Acessibilidade / Reportar erro

INDIVÍDUO E INDIVIDUALISMO EM NORBERT ELIAS

INDIVIDUAL AND INDIVIDUALISM IN NORBERT ELIAS

Resumo

O ensaio, de cunho teórico, discute os conceitos de indivíduo e individualismo em Norbert Elias. Para tanto, três objetivos são perseguidos: - partindo das obras A sociedade de corte, O processo civilizador e A sociedade dos indivíduos, discutimos o conceito de figuração, solução conceitual eliasiana para o par antitético indivíduo e sociedade; - Mozart, sociologia de um gênio é utilizado como estudo de caso em que o gênio é visto em suas figurações, relações de interdependência e constrangimentos sociais; - por fim, pensando com e a partir de Elias, colocamos à frente o entendimento do individualismo como habitus individual e social, formulação que indica a radicalidade do conceito de figuração, a qual afirma a sociedade como formação de indivíduos interdependentes, a despeito da percepção individual ou social de uma possível autonomia, constituindo a interdependência questão empírica e ontológica.

Palavras-chave
Norbert Elias; sociologia figuracional; indivíduo; figuração; individualismo

Abstract

The essay, theoretical in nature, discusses the concepts of individual and individualism in Norbert Elias. To this end, three objectives are pursued: - starting from the works The court society, The civilizing process, and The society of individuals, we discuss the concept of figuration, Eliasian conceptual solution to the antithetical pair individual and society; - Mozart, sociology of a genius is used as a case study in which the genius is seen in his figuration, interdependent relations and social constraints; - finally, thinking with and from Elias, we put forward the understanding of individualism as individual and social habitus, a formulation that indicates the radicality of the concept of figuration, which affirms society as the formation of interdependent individuals, despite the individual or social perception of possible autonomy, interdependence consisting of an empirical and ontological question.

Keywords
Norbert Elias; figurational sociology; individual; figuration; individualism

O par conceitual indivíduo e sociedade é um tópico clássico da teoria sociológica, abordado desde os precursores da sociologia, passando pelos clássicos e chegando aos autores contemporâneos. A obra de Norbert Elias reorienta os termos que fazem desse par uma oposição conceitual, antitética, apresentando a questão como falso problema. Sua sociologia coloca-se justamente em oposição ao homo clausus, à concepção do indivíduo como autônomo e independente; a definição do indivíduo determinado pelo social tampouco encontra lugar na sociologia eliasiana. O autor trabalha entre os dois polos, pensando os indivíduos e os processos de individualização em redes de interdependência. Nesse sentido, ainda que falar em indivíduo e individualismo em Elias possa soar estranho, até contraditório, entendemos ser importante discutir essa questão, colocando à frente o entendimento do individualismo como habitus individual e social.

A sociedade dos indivíduos - publicado como primeiro capítulo em livro de igual título (Elias, 1994Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.) - foi escrito na época em que Elias trabalhou em O processo civilizador. Originalmente foi pensado, aliás, como parte da teoria mais abrangente dos processos civilizadores, sendo posteriormente desmembrado para evitar desarticular a estrutura de um livro já bastante extenso (Elias, 1994Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 8). Os capítulos seguintes que compõem o livro são desenvolvimentos posteriores, constituindo material ímpar para nossa análise.

Após identificar dois campos opostos na abordagem da relação entre indivíduo e sociedade - aqueles que entendem as formações sócio-históricas como concebidas, planejadas e criadas por indivíduos ou organismos, e aqueles que afirmam que o indivíduo não desempenha papel algum nessas formações -, Elias (1994Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 16) afirma a necessidade de

modelos conceituais e uma visão global mediante os quais possamos tornar compreensível, no pensamento, aquilo que vivenciamos diariamente na realidade, mediante os quais possamos compreender de que modo um grande número de indivíduos compõe entre si algo maior e diferente de uma coleção de indivíduos isolados: como é que eles formam uma ‘sociedade’ e como sucede a essa sociedade poder modificar-se de maneiras específicas, ter uma história que segue um curso não pretendido ou planejado por qualquer dos indivíduos que a compõem.

Já em seus primeiros escritos, Elias reconhece, portanto, como da máxima importância essa questão que subjaz à teoria sociológica, merecedora de um desenvolvimento apropriado. O conceito de figuração ainda não se encontra nomeado nesse texto, mas já há nele a intenção de encontrar uma forma de pensar a coletividade de indivíduos que formam a sociedade em novas bases teóricas, indicando também a necessidade de que esse conceito elucide a historicidade das relações e formações humanas.

Neste ensaio, três objetivos são perseguidos. Num primeiro momento, seguiremos, nos trabalhos iniciais de Elias - A sociedade de corte, O processo civilizador e A sociedade dos indivíduos -, o caminho do conceito de figuração. Figuração é a solução conceitual eliasiana para o par antitético indivíduo e sociedade, conceito que encontrou definição mais precisa em Introdução à sociologia (Elias, 2008Elias, Norbert. (2008). Introdução à sociologia. Lisboa: Edições 70.) e cujo uso rigoroso implica entendê-la de forma associada ao conceito de processo. Num segundo momento, nos debruçaremos sobre Mozart, sociologia de um gênio. Ainda que gênio seja uma característica propícia ao entendimento de que seu talento o colocaria em uma situação extraordinária, assim como o faz com Luís IV, o Rei-Sol, Elias vê o gênio em suas figurações. Trazemos Mozart, portanto, como um estudo de caso, situação empírica que nos permite estabelecer o rigor e o alcance da proposta teórica eliasiana. Por fim, em um terceiro momento, enfrentamos o desafio de pensar o individualismo, conceito que atribui centralidade ao indivíduo, ao florescimento da individualidade, e também à autorrepresentação do eu desprovido de um nós. Em outras palavras, situação em que a balança nós-eu pende firmemente para o lado do eu. Pensando com e a partir de Elias, entendemos o individualismo como habitus individual e social. Essa formulação, do individualismo como habitus, indica, por sua vez, a radicalidade do conceito de figuração, afirmando a sociedade como formação de indivíduos interdependentes a despeito da percepção individual ou social de uma possível autonomia. Ao fim e ao cabo, a interdependência em Elias está para além do entender-se autônomo, único e livre, para além da identidade-eu dos indivíduos. É ao mesmo tempo uma questão empírica e ontológica. E a não percepção - ou mesmo as tentativas de negação da interdependência - constitui, portanto, um habitus situado historicamente.

INDIVÍDUO, FIGURAÇÃO E PROCESSO

Iniciamos nossas reflexões pelos livros A sociedade de corte, primeiro trabalho sociológico de Elias,1 1 A sociedade de corte, publicada tardiamente, com adições, em 1969, constituiu a tese pós-doutoral de Elias. O título original do trabalho, entregue para avaliação em 1933, era Der höfische Mensch ou The courtly human, em inglês. Uma leitura mais aprofundada a respeito do histórico dessa obra, bem como das condições e circunstâncias de sua escrita, pode ser encontrada no sétimo capítulo de Korte (2017). e O processo civilizador (ou O processo da civilização, em tradução mais fidedigna). Ainda que a publicação tardia - e retrabalhada - de A sociedade de corte não permita uma leitura em que o uso de algumas palavras e formulações seja colocado em questão, essa obra é fundamental para mostrar a riqueza da sociologia de Elias e de seu entendimento a respeito do par conceitual indivíduo e sociedade, explicitado na dinâmica da corte.

A sociedade de corte trata de um período que antecede e engendra a sociedade industrial-burguesa, constituindo base para a posterior construção de O processo civilizador. Tomando as variadas dinâmicas que constituem o processo civilizador, esse livro, escrito já no exílio na Inglaterra, trata de um período mais extenso, da época feudal até o século XX, sem discutir as figurações de corte em detalhes. A proposta que fazemos é de uma leitura conjunta, entendendo A sociedade de corte como estudo de uma síntese figuracional (Elias, 2009Elias, Nordert. (2009). À quoi servent les utopies scientifiques et littéraire pour l’avenir? In: L’utopie. Paris: Éditions La Découvert.: 130), jamais ponto de partida, mas mergulho em um período importante em O processo civilizador. O objetivo é seguir a pista metodológica oferecida pela abordagem de Elias: possibilitar uma discussão sobre conceitos - no caso, o conceito de figuração - a partir do material empírico. Cabe observar a importância conferida pelo autor à Idade Média, com seus mecanismos de centralização e descentralização, assim como às instituições do Renascimento, enquanto dinâmicas que tornaram possíveis as mutações observadas na corte absolutista francesa.2 2 A respeito, consultar: Elias (2021a). Conforme esclarecem Mennell, Bourguignon e Deluermoz (2010: 211-212), esse livro sobre a Idade Média contém as 122 páginas suprimidas do que foi publicado na França e em outros países com o segundo volume de O processo civilizador.

Para Elias, o processo civilizador europeu tomou algumas direções que podem ser claramente definidas. As principais: mudança na balança de equilíbrio entre coerções externas e autocontrole em favor do último; desenvolvimento de um padrão social de comportamento e sentimento, o qual gera a emergência de um autocontrole ainda mais estável, completo e diferenciado; aumento do escopo de identificação mútua entre as pessoas (Fletcher, 1997Fletcher, Jonathan. (1997). Violence and civilization: an introduction to the work of Norbert Elias. Cambridge, UK: Polity Press.: 82). Além dessas, o processo civilizador também tomou os seguintes direcionamentos: aumento da pressão pelo desenvolvimento da previsão e do autocontrole; processos de psicologização e racionalização; avanço nos limiares de vergonha, pudor e repugnância; redução dos contrastes na conduta entre grupos superiores e inferiores e aumento nas variações ou nuanças da conduta civilizada; mudanças no conhecimento humano de uma perspectiva mais envolvida para uma mais distanciada (Elias, 1990Elias, Norbert. (1990). O processo civilizador. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, v. 1., 1993Elias, Norbert. (1993). O processo civilizador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, v. 2.).

O processo civilizador é sobre mudanças de longo prazo em dois níveis interdependentes: o individual e o social. Como essas mudanças aconteceram e quais foram as forças ou impulsos que as levaram para uma determinada direção não planejada são as questões que Elias busca responder ao longo do livro. Ainda que O processo civilizador elabore uma discussão ancorada no empírico, Elias dá um passo à frente estabelecendo (ou tentando estabelecer) uma teoria central que envolve a busca por conexões entre o habitus social, o desenvolvimento de padrões sociais e as cadeias de interdependência, nível de formação do Estado, democratização funcional e níveis de pacificação (Dunning & Mennell, 2003Dunning, Eric & Mennell, Stephen. (2003). Norbert Elias. London/New Delhi: Thousand Oaks/Sage Publications, 4 v.: xxix). Nas palavras do próprio autor, em entrevista concedida em 1969 a Johan Goudsblom (2013Goudsblom, Johan. (2013) [1969]. An interview in Amsterdam. In: Jephcott, Edmund et al. Norbert Elias: Interviews and autobiographical reflections. (Publicado como volume 17 do The Collected Works of Norbert Elias, Dublin: UCD Press.): 170),

No livro sobre os processos civilizadores e de formação do Estado apresento pela primeira vez um modelo para diagnosticar os nexos de eventos em processos de longo prazo, mostrando como o desenvolvimento de padrões e tipos de coações estão conectados de forma tanto passiva quanto ativa a certos aspectos do mesmo processo de formação do Estado.

Van Krieken (1998Van Krieken, Robert. (1998). Norbert Elias. London: Routledge.: 85) identifica em A sociedade de corte três aspectos de especial significância e que, ao nosso ver, indicam claramente a relação entre a figuração de corte e a figuração posterior, a sociedade industrial-burguesa: o argumento que identifica as cortes reais e aristocráticas como unidades sociais- chave que cumpriram um importante papel na emergência das sociedades capitalistas; a análise da ‘racionalidade de corte’, entendendo-a como uma forma de racionalidade que precede a instrumental-legal e, ao mesmo tempo, lhe deu continuidade na forma de uma subcorrente; a identificação de mecanismos particulares de poder e diferenciação social que continuaram a operar na vida social contemporânea.

Assim, na problemática eliasiana, as figurações presentes na sociedade feudal, sociedade de corte e sociedade industrial-burguesa permitem conhecer dinâmicas que se sucedem no longo e contínuo prazo de um processo de civilização. Em A sociedade de corte, Elias se refere à figuração da corte, o que nos possibilita pensar a época feudal e a época moderna também como figurações. Não há estágios estanques, momentos de início ou término para cada uma delas. Figurações não são sistemas autorreferidos. São três momentos que se sucedem não como quebras ou rupturas, mas como continuidades. Três redes de interdependência que funcionam a partir de dinâmicas internas significativamente diferentes e que, ao mesmo tempo, possibilitam compreender a transmutação de uma em outra, por meio de mudanças paulatinas e contínuas. O olhar de Elias não focaliza exclusivamente as figurações, cada uma delas separadamente, mas se desloca para processos que levam de uma à outra, identificando também permanências.3 3 Em certo momento de sua vida, Elias voltou-se contra o rótulo de sociologia figuracional, justamente por entender que seu conceito estava sendo confundido com o de sistema, sendo ignorada a importante definição de que as figurações estão sempre em processo (Engler, 2013).

Até a época em que Elias escreve seu texto, a corte aristocrática era um campo pouco estudado pela sociologia, voltada para outros recortes empíricos, tais como a cidade, a fábrica, o monastério, o Estado, organizações burocráticas e patrimoniais, estruturas econômicas feudais ou capitalistas, família, protestantismo, burguesia, a classe trabalhadora etc. Nesse livro, Elias apresenta com muita clareza um “duplo foco” que caracteriza sua sociologia: ao mesmo tempo em que estuda o processo de desenvolvimento social (a corte como estágio que antecede a sociedade burguesa-industrial) também mergulha em momentos específicos daquela figuração, trazendo à tona os personagens e as relações de interdependência que os caracterizavam. Alargando um pouco o foco, o estudo da sociedade de corte pode ser visto como um recurso metodológico que permite adentrar em profundidade uma trama específica no movimento contínuo do processo de civilização. A sociologia de Elias combina, portanto, estudos sincrônicos e diacrônicos. É o mergulho em figurações sociais e emocionais específicas que ancoram sua discussão de processos de longo prazo, permitindo-lhe estabelecer a relação entre estruturas da personalidade e a estrutura social.

A corte real do Antigo Regime acumulava duas funções: instância máxima de estruturação da grande família real e função de governo. Em 1984, em debate com colegas no que ficou conhecido como Conferência de Bielefeld, Elias relembrou que um dos objetivos centrais do estudo sobre a sociedade de corte era investigar a estrutura de poder de uma monarquia absoluta, resultando daí o insight de que o poder do rei era tudo, menos absoluto. Ele era “dependente do contracontrole da aristocracia, da burguesia e das pessoas de forma geral” (Elias, 2021cElias, Norbert. (2021c). Discussion of Elias’s paper. In: Bogner, Artur & Mennell, Stephen (orgs.). Civilisations, civilising processes and modernity - a debate between Norbert Elias, Immanuel Wallerstein, William H. McNeill, Hans-Dieter Evers, Keith Hopkins, Johann P. Arnason, Johan Goudsblom and others. Documents from the conference at Bielefeld, 1984. New York: Palgrave Macmillan.). Luís XIV nunca foi livre, assim como nunca foi absolutamente predeterminado (Elias, 2001Elias, Norbert. (2001). A sociedade de corte: investigação sobre a sociologia da realeza e da aristocracia de corte. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 55).

Identificamos, portanto, o olhar sociológico impresso por Elias na construção de seus objetos de estudo: trata-se de olhar não o indivíduo, mas a figuração. O poder que Luís XIV, o Rei-Sol - exemplo do soberano absoluto, irrestrito, onipotente - consegue imprimir sobre seus súditos é explicado a partir das redes de interdependências das quais fazia parte. Seu espaço de atuação era mantido a partir de estratégias bem articuladas na figuração da sociedade de corte e na da sociedade francesa como um todo (Elias, 2001Elias, Norbert. (2001). A sociedade de corte: investigação sobre a sociologia da realeza e da aristocracia de corte. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 29). A intriga e a etiqueta se tornavam peças-chave nas estratégias de poder.

Relembremos a icônica descrição do lever do rei, no capítulo V de A sociedade de corte:

De manhã, geralmente às 8 horas, e em todo caso no horário por ele determinado, o rei é acordado pelo primeiro criado de quarto, que dormia aos pés de sua cama. As portas são abertas para os pajens. Nesse momento, um deles acaba de dar a notícia ao “grand chambellan” e ao primeiro fidalgo de quarto, um segundo dirigiu-se à cozinha da corte para providenciar o café da manhã e um terceiro ocupa seu posto diante da porta, deixando entrar apenas os senhores que têm o privilégio do acesso.

Esse privilégio seguia uma hierarquia muito precisa. Havia seis grupos diferentes de pessoas com permissão para entrar, um após outro. Falava-se então das diversas “entrées”. (...)

Como vemos, tudo seguia regras bem precisas. Os dois primeiros grupos eram admitidos quando o rei ainda estava na cama. Ele usava então uma pequena peruca; nunca aparecia sem peruca, mesmo deitado em sua cama. Quando estava de pé e o grand chambellan com o primeiro criado de quarto acabavam de vestir o seu robe, chamavam o grupo seguinte, a première entrée (Elias, 2001Elias, Norbert. (2001). A sociedade de corte: investigação sobre a sociologia da realeza e da aristocracia de corte. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 101).

A precisão das regras, como chama a atenção o autor, não tinha o sentido de uma organização racional moderna, mas explicitava a importância simbólica da etiqueta na estrutura social e de governo da corte. A necessária atividade de vestir-se adquiriu, na corte de Luís XIV, o sentido de atribuição de privilégio e distinção.

Mas não podemos concluir daí que o ritual prescindia de seus personagens. Luís XIV “foi um rei forte o suficiente para intervir quando necessário”, preservando as funções primárias do ritual. Com o passar do tempo, a hierarquia dos privilégios passou a ser mantida pela simples competição dos indivíduos envolvidos na dinâmica, cada qual preocupado com seus pequenos privilégios e poderes conferidos, perdendo a dinâmica sua função primária, autonomizando-se. Chegada a época de Luís XVI e Maria Antonieta, a descrição do lever da rainha revela um ritual vazio, no qual a rainha aguarda, nua, que sua blusa passe de mão em mão, numa disputa de privilégios e honras.

A diferença do significado do ritual encontra-se na estrutura tanto psicológica quanto social, o que significa dizer que é devedora dos indivíduos que compõem a figuração, em específico da personalidade do rei, bem como da estrutura social - e, portanto, das redes de interdependência - em que está inserido: Luís XIV certamente não teria tolerado que a etiqueta sobrepujasse assim o objetivo principal do ato de se vestir, afirma Elias (2001Elias, Norbert. (2001). A sociedade de corte: investigação sobre a sociologia da realeza e da aristocracia de corte. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 104), ainda que a estrutura psicológica e social que acabou produzindo esse mecanismo vazio já estivesse visível em sua época. As filhas de Luís XV participavam do coucher do rei muito a contragosto, mas participavam. E o faziam porque não podiam romper com a etiqueta, sua existência social estava ligada à participação obrigatória nesses rituais. A recusa em participar significaria uma humilhação e uma abdicação de privilégio.

Se Elias olha para as relações entre os envolvidos no ritual, não deixa de lado a compreensão de que esse ritual que envolvia a nobreza significava também a exclusão de todos os que não eram nobres e tinham que pagar impostos. E a exclusão de um grupo enorme de pessoas é também característica dessa figuração como forma de relação de interdependência. Em síntese, a engrenagem social da corte funcionava na base da pressão e contrapressão e estava explicitada na etiqueta.

INDIVÍDUO, INDIVIDUALIDADE E INDIVIDUALIZAÇÃO

No estudo sobre o destino do músico Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791), Elias buscou compreender a experiência social do artista burguês na corte aristocrática, acabando por lançar as bases de uma sociologia da singularidade, transpondo para a escala da biografia o problema maior das restrições às quais se submetem os indivíduos no processo de civilização. Pode-se afirmar que o livro discorre sobre as ambivalências na construção de uma vivência do eu reivindicada como alteridade absoluta, ou melhor, a vontade de viver profissionalmente da música. O estatuto do gênio criador, em Mozart, nos leva à compreensão do conflito entre o processo de criação na esfera musical, orientado pela afirmação de uma assinatura própria, e a dependência a uma estrutura social da qual o artista não poderia escapar. A vida entre dois mundos, o burguês e o aristocrático, que selou o destino trágico do músico, nada mais significa que a tensão entre autoria (eu) e civilidade (nós) no esforço de reconhecimento público. Não se pode perder de vista que Wolfgang Amadeus desejava ser reconhecido nos círculos dos que o desprezavam porque os padrões de gosto nos quais foi formado e que tinham se tornado uma segunda natureza para ele eram os cortesãos dos quais queria se libertar. Esse conflito configurou um processo de individualização como autopercepção de um eu desprovido de um nós. Em função da estrutura de sua personalidade, Mozart antecipou a posição social alcançada, uma década após, por Luwig von Beethoven, em função de mudanças estruturais que inauguraram o mercado da música na sociedade burguesa industrial.

Para a socióloga Nathalie Heinich (1993)Heinich, Nathalie. (1993). Le génie. Histoire d’une notion de l’Antiquité à la Renaissance. Paris: Les Éditions de Minuit., a tradição do pensamento sociológico, muito mais interessada no estudo das coletividades, não confere importância ao conceito de singularidade. Para ela, as posturas analíticas de cientistas sociais frente ao problema das figuras da singularidade no mundo social se empenham em demonstrar a compreensão da verdade individual pela lógica do agrupamento, o princípio de desvendamento que permite o acesso ao individualismo considerado sinônimo de ilusão. Há ainda outra postura, que é a dos sociólogos militantes da autenticidade da pessoa, aqueles que cultivam estilo mais propícios aos elogios à grandeza e ao inusitado do gênio. Uns fazem, do social, ideologia a defender, e outros fazem o mesmo das qualidades da pessoa. Uns são chamados de redutores, os outros de ingênuos. O conceito de figuração, já falamos, escapa a essa tipologia intelectual baseada nas polarizações dicotômicas. Em Mozart, sociologia de um gênio, não há qualquer empenho do autor em desindividualizar o artista ou em se posicionar a favor de determinações ou de uma última instância de explicação do social. Elias mostra a existência de figurações, redes de interdependência, nas quais as características do gênio criador são levadas em consideração.

Norbert Elias articula, na figuração da corte na qual viveu o músico, uma forma de individualização da criação estética, vinculando a genialidade às redes de pressões sociais. Elias parte da indagação dos motivos da profunda melancolia, sentimento de fracasso e do marcado ressentimento de Mozart. Encontra-os em uma série de regramentos sociais, que, de um modo ou de outro, possibilitaram o fenômeno Mozart. Sentindo-se derrotado ao mesmo tempo em que reagia com modos descorteses, a doença que o vitimou não foi mais fatal que o vazio sentido nos últimos anos. O gênio Wolfgang Amadeus Mozart obteve fama no mundo, mas não conseguiu sair da posição de inferioridade na sua corte natal, um pequeno Estado absolutista governado pelo conde de Colloredo, o arcebispo de Salzburgo. Não cabia na autoimagem do homem a dependência dos músicos de sua época com relação aos padrões de comportamento e bom-gosto da aristocracia cortesã. Essa camada social cumpria ao mesmo tempo a função de patrona e audiência para a música de concerto. Os príncipes procuravam os artistas para figurar em suas orquestras, teatros e igrejas. Levado por essa condição, Mozart, na posição de um criado de libré, “tão indispensável quanto os pasteleiros, os cozinheiros e as damas de companhia” (Elias, 1995ELIAS, Norbert. (1995). Mozart, sociologia de um gênio. Org. Michael Schröter. Trad. Sergio Goes de Paula. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 18), trabalhou como serviçal do príncipe-bispo da acanhada corte de Salzburgo. A dinâmica do conflito entre a realidade do artista cortesão e o sonho de tornar-se um artista autônomo esteve presente por toda a existência social do músico. Uma estrutura de emoções se interpunha entre a consciência do posto ocupado e o desejo de ganhar a vida de modo regular. Essa realidade gerou muitos sofrimentos e insatisfações a Mozart, acabando, paradoxalmente, por contribuir para o seu fracasso social e por influenciar a escrita de suas belas óperas.

Nessa obra da maturidade do sociólogo (publicada postumamente, em 1991), encontramos, mais uma vez, a construção de um objeto de investigação centrado na figuração de que fazia parte Mozart, mas colocando foco no próprio artista e nas relações funcionais e de interdependência que ia contraindo com os que passavam pela sua vida, Leopold Mozart, seu pai e empresário; Constanze, a esposa que o rejeitou; o nobre e irascível bispo de Salzburgo, a quem o artista prestava serviço. Todos dependiam uns dos outros determinando-se mutuamente, modelavam entre si suas personalidades. Além de situar Mozart em suas relações de interdependência mais próximas, Elias o situa na figuração mais ampla da sociedade de corte e na figuração que já se insinua, a sociedade industrial-burguesa, com sua maior abertura ao indivíduo e ao individualismo. Por mais diversas que pudessem ser as condutas e os sentimentos de cada um, eles formavam uma teia de relações na vida de Mozart. Foi nessa teia que o músico respondeu ao conflito com as normas sociais, a expressá-lo por meio de uma dupla revolta, social e familiar, contra o pai-empresário e contra o príncipe-patrão. Tanto seu comportamento quanto sua música foram influenciados pelas pressões organizadas no interior da figuração (Leão, 2007Leão, Andréa Borges. (2007). Norbert Elias e a educação. Belo Horizonte: Autêntica.).

O jovem Wolfgang jamais assimilou as regras da etiqueta, tampouco apreciava as bajulações e muito menos as artes da representação. O comportamento era meio bufão e sua aparência deselegante, por vezes, tornava-o um pouco infantil. A rudeza do estilo pessoal contrastava com a sofisticação de suas composições, com o grande domínio que tinha sobre as formas musicais. A propósito da modificação da posição social do artista-artesão, em A sociedade dos indivíduos (Elias, 1987Elias, Norbert. (1987). La société des individus. Paris: Édition Fayard.: 60), Norbert Elias nos lembra o quanto “as diferentes estruturas das sociedades ocidentais produzem necessariamente outra estrutura de controle dos instintos e outra estrutura da consciência”, por conseguinte, outras formas de individualidade e, em particular, de formação da personalidade humana, diversas daquelas dos séculos XX, XVIII ou XII. Essa é a razão pela qual a economia psíquica da distinção aristocrática de corte não poderia permanecer integralmente nos grupos de literatos e artistas burgueses. A extraordinária música de Mozart sintetiza um momento de trânsito entre cadeias de interdependência que configuram a diferenciação social no processo de civilização. Não por acaso, sua existência social e seu talento traduzem o permanente desequilíbrio entre as instâncias controladoras da aristocracia de corte e a autorregulação das pulsões e emoções.

Assim, o artista burguês na sociedade de corte do século XVIII não teria sido capaz de se deslocar da perspectiva do eu para a perspectiva do nós. Foi necessário chegar o século XIX, em que a diferenciação e extensão das interdependências funcionais em escala planetária tornavam de outro modo traumática a experiência social do indivíduo. Um dos principais dilemas a que se veem confrontados os seres humanos na sociedade industrial-burguesa, adverte Elias (2009)Elias, Nordert. (2009). À quoi servent les utopies scientifiques et littéraire pour l’avenir? In: L’utopie. Paris: Éditions La Découvert., é a sincronia entre a experiência dos processos sociais planetários de dimensões dificilmente controláveis em seus cursos indeterminados e o aumento da individualização. Ao mesmo tempo em que os indivíduos participam de processos de interdependências em escalas transnacionais - conflitos, epidemias, guerras e ameaças de destruição -, reforça-se a tendência de cada um se imaginar como entidade autônoma e independente. Diante de tal paradoxo e, em consequência, da grande dificuldade de compreensão da dinâmica interna de processos que envolvem todos os indivíduos, a literatura emerge como uma forma possível de simbolização. É o caso da literatura de ficção-científica e de utopia. Há escritores geniais, nesses gêneros, que conseguem reunir conhecimentos das ciências naturais e tecnológicas a fim de produzir símbolos capazes de traduzir angústias, incertezas e medos humanos.

Na conferência intitulada “À quoi servent les utopies scientifiques et littéraires pour l’avenir?”, proferida em 1981, em Wassenaar, na Holanda, Elias analisa a obra de ciência-ficção do britânico H.G Wells, como ponto de mutação entre as utopias sonhos, decorrentes da crença no progresso científico e tecnológico, e as utopias pesadelos, emocionalmente menos satisfatórias porque ligadas às perdas das ilusões científicas de felicidade universal. Para Elias (2009Elias, Nordert. (2009). À quoi servent les utopies scientifiques et littéraire pour l’avenir? In: L’utopie. Paris: Éditions La Découvert.:106), as antecipações literárias, tanto as utópicas como as distópicas, representam soluções de problemas a partir de futuros possíveis já inscritos na ordem do desenvolvimento das dinâmicas sociais. Wells, ao imaginar ficcionalmente situações de antecipação de um futuro possível como utopia pesadelo - esperanças perdidas, guerras e destruições decorrentes da tecnologia -, não apenas levava as ambivalências e os dilemas dos seres humanos a sério como conseguia distanciar-se do ponto de vista da imaginação do gênio literário, abordando-as a partir da figuração de indivíduos interdependentes. Ao contrário de Mozart, H. G. Wells via a si mesmo e a sua obra artística da perspectiva da identidade-nós, oferencendo um modelo de compreensão da realidade social digno de um sociólogo avant la lettre.

INTERDEPENDÊNCIA E PODER

No texto A sociedade dos indivíduos, Elias (1994Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 16) afirma a necessidade de modelos conceituais que tornassem compreensível, no pensamento, o que é vivenciado na sociedade. A necessidade de que, de certa forma, a pesquisa sociológica “traduza” a realidade, de que o conhecimento seja congruente e orientado para a realidade tornando-a compreensível, permeia toda sua obra. Em palestra intitulada “The formation of states and changes in restraint” (“A formação dos Estados e mudanças nas coações”), proferida em 1984, premido pelo que temia ser a real possibilidade de uma terceira guerra mundial, Elias (2021b)Elias, Norbert. (2021b). The formation of states and changes in restraint. In: Bogner, Artur & Mennell, Stephen (orgs.). Civilisations, civilising processes and modernity - a debate between Norbert Elias, Immanuel Wallerstein, William H. McNeill, Hans-Dieter Evers, Keith Hopkins, Johann P. Arnason, Johan Goudsblom and others. Documents from the conference at Bielefeld, 1984. New York: Palgrave Macmillan. afirmava:

Estamos no momento em uma situação - nós, ameaçados pela guerra - em que a forma mais realista de conhecimento da realidade é a melhor para nos guiar. Certamente, isso está relacionado com o que eu gostaria que acontecesse, quer dizer, que não deveria ocorrer uma guerra. Penso que uma das coisas indispensáveis necessárias para que sigamos nessa direção não é apenas o desarmamento militar, mas o desarmamento ideológico. E essa é uma razão adicional que explica por que penso que a pesquisa não ideológica possui, de fato, maior possibilidade de ter valor prático em um mundo ameaçado por uma terrível e desastrosa guerra

Os conceitos de figuração e processo são fundantes da sociologia eliasiana (Landini, 2013Landini, Tatiana Savoia. (2013). Main principles of Elias’s sociology. In: Depelteau, François & Landini, Tatiana Savoia (orgs.). Norbert Elias and social theory. New York: Palgrave Macmillan.) e ocupam lugar central em sua proposta de uma sociologia orientada para a realidade. A noção de figuração já estava presente, de certo modo, em sua tese de doutoramento, submetida à Faculdade de Filosofia da Universidade de Breslau em 19224 4 Idea and individual: a critical investigation of the concept of history (Elias, 2006). (Heilbron, 2013Heilbron, Johan. (2013). Sociology… done in the right way. In: Jephcott, Edmund et al. Norbert Elias: interviews and autobiographical reflections. Publicado como volume 17 do The Collected Works of Norbert Elias, Dublin: UCD Press.): 159). Em A Sociedade dos Indivíduos, texto escrito em 1939, encontramos a seguinte formulação:

Nenhum dos dois [indivíduo e sociedade] existe sem o outro. Antes de mais nada, na verdade, eles simplesmente existem - o indivíduo na companhia de outros, a sociedade como uma sociedade de indivíduos - de modo tão desprovido de objetivo quanto as estrelas que, juntas, formam um sistema solar, ou os sistemas solares que foram a Via-Láctea. E essa existência não finalista dos indivíduos em sociedade é o material, o tecido básico em que as pessoas entremeiam as imagens variáveis de seus objetivos (Elias, 1994Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 18).

Em Mozart, sociologia de um gênio, discutido acima, Elias estuda um caso elucidativo das mudanças nos padrões de interdependência instauradas no processo de individualização na modernidade ocidental. No ensaio “Mudanças na balança nós-eu”, desenvolvimento do texto A sociedade dos indivíduos, Elias (1994)Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar. apresenta os conceitos de identidade-eu e identidade-nós enquanto ferramentas heurísticas da autopercepção da singularidade e da pertença ao grupo, mostrando que ao longo dos séculos essa balança se inclina para o lado do eu. É no Renascimento que o equilíbrio se modifica, pendendo para o eu, tornando-se cada vez mais frequente o entendimento de um eu desprovido de um nós (Elias, 1994Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 161). Descartes, ao escrever seu Cogito, ergo sum, teria sido o pioneiro de uma crescente mudança na ênfase na autoimagem humana. O cogito é um sinal da mudança na posição social da pessoa singular. A percepção de si mesmo como um eu desprovido de um nós difundiu-se ampla e profundamente. A existência de um músico na figuração da corte - estrutura de dependência incompatível com a autoconsciência da genialidade singular - revela processo semelhante de ambivalência e sofrimento nas formas de individualização. Mozart não poderia ser capaz de adequar o habitus social pequenoburguês, incorporado nas ligações familiares, com o padrão de civilização da corte aristocrática para a qual servia como músico de altíssimo talento. Assim, o problema psicológico vivido pelo artista entrecruzava-se a um problema sociológico, ambos apontando para um processo de sublimação, orientação controlada dos fluxos de fantasia, como nos chama a atenção Elias (1995ELIAS, Norbert. (1995). Mozart, sociologia de um gênio. Org. Michael Schröter. Trad. Sergio Goes de Paula. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 136-137):

Já apontei, de passagem, que uma das peculiaridades do artista não cortesão, “autônomo”, é uma combinação do livre fluxo de fantasia com a capacidade de controle através da autorrestrição individual, através de uma consciência altamente desenvolvida. Mais precisamente: fluxos-fantasia e impulsos de consciência não são meramente reconciliados no interior da estrutura de uma atividade artística, eles são efetivamente fundidos. Isto está no âmago do que chamamos de “gênio artístico”.

No livro Introdução à sociologia, Elias (2008)Elias, Norbert. (2008). Introdução à sociologia. Lisboa: Edições 70. apresenta uma representação visual de seu conceito de figuração. Opondo-se ao que denomina visão egocêntrica da sociedade, em que o Eu ocupa o centro de círculos concêntricos que representam família, escola, indústria, Estado - imagem que lembra o painel para um jogo de dardos ou tiro ao alvo -, Elias apresenta o diagrama da teia de indivíduos interdependentes, cada qual ligado a outros por meio de um equilíbrio de poder mais ou menos instável.

O poder está no centro da proposta sociológica eliasiana e constitui parte integrante do conceito de figuração. Assim como sua proposta teórica não tem como ponto de partida o indivíduo, mas as relações de interdependência, o poder também é entendido em sua forma relacional - Elias fala em relações de poder, equilíbrio ou balança de poder. O poder “constitui um elemento integral de todas as relações humanas” (Elias, 2008Elias, Norbert. (2008). Introdução à sociologia. Lisboa: Edições 70.: 80).

Ao afirmar que constitui elemento das relações humanas, Elias está indicando que o poder não é monopolizado por uma ou outra pessoa que participa da relação, mas compartilhado, algumas vezes de forma extremamente desigual, em outras de forma mais equilibrada. A relação entre pais e filhos, principalmente bebês, e entre senhores e escravos, exemplificam relações em que as oportunidades de poder são distribuídas de forma muito assimétrica - ainda assim, o bebê tem algum poder sobre os pais uma vez que os pais lhe atribuem valor, e o escravo tem algum poder sobre os senhores na proporção da função que desempenha (Elias, 2008Elias, Norbert. (2008). Introdução à sociologia. Lisboa: Edições 70.: 81). Sendo extremamente assimétricas, essas relações de interdependência são capazes de indicar, com alto grau de segurança, qual será o desenlace de uma situação.

“Modelos de jogo”, capítulo 3 de Introdução à sociologia (Elias, 2008Elias, Norbert. (2008). Introdução à sociologia. Lisboa: Edições 70.), reflete essas relações, considerando cenários de menor e maior complexidade. O jogo de xadrez, com um dos jogadores muito mais forte do que o outro, constitui uma representação das relações tais quais as comentadas acima, em que há grande assimetria de poder e cujo desenlace é bastante previsível. Com o aumento da complexidade da figuração - número maior de jogadores, menor assimetria de poder, aumento da complexidade das regras dos jogos - cresce também a imprevisibilidade do desenlace. O processo torna-se independente da vontade de qualquer um dos jogadores - encontra-se aqui uma abstração do conceito de processo cego, abordada por Elias em O processo civilizador. Nesses cenários mais complexos de figurações, o jogador (indivíduo), ainda que diferenciado, não possui mais a capacidade de controle dos processos, encontrando-se numa espécie de sujeição a esses processos.

Para evitar o entendimento equivocado de que, ao afirmar que os indivíduos ficam sujeitos ao processo, o conceito de figuração seria independente ou prescindiria dos indivíduos que a compõem, lembremos outra imagem utilizada por Elias, a da dança. Os dançarinos em um palco formam uma figuração móvel, é possível reconhecer padrões, como a valsa ou o tango - o que pode ser entendido como uma analogia a relações de gênero ou de classe, por exemplo. Mas a dança não constitui uma estrutura ou algo que está para além dos indivíduos, tampouco subjacente: “As danças são, como qualquer figuração, de certa forma independente de qualquer indivíduo específico, mas não de indivíduos como tais, constituindo padrões relacionais emergentes de interdependência entre dançarinos individuais” (Hugues, 2016Hugues, Jason. (2016). Fields, worlds and figurations: conceptual imagery and political investments in the work of Bourdieu, Becker and Elias. Trabalho apresentado no XVI Simpósio Internacional Processos Civilizadores. Vitória, Universidade Federal do Espírito Santo, mimeo.: s.p.).

Como a sociologia de Elias não é voltada apenas para um momento determinado, fala-se do maior ou menor equilíbrio de poder ao longo de um processo - é assim que vemos, ao longo da análise da sociedade de corte, o poder “absoluto” do rei perder força, até dar lugar à revolução e à instauração da sociedade burguesa-industrial.

Em “Mudanças na balança nós-eu” (Elias, 1994Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.), de 1987, encontramos uma reflexão apurada sobre os processos de desenvolvimento social e, portanto, de mudanças nas figurações. Sua proposta é a de buscar a sociogênese desses dois termos, assim como o fez com os conceitos de cortesia, civilidade e civilização em O processo civilizador. Segundo ele, o uso antitético dos conceitos de indivíduo e sociedade - o termo indivíduo expressando a ideia de que todo ser humano é ou deve ser uma entidade autônoma e que cada ser humano é diferente de todos os outros - é recente na sociedade ocidental.

Entendendo, portanto, que o desenvolvimento dos conceitos é um aspecto do desenvolvimento social, cumprindo também uma função explicativa, Elias nos lembra que a família de conceitos relacionados ao substantivo indivíduo é recente, data da época do Renascimento, quando as pessoas puderam ascender de suas comunidades tradicionais a posições sociais mais elevadas - humanistas, comerciantes, artistas são exemplos do aumento das oportunidades sociais de progresso individual. É apenas no século XVII que aparece a distinção entre o que era feito individualmente e o que era feito coletivamente. Posteriormente, no século XIX, aparece a formação de vocábulos como individualismo de um lado, e socialismo e coletivismo de outro, contribuindo para o entendimento corrente de que indivíduo e sociedade formam um par antitético (Elias, 1994Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 134).

A identidade-eu e a identidade-nós são autorrepresentações presentes em todos os espaços e tradições nacionais, em qualquer momento ou estágio de sua história, variando a intensidade de um e outro na balança das identidades. Nas sociedades mais desenvolvidas, afirma Elias, o nível de integração do Estado absorve cada vez mais essa função de refúgio da necessidade extrema. Ao mesmo tempo em que o Estado elimina as diferenças entre as pessoas ao transformá-las em um número, um contribuinte (o que poderíamos entender como massificação), o Estado relaciona-se com as pessoas como indivíduos e não como membros de uma família ou de um clã. Os Estados, assim, dão sua contribuição para o avanço da individualização em massa (Elias, 1994Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 149). Já a extensão e o padrão dessa individualização, alerta o autor, diferem amplamente conforme a estrutura da nação e, em especial, da distribuição de poder entre governo e governados, aparelho de Estado e cidadãos.

Questão de absoluta importância e até aqui apenas indicada é a da mudança dos comportamentos e da própria estrutura da personalidade. É na figuração e por meio das relações de interdependência que o indivíduo sofre a coação que o instiga a desenvolver sua autocoação - processo das incorporações em que a passagem da coação exterior à autocoação se realiza, às vezes com boas doses de renúncia, denegações e traumas. É assim que as características básicas da personalidade, o ‘espírito’ dos cortesãos, emerge “da estrutura social, da figuração, da rede de interdependência que eles formam entre si” (Elias, 2001Elias, Norbert. (2001). A sociedade de corte: investigação sobre a sociologia da realeza e da aristocracia de corte. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 128). A elegância da atitude e o bom gosto eram obrigatórios para a aceitação e ascensão social daqueles que faziam parte das camadas dominantes do Antigo Regime e que viviam da renda em uma sociedade regida pela convenção social e pela competição por prestígio. Esses comportamentos foram relegados a uma esfera que não estava mais no centro da influência social na sociedade industrial-burguesa do século XIX, quando a profissão passou a determinar o comportamento dos indivíduos e sua relação mútua, passando a ser ela o centro das coações exercidas pelas interdependências sociais sobre os indivíduos singulares (Elias, 2001Elias, Norbert. (2001). A sociedade de corte: investigação sobre a sociologia da realeza e da aristocracia de corte. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 129).

Na mesma linha, é assim que seguimos com Elias, no segundo capítulo de O processo civilizador, o caminho percorrido para demonstrar transformações nos costumes, abarcando mudanças nas maneiras associadas à mesa, à forma de comer, atitudes em relação às funções corporais, comportamento no quarto de dormir etc. Transformações nos costumes (ou maneiras) implicam também transformação nos sentimentos e emoções. É a partir do aumento da pressão que as pessoas exercem reciprocamente umas sobre as outras, em sociedades já pacificadas, que Elias identifica a passagem, efetivamente, do período medieval para o Renascimento, a consolidação de um novo mecanismo de controle das emoções.

O objetivo de Elias não está em precisar ou diagnosticar novos comportamentos, mas seus olhos estão voltados para o processo de formação ou desenvolvimento de novos padrões, os quais, formados inicialmente em um “pequeno círculo”, foram lentamente estendidos a toda a sociedade, instilados de cima para baixo. Podemos dizer que esse processo de longo prazo é repetido no processo de socialização das crianças. Mas isso acontece de forma a que o comportamento, ao ser forçado no mesmo molde e na mesma direção, é percebido pelas crianças como algo que praticamente vem de dentro, implantado nelas pela natureza (Korte, 2001Korte, Hermann. (2001). Perspectives on a long life: Norbert Elias and the process of civilization. In: Salumets, Thomas (org.). Norbert Elias and human interdependencies. Quebec City: McGill-Queen’s University Press.: 26).

CONCLUSÃO - O INDIVIDUALISMO COMO HABITUS

A formação da sociedade industrial-burguesa pressupõe, para Elias, a pacificação e racionalização da vida social, retendo de Durkheim a ideia de coação social, porém retirando a identificação da coação social com normas e leis:

a quintessência do argumento eliasiano é sua reivindicação de ter identificado um nível mais profundo de ação recíproca entre fenômenos sociais e individuais. O desenvolvimento dos controles internalizados em resposta às pressões e necessidade da interdependência social não pressupõe um quadro normativo; antes, uma certa extensão do ‘espaço social pacificado’ e um nível correspondente de ‘silenciamento dos controles’ constituem um pré-requisito necessário à imposição de normas em uma figuração social (Arnason, 2021Arnason, Johann P. (2021). Civilisation, culture and power: reflections on Norbert Elias’s genealogy of the West. In: Bogner, Artur & Mennell, Stephen (orgs.). Civilisations, civilising processes and modernity - A debate between Norbert Elias, Immanuel Wallerstein, William H. McNeill, Hans-Dieter Evers, Keith Hopkins, Johann P. Arnason, Johan Goudsblom and others. Documents from the conference at Bielefeld, 1984. New York: Palgrave Macmillan.).

Segundo Elias, boa parte da teoria filosófica do conhecimento - Descartes, Berkeley, Kant, Husserl - traz essa ideia de que o indivíduo que tenta chegar ao conhecimento é um ser isolado que duvida da existência de alguém ou alguma coisa fora dele mesmo. Na literatura, a partir da segunda metade do século XX, há cada vez mais personagens que se percebem sós e duvidam da existência de qualquer coisa ou pessoa fora delas mesmas - A náusea, de Sartre, e O estrangeiro, de Albert Camus, são exemplos (Elias, 1994Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 163).

Para o autor, a percepção do eu desprovido de um nós não constitui, no século XX, uma questão isolada e individual, mas um “habitus, um traço básico da estrutura da personalidade social das pessoas da era moderna” (Elias, 1994Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 165). O homo clausus deixa o espaço de conceito sociológico e passa a ser tomado como um habitus. Essa provocante e elucidativa formulação, concebida a partir de Elias, nos indica a radicalidade do conceito de figuração, a qual afirma a sociedade como formação de indivíduos interdependentes, a despeito da percepção individual ou social de uma possível autonomia. A interdependência, ao fim e ao cabo, está para além do entender-se autônomo, único e livre, para além da identidade-eu dos indivíduos. A interdependência é ao mesmo tempo uma questão empírica e ontológica. E a não percepção, ou mesmo negação, da interdependência, constitui um habitus situado historicamente. Elias operou um deslocamento no modo de orientação do conhecimento. O conceito de interdependência usado por Elias vai além e ultrapassa a oposição dos conceitos de indivíduo e sociedade, transformando realidades estáticas e autorreferenciadas em processos.

Em Da divisão do trabalho social, Durkheim busca demonstrar a passagem de uma sociedade em que prevalecia a solidariedade mecânica, a solidariedade por igualdade, para a solidariedade orgânica, baseada na diferença e na complementariedade das funções exercidas na divisão do trabalho. A tentativa de Durkheim de demonstrar que o aumento da individualização e da solidariedade orgânica, decorrente da divisão do trabalho, possibilitava um mundo mais coeso, leva-o a menosprezar, naquele livro, o papel do individualismo no mundo moderno. Há um paralelo, ainda que superficial, com Elias. Assim como Durkheim, Elias também fala na complexificação do mundo social, no aumento e maior diversidade das cadeias de interdependência. É justamente nesse aumento das cadeias de interdependência que se localiza a possibilidade da individualização, a própria formação do Estado moderno propiciando, de certa forma, a possibilidade de que o indivíduo se entenda como autônomo. Verifica-se maior impermanência das relações-nós - após certa idade, o indivíduo pode afastar-se da família sem perder suas probabilidades de sobrevivência física e social; as relações entre as pessoas que decidem formar casais e mesmo entre pais e filhos assumem cada vez mais o caráter de união voluntária e revogável, idem para as relações profissionais, até para a nacionalidade:

Ao lado da permanência reduzida, surgiu uma permutabilidade maior dos relacionamentos, uma forma peculiar de habitus social. Essa estrutura de relações requer do indivíduo maior circunspecção, formas de autocontrole mais conscientes e menor espontaneidade dos atos e do discurso no estabelecimento e na administração das relações (Elias, 1994Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 167).

Retomemos a questão do dualismo entre indivíduo e sociedade - do entendimento do ‘indivíduo’ como meio e o ‘todo social’ como valor e objetivo supremos, e de seu oposto, a ‘sociedade’ como meio e os ‘indivíduos’ como o valor e o objetivo supremos (Elias, 1994Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 73) - ao qual o autor intercede o conceito de figuração. Há uma questão valorativa que é necessário adicionar aqui. Termos como indivíduo, sociedade, personalidade e coletividade, mais do que expressões da autopercepção e da percepção social, são também “armas ideológicas das lutas de poder de vários partidos e Estados” (Elias, 1994Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.: 74).

Apesar de Elias não incorporar em sua discussão as ideologias políticas mais propriamente ditas, se mais liberais ou mais comunitárias, nas quais predominam o Estado mínimo ou estado de bem-estar social, Mennell (2021)Mennell, Stephen. (2021). Some political implications of sociology from an Eliasian point of view. In: Delmotte, Florence & Gornicka, Barbara (orgs.). Norbert Elias in troubled times - figurational approaches to the problems of the twenty-first century. New York: Palgrave Macmillan. propõe localizar essas ideologias políticas ocidentais ao longo do contínuo nós-eu. Para ele, o neoliberalismo extremo, que emana principalmente dos Estados Unidos e que representa o espírito do tempo no mundo ocidental, é uma crença fervorosa na ‘liberdade do indivíduo’. Assim como Elias critica o mito filosófico do indivíduo atomizado e independente, o neoliberalismo mais radical pode ser visto na mesma chave, como um mito que impede o indivíduo de perceber que está relacionado aos outros em cadeias mais ou menos extensas de interdependências, as quais limitam a possibilidade de ação do indivíduo.

A questão que se coloca a partir daqui - para além de Elias, para pensar com Elias - é a de um momento em que a autopercepção do indivíduo como eu desprovido de um nós parece ter atingido níveis ainda maiores. Alguns parágrafos acima propusemos o entendimento do homo clausus como habitus, portanto como incorporação social da percepção da independência, em oposição à percepção da interdependência, fato empírico e ontológico na visão de Elias. Estamos falando, portanto, não mais do conceito sociológico de indivíduo, mas de individualismo.

Ao levantar razões para a intrincada recepção e efetivo uso da sociologia eliasiana, Kilminster afirma que a dificuldade do perceber-se interdependente, por parte dos próprios sociólogos, aparece como importante barreira. Indo mais além, o autor entende a sociologia eliasiana como um grande baque no narcisismo humano:

Em seu ensaio seminal, “As resistências à psicanálise” (...), Freud referiu-se ao golpe cosmológico no amor próprio humano dado por Copérnico; ao golpe biológico desferido por Darwin; e ao golpe psicológico apontado pela psicanálise. Norbert Elias talvez tenha desferido o quarto golpe contra o narcisismo humano, para além de Copérnico, Darwin e Freud - isto é, o golpe sociológico. Pode ser que as resistências a seu trabalho que vieram à tona ao longo dos anos tenham surgido, pelo menos em parte, das características do atual estágio de desenvolvimento social e psíquico. A maior parte dos sociólogos (e de outros) pode simplesmente não possuir a força psíquica mais ampla e o distanciamento, reforçado por redes de pesquisadores com ideias semelhantes, necessários para lidar com a imagem realista de uma sociedade humana interdependente e de si mesmos que Elias insiste que devemos enfrentar. Elias aponta (...) que a capacidade das pessoas de ‘enfrentarem a si mesmas’, de se verem como são, ‘sem a armadura brilhante das fantasias que as protegem do sofrimento, passado, presente e futuro’, depende do grau de segurança de que gozam na sociedade. Ele acrescenta significativamente: ‘Mas isso provavelmente tem seus limites’ (...) (Kilminster, 2007Kilminster, Richard. (2007). Norbert Elias: post-philosophical sociology. London/New York: Routledge.: 155).

As ideologias políticas, as quais são constituintes do habitus individual e social, não são construídas apenas a partir de fantasias emotivas, mas também a partir de dados empíricos. Daqui depreendemos a responsabilidade do sociólogo “caçador de mitos”, da busca por um conhecimento que seja mais orientado para a realidade. Se Elias nos deixa alguma lição para o estudo da contemporaneidade, uma das mais valiosas talvez seja a da necessidade de um conhecimento congruente e orientado para a realidade e, portanto, pautado pela interdependência ontológica, constituinte das figurações que os seres humanos formam uns com os outros. É nesse sentido que entendemos o individualismo predominante na sociedade ocidental contemporânea, como habitus social e individual.

NOTAS

  • 1
    A sociedade de corte, publicada tardiamente, com adições, em 1969, constituiu a tese pós-doutoral de Elias. O título original do trabalho, entregue para avaliação em 1933, era Der höfische Mensch ou The courtly human, em inglês. Uma leitura mais aprofundada a respeito do histórico dessa obra, bem como das condições e circunstâncias de sua escrita, pode ser encontrada no sétimo capítulo de Korte (2017)Korte, Hermann. (2017). On Norbert Elias - Becoming a Human Scientist. Wiesbaden: Springer VS..
  • 2
    A respeito, consultar: Elias (2021a)Elias, Nobert. (2021a). Moyen Âge et procès de civilisation. Paris: Éditions EHESS.. Conforme esclarecem Mennell, Bourguignon e Deluermoz (2010Mennell, Stephen, Bourguignon & Deluermoz, Quentin. (2010). Quelques observations en guise de conclusion. In: Deluermoz, Quentin (org.), Nobert Elias et le 20ème siècle. Le processus de civilisation à l’épreuve. Vintième Siécle. Revue d’histoire, 106 Paris: SciencesPo/Les Presses, p. 209-214.: 211-212), esse livro sobre a Idade Média contém as 122 páginas suprimidas do que foi publicado na França e em outros países com o segundo volume de O processo civilizador.
  • 3
    Em certo momento de sua vida, Elias voltou-se contra o rótulo de sociologia figuracional, justamente por entender que seu conceito estava sendo confundido com o de sistema, sendo ignorada a importante definição de que as figurações estão sempre em processo (Engler, 2013Engler, Wolfgang. (2013) [1989]. Perhaps I have had something to say that will have a future. In: Jephcott, Edmund at al. Norbert Elias: interviews and autobiographical reflections. (Publicado como volume 17 do The Collected Works of Norbert Elias, Dublin: UCD Press.)).
  • 4
    Idea and individual: a critical investigation of the concept of history (Elias, 2006Elias, Norbert. (2006). The Colected Works of Norbert Elias, v. 1. Early writings. Dublin: UCD Press.).

REFERÊNCIAS

  • Arnason, Johann P. (2021). Civilisation, culture and power: reflections on Norbert Elias’s genealogy of the West. In: Bogner, Artur & Mennell, Stephen (orgs.). Civilisations, civilising processes and modernity - A debate between Norbert Elias, Immanuel Wallerstein, William H. McNeill, Hans-Dieter Evers, Keith Hopkins, Johann P. Arnason, Johan Goudsblom and others. Documents from the conference at Bielefeld, 1984. New York: Palgrave Macmillan.
  • Dunning, Eric & Mennell, Stephen. (2003). Norbert Elias. London/New Delhi: Thousand Oaks/Sage Publications, 4 v.
  • Elias, Nobert. (2021a). Moyen Âge et procès de civilisation. Paris: Éditions EHESS.
  • Elias, Norbert. (2021b). The formation of states and changes in restraint. In: Bogner, Artur & Mennell, Stephen (orgs.). Civilisations, civilising processes and modernity - a debate between Norbert Elias, Immanuel Wallerstein, William H. McNeill, Hans-Dieter Evers, Keith Hopkins, Johann P. Arnason, Johan Goudsblom and others. Documents from the conference at Bielefeld, 1984. New York: Palgrave Macmillan.
  • Elias, Norbert. (2021c). Discussion of Elias’s paper. In: Bogner, Artur & Mennell, Stephen (orgs.). Civilisations, civilising processes and modernity - a debate between Norbert Elias, Immanuel Wallerstein, William H. McNeill, Hans-Dieter Evers, Keith Hopkins, Johann P. Arnason, Johan Goudsblom and others. Documents from the conference at Bielefeld, 1984. New York: Palgrave Macmillan.
  • Elias, Nordert. (2009). À quoi servent les utopies scientifiques et littéraire pour l’avenir? In: L’utopie Paris: Éditions La Découvert.
  • Elias, Norbert. (2008). Introdução à sociologia. Lisboa: Edições 70.
  • Elias, Norbert. (2006). The Colected Works of Norbert Elias, v. 1. Early writings. Dublin: UCD Press.
  • Elias, Norbert. (2001). A sociedade de corte: investigação sobre a sociologia da realeza e da aristocracia de corte. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
  • ELIAS, Norbert. (1995). Mozart, sociologia de um gênio Org. Michael Schröter. Trad. Sergio Goes de Paula. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
  • Elias, Norbert. (1994) [1939]. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
  • Elias, Norbert. (1993). O processo civilizador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, v. 2.
  • Elias, Norbert. (1990). O processo civilizador. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, v. 1.
  • Elias, Norbert. (1987). La société des individus. Paris: Édition Fayard.
  • Engler, Wolfgang. (2013) [1989]. Perhaps I have had something to say that will have a future. In: Jephcott, Edmund at al. Norbert Elias: interviews and autobiographical reflections. (Publicado como volume 17 do The Collected Works of Norbert Elias, Dublin: UCD Press.)
  • Fletcher, Jonathan. (1997). Violence and civilization: an introduction to the work of Norbert Elias Cambridge, UK: Polity Press.
  • Goudsblom, Johan. (2013) [1969]. An interview in Amsterdam. In: Jephcott, Edmund et al. Norbert Elias: Interviews and autobiographical reflections (Publicado como volume 17 do The Collected Works of Norbert Elias, Dublin: UCD Press.)
  • Heilbron, Johan. (2013). Sociology… done in the right way. In: Jephcott, Edmund et al. Norbert Elias: interviews and autobiographical reflections Publicado como volume 17 do The Collected Works of Norbert Elias, Dublin: UCD Press.)
  • Heinich, Nathalie. (1993). Le génie. Histoire d’une notion de l’Antiquité à la Renaissance. Paris: Les Éditions de Minuit.
  • Hugues, Jason. (2016). Fields, worlds and figurations: conceptual imagery and political investments in the work of Bourdieu, Becker and Elias. Trabalho apresentado no XVI Simpósio Internacional Processos Civilizadores. Vitória, Universidade Federal do Espírito Santo, mimeo.
  • Kilminster, Richard. (2007). Norbert Elias: post-philosophical sociology London/New York: Routledge.
  • Korte, Hermann. (2017). On Norbert Elias - Becoming a Human Scientist Wiesbaden: Springer VS.
  • Korte, Hermann. (2001). Perspectives on a long life: Norbert Elias and the process of civilization. In: Salumets, Thomas (org.). Norbert Elias and human interdependencies Quebec City: McGill-Queen’s University Press.
  • Landini, Tatiana Savoia. (2013). Main principles of Elias’s sociology. In: Depelteau, François & Landini, Tatiana Savoia (orgs.). Norbert Elias and social theory New York: Palgrave Macmillan.
  • Leão, Andréa Borges. (2007). Norbert Elias e a educação Belo Horizonte: Autêntica.
  • Mennell, Stephen. (2021). Some political implications of sociology from an Eliasian point of view. In: Delmotte, Florence & Gornicka, Barbara (orgs.). Norbert Elias in troubled times - figurational approaches to the problems of the twenty-first century. New York: Palgrave Macmillan.
  • Mennell, Stephen, Bourguignon & Deluermoz, Quentin. (2010). Quelques observations en guise de conclusion. In: Deluermoz, Quentin (org.), Nobert Elias et le 20ème siècle. Le processus de civilisation à l’épreuve. Vintième Siécle. Revue d’histoire, 106 Paris: SciencesPo/Les Presses, p. 209-214.
  • Van Krieken, Robert. (1998). Norbert Elias. London: Routledge.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2021

Histórico

  • Recebido
    28 Abr 2021
  • Aceito
    08 Dez 2021
Universidade Federal do Rio de Janeiro Largo do São Francisco de Paula, 1, sala 420, cep: 20051-070 - 2224-8965 ramal 215 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revistappgsa@gmail.com