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Faces da bifobia dentro (e fora) da comunidade LGBTQIAP+: reflexões a partir de narrativas de pessoas bissexuais

Faces of biphobia inside (and outside) the LGBTQIAP+ community: reflections from bisexual people's narratives

Rostros de bifobia dentro (y fuera) de la comunidad LGBTQIAP+: reflexiones desde las narrativas de personas bisexuales

Resumo:

O objetivo do presente artigo é investigar as diferentes manifestações da bifobia, sobretudo no interior da comunidade LGBTQIAP+. Para tanto, foi realizada pesquisa com seis pessoas bissexuais, cujos relatos foram submetidos à análise de conteúdo. Os resultados apontam que a bifobia se manifesta em aspectos como a hipersexualização de bissexuais e a pressão para que escolham uma orientação sexual “definitiva”. Argumentamos que pessoas bissexuais enfrentam dificuldades para inserir-se na comunidade LGBTQIAP+, já que suas práticas afetivo/sexuais são consideradas pouco legítimas e suas experiências tendem a ser invalidadas. Esse contexto de exclusão agrava sentimentos como solidão e confusão identitária. Dessa forma, pessoas bissexuais estão sujeitas a uma dinâmica particular de violência que produz efeitos relevantes à sua saúde mental.

Palavras-chave:
bissexualidade; bifobia; monodissidência; LGBTQIAP+; diversidade sexual.

Abstract:

The aim of this article is to investigate the different manifestations of biphobia, especially within the LGBTQIAP+ community. For this purpose, a survey was carried out with six bisexual people, whose reports were submitted to content analysis. The results show that biphobia manifests itself in aspects such as the hypersexualization of bisexuals and the pressure to choose a “definitive” sexual orientation. We argue that bisexual people face difficulties to be embraced by the LGBTQIAP+ community, as their affective/sexual practices are considered illegitimate and their experiences tend to be invalidated. This context of exclusion aggravates feelings such as loneliness and identity confusion. Thus, the bisexual people face a particular dynamic of violence that produces relevant effects on their mental health.

Keywords:
bisexuality; biphobia; monodissidence; LGBTQIAP+; sexual diversity

Resumen:

El objetivo de este artículo es investigar las diferentes manifestaciones de la bifobia, especialmente dentro de la comunidad LGBTQIAP+. Para eso, se realizó una investigación con seis personas bisexuales, cuyos relatos fueron sometidos a análisis de contenido. Los resultados muestran que la bifobia se manifiesta en aspectos como la hipersexualización de los bisexuales y la presión para elegir una orientación sexual “definitiva”. Argumentamos que las personas bisexuales enfrentan dificultades para ingresar a la comunidad LGBTQIAP+, ya que sus prácticas afectivo/sexuales son consideradas poco legítimas y sus vivencias tienden a ser invalidadas. Este contexto de exclusión agrava sentimientos como la soledad y la confusión de identidad. Así, la población bisexual y las personas bisexuales están sujetas a una particular dinámica de violencia que produce efectos relevantes en su salud mental.

Palabras clave:
bisexualidad; bifobia; monodisidencia; LGBTQIAP+; diversidad sexual

Introdução

As orientações sexuais, tal como são concebidas hoje, são modos de viver por meio dos quais tentamos tornar inteligíveis alguns comportamentos, gostos, desejos (Simões; Facchini, 2009SIMÕES, Julio Assis; FACCHINI, Regina. 2009. Na trilha do arco-íris: Do movimento homossexual ao LGBT. 1ª ed. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo. ). Hegemonicamente, a compreensão das diferentes sexualidades é pautada em uma lógica que vincula sexo biológico, gênero e desejo, a partir de relações de oposição entre as categorias binárias feminino-masculino, homem-mulher, heterossexual-homossexual (Butler, 2018BUTLER, Judith. 2018. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. 16ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. ). A partir dessa estrutura de inteligibilidade, a norma heterossexual busca garantir que as relações afetivo-sexuais dos indivíduos estejam baseadas em performances e papéis de gênero binários.

Nesse contexto, formas de existência dissidentes em face de tais classificações dicotômicas são marginalizadas. Sob o jugo da heteronormatividade1 1 “Por heteronormatividade entendemos aquelas instituições, estruturas de compreensão e orientações práticas que não apenas fazem com que a heterossexualidade pareça coerente - ou seja, organizada como sexualidade - mas também que seja privilegiada. Sua coerência é sempre provisional e seu privilégio pode adotar várias formas (que às vezes são contraditórias): passa desapercebida como linguagem básica sobre aspectos sociais e pessoais; é percebida como um estado natural; também se projeta como um objetivo ideal ou moral” (Berlant; Warner, 2002, p. 230). , os grupos que compõem a comunidade LGBTQIAP+2 2 Comunidade LGBTQIAP+ é o termo utilizado para agregar diferentes sexualidades e identidades de gênero divergentes da norma heterossexual e cisgênera. A sigla LGBTQIAP+ se refere a lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, queer, intersexos, assexuais, pansexuais e demais identidades, e busca destacar a amplitude que a comunidade assume nos dias de hoje e promover a visibilidade dos grupos que a compõem. enfrentam diversas formas de violência, entre eles, pessoas bissexuais. Estas estão sujeitas à discriminação de uma maneira particular, e nem sempre encontram ressonância de suas demandas no interior do movimento pela diversidade sexual e de gênero.

A Revolta de Stonewall, em 1969, foi o marco de origem do movimento LGBTQIAP+ no Ocidente e, desde então, pessoas bissexuais já assumiam posições centrais na sua construção. Marsha P. Johnson e Sylvia Rivera foram pessoas transgêneras, bissexuais e não brancas que, após os eventos de Stonewall, dedicaram-se à luta pelos direitos de pessoas de sexualidade e gênero dissidentes e criticaram ferreamente os contornos do movimento da época, majoritariamente branco, cisgênero, de classe média, construído em favor de homens gays, mas não somente por eles. Entre outros nomes, podemos citar Brenda Howard, que criou, em 1970, a Christopher Street Liberation Day Parade, que ficaria conhecida como a primeira Parada do Orgulho LGBTQIAP+. Ao lado de Donny The Punk, outro militante bissexual, Howard idealizou o chamado Mês do Orgulho, comemorado em junho até os dias de hoje (Vas, 2020). Apesar das contribuições de pessoas bissexuais nas lutas pela diversidade sexual e de gênero, a bissexualidade ainda hoje é vista com desconfiança pela comunidade LGBTQIAP+, acusada de ameaçar a integridade do movimento em virtude de sua suposta aproximação com a heterossexualidade (Jaeger, 2018JAEGER, Melissa Bittencourt. 2018. Experiência de minas bissexuais: Políticas identitárias e processos de marginalização. Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina. ; Caproni Neto, 2017CAPRONI NETO, Henrique Luiz. (08.11.2017). “A bissexualidade (des)organizada: desenhos, estigmas e subversões” [on-line]. Anais do XX SemeAd (Minas Gerais/ UFMG). ISSN 2177-3866, p. 1-16. Disponível em: Disponível em: https://login.semead.com.br/20semead/anais/resumo.php?cod_trabalho=1756 [Acessado em: 23.02.21].
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).

Apesar do radical “bi” sugerir uma designação binária - em função do controverso processo sócio-histórico de criação da nomenclatura (Lewis, 2012aLEWIS, Elizabeth Sara. 2012a. “Não é uma fase”: Construções identitárias em narrativas de ativistas LGBT que se identificam como bissexuais. Dissertação de mestrado, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.), atualmente a bissexualidade não é mais descrita como atração por dois gêneros (homem e mulher), pois entende-se que o desejo bissexual se estende a diferentes identidades de gênero, para além de classificações binárias. Nesse sentido, algumas possibilidades de definição são apresentadas por Vas (2020)VAS, Dani. 2021. Militância enquanto convite ao diálogo: o caso da militância monodissidente. Dissertação de mestrado, Universidade de São Paulo., como atração por todos os gêneros, atração pelo mesmo gênero e outros e - a mais aceita entre os grupos brasileiros de militância bissexual - atração por mais de um gênero. Além de sua definição não ser produto de consensos, a bissexualidade, como bem discute Souza (2021SOUZA, Jamilie Santos de. 2021. Tecendo identidades nas fronteiras: o vestir em narrativas de mulheres bissexuais. Dissertação de mestrado, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. ), carece de símbolos estereótipos que constituam uma cultura coletiva e contribuam para o seu reconhecimento visual.

Sob esta perspectiva, o presente trabalho adotará a partir de agora o termo “bissexualidades” para se referir a essa orientação sexual, como compromisso político-epistêmico com a pluralidade de sujeitos e práticas que ela abrange. O caráter heterogêneo e fluido das bissexualidades tem se mostrado um desafio ao estudo e à compreensão da subjetividade e da sexualidade humanas ao longo dos séculos, na medida em que não se encaixa na noção de identidade rígida, imutável e na dicotomia homo/heterossexual e de gênero (Lewis, 2012aLEWIS, Elizabeth Sara. 2012a. “Não é uma fase”: Construções identitárias em narrativas de ativistas LGBT que se identificam como bissexuais. Dissertação de mestrado, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.; Monro; Hines; Osborne, 2017MONRO, S.; HINES, S.; OSBORNE, A. (01.02.2017). “Is bisexuality invisible? A review of sexualities scholarship 1970-2015”. The Sociological Review. Vol. 4, nº 65, p. 663-681. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0038026117695488. [Acessado em: 21.11.2021].
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; Jaeger, 2018JAEGER, Melissa Bittencourt. 2018. Experiência de minas bissexuais: Políticas identitárias e processos de marginalização. Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina. ). Por provocarem certa instabilidade à concepção tradicional de sexualidade e transmitirem uma suposta ambiguidade (Lewis, 2012a), as bissexualidades têm sido permeadas por mitos e preconceitos (Seemanthini; Cavale, 2018SEEMANTHINI, T.S.; CAVALE, J. 2018. “Biphobia and bierasure: Deconstructing the issues of bisexual men and women in India”. International Journal of Current Research and Academic Review. Edição especial-5, p. 133-138. ), sofrendo marginalização em relação a outras sexualidades (Monro; Hines; Osborne, 2017MONRO, S.; HINES, S.; OSBORNE, A. (01.02.2017). “Is bisexuality invisible? A review of sexualities scholarship 1970-2015”. The Sociological Review. Vol. 4, nº 65, p. 663-681. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0038026117695488. [Acessado em: 21.11.2021].
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) e recorrente invalidação enquanto uma orientação sexual real (van Lisdonk e Keuzenkomp, 2016VAN LISDONK, J.; KEUZENKAMP, S. (18.07.2016). “Towards bi-inclusive policies: Suggestions based on research on dutch same-sex attracted young people” [on-line]. Sexuality research & social policy: journal of NSRC. Vol. 14, nº 2, p. 206-222. Disponível em: https://doi.org/10.1007/s13178-016-0241-1. [Acessado em: 14.06.2021].
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). Dessa forma, alguns autores (Monro et al., 2017MONRO, S.; HINES, S.; OSBORNE, A. (01.02.2017). “Is bisexuality invisible? A review of sexualities scholarship 1970-2015”. The Sociological Review. Vol. 4, nº 65, p. 663-681. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0038026117695488. [Acessado em: 21.11.2021].
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; Jaeger; Longhini; Oliveira; Toneli, 2019JAEGER, Melissa Bittencourt et al. (29.11.2019). “Bissexualidade, bifobia e monossexismo: problematizando enquadramentos” [on-line]. Periódicus. Vol. 2, nº 11, p. 01-16. Disponível em: https://doi.org/10.9771/peri.v2i11.28011. [Acessado em: 04.12.2021].
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; Yoshino, 2000KENJI, Yoshino. (01.01.2000). The Epistemic Contract of Bisexual Erasure. Stanford Law Review. Vol. 52, nº 2, p. 353. Disponível em: Disponível em: https://www.ilga-europe.org/sites/default/files/yoshino_2000_the_epistemic_contract_of_bisecsual_erasure.pdf . [Acessado em: 12.11.2021].
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) sugerem a possibilidade de monossexuais (pessoas que se atraem por apenas um gênero, ou seja, homossexuais e heterossexuais) terem interesse em preservar o caráter binário das categorias sexuais e de gênero como base ontológica para as relações, exercendo, com este fim, o apagamento das bissexualidades.

Nesse sentido, Yoshino (2000)KENJI, Yoshino. (01.01.2000). The Epistemic Contract of Bisexual Erasure. Stanford Law Review. Vol. 52, nº 2, p. 353. Disponível em: Disponível em: https://www.ilga-europe.org/sites/default/files/yoshino_2000_the_epistemic_contract_of_bisecsual_erasure.pdf . [Acessado em: 12.11.2021].
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, em sua teoria do contrato epistêmico do apagamento bissexual, descreve três esferas de invisibilidade enfrentadas pela sexualidade, sendo a primeira delas o tabu sobre qualquer tipo de sexualidade; a segunda, aquela que afeta práticas não heterossexuais (como a homossexualidade, a bissexualidade etc.); e a terceira a que é utilizada por monossexuais a fim de manter o binário heterossexual/homossexual como duas categorias essencialmente antagônicas, de maneira que apenas a bissexualidade seja afetada pelas três formas de invisibilidade. Nesse sentido, Jaeger et al. (2019JAEGER, Melissa Bittencourt et al. (29.11.2019). “Bissexualidade, bifobia e monossexismo: problematizando enquadramentos” [on-line]. Periódicus. Vol. 2, nº 11, p. 01-16. Disponível em: https://doi.org/10.9771/peri.v2i11.28011. [Acessado em: 04.12.2021].
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) descrevem o monossexismo como a estrutura social que garante legitimidade apenas às orientações sexuais cujo desejo é dirigido a apenas um gênero. Em contrapartida, pessoas não monossexuais (Jaeger, 2018JAEGER, Melissa Bittencourt. 2018. Experiência de minas bissexuais: Políticas identitárias e processos de marginalização. Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina. ), ou monodissidentes (Vas, 2021VAS, Dani. 2021. Militância enquanto convite ao diálogo: o caso da militância monodissidente. Dissertação de mestrado, Universidade de São Paulo.), são aquelas que têm seu desejo e/ou afeto direcionado a mais de um gênero, entre as quais se podem citar: pansexuais, polissexuais e bissexuais.

Assim, a bifobia é a discriminação vivida por bissexuais tanto da parte de pessoas homossexuais quanto de pessoas heterossexuais (Lewis, 2012LEWIS Elizabeth Sara. (14.02.2012) “‘Eu quero meu direito como bissexual’: A marginalização discursiva da diversidade sexual dentro do movimento LGBT e propostas para fomentar a sua aceitação” [on-line]. Anais do Simpósio Nacional Discurso, Identidade e Sociedade (III Sidis). ISBN 978-85-62641-06-0. Disponível em: Disponível em: https://www.iel.unicamp.br/sidis/anais/pdf/LEWIS_ELIZABETH_ SARA.pdf [Acessado em: 17.02.2021].
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), e resulta do contrato epistêmico (Yoshino, 2000KENJI, Yoshino. (01.01.2000). The Epistemic Contract of Bisexual Erasure. Stanford Law Review. Vol. 52, nº 2, p. 353. Disponível em: Disponível em: https://www.ilga-europe.org/sites/default/files/yoshino_2000_the_epistemic_contract_of_bisecsual_erasure.pdf . [Acessado em: 12.11.2021].
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) que busca garantir a legitimidade das categorias monossexuais a partir da delimitação clara de suas fronteiras, negando suas permeabilidades e considerando como ameaça toda performance que tangencie a ambiguidade (Jaeger; Longhini; Oliveira; Toneli, 2019JAEGER, Melissa Bittencourt et al. (29.11.2019). “Bissexualidade, bifobia e monossexismo: problematizando enquadramentos” [on-line]. Periódicus. Vol. 2, nº 11, p. 01-16. Disponível em: https://doi.org/10.9771/peri.v2i11.28011. [Acessado em: 04.12.2021].
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). Dentre os preconceitos associados às bissexualidades é possível citar a promiscuidade, a tendência à infidelidade, a hipersexualização de pessoas bissexuais (Seemanthini; Cavale, 2018SEEMANTHINI, T.S.; CAVALE, J. 2018. “Biphobia and bierasure: Deconstructing the issues of bisexual men and women in India”. International Journal of Current Research and Academic Review. Edição especial-5, p. 133-138. ) e a ideia de que a bissexualidade é apenas uma fase de experimentação sexual, o que a deslegitima enquanto orientação sexual real (Lewis, 2012) e gera uma pressão para que os sujeitos assim identificados assumam uma orientação sexual definitiva (van Lisdonk; Keuzenkomp, 2016VAN LISDONK, J.; KEUZENKAMP, S. (18.07.2016). “Towards bi-inclusive policies: Suggestions based on research on dutch same-sex attracted young people” [on-line]. Sexuality research & social policy: journal of NSRC. Vol. 14, nº 2, p. 206-222. Disponível em: https://doi.org/10.1007/s13178-016-0241-1. [Acessado em: 14.06.2021].
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; Monro; Hines; Osborne, 2017MONRO, S.; HINES, S.; OSBORNE, A. (01.02.2017). “Is bisexuality invisible? A review of sexualities scholarship 1970-2015”. The Sociological Review. Vol. 4, nº 65, p. 663-681. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0038026117695488. [Acessado em: 21.11.2021].
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).

É importante destacar que, por se constituir através de uma forma complexa de discriminação, a bifobia assume diferentes formatos que guardam propósitos em comum, como, por exemplo, uma forma de reação à ruptura com a matriz binária das sexualidades que a bissexualidade promove (Lewis, 2012LEWIS Elizabeth Sara. (14.02.2012) “‘Eu quero meu direito como bissexual’: A marginalização discursiva da diversidade sexual dentro do movimento LGBT e propostas para fomentar a sua aceitação” [on-line]. Anais do Simpósio Nacional Discurso, Identidade e Sociedade (III Sidis). ISBN 978-85-62641-06-0. Disponível em: Disponível em: https://www.iel.unicamp.br/sidis/anais/pdf/LEWIS_ELIZABETH_ SARA.pdf [Acessado em: 17.02.2021].
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). Por ser percebida, equivocadamente, como uma combinação da hétero e da homossexualidade, as bissexualidades são comumente consideradas uma ameaça à coerência da identidade e do movimento homossexuais e, por isso, pessoas bissexuais muitas vezes se veem marginalizadas dentro da comunidade LGBTQIAP+ (Lewis, 2012LEWIS Elizabeth Sara. (14.02.2012) “‘Eu quero meu direito como bissexual’: A marginalização discursiva da diversidade sexual dentro do movimento LGBT e propostas para fomentar a sua aceitação” [on-line]. Anais do Simpósio Nacional Discurso, Identidade e Sociedade (III Sidis). ISBN 978-85-62641-06-0. Disponível em: Disponível em: https://www.iel.unicamp.br/sidis/anais/pdf/LEWIS_ELIZABETH_ SARA.pdf [Acessado em: 17.02.2021].
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; Caproni Neto, 2017CAPRONI NETO, Henrique Luiz. (08.11.2017). “A bissexualidade (des)organizada: desenhos, estigmas e subversões” [on-line]. Anais do XX SemeAd (Minas Gerais/ UFMG). ISSN 2177-3866, p. 1-16. Disponível em: Disponível em: https://login.semead.com.br/20semead/anais/resumo.php?cod_trabalho=1756 [Acessado em: 23.02.21].
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). Segundo Van Lisdonk e Keuzenkomp (2016)VAN LISDONK, J.; KEUZENKAMP, S. (18.07.2016). “Towards bi-inclusive policies: Suggestions based on research on dutch same-sex attracted young people” [on-line]. Sexuality research & social policy: journal of NSRC. Vol. 14, nº 2, p. 206-222. Disponível em: https://doi.org/10.1007/s13178-016-0241-1. [Acessado em: 14.06.2021].
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, muitas pessoas bissexuais admitem ter dificuldade em assumir sua sexualidade entre gays e lésbicas e afirmam que seria mais fácil ajustar-se à heterossexualidade, ou ainda, assumir-se homossexual do que sustentar uma identidade bissexual (Gómez; Arenas, 2019GÓMEZ, J. P. P.; ARENAS, Y. (30.05.2019). “Development of Bisexual Identity” [on-line]. Revista Ciência e Saúde Coletiva. Vol. 24, nº 5, p. 1669-1678. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/VPxGFPV9CLHDtnDNMwBKr4w/?lang=en . [Acessado em: 20.02.2021].
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).

Pelo duplo contexto de apagamento, no qual pessoas bissexuais são atravessadas pela negação de sua existência (Jaeger, 2018JAEGER, Melissa Bittencourt. 2018. Experiência de minas bissexuais: Políticas identitárias e processos de marginalização. Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina. ) e pela dificuldade em serem reconhecidas como bissexuais em contextos sociais (Souza, 2021SOUZA, Jamilie Santos de. 2021. Tecendo identidades nas fronteiras: o vestir em narrativas de mulheres bissexuais. Dissertação de mestrado, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. ), o processo de construção de suas identidades tende a ser permeado por sentimentos como solidão e confusão (Mônaco, 2020MÔNACO, Helena Motta. 2020. “A gente existe!”: ativismo e narrativas bissexuais em um coletivo monodissidente. Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina. ), vulnerabilidade, insegurança, arrependimento, frustração e pelo prejuízo à qualidade de vida, à autoimagem e às relações interpessoais dos indivíduos (Gómez; Arenas, 2019GÓMEZ, J. P. P.; ARENAS, Y. (30.05.2019). “Development of Bisexual Identity” [on-line]. Revista Ciência e Saúde Coletiva. Vol. 24, nº 5, p. 1669-1678. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/VPxGFPV9CLHDtnDNMwBKr4w/?lang=en . [Acessado em: 20.02.2021].
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). Percebemos a bifobia como uma violência silenciosa, inserida em diferentes contextos e com repercussões significativas na vida daqueles que a enfrentam diariamente.

A partir desta perspectiva, este estudo buscou investigar distintas manifestações da bifobia, sobretudo no interior da comunidade LGBTQIAP+, de modo a conhecer os possíveis impactos desses processos de violências na vida de pessoas bissexuais.

Metodologia

A entrevista narrativa foi escolhida como via para a condução desta pesquisa. A narrativa de experiência pessoal envolve a produção de histórias a partir de um tema central (Paiva, 2008PAIVA, Vera Lúcia Menezes de Oliveira e. (01.01.2008). “A pesquisa narrativa: Uma introdução” [on-line]. Revista Brasileira de Linguística Aplicada. Vol. 8, nº 2, p. 261-266. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbla/a/ gPC5BsmLqFS7rdRWmSrDc3q/?format=pdf⟨=pt . [Acessado em: 08.10.2021].
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), fornecendo um panorama do fenômeno estudado segundo o ponto de vista dos interlocutores (Muylaert; Sarubbi J.; Gallo; Rolim Neto; Reis, 2014MUYLAERT, Camila Junqueira et al. 2014. “Entrevistas narrativas: Um importante recurso em pesquisa qualitativa” [on-line]. Revista Escola de Enfermagem da USP. Vol. 48, nº esp. 2., p. 193-199. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.br/j/reeusp/a/NyXVhmXbg96xZNPWt9vQYCt/?format=pdf⟨=pt . [Acessado em: 20.11.2021].
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). Sob este enfoque metodológico, os relatos carregam relevância emocional e social (Paiva, 2008PAIVA, Vera Lúcia Menezes de Oliveira e. (01.01.2008). “A pesquisa narrativa: Uma introdução” [on-line]. Revista Brasileira de Linguística Aplicada. Vol. 8, nº 2, p. 261-266. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbla/a/ gPC5BsmLqFS7rdRWmSrDc3q/?format=pdf⟨=pt . [Acessado em: 08.10.2021].
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) e favorecem a compreensão e a organização da realidade social, construindo-a historicamente (Muylaert et al., 2014MUYLAERT, Camila Junqueira et al. 2014. “Entrevistas narrativas: Um importante recurso em pesquisa qualitativa” [on-line]. Revista Escola de Enfermagem da USP. Vol. 48, nº esp. 2., p. 193-199. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.br/j/reeusp/a/NyXVhmXbg96xZNPWt9vQYCt/?format=pdf⟨=pt . [Acessado em: 20.11.2021].
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).

A construção dessa pesquisa se deu, como muitas outras, durante a pandemia de Covid-19 que tem assolado o mundo desde 2019. Em meio à impossibilidade de encontros presenciais para a realização de entrevistas, o recurso de videochamadas foi a alternativa escolhida para acessar as/os participantes em contextos de distanciamento social. Dessa maneira, o presente estudo caracteriza-se como pesquisa on-line, uma vez que utiliza a internet como instrumento metodológico (Flick, 2013FLICK, Uwe. 2013. “Pesquisa on-line: realização de pesquisa social on-line”. In: FLICK, U. Introdução à metodologia de pesquisa: Um guia para iniciantes. 1ª ed. Porto Alegre: Penso.). Apesar de possibilitar a execução de estudos que de outra forma seriam inviabilizados, a pesquisa on-line exige que as partes envolvidas tenham habilidades e recursos técnicos necessários para garantir este tipo de comunicação (como conexão de internet, webcam, computador ou celular etc.), o que limita o perfil de pessoas por nós alcançado.

Contribuíram com a pesquisa seis pessoas bissexuais, residentes na região metropolitana de Belém-PA, que se reconhecem como integrantes da comunidade LGBTQIAP+ (seja através das redes sociais, coletivos, e/ou círculos sociais). As/os voluntárias/os foram convidadas/os a participar do estudo por meio de publicações em redes sociais (Twitter e Instagram). A fim de preservar a identidade das/os participantes do estudo, seus nomes foram substituídos. Na tabela abaixo, estão organizadas as informações referentes a cada participante, de forma a melhor caracterizá-los. Destacamos que as categorias raça/etnia e renda foram preenchidas conforme autoidentificação das/dos participantes, que se classificaram como brancos, negros, pardos, e no que tange à renda, como baixa, média e média-alta. Ademais, a opção de discriminar as modalidades de relacionamento das/os entrevistadas/os entre monogâmica e não monogâmica foi um esforço para evidenciar a pluralidade de vivências afetivo/sexuais de pessoas bissexuais.

Como pode ser observado, o grupo de participantes é composto por duas mulheres cisgêneras, dois homens cisgêneros e duas pessoas transexuais não binárias. Além disso, foi unânime a participação de estudantes universitários, fato provavelmente explicado pela predominância deste público nas redes sociais das pessoas responsáveis pela divulgação da pesquisa. Como sinalizado por Flick (2013FLICK, Uwe. 2013. “Pesquisa on-line: realização de pesquisa social on-line”. In: FLICK, U. Introdução à metodologia de pesquisa: Um guia para iniciantes. 1ª ed. Porto Alegre: Penso.), o público alcançado pela pesquisa on-line tende a ser composto por pessoas jovens e de maior nível educacional, uma vez que este é o principal perfil de usuários/as da internet. No caso do presente estudo, isto não se revela um obstáculo, uma vez que o propósito da investigação é conhecer diferentes formas de bifobia a partir das narrativas construídas pelas pessoas ouvidas.

Tabela 1
Descrição das/os participantes

Foi realizado um encontro individual com cada participante através da plataforma Google Meet, garantindo contato visual de forma sincrônica (Flick, 2013FLICK, Uwe. 2013. “Pesquisa on-line: realização de pesquisa social on-line”. In: FLICK, U. Introdução à metodologia de pesquisa: Um guia para iniciantes. 1ª ed. Porto Alegre: Penso.). As entrevistas foram orientadas pela pergunta-disparadora: “Como é ser bissexual na comunidade LGBTQIAP+?”. Por meio desta pergunta pretendemos conhecer como se dá a inclusão das/os participantes no grupo em questão, as experiências mais marcantes para a constituição de sua sexualidade nesse contexto e os principais desdobramentos emocionais decorrentes dessas experiências.

O conteúdo produzido a partir das entrevistas foi examinado, cumprindo as etapas de pré-análise, exploração do material e interpretação (Minayo, 2001MINAYO, Maria Cecília de Souza (org.). 2001. Pesquisa Social: Teoria, método e criatividade.18ª ed. Petrópolis: Vozes.), de maneira a extrair categorias temáticas relacionadas às vivências de pessoas bissexuais na comunidade LGBTQIAP+, bem como em contextos heteronormativos. A próxima seção do texto, “Faces da bifobia”, aponta como o discurso bifóbico se faz presente no dia a dia de pessoas bissexuais. Em seguida, em “B não é de bifobia”, destaca-se o processo de deslegitimação das bissexualidades dentro da comunidade LGBTQIAP+ e os prejuízos psicossociais dele resultantes. Nas perspectivas finais, retomamos os objetivos e os principais resultados alcançados na investigação, desde as principais formas de manifestação da bifobia, as estratégias de enfrentamento do preconceito adotadas por pessoas bissexuais até a constituição das suas redes de apoio. Também são apontadas as limitações do estudo realizado, bem como caminhos para futuras investigações sobre o tema.

Faces da bifobia

Inicialmente é importante destacar que, apesar de a proposta do estudo serem as manifestações da bifobia no interior da comunidade LGBTQIAP+, as/os participantes foram unânimes em relatar que sofrem mais bifobia em espaços heteronormativos. Nesse cenário, mencionamos que a aliança monossexual para o apagamento discursivo das bissexualidades tem sido criticada por supostamente igualar as dinâmicas de poder entre homossexuais e heterossexuais contra bissexuais, ignorando a hegemonia da heteronormatividade na regulação das relações de gênero e sexualidade (Hemmings, 2002HEMMINGS, Clare. 2002. Bisexual Spaces: A Geography of sexuality and Gender. 1ª ed. Nova York: Routledge.; Leão, 2018LEÃO, Maria. 2018. Os unicórnios no fim do arco-íris: bissexualidade feminina, identidade e política no Seminário Nacional de Lésbicas e Mulheres Bissexuais. Dissertação de mestrado, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.). Assim, iniciamos nossas análises pelos relatos de algumas faces da bifobia produzidas fora de espaços LGBTQIAP+.

Dentre as formas que o discurso bifóbico assume, a hipersexualização e a fetichização de pessoas bissexuais estão entre as principais queixas das/os entrevistadas/os, com destaque para as mulheres. Paula denuncia que há poucas referências de mulheres bissexuais na mídia e, quando há, são apresentadas por personagens com grande apelo erótico e interpretadas por atrizes de beleza dentro do padrão heteronormativo. A fetichização de mulheres bi é ilustrada pelos recorrentes convites para praticarem ménage à trois3 3 Modalidade de relação sexual em que participam três pessoas simultaneamente, independente do gênero. sem terem sequer manifestado interesse prévio por esta modalidade de relação sexual, mas apenas por serem bissexuais, como relatou Paula, assim como Ivi no trecho abaixo:

Então acontecia muito de eu estar num grupo de amigos homens e eles ficarem “eu quero dar um beijo triplo contigo”, “ah eu quero fazer um ménage”; e eu ficava assim: “gente, não tem nada a ver”. Tudo bem a pessoa querer fazer, mas não é porque eu sou bissexual que é só isso que eu quero, entendeu? (Paula, 19 anos, mulher cisgênero, branca, em um relacionamento não monogâmico, renda média).

Nesse contexto, a hipersexualização de pessoas bissexuais está atrelada, ainda, aos estereótipos de promíscuas e infiéis, reforçados pela crença de que bissexuais necessitam se relacionar simultaneamente com os dois gêneros para satisfazerem seu desejo afetivo/sexual. Assim, ao serem percebidas como uma ameaça ao bem-estar emocional de seus/suas parceiros/as, bissexuais têm maior dificuldade em serem considerados como opção para relacionamentos estáveis e profundos, ficando muitas vezes restringidos a relações casuais e superficiais (Lewis, 2012bLEWIS Elizabeth Sara. (14.02.2012) “‘Eu quero meu direito como bissexual’: A marginalização discursiva da diversidade sexual dentro do movimento LGBT e propostas para fomentar a sua aceitação” [on-line]. Anais do Simpósio Nacional Discurso, Identidade e Sociedade (III Sidis). ISBN 978-85-62641-06-0. Disponível em: Disponível em: https://www.iel.unicamp.br/sidis/anais/pdf/LEWIS_ELIZABETH_ SARA.pdf [Acessado em: 17.02.2021].
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).

A disseminação desses e de outros preconceitos bifóbicos dificulta a identificação e a aceitação de pessoas como bissexuais, e configura-se ainda como fator de sofrimento para aqueles que assumem tal orientação sexual abertamente. Esse cenário é ilustrado pela fala de vários/as participantes, com destaque para Cris:

Eu não tinha com quem conversar. O que era que eu tinha de referência da bissexualidade: é uma pessoa indecisa, que não sabe o que quer, é uma pessoa que tem chance de trair em dobro. Então, como é que eu, tendo toda essa visão da bissexualidade, ia conseguir me identificar? (...) Essa falta de referencial pesou muito (Cris, 24 anos, não binário, negro, em um relacionamento não monogâmico, renda baixa).

Tal como a heterossexualidade compulsória, definida por Rich (2010), enquanto instituição que estabelece a heterossexualidade como única via de relação entre os gêneros, Cris descreve sua experiência a partir do que denomina de “monossexualidade compulsória”, estrutura que presume a monossexualidade intrínseca às relações afetivo-sexuais, impondo-se sobre as pessoas ao longo de sua socialização e amadurecimento sexual, impedindo que sexualidades monodissidentes sejam consideradas como alternativas viáveis.

Nesse contexto, bissexuais comprometidos/as em relacionamentos de longo prazo tendem a optar pela omissão da sua sexualidade, uma vez que a monossexualidade é sempre presumida, principalmente tendo como referência o gênero de seu/sua parceiro/a (van Lisdonk; Keuzenkomp, 2016VAN LISDONK, J.; KEUZENKAMP, S. (18.07.2016). “Towards bi-inclusive policies: Suggestions based on research on dutch same-sex attracted young people” [on-line]. Sexuality research & social policy: journal of NSRC. Vol. 14, nº 2, p. 206-222. Disponível em: https://doi.org/10.1007/s13178-016-0241-1. [Acessado em: 14.06.2021].
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). Lewis (2012b)LEWIS Elizabeth Sara. (14.02.2012) “‘Eu quero meu direito como bissexual’: A marginalização discursiva da diversidade sexual dentro do movimento LGBT e propostas para fomentar a sua aceitação” [on-line]. Anais do Simpósio Nacional Discurso, Identidade e Sociedade (III Sidis). ISBN 978-85-62641-06-0. Disponível em: Disponível em: https://www.iel.unicamp.br/sidis/anais/pdf/LEWIS_ELIZABETH_ SARA.pdf [Acessado em: 17.02.2021].
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destaca que a sexualidade da pessoa geralmente é definida a partir do sexo/gênero do/a seu/sua parceiro/a sexual/afetivo. Em razão da descontinuidade do fator gênero nas relações bissexuais (Mônaco, 2020MÔNACO, Helena Motta. 2020. “A gente existe!”: ativismo e narrativas bissexuais em um coletivo monodissidente. Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina. ), pessoas bissexuais vivenciam um eterno sair do armário sempre que se envolvem com um/a parceiro/a de gênero diferente do anterior, mesmo quando sua bissexualidade é de conhecimento geral. Nesse cenário, as performances bissexuais estão sob constante vigilância.

Não é porque eu estou com uma mulher ou com homem que eu sou menos bi por isso. Para me afirmar enquanto mulher bissexual, eu tenho que estar me relacionando com os dois ou tenho que estar numa balança medindo... sei lá, tipo: eu fui numa festa, fiquei com dois homens, então eu tenho que ficar com duas mulheres para equilibrar? (Paula, 19 anos, mulher cisgênero, branca, em um relacionamento não monogâmico, renda média).

Ao ser descartada como possibilidade, a bissexualidade geralmente é considerada como uma fase transitória ou apenas um período de experimentação sexual (van Lisdonk e Keuzenkomp, 2016VAN LISDONK, J.; KEUZENKAMP, S. (18.07.2016). “Towards bi-inclusive policies: Suggestions based on research on dutch same-sex attracted young people” [on-line]. Sexuality research & social policy: journal of NSRC. Vol. 14, nº 2, p. 206-222. Disponível em: https://doi.org/10.1007/s13178-016-0241-1. [Acessado em: 14.06.2021].
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; Lewis, 2012bLEWIS Elizabeth Sara. (14.02.2012) “‘Eu quero meu direito como bissexual’: A marginalização discursiva da diversidade sexual dentro do movimento LGBT e propostas para fomentar a sua aceitação” [on-line]. Anais do Simpósio Nacional Discurso, Identidade e Sociedade (III Sidis). ISBN 978-85-62641-06-0. Disponível em: Disponível em: https://www.iel.unicamp.br/sidis/anais/pdf/LEWIS_ELIZABETH_ SARA.pdf [Acessado em: 17.02.2021].
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). Tiago conta que, ao começar a se relacionar com homens, ouviu insistentemente de amigos: “Tu sempre foi gay”, mesmo esses mesmos amigos sabendo da sua atração por mulheres. Por sua vez, Paula narra que dentro de casa sua bissexualidade é constantemente apagada, e conta que, ao ser vista com parceiros de diferentes gêneros, ouviu de um familiar: “Se decide o que tu é então: ou tu é um ou o outro”.

Os relatos revelam uma constante vigilância das performances bissexuais, de modo a enquadrá-las em exigências normativas que frequentemente deslegitimam os vários modos de se viverem as bissexualidades. Lewis (2012b) destaca esse intenso policiamento entre os integrantes do movimento LGBTQIAP+ como forma de garantir a estabilidade e a legitimação das categorias gay e lésbica, invalidando, assim, performances que escapam aos extremos homo/hétero do continuum da sexualidade. Sobre esse cenário, Ivi relata:

Infelizmente as pessoas gostam muito de rotular tudo, isso é uma coisa que me incomoda bastante. Porque isso é muito chato, e isso diminui uma pessoa a simplesmente uma coisa. Acho que por conta disso eu acabo não falando nada. Eu respeito quem fala, quem se assume, eu acho incrível, eu acho lindo, maravilhoso (...). Mas eu não sou assim porque não faz parte de quem eu sou. E é válido também, sabe? (Ivi, 23 anos, mulher cisgênero, branca, em um relacionamento monogâmico, renda média alta).

Para ela, nomear e defender sua sexualidade em público, tornar a bissexualidade uma bandeira política podem sujeitá-la a normatizações, modelos de bissexualidade impostos que não descrevem sua experiência pessoal. Diferentemente de Ivi, Paula exemplifica esse fenômeno ao relatar uma necessidade constante de reafirmar sua identidade bi, pois sente uma exigência externa para que fique com homens e mulheres na mesma proporção, de modo a validar sua orientação sexual.

Nesse sentido, apesar da proposta emancipatória das políticas identitárias, a imposição de marcadores sociais gera processos de essencialização e exclusão, visto que restringe a legitimidade apenas a sujeitos que atendam aos critérios de pertencimento de determinada identidade (Jaeger, 2018JAEGER, Melissa Bittencourt. 2018. Experiência de minas bissexuais: Políticas identitárias e processos de marginalização. Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina. ). Nesse cenário, as bissexualidades acabam não sendo amplamente vistas e aceitas, pois não se enquadram nos critérios de pertencimento das categorias que são válidas/vigentes, o que gera o apagamento dessa identidade e o atravessamento por diversas outras violências.

B não é de bifobia

Como argumentamos, a bifobia é difundida discursivamente de variadas maneiras, de forma a deslegitimar a vivência de pessoas bissexuais. A sua prática não está restrita a pessoas heterossexuais, mas descreve também as reações negativas de gays e lésbicas em relação à experiência bissexual. Como aponta Lewis: “apesar de a homossexualidade ser o lado marginalizado do binário heterossexual/homossexual, ela tem sido consolidada como uma das (duas) opções de sexualidade construídas pela sociedade atual” (Lewis, 2012a: 35LEWIS, Elizabeth Sara. 2012a. “Não é uma fase”: Construções identitárias em narrativas de ativistas LGBT que se identificam como bissexuais. Dissertação de mestrado, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.) e, juntamente com a heterossexualidade, tem reservado o lugar do apagamento a orientações sexuais monodissidentes. Assim, as análises a seguir são dos relatos de bifobia praticada por pessoas da comunidade LGBTQIAP+.

A maioria das/os entrevistadas/os aponta que o sofrimento decorrente da bifobia foi, em algum momento, invalidado em face da expressividade dos atos homofóbicos, amplamente discutidos e midiatizados.

Tem muita gente que não consegue enxergar que isso realmente é real. A homofobia, ela é muito palpável; não que a bifobia não seja, mas ela é muito mais debatida e há muito mais tempo. Então, a questão da bifobia, eu vejo que tem muita gente que ainda tem dificuldade de enxergar que certas brincadeiras, que certos comentários, eles estão sendo bifóbicos (Cris, 24 anos, não binário, negro, em um relacionamento não monogâmico, renda baixa).

A subestimação da bifobia enquanto preconceito é resultado, em grande parte, da ideia de que pessoas bissexuais têm a vantagem de escapar à discriminação enquanto se relacionam com uma pessoa de gênero diferente do seu, e por isso seriam privilegiadas em comparação a homossexuais. A suposta aproximação de bissexuais com a heterossexualidade colocaria em xeque o potencial de subversão das bissexualidades contra o sistema heteronormativo (Caproni Neto, 2017CAPRONI NETO, Henrique Luiz. (08.11.2017). “A bissexualidade (des)organizada: desenhos, estigmas e subversões” [on-line]. Anais do XX SemeAd (Minas Gerais/ UFMG). ISSN 2177-3866, p. 1-16. Disponível em: Disponível em: https://login.semead.com.br/20semead/anais/resumo.php?cod_trabalho=1756 [Acessado em: 23.02.21].
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) e patriarcal, como indicado pelas mulheres lésbicas ouvidas por Jaeger (2018JAEGER, Melissa Bittencourt. 2018. Experiência de minas bissexuais: Políticas identitárias e processos de marginalização. Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina. ). Contudo, a ativista Robyn Ochs, em seu texto intitulado “Bifobia”, argumenta sobre o revés da chamada “passabilidade bissexual”:

Embora não constantemente identificáveis, o que em determinados contextos possa nos proteger de discriminações, nós sofremos a desvantagem de não sermos capazes de identificar outros como nós, resultando em sentimentos de isolamento e subestimação de nossos grandes números (...). Além disso, o “privilégio” da passabilidade também carrega como seu contrapeso o ônus de precisarmos repetidamente nos identificar publicamente para evitarmos ser identificados erroneamente, assim como experimentamos sentimento de culpa ou desconforto quando ficamos em silêncio. Nós carregamos o peso de constantemente tomar a decisão de como e quando sair do armário e a que custo (Ochs, 2005OCHS, Robyn. 2005. “Biphobia”. In: OCHS, R; ROWLEY, S. E. (orgs.). Getting Bi: Voices of Bisexual Around the World. 1ª ed. Boston: Bisexual Research Center.: 106).

Entretanto, a fala de alguns participantes também reiterou a ideia de que a bissexualidade se encontra, de certa forma, em posição de privilégio quando se tem em vista a homofobia. Assim, a relevância da bifobia enquanto instrumento de opressão é questionada, bem como suas consequências e as estratégias de resistência mobilizadas por ela.

Eu acho que a gente também passa por uma dualidade que tem, lamentavelmente, o ônus da comunidade gay, e a gente tem os bônus da comunidade heterossexual, com a possibilidade de tá com uma garota na rua em qualquer horário, fazer qualquer coisa; mas com homem a gente precisar tá escondido, se preservar ao não beijo, ao não carinho e essas coisas assim (Caio, 32 anos, homem cisgênero, negro, solteiro, renda baixa).

Consequentemente, por ser uma violência que ocorre sob o véu do apagamento, a bifobia tem como principal repercussão danos psicoemocionais. Segundo uma lógica biomédica, o sofrimento mental é percebido como menos alarmante em comparação aos danos da violência física. Por outro lado, Teixeira Filho e Rondini (2012)TEIXEIRA-FILHO, F. S., RONDINI, C. A. (01.11.2012). “Ideações e tentativas de suicídio em adolescentes com práticas sexuais hetero e homoeróticas” [on-line]. Saúde e Sociedade. Vol. 21, n.º 3, p. 651-667. Disponível em: Disponível em: https://www.scielosp.org/scielo.php?pid=S0104-12902012000300011&script =sci_ arttext&tlng=en . [Acessado em: 14.05.2022].
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apontam que, dentre adolescentes não heterossexuais, os/as bissexuais são os mais vulneráveis a tentativas de suicídio, o que escancara a gravidade dos prejuízos que a bifobia pode provocar à saúde mental desses indivíduos.

De toda forma, o trecho anterior, retirado das entrevistas, expõe a reprodução da noção de “privilégio hétero” mesmo entre pessoas bissexuais. Em contrapartida, as narrativas desenvolvidas pelos participantes denunciam as tensões dentro da comunidade LGBTQIAP+. Ivi demonstra frustração ao contar que não encontra o acolhimento esperado em um espaço que prega diversidade e tolerância, mas que prioriza pautas de homens gays, o que resulta na invisibilização das demais orientações sexuais. O depoimento de Caio vem se somar a esse incômodo: “Essa comunidade tem uns debates prioritários e a bissexualidade não está entre eles, nem na ordem do dia, não esteve ontem e muito provavelmente não estará amanhã”.

Nesse contexto, segundo Paveltchuk, Borsa e Damásio (2019PAVELTCHUK, F. de O.; BORSA, J. C.; DAMÁSIO, B. F. (29.11.2019). “Indicadores de bem-estar subjetivo e saúde mental em mulheres de diferentes orientações sexuais” [on-line].Psico. Vol. 50, nº 3, p. 01-13. Disponível em: https://doi.org/10.15448/1980-8623.2019.3.31616. [Acessado em: 30.10.2021].
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), a revelação da orientação sexual, quando vinculada a apoio social e com conexão com a comunidade LGBTQIAP+, “parece estar associada a maiores índices de bem-estar e saúde mental” (: 3); contudo, os índices desfavoráveis de saúde mental entre pessoas bissexuais (quando comparadas a monossexuais) parecem indicar que esse grupo encontra dificuldades em estabelecer vínculos com gays e lésbicas. Leão (2018LEÃO, Maria. 2018. Os unicórnios no fim do arco-íris: bissexualidade feminina, identidade e política no Seminário Nacional de Lésbicas e Mulheres Bissexuais. Dissertação de mestrado, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.) sugere que, para homossexuais, a atitude de “sair do armário” representa uma chance de estabelecimento de laços de sociabilidade e de redução do sofrimento mental; para bissexuais, por outro lado, a pressão para encaixar-se em uma lógica monossexual e a constante vigilância de sua identidade provocam ainda mais angústia.

Enfrentar essas e outras barreiras, em diferentes contextos e continuamente, torna a saúde mental de pessoas bissexuais mais vulnerável a adoecimentos. No cenário internacional, alguns estudos já apontam a relação entre sofrimento mental e bissexualidade, com dados indicando que pessoas bissexuais têm graves índices de abuso de substâncias, de transtornos como depressão e ansiedade, e comportamentos suicidas (principalmente entre as mulheres) (Colledge et al., 2014COLLEDGE, Lisa et al. 2015. “Poorer mental health in UK bisexual women than lesbians: evidence from the UK 2007 Stonewall Women’s Health Survey” [on-line]. (13.01.2015). Journal of Public Health. Vol. 37, nº 3, p. 427-437. Disponível em: https://doi.org/10.1093/pubmed/fdu105. [Acessado em: 14.05.2022].
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; Pompili et al., 2014POMPILI, Maurizio et al. (20.05.2014). “Bisexuality and suicide: a systematic review of the current literature” [on-line]. The Journal of Sexual Medicine. Vol. 11, nº 8, p. 1903-1913. Disponível em: https://doi.org/10.1111/jsm.12581. [Acessado em 14.05.2022].
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). Além disso, segundo o relatório da Comissão de Direitos Humanos de São Francisco, pessoas bissexuais apresentam maiores níveis de vulnerabilidade econômica quando comparados a gays e lésbicas (Leão, 2018LEÃO, Maria. 2018. Os unicórnios no fim do arco-íris: bissexualidade feminina, identidade e política no Seminário Nacional de Lésbicas e Mulheres Bissexuais. Dissertação de mestrado, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.), e também correm maior risco de serem vitimizadas física, mental e psicologicamente (Walters; Chein; Braiding, 2013WALTERS, M. L.; CHEN J.; BREIDING, M J. 2013. “The National Intimate Partner and Sexual Violence Survey (NISVS): 2010 Findings on Victimization by Sexual Orientation” [on-line]. Atlanta: National Center for Injury Prevention and Control, Centers for Disease Control and Prevention. Disponível em: Disponível em: https://www.cdc.gov//violenceprevention/pdf/nisvs_sofindings.pdf . [Acessado em: 14.05.2022]
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).

A falta de referências a vivências bissexuais (Gómez e Arenas, 2019GÓMEZ, J. P. P.; ARENAS, Y. (30.05.2019). “Development of Bisexual Identity” [on-line]. Revista Ciência e Saúde Coletiva. Vol. 24, nº 5, p. 1669-1678. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/VPxGFPV9CLHDtnDNMwBKr4w/?lang=en . [Acessado em: 20.02.2021].
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) e a dificuldade em compreender as bissexualidades enquanto uma categoria não essencialista (Caproni Neto, 2017CAPRONI NETO, Henrique Luiz. (08.11.2017). “A bissexualidade (des)organizada: desenhos, estigmas e subversões” [on-line]. Anais do XX SemeAd (Minas Gerais/ UFMG). ISSN 2177-3866, p. 1-16. Disponível em: Disponível em: https://login.semead.com.br/20semead/anais/resumo.php?cod_trabalho=1756 [Acessado em: 23.02.21].
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) impelem os sujeitos que transitam por esse processo de identificação a se encaixarem em estereótipos que nem sempre contemplam suas experiências pessoais, como pode ser observado no trecho a seguir, no qual Alex relata a reação negativa de seus amigos diante da bissexualidade de uma colega:

Por exemplo, quando tinha uma menina que tava muito tempo com um garoto, aí eles se separaram, depois de um tempo ela apareceu com uma garota, aí aquilo pareceu um acontecimento, sabe? Eles ficaram realmente duvidando, como se fosse moda. Aí eu pensei: “que imagem será que eles não têm de mim?”. Porque eu acho que perto deles eu nunca fiquei com uma garota, eu não namorei com nenhuma garota. O que será que eles pensam de mim? Será que pra eles eu tô só numa moda, tô querendo ficar no vale4 4 “Vale” ou “Vale LGBT” é uma gíria utilizada para se referir à comunidade LGBTQIAP+. Está associada à ideia de um lugar utópico, livre de preconceitos. a qualquer custo? (Alex, 19 anos, não binário, branco, solteiro, renda média).

Somado a isso, Arthur compartilha o caso em que uma colega lésbica, já na universidade, o chamou de “bissexual Nutella”, afirmando que ele apenas se relacionava com mulheres quando estava sob efeito de álcool, o que, segundo ela, o tornava um bissexual ilegítimo. Os relatos descrevem situações das mais diversas, desde a associação com promiscuidade e infidelidade à concepção das bissexualidades como uma conveniente alternativa à homossexualidade.

Essa conjuntura se mostra ameaçadora não só à sexualidade do sujeito, mas à concepção pessoal de si, de quem se é e do que sente; Paveltchuk, Borsa e Damásio (2019PAVELTCHUK, F. de O.; BORSA, J. C.; DAMÁSIO, B. F. (29.11.2019). “Indicadores de bem-estar subjetivo e saúde mental em mulheres de diferentes orientações sexuais” [on-line].Psico. Vol. 50, nº 3, p. 01-13. Disponível em: https://doi.org/10.15448/1980-8623.2019.3.31616. [Acessado em: 30.10.2021].
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) assinalam que o enfrentamento e a internalização de estigmas por pessoas bissexuais podem provocar juízos negativos sobre si e a sua sexualidade, conduzindo a altos índices de confusão identitária e comprometendo a saúde mental do grupo. Nota-se uma pressão, pessoal e externa, para que a experiência bissexual seja compreendida a partir da lente da homossexualidade ou da heterossexualidade, uma vez que a bissexualidade em si não é considerada uma opção válida; este pode ser o ponto de partida para o sofrimento e o adoecimento mental que acometem pessoas bissexuais. Esse cenário reverbera ainda nas relações interpessoais dessas pessoas, atravessadas, a todo momento, pela insegurança e a desconfiança que partem do outro - e de si mesmos.

Mas se a gente for levar em conta o contexto psicológico da coisa, a gente se abala muito por tudo o que as pessoas falam, por tudo o que as pessoas pensam e até mesmo contigo, porque às vezes nem tu mesmo tem certeza de quem tu é. Sempre vai ser uma via que tu vai levar em consideração, às vezes, o que as pessoas falam, por mais que tu não queira que aquilo te abale, te afete, mas tu vai sempre ficar com aquilo: “será que o que aquela pessoa falou tá correto?”. Eram esses os pensamentos que passavam na minha cabeça até certo tempo atrás. Hoje eu sou muito mais bem resolvido. Mas há muito pouco tempo atrás ainda era esse pensamento que perpetuava na minha cabeça, o que me deixava muito pra baixo, até de pensar na questão de suicídio (...) (Arthur, 20 anos, homem cisgênero, solteiro, renda baixa).

De acordo com Leão (2018LEÃO, Maria. 2018. Os unicórnios no fim do arco-íris: bissexualidade feminina, identidade e política no Seminário Nacional de Lésbicas e Mulheres Bissexuais. Dissertação de mestrado, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.), bissexuais são impelidos a uma posição de isolamento e solidão dentro (e fora) da comunidade LGBTQIAP+; a vivência sexual e afetiva de homens bissexuais, particularmente, é permeada pelo sentimento de solidão, uma vez que não contam com interlocutores com os quais compartilhar as experiências que atravessam sua sexualidade e sua masculinidade, levando-os a priorizar muitas vezes o estabelecimento de relações de amizade com outros homens, antes que essas evoluam para um envolvimento sexual (Seffner, 2003SEFFNER, Fernando. 2003. Derivas da masculinidade: Representação, identidade e diferença no âmbito da masculinidade bissexual. Tese de doutorado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. ).

Nessas condições, há um aspecto comum na experiência da maioria das/os participantes da pesquisa: o fortalecimento da identidade bissexual enquanto estratégia de enfrentamento da bifobia. A maioria dos relatos abordou, em algum momento, como a exposição constante ao questionamento e à invalidação da sua orientação sexual estimulou um processo de consolidação da identidade, agora orgulhosamente nomeada e defendida. Ao sofrer bifobia de uma companheira lésbica, Paula mostra uma mudança de comportamento a partir do fortalecimento da identidade bi:

(...) Eu já tinha me autoafirmado enquanto mulher bissexual, então eu já tava super ok com a minha sexualidade, nada me abala quanto a isso. Então, quando eu recebi esse tipo de comentário, a minha reação foi me afastar. Essas pessoas não me merecem. Se não for para contemplar minha forma inteira, a minha sexualidade, compreender a forma que eu amo as pessoas e me relaciono, então não me interessa (Paula).

Notamos que, mesmo expostos a discursos semelhantes, diversas são as reações de enfrentamento e defesa assumidas por pessoas sujeitas à bifobia. Alex, por exemplo, tendo pouco contato com experiências explicitamente bifóbicas, parece ainda não dispor da confiança necessária para se posicionar criticamente em situações de preconceito. Em contrapartida, Paula se mostra mais incisiva em seus posicionamentos e atitudes, afirmando que está sempre em estado de alerta, a postos para se defender de possíveis ataques bifóbicos. De forma geral, a sensação da iminente ameaça da bifobia esteve presente na fala de todas/os as/os participantes.

Ao enfrentar a estrutura monossexual e heteronormativa, foi percebida a preferência dos/as entrevistados/as em se rodearem de pessoas que estejam abertas à sua possibilidade de existência (em suas pluralidades e especificidades), constituindo, então, uma rede de apoio sólida e coerente. No entanto, Caio é incisivo ao dizer que não tem rede de apoio. Já Cris confessa que se sente inserido em uma “bolha”, na qual as pessoas se encontram acomodadas em suas experiências grupais e individuais, e não demonstram iniciativa para conhecer e defender vivências que escapam a isso. A este respeito, Bento (2017BENTO, Berenice. 2017. A reinvenção do corpo: Sexualidade e gênero na experiência transexual. 3ª ed. Salvador: Editora Devires. ) aponta que a construção de identidades coletivas estabelece a sexualidade como elemento de semelhança e unidade entre os indivíduos que as constituem. Como resultado, os grupos sociais formados têm as diferenças entre si acirradas, distanciando-os e coibindo sua articulação no combate à heteronormatividade.

Nesse cenário, as bissexualidades assumem uma posição ainda mais complexa ao romperem com a norma binária homo/hétero e aproximarem-se de uma crítica que desfaz a orientação sexual como categoria (Caproni Neto, 2017CAPRONI NETO, Henrique Luiz. (08.11.2017). “A bissexualidade (des)organizada: desenhos, estigmas e subversões” [on-line]. Anais do XX SemeAd (Minas Gerais/ UFMG). ISSN 2177-3866, p. 1-16. Disponível em: Disponível em: https://login.semead.com.br/20semead/anais/resumo.php?cod_trabalho=1756 [Acessado em: 23.02.21].
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). Entretanto, ao se localizar fora dessa inteligibilidade e se afirmar enquanto categoria que prescinde de estabilidade, a bissexualidade é confrontada, como vimos, por dispositivos discursivos de deslegitimação que comprometem a saúde mental e a qualidade de vida de pessoas bissexuais. Lewis (2012b)LEWIS Elizabeth Sara. (14.02.2012) “‘Eu quero meu direito como bissexual’: A marginalização discursiva da diversidade sexual dentro do movimento LGBT e propostas para fomentar a sua aceitação” [on-line]. Anais do Simpósio Nacional Discurso, Identidade e Sociedade (III Sidis). ISBN 978-85-62641-06-0. Disponível em: Disponível em: https://www.iel.unicamp.br/sidis/anais/pdf/LEWIS_ELIZABETH_ SARA.pdf [Acessado em: 17.02.2021].
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, ao entrevistar mulheres bissexuais, aponta um esforço de homogeneização das performances, aproximando-a de padrões normativos na busca por afastar as bissexualidades de estereótipos como o da infidelidade, das bissexualidades como fase ou incerteza.

É evidente que a localização das bissexualidades como dispositivo de subversão do sistema monossexista e binário e enquanto “categoria que desafia a categorização” (Caproni Neto, 2017CAPRONI NETO, Henrique Luiz. (08.11.2017). “A bissexualidade (des)organizada: desenhos, estigmas e subversões” [on-line]. Anais do XX SemeAd (Minas Gerais/ UFMG). ISSN 2177-3866, p. 1-16. Disponível em: Disponível em: https://login.semead.com.br/20semead/anais/resumo.php?cod_trabalho=1756 [Acessado em: 23.02.21].
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: 5) é importante na construção do debate sobre os diferentes mecanismos de opressão social. Contudo, é preciso realizar um movimento de humanização das pessoas que se encontram nesses campos de tensão política e social e que tecem diariamente as narrativas que tanto buscamos legitimar. No fim do dia, são apenas pessoas tentando viver - e sobreviver - em um mundo ainda edificado segundo um sistema heteronormativo, binário e monossexista.

Considerações finais

O presente estudo teve como objetivo investigar as diferentes manifestações da bifobia, sobretudo no interior da comunidade LGBTQIAP+, de modo a conhecer os possíveis impactos desse duplo processo de violência na vida de pessoas bissexuais. Como discutido, as bissexualidades desafiam as relações de oposição entre categorias de gênero, sexualidade e desejo; e ao abrirem mão da estabilidade (aparentemente) imprescindível à noção de categoria identitária, são confrontadas por dispositivos de invisibilização.

Conforme observado nos relatos colhidos, os discursos de apagamento e invalidação decorrem tanto de pessoas heterossexuais quanto de pessoas LGBTQIAP+; contudo, são mais expressivos entre o público heterossexual, sobretudo entre homens cisgêneros.

A partir dos relatos dos/as participantes foi possível visualizar as principais manifestações da bifobia no cotidiano de pessoas bissexuais, com destaque para a hipersexualização de mulheres bissexuais e a pressão sofrida por pessoas bissexuais para decidirem sua orientação sexual, uma vez que as bissexualidades não são consideradas uma identidade válida. Nesse contexto, apesar de o mito do “privilégio heterossexual” se fazer presente no imaginário de alguns entrevistados, seus relatos, bem como os de seus pares, reiteram a vivência não de uma dimensão da homofobia, mas de um massivo preconceito direcionado às experiências bissexuais em si.

A partir desse prisma, a narrativa das/os entrevistadas/os revela as dificuldades que pessoas bissexuais encontram ao se inserirem em meios LGBTQIAP+. Assim, como foi constatado nas entrevistas, a rede de apoio de pessoas bissexuais é constituída predominantemente por outros bissexuais, já que a experiência de suas bissexualidades, no geral, não é vista com bons olhos nem por pessoas heterossexuais, nem por homossexuais.

Os relatos apontam diferentes estratégias de enfrentamento à bifobia, como o diálogo didático, o confronto direto, a preservação do bem-estar emocional do sujeito. A conquista de melhores níveis de autoestima e autoconfiança parece proporcionar a segurança necessária para defender sua identidade em face do apagamento.

Salienta-se que, apesar da manutenção da heteronormatividade enquanto estrutura social predominante, a bifobia permanece agindo sobre corpos e existências, produzindo demandas reais e, portanto, não deve ser subestimada enquanto instrumento de opressão.

De modo geral, o debate aqui proposto indica ainda outras investigações fecundas no campo das bissexualidades, como os atravessamentos entre transexualidades (binárias e não binárias) e bissexualidades; a adoção de discursos normativos como estratégia de validação das bissexualidades, como explorado por Lewis (2012b); e os diferentes aspectos das bissexualidades feminina e masculina.

A presente pesquisa permitiu a exploração de variadas manifestações da bifobia e suas possíveis repercussões na vida de pessoas bissexuais, indo ao encontro de trabalhos anteriores sobre o tema (Jaeger, 2018JAEGER, Melissa Bittencourt. 2018. Experiência de minas bissexuais: Políticas identitárias e processos de marginalização. Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina. ; Lewis, 2012, 2012a; Mônaco, 2020MÔNACO, Helena Motta. 2020. “A gente existe!”: ativismo e narrativas bissexuais em um coletivo monodissidente. Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina. ; Teixeira-Filho; Rondini, 2012). No entanto, entendendo que os casos apresentados não representam toda a gama de possibilidades que essa discriminação pode assumir, até mesmo pelo número restrito de participantes escutados, é importante que outros estudos continuem investigando os prejuízos da bifobia (e do monossexismo) para a saúde mental de bissexuais que, antes de dispositivos de subversão do sistema hétero e mononormativo, são pessoas em potencial sofrimento.

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  • 1
    “Por heteronormatividade entendemos aquelas instituições, estruturas de compreensão e orientações práticas que não apenas fazem com que a heterossexualidade pareça coerente - ou seja, organizada como sexualidade - mas também que seja privilegiada. Sua coerência é sempre provisional e seu privilégio pode adotar várias formas (que às vezes são contraditórias): passa desapercebida como linguagem básica sobre aspectos sociais e pessoais; é percebida como um estado natural; também se projeta como um objetivo ideal ou moral” (Berlant; Warner, 2002, p. 230BERLANT, Laurent; WARNER, Michael. 2002. “Sexo em Público”. In: JIMÉNEZ, Rafael M. (ed.). Sexualidades Transgressoras. 1ª ed. Barcelona: Içaria. ).
  • 2
    Comunidade LGBTQIAP+ é o termo utilizado para agregar diferentes sexualidades e identidades de gênero divergentes da norma heterossexual e cisgênera. A sigla LGBTQIAP+ se refere a lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, queer, intersexos, assexuais, pansexuais e demais identidades, e busca destacar a amplitude que a comunidade assume nos dias de hoje e promover a visibilidade dos grupos que a compõem.
  • 3
    Modalidade de relação sexual em que participam três pessoas simultaneamente, independente do gênero.
  • 4
    “Vale” ou “Vale LGBT” é uma gíria utilizada para se referir à comunidade LGBTQIAP+. Está associada à ideia de um lugar utópico, livre de preconceitos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    19 Jan 2022
  • Aceito
    25 Abr 2022
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