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Levantamento de condições de saúde de alunos dos estabelecimentos de ensino primário da Secretaria dos Negócios da Educação do Governo do Estado, no município de São Paulo Brasil

Survey of the health conditions of elementary school children from the State elementary schools in São Paulo City, Brazil

Resumos

Fez-se um levantamento das condições de saúde de escolares primários do município de São Paulo. Nos alunos componentes da amostra foram realizados os seguintes exames: exame físico geral; exame físico especial; exame de fezes. Os resultados obtidos no exame físico geral permitiram construir tabelas de peso e altura para crianças de ambos os sexos, de 7 a 14 anos. Foi verificada a presença de parasitoses intestinais em 89,4% dos escolares examinados. Concluiu-se que, ao nível de significância de 1%, existe associação entre ausência de saneamento básico nas residências dos escolares e a presença de parasitos intestinais nos exames de fezes.

Saúde escolar; Nível de saúde de escolares; Saúde pública


A survey about the health conditions of the elementary schools children of São Paulo City, was realized. The sample students were submitted to general and specialized physical examinations and to parasitological examination of feces. Tables of height and weight of boys and girls, aged 7-14 years, were built based on the general physical examination data. The results of the physical specialized examinations were compared with bibliographical data, whenever existed. About feces examinations, 89,4% of the school children selected presented parasites. At 1% of significance level, it was possible to accept that there was correlation between lackness of sanitation in the school children houses and the presence of intestinal parasites in the feces examination.

School health; Health levels; Public health


ARTIGO ORIGINAL

Levantamento de condições de saúde de alunos dos estabelecimentos de ensino primário da Secretaria dos Negócios da Educação do Governo do Estado, no município de São Paulo Brasil

Survey of the health conditions of elementary school children from the State elementary schools in São Paulo City, Brazil

Emilia Castejón RodriguesI; Gustavo Adolpho Coelho de SouzaI; Wilson Antonio MartinsI; Isaac SoibelmanI; Affonso Renato MeiraI; Norma Corte FaustinoI; Ana Rosa Ferreira PradoII

IDo Serviço de Saúde Escolar da Secretaria dos Negócios da Educação do Estado de São Paulo, – Praça da Bandeira, 40-15.o andar – São Paulo, SP, Brasil

IIDo curso de Fonoaudiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. – Av. Dr. Enéas Carvalho de Aguiar, 255 – São Paulo, SP, Brasil

RESUMO

Fez-se um levantamento das condições de saúde de escolares primários do município de São Paulo. Nos alunos componentes da amostra foram realizados os seguintes exames: exame físico geral; exame físico especial; exame de fezes. Os resultados obtidos no exame físico geral permitiram construir tabelas de peso e altura para crianças de ambos os sexos, de 7 a 14 anos. Foi verificada a presença de parasitoses intestinais em 89,4% dos escolares examinados. Concluiu-se que, ao nível de significância de 1%, existe associação entre ausência de saneamento básico nas residências dos escolares e a presença de parasitos intestinais nos exames de fezes.

Unitermos: Saúde escolar*; Nível de saúde de escolares *; Saúde pública *.

SUMMARY

A survey about the health conditions of the elementary schools children of São Paulo City, was realized. The sample students were submitted to general and specialized physical examinations and to parasitological examination of feces. Tables of height and weight of boys and girls, aged 7-14 years, were built based on the general physical examination data. The results of the physical specialized examinations were compared with bibliographical data, whenever existed. About feces examinations, 89,4% of the school children selected presented parasites. At 1% of significance level, it was possible to accept that there was correlation between lackness of sanitation in the school children houses and the presence of intestinal parasites in the feces examination.

Uniterms: School health *; Health levels; Public health*.

INTRODUÇÃO

Em razão da precariedade de dados na literatura brasileira sobre as condições de saúde dos escolares, e preocupada em conhecer essa realidade fundamental para o planejamento de serviços de saúde, a Diretoria do Serviço de Saúde Escolar da Secretaria dos Negócios da Educação do Governo do Estado de São Paulo organizou um grupo para realizar, nas escolas primárias no Município de São Paulo, levantamento nesse sentido. O presente trabalho é o resultado das atividades realizadas por esse grupo.

MATERIAL E MÉTODOS

Procurando verificar diversos aspectos referentes à saúde dos escolares de nível primário, alunos de escolas mantidas pela Secretaria dos Negócios da Educação do Governo do Estado de São Paulo, no Municipio do mesmo nome, foi levantada uma amostra da totalidade das escolas com essas características, existentes no no de 1967.

A amostra foi elaborada em duas etapas. Na primeira foi feita uma amostragem com partilha proporcional. Para tanto, tomaram-se como estratos as oito delegacias de ensino elementar do Departamento de Ensino Primário da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, no município de São Paulo e, como unidade amostral primária, o grupo escolar. As oito delegacias compreendiam os 382 grupos escolares então existentes no ensinop rimário estadual, no município de São Paulo. Desses 382 grupos escolares tomaram-se 56, ao acaso, sorteados pela tabela de números aleatórios de Fisher e Yates e em números proporcionais ao número dos grupos de cada estrato. Na segunda etapa foi elaborada uma amostra sistemática, tomando-se, como unidade secundária, o aluno.

Desejando-se uma amostra de 2.000 alunos e calculando-se cerca de 12% de ausência de respostas, adotou-se o intervalo de 24 para a seleção dos alunos. Sorteou-se um número que seria igual ou menor que 24 para tomar-se um começo casual, a partir do qual foi selecionado, sistematicamente, cada 24.° aluno, perfazendo-se, assim, uma amostra de 2.290 alunos, com as seguintes características: 1.187 alunos do sexo masculino e 1.103 do sexo feminino; 722, 615, 530 e 423 alunos de 1.a, 2.a, 3.a e 4.a séries escolares, respectivamente.

Antes do início do levantamento os delegados de ensino e os diretores e professores dos grupos escolares constituintes da amostra foram informados sobre os objetivos desse levantamento, e instruídos quanto aos exames a que seriam submetidos os alunos e quanto às datas e preparo dos locais em que seriam realizados os exames. Aos diretores, além das instruções verbais, foram fornecidas instruções impressas e escalas com as datas e horários dos exames clínicos e do recolhimento de material para exames de laboratório.

O grupo encarregado de examinar os alunos compunha-se de: três médicos para os exames clínicos; uma educadora sanitária para testar a acuidade visual; um elemento do curso de fonoaudiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicna da Universidade de São Paulo, supervisionado pelo professor de foniatria do referido curso, para testar a acuidade auditiva; e, uma funcionária administrativa encarregada de tomar as medidas de peso e altura, especialmente treinada para esse trabalho, o qual foi supervisionado por um médico da equipe.

A equipe reuniu-se periodicamente para decidir e padronizar os métodos e técnicas dos exames a serem realizados.

Os exames para o levantamento de dados realizaram-se de 15 de agosto a 30 de novembro de 1967.

Nos alunos componentes da amostra foram realizados os seguintes exames:

a. Exame físico geral, compreendendo medidas de peso e altura, classificação do estado geral e condições de pele, mucosas e gânglios.

b. Exame físico especial, compreendendo exames de olhos, boca, orelhas, coração, abdômen, órgãos genitais (masculinos) e sistema osteomuscular, inclusive deformidades residuais da poliomielite e malformações.

c. Exame de fezes, compreendendo exclusivamente o exame parasitológico.

Critério e métodos utilizados para a realização desses exames:

a – Para pesagem e medida de altura foi utilizada uma única balança, da marca "Filizola", revisada antes do início dos trabalhos pela firma "Filizola", aferida diariamente, antes do início da pesagem, por um dos médicos da equipe e colocada sempre em local com perfeito nivelamento e bem iluminado. Foram pesados e medidos apenas os alunos com idade de 7 a 14 anos, excluídos ainda os estrangeiros, os gessados e os portadores de deformações do esqueleto ou de aparelhos ortopédicos. Foi adotado o critério de anos completos. Assim, um aluno com 7 anos, 11 meses e 30 dias, considerados no dia da tomada de medidas, foi classificado no grupo de alunos de 7 anos, etc. Os alunos foram pesados e medidos descalços e sem agasalhos.

b – Para observação do estado geral do aluno foi adotada classificação de bom, mau e regular, considerando-se:

bom – panículo adiposo desenvolvido, trofismo e turgescência bons;

mau – panículo adiposo, trofismo e turgescência bastante diminuídos; regular – condição intermediária.

Foi ainda observado, para essa classificação, o relacionamento entre peso, altura e idade de cada aluno.

c – Mucosas: descoradas ou não.

d – Gânglios: infartados ou não.

e – No exame de olhos foram feitas as seguintes observações:

medida da acuidade visual, adotando-se a tabela de Snellen;

verificação do uso ou não de óculos; presença de estrabismo;

presença de afecções oculares externas.

f – No exame de boca verificaram-se os dentes e as amígdalas.

Dentes: conservação boa, regular ou má, considerando-se:

boa – ausência de cáries

regular – algumas cáries

má – muitas cáries, gengivites, etc.

Amígdalas:

amigdalite aguda;

amigdalite crônica, considerando-se, para essa classificação: hipertrofia, criptas grandes, congestão pilar, gânglios satélites.

g – No exame de orelhas observaram-se:

otorréia;

medida de acuidade auditiva, processada em duas etapas:

a primeira no próprio grupo escolar, em sala que oferecesse as melhores condições possíveis quanto a ruídos, utilizando-se um audiómetro portátil da marca "Mayco". As crianças com audição baixa foram encaminhadas para o Serviço de Foniatria da Clínica Otorrinolaringológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, onde foi realizado o exame de segunda etapa.

h – No exame de coração procurou-se a presença de sopros e disritmias.

i – No exame de abdômen pesquisaram-se os diversos tipos de hérnias: inguinal (uni e bilateral), escrotal, crural, umbilical e incisional, assim como outros aspectos clinicos.

j – Nos órgãos genitais masculinos pesquisaram-se: fimose, criptorquidia (uni e bilateral), hipospádia e outras.

l – No sistema osteomuscular verificaram-se: postura, classificando-se em boa e má; desvios da coluna vertebral, especificadamente escoliose, lordose, cifose e cifoescoliose, genu-varo, genu-valgo, pé plano, pé cavo e pé valgo, (todos esses uni e bilaterais). Verificou-se ainda a presença de malformações e de deformidades residuais de poliomielite.

m – Os exames parasitológicos de fezes foram processados no Departamento de Parasitologia do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo. O método usado foi o da sedimentação, para pesquisa de helmintos e protozoários.

Os exames clínicos foram realizados nos próprios grupos escolares onde, segundo escala previamente estabelecida, eram examinados 30 alunos por dia, aproximadamente.

As observações foram anotadas diretamente em fichas MacBee Keysort que continham, além dos itens referentes a exame físico geral, exame físico especial e exame de fezes, outros de observação de ordem geral, onde se anotaram: nome do grupo escolar e da delegacia de ensino a que pertencia o grupo; nome, sexo, cor e data de nascimento do aluno; informações sobre se a residência do aluno era servida ou não por saneamento básico, ou seja, rede de águas e esgotos; e se o aluno pertencia à Caixa Escolar.

Terminados os exames, procedeu-se a picotagem das fichas e o levantamento de dados. Dos dados assim obtidos foi realizada estimativa para a totalidade dos alunos representados pela amostra, ou seja, para a população em estudo, empregando-se a estimativa por índice combinado3.

RESULTADOS

Os resultados apresentados referem-se aos grupos de variáveis, os quais abrangem informações gerais relacionadas ao aluno, bem como condições gerais e específicas de sua saúde, assim compreendidos:

– Dados gerais

– Exame físico geral

– Exame físico especial

– Exame parasitológico de fezes

Dados gerais

Procurou-se levantar algumas características de ordem geral, relacionadas à composição da população escolar, tais como a distribuição dos escolares por sexo e por série escolar, encontrando-se os resultados demonstrados nas Tabelas 1 e 3 .

Estes percentuais estimados aproximam-se grandemente dos dados reais da população escolar em estudo, o que se poderá facilmente verificar, comparando-se as estimativas aos dados populacionais então existentes (Tabela 2).

Na Tabela 3 estudou-se a composição da população escolar quanto à distribuição dos alunos pelas quatro séries do ensino primário.

Também aqui houve grande aproximação entre os dados estimados e os dados reais da população estudada, o que se pode observar na Tabela 4.

As pequenas diferenças entre os dados amostrais e populacionais demonstradas nas Tabelas 2 e 4, permitem-nos acreditar que a amostra em estudo se comportou como a população da qual foi tirada.

Outra situação pesquisada foi a referente à existência ou não de saneamento básico na residência dos escolares, verificando-se que apenas 29,9% dos escolares contavam, em suas casas, com serviços de água e esgotos ligados.

Exame físico geral

Foram tomadas medidas de peso e altura dos escolares, procurando-se avaliar seu estado geral, bem como a presença de afecções da pele e condições das mucosas e gânglios.

Com o objetivo de estudar o estado atual do desenvolvimento físico da criança em idade escolar, tomaram-se medidas dos escolares, as quais permitiram a elaboração de tabelas de peso e altura médios, para os grupos etários de 7 a 14 anos, de ambos os sexos. A partir das tabelas agora elaboradas, far-se-ão estudos comparativos com os dados até então existentes para os mesmos grupos etários, na literatura brasileira.

Estes resultados mostram um sensível aumento na altura e peso dos escolares em relação aos dados encontrados por CASTRO e KOENIGSTEIN (1954)2.

Tabela 5

Outra condição observada foi o estado geral do aluno. Para avaliação desse estado, tomou-se em consideração o relacionamento entre peso e altura, espessura do panículo adiposo, turgescência e condições de mucosas (Tabela 6).

No levantamento de dermatoses foram encontrados 36,4% dos escolares portadores de afecções da pele, em percentuais discriminados na Tabela 7.

Na avaliação do estado de mucosas e gânglios verificou-se que 6,3% dos escolares apresentavam mucosas descoradas, notando-se maior freqüência nos meninos (7,9%) que nas meninas (4,5%). Quanto ao infartamento ganglionar, encontraram-se 34,1% dos escolares com gânglios infartados, também aqui os meninos com maior percentual (35,6%) que as meninas, que apresentaram 32,5%.

Exame físico especial

No exame físico especial observaram-se olhos, dentes, amígdalas, ouvidos, coração, abdômen, órgãos genitais (masculinos) e sistema osteomuscular.

No exame de olhos, os testes realizados apontaram 12% dos escolares como suspeitos de diminuição da acuidade visual. Afecções oculares externas e estrabismo também foram observados, podendo-se verificar, pela Tabela 8, a situação encontrada.

Nesse exame foi ainda verificado o uso de óculos em 4,7% dos escolares (incluídos entre os que foram considerados como deficientes), constatando-se assim que 39,4% dos que apresentaram diminuição da capacidade de visão já estavam tratados e que, portanto, 60,6% não tinham recebido qualquer assistência especializada, conforme se pode verificar na Tabela 9.

No exame de dentes encontraram-se as condições indicadas na Tabela 10.

Quanto às amígdalas, levantaram-se os percentuais de alunos portadores de amigdalites, bem como os que já haviam sido amigdalectomizados. (Tabela 11).

Para avaliação da audição, realizaram-se testes preliminares no próprio Grupo Escolar, levantando-se 17,0% dos escolares como suspeitos de apresentarem hipoacusia. Submetidos esses escolares a um segundo exame, em clínica especializada, verificou-se que 7,2% do total dos alunos (Tabela 12) eram portadores de deficiência auditiva.

Os exames de coração revelaram os percentuais de crianças com alterações na ausculta cardíaca (Tabela 13).

O exame de abdômen mostrou 3,0% dos meninos e 0,4% das meninas com hérnias. Anormalidades dos órgãos genitais masculinos também foram pesquisadas (Tabela 14).

Aas Tabelas 15 e 16 mostram, respectivamente, os percentuais de alunos com má postura, e o estudo que relaciona o comportamento da má postura com a evolução do aluno pelas quatro séries escolares.

Os desvios posturais dos pés e joelhos também foram estudados. As Tabelas 17 e 18 demonstram essas anormalidades.

As Tabelas 19 e 20 mostram os percentuais de escolares portadores de deformidades residuais de poliomielite e de malformações.

Exame parasitológico de fezes

O levantamento de parasitoses intestinais encontra-se demonstrado nas Tabelas 21, 22, 23 e 24, nas quais se procurou estabelecer os percentuais gerais, o comportamento das infestações segundo a série escolar em que se encontravam os alunos, os tipos de infestações únicas ou múltiplas e, ainda, segundo os diversos tipos de parasitos encontrados.

A Tabela 22 mostra o estudo de infestações simples e multinfestações.

O estudo do comportamento das parasitoses intestinais durante as quatro séries escolares encontra-se na Tabela 23.

A Tabela 24 mostra a incidência de parasitos, segundo os vários tipos de helmintos e protozoários.

Foram ainda encontrados 13,6% de escolares com Entamoeba coli, observando-se que todos esses casos foram sempre associados a outras parasitoses.

DISCUSSÃO

Dados Gerais

Para se ter uma idéia da validade da amostra e da estimativa realizada para todos os escolres do universo estudado, foi feita uma comparação dos dados gerais estimados com os registrados nas repartições competentes da Secretaria dos Negócios da Educação do Governo do Estado de São Paulo. A variação, no que se refere ao sexo, foi de 0,5% entre os dados estimados (51,6% para o sexo masculino e 48,4% para o feminino) e os dados registrados (52,1% para o sexo masculino e 47,9% para o feminino). Quanto a população escolar nas diferentes séries escolares, as variações foram de 1,7% na 1.a;, 0,1% na 2.a; 0,6% na 3.a e 1,0% na 4.a, entre os valores estimados e os registrados. Esses aspectos valorizam a estimativa realizada não só quanto aos dados gerais, como no que se refere a todas as demais variáveis levantadas, permitindo a existência de uma acentuada confiança nos resultados obtidos.

Exame físico geral

Fazendo-se um cotejo entre as medidas de peso e altura de nossos dados com as encontradas na literatura (MARCONDES et al.4), realizado em Santo André, Estado de São Paulo, em 1969; AZEVEDO (1932)1, em São Paulo; CASTRO e KOENIGSTEIN (1954) 2, ainda em São Paulo, é possível verificar-se que as médias apresentadas neste trabalho são mais altas.

No que tange a peso, uma parte desse aumento pode ser atribuída, principalmente em comparação com o trabalho de MARCONDES et al.5, à diversidade de técnica da tomada dessa variável, uma vez que no presente levantamento as crianças foram pesadas vestidas (apesar de que é dificil considerar-se que toda a diferença se deva a esse fato). No que se refere a altura, todavia, não existem variações de técnicas. Quanto ao levantamento feito por CASTRO e KOENIGSTEIN2, os grupos etários eram delimitados de modo diferente do que foi feito nesta oportunidade, fato capaz de ter influído, em parte, nas variações observadas. Essas comparações encontram-se nas Tabelas 25 e 26 e nas Figuras 1, 2, 3 e 4.





É possível que essas variações sejam devidas, não só às épocas de realização dos diversos trabalhos, como chamou a atenção MARCONDES et al.4, "têm sido verificadas alterações do crescimento físico e da maturidade biológica com o correr dos anos (variação secular do crescimento)" mas, principalmente, à diversidade das populações, em termos étnicos e sócio-econômicos.

Ainda no exame físico geral, em outros aspectos, chamou a atenção, nos problemas referentes à dermatologia, o número de crianças com diagnósticos de escabiose (0,4%), o que sugere uma falta de maior atenção com o asseio corporal, ou então, outro fator capaz de provocar um surto epidêmico, o que realmente ocorreu, entre o tempo em que se levantaram esses dados e a época de sua análise e elaboração.

Exame físico especial

Os dados referentes aos exames dos olhos mostram 12% das crianças com acuidade visual diminuída, o que significa que em 1967, aproximadamente, em números absolutos, 45.510 escolares necessitavam de correção de problemas de visão. Entretanto, foi observado o uso de óculos em 4,7% das crianças. Isto significa que praticamente 27.686 escolares freqüentavam a escola sem ter seus problemas de visão corrigidos. Quanto ao estrabismo, foi verificado que 1,9% das crianças chegam à escola com esses desvios, o que sugere a necessidade de diagnóstico e tratamento precoces, ainda na idade pré-escolar, quando se pode obter melhores resultados na sua correção e recuperação.

Com relação aos aspectos otorrinolaringológicos, apesar de ter sido observado que 11,8% dos escolares haviam sofrido extirpação das amígdalas, ainda assim foi encontrado um percentual de 26,5% das crianças com diagnóstico de amigdalite crônica. Como esse processo produz com freqüência fases de agudização, é possível admitir-se ter sido, ou ainda ser, essa entidade nosológica, uma das maiores responsáveis por ausência de alunos à escola.

Os exames audiométricos revelaram 7,2% dos escolares com diminuição da capacidade auditiva. Essa estimativa, entretanto, deve ser considerada com certa ressalva, uma vez que 36,5% das crianças com suspeita de deficiência auditiva, as quais deveriam passar por um segundo exame mais acurado, deixou de comparecer a essa segunda fase do exame. Portanto, o resultado obtido poderá não refletir a verdadeira situação da população escolar estudada, no que se refere a esse aspecto, podendo-se, mesmo, acreditar que o problema tenha tido uma relevância maior.

O exame de coração mostrou 1,6% das crianças com anomalias, quer referentes ao rítimo ou a caracteres das bulhas cardíacas, ou ainda, à existência de sopros. Este resultado é inferior ao encontrado por SILVA et al. 5 (1968), no município de São Paulo, em escolares pertencentes à rede do ensino elementar da Prefeitura da Capital. Isto pode ter ocorrido porque esses autores estavam voltados exclusivamente ao estudo de cardiopatias, tendo recebido os clínicos que examinaram as crianças um treinamento especializado e recomendação de separar todo e qualquer caso em que pairasse a menor dúvida quanto à normalidade do exame. Assim, eles encontraram um percentual de 6,9% de suspeitos. Desses suspeitos portadores de cardiopatias (em número absoluto de 304), somente foram considerados com cardiopatias, 8 crianças. Como não se realizaram exames mais acurados no levantamento aqui relatado, difícil se tornou uma comparação em relação à prevalência encontrada por SILVA et al.5. Pode-se apenas afirmar que os dados encontrados não permitem contestar aqueles AA, uma vez que se fossem realizados outros exames, poderia ser possível encontrar-se a mesma prevalência por eles observada.

Nos dados referentes a hérnias não pode ser tomada em consideração a variação entre os sexos, uma vez que, em razão de aspectos culturais ligados a sentimento de "pudor", que os examinadores procuraram respeitar, um número acentuado de meninas foram dispensadas desse exame. Isto teve que ser feito para que a colaboração das crianças, das famílias e dos responsáveis pelas escolas continuasse a ser obtida em relação a outros itens do levantamento.

Pela mesma razão só foram examinados os meninos, no que se refere a órgãos genitais. O percentual de portadores de fimose é de quase 30%. Isto demonstra uma característica cultural da população de São Paulo, qual seja, da não valorização do tratamento cirúrgico para esse problema. Não foi registrado o número de meninos que já haviam sofrido tratamento cirúrgico para o problema, o que poderia trazer mais luz sobre o assunto, pois sabe-se que os componentes de certos grupos étnicos e religiosos e ainda outros, por razão de higiene, têm por hábito a realização dessa cirurgia em tenra idade, e sem dúvida a amostra estudada era composta também por elementos desses grupos.

Quanto ao sistema osteomuscular verificou-se um percentual geral elevado de crianças com má postura (37,6%). Percentual esse elevado no sexo masculino (44%) que no feminino (30,6%). Entretanto, mostram esses dados, para ambos os sexos, uma diminuição contínua da má postura no decorrer dos anos em que a criança esteve na escola. É possível que essa melhoria se deva ao seu desenvolvimento e crescimento fisiológico, a uma correção adquirida na freqüência à escola, ou ainda, a ambos os fatores. A criança é um ser em crescimento, fato que se deve ter sempre presente, considerando-se freqüentemente seus desvios posturais como desvios de desenvolvimento, não se devendo esquecer, portanto, que muitos aspectos considerados anormais são apenas transitórios. O mesmo critério pode-se aplicar para os pés planos, valgos e joelhos valgos, devendo-se, entretanto, pensar em outras causas possíveis como estrutura frouxa, aumento exagerado do diâmetro das coxas e desvios estruturais dos ossos. Outro dado que chama a atenção é o número de crianças portadoras de deformações residuais de poliomielite, demonstrando a magnitude do problema da incidência dessa doença nos anos anteriores a 1967. Estes dados se nos afiguram valiosos para estudos posteriores, uma vez que este levantamento foi realizado antes do emprego sistemático da vacinação antipoliomielite.

Exames de fezes

Os dados referentes aos exames de fezes mostraram uma acentuada positividade, encontrando-se quase 90% de escolares infestados por parasitos intestinais, quase 70% com infestações múltiplas, sendo que os meninos apresentaram maior índice de multinfestações que as meninas. O estudo do comportamento das parasitoses intestinais em relação à evolução dos alunos pelas diversas séries escolares demonstrou que durante as quatro séries de escolaridade primária, a prevalência de parasitoses manteve-se praticamente nos mesmos níveis encontrados na primeira série, aumentando mesmo no caso das meninas. Feita uma análise estatística pelo teste de associação do X2, foi possível aceitar-se, ao nível de significância de 1%, que existe uma associação entre a ausência de saneamento básico nas residências dos escolares e a presença de parasitos intestinais nos exames de fezes, encontrando-se, para o coeficiente de Yule, o valor de 0,4, indicando ser positiva a referida associação. Este fato reforça a idéia de que a solução para esse problema possivelmente se encontre mais nas medidas preventivas de saneamento do que nos processos curativos das parasitoses.

CONCLUSÕES

De nossas observações julgamos poder concluir, o que se segue:

1. os valores de peso e altura dos alunos estudados nesta pesquisa são maiores do que nas anteriores;

2. foi verificado que 15,7% dos escolares necessitam de atenção médica para o órgão da visão. Entretanto, encontram-se 4,7% desses escolares, com uso de óculos;

3. pode-se pensar que 7,2% dos escolares apresentam problemas de audição;

4. destacam-se ainda como percentuais mais elevados: amigdalites crônicas, 26,5%; fimose, 28%; desvios posturais, 37,6%;

5. chamou atenção que, entre os percentuais obtidos, à exceção dos referentes a visão, audição, dentes e deformidades residuais da poliomielite, houve predominância das ocorrências nos alunos do sexo masculino;

6. a alta incidência, (89,4%) de parasitoses intestinais e a ausência de saneamento básico, – água e esgotos – em 70,1% das residências dos escolares, vem confirmar as opiniões de que o saneamento básico é fator primordial e indispensável para o combate às parasitoses intestinais.

AGRADECIMENTOS

Nossos especiais agradecimentos a: Dra. Eunice Pinho de Castro Silva, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, pelo planejamento amostrai e pela orientação da análise estatística; Dr. Antonio Dacio Franco do Amaral, da Universidade de São Paulo, que possibilitou a realização dos exames parasitológicos no laboratório do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo; Dr. Américo Paulo Morganti, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, pela colaboração na realização dos exames audiométricos; Dr. Ruy Laurenti, da Faculdade de Saúde Pública, pela orientação na elaboração das fichas para o levantamento; Otávia C. Carneiro, funcionária do Serviço de Saúde Escolar, pelos trabalhos de tomada das medidas de peso e altura; e, ainda, aos órgãos da Secretaria dos Negócios da Educação do Governo do Estado de São Paulo, aos diretores e professores dos Grupos Escolares, pela valiosa colaboração prestada.

Recebido para publicação em 2/10/1792

Aprovado para publicação em 25/10/1972

  • 1. AZEVEDO, E. Contribuição para o estudo de peso e estatura das crianças de São Paulo. São Paulo, 1932. [Tese Faculdade de Medicina da USP]
  • 2. CASTRO, M. A. & KOENIGSTEIN, W. A. Pesquisa sobre peso e altura dos escolares de São Paulo. [Trabalho aresentado no IV Congresso Sul Americano de Pediatria, São Paulo, 1954]
  • 3. HURWITZ, M. H. Sample survey, methods and theory. New York, John Willey S. Sons, 1953. v. 1.
  • 4. MARCONDES, E. et al. Estudo antropométrico de crianças brasileiras de zero a doze anos de idade. Anais Nestlé, 84:1-200, 1970.
  • 5. SILVA, W. N. da et al. Epidemiologia da doença reumática em escolares de 7 a 14 anos no Município de São Paulo. Arq. bras. Cardiol., 22:235-42, 1964.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Ago 2006
    • Data do Fascículo
      Dez 1972

    Histórico

    • Aceito
      25 Out 1972
    • Recebido
      02 Out 1972
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