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Doutrinadores jurídicos e a afirmação de “novos direitos” no Brasil pós-1988: o caso das uniões entre pessoas do mesmo sexo

Legal scholars and the affirmation of “new rights” in the post-1988 Brazil: the case of same-sex unions

Resumo

Sentenças judiciais se fundamentam na legislação em vigor e nas decisões judiciais anteriores, a jurisprudência. Sobretudo quando a decisão diz respeito a temas controversos, as sentenças também se apoiam em arrazoados produzidos por especialistas do direito que, quando recorrentemente adotados, passam a ser reconhecidos como doutrina jurídica. Considerando seu papel fundamental para definir o direito, uma importante literatura tem examinado os processos pelos quais doutrinas jurídicas são produzidas. Este artigo oferece uma contribuição para esses estudos por meio da análise das características socioprofissionais de especialistas cujos arrazoados foram mobilizados para fundamentar os votos de ministros do Supremo Tribunal Federal quando reconheceram, em 2011, o direito de pessoas de mesmo sexo à união civil. O estudo mostra que os percursos socioprofissionais dos especialistas citados por ministros, assim como as redes das quais fizeram parte e seus engajamentos políticos, são elementos importantes para explicar o sucesso de suas ideias. Além disso, utilizaram habilmente capitais que ganharam importância com a diversificação do campo jurídico brasileiro e aproveitaram oportunidades decorrentes das mudanças institucionais no STF, além de novas concepções sobre o que é o direito na democracia pós-1988.

Palavras-chave
doutrina jurídica; campo jurídico; juristas; direitos LGBTQIA+; Supremo Tribunal Federal

Abstract

Judicial sentences are based on current laws and past court rulings, also known as jurisprudence. Legal experts often provide arguments to support sentences, especially when the decision concerns controversial issues. When consistently adopted, these arguments are recognized as legal doctrine. Given their essential function in shaping the law, extensive literature has investigated how legal doctrines are created. This article adds to existing studies by examining the social and professional backgrounds of the experts whose opinions supported the Supreme Court's decision to grant legal recognition of same-sex marriage in 2011. Their arguments favoring same-sex marriage could influence the justices' ruling due to their career paths, networks, and political engagement. These experts adeptly utilized capitals that gained significance during the diversification of the Brazilian legal field and seized opportunities arising from institutional changes within the High Federal Court following the Brazilian re-democratization.

Keywords
legal doctrine; legal field; jurists; LGBTQIA+ rights; Brazilian Supremo Tribunal Federal

Introdução

O arcabouço jurídico vigente no Brasil exige que juízes fundamentem suas decisões, sob pena de nulidade das mesmas. Portanto, a fundamentação é um dos elementos essenciais das sentenças emitidas em nome do poder público.1 1 Constituição Federal de 1988 (Art. 93, IX) e Código de Processo Civil de 2015 (Art. 489, II; §1º, I a VI). Na prática, a sentença consiste num esforço argumentativo apoiado, primeiro, na legislação em vigor e, segundo, nas decisões judiciais anteriores sobre demandas que podem ser consideradas como semelhantes, o que passa a compor a chamada jurisprudência relativa ao tema. A fundamentação das sentenças pode-se amparar também em arrazoados emitidos por especialistas em direito, divulgados em livros, artigos, pareceres etc. Isso é tanto mais frequente nos casos em que se propõe uma nova interpretação do direito. Ao serem reconhecidos como válidos, esses arrazoados passam a ser denominados, no jargão da área, como doutrina jurídica.

Considerando a relevância dessas opiniões para a definição de novos modos de pensar e definir o direito, importa indagar sobre as condições que permitem a certos arrazoados se tornarem doutrinas jurídicas.

Trata-se de um longo e complexo processo. Alguns estudos se debruçaram sobre essa questão a partir de uma abordagem internalista, buscando explicar a transmutação de uma opinião em doutrina em função de suas características particulares (Rodrigues Jr., 201039 RODRIGUES JR., Luiz Otávio. Dogmática e crítica da jurisprudência (ou da vocação da doutrina em nosso tempo). Revista dos Tribunais, v. 891, p. 1-31, 2010.; Jamin; Jestaz, 200432 JAMIN, Christophe; JESTAZ, Philippe. La doctrine. Paris: Dalloz, 2004.; Braun, 200610 BRAUN, Alexandra. Professors and judges in Italy: it takes two to tango. Oxford Journal of Legal Studies, v. 26, n. 4, p. 665-681, 2006. https://www.jstor.org/stable/4494562.
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, 20109 BRAUN, Alexandra. Burying the living? The citation of legal writings in English Courts. The American Journal of Comparative Law, v. 58, n. 1, p. 27-52, 2010. https://www.jstor.org/stable/25652684.
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; Chambost, 201414 CHAMBOST, Anne-Sophie (org.). Histoire des manuels de droit: une histoire de la littérature juridique comme forme du discours universitaire. Paris: Lextenso Editions, 2014.). Outra perspectiva destaca tanto a ação dos movimentos sociais quanto a dos profissionais do direito para afirmação de uma nova concepção jurídica (Bunchaft, 201211 BUNCHAFT, Maria Eugenia. A temática das uniões homoafetivas no Supremo Tribunal Federal à luz do debate Honneth-Frase. Revista Direito GV, v. 8(1), p. 133-156, 2012. https://doi.org/10.1590/S1808-24322012000100006.
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; Buzolin, 201912 BUZOLIN, Lívia G. Direito homoafetivo. Criação e discussão nos poderes Judiciário e Legislativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019.; Caulfield, 201713 CAULFIELD, Sueann. 2017. A dignidade humana, o direito de família e o casamento homoafetivo no Brasil, 1988-2016. Acervo, v. 30, n. 1, p. 179-194, 2017. https://revista.an.gov.br/index.php/revistaacervo/article/view/786.
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; Coitinho Filho; Rinaldi, 2018; Costa; Nardi, 201516 COSTA, Angelo B.; NARDI, Henrique Caetano. O casamento “homoafetivo” e a política da sexualidade: implicações do afeto como justificativa das uniões de pessoas do mesmo sexo. Estudos Feministas, v. 23, n. 1, p. 137-150, 2015.; Hess, 201727 HESS, Heliana Maria C. O reconhecimento da união homoafetiva no Brasil e nos Estados Unidos: estudo de caso precedente ADI-4277 (ADPF-132-RJ) e Perry v. Brown. In: KIYOSHI, Marcus Vinicius. Brasil e EUA: temas de direito comparado. São Paulo: Escolha Paulista de Magistratura, 2017.; Roesler; Santos, 201440 ROESLER, Claudio R.; SANTOS, Paulo A. Argumentação jurídica utilizada pelos tribunais brasileiros ao tratar das uniões homoafetivas. Revista Direito GV, v. 10, n. 2, p. 615-638, 2014.; Rosário; Guimarães; Carvalho, 2017; Streck, 201455 STRECK, Lenio. O caso da ADPF-132. Defender o texto da Constituição é uma atitude positivisma (ou “originalista”)? Revista Direito UnB, v. 1, n. 1, p. 280-304, 2014.; Vieira; Efrem Filho, 2020; Nichnig, 201433 NICHNIG, Claudia Regina. Os conceitos têm história: os usos e a historicidade dos conceitos utilizados em relação à conjugalidade entre pessoas do mesmo sexo no Brasil. Revista Gênero e Direito, v. 1, p. 27-46, 2014.).

Neste artigo, a partir do caso da afirmação do direito dos casais de mesmo sexo à união civil pelo STF em 2011, examinamos uma dimensão particular desse processo, aquela que diz respeito às características socioprofissionais dos especialistas em direito cujas opiniões embasaram a decisão do Supremo. Mais precisamente, procuramos examinar como as dinâmicas específicas do campo jurídico brasileiro, no qual se movem especialistas e operadores do direito de família, assim como outros interessados na afirmação desse novo direito, contribuíram para a produção social da doutrina jurídica que fundamentou essa decisão.

Compreendendo o campo jurídico como local de disputas pelo monopólio da capacidade de afirmar o direito legítimo (Bourdieu, 19898 BOURDIEU, Pierre. A força do direito. Elementos para uma sociologia do campo jurídico. In: BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand, 1989. p. 209-255.; Israël, 201731 ISRAËL, Liora. À qui de droit (Introduction à la nouvelle édition). In: ISRAËL, Liora (ed.). La force du droit, de Pierre Bourdieu. Paris: Éditions de la Sorbonne, 2017.), examinamos os circuitos de legitimação ativados no interior do próprio espaço do direito para esse caso específico, focalizando as trajetórias profissionais de especialistas que foram capazes de produzir e divulgar em larga escala uma visão específica sobre o conceito jurídico de família, assim como os capitais que permitiram a esses profissionais – e não a outros – chegar a tal resultado. Argumentamos que esses capitais lhes possibilitaram construir uma importante notoriedade no campo jurídico levando a que suas opiniões, que expressavam novas perspectivas jurídicas, pudessem ser adotadas de maneira ampla.

Como ficará mais claro adiante, essa forma de pensar o problema exigiu levar em conta as modificações no campo jurídico resultantes da Constituição promulgada em 1988, em particular, a importância assumida pelo direito no jogo democrático, que transferiu para a esfera judicial diversos contenciosos sociais cuja resolução era antes direcionada para o legislativo. Essas transformações, que correspondem, portanto, a uma diversificação das questões levadas à corte, ocorreram simultaneamente à expansão universitária que levou ao aumento da oferta de profissionais do direito, assim como à diversificação de sua formação (Engelmann, 200620 ENGELMANN, Fabiano. Sociologia do campo jurídico: juristas e usos do direito. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006.).

O texto está organizado em duas partes, além desta introdução e da conclusão. Cuidamos inicialmente da descrição do caso e, depois, da construção da hipótese a partir de uma análise das chaves explicativas do fenômeno, que já vêm sendo mobilizadas na literatura. A seguir, aplicada ao caso empírico em tela, nossa abordagem, que leva em conta processos de formação da e dos juristas cujas opiniões foram mobilizadas no julgamento, assim como as redes das quais fizeram parte e seus engajamentos políticos, contribui para explicar por que suas ideias puderam apoiar decisões naquele julgamento específico, oferecendo as bases doutrinárias para que fosse operada, pela via judicial, uma renovação do direito de família no Brasil contemporâneo.

O “novo direito” no Brasil contemporâneo

Encerrada a sessão plenária do STF em 05/05/2011, uma realidade jurídica inédita foi estabelecida no Brasil. Naquela ocasião, os ministros equipararam as uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo às demais formas familiares historicamente previstas em lei, impondo para elas “regras e consequências” semelhantes (STF, 201151 STF, Supremo Tribunal Federal. Registro do julgamento da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental 132 e da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4277, em 05/05/2011, Canal oficial do STF no YouTube, 2011a. https://www.youtube.com/watch?v=9w6ouZOgRnE&ab_channel=STF
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, p. 5). Com isso, essa convivência familiar passou a ser, pela primeira vez na história do país, oficialmente reconhecida pelo sistema de justiça, permitindo que pessoas pudessem exercer de maneira inequívoca direitos sobre filiação, adoção, autoridade familiar, pensão, partilha e uso dos nomes de família (Dias, 200717 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 4. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.).

Nesse julgamento, o STF examinou simultaneamente duas demandas com mesmo objeto. A primeira, proposta pelo governador fluminense em 2008, no âmbito de uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 132 (ADPF-132), requeria, com base em princípios constitucionais abstratos, como liberdade de determinação, equidade, razoabilidade, segurança jurídica e dignidade da pessoa humana, nova interpretação para o Estatuto Estadual dos Servidores Públicos Civis para conceder às uniões estáveis que envolviam pessoas do mesmo sexo as mesmas garantias jurídicas já autorizadas para aquelas que envolviam pessoas de sexos diferentes. No ano seguinte, esse pedido foi encampado pela Ação Direta de Inconstitucionalidade 4277 (ADI-4277), encaminhada pela Procuradoria-Geral da República. Isso possibilitou que a decisão a ser tomada pela corte, qualquer que fosse ela, tivesse maior abrangência, pois incidiria sobre todas as pessoas afetadas pelo direito pleiteado e com efeito vinculante. Com isso, o Supremo impôs universalidade e uniformidade de interpretação jurídica ao assunto no país (STF, 2011c53 STF - Supremo Tribunal Federal. Argüição de descumprimento de preceito fundamental 132 (ADPF 132). Plenário. Rio de Janeiro, 5 nov. 2011c. Disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=628633
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).

Transmitida pela TV Justiça e outros canais de imprensa, o que acarretou ampla exposição das opiniões veiculadas, a sessão foi precedida por audiências públicas entre ministros e setores da sociedade (Falcão; Oliveira, 201322 FALCÃO, Joaquim; OLIVEIRA, Fabiana Luci. O STF e a agenda pública nacional: de outro desconhecido a supremo protagonista? Lua Nova, v. 88, p. 429-469, 2013.; Vieira; Efrem Filho, 202056 VIEIRA, Adriana D.; EFREM FILHO, Roberto. O rei está nu: gênero e sexualidade nas práticas e decisões no STF. Direito e práxis, v. 11, n. 2, p. 1084-1136, 2020.; Recondo; Weber, 201937 RECONDO, Felipe; WEBER, Luiz. Os onze: o STF, seus bastidores e suas crises. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.), das quais participaram associações de juristas, grupos de militantes e religiosos, como foi amplamente documentado por diferentes autores (Coitinho Filho; Rinaldi, 201815 COITINHO FILHO, Ricardo; RINALDI, Alessandra de A. O Supremo Tribunal Federal e a “união homoafetiva”. Onde os direitos e as moralidades se cruzam. Civitas, v. 18, n. 1, p. 26-42, 2018.; Vieira; Efrem Filho, 202056 VIEIRA, Adriana D.; EFREM FILHO, Roberto. O rei está nu: gênero e sexualidade nas práticas e decisões no STF. Direito e práxis, v. 11, n. 2, p. 1084-1136, 2020.; Caulfield, 201713 CAULFIELD, Sueann. 2017. A dignidade humana, o direito de família e o casamento homoafetivo no Brasil, 1988-2016. Acervo, v. 30, n. 1, p. 179-194, 2017. https://revista.an.gov.br/index.php/revistaacervo/article/view/786.
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; Rosário; Guimarães; Carvalho,, 201741 ROSÁRIO, Luana P. D.; GUIMARÃES, Rafael S.; CARVALHO, Ciro Antônio das M. Julgamento da ADPF 132. Análise à luz da hermenêutica fenomenológica e do ativismo judicial. Revista de Informação Legislativa, v. 54, n. 216, p. 207-229, 2017.). O placar foi expressivo. Todos os ministros julgaram a causa procedente (STF, 2011a51 STF, Supremo Tribunal Federal. Registro do julgamento da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental 132 e da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4277, em 05/05/2011, Canal oficial do STF no YouTube, 2011a. https://www.youtube.com/watch?v=9w6ouZOgRnE&ab_channel=STF
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; STF, 201849 STF - Supremo Tribunal Federal. Casos notórios do STF, ed. 2018. Stf.jus.br: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/jurisprudenciaPesquisasFavoritas/anexo/CasosNotrios.pdf.
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).2 2 Apenas o ministro Dias Toffoli não participou do julgamento. Declarou-se suspeito, pois tinha opinado favoravelmente ao pedido como Advogado Geral da União.

Até a decisão final da corte constitucional, as únicas uniões civis oficialmente reconhecidas no Brasil eram as expressamente inscritas na legislação infraconstitucional e na Carta Magna. Com a exceção de alguns poucos casos que foram considerados por decisões judiciais esporádicas que tiveram lugar nos anos 1990 em diante (Dias, 200319 DIAS, Maria Berenice. Homoafetividade: o que diz a justiça! As pioneiras decisões do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que reconhecem direitos às uniões homossexuais.. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003., 200618 DIAS, Maria Berenice. União homossexual: o preconceito e a justiça. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.), as leis permitiam uniões estáveis e casamentos apenas entre um homem e uma mulher. Afinal, isso é o que rege o artigo 226, §3º, da Constituição Federal de 1988, repetido pelo artigo 1.723ss do Código Civil de 2002, assim como previsões legais anteriores.

Uma vez garantido o novo direito pela mais alta corte brasileira, operou-se também uma mudança conceitual sobre como se enxerga oficialmente o que é família. Isso levou a mudanças no sistema de justiça, com efeitos em cascata para as instâncias inferiores. Baseado nesse julgamento, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou que uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo fossem convertidas em casamentos3 3 Recurso Especial 1.183.348, de 25/10/2011. e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou que isso ocorresse sem questionamento dos cartorários4 4 Resolução 175, de 14/05/2013. (Costa; Nardi, 201516 COSTA, Angelo B.; NARDI, Henrique Caetano. O casamento “homoafetivo” e a política da sexualidade: implicações do afeto como justificativa das uniões de pessoas do mesmo sexo. Estudos Feministas, v. 23, n. 1, p. 137-150, 2015., p. 138). Desde então, essa modalidade de união cresceu muito em todas as regiões do país (Yamaguti, 202359 YAMAGUTI, Bruna. Casamentos homoafetivos quadriplicam em 10 anos no Brasil. G1, 15/05/2023. https://g1.globo.com/df/distrito-federal/noticia/2023/05/15/casamentos-homoafetivos-quadriplicam-em-10-anos-no-brasil.ghtml
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).

Isso aconteceu mais ou menos concomitantemente ao que ocorreu em outros países, onde a compreensão do que pode ser considerado juridicamente como família vem sendo modificada pela ação de legisladores ou magistrados. Entre 2001 e 2017, Holanda (em 2001), Bélgica (2003), Espanha (2005), Portugal (2010), França (2013) e Alemanha (2017) alteraram suas leis para reconhecer o casamento e/ou união estável para pessoas do mesmo sexo (Paternotte, 201135 PATERNOTTE, David. Revendiquer le “mariage gay”. Bruxelas: Éditions de l'Université de Bruxelles, 2011.; Pearson, 201836 PEARSON, Alexander. Países do mundo que legalizaram o casamento gay. Deutsche Welle Brasil, ed. 10/01/2018. https://p.dw.com/p/2qeCn.
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). Na América Latina, também por força de legislação, o mesmo ocorreu na Argentina (2010) e no Uruguai (2013). A decisão do Supremo, portanto, permitiu ao Brasil se adequar a essa onda de transformações. Observa-se que, enquanto na maioria dos outros países essa alteração ocorreu por vias parlamentares, nos Estados Unidos, no México e no Brasil, o Judiciário foi o responsável por essa mudança. No Brasil, em particular, isso ocorreu num momento em que os debates internacionais sobre a questão e a ação dos movimentos sociais locais ganhavam força, o que, no entanto, não foi suficiente para que o Congresso Nacional se dispusesse a examinar a questão (Santos; Melo, 201842 SANTOS, Gustavo G. da C.; MELO, Bruno Leonardo R. de. The opposition to LGBT rights in the Brazilian national congress (1986-2018): actors, dynamics of action and recent developments. Sociologies in dialogue – Journal of the Brazilian Sociological Society, v. 4, n. 1, p. 80-108, 2018.; Buzolin, 201912 BUZOLIN, Lívia G. Direito homoafetivo. Criação e discussão nos poderes Judiciário e Legislativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019.).

Alguns autores mostram que não é possível compreender essa mudança sem levar em conta a atuação do movimento social e, em particular, seu trabalho como impulsionador de debates públicos. Bem posicionados durante a construção da chamada Nova República, militantes articularam pautas e fizeram pressão em diferentes espaços de poder (Facchini, 200921 FACCHINI, Regina. Entre compassos e descompassos: um olhar para o “campo” e para a “arena” do movimento LGBT brasileiro. BAGOAS – Estudos gays: gênero e sexualidades, v. 3, n. 4, p. 131-158, 2009.; Caulfield, 201713 CAULFIELD, Sueann. 2017. A dignidade humana, o direito de família e o casamento homoafetivo no Brasil, 1988-2016. Acervo, v. 30, n. 1, p. 179-194, 2017. https://revista.an.gov.br/index.php/revistaacervo/article/view/786.
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; Green, 200326 GREEN, James. A luta pela igualdade: desejos, homossexualidade e a esquerda na América Latina. Cadernos AEL, v. 10, n. 18-19, p. 16-41, 2003.).

Ao menos desde os anos 1990, esses movimentos têm encontrado espaços de atuação no âmbito do próprio Estado (Facchini, 200921 FACCHINI, Regina. Entre compassos e descompassos: um olhar para o “campo” e para a “arena” do movimento LGBT brasileiro. BAGOAS – Estudos gays: gênero e sexualidades, v. 3, n. 4, p. 131-158, 2009.). No executivo, militantes atuaram diretamente na formulação de políticas públicas para a população LGBTQI+, pelo menos durante algum tempo (Ferreira; Aguinsky, 201323 FERREIRA, Guilherme G.; AGUINSKY, Beatriz G. Movimentos sociais de sexualidade e gênero: análise do acesso às políticas públicas. Revista Katál, v. 16, n. 2, p. 223-232, 2013.). No legislativo, em aliança com parlamentares, lutaram pela proposição de projetos de lei, mesmo enfrentando resistência da bancada evangélica, de católicos tradicionalistas e outros políticos (Santos; Melo, 201842 SANTOS, Gustavo G. da C.; MELO, Bruno Leonardo R. de. The opposition to LGBT rights in the Brazilian national congress (1986-2018): actors, dynamics of action and recent developments. Sociologies in dialogue – Journal of the Brazilian Sociological Society, v. 4, n. 1, p. 80-108, 2018.). Por fim, atuaram no Judiciário, onde as uniões entre pessoas do mesmo sexo passaram a ser reconhecidas, ainda que de forma esparsa, por juízes de primeiro ou segundo graus, desde finais dos anos 1990 (Dias, 200618 DIAS, Maria Berenice. União homossexual: o preconceito e a justiça. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.). Em parte, esse trabalho dependeu de alianças entre militantes e juristas comprometidos em promover essas causas, resultando, inclusive, em conquista, pelos primeiros, de espaço nas audiências públicas promovidas pelo STF e na sua atuação como amicus curiae no julgamento mencionado (Vieira; Efrem Filho, 202056 VIEIRA, Adriana D.; EFREM FILHO, Roberto. O rei está nu: gênero e sexualidade nas práticas e decisões no STF. Direito e práxis, v. 11, n. 2, p. 1084-1136, 2020.; Caulfield, 201713 CAULFIELD, Sueann. 2017. A dignidade humana, o direito de família e o casamento homoafetivo no Brasil, 1988-2016. Acervo, v. 30, n. 1, p. 179-194, 2017. https://revista.an.gov.br/index.php/revistaacervo/article/view/786.
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).

Outra dimensão que não pode ser ignorada diz respeito aos conteúdos da Constituição vigente, principalmente as garantias nela consagradas como fundamentais. No constitucionalismo pós-1988, princípios abstratos, como dignidade da pessoa humana, liberdade de determinação e equidade, tornaram-se “as normas mais fundamentais do sistema” (Silva, 200348 SILVA, Virgílio Afonso da. Princípios e regras: mitos e equívocos de uma distinção. Revista Latino-Americana de Estudos Constitucionais, v. 2, p. 607-630, 2003. p. 612). Esses princípios demandam aplicação direta nas relações sociais (Barroso, 20056 BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito: o triunfo tardio do Direito Constitucional no Brasil. Revista Direito Administrativo, v. 240, p. 1-42, 2005. https://doi.org/10.12660/rda.v240.2005.43618.
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, 20074 BARROSO, Luís Roberto. Diferentes, mas iguais: o reconhecimento jurídico das relações homoafetivas no Brasil. Boletim Científico da Escola Superior do Ministério Público da União, v. 6, n. 22(23), p. 117-163, 2007. http://boletimcientifico.escola.mpu.mp.br/boletins/boletim-cientifico-n.-22-e-n.-23-janeiro-junho-de-2007/diferentes-mas-iguais-o-reconhecimento-juridico-das-relacoes-homoafetivas-no-brasil.
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; Sarmento, 200945 SARMENTO, Daniel. O neoconstitucionalismo no Brasil: riscos e possibilidades. Revista Brasileira de Estudos Constitucionais, v. 9, p. 95-133, 2009.). Essa foi a posição assumida no julgamento das uniões entre pessoas do mesmo sexo – num contexto de ampliação dos poderes do Judiciário na democracia e de novas visões sobre os papéis do direito no pós-ditadura (Arantes, 19972 ARANTES, Rogério. Judiciário e política no Brasil. São Paulo: Sumaré, 1997.; Engelmann, 200620 ENGELMANN, Fabiano. Sociologia do campo jurídico: juristas e usos do direito. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006.).

Em terceiro lugar, essa conjuntura favoreceu a criação de instrumentos jurídicos, como o controle concentrado da constitucionalidade, por meio do qual indivíduos e grupos interessados podem “contestar diretamente no Supremo a constitucionalidade de uma lei ou ato normativo” (STF, 200954 STF - Supremo Tribunal Federal. Controle concentrado: legalidade de leis ou atos normativos é questionada em 1.040 ações no STF, Notícias STF. Stf.jus.br, ed. 12/ maio 2009. http://www.stf.jus.br/portal/cms/vernoticiadetalhe.asp?idconteudo=108009.
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) e a possível omissão do legislador para regulamentar temáticas caras ao exercício de direitos fundamentais dos cidadãos. Nessa figura se enquadram a ADPF e a ADI mencionadas no caso estudado (STJ, 2011c53 STF - Supremo Tribunal Federal. Argüição de descumprimento de preceito fundamental 132 (ADPF 132). Plenário. Rio de Janeiro, 5 nov. 2011c. Disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=628633
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). Isso significa que, no bojo de uma sociedade que procura aprofundar sua experiência democrática, dispositivos foram criados para permitir que os cidadãos tenham poder para incitar a mais alta corte a aplicar normas constitucionais às relações sociais, inclusive para assuntos não regulamentados pela legislação ordinária, mas dotados de um possível enquadramento como garantia fundamental (Barroso, 20095 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, v. 13, p. 17-32, 2009. https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/5124286.pdf.
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).

Porém, mesmo com todas essas mudanças, não é possível ignorar que foi necessária uma composição particular no Supremo para que certos direitos fossem reconhecidos. Esse é um ponto que exploramos neste texto, por meio da análise de especialistas em direito que os ministros elegeram considerar na justificação da sentença exarada no julgamento favorável à união civil entre indivíduos do mesmo sexo.

A construção das notoriedades no Direito de Família

No julgamento final da ADPF-132/ADI-4.277, a corte era composta por um conjunto de ministros nomeados por presidentes do período democrático. A maior parte deles se mostrara disposta a manusear as gramáticas jurídicas formuladas no período após 1988 em “decisões controversas e que mudaram o rumo do país, como a união homoafetiva, a prisão em segunda instância, a lei de imprensa, as biografias não autorizadas e a marcha da maconha” (Recondo; Weber, 201937 RECONDO, Felipe; WEBER, Luiz. Os onze: o STF, seus bastidores e suas crises. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.), além do aborto de fetos anencéfalos, as pesquisas com células tronco, as cotas raciais em universidades e a criminalização da homofobia.

Essa composição da cúpula judicial decorre de transformações mais amplas que também dizem respeito à diversificação do campo jurídico a partir dos anos 1990, com consequências para as décadas seguintes. Como mostra Engelmann (2006)20 ENGELMANN, Fabiano. Sociologia do campo jurídico: juristas e usos do direito. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006., tal diversificação corresponde à chegada de novos profissionais, com trajetórias diferentes da historicamente apresentada por juristas que tinham acesso à corte mais alta – bacharéis com trânsito pelo mundo da política, que conseguiram se destacar ao produzirem vocabulários jurídicos inéditos e, além disso, por renovarem disciplinas na área.

Altamente titulados em uma área em que estudos avançados eram incomuns, passaram a ocupar posições em programas de pós-graduação recém-criados, geralmente fora das universidades e searas jurídicas mais tradicionais. Sem abandonar seus cargos em órgãos públicos estaduais ou federais acessados por seletivos concursos, também se tornaram orientadores de teses e dissertações, além de escreverem obras jurídicas apresentando suas interpretações das leis. Ao navegar por esses diferentes espaços, puderam expandir seus modos de pensar o direito, muitas vezes se contrapondo ao positivismo jurídico e ao dogmatismo historicamente dominantes no país (Engelmann, 200620 ENGELMANN, Fabiano. Sociologia do campo jurídico: juristas e usos do direito. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006.).

Como argumentamos, interessa compreender quem são esses juristas e que trajetórias socioprofissionais construíram para um caso específico. Suas trajetórias foram levantadas em 2017 (ver quadro 2 adiante), todavia, como se pôde verificar, essas pessoas já apresentavam uma carreira fortemente estabilizada como pesquisadores e autores de obras jurídicas quando foram reconhecidos, pelos ministros do STF, como autoridades para o referido caso. À época do julgamento, tais juristas participavam, ao menos desde os anos 1990, de um intenso debate que opunha os conceitos ditos “restrito” e “amplo” de família quando se tratava de sua definição jurídica (Buzolin, 201912 BUZOLIN, Lívia G. Direito homoafetivo. Criação e discussão nos poderes Judiciário e Legislativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019., p. 49-56).

O conceito restrito ecoa a família nuclear historicamente inscrita na legislação, na jurisprudência e na doutrina. Entre seus adeptos, encontram-se juristas considerados como mais conservadores, professores de tradicionais faculdades de direito e/ou ocupantes de postos importantes no Estado em diferentes momentos, como Pontes de Miranda, Orlando Gomes, Clóvis Beviláqua, San Tiago Dantas, Lafayette Rodrigues Pereira, Washington de Barros Monteiro, Sílvio de Salvo Venosa, Maria Helena Diniz e Álvaro Villaça Azevedo. Já o conceito amplo associa a definição oficial aos laços afetivos existentes entre as pessoas, independentemente das orientações sexuais. Essa interpretação é afirmada por juristas considerados como mais progressistas, que têm se destacado no espaço nacional no período recente, como: Maria Berenice Dias, Luiz Edson Fachin, Paulo Luiz Netto Lôbo, Rolf Madaleno, Daniel Sarmento e Rodrigo da Cunha Pereira. No julgamento ora estudado, essa foi a corrente doutrinária majoritariamente assumida pelos ministros, em especial a noção de “família homoafetiva” (Buzolin, 201912 BUZOLIN, Lívia G. Direito homoafetivo. Criação e discussão nos poderes Judiciário e Legislativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019., p. 56-59).

Como mostraram Nichnig (2014)33 NICHNIG, Claudia Regina. Os conceitos têm história: os usos e a historicidade dos conceitos utilizados em relação à conjugalidade entre pessoas do mesmo sexo no Brasil. Revista Gênero e Direito, v. 1, p. 27-46, 2014., Caulfield (2017)13 CAULFIELD, Sueann. 2017. A dignidade humana, o direito de família e o casamento homoafetivo no Brasil, 1988-2016. Acervo, v. 30, n. 1, p. 179-194, 2017. https://revista.an.gov.br/index.php/revistaacervo/article/view/786.
https://revista.an.gov.br/index.php/revi...
e Buzolin (2019)12 BUZOLIN, Lívia G. Direito homoafetivo. Criação e discussão nos poderes Judiciário e Legislativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019., a jurista Maria Berenice Dias e seus aliados foram os principais responsáveis por criar e divulgar esse novo discurso sobre o direito de família. Em particular, esse grupo cunhou a ideia de “homoafetividade” que originou o termo “uniões homoafetivas” reconhecido pelo STF. Como mostram Costa e Nardi (2015 p. 138)16 COSTA, Angelo B.; NARDI, Henrique Caetano. O casamento “homoafetivo” e a política da sexualidade: implicações do afeto como justificativa das uniões de pessoas do mesmo sexo. Estudos Feministas, v. 23, n. 1, p. 137-150, 2015., apenas no Brasil “se utiliza o termo homoafetividade – inclusive em documentos oficiais – para designar as relações entre pessoas do mesmo sexo, pretendendo-se, assim, legitimar direitos através da afirmação jurídica de um sentimento positivado”.

Diferentes ministros que participaram do julgamento, e a própria Maria Berenice Dias, em entrevistas e publicações, indicam que esses “inovadores” do direito estão reunidos no Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), associação que atua desde os anos 2000 para incluir no direito a noção de “abandono afetivo parental” (Wohnrath, 201258 WOHNRATH, Vinicius. Laços de família e expertise jurídica: uma análise da construção do direito dos filhos ao afeto. Dissertação. (Mestrado em Educação) Universidade Estadual de Campinas- UNICAMP. Campinas, 2012.). Assim, essa nova visão jurídica sobre a família pôde ser convertida em doutrina por meio de um trabalho persistente em espaços de prática e de ensino jurídico. Não é surpresa, portanto, que esses tenham sido os autores de referência para apoiar e justificar os votos de ministros no referido julgamento.

Para localizar os juristas mais citados nos votos dos ministros para o caso estudado, coletamos, no referido processo judicial (ADPF-132/ADI-4.277), as obras jurídicas escritas por autores brasileiros provenientes da área do direito5 5 Buzolin (2019, p. 151-156) também identificou, nos documentos do STF, os doutrinadores mobilizados nesse julgamento. . No processo judicial, esse material aparece organizado no item denominado “Doutrina”, elaborado pela Seção de Jurisprudência do STF.6 6 Fonte: STF, Jurisprudência. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/>. Para chegarmos ao resultado desconsideramos as menções a autores de outras áreas que não o direito, como história, antropologia, sociologia e filosofia. Em seguida, selecionamos apenas especialistas brasileiros, uma vez que nosso interesse é identificar os circuitos de legitimação que organizam o campo jurídico nacional. Também desconsideramos o número de vezes que uma única doutrina jurídica foi citada e por qual ministro, por não ser nosso foco analisar discursos jurídicos ou como decide cada magistrado em específico.

Aplicados esses filtros, encontramos mencionados na decisão 76 especialistas em direito. Em seguida, selecionamos os juristas com incidência de citação maior que um (>1) por obra bibliográfica. Como resultado, vimos que apenas dez profissionais alcançaram esse patamar, sendo citados duas ou mais vezes (Quadro 1).

Quadro 1
Juristas mais citados na ADPF-132/ADI-4.277

Com exceção de José Afonso da Silva, os doutrinadores listados no Quadro 1 estão vinculados ao IBDFAM como sócios, fundadores e/ou equipe dirigente, tanto no momento do julgamento analisado quanto imediatamente após proferida a sentença do STF. Encontram-se nesta condição: Rodrigo da Cunha Pereira (presidente nacional; fundador), Maria Berenice Dias (vice-presidenta nacional; fundadora; presidenta da Comissão de Direito Homoafetivo e Gênero), Gustavo Tepedino (presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da Família), Guilherme Gama (filiado), Luiz Edson Fachin (filiado; fundador) e Álvaro Villaça Azevedo (sócio-honorário; membro do conselho consultivo) (IBDFAM, 201530 IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família. Luiz Edson Fachin é o novo ministro do STF. Notícias. Ibdfam.org, 20 maio 2015. http://www.ibdfam.org.br/noticias/5643/Luiz+Edson+Fachin+%C3%A9+o+novo+ministro+do+Supremo+Tribunal+Federal.
http://www.ibdfam.org.br/noticias/5643/L...
, 201829 IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família. Diretoria, Ibdfam.org, 2018. http://www.ibdfam.org.br/conheca-o-ibdfam/diretoria.
http://www.ibdfam.org.br/conheca-o-ibdfa...
). Já Daniel Sarmento palestrou em 2018 no encerramento do 6o Congresso Internacional do IBDFAM e Ingo Sarlet em 2010 na abertura do Congresso sobre Direitos Fundamentais do IBDFAM, além de publicar capítulos em livros organizados por Dias (2017)17 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 4. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. e Sarlet (2008)43 SARLET, Ingo Wolfgang. Breves notas sobre a contribuição dos princípios para a renovação da jurisprudência brasileira. In: TEPEDINO, Gustavo (org.). Direito Civil contemporâneo: novos problemas à luz da legalidade constitucional. São Paulo: Atlas, 2008.. Logo, as redes que já existiam no momento do referido julgamento continuaram ativas e, mais do que isso, posteriormente foram aprofundadas, como se pode perceber pelas publicações conjuntas ou pelos eventos realizados ao longo daquela década. Em parte, isso se deve ao incremento da notoriedade obtida por esses agentes que formularam concepções jurídicas que passaram a ser relativamente dominantes, também a partir do reconhecimento inédito de certos direitos pelo Supremo.

Tendo essas informações como base, inicialmente classificamos o grupo de juristas em dois tipos a partir dos investimentos temáticos que realizaram dentro da esfera do direito, produzindo obras jurídicas, operando em tribunais, orientando estudantes de graduação ou pós-graduação e ministrando disciplinas sobre o assunto.

O primeiro é formado por especialistas que organizaram o vocabulário jurídico definidor do que propõem ser a família “moderna”. Atuando mais exclusivamente no ramo do direito de família, tanto no Judiciário quanto em universidades, cunharam ou difundiram o termo “homoafetividade”, além de lutarem para definir os contornos do direito de família a partir dos anos 1990, quando o ensino do direito sofreu mudanças importantes em termos de reelaboração de disciplinas e valorização de temáticas até então inéditas no país. Aqui se localizam, por exemplo, juristas como Maria Berenice Dias e Rodrigo da Cunha Pereira.

Por sua vez, o segundo tipo é composto por juristas que interpretavam as regras do direito civil, em que se encontra essa família que chamam de “nova” ou “contemporânea”,7 7 Essa terminologia aparece, inclusive, nas obras incorporadas pela decisão do STF e no próprio acórdão elaborado pelos ministros. à luz constitucional. Nesse conjunto estão agentes que retraduziram no Brasil a “metodologia da constitucionalização do direito civil”, conhecida na área por “direito civil-constitucional” (Schreiber; Konder, 201647 SCHREIBER, Anderson; KONDER, Carlos Nelson. Uma agenda para o Direito Civil-Constitucional. Revista Brasileira de Direito Civil, v. 10, p. 9-27, 2016., p. 10). Esta interpretação, importada da Itália a partir de meados dos anos 1980, sobretudo por pesquisadores da UERJ com passagens pela Universidade de Camerino, busca colocar em evidência o caráter constitucional do direito civil, contrapondo-se ao normativismo privatista tradicional. Profissionais como Tepedino, Calmon e Fachin comungam dessa ideia, que pode ser ampliada para a interpretação das regras jurídicas sobre a família, uma vez que elas estão inscritas na atual Constituição, além do Código Civil de 2002. As diretrizes do direito de família passaram a ser pensadas também a partir dos princípios fundamentais abstratos valorizados por tal corrente. Suas ideias se juntam assim às promovidas por autores afiliados à gramática do afeto, ou seja, que traduzem o direito ao afeto à luz da dignidade humana reconhecida constitucionalmente após 1988.

Em conjunto, as propostas desses e dessas juristas, que investiram em áreas do direito complementares, forneceram as condições teóricas para que os ministros diversificassem seus repertórios jurídicos sobre a temática julgada, construíssem suas convicções e justificassem suas decisões sobre uma causa que dependia de interpretação de conteúdos abstratos do direito. Em regra, tais doutrinadores se localizavam em uma associação profissional que suportou eventos, publicações e, enfim, funcionou como um espaço de divulgação de certas ideias posteriormente – ou seja, após um longo trabalho de afirmação no campo jurídico – recepcionadas pelo Supremo.

O IBDFAM se apresenta como uma “entidade técnico-científica sem fins lucrativos” fundada em 1997, em Belo Horizonte, “durante o 1º Congresso Brasileiro de Direito de Família”. Seu objetivo declarado é “desenvolver e divulgar o conhecimento sobre direito das famílias, além de atuar como força representativa nas demandas sociais que recorrem à justiça” (IBDFAM, 202028 IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família. História do IBDFAM. Ibdfam.org, 2020. http://www.ibdfam.org.br/conheca-o-ibdfam/historia.
http://www.ibdfam.org.br/conheca-o-ibdfa...
). Trata-se de uma associação civil de utilidade pública, que se articula com círculos acadêmicos, políticos e profissionais, além de se manter próxima da militância social. Dedica-se a temas que dizem respeito aos “novos” direitos de família, como se apreende dos assuntos divulgados em seu site, nas programações de seus eventos e demais atividades. O “direito ao afeto” mobiliza os discursos de seus porta-vozes.

Quando foi julgada a ADPF-132/ADI-4.277, seus eventos alcançavam uma amplitude nacional, o que se percebe pelos locais de realização, origem dos palestrantes convidados, volume de inscritos e, enfim, na grande divulgação dos congressos no próprio campo jurídico. Os livros escritos por seus membros, principalmente por aqueles juristas que funcionavam como seus porta-vozes, circulavam nacionalmente, como se observa nas listas de best-sellers jurídicos divulgadas anualmente pelo mercado editorial. Esse material passou gradativamente a ser mobilizado por advogadas e advogados dispostos a orientar sua atuação por esse mesmo entendimento (Nichnig, 201433 NICHNIG, Claudia Regina. Os conceitos têm história: os usos e a historicidade dos conceitos utilizados em relação à conjugalidade entre pessoas do mesmo sexo no Brasil. Revista Gênero e Direito, v. 1, p. 27-46, 2014., p. 37-38). Isso contribuiu não apenas para divulgar certa compreensão sobre o direito de família, mas também para torná-la dominante, contrapondo correntes jurídicas anteriores sobre determinados assuntos.

À época do julgamento observado, o instituto contava com aproximadamente quinze anos de existência, sendo reconhecido por uma atuação prática particular nos tribunais, que não se esquivava de mobilizar pontos de vista jurídicos ainda não consensuais e mesmo “polêmicos” (Nichnig, 201433 NICHNIG, Claudia Regina. Os conceitos têm história: os usos e a historicidade dos conceitos utilizados em relação à conjugalidade entre pessoas do mesmo sexo no Brasil. Revista Gênero e Direito, v. 1, p. 27-46, 2014.; Caulfield, 201713 CAULFIELD, Sueann. 2017. A dignidade humana, o direito de família e o casamento homoafetivo no Brasil, 1988-2016. Acervo, v. 30, n. 1, p. 179-194, 2017. https://revista.an.gov.br/index.php/revistaacervo/article/view/786.
https://revista.an.gov.br/index.php/revi...
). Além disso, praticava forte ativismo no ensino jurídico, reunindo professores de cursos de direito e programas de pós-graduação em direito reconhecidos. Com isso, seus principais filiados se colocavam em frentes disputadas em diferentes espaços do direito.

Para além das citações recebidas no Supremo, percebemos: (i) a identificação pública entre o instituto e a imagem de seus dirigentes, que funcionam como seus porta-vozes, sobretudo Maria Berenice Dias; (ii) e o esforço desses dirigentes para afirmar suas visões no instante em que se aproximava o julgamento referente a um assunto que dominavam e, mais que isso, sobre o qual articulavam os vocabulários assumidos como “atuais” na área. Apresentavam-se como especialistas no tema, diferenciando-se de juristas tradicionais –acusados pelo grupo de se preocuparem apenas com questões patrimoniais e formais da família, esquecendo-se de suas pluralidades ou dimensões subjetivas.

Essa querela apareceu na imprensa, nas divergências públicas entre Rodrigo da Cunha Pereira, que dizia que o atual “Código Civil brasileiro nascera velho”, e um jurista considerado como o cânone do direito nacional, Miguel Reale, um dos idealizadores deste Código (Wohnrath, 201258 WOHNRATH, Vinicius. Laços de família e expertise jurídica: uma análise da construção do direito dos filhos ao afeto. Dissertação. (Mestrado em Educação) Universidade Estadual de Campinas- UNICAMP. Campinas, 2012., p. 12-15). Mobilizando a oposição entre “velho” e “novo”, Pereira se amparou em argumentos de Álvaro Villaça Azevedo – advogado e professor da Faculdade de Direito da USP, anteriormente alinhado com juristas “tradicionais”, que se deslocou em direção ao polo oposto do debate, sobretudo depois que foi convidado a colaborar com o IBDFAM. Isso sugere que pode existir uma parte ativa no grupo que outrora se alinhava com uma visão mais conservadora de família, mas que progressivamente foi se deslocando em direção ao polo dito mais progressista, isto é, aquele que trata os vínculos entre as pessoas a partir da dimensão do afeto.

Esses movimentos, que implicaram até mesmo contrariar opiniões sustentadas por juristas tradicionais como Reale, somados com alianças com juristas estabelecidos e articulações com militantes sociais, potencializaram o destaque do grupo no mundo do direito. Não é surpresa, portanto, que o IBDFAM tenha atuado como amicus curiae no julgamento das uniões entre pessoas do mesmo sexo, o que representa, dentre outras coisas, uma importante distinção e reconhecimento.

Algumas indicações da distinção alcançada por tais juristas ficaram evidentes no julgamento. O ministro Marco Aurélio afirmou, em seu voto, que “cumpria rememorar [...] a notável lição ministrada pela eminente Desembargadora, hoje Advogada, Maria Berenice Dias, cujas reflexões sobre o tema merecem especial destaque” (STF, 201152 STF, Supremo Tribunal Federal. Supremo reconhece união homoafetiva. Notícias STF. Stf.jus.br, ed. 05/05/2011b. http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=178931.
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoti...
, p. 230-231). Por essa atuação, ela fora homenageada anteriormente com o Prêmio Direitos Humanos, em 2009, na categoria “Direitos da População LGBT”, conferido pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência e entregue pessoalmente pelo presidente Lula (Schiavon, 200946 SCHIAVON, Fabiana. Advogada recebe prêmio por defesa de homoafetivos. Consultor Jurídico, ed. 09/12/2009. https://www.conjur.com.br/2009-dez-09/advogada-recebe-premio-direitos-humanos-defesa-aos-homoafetivos.
https://www.conjur.com.br/2009-dez-09/ad...
).

Todos os especialistas citados mais de uma vez no julgamento eram práticos do direito, além de lotados em universidades nacionalmente bem reputadas, operando como professora e professores de direito (Quadro 2). Esse perfil profissional híbrido é uma marca importante, mas não exclusiva desse grupo. No geral, é uma característica das elites jurídicas brasileiras, como já mostraram outros autores (Almeida, 20101ALMEIDA, Frederico de. A nobreza togada: as elites jurídicas e a política da justiça no Brasil. Tese. (Doutorado em Ciência Política), Universidade de São Paulo, 2010. https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8131/tde-08102010-143600/pt-br.php.
https://www.teses.usp.br/teses/disponive...
; Bento; Engelmann; Penna, 20177 BENTO, Juliana S.; ENGELMANN, Fabiano; PENNA, Luciana. Doutrinadores, políticos e “Direito Administrativo” no Brasil. Política e Sociedade, v. 16, n. 37, p. 286-314, 2017. http://dx.doi.org/10.5007/2175-7984.2017v16n37p286.
https://doi.org/10.5007/2175-7984.2017v1...
; Nobre, 200934 NOBRE, Marcos. Apontamentos sobre a pesquisa em direito no Brasil. FGV Direito. Cadernos Direito GV, n, 39, 2009.).

Quadro 2
Dados biográficos dos doutrinadores citados

Sendo esse um percurso profissional típico, tais juristas se diferenciaram por seus investimentos em “criar ideias” jurídicas, justamente num momento de mudanças mais gerais na concepção sobre o que é família. Nos livros que publicaram, muitos dos quais inicialmente por editoras sem tanta capilaridade no mercado brasileiro, mas fortemente divulgados em círculos acadêmicos, mobilizaram um vocabulário inédito na área (Nichnig, 201433 NICHNIG, Claudia Regina. Os conceitos têm história: os usos e a historicidade dos conceitos utilizados em relação à conjugalidade entre pessoas do mesmo sexo no Brasil. Revista Gênero e Direito, v. 1, p. 27-46, 2014. p. 38). Isso provavelmente contribuiu para que tenham sido lembrados em um julgamento sem precedentes no Supremo, referente a um assunto no qual poucos juristas até então se aventuravam. Soma-se a isso o fato de que já vinham se engajando na discussão sobre uniões entre pessoas do mesmo sexo em sua prática profissional havia pelo menos uma década (Dias, 200319 DIAS, Maria Berenice. Homoafetividade: o que diz a justiça! As pioneiras decisões do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que reconhecem direitos às uniões homossexuais.. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.), o que permitiu que construíssem um conhecimento específico sobre essa questão, ao mesmo tempo que afirmavam sua competência específica, sempre associada a seus nomes, no campo jurídico.

Se uma parte desses juristas atuava como advogado, habilitada, portanto, a promover causas judiciais, provocando respostas do Judiciário em defesa dos interesses de seus clientes, outra parte servia ao poder público (Quadro 2). Maria Berenice Dias e outros membros do IBDFAM, por exemplo, estiveram envolvidos nos primeiros julgamentos sobre o assunto, ocorridos no TJ/RS (Dias, 200319 DIAS, Maria Berenice. Homoafetividade: o que diz a justiça! As pioneiras decisões do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que reconhecem direitos às uniões homossexuais.. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.). Outro ponto comum é a conversão para a advocacia após a aposentadoria no serviço público.

Assim, tudo se passa como se, ligados aos cursos de direito por onde mais circulavam as novas concepções jurídicas, relativamente deslocados do polo mais estabelecido do campo jurídico e garantidos pela estabilidade de suas posições no serviço público, esses juristas pudessem ter encontrado as condições necessárias para propor inovações que seriam impensáveis para outros grupos. Investindo arduamente na divulgação de suas ideias e no convencimento de outros profissionais, inclusive pela atuação em rede, estavam prontos para contribuir com a afirmação de um novo direito quando a conjuntura dos anos 2000 permitiu que se encontrassem no STF uma demanda social substantiva trazida pelos movimentos sociais e uma composição da corte disposta a acolher tais orientações sobre o direito familial.

O caso de Maria Berenice Dias pode ser considerado como exemplar. Como ela rememora em entrevistas, mesmo pertencendo a uma tradicional família do Judiciário gaúcho (com pai e avô desembargadores), sendo a primeira mulher juíza no TJ/RS, enfrentou dificuldades no concurso de seleção e, também, ao longo da carreira de magistrada, inclusive para sua progressão funcional. Para superar esses obstáculos, dirigiu-se ao direito de família, um ramo talvez menos prestigiado que outros.

Seu engajamento pelos direitos da população LGBTQIA+ surgiu em 1995, a partir de um evento acadêmico no qual palestrava, quando, segundo ela, percebeu a ausência de grandes debates jurídicos sobre algumas reivindicações de militantes sociais. Naquele instante, justamente quando o IBDFAM estava sendo projetado, a jurista, que se preparava para converter, após aposentadoria, sua carreira da magistratura para a advocacia, passou a considerar mais fortemente essas demandas na nova atividade profissional. Também passou a escrever materiais sobre o assunto, além de ampliar concepções jurídicas que já vinham sendo elaboradas, cunhando o neologismo “homoafetividade” no livro “União homossexual: o preconceito e a justiça”, título atualizado para “União Homoafetiva...” (González, 201324 GONZÁLEZ, Letícia. Maria Berenice Dias, 65 anos, a primeira juíza do Rio Grande do Sul, mudou a cara do casamento no Brasil. Ela fez o país reconhecer as relações fora do papel, os direitos das mulheres, a primeira união homoafetiva – e quer que as famílias gays parem de ser ignoradas. Revista TPM. https://revistatrip.uol.com.br/tpm/maria-berenice-dias.
https://revistatrip.uol.com.br/tpm/maria...
; Dias, 200319 DIAS, Maria Berenice. Homoafetividade: o que diz a justiça! As pioneiras decisões do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que reconhecem direitos às uniões homossexuais.. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.; 200717 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 4. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007., p. 183).

Apesar de o termo “homoafetividade” ter logrado se impor tanto na academia quanto no Judiciário, dando corpo a doutrinas jurídicas e fundamentando sentenças judiciais, até mesmo pelos ministros do STF, mais recentemente o desembargador federal e professor de direito Roger Raupp Rios (aliado aos dirigentes do IBDFAM, igualmente mencionado na ADPF-132/ADI-4.277), assim como outros juristas tidos como progressistas em matérias comportamentais, vem formulando críticas a como esse conceito foi construído (Nichnig, 201433 NICHNIG, Claudia Regina. Os conceitos têm história: os usos e a historicidade dos conceitos utilizados em relação à conjugalidade entre pessoas do mesmo sexo no Brasil. Revista Gênero e Direito, v. 1, p. 27-46, 2014.). De acordo com Rios (2013, p. 16)38 RIOS, Roger Raupp. As uniões homossexuais e a “família homoafetiva”. O Direito de Família como instrumento de adaptação e conservadorismo ou a possibilidade de sua transformação e inovação. Civilística. v. 2, n. 2, p. 1-21, 2013. https://civilistica.emnuvens.com.br/redc/article/view/101.
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, se, por um lado, o vocábulo é de fácil assimilação, por outro, é “expressão familista que muito dificilmente pode ser apartada de conceitos conservadores e discriminatórios, [...] sem o que a ‘purificação’ da sexualidade reprovada pela heterossexualidade compulsória compromete-se gravemente”.

Essa formulação ocorreu a partir das trocas com outros pesquisadores e pesquisadoras, em particular da área da antropologia, além de psicanalistas, os quais alertaram que estabelecer um modelo jurídico de convivência a partir do afeto, ou seja, um elemento extremamente subjetivo, poderia criar uma barreira para a plena realização de direitos (Nichnig, 201433 NICHNIG, Claudia Regina. Os conceitos têm história: os usos e a historicidade dos conceitos utilizados em relação à conjugalidade entre pessoas do mesmo sexo no Brasil. Revista Gênero e Direito, v. 1, p. 27-46, 2014.). Em suma, mesmo gerando equidade de direitos, conforme a crítica acadêmica, o uso indiscriminado do termo poderia representar também “sérios prejuízos aos direitos sexuais e à valorização da diversidade sexual” (Rios, 201338 RIOS, Roger Raupp. As uniões homossexuais e a “família homoafetiva”. O Direito de Família como instrumento de adaptação e conservadorismo ou a possibilidade de sua transformação e inovação. Civilística. v. 2, n. 2, p. 1-21, 2013. https://civilistica.emnuvens.com.br/redc/article/view/101.
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, p. 16).

No geral, os juristas citados pelos ministros do STF investem fortemente na vida acadêmica, inclusive ocupando postos de autoridade universitária em centros renomados nas últimas décadas.8 8 Exemplos colhidos no Lattes: Tepedino dirigiu a FD/UERJ. Calmon coordenou a pós-graduação da FD/UERJ. Sarlet coordenou a pós-graduação da FD/PUC-RS. Fachin dirigiu a FD/UFPR, candidatou-se à reitor da UFPR e coordenou a Área do Direito/CAPES. Por outro lado, com algumas exceções, percebemos que seus locais de formação e docência diferem dos centros formadores dos bacharéis que em outros momentos históricos alcançaram administrar a justiça brasileira, particularmente a Faculdade de Direito da USP (Almeida, 20101ALMEIDA, Frederico de. A nobreza togada: as elites jurídicas e a política da justiça no Brasil. Tese. (Doutorado em Ciência Política), Universidade de São Paulo, 2010. https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8131/tde-08102010-143600/pt-br.php.
https://www.teses.usp.br/teses/disponive...
). Seus currículos Lattes também revelam expressiva atuação na orientação, publicações e participações em bancas. Ao menos seis deles atingiram o nível máximo da carreira acadêmica. Isso nos permite pensar na coincidência entre seus perfis e aqueles encontrados por Engelmann (2006)20 ENGELMANN, Fabiano. Sociologia do campo jurídico: juristas e usos do direito. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006. para os juristas que se destacaram na promoção da diversificação do campo jurídico nacional. Beneficiando-se da expansão do ensino jurídico, ocuparam novos postos de trabalho disponíveis em universidades, onde puderam se dedicar aos problemas jurídicos que emergiram com a democracia. Essa atividade foi acumulada com a advocacia ou carreiras acessadas por concursos públicos. Notavelmente, não ocuparam postos dependentes de indicações políticas (assessorias parlamentares, secretarias e ministérios) nem ingressaram em disputas eleitorais, uma marca característica dos percursos dos bacharéis tradicionais.

É importante lembrar que Fachin não era ministro quando seus livros foram referenciados em 2011. Foi indicado para o STF anos mais tarde, por Dilma Rousseff, sucedendo Joaquim Barbosa. Naquele momento, já doutor pela Faculdade de Direito da PUC-SP, ligado a movimentos sociais (fato que gerou resistências quando sabatinado no Senado), suas atividades profissionais estavam concentradas na Faculdade de Direito da UFPR e na advocacia liberal, após passagens pela procuradoria estadual do Paraná e do INCRA. Esta posição permitiu que fosse expositor externo na última Constituinte, na Subcomissão de Reforma Agrária, onde adotou discurso mediador entre forças políticas em disputa (Wohnrath, 201757 WOHNRATH, Vinicius. Constituindo a Nova República: agentes católicos na Assembleia Nacional 1987-88. Tese. (Doutorado em Educação), Universidade Estadual de Campinas-. UNICAMP, Campinas, 2017., p. 256-257). Pode-se considerar, assim, que se tratava de um agente experimentado no mundo do direito, envolvido com disputas acadêmicas e tangenciando o universo da política.

Finalmente, no conjunto de especialistas examinados, principalmente quanto aos modos como construíram suas carreiras, destacamos duas exceções. A primeira é Álvaro Villaça Azevedo que, como mencionado, pertence a uma geração anterior. De maior aproximação com os tradicionais bacharéis em direito, deslocou-se progressivamente em direção aos entendimentos que podem ser considerados como mais progressistas na área do direito de família. Professor de Direito Civil, foi diretor da Faculdade de Direito da USP e do Mackenzie. Advogado de renome, presidiu a Comissão de Estudos em Direito de Família, do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP), importante associação classista. Ligado a políticos profissionais, foi assessor jurídico de um deputado federal. Ainda no mundo da política, desde os anos 1970 vinha sendo nomeado para participar, como especialista, de comissões de estudos sobre o anteprojeto de código civil (Azevedo, 20173 AZEVEDO, Álvaro V. Entrevista com o Prof. Álvaro Villaça Azevedo. Fabiana Lopes Pinto. Programa Código de Honra IASP-TJ/SP, 2017. https://www.youtube.com/watch?v=CxrZ9q1a-NI.
https://www.youtube.com/watch?v=CxrZ9q1a...
). Nome central no direito familial brasileiro, foi autor pioneiro no tema das uniões estáveis – figura jurídica reconhecida apenas com a Constituição de 1988, paralelamente ao casamento. Sobre tal assunto, suas obras balizaram a normatização do assunto, além das decisões judiciais que surgiram na sequência (Wohnrath, 201258 WOHNRATH, Vinicius. Laços de família e expertise jurídica: uma análise da construção do direito dos filhos ao afeto. Dissertação. (Mestrado em Educação) Universidade Estadual de Campinas- UNICAMP. Campinas, 2012. p. 15). Assim, não foi surpresa vê-lo listado pelos ministros do STF como referência acadêmica. Fora isso, em algum momento de sua trajetória, mais recentemente, aproximou-se do grupo do IBDFAM – na qualidade de consultor e sócio honorário.

A segunda exceção é José Afonso da Silva. Sequer encontramos indícios de que esse jurista fosse alinhado ao IBDFAM. Também pertencendo a uma geração anterior, foi professor titular de Direito Constitucional na Faculdade de Direito da USP, procurador do Estado e secretário de governo em São Paulo. Sendo um jurista-chave na Constituinte, assessorando congressistas centrais, sobretudo uma liderança partidária, afirmou-se como grande autoridade, espécie de nome incontornável quando se fala em direitos fundamentais no Brasil contemporâneo. Sua importância nesse julgamento deriva do fato de que os ministros se esforçaram para afirmar a competência do Supremo para dizer o direito válido apoiados pela visão preponderante do novo constitucionalismo, o que pode ter encontrado amparo em argumentos de José Afonso. Por fim, suas opiniões sobre as garantias fundamentais podem ter servido para justificar a sentença de modo praticamente incontestável no campo jurídico.

Considerações finais

As divergências históricas sobre a possibilidade de tratar oficialmente a união entre pessoas do mesmo sexo como família reforçam ao menos duas questões, aqui mais evidentes. A primeira é sobre como o problema pôde ser mobilizado num espaço de poder central da República, a cúpula judicial, mesmo diante das resistências de setores dominantes na sociedade, como as igrejas. Já a segunda é como essa questão teve sucesso no STF e não em outros lugares do Estado, sobretudo no Congresso, ocupado pelos eleitos democraticamente para legislar.

Neste artigo, examinamos algumas das condições para que isso tenha podido ocorrer tratadas pela literatura, avançando na hipótese de que um grupo de renovadores do direito de família pouco a pouco obteve voz na área, chegando a ser ouvido pela cúpula judicial. Identificados esses especialistas, notamos que eles nucleavam uma rede, articulada formalmente num instituto que vinha se destacando nacionalmente desde finais dos anos 1990, além de funcionarem concomitantemente como docentes de direito – produzindo trabalhos acadêmicos e orientando estudantes – e servidores públicos ou advogados liberais. Mostramos, assim, que esses especialistas foram favorecidos pela concentração de diferentes tipos de recursos que conseguiram reunir, num momento de diversificação do campo jurídico e criação de mecanismos, possibilitando que novas interpretações atingissem e fossem acolhidas pelo Supremo Tribunal Federal.

Não pensamos numa justaposição de eventos ou ações isoladas, mas nos arranjos. Assim, acreditamos, o assunto foi posto em marcha naquele local e momento quando também manifestada a vontade de agentes-chave, dentre os quais os fornecedores de parte das “cartas” que permitiram que o “jogo fosse jogado”. Estes agentes escreveram o que a área reconhece como doutrina jurídica, traduzida como os arrazoados dos especialistas em direito sobre determinado problema jurídico. Cruzados entre si, e com outros fatores, os argumentos provindos dessa literatura compuseram um dos elementos que possibilitaram aos ministros decidirem da maneira como decidiram naquele momento específico, promovendo uma mudança significativa de entendimento com relação a um tema que, dado o silêncio da lei, parecia cristalizado no direito.

  • 1
    Constituição Federal de 1988 (Art. 93, IX) e Código de Processo Civil de 2015 (Art. 489, II; §1º, I a VI).
  • 2
    Apenas o ministro Dias Toffoli não participou do julgamento. Declarou-se suspeito, pois tinha opinado favoravelmente ao pedido como Advogado Geral da União.
  • 3
    Recurso Especial 1.183.348, de 25/10/2011.
  • 4
    Resolução 175, de 14/05/2013.
  • 5
    Buzolin (2019, p. 151-156)12 BUZOLIN, Lívia G. Direito homoafetivo. Criação e discussão nos poderes Judiciário e Legislativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019. também identificou, nos documentos do STF, os doutrinadores mobilizados nesse julgamento.
  • 6
    Fonte: STF, Jurisprudência. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/>.
  • 7
    Essa terminologia aparece, inclusive, nas obras incorporadas pela decisão do STF e no próprio acórdão elaborado pelos ministros.
  • 8
    Exemplos colhidos no Lattes: Tepedino dirigiu a FD/UERJ. Calmon coordenou a pós-graduação da FD/UERJ. Sarlet coordenou a pós-graduação da FD/PUC-RS. Fachin dirigiu a FD/UFPR, candidatou-se à reitor da UFPR e coordenou a Área do Direito/CAPES.
  • Proc. FAPESP 2017/18251-0 – Bolsa Pós-doutorado.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    24 Maio 2022
  • Aceito
    28 Ago 2023
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