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Epidemiologia e emancipação humana: uma revisita aos princípios da justiça

Epidemiology and human emancipation: revisiting the principles of justice

RESUMO

A epidemiologia, apesar de suas origens sócio-históricas, tornou-se hegemonicamente individual, linear, com clivagens entre os hemisférios norte e sul, entre método e teoria crítica, de onde emerge a necessidade de uma epidemiologia voltada à emancipação humana. O objetivo deste artigo é avaliar de que forma a epidemiologia contra-hegemônica tem contribuído para práticas efetivas de emancipação humana na saúde pública nos diferentes níveis de justiça. Realizou-se revisão integrativa, com busca nas bases de dados PubMed, BVS, Assia, Embase e SA e análise temática e cross-case. Diante de lentes ajustadas à epidemiologia crítica, reconstituímos os tensionamentos entre as diferentes formas de emancipações política e humana, nos níveis de justiça cognitiva, socioambiental e de saúde. O primeiro nível, cognitivo, é atravessado pela razão de mundo e pelo pensamento abissal e envolve os demais. O nível socioambiental foi ancorado no metabolismo socionatural-histórico e o de saúde, angustia-se entre o bem viver e as lutas fragmentadas pelos direitos à saúde universal, frente à espoliação do setor. No enfrentamento ao modelo de acumulação de capital, devemos valorizar a interculturalidade e a subjetividade. Evidenciou-se que a ‘Epistemologia do Sul’ remete a um pensamento descolonizador, orientando metodologias capazes de potencializar descobertas bem como desmistificar as relações sociais.

PALAVRAS-CHAVE
Saúde coletiva; Epistemologia; Capitalismo; Interculturalidade; Interseccionalidade

ABSTRACT

Epidemiology, despite its socio-historical origins, has become hegemonically individual and linear, with the north-southern hemispheres divide, methodology and critical theory, which calls for a human emancipation oriented epidemiology. The aim of this article is to assess how critical epidemiology has contributed to effective human emancipation practices in public health, at different justice levels. An Integrative review was performed, with searches in PubMed, VHL, ASSIA, EMBASE and SA databases and thematic and cross-case analysis. Elaborating through critical counter-hegemonic epidemiology adjusted lens, we reconstitute the tension between different modes of human and political emancipations, at the levels of cognitive, socio-environmental and health justice. The cognitive level is crossed by the ‘way of the world’ and the ‘abyssal’ thinking and involves the other levels. The socio-environmental level was anchored in the historical socio-natural metabolism and that of health, anguishes between well-being and the fragmented struggles for universal health rights, as opposed to the spoliation of the sector. In confronting the capital accumulation model, it’s essential to value interculturality and subjectivity We found evidence that the ‘Epistemology of the South’ points out to a decolonizing thought-oriented methodology, capable of enhancing discoveries and demystifying social relations.

KEYWORDS
Public health; Epistemology; Capitalism; Interculturality; Intersectionality

Introdução

A epidemiologia surgiu inicialmente com caráter coletivo e social, ainda que com a perspectiva do controle urbano da sociedade e suas moléstias e agravos nos séculos XVII e XVIII. No entanto, o resgate histórico permite afirmar que, na medida em que o capitalismo foi consolidado, a epidemiologia, para ser aceita e tornar-se ciência hegemônica, foi se apropriando do espaço público de determinação da saúde e doença, com todas as implicações do significado do público na ordem social burguesa11 Ayres JRCM. Interpretação histórica e transformação científica: a tarefa hermenêutica de uma teoria crítica da epidemiologia. Rev Saude Publica. 1994 [acesso em 2020 abr 14]; 28(4):311-9. Disponível em: https://www.scielosp.org/pdf/rsp/1994.v28n4/311-319.
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Não é à toa que a epidemiologia foi reduzindo sua dimensão social gradativamente e ampliando seu arsenal tecnológico e matemático a serviço dos problemas individuais de saúde, engrandecendo as ferramentas da epidemiologia clínica e da experimentação racional, a ponto de chegar ao nível nanomolecular. Quanto mais verticalizada, maior status adquire na ciência, ao mesmo tempo em que permanece mais limitada e restrita à reconstrução da realidade sócio-histórica, embora as contradições entre o individual e coletivo permaneçam22 Almeida Filho N. Bases históricas da Epidemiologia. Cad. Saúde Pública. 1986 [acesso em 2020 abr 14]; 2(3):304-11. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/csp/v2n3/v2n3a04.
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no que se refere aos interesses subjacentes, gerando lutas colossais.

Assim, nos anos de 1970, surgem nos países da América Latina fortes resistências a esse modelo, uma vez que as desigualdades em saúde são extremas nos países periféricos, buscando sua identidade na teoria crítica e na dialética, resgatando a determinação social de saúde e doença como forma de alcançar o bem viver33 Spiegel JM, Breilh J, Yassi A. Why language matters: insights and challenges in applying a social determination of health approach in a North-South collaborative research program. Global Health. 2015 [acesso em 2019 dez 16]; (11):9. Disponível em: https://doi.org/10.1186/s12992-015-0091-2.
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Floresce, dessa necessidade, a ‘Epistemologia do Sul’, com a finalidade de combater o pensamento abissal44 Santos BS. Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia de saberes. Novos estudos CEBRAP. 2007 [acesso em 2019 nov 15]; (79):71-94. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0101-33002007000300004.
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e toda forma injusta derivada das relações sociais de poder e opressão, como o capitalismo financeiro espoliador, o pós-colonialismo, o patriarcado e o racismo. Almejam-se a resiliência e o enfrentamento dos eixos de dominação, como forma de emancipação social frente à imposição da modernidade eurocêntrica, ocidental e capitalista. A exclusão e a invisibilidade passam a dominar os artigos científicos relativos a fatores de risco individuais e fragmentados, até mesmo pelos temas escolhidos, doenças abordadas e população estudada, muitas vezes de forma experimental, voltados aos ensaios clínicos. A clivagem biomédica provoca um contramovimento da epidemiologia social no sentido de dar voz aos excluídos e invisíveis, aos ausentes, em que a epidemiologia crítica propõe novas ferramentas e instrumentos rumo à emancipação.

Dessa forma, temos de um lado uma epidemiologia hegemônica, matematizada e científica, de cunho mais metodológico no hemisfério Norte, enquanto no Sul temos o desenvolvimento mais consistente de uma epidemiologia fortemente voltada à teoria e que almeja essencialmente a emancipação humana55 Breilh J. Latin American critical (“social”) epidemiology: new settings for an old dream. Int j. epidemiol. 2008 [acesso em 2019 out 10]; (37):745-750. Disponível em: https://doi.org/10.1093/ije/dyn135.
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É importante ressaltar aqui a diferença entre a emancipação humana e a política, pois, se a emancipação política é fundamental para a luta em prol dos direitos sociais e da cidadania plena, é somente com a superação da política e do capital na ordem social66 Chasin J. A sucessão na crise e a crise na esquerda. Revista Ensaio. 1989; (17-18):10-25.,77 Chasin J. A determinação ontonegativa da politicidade. Verinotio - Revista on-line de Educ. Ciênc. Hum. 2013 [acesso em 2019 nov 15]; (15):42-59. Disponível em: http://www.verinotio.org/conteudo/0.90872840854221.pdf.
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que se alcança a emancipação humana na concepção marxista.

Assim, segundo Chasin77 Chasin J. A determinação ontonegativa da politicidade. Verinotio - Revista on-line de Educ. Ciênc. Hum. 2013 [acesso em 2019 nov 15]; (15):42-59. Disponível em: http://www.verinotio.org/conteudo/0.90872840854221.pdf.
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a emancipação humana ou revolução social do homem compreende a reintegração de posse pelo homem real da figura do cidadão, de modo que ele não mais aliene de si a força humano-societária, degenerada e transfigurada em força política e o reconhecimento e a organização – racional e humanamente orientada – das próprias forças individuais como forças sociais, de tal sorte que a individualidade, isolada e confundida com o ser mudo da natureza, quebre a finitude do ser orgânico e se alce à universalidade de seu gênero.

Somente dessa forma, serão possíveis uma individuação e uma sociabilidade de livre associação comunitária, inclusive no que se refere às atividades humanas.

Os projetos emancipatórios devem aspirar ao bem-estar dos sujeitos e dos grupos frente aos contextos de injustiça social e fenômenos de reificação das formas da cultura hegemônica do capitalismo, que, mesmo oferecendo meios de emancipação política, não reconhece os seus modos de andar a vida e de trabalhar, incluindo suas formas socioculturais de sofrer, de desejar e de cuidar de si próprios e de seus semelhantes88 Arreaza ALV. Epidemiologia crítica: por uma práxis teórica do saber agir. Ciênc. saúde coletiva. 2012 [acesso em 2019 dez 15]; 17(4):1001-13. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1413-81232012000400022.
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O dilema é que a emancipação política se encontra circunscrita à ordem social burguesa, que delimita as possibilidades de alcance do bem viver e de construção de um novo modelo civilizatório que implique um metabolismo socionatural promotor e protetor da vida e da saúde99 Samaja J. Epistemologıa y Epidemiologıa. In: Anais do 1º Congresso Brasileiro de Epidemiologıa; 1990; Campinas. Campinas: Abrasco; 1990.. Tampouco podemos esquecer que toda concepção de direito é reificada e delimitada pela hegemonia de classe e que está sujeita à supremacia da propriedade privada e da liberdade e igualdade apenas entre sujeitos genéricos, tendo por referência o mundo material1010 Pachukanis E. A Teoria Geral do Direito e o Marxismo e Ensaios Escolhidos (1921 – 1929). São Paulo: Editora Sundermann; 2017.. Ademais, a categoria dos grupos fica excluída propositalmente, pois não está em lugar algum: nem no sujeito privado, nem no direito público.

Torna-se essencial, portanto, ponderar como os princípios da justiça atravessam essa diferenciação de emancipação em suas vertentes políticas e humanas, pois, ao considerarmos cada nível e as lutas travadas por direitos humanos em todas as suas gerações, podemos vislumbrar nesse horizonte novos alcances mais substantivos, que possam alicerçar a emancipação humana. Primeiramente, é preciso alterar a percepção de como vemos o mundo e valorizamos o outro. A epidemiologia crítica ou contra-hegemônica envolve não somente a mudança acerca do que percebemos em termos de relações de poder, controle e de reprodução social, por meio das normas e estruturas, mas também como pensamos e sentimos a ciência, de que modo selecionamos a agenda e realizamos pesquisa, até como construímos e comunicamos o conhecimento produzido1111 Breilh J. Salud pública, universidad y poder. La universidad que queremos. Rev. salud pública (Bogota). 2019 [acesso em 2019 dez 15]; 37(1):8-14. Disponível em: https://doi,org/10.17533/udea.rfnsp.v37n1a03.
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,1212 Briggs CL, Mantini-Briggs C. “Misión Barrio Adentro”: Medicina Social, Movimientos Sociales de los Pobres y Nuevas Coaliciones en Venezuela. Salud colect. 2007; 3(2):159-176.,1313 Inhorn MC, Whittle KL. Feminism meets the ‘‘new’’ epidemiologies: toward an appraisal of antifeminist biases in epidemiological research on women’s health, Soc. sci. med. 2001 [acesso em 2020 abr 15]; (53):553-567. Disponível em: https://doi.org/10.1016/S0277-9536(00)00360-9.
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Dessa forma, o objetivo deste artigo é avaliar de que forma a epidemiologia crítica e alternativa, ou contra-hegemônica, tem contribuído para práticas efetivas de emancipação humana na saúde pública nos diferentes níveis de justiça.

Material e métodos

A revisão integrativa foi o método escolhido por seu potencial de análise e síntese de diferentes tipos de estudos, incluindo os teóricos e os empíricos, além da possibilidade criativa da meta-agregação, que envolve práticas de abstração e suspensão1414 Mendes KDS, Silveira RCCP, Galvão CM. Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Text. context. enfermagem. 2008; 17(4):758-64.,1515 Tufanaru C. Theoretical foundations of meta-aggregations: insights from Husserlian phenomenology and American pragmatism. [tese]. Adelaide: The University of Adelaide; The Joanna Briggs Institute; 2015. 123 p..

A questão de pesquisa deste estudo consiste em compreender como a epidemiologia crítica, ou alternativa, tem contribuído para as práticas emancipatórias na saúde pública. Assim, foram definidos os conceitos de epidemiologia contra-hegemônicos, independentemente de sua nomenclatura, que poderiam caminhar de social à epidemiologia alternativa ou popular, conquanto não fosse a epidemiologia clássica.

Do mesmo modo, a definição de emancipação também foi essencial, em razão da divisão básica de emancipação em política e humana, que tratam de dimensões diferentes, embora a primeira seja uma etapa necessária, porém não suficiente para a segunda. Os níveis de justiça também foram investigados, de forma a contemplar sua transversalidade nas práticas propostas.

A estratégia de busca e critérios de inclusão foi definida a partir da pergunta de pesquisa assinalada e buscaram-se os seguintes termos, em separado: “epidemiologia crítica”; “epidemiologia alternativa”; “epidemiologia social”; “epidemiologia popular”, com e sem o termo “emancipação” ou “práticas emancipatórias”. Excetuaram-se os seguintes termos: “epidemiologia clássica”; “epidemiologia de risco”; “epidemiologia clínica” ou com adjetivo “biomédico”; “fator de risco”; “causalidade”.

Consultaram-se as seguintes bases de dados entre abril e agosto de 2020: Pubmed, BVS, Sociological abstracts, Assia e Embase, além de buscas integradas da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP/USP) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). De um total de 360 artigos, foram analisados na íntegra 106 e apenas 40 remanesceram para a extração de dados, depois de excluídos os artigos duplicados ou que não estavam no escopo da pesquisa (figura 1). Apenas resultaram 21 materiais diferentes de artigos científicos, como teses, resenhas e artigos de jornal, não compondo a análise.

Figura 1
Etapas para a inclusão de estudos para a revisão integrativa

Os critérios de inclusão adotados foram: textos completos, de diferentes modalidades, em periódicos revisados por pares, disponíveis nas bases de dados; texto em português, inglês ou espanhol; estudos realizados ou publicados preferencialmente a partir de 2000. Os critérios de exclusão adotados aos estudos foram: duplicidade; enfoque clínico ou biomédico; e enfoque clássico, de risco, linear, causal.

Extração de dados

As seguintes informações foram extraídas dos estudos: autores, país de origem, instituições de pesquisa, tipos de revista e de publicação; conceitos utilizados na definição de epidemiologia clássica e contra-hegemônica; abordagens metodológicas utilizadas, i.e., dimensões e níveis de análise; variáveis selecionadas e análises qualitativas e quantitativas, e, principalmente, a finalidade da pesquisa, resultados encontrados e respostas às questões da pesquisa. Especificamente, foram verificadas as lentes de pesquisa utilizadas e a percepção do problema de pesquisa pelo autor; a presença de uma visão imperialista ou colonizadora; a preocupação com os saberes populares, a interculturalidade e a sociologia da ausência; as práticas emancipatórias propostas e sua resposta socioambiental; a presença de ruptura com as práticas tradicionais; formas de conceituação de vulnerabilidade e papel interseccional de gênero, etnia, classe social e colonização.

Interpretação dos dados e metodologias utilizadas

Os seguintes tópicos foram avaliados criticamente nos estudos selecionados: a questão da pesquisa, sua relevância, as bases conceituais e teórico-metodológicas; resposta adequada à questão de pesquisa no artigo; as limitações ou vieses discutidos; e as lacunas sobre o tema que restam na literatura. Essas questões permitiram uma revisita aos artigos, de modo crítico, validando a interpretação dos resultados. Quanto aos estudos teóricos, os seguintes fatores foram avaliados: interesse público envolvido, argumentos lógicos e bem construídos, fonte claramente identificada e referências relacionadas1616 Joanna Briggs Institute. Joanna Briggs Institute Reviewers’ Manual. The University of Adelaide; 2009. [acesso em 2018 dez 20]. Disponível em: http://www.joannabriggs.edu.au.
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Os resultados foram classificados e resumidos, de forma a possibilitar a síntese das evidências primárias coletadas e analisadas, na linha da análise temática e da relação entre as variáveis. A metassíntese foi realizada com base na identificação de padrões, temas e relações, a partir da definição de categorias na extração de dados, permitindo a construção de matrizes de análise e síntese.

A metodologia de análise selecionada foi a de cross-case, proposta por Miles e Huberman1717 Miles MB, Huberman AM. Qualitative data analysis. 2. ed. Thousand Oaks: Sage; 1994., que permite discriminar e contrastar os padrões identificados. Os estudos foram analisados de diferentes modos: divergência entre categorias, semelhanças e diferenças entre pares próximos, e a distinção de casos similares. Foi possível, assim, um segundo olhar, por meio das diferentes possibilidades de interpretação dos dados.

As sínteses realizadas originaram-se da meta-agregação dos dados, quando foram identificados os principais temas propostos e inter-relacionadas as abordagens epidemiológicas, as formas de emancipação, a interseccionalidade, os níveis de justiça e de análise, os valores contra-hegemônicos e as mudanças alcançadas (quadro 1).

Quadro 1
Etapas para a meta-agregação dos dados na revisão integrativa

Resultados e discussão

Os temas versavam sobre questões do meio ambiente e espaço (27,3%), direitos humanos e advocacia para as minorias (22,7%); os agravos mais prevalentes na sociedade (15,9%), como as doenças crônicas e causas externas, bem como as doenças infecciosas e a vigilância à saúde, programas de saúde compartimentalizados (13,6%), ensino, trabalho em saúde e concepções de políticas públicas (13,6%); e tecnologia da informação e comunicação (6,8%).

As lentes pelas quais as discussões foram desenvolvidas foram a teoria crítica e a dialética, além da epidemiologia social, alternativa, popular ou até novas categorias interseccionais. Articulações importantes com a geoecologia política e com a psicologia crítica estiveram presentes, com novos significados compartilhados com a epidemiologia O quadro 2 permite apreciar um recorte dos estudos empíricos e de revisão quanto às lentes utilizadas, às perguntas de pesquisa e se as respostas eram adequadas aos problemas de pesquisa.

Quadro 2
Características dos artigos não teóricos submetidos à revisão integrativa, segundo a pergunta de pesquisa; sua resposta, lentes utilizadas e referência (tipo de publicação).

A maioria dos estudos é proveniente da América Latina (77,5%), sendo a Colômbia (35,5%) o país de origem predominante, seguido pelo Equador (29,0%), Brasil (25,8%) e Venezuela (12,9%). Chama a atenção a participação dos Estados Unidos, com 17,5% das publicações, predominantemente relacionados à epidemiologia social, e a coprodução inicial entre países do hemisfério Norte e Sul, como um alento a essa cisão permanente.

Com relação ao tipo de publicação, 47,5% dos estudos são teóricos, em sua maioria sob a forma de ensaio teórico (78,9%), 30,0% são empíricos e apenas 12,5% de revisão. Os demais 10,0% eram formas mistas, que envolviam revisão e estudo teórico ou empírico associado. Não é de se espantar essa divisão, uma vez que a cisão entre os hemisférios Norte e Sul trouxe essa diferenciação, com a teoria estando muito presente na Amér ica Latina, até como forma de resistência aos regimes autoritários passados e presentes, ao mesmo tempo em que houve grandes avanços em seu aporte metodológico. Contudo, ainda é bastante pequena sua difusão, sendo as barreiras linguísticas o fator menos importante33 Spiegel JM, Breilh J, Yassi A. Why language matters: insights and challenges in applying a social determination of health approach in a North-South collaborative research program. Global Health. 2015 [acesso em 2019 dez 16]; (11):9. Disponível em: https://doi.org/10.1186/s12992-015-0091-2.
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,1818 Perrilla MM. Dos versiones de la epidemiología social: entre el centro y la periferia. Med UNAB. 2009 [acesso em 2019 dez 20]; 12(1):22-6. Disponível em: https://revistas.unab.edu.co/index.php/medunab/article/view/47.
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No quesito ano de publicação, a maioria era posterior a 2010 (62,5%); seguida de artigos publicados nos anos 2000-10 (35,0%). Apenas um único estudo datava de 1979, um clássico sobre o suicídio e suas causas, que não tratou de fatores de risco, mas da própria estrutura e instituições sociais como determinantes da indiferença e anormalidade presentes no cotidiano1919 Hopper K, Gutmacher S. Rethinking suicide: notes toward a critical epidemiology. Int. j. health serv. 1979 [acesso em 2019 dez 20]; 9(3):417-38. Disponível em: https://doi.org/10.2190/pve5-abq7-xaq1-1gyf.
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Quanto aos veículos de publicação, a maioria dos artigos (47,5%) foi publicada em revistas de saúde pública (22,5%), saúde coletiva (12,5%) ou epidemiologia (12,5%). A revista de maior projeção foi a revista colombiana da Faculdade Nacional de Saúde Pública (15,0%), seguida pela ‘Revista Brasileira de Epidemiologia’ (10,0%) e a de ‘Ciência e Saúde Coletiva’ (7,5%). As demais eram de campos diversos tais como: enfermagem, ciências sociais, psicologia, geografia, antropologia, direitos humanos, saúde global, saúde comunitária, políticas e serviços de saúde.

Modelo teóricos de análise

Considerando os níveis de análise propostos, 34,6% dos artigos não continha nenhum modelo ou não se aplicava, de fato, ao estudo. O modelo de análise mais frequentemente concebido foi denominado por Breilh33 Spiegel JM, Breilh J, Yassi A. Why language matters: insights and challenges in applying a social determination of health approach in a North-South collaborative research program. Global Health. 2015 [acesso em 2019 dez 16]; (11):9. Disponível em: https://doi.org/10.1186/s12992-015-0091-2.
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,1111 Breilh J. Salud pública, universidad y poder. La universidad que queremos. Rev. salud pública (Bogota). 2019 [acesso em 2019 dez 15]; 37(1):8-14. Disponível em: https://doi,org/10.17533/udea.rfnsp.v37n1a03.
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como GPS (23,1%) – denotando as camadas gerais ou estruturais, particulares ou de modo de vida e singulares ou de estilo de vida na determinação social da saúde; seguido pela análise micro, meso e macro (17,3%). Outras formas de análise foram as relativas aos processos protetores e destrutivos (11,5%) e às matrizes 4S (7,7%), com os diferentes níveis de justiça: saúde-biossegurança; ambiente-sustentabilidade; social-solidariedade e o cognitivo ou da interculturalidade-soberania. Mencionou-se, ainda, o modelo relativo à saúde real, atual e ontológica; além de modelos mais tradicionais, como o das caixas chinesas, o ecoepidemiológico e o ecossocial. Uma grande parte apresentou mais de um modelo no artigo (30,0%), o que denota um avanço metodológico digno de nota.

Vale à pena nos determos um pouco mais nas ferramentas desenvolvidas para as práticas emancipatórias, já que guardam elementos favoráveis à emancipação humana, mas ainda resvalam na emancipação política. Isso era de se esperar, uma vez que estamos inscritos e moldados no sistema capitalista, em suas diferentes formas política, ideológica e cultural, além de jurídica. Nossos filtros são atravessados pelos aparatos cognitivos do sistema, com alguns pontos cegos. Por exemplo, no caso da matriz de processos críticos, os níveis estruturais, particulares e singulares fazem com que percebamos as causas mais distais e as raízes para a situação encontrada do ponto de vista singular ou biológico33 Spiegel JM, Breilh J, Yassi A. Why language matters: insights and challenges in applying a social determination of health approach in a North-South collaborative research program. Global Health. 2015 [acesso em 2019 dez 16]; (11):9. Disponível em: https://doi.org/10.1186/s12992-015-0091-2.
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No entanto, as dimensões estão permeadas pelo consumo e pelas formas de organização e participação político democráticas2020 Carmona-Fonseca J, Correa AMB. Social determination of malnutrition and psychomotor retardation in preschool children in Urabá (Colombia). An analysis based on Social Epidemiology. Rev. Fac. Nac. Salud Pública. 2014 [acesso em 2020 abr 24]; 32(1):40-51. Disponível em: http://www.scielo.org.co/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0120-386X2014000100005&lng=en.
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, ainda que estas sejam as bases atuais para enxergarmos as contradições existentes e deslocadas propositalmente. Devemos, pois, ter cuidado de não cair nas armadilhas do sistema para sua explicação, já que impedem a transformação.

Ainda que abrangente, sempre escapa à análise um ou outro elemento, como lembrou Briggs2121 Briggs CL. Perspectivas críticas de salud y hegemonía comunicativa: aperturas progresistas, enlaces letales. Rev Antropol Soc. 2006 [acesso em 2019 dez 20]; (14):101-124. Disponível em: https://doi,org/10.5209/rev.RASO.2005.v14.10271.
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em relação à comunicação em saúde e suas formas hegemônicas que hierarquizam o público conforme categorias de conveniência ao sistema capitalista, homogeneizando-as, mas contendo mensagens carregadas de contradições.

Métodos de pesquisa e práticas propostas: velhos e novos paradigmas

É interessante observar que apenas 10,0% dos artigos não mencionam a epidemiologia clássica. A maioria, mesmo que com muitas críticas e ressalvas, ainda se ancora em suas bases para fomentar e amadurecer os novos paradigmas. Predominantemente (37,5%), foi considerada uma ciência positivista, de risco individual, causal, a-histórica e apolítica. Outros 27,5% a nomeiam como ciência hegemônica, linear e biomédica, sem efetividade nas intervenções de saúde das populações. Em 7,5% dos estudos, foi lembrado seu caráter funcional e mecanicista; ademais, outros 7,5% tacharam-na de estar a serviço do Estado, medicalizando a vida e responsabilizando os indivíduos por sua saúde. Enfim, é considerada ultrapassada e descontextualizada, ligada à saúde global e às urgências, sem avaliação alguma da estrutura e dinâmica do poder.

Na órbita do novo paradigma, 65,0% dos artigos mencionaram a epidemiologia crítica isoladamente ou acompanhada da epidemiologia social (20%). Poucas vezes foi relacionada a outras ciências, como a geografia ou a psicologia crítica, ou mesmo a uma categoria interseccional, como, por exemplo, o gênero, em busca de uma epidemiologia que fosse capaz de dar conta do feminismo1313 Inhorn MC, Whittle KL. Feminism meets the ‘‘new’’ epidemiologies: toward an appraisal of antifeminist biases in epidemiological research on women’s health, Soc. sci. med. 2001 [acesso em 2020 abr 15]; (53):553-567. Disponível em: https://doi.org/10.1016/S0277-9536(00)00360-9.
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. Foram também mencionados outros termos, raramente, como a epidemiologia alternativa ou popular. Mais raro ainda (2,5%) foi a menção aos determinantes sociais de saúde, ao contrário da determinação social, enfatizada inúmeras vezes e aprofundada na maioria dos artigos. Bem consolidada na América Latina, a epidemiologia crítica ainda é pouco conhecida e valorizada, embora haja uma quantidade infinitamente superior de artigos relacionados à epidemiologia clínica ou clássica.

Em resposta à questão acerca da ruptura em relação às práticas tradicionais, 57,5% obtiveram análises positivas, enquanto outros 37,5% apresentaram apenas mudanças incrementais. Alguns poucos artigos encontram-se no meio do caminho, lançando as bases para uma ruptura futura. Um ponto muito importante é que apenas 8,7% apresentaram de fato uma proposta de ruptura total com as práticas tradicionais1111 Breilh J. Salud pública, universidad y poder. La universidad que queremos. Rev. salud pública (Bogota). 2019 [acesso em 2019 dez 15]; 37(1):8-14. Disponível em: https://doi,org/10.17533/udea.rfnsp.v37n1a03.
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,2222 Rigotto RM, Carneiro FF, Marinho AMCP, et al. O verde da economia no campo: desafios à pesquisa e às políticas públicas para a promoção da saúde no avanço da modernização agrícola. Ciênc. saúde coletiva. 2012 [acesso em 2020 maio 6]; 17(6):1533-1542. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1413-81232012000600017.
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, enquanto a maioria figurava em torno de rupturas de partes das abordagens tradicionais da epidemiologia clássica, misturando as duas formas ou mesmo tomando-a como base, ainda que a criticando.

Com relação ao método de pesquisa, 47,5% não utilizaram qualquer método, pois não se aplicava ao tipo de estudo, no caso, teórico. Dos que utilizaram uma metodologia, a maioria foi qualitativa (50,0%), seguida de estudos mistos (quali-quanti, com 35,7%), e apenas 14,3% utilizaram metodologia quantitativa isoladamente. As principais técnicas foram os grupos focais, entrevistas, etnografia, observação participante, oficinas, cartografia e análise documental; além de matrizes de processos críticos com fatores protetores e nocivos – 4S ou GPS –; e estudos descritivos ou exploratórios.

Quanto às práticas propostas, a maioria foi voltada ao pensamento, análise e ação crítica (35,0%) concernentes aos fatores estruturais tais como o ambiente, a ecologia, a história, economia, cultura e aspectos sociais, trabalhados de forma transdisciplinar. O grande desafio, neste caso, é estudar mais de uma dimensão de forma simultânea, tentando compreender as contradições entre aparência e essência e reconstruir a totalidade, desvelando as formas nocivas impostas pelo sistema2323 Samaja J. Desafíos a la epidemiología (pasos para una epidemiología “Miltoniana”). Rev. bras. epidemiol. 2003 [acesso em 2020 abr 24]; 6(2):105-120. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-790X2003000200005&lng=en.
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Na sequência, os estudos foram voltados às práticas de epidemiologia social (12,5%), relacionados ao ambiente, à agricultura, aos acidentes de trânsito, à desnutrição e ao alcoolismo. Outros 10,0% dos artigos versavam sobre maior participação social, principalmente na área da saúde e agricultura, e 7,5% tratavam de redução de iniquidades sociais, garantia de direitos humanos e comunicação em saúde. As demais práticas eram mais esparsas e lidavam com temas variados, como a determinação cibernética, a advocacia, vigilância, planejamento em saúde, integralidade na atenção à saúde e transformações sociais. É interessante perceber como a advocacia se apoia sobre a epidemiologia clássica, de forma a se tornar mais convincente aos dirigentes públicos, com a exibição de indicadores e métodos ‘objetivos’2424 Prussing E. Critical Epidemiology in action; Research by and for indigenous peoples. SSM Popul Health. 2018 [acesso em 2019 dez 20]; (6):98-106. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.ssmph.2018.09.003.
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Imperialismo, Estado e democracia

No que tange à presença de uma visão imperialista-colonizadora na discussão do artigo, 20,0% nem se aproximaram do tema, enquanto as abordagens mais frequentes foram o fundamentalismo econômico ou de mercado (17,5%), em conjunto com a perda de direitos humanos e de soberania, e a flexibilização do trabalho. O modelo do agronegócio e a expropriação da terra (15,0%) cursam com exposição dos trabalhadores aos agrotóxicos e à violência nos conflitos sobre a posse da terra, envolvendo grupos de narcotraficantes e paramilitares.

Outros 12,5% dos artigos narram experiências acerca do colonialismo, com acúmulos históricos de desvantagens experimentadas por categorias de etnia e gênero, além das diferenças na determinação social entre os hemisférios Norte e Sul. Os demais, de forma mais difusa, tratam de gradientes urbano-rurais, práticas de hegemonia cultural na saúde; gestão do conhecimento e sucursalismo nas universidades, na definição de agendas de pesquisa e na seletividade de recursos aos temas hegemônicos; crises econômicas e ajustes estruturais; degradação ambiental e saúde animal.

Considerando a maioria dos estudos com origem na América Latina, é fundamental que a noção de capitalismo dependente seja ressaltada, pois explica a subsoberania e a superexploração imposta aos trabalhadores, quando não a expropriação de todas as formas de existência, até mesmo de nossa subjetividade2525 Osório J. Caderno Sobre superexploração e capitalismo dependente. C R H, Salvador. 2018 [acesso em: 2019 dez 20]: 31(84):483-500. Disponível em https://doi.org/10.1590/S0103-49792018000300004.
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Sobre a democracia, a participação popular e as instituições envolvidas, uma grande parte não aprofundou o tema (35,0%). Partes iguais (19,2% cada) mencionaram as lutas políticas por direitos humanos e os movimentos sociais na participação do ciclo de políticas públicas, sendo muitas vezes estimulada e somente assegurada a participação por meio de recursos financeiros como moeda de troca; ou seja, é sempre acerca da emancipação política, na melhor das hipóteses, envolvendo a tecnoburocracia, os representantes do capitalismo e os privilégios em jogo. Em 11,5% dos artigos, a participação está aliada à interculturalidade e à diversidade de saberes, no intuito de ampliar a democracia.

Nesse ponto, podemos detectar um grande paradoxo, pois a forma política do sistema capitalista, a democracia, impõe sérios limites à ausculta verdadeira de outros saberes, normalmente apenas para legitimar o que já foi decidido, daí a transparência acaba funcionando apenas como vitrine político-eleitoral. Devemos entender que a democracia é a forma política do capitalismo, responsável por abstrações e seletividades próprias, como nos lembra Chasin2626 Chasin J. Democracia política e emancipação humana. Verinotio – Rev. Educ. Ciênc. Hum. 2013 [acesso em 2019 dez 20]; (15):22-27. Disponível em: http://www.verinotio.org/sistema/index.php/verinotio/article/view/156.
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. Assim, na democracia “não se entra ou se sai por inteiro”2626 Chasin J. Democracia política e emancipação humana. Verinotio – Rev. Educ. Ciênc. Hum. 2013 [acesso em 2019 dez 20]; (15):22-27. Disponível em: http://www.verinotio.org/sistema/index.php/verinotio/article/view/156.
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(25), ela deve servir apenas como mediação à emancipação humana.

A própria participação em ciclo de políticas públicas fica comprometida, pois, em verdade, é uma abstração. Não existe ciclo, mas justaposição de etapas distintas, e normalmente apenas as últimas etapas admitem alguma forma de participação. Raríssimas vezes, observamos participação mais ampla e intercultural, por exemplo, na definição da agenda de políticas públicas. Quando ocorre a participação da população como moeda de troca, então compreendemos o valor dessa troca, reificando os sujeitos e determinando sua sociabilidade pautada de forma egoísta e individualista2727 Gómez GE, López MV, Ochoa SC, et al. Matriz de procesos críticos: propuesta para estudiar condiciones de vida y salud. Invest. educ. enferm. 2007; (25)1:20-28..

Outros três artigos (7,5%) denunciam o Estado como ente policialesco, mediador do risco ambiental e também comprador de uma ciência que se tornou mercadoria, além de temas como a reforma agrária, o engajamento social e a vigilância à saúde, de forma participativa e inovadora. Um ponto importante é que os artigos mencionam a maior participação de pequenos produtores rurais e de idosos; estes últimos também ansiosos por momentos de integração social, esperando, porém, que essa iniciativa venha do Estado. Por fim, apenas um único artigo discorre sobre a verdadeira emancipação humana, envolvendo direitos sociais e ambientais2222 Rigotto RM, Carneiro FF, Marinho AMCP, et al. O verde da economia no campo: desafios à pesquisa e às políticas públicas para a promoção da saúde no avanço da modernização agrícola. Ciênc. saúde coletiva. 2012 [acesso em 2020 maio 6]; 17(6):1533-1542. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1413-81232012000600017.
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Interculturalidade, práticas de saúde e meio ambiente

Acerca da interculturalidade, 17,5% não fizeram menção ao tema. A maioria (22,5%) versava sobre a relação do indivíduo em relação a um grupo coletivo, ou de como o biológico é incorporado ao social, aliado à gestão do conhecimento e à preocupação da ciência-mercadoria nesse campo. É importante ressaltar que 17,5% dos estudos apresentaram a questão da sociologia da ausência44 Santos BS. Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia de saberes. Novos estudos CEBRAP. 2007 [acesso em 2019 nov 15]; (79):71-94. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0101-33002007000300004.
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, ou seja, a interculturalidade aparece como forma de reduzir a invisibilidade de categorias vulneráveis e pouco ouvidas, essencial até na definição da agenda de pesquisas.

Outros 15,0% mencionam o saber ancestral e o modo de produção calcado nessa sabedoria, além da construção social do espaço. Outros artigos mencionam a importância da interculturalidade na concepção de educação em saúde como direito; na interpretação recíproca, formação e mobilização de pessoas, e até na própria atenção à saúde; além da consideração sobre os saberes intergeracionais e os rituais, como mecanismo de ausculta e interação, com base no direito à saúde em casos concretos.

Com relação à resposta às práticas de saúde e às voltadas ao meio ambiente, a grande maioria (60,0%) não mencionou ou aprofundou o tema. Os tópicos examinados abarcavam a autoconsciência sanitária, a ressignificação da subjetividade e a organização do meio-ambiente (31,3%); além do metabolismo socioambiental (25,0%) e da comunicação de vivências e saberes ancestrais ligados ao ambiente (25,0%), em justaposição ao tema da interculturalidade. Esse é um aspecto muito importante, pois o sistema capitalista domina a natureza inteiramente, deixando pouco espaço a práticas alternativas, voltadas ao meio-ambiente, muito menos relacionadas às mudanças climáticas ou às relações entre degradação do meio-ambiente e saúde coletiva. O território também foi mencionado várias vezes como espaço de construção social e de delimitação de poder, relacionando-se intimamente à situação de saúde da população2828 Ortunio EE. Aspectos territoriales, geoecológicos y demográficos del estado Carabobo: bases para la comprensión de las desigualdades en salud. Comun. salud. 2011; 9(2):15-33..

Vulnerabilidade e interseccionalidade

Por fim, as questões relativas à vulnerabilidade e interseccionalidade trouxeram muitos temas relevantes tais como a dimensão socioambiental (40,0%), o patriarcalismo como cultura vigente (22,5%) e a violência (15,0%). Sobre a dimensão socioambiental e seus impactos na saúde, foi mencionado o Estado insuficiente, a identidade cultural na conformação de nação; a acumulação capitalista, o desgaste no trabalho e no transporte, a deterioração e o consumo em massa, a degradação ambiental, o ambiente tóxico e estressante, as aglomerações, as altas taxas de natalidade e de prevalência de doenças crônicas, as diferentes formas de adoecimento e as emergências sociossanitárias, o atendimento às necessidades de saúde, a garantia de direitos humanos e sociais, a consolidação do SUS e as relações transversais de poder, gênero, etnia, classe social e ocupação, além das diferenças intergeracionais.

A vulnerabilidade é conceituada como falta de potência em agir em prol da garantia dos direitos humanos, marginalização e opressão, exclusão e segregação como mecanismos de atuação, além da acumulação histórica2929 Sevalho G. The concept of vulnerability and health education based on the theory laid out by Paulo Freire. Interface (Botucatu). 2018 [acesso em 2019 dez 20]; 22(64):177-88. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1807-57622016.0822.
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,3030 Zaldúa G, Pawlowicz MP, Longo R, et al. Right’s infringement and alternatives to exigibility in communitarian health. Anu. investig. – Fac. Psicol., Univ. B. Aires. 2013 [acesso em 2020 abr 24]; 20(1):265-275. Disponível em: http://www.scielo.org.ar/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1851--16862013000100027&lng=en&tlng=en.
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A cultura patriarcal determina baixos níveis de educação e qualificação para as mulheres, que têm reduzidas oportunidades, poucos serviços disponíveis e condições de vida precárias, que são transmitidas aos filhos, como a desnutrição e falhas no desenvolvimento psicomotor e cognitivo. Permeia a concentração e demarcação de terras, os conflitos armados e pode ser percebida facilmente na violência ao redor e no interior dos núcleos familiares. Está presente até na produção do conhecimento, donde é citada uma ‘epistemologia machista’; daí a importância de os pesquisadores passarem pelo processo de posicionamento e reflexão acerca de seu papel na pesquisa e da percepção dos pesquisados3131 Brisbois BW, Almeida PP. Attending to Researcher Positionality in Geographic Fieldwork on Health in Latin America: Lessons from La Costa Ecuatoriana. J. Latin Am. Geogr. 2017 [acesso em 2019 dez 20]; 16(1):194-201. Disponível em: https://doi.org/10.1353/lag.2017.0005.
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,3232 Ventres WB, Fort MP. Eyes wide open: an essay on developing an engaged awareness in global medicine and public health. BMC int. health hum. rights. 2014 [acesso em 2019 dez 20]; (14):29. Disponível em: http://www.biomedcentral.com/1472-698X/14/29.
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Com relação à violência e ao conflito, além da relação de classe social, gênero e etnia, são destacados também os imigrantes e refugiados, marginalizados, que necessitam da tutela de um Estado3030 Zaldúa G, Pawlowicz MP, Longo R, et al. Right’s infringement and alternatives to exigibility in communitarian health. Anu. investig. – Fac. Psicol., Univ. B. Aires. 2013 [acesso em 2020 abr 24]; 20(1):265-275. Disponível em: http://www.scielo.org.ar/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1851--16862013000100027&lng=en&tlng=en.
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– segundo ele próprio – para decidir como aproveitar melhor seu tempo, como, por exemplo, o direito à prática esportiva3333 Camargo DA, Gómez EA, Ovalle J, et al. La cultura física y el deporte: fenómenos sociales. Rev. salud pública (Bogota). 2013; 31(s1):S116-S125., que acaba se transmutando numa relação conflituosa. Há estudos que alertam também para as falsas categorizações2323 Samaja J. Desafíos a la epidemiología (pasos para una epidemiología “Miltoniana”). Rev. bras. epidemiol. 2003 [acesso em 2020 abr 24]; 6(2):105-120. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-790X2003000200005&lng=en.
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, que escondem as verdadeiras e importantes contradições do capital internacional, que se encontram cristalizadas e naturalizadas, irreconhecíveis, como a segregação socioespacial, a mobilidade diferenciada, a falta de oportunidades e os pensamentos hegemônicos que chegam a todo momento como mensagens subliminares2121 Briggs CL. Perspectivas críticas de salud y hegemonía comunicativa: aperturas progresistas, enlaces letales. Rev Antropol Soc. 2006 [acesso em 2019 dez 20]; (14):101-124. Disponível em: https://doi,org/10.5209/rev.RASO.2005.v14.10271.
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Os níveis de justiça

Dessas várias interseções observadas e analisadas das variáveis explicitadas e esquadrinhadas acima, carregadas com tintas de diferentes cores e texturas e projetadas sobre espaços de luz e sombra, um desenho claro-escuro se conformava e ganhava corpo, compasso e potência, após um breve intervalo de suspensão e síntese1515 Tufanaru C. Theoretical foundations of meta-aggregations: insights from Husserlian phenomenology and American pragmatism. [tese]. Adelaide: The University of Adelaide; The Joanna Briggs Institute; 2015. 123 p.. A figura 2 apresenta esses tensionamentos entre as vertentes políticas e humanas da emancipação em cada nível de justiça, que são descritos com mais detalhes a seguir. A partir dessa visão quase caleidoscópica, é possível observar como o nível de justiça da saúde, o socioambiental e o cognitivo transformam-se, acumulam-se e almejam sempre sua superação, sendo subsumidos nesse processo pelos demais.

Figura 2
Níveis de justiça e tensionamentos entre emancipação política (seta cinza-claro) e humana (seta cinza-escuro)

O nível de justiça cognitiva envolve os demais, pois dele depende a razão do mundo, a fetichização da consciência, a barbárie e o pensamento abissal, cujas linhas dividem o mundo entre os visíveis e os invisíveis44 Santos BS. Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia de saberes. Novos estudos CEBRAP. 2007 [acesso em 2019 nov 15]; (79):71-94. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0101-33002007000300004.
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,3434 Chasin J. Marx, hoje: da razão do mundo ao mundo sem razão. Nova Escr. Ensaio. 1983; (11/12):7-47.,3535 Dardot P, Laval C. A nova razão do mundo. Ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo; Boitempo: 2006.. As ações afirmativas e segmentadas, a fragmentação dos movimentos sociais identitários denotam as práticas de emancipação política e cidadania, com incremento da participação e controle social e do envolvimento por meio das políticas públicas, em todas as suas fases3636 Wemrell M, Merlo J, Mulinari S, et al. Contemporary Epidemiology: A Review of Critical Discussions Within the Discipline and A Call for Further Dialogue with Social Theory. Soc. Compass. 2016 [acesso em 2019 out 16]; 10(2):153-171. Disponível em: https://doi.org/10.1111/soc4.12345.
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,3737 Krieger N. Refiguring “race”: epidemiology, racialized biology, and biological expressions of race relations. Int. j. health serv. 2000 [acesso em 2019 dez 20]; 30(1):211-6. Disponível em: https://doi.org/10.2190/672j-1ppf-k6qt-9n7u.
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. No entanto, permanecem as ausências e a invisibilidade nesse processo, como a genealogia das políticas evidencia. As lutas fragmentam-se ora em relação ao imperialismo ora em relação ao racismo ora em relação ao machismo-patriarcalismo ou mesmo em algumas pautas combinadas, mas dificilmente em relação à totalidade das relações sociais vigentes no sistema capitalista1313 Inhorn MC, Whittle KL. Feminism meets the ‘‘new’’ epidemiologies: toward an appraisal of antifeminist biases in epidemiological research on women’s health, Soc. sci. med. 2001 [acesso em 2020 abr 15]; (53):553-567. Disponível em: https://doi.org/10.1016/S0277-9536(00)00360-9.
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,2424 Prussing E. Critical Epidemiology in action; Research by and for indigenous peoples. SSM Popul Health. 2018 [acesso em 2019 dez 20]; (6):98-106. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.ssmph.2018.09.003.
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,3838 Edelman N. Towards a critical epidemiology approach for applied sexual health research. J health Psychol. 2018 [acesso em 2019 dez 20]; 23(2):161-174. Disponível em: https://doi.org/10.1177/1359105317743768.
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A sociedade sob o capitalismo transformou-se em uma sociedade de risco, onde imperam o medo e o controle sobre o indivíduo, que está subjugado pelo poder biomédico, que se alastra por meio dos organismos internacionais e obriga a um gerenciamento completo da vida e da saúde, como uma máquina de autorregulação2121 Briggs CL. Perspectivas críticas de salud y hegemonía comunicativa: aperturas progresistas, enlaces letales. Rev Antropol Soc. 2006 [acesso em 2019 dez 20]; (14):101-124. Disponível em: https://doi,org/10.5209/rev.RASO.2005.v14.10271.
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,3939 Acero-Aguilar M. Zoonosis y otros problemas de salud pública relacionados con los animales: reflexiones a propósito de sus aproximaciones teóricas y metodológicas. Rev Gerenc. Polít Salud. 2016 [acesso em 2020 abr 14]; 15(31):232-245. Disponível em: http://dx.doi.org/10.11144/Javeriana.rgyps15-31.
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. Alia-se a esse modelo um grande sistema de informações que invisibilizam e excluem vários grupos contra-hegemônicos. Do ponto de vista da ciência, o mundo divide-se entre centro e periferia, reproduzindo o movimento do capital, tendo o conhecimento se transformado também em fator produtivo, atrelado ao mercado internacional88 Arreaza ALV. Epidemiologia crítica: por uma práxis teórica do saber agir. Ciênc. saúde coletiva. 2012 [acesso em 2019 dez 15]; 17(4):1001-13. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1413-81232012000400022.
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,1818 Perrilla MM. Dos versiones de la epidemiología social: entre el centro y la periferia. Med UNAB. 2009 [acesso em 2019 dez 20]; 12(1):22-6. Disponível em: https://revistas.unab.edu.co/index.php/medunab/article/view/47.
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Nossa submissão é tão vasta, que é cultural, cognitiva e até linguística. Assim, muitos dos termos utilizados na saúde coletiva são provenientes de outras áreas e levados com significados de verniz neoliberal, ainda que os conceitos originais tivessem as melhores das intenções. Sem percebermos, estamos imbuídos dessas ideias e valores, inclusive reproduzindo-os, tal como acontece com os termos ‘empoderamento’ e ‘promoção da saúde’, que denotam práticas tão caras à saúde coletiva, embora expressem simultaneamente as ideias fora do lugar. É preciso todo o cuidado ao nos determos nesses conceitos e práticas1111 Breilh J. Salud pública, universidad y poder. La universidad que queremos. Rev. salud pública (Bogota). 2019 [acesso em 2019 dez 15]; 37(1):8-14. Disponível em: https://doi,org/10.17533/udea.rfnsp.v37n1a03.
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,2929 Sevalho G. The concept of vulnerability and health education based on the theory laid out by Paulo Freire. Interface (Botucatu). 2018 [acesso em 2019 dez 20]; 22(64):177-88. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1807-57622016.0822.
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Assim, para vencer o controle e o choque impostos, é necessário potência e pulsão de vida que nos levem a lutar contra as injustiças históricas acumuladas, contra toda forma de opressão e dominação de classe, gênero e etnia. Para tanto, avançaremos apenas com o enfrentamento às contradições intrínsecas ao capital material e simbólico, com o desvelar das falsas contradições criadas e, enfim, nos será dada a possibilidade de reconstituição da totalidade invisível, que explica as partes em sucessivas aproximações e tentativas2323 Samaja J. Desafíos a la epidemiología (pasos para una epidemiología “Miltoniana”). Rev. bras. epidemiol. 2003 [acesso em 2020 abr 24]; 6(2):105-120. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-790X2003000200005&lng=en.
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Dessa forma, é necessário desmistificar as ideologias de comunicação e de informação presentes, que distorcem a realidade e hierarquizam a sociedade2121 Briggs CL. Perspectivas críticas de salud y hegemonía comunicativa: aperturas progresistas, enlaces letales. Rev Antropol Soc. 2006 [acesso em 2019 dez 20]; (14):101-124. Disponível em: https://doi,org/10.5209/rev.RASO.2005.v14.10271.
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. As diferentes vozes estarão presentes e os invisíveis serão finalmente percebidos por meio de uma ciência ‘sentipensante’, que valorize as subjetividades, a interculturalidade, os saberes e práticas ancestrais, inclusive dos países periféricos1111 Breilh J. Salud pública, universidad y poder. La universidad que queremos. Rev. salud pública (Bogota). 2019 [acesso em 2019 dez 15]; 37(1):8-14. Disponível em: https://doi,org/10.17533/udea.rfnsp.v37n1a03.
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. Nosso déficit cognitivo é tão forte que somente com a definição conjunta de prioridades e de agendas de pesquisa inclusivas seremos capazes de desconstruir a atual rede criada de saberes e práticas, dada como imutável e totalmente necessária ao desenvolvimento econômico e à sobrevivência4040 Mascaro AL. Estado e Forma Política. São Paulo: Boitempo; 2013..

O nível socioambiental foi construído com base no metabolismo socionatural, onde meio ambiente não é entorno, e sim componente histórico. Algumas indagações surgiram inicialmente: os níveis social e ambiental deveriam ser construídos juntos ou separados? Deveríamos colocar o nível ambiental como natural e o social como passível de modificação nas estruturas e instituições? Ou juntos, pensando no metabolismo socionatural que Juan Samaja tanto defende? Meio ambiente não é exterior à totalidade-sujeito; é um componente de sua história e é inerente à sua complexidade organizada. Assim, Samaja2323 Samaja J. Desafíos a la epidemiología (pasos para una epidemiología “Miltoniana”). Rev. bras. epidemiol. 2003 [acesso em 2020 abr 24]; 6(2):105-120. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-790X2003000200005&lng=en.
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nos convenceu definitivamente da necessidade de considerá-los em conjunto, junto às ponderações que se seguem, de Milton Santos4141 Santos M. A natureza do espaço. São Paulo: Editora Hucitec; 1996. e Jaime Breilh4242 Breilh J. La epidemiología crítica: una nueva forma de mirar la salud en el espacio urbano. Salud Colect. 2010; 6(1):83-101..

Os ecossistemas correspondem a socio ecossistemas, pois são atravessados por relações sociais que determinam a lógica de equidade dos processos humanos e de sua artificialização, com as seguintes escolhas: a construção ou segregação dos espaços socionaturais; a sustentabilidade ou, contrariamente, a perda de biomassa e biodiversidade; a construção de padrões sociais de proteção ou vulnerabilidade dos ecossistemas ligados à produção econômica e ao consumo; e, finalmente, aos tipos de impacto à vida4141 Santos M. A natureza do espaço. São Paulo: Editora Hucitec; 1996..

Breilh4242 Breilh J. La epidemiología crítica: una nueva forma de mirar la salud en el espacio urbano. Salud Colect. 2010; 6(1):83-101., em seu artigo sobre espaço urbano, trabalha com categorias sociais do particular e singular em relação ao contexto ambiental, fornecendo também as pistas para a integração entre os níveis. Nessas dimensões, as questões postas são de produção ou trabalho e consumo, identidade, empoderamento, organização social e relação com a natureza. Ao mesmo tempo, são identificados modelos de desenvolvimento nocivos, com a flexibilização do trabalho e o estabelecimento de relações sucursais, na perspectiva do capitalismo dependente e de suas graves repercussões socioambientais1111 Breilh J. Salud pública, universidad y poder. La universidad que queremos. Rev. salud pública (Bogota). 2019 [acesso em 2019 dez 15]; 37(1):8-14. Disponível em: https://doi,org/10.17533/udea.rfnsp.v37n1a03.
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,2525 Osório J. Caderno Sobre superexploração e capitalismo dependente. C R H, Salvador. 2018 [acesso em: 2019 dez 20]: 31(84):483-500. Disponível em https://doi.org/10.1590/S0103-49792018000300004.
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Já o filósofo Mészáros caracteriza a configuração atual do capitalismo como uma “crise histórica sem precedentes, estrutural, profunda, do próprio sistema do capital – universal, global, extensa e rastejante4343 Mészáros I. A crise estrutural do capital. São Paulo: Boitempo; 2009(795)”, constatando o desenvolvimento do novo modelo de acumulação de capital, que não só trabalha mediante a extração de mais-valia e os tradicionais mecanismos de mercado, mas desenvolve práticas predatórias, a fraude e a extração violenta, aproveitando as desigualdades e as assimetrias entre os grupos sociais, para pilhar os recursos dos mais frágeis, produzindo injustiças e racismo ambiental ou fascismo territorial. Este é caracterizado como a negação e desqualificação dos modos de vida tradicionais, igualando formas artesanais e ecológicas ao atraso no desenvolvimento econômico, forçando o deslocamento desses grupos, mesmo sob regimes políticos de democracias liberais44 Santos BS. Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia de saberes. Novos estudos CEBRAP. 2007 [acesso em 2019 nov 15]; (79):71-94. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0101-33002007000300004.
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As questões ambientais foram conduzidas quase sempre em separado da dimensão social mais profunda das relações de poder nelas contidas. Assim, as lutas acabam por dirigirem-se aos direitos sociais, econômicos, trabalhistas e ambientais, reduzindo-se à demarcação de terras e propriedades de comunidades étnicas historicamente injustiçadas. Essa trajetória é marcada também por grandes desastres ambientais, que não devem ser considerados como eventos ‘naturais’; ao contrário, são causados pela ação humana e provocam grandes desequilíbrios ecológicos. Somos a sociedade que resolve seus problemas pelo ‘fuzil sanitário’ e pela segregação socioespacial, tamanho o medo de contaminação e a necessidade de controlar e isolar as pessoas e os animais que possam transmitir doenças ou contrariar as classes dominantes com suas demandas por justiça, afrontando o lucro desenfreado e o modo de produção periférico, de superexploração3939 Acero-Aguilar M. Zoonosis y otros problemas de salud pública relacionados con los animales: reflexiones a propósito de sus aproximaciones teóricas y metodológicas. Rev Gerenc. Polít Salud. 2016 [acesso em 2020 abr 14]; 15(31):232-245. Disponível em: http://dx.doi.org/10.11144/Javeriana.rgyps15-31.
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Novas formas de desenvolvimento econômico verde são identificadas com base na mecanização da agricultura monocultora realizada por grandes empresas agroindustriais, muitas provenientes dos países centrais geridas por multinacionais, com uso de agrotóxicos e recursos biotecnológicos em territórios periféricos2222 Rigotto RM, Carneiro FF, Marinho AMCP, et al. O verde da economia no campo: desafios à pesquisa e às políticas públicas para a promoção da saúde no avanço da modernização agrícola. Ciênc. saúde coletiva. 2012 [acesso em 2020 maio 6]; 17(6):1533-1542. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1413-81232012000600017.
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. Assim, muito além da reprodução do capital, ocorre a expropriação da terra e dos meios de vida para a população residente, que apresenta, todavia, formas alternativas de produzir no campo, de maneira responsável com o meio-ambiente, de forma agroecológica.

A bioeconomia verde, apesar de sua possibilidade de utilizar matérias-primas renováveis e ser promissora em relação à sustentabilidade, não encerra os meios para garanti-la sem que se repensem as relações sociais de trabalho, produção e consumo entre países centrais e periféricos, que devem ser calibradas por uma velocidade compatível com a preservação e regeneração dos ecossistemas e da vida humana4444 Abramovay R. Muito além da economia verde. São Paulo: Editora abril; 2012..

A desregulamentação é outra preocupação presente na atualidade, que flexibiliza a vida e a saúde humana, que cresce nas crises e explora e expropria os mais vulneráveis. O direito tornou-se, assim, a ferramenta ideal para impor as vontades e os privilégios de poucos sobre o bom senso e a coerência no ambiente social. As lutas decorrentes desse embate levam às denúncias sobre o racismo ambiental2222 Rigotto RM, Carneiro FF, Marinho AMCP, et al. O verde da economia no campo: desafios à pesquisa e às políticas públicas para a promoção da saúde no avanço da modernização agrícola. Ciênc. saúde coletiva. 2012 [acesso em 2020 maio 6]; 17(6):1533-1542. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1413-81232012000600017.
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, com a degradação, depredação e poluição ambiental, forçando milhares de pequenos produtores com práticas ecológicas a se deslocarem de suas terras, perdendo todas as suas condições objetivas de existência2222 Rigotto RM, Carneiro FF, Marinho AMCP, et al. O verde da economia no campo: desafios à pesquisa e às políticas públicas para a promoção da saúde no avanço da modernização agrícola. Ciênc. saúde coletiva. 2012 [acesso em 2020 maio 6]; 17(6):1533-1542. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1413-81232012000600017.
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,2828 Ortunio EE. Aspectos territoriales, geoecológicos y demográficos del estado Carabobo: bases para la comprensión de las desigualdades en salud. Comun. salud. 2011; 9(2):15-33.,4242 Breilh J. La epidemiología crítica: una nueva forma de mirar la salud en el espacio urbano. Salud Colect. 2010; 6(1):83-101.,4545 Franco-Cortés AM, Otálvaro-Castro GJ, Ochoa-Acosta E, et al. Inequidades en salud de la primera infancia en el municipio de Andes, Antioquia. Un análisis desde la epidemiología crítica. Rev. Gerenc. Polít. Salud. 2016 [acesso em 2019 dez 20]; 15(31):246-261. Disponível em: http://dx.doi.org/10.11144/Javeriana.rgyps15-31.ispi.
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Para enfrentar esse modelo de desenvolvimento econômico extrativista e indiferente às subjetividades, é preciso resgatar as práticas comunitárias e os espaços inclusivos, que atendam às necessidades coletivas, e vislumbrar novos modos de produção, consumo, organização e de relações e divisões de trabalho, desmistificando as relações sociais e de poder que atravessam esse modo de vida3030 Zaldúa G, Pawlowicz MP, Longo R, et al. Right’s infringement and alternatives to exigibility in communitarian health. Anu. investig. – Fac. Psicol., Univ. B. Aires. 2013 [acesso em 2020 abr 24]; 20(1):265-275. Disponível em: http://www.scielo.org.ar/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1851--16862013000100027&lng=en&tlng=en.
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,4646 Eslava Castañeda JC. Pensando la determinación social del proceso salud-enfermedad. Rev. salud pública (Bogota). 2017 [acesso em 2019 out 20]; 19(3):396. Disponível em: http://dx.doi.org/10.15446/ rsap.v19n3.68467.
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. As novas formas de flexibilização do trabalho, aproximando a mão de obra da escravidão e da servidão desvelam novas necessidades que vão muito além da luta pelos direitos trabalhistas, com a necessidade mais de ‘ser’ do que de ‘ter’, da busca pela liberdade para o modo de vida4747 Fromm E. Ter ou ser? Tradução Nathanael C. Caixeiro. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1987..

O nível de saúde, denota o tensionamento entre o bem viver e a possibilidade de escolha do modo de vida e as lutas fragmentadas pelos direitos à saúde universal, em contracorrente à espoliação dos serviços de saúde e à culpabilização dos grupos vulneráveis pelas epidemias1212 Briggs CL, Mantini-Briggs C. “Misión Barrio Adentro”: Medicina Social, Movimientos Sociales de los Pobres y Nuevas Coaliciones en Venezuela. Salud colect. 2007; 3(2):159-176.. Há que se considerar também a luta de determinados grupos pelo direito à doença, no sentido de reconhecimento de afecções desconsideradas pelas autoridades, com garantia de acesso aos cuidados de saúde nessas situações4848 Nunes JA. Saúde, direito à saúde e justiça sanitária. Rev. crit. cienc. sociais. 2009 [acesso em 2020 jul 4]; (87):143-169. Disponível em: https://doi.org/10.4000/rccs.1588.
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Nesse nível, subsumido pelos demais, podemos perceber que a luta pelos direitos sociais leva apenas a migalhas. A emancipação política é necessária para pavimentar o caminho até a emancipação humana, mas apenas é útil quando produz centelhas de novos modos de andar a vida. Os enfrentamentos da saúde coletiva, no sentido de ampliar as ações de vigilância à saúde, são muito pouco eficazes frente aos gigantescos esforços, numa sociedade onde o controle e a responsabilidade individual constituem a tônica. A prevenção da eclosão de novos e velhos males de saúde infectocontagiosos é relativamente infrutífera, uma vez que as ações deletérias no nível imediatamente anterior não cessam e têm o aval dos governos para prosperarem4949 Breilh J. De la vigilancia convencional al monitoreo participativo. Ciênc. saúde coletiva. 2003 [acesso em 2020 abr 24]; 8(4):937-951. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1413-81232003000400016.
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,5050 Pernalete ME, Lópes PV. De la crítica a la práctica en Epidemiologia, a la práctica de una Epidemiología crítica de costrucción sócio-comunitaria. Saber (Cumana). 2018; (30):37-52.. Cada vez mais, são associadas as causas socioambientais e os modelos econômicos extrativistas a novas e perigosas pandemias5151 Wallace R. Pandemia e agronegócio: doenças infecciosas, capitalismo e ciência. São Paulo: Editora Elefante; 2020..

A saúde coletiva deve, em última instância, utilizar seus saberes e práticas para reduzir as iniquidades sociais dos mais vulneráveis, ao mesmo tempo em que provoca um verdadeiro e humano encontro de subjetividades, seja na prática clínica, seja na pesquisa, em que não estejam dissolvidos nem na tecnoburocracia, nem na ciência ou nos dados2929 Sevalho G. The concept of vulnerability and health education based on the theory laid out by Paulo Freire. Interface (Botucatu). 2018 [acesso em 2019 dez 20]; 22(64):177-88. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1807-57622016.0822.
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,3030 Zaldúa G, Pawlowicz MP, Longo R, et al. Right’s infringement and alternatives to exigibility in communitarian health. Anu. investig. – Fac. Psicol., Univ. B. Aires. 2013 [acesso em 2020 abr 24]; 20(1):265-275. Disponível em: http://www.scielo.org.ar/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1851--16862013000100027&lng=en&tlng=en.
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Em nível sistêmico, devemos ter o direito de escolher nosso modo de vida e de bem viver. Para tanto, essa nova razão de mundo só irá aflorar se pudermos ir além das aparências genéricas e nos debruçarmos sobre as verdadeiras essências. Somente com a valorização de nossa essência comum e da subjetividade comunitária é que a vida será capaz de atravessar os demais níveis, como expressa Chasin:

Os homens desenvolveram suas forças essenciais em relação aos objetos da natureza, mas não foram capazes ainda de desenvolver suas forças essenciais relativas a si mesmos, ou seja, em relação à sociabilidade5252 Chasin J. Excertos sobre revolução, individuação e emancipação humana. Rev. Filosof. Ciênc. Hum. 2017 [acesso em 2020 mar 16]; 23(1):23-105. Disponível em: http://www.verinotio.org/sistema/index.php/verinotio/article/view/301.
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(31).

Diante do novo modelo de acumulação de capital, que envolve a reprodução ampliada do capital aliada à espoliação, com práticas predatórias, fraude e extração violenta, facilitada sobremaneira pelo direito das coisas, são urgentes a redução de desigualdades sociais e a luta contra as injustiças produzidas, a escravidão e servidão a que são submetidos os trabalhadores e o racismo ambiental. Mesmo com a expropriação da terra e até dos meios de vida e da própria subjetividade, há sempre alternativas, além das existentes e consideradas viáveis, de formas de produção saudáveis e seguras, humano-societárias, que estejam reproduzindo a sociedade e não a acumulação privada de capital44 Santos BS. Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia de saberes. Novos estudos CEBRAP. 2007 [acesso em 2019 nov 15]; (79):71-94. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0101-33002007000300004.
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,4343 Mészáros I. A crise estrutural do capital. São Paulo: Boitempo; 2009.

Não podemos nos satisfazer, tampouco, com o regime político do capitalismo, a democracia, por temor a formas ainda mais perversas de sociabilidade, quando esta já convive com o fascismo social quando lhe é conveniente44 Santos BS. Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia de saberes. Novos estudos CEBRAP. 2007 [acesso em 2019 nov 15]; (79):71-94. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0101-33002007000300004.
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. É imperativo superar suas limitações e contradições ao bem viver, ao genuinamente humano, que se perdeu nos interesses egoístas e individualistas estimulados todos os dias, sob formas político-jurídicas denominadas usualmente de interesse geral2626 Chasin J. Democracia política e emancipação humana. Verinotio – Rev. Educ. Ciênc. Hum. 2013 [acesso em 2019 dez 20]; (15):22-27. Disponível em: http://www.verinotio.org/sistema/index.php/verinotio/article/view/156.
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Assim, a saúde e a vida serão uma só categoria, do ponto de vista ético, com suficiente potência transformadora, energia social e consciência crítica sobre a mobilização necessária à construção social da saúde, dentro de uma nova sociabilidade solidária e reintegrada, de trabalho associado e bem viver5353 Franco-Cortés ÁM, Roldán-Vargas O. Sentido de la responsabilidad con la salud: perspectiva de sujetos que reivindican este derecho. Rev. latinoam. cienc. soc. niñez juv. 2015; 13(2):823-835..

Dessa forma, apenas com a valorização dos diferentes saberes e da subjetividade, com uma nova sociabilidade, inclusive originárias dos países periféricos, será possível alterar a percepção acerca dos verdadeiros problemas de saúde desde sua produção como conhecimento até a efetividade dos projetos que almejem a emancipação humana.

Conclusões

Em uma tentativa de resposta à pergunta norteadora, podemos concluir que a mudança paradigmática no interior da epidemiologia é um processo que avança de forma desigual pelos hemisférios. Evidenciamos que a ‘Epistemologia do Sul’ remete a um pensamento descolonizador e crítico que promove rupturas incrementais com o modelo clássico. Ainda não alcançamos o ponto de clivagem, mas observamos que os estudos teóricos norteiam os estudos empíricos, jogando luz sobre a forma como o novo arsenal metodológico pode potencializar as descobertas bem como desmistificar as relações sociais. Dessa forma, os métodos analíticos ganham potência em relação ao seu objeto, progressivamente refinado pela teoria, com a promissora capacidade de assessorar as mudanças necessárias à emancipação humana.

Enquanto isso, a bússola da epidemiologia contra-hegemônica aponta para a emancipação política, que vai se consolidando na saúde pública para abrir caminho e garantir os direitos humanos e a democracia. No entanto, ela é insuficiente para o grande salto necessário, pois ainda se ancora no modelo clássico, mesmo que consciente e caminhando para o pensamento crítico. Sua autorreferência só será quebrada quando houver a percepção de que é necessário afastar as linhas abissais que escondem novas possibilidades de sociabilidade.

  • Suporte financeiro: não houve

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Abr 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2023

Histórico

  • Recebido
    29 Abr 2022
  • Aceito
    26 Set 2022
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