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Capitalismo periférico, sistema penal neoliberal e práxis abolicionista

Peripheral capitalism, neoliberal penal system and abolitionist praxis

Resumos

Resumo

O presente artigo objetiva discutir diferentes aspectos pertinentes ao modo de atuação do sistema penal neoliberal no Brasil. Diante do avanço neoliberal concomitante à restrição da condição humana, perguntamo-nos como o pensamento de Frantz Fanon pode contribuir para a compreensão desse aparato punitivo. Assim, mobilizamos os processos de racialização por ele articulados diante da situação colonial para compreendermos a matriz colonial de poder como arranjo institucional da posição brasileira na periferia do capitalismo e como elemento norteador da atuação racista do nosso sistema penal. Por isso, a análise daqueles aspectos aponta para a necessária interrupção das práticas de extermínio institucionalizadas contra a população negras, pelo resgate da resistência abolicionista.

Palavras-chave:
Racialização; Colonialidade; Capitalismo periférico; Sistema penal neoliberal


Abstract

This article aims to discuss different aspects relevant to the modus operandi of the neoliberal penal system in Brazil. Faced with the neoliberal advance concomitant with the restriction of the human condition, we wonder how Frantz Fanon's thought can contribute to the understanding of this punitive apparatus. Thus, we mobilize the racialization processes articulated by him in the face of the colonial situation to understand the colonial matrix of power as an institutional arrangement of the Brazilian position on the periphery of capitalism and as a guiding element of the racist performance of our penal system. Therefore, the analysis of those aspects’ points to the necessary interruption of institutionalized extermination practices against the black population, by rescuing abolitionist resistance.

Keywords:
Racialization; Coloniality; Peripheral capitalism; neoliberal penal system


Introdução

Com o presente artigo buscamos discutir diferentes aspectos pertinentes ao modo de atuação do sistema penal neoliberal no Brasil, a partir do questionamento sobre como o pensamento de Frantz Fanon pode contribuir para a sua compreensão. Inicialmente, articularemos o processo de racialização decorrente da situação colonial à invenção da ideia de raça — esta com base no pensamento de Aníbal Quijano — para que se possa compreendê-los atualmente como expressão da matriz colonial de poder em nosso continente, ou seja, como herança ainda viva do processo de colonização e — nos termos propostos por Dennis de Oliveira — como arranjo institucional do Brasil na periferia do capitalismo.

Os processos de racialização forja(ra)m as hierarquias de humanidade que serviram de justificativa para a escravidão em um passado não tão distante no nosso país, e hoje justificam não apenas a superexploração do trabalho no marco do neoliberalismo, mas também uma série de outras violências dirigidas aos derrotados e às derrotadas pelo processo de colonização. Um dos mecanismos que materializam essas violências racializadas é o sistema penal.

Por isso, em seguida, partiremos do percurso histórico orientado, a princípio, na percepção de Ana Flauzina sobre como o racismo condicionou estruturalmente as práticas inscritas no sistema penal brasileiro em diferentes períodos — desde a colonização portuguesa à atualidade — para, assim, pensarmos o sistema penal neoliberal em diálogo com as correntes abolicionistas, pela interrupção dos processos de extermínio contra a população negra.

Fanon e os processos de racialização

Ao investigar a recepção do pensamento de Frantz Fanon no Brasil, Deivison Mendes Faustino (2015)FAUSTINO, D. M. “Por que Fanon, por que agora?”: Frantz Fanon e os fanonismos no Brasil. 2015. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, 2015. — ou Deivison Nkosi, como costuma ser chamado — lança a pergunta: “Por que Fanon? Por que agora?”. Os motivos que levaram à renovação do interesse no pensamento do intelectual martinicano dentro do debate acadêmico brasileiro do século XXI podem ser associados ao avanço do neoliberalismo, rumo à restauração de um ordenamento social global em que a condição humana se restringe, como nos alerta Dennis de Oliveira (2021)OLIVEIRA, D. de. Racismo estrutural: uma perspectiva histórico-crítica. 1 ed. São Paulo: Editora Dandara, 2021..

Esse processo envolve a concentração crescente de riquezas nos países centrais, de maioria branca, aliada ao aumento da miserabilidade enquanto foco de desestabilização nos países da periferia do capitalismo, de população majoritariamente não branca. Além disso, impõe as condições econômicas que conduziram ao desemprego estrutural crescente, ao aumento da população na zona da miséria e à intensificação das tensões sociais - tudo isso em países, como o próprio Brasil, em que o critério raça é historicamente funcional à sustentação de clivagens sociais. É diante desse cenário que se aponta as duas vertentes políticas pelas quais se expressa a “contrarreforma neoliberal”: uma que se baseia na administração das tensões sociais mediante políticas compensatórias, e outra baseada na intensificação de estruturas de violência institucional como caminho para o extermínio da população não branca. Num contexto de constante crise política em torno da radicalização neoliberal, bem como em razão do recorte temático deste trabalho, é indispensável atentar-se para a segunda vertente (OLIVEIRA, 2021OLIVEIRA, D. de. Racismo estrutural: uma perspectiva histórico-crítica. 1 ed. São Paulo: Editora Dandara, 2021.).

A rigor, isso não seria nenhuma novidade se considerarmos como a história do racismo moderno se entrelaça com a história das crises estruturais do capitalismo, cujas reatualizações sempre resultaram em formas renovadas de violência e estratégias de subjugação da população negra. A crise atual mundializa a condição negra. Quem antes vivia o drama de ser explorado pelo capital, hoje convive com a tragédia de não mais sequer ser útil a seu funcionamento. Se, por um lado, os corpos reduzidos pela racialidade se tornaram um excedente populacional a ser extirpado; por outro, a institucionalização dessa descartabilidade enquanto padrão de vida e a sua generalização ao mundo inteiro consistem naquilo que Achille Mbembe chama de devir-negro do mundo (ALMEIDA, 2019ALMEIDA, S. L. de. Racismo estrutural. São Paulo: Sueli Carneiro; Pólen, 2019.; BARROS, 2019BARROS, D. R. Lugar de negro, lugar de branco? Esboço para uma crítica à metafísica racial. 1. ed. São Paulo: Hedra, 2019.; MBEMBE, 2017MBEMBE, A. Crítica da razão negra. 2. ed. Lisboa: Antígona, 2017.).

Então, finalmente: Por que Fanon? Por que agora? Porque o momento atual é decisivo para o desenvolvimento de perspectivas teóricas que localizam raça e racismo como parte integrante do capitalismo. Nesse sentido, os esforços de Fanon representam uma “tentativa importante de elaborar a dialética de raça e classe por meio de uma estrutura teórica coerente que não dissolvesse uma na outra. Isso pode ajudar a explicar o atual ressurgimento do interesse em seu trabalho” (HUDIS, 2020, pHUDIS, P. O Racismo e a lógica do capital: uma reconsideração Fanoniana. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 11, n. 2, p. 1391-1417, jun. 2020.. 1393)1.

Faustino (2015, pFAUSTINO, D. M. “Por que Fanon, por que agora?”: Frantz Fanon e os fanonismos no Brasil. 2015. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, 2015.. 54-56) argumenta que o conceito de sociogenia é a base estruturante do pensamento fanoniano de modo a — desautorizando a costumeira separação entre um Fanon psicanalista e um Fanon revolucionário em sua análise do colonialismo — apontar para uma determinação reflexiva entre capitalismo, colonialismo e racismo. Por um lado, só é efetivamente possível compreender as articulações entre o colonialismo e os traumas que ele causa à subjetividade do colonizado a partir de “suas determinações historicamente concretas: a modernidade capitalista e sua necessidade de converter o que é genuinamente humano em objeto de sua acumulação”. Por outro, essa compreensão precisa “ser pautada por uma análise que ultrapasse a dimensão meramente econômica da dominação”, de modo a distender o marxismo com o qual Fanon dialoga criticamente (FAUSTINO, 2018, pFAUSTINO, D. M. Frantz Fanon: capitalismo, racismo e a sociogênese do colonialismo. SER Social, Brasília, v. 20, n. 42, p. 148-163, jan./jun. 2018.. 151). O racismo não pode ser combatido exclusivamente em termos econômicos ou de classe, posto que aquilo que o torna especialmente mortal é o seu caráter de interdição ao reconhecimento da dignidade e da humanidade do sujeito colonizado (HUDIS, 2020HUDIS, P. O Racismo e a lógica do capital: uma reconsideração Fanoniana. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 11, n. 2, p. 1391-1417, jun. 2020.).

A racialização do mundo contemporâneo, segundo Faustino (2015, pFAUSTINO, D. M. “Por que Fanon, por que agora?”: Frantz Fanon e os fanonismos no Brasil. 2015. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, 2015.. 61), implicaria “não o surgimento de mais um conflito existencial — ou discriminação ou preconceito —, mas a impossibilidade, para os povos racializados, de viver plenamente os conflitos existenciais que nos fazem humanos”. É o lugar de negação da humanidade da pessoa negra que Fanon (2008, pFANON, F. Pele negra, máscaras brancas. Salvador: Edufba, 2008.. 26) define como uma “zona de não-ser, uma região extraordinariamente estéril e árida, uma rampa essencialmente despojada, onde um autêntico ressurgimento pode acontecer”. Ao trabalhar essa categoria, Peter Hudis (2020, pHUDIS, P. O Racismo e a lógica do capital: uma reconsideração Fanoniana. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 11, n. 2, p. 1391-1417, jun. 2020.. 1399) nos alerta que o “negro não é visto como humano precisamente por ser ‘visto’ — não uma vez, mas repetidamente — como negro. A mente colonial não ‘vê’ o que pensa que vê; fixa seu olhar não na pessoa real, mas em uma imagem reificada que a obscurece”.

Esse processo de coisificação se dá de forma mais profunda quando se remete à interiorização subjetiva dos complexos oriundos da situação colonial (FAUSTINO, 2018FAUSTINO, D. M. Frantz Fanon: capitalismo, racismo e a sociogênese do colonialismo. SER Social, Brasília, v. 20, n. 42, p. 148-163, jan./jun. 2018.). A princípio, a racialização das experiências do colonizado conduz ao complexo de inferioridade que, na análise psicológica empreendida por Fanon, é condicionada à prévia tomada de consciência das realidades econômicas e sociais. A construção do complexo de inferioridade depende de um duplo processo, que é inicialmente econômico e que se segue pela “interiorização, ou melhor, pela epidermização dessa inferioridade” (FANON, 2008, pFANON, F. Pele negra, máscaras brancas. Salvador: Edufba, 2008.. 28).

O aspecto econômico da racialização diz respeito à “epidermização dos lugares e posições sociais, ou seja, aquilo que se entende por raça passa a ser definidor das oportunidades e barreiras vividas pelos indivíduos ao longo de sua vida” (FAUSTINO, 2015, pFAUSTINO, D. M. “Por que Fanon, por que agora?”: Frantz Fanon e os fanonismos no Brasil. 2015. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, 2015.. 58, grifo do autor). A situação colonial se expressa na imediata percepção da raça, num contexto em que “as realidades econômicas, as desigualdades, a enorme diferença dos modos de vida não conseguem nunca mascarar as realidades humanas”, já que se trata do espaço onde “a infraestrutura econômica é também uma superestrutura. A causa é consequência: alguém é rico porque é branco, alguém é branco porque é rico” (FANON, 2005, pFANON, F. Os condenados da terra. 1. ed. 2. reimpressão atualizada. Juiz de Fora: Editora UFJF, 2005.. 56). O maniqueísmo colonizador-colonizado se materializa nas forças violentas que estouram na colônia com a objetiva cumplicidade do capitalismo.

O aspecto subjetivo da racialização envolve a já mencionada interiorização subjetiva dos complexos estabelecidos na situação colonial — seja pela epidermização da inferioridade do colonizado ou da superioridade do colonizador. Trata-se, nas palavras de Faustino (2015, pFAUSTINO, D. M. “Por que Fanon, por que agora?”: Frantz Fanon e os fanonismos no Brasil. 2015. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, 2015.. 59), do “momento em que os indivíduos deixam de se reconhecer mutuamente como reciprocamente humanos para ver a si e ao outro por meio da lente distorcida do colonialismo”, que passa a restringir a visão de mundo e de si por parte de ambos.

Em oposição ao complexo de inferioridade que a ideologia do branqueamento impõe a pessoas negras, o racismo é internalizado pelas brancas enquanto complexo de superioridade em relação às não brancas (MIRANDA; SANTOS, 2021MIRANDA, L. S.; SANTOS, J. F. dos. Notas sobre branquitude, privilégios e negação do racismo. Perspectivas e Diálogos: Revista de História Social e Práticas de Ensino, v. 2, n. 8, p. 120-141, jul./dez. 2021.). No contexto do projeto moderno de colonização, a branquitude se estabelece como “um constructo ideológico de poder, em que os brancos tomam sua identidade racial como norma e padrão” (SCHUCMAN, 2020, pSCHUCMAN, L. V. Entre o encardido, o branco e o branquíssimo: branquitude, hierarquia, e poder na cidade de São Paulo. 2. ed. São Paulo: Veneta, 2020.. 49-50). A esse lugar de poder, marcado por privilégios e ocupado pela branquitude que universaliza sua própria experiência enquanto medida de humanidade, podemos chamar de zona do ser.

Da análise psicológica fanoniana emergem subjetividades profundamente marcadas pela racialização. As representações distorcidas que colonizadores e colonizados, brancos e negros, têm de si e do outro são possíveis apenas num mundo conformado pelo colonialismo e por seu arranjo violento. Nesse mundo compartimentado, cindido, cortado em dois, surge a assunção em massa de um complexo psicoexistencial que, com sua análise, Fanon busca destruir. Sua superação deve se dar principalmente no campo prático-sensível, como pré-condição essencial para o surgimento de uma sociabilidade nova, de um novo humanismo. Afinal, o colonialismo é um dado da realidade social que se manifesta como exterioridade concreta aos sujeitos, a partir de uma negação sistemática do outro, e de uma determinação furiosa de negar à pessoa racializada todos os atributos da humanidade. O humanismo radical de Fanon é um chamado à ação e se efetiva a partir dela, na medida em que é pela práxis que a “coisa colonizada” se humaniza no mesmo processo pelo qual se liberta, ao mobilizar a violência contracolonial para a descolonização (FANON, 2005FANON, F. Os condenados da terra. 1. ed. 2. reimpressão atualizada. Juiz de Fora: Editora UFJF, 2005., 2008FANON, F. Pele negra, máscaras brancas. Salvador: Edufba, 2008.; FAUSTINO, 2018FAUSTINO, D. M. Frantz Fanon: capitalismo, racismo e a sociogênese do colonialismo. SER Social, Brasília, v. 20, n. 42, p. 148-163, jan./jun. 2018.; HUDIS, 2020HUDIS, P. O Racismo e a lógica do capital: uma reconsideração Fanoniana. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 11, n. 2, p. 1391-1417, jun. 2020.).

Porém, Faustino (2018, pFAUSTINO, D. M. Frantz Fanon: capitalismo, racismo e a sociogênese do colonialismo. SER Social, Brasília, v. 20, n. 42, p. 148-163, jan./jun. 2018.. 160) nos relembra o alerta de que “a estrutura econômica da colônia dificultava uma saída verdadeiramente independente” para os colonizados. A dependência econômica histórica em relação às antigas metrópoles, aliada à subserviência das elites locais, conduziu ao surgimento de novas formas de colonização e exploração — em vez de uma efetiva descolonização.

A centralidade da raça na matriz colonial de poder e o capitalismo periférico

O cenário que se apresenta no século XXI é em vários aspectos distinto daquele com que Fanon se deparou em meados do século XX, no período mais efervescente de sua atividade intelectual e política. Ao mesmo tempo, esse cenário oferece novas aproximações possíveis às questões por ele enfrentadas. Entre as recepções contemporâneas da obra de Fanon, destacamos e mobilizamos o pensamento decolonial para reposicionar o antagonismo colonizador-colonizado para a polaridade geográfica Norte-Sul. A partir dessa perspectiva latino-americana, o conceito de modernidade deveria ser pensado como um processo histórico necessariamente vinculado às tramas da colonialidade, como sua face oculta (FAUSTINO, 2015FAUSTINO, D. M. “Por que Fanon, por que agora?”: Frantz Fanon e os fanonismos no Brasil. 2015. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, 2015.).

De acordo com Aníbal Quijano (2005), aQUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Ciudad Autónoma de Buenos Aires, Argentina: CLACSO - Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales, 2005. colonialidade cria um novo padrão de poder capitalista, cujo eixo central é a raça, ou seja, a classificação da população mundial de acordo com a ideia de raça. Com isso, pensamos ser pertinente a pergunta que se faz Douglas Rodrigues Barros (2019)BARROS, D. R. Lugar de negro, lugar de branco? Esboço para uma crítica à metafísica racial. 1. ed. São Paulo: Hedra, 2019., afinal: como uma ficção pôde ganhar força material a ponto de moldar a apreensão de um mundo e tornar-se motor do real? A invenção da ideia de raça2 forjada na colonização da América convergiu com dois processos: a codificação (e posterior naturalização) da diferença entre dominantes e dominados em termos de raça e a articulação de todas as formas históricas de controle do trabalho em torno do mercado mundial. O sistema-mundo, portanto, organiza-se a partir da raça como uma categoria mental fundamental no projeto moderno.

Neste trabalho, tais processos serão encarados como uma relocalização/reperiodização dos aspectos subjetivos e econômicos da racialização abordados anteriormente — agora desde a América e enquanto expressão da matriz colonial do poder nessa região. É com a invasão ibérica que toma lugar essa nova codificação para a distribuição internacional do trabalho com critério na ideia de raça, em que as ditas raças inferiores não deveriam ser destinadas ao trabalho assalariado, mas à escravidão, à servidão ou à morte. O sistema escravista-colonial operou sob os signos da divisão racial do trabalho e do lucrativo tráfico de pessoas negras escravizadas por quase quatrocentos anos no Brasil, sendo este o fato histórico-social mais importante para a formação brasileira. Nesse aspecto, o racismo como hoje o conhecemos é produto dessa classificação racial que se consolidou ao longo do século XVI como instrumento do projeto ideológico eurocêntrico materializado na emergência do capitalismo e na hegemonia da branquitude (MOURA, 1983MOURA, C. Escravismo, colonialismo, imperialismo e racismo. Afro-Ásia. Salvador, n. 14, 1983.; QUIJANO, 2005QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Ciudad Autónoma de Buenos Aires, Argentina: CLACSO - Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales, 2005.; OLIVEIRA, 2021OLIVEIRA, D. de. Racismo estrutural: uma perspectiva histórico-crítica. 1 ed. São Paulo: Editora Dandara, 2021.).

A função ideológica da ideia de raça está vinculada ao modo como legitimou as relações de dominação impostas pelos colonizadores brancos. A partir dela, a expansão mundial do colonialismo promoveu uma “quase exclusiva associação da branquitude social com o salário e logicamente com os postos de mando da administração colonial”, naturalizando, então, os lugares de poder na hierarquização do sistema-mundo (QUIJANO, 2005, pQUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Ciudad Autónoma de Buenos Aires, Argentina: CLACSO - Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales, 2005.. 118-119).

Essa função, porém, não se esgota no período da colonização. Por suposição lógica, “caso a função ideológica da raça se limitasse apenas à legitimação do colonialismo, à medida que as nações colonizadas se emancipassem, o racismo acabaria” (OLIVEIRA, 2021, pOLIVEIRA, D. de. Racismo estrutural: uma perspectiva histórico-crítica. 1 ed. São Paulo: Editora Dandara, 2021.. 68). Sabemos bem que isso não aconteceu. A ideia de raça transcendeu a “independência” das antigas colônias. Aqui, as aspas indicam que o surgimento dos Estados independentes na América Latina não significou uma ruptura com a ordem do sistema-mundo, mas um reposicionamento: uma rearticulação da colonialidade do poder sobre novas bases institucionais. A construção dos Estados recém surgidos foi operacionalizada pelas elites brancas contra a maioria da população, neste caso representada por pessoas indígenas, negras e mestiças (OLIVEIRA, 2021OLIVEIRA, D. de. Racismo estrutural: uma perspectiva histórico-crítica. 1 ed. São Paulo: Editora Dandara, 2021.; QUIJANO, 2005QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Ciudad Autónoma de Buenos Aires, Argentina: CLACSO - Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales, 2005.).

A dependência dos capitalistas senhoriais desses jovens países era movida pela colonialidade do poder, que os levava a perceber seus interesses sociais como iguais aos dos outros brancos dominantes, na Europa e nos Estados Unidos. Nesse processo, o capitalismo se ocupou de manter as hierarquias raciais fundadas no modelo anterior. Os lugares de cada um já estavam marcados na nova ordem, o que possibilitou a produção e circulação de mercadorias no mercado mundial. De fato, se o capitalismo altera as formas de organização dessa produção, ele não rompe com as hierarquias do período colonial, que lhe permanecem úteis. A universalização da concepção eurocêntrica de ser humano, portanto, foi necessária à expansão capitalista (OLIVEIRA, 2021OLIVEIRA, D. de. Racismo estrutural: uma perspectiva histórico-crítica. 1 ed. São Paulo: Editora Dandara, 2021.; QUIJANO, 2005QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Ciudad Autónoma de Buenos Aires, Argentina: CLACSO - Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales, 2005.).

Segundo Clóvis Moura (1983, pMOURA, C. Escravismo, colonialismo, imperialismo e racismo. Afro-Ásia. Salvador, n. 14, 1983.. 132), o escravismo atuou como elemento de entrave no desenvolvimento interno do Brasil, pois “permitiu que a economia de tipo colonial pudesse chegar aos níveis de exploração a que chegou, descapitalizando permanentemente aqueles setores que poderiam compor uma economia de consumo interno, em favor de uma economia de exportação”. O modelo de capitalismo dependente substituiu o modo de produção escravista aproveitando-se de seus vestígios ainda presentes, ao torná-los parte de seus mecanismos reguladores da economia subdesenvolvida. No capitalismo dependente, desenvolvimento e subdesenvolvimento estão conectados de tal modo que são dois lados da mesma moeda: tanto a dependência e a subordinação dos países de capitalismo periférico, quanto o desenvolvimento dos países centrais (MOURA, 1983MOURA, C. Escravismo, colonialismo, imperialismo e racismo. Afro-Ásia. Salvador, n. 14, 1983.; ORTEGAL, 2018ORTEGAL, L. Relações raciais no Brasil: colonialidade, dependência e diáspora. Serv. Soc. Soc., São Paulo, n. 133, p. 413-431, set./dez. 2018.).

Dennis de Oliveira (2021)OLIVEIRA, D. de. Racismo estrutural: uma perspectiva histórico-crítica. 1 ed. São Paulo: Editora Dandara, 2021. argumenta que a matriz colonial de poder é o arranjo institucional do nosso atual capitalismo periférico, em que a divisão racial do trabalho na rede global produtiva se sofistica em relação ao período colonial. As hierarquias raciais agora definem o acesso às riquezas, aos recursos tecnológicos e ao conhecimento. No topo do capitalismo estão os processos tecnológicos de produção e distribuição sob controle branco, o que deixa numa escala intermediária a produção manufatureira, e na base da pirâmide o fornecimento de insumos e matérias primas - com a população não branca ocupando as formas de trabalho mais degradantes subordinadas a esse circuito. Os recursos antes drenados pelas metrópoles no sistema colonial-escravista continuam sendo drenados na estrutura do capitalismo dependente, numa relação levada pelas classes dominantes locais que se beneficiam disso e conseguem, nessa dinâmica, tirar proveito da situação ao se apropriarem de grande parte do excedente, assim como as classes dominantes externas que também se beneficiam das grandes fontes produtoras de lucro: antes a pilhagem, agora o comércio exterior (GONZALEZ, 1979GONZALEZ, L. Cultura, etnicidade e trabalho: efeitos linguísticos e políticos da exploração da mulher. In: ENCONTRO NACIONAL DA LATIN AMERICAN STUDIES ASSOCIATION, 8., Pittsburg, 1979.; OLIVEIRA, 2021OLIVEIRA, D. de. Racismo estrutural: uma perspectiva histórico-crítica. 1 ed. São Paulo: Editora Dandara, 2021.; ORTEGAL, 2018ORTEGAL, L. Relações raciais no Brasil: colonialidade, dependência e diáspora. Serv. Soc. Soc., São Paulo, n. 133, p. 413-431, set./dez. 2018.).

As classes dominantes locais, contudo, compensam essa drenagem por meio da superexploração do trabalho, que só foi possível pela instituição de mecanismos repressivos, ideológicos, econômicos e culturais de caráter autoritário, com vistas à marginalização sistêmica da grande maioria negra na população brasileira desde o pós-abolição. Nesse processo, a população negra é descartada pelas elites brancas como modelo de operário para o trabalho assalariado, enquanto se busca, em outros países aquele tipo de trabalhador considerado ideal: o branco (MOURA, 1983MOURA, C. Escravismo, colonialismo, imperialismo e racismo. Afro-Ásia. Salvador, n. 14, 1983.; OLIVEIRA, 2021OLIVEIRA, D. de. Racismo estrutural: uma perspectiva histórico-crítica. 1 ed. São Paulo: Editora Dandara, 2021.).

Dennis de Oliveira (2021)OLIVEIRA, D. de. Racismo estrutural: uma perspectiva histórico-crítica. 1 ed. São Paulo: Editora Dandara, 2021. aponta que a população negra formou um estoque de mão de obra que ficou responsável pela execução de determinados serviços não qualificados, no âmbito do chamado mercado informal de trabalho. Desde Lélia Gonzales (1979) já se questiona a naturalização da divisão racial no desempenho desses papéis socialmente desvalorizados, em especial aqueles relegados às mulheres negras na prestação de serviços domésticos. Para ela, a libertação da mulher branca se tem feito às custas da exploração da mulher negra. Esses trabalhos desobrigaram investimentos públicos e privados para garantir os suportes materiais necessários para a própria produção capitalista, como creches e lavanderias. Por parte do Estado, esses investimentos somente poderiam ser realizados mediante a captação de recursos via tributos cobrados das classes dominantes brancas — poupadas nesse processo.

No entanto, há de se acrescentar um fator central a essa discussão. A mesma matriz colonial de poder que sustenta as transferências desiguais de valor e a superexploração do trabalho de homens negros e mulheres negras nas condições diferenciadas de humanidade forjadas pelo racismo, também sustenta um projeto de extermínio em curso contra a população negra nesses mesmos termos.

Aqueles mecanismos repressivos, ideológicos, econômicos e culturais de caráter autoritário que possibilitam a superexploração, possibilitam também a execução desse projeto de descarte de todo um segmento populacional. Aliado à invenção racista de que progresso e embranquecimento do país são sinônimos, um desses mecanismos tem papel decisivo na execução daquele projeto. Falamos do sistema penal brasileiro e do condicionamento estrutural que o racismo imprimiu em suas práticas (FLAUZINA, 2017FLAUZINA, A. L. P. Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro. 2. ed. Brasília: Brado Negro, 2017.).

Sistema penal neoliberal, racismo e abolição

A partir da discussão sobre a invenção da ideia de raça articulada aos diferentes aspectos do processo de racialização, foi possível identificar a base de sustentação da violência colonial em hierarquias raciais, refletidas diretamente no modelo escravista e atualizadas e no modelo capitalista dependente. De fato, “o racismo foi o amparo ideológico em que o país se apoiou e se apoia para se fazer viável” (FLAUZINA, 2017, pFLAUZINA, A. L. P. Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro. 2. ed. Brasília: Brado Negro, 2017.. 17).

Na medida em que o chamado mito da democracia racial foi o suporte ideológico em que se assenta a política discriminatória de extermínio contra a população negra, também lhe coube impedir a constatação explícita dessas práticas nos meios institucionais. No entanto, a violência explícita que o sistema penal brasileiro mobiliza contra esse segmento da população a transforma numa “ferida aberta” a administrar. Como algo assim poderia acontecer no país da democracia racial? O pacto da suposta convivência harmoniosa entre as raças — ou, em outras palavras, da inexistência do racismo no Brasil — é desmascarado pelas demandas históricas de resistência intelectual e política dos movimentos negros organizados que, recepcionadas por Ana Flauzina no campo criminológico em “Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro”, tornam explícita a principal tarefa do nosso sistema penal desde sua origem: a manutenção das hierarquias raciais mediante o controle da população negra (MOURA, 1983MOURA, C. Escravismo, colonialismo, imperialismo e racismo. Afro-Ásia. Salvador, n. 14, 1983.; FLAUZINA, 2017FLAUZINA, A. L. P. Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro. 2. ed. Brasília: Brado Negro, 2017.).

Essa tarefa tem ganhado novo corpo com o avanço neoliberal e a crescente racialização da vida — aos quais nos referimos no início da primeira seção. Esse processo sinaliza o surgimento de um novo modelo de sistema penal em que o racismo segue sendo o fundamento do controle social e dos processos de extermínio da população negra (BARROS, 2019BARROS, D. R. Lugar de negro, lugar de branco? Esboço para uma crítica à metafísica racial. 1. ed. São Paulo: Hedra, 2019.; FLAUZINA, 2017FLAUZINA, A. L. P. Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro. 2. ed. Brasília: Brado Negro, 2017.; MBEMBE, 2017MBEMBE, A. Crítica da razão negra. 2. ed. Lisboa: Antígona, 2017.; OLIVEIRA, 2021OLIVEIRA, D. de. Racismo estrutural: uma perspectiva histórico-crítica. 1 ed. São Paulo: Editora Dandara, 2021.).

Mesmo uma nova ordem constitucional que se afirma democrática não cumpre um papel de ruptura histórica com os ditames do racismo sobre o conjunto das agências de punição. Pelo contrário, a Constituição de 1988 deve ser interpretada para além de seu texto e a partir das estruturas sociais em que se insere, na medida em que o próprio constitucionalismo precisa ser compreendido como parte do processo social concebido desde o contexto que o produz. A atuação das agências penais constitucionalmente legitimadas revela mais permanências do modelo colonial-escravista do que propriamente rupturas com o projeto genocida de poder que forjou o Estado brasileiro. O sistema penal neoliberal permanece funcional aos projetos hegemônicos de Brasil e se revela a partir de processos de desumanização que o precedem e que não se encerram por sua atuação — pois os reproduz (FLAUZINA, 2017FLAUZINA, A. L. P. Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro. 2. ed. Brasília: Brado Negro, 2017.; HOLMES, 2020HOLMES, P. A sociedade civil contra a população: uma teoria crítica do constitucionalismo de 1988. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, Ahead of print, v. XX, n. XX, p. 01-34, 2020.; PIRES, 2018PIRES, T. 130 anos de Lei Áurea e 30 anos da Constituição de 1988: constitucionalismo e decolonialidade em perspectiva diaspórica. In: GÓES, L. 130 anos de (des)ilusão: a farsa abolicionista em perspectiva desde olhares marginalizados. Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2018.).

Por tudo isso, alguns aspectos do sistema penal neoliberal serão analisados a seguir. O primeiro deles diz respeito à atuação das agências policiais nesse sistema. O racismo é a variável que regula a atuação do sistema penal, indica a intensidade de suas intervenções, e formata a metodologia desse aparato de controle social. Essa metodologia é fundamentalmente ancorada na negação da humanidade das pessoas negras. Suspeição generalizada, altíssimos índices de letalidade policial e os agora renomeados autos de resistência estão inclusos nesse pacote. No âmbito da radicalização neoliberal, essa forma de agir tem se legitimado socialmente na atuação não só dos subterrâneos esquadrões da morte, mas de grupos de extermínio institucionalizados (FLAUZINA, 2017FLAUZINA, A. L. P. Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro. 2. ed. Brasília: Brado Negro, 2017.).

O grau de enraizamento do mito da democracia racial é o que permite comparar a atuação de um policial na periferia a um artilheiro em frente ao gol e, ao mesmo tempo, tratar a violência racista praticada sistematicamente por esse agrupamento como casos isolados, quando vêm a público3. Em alguma medida, o velho “Não existe racismo no Brasil” se converte num “Ah! Mas agora também tudo é racismo” quando a sua negação se torna impossível. A radicalização neoliberal, no entanto, tem deixado escapar suas verdadeiras intenções de que a polícia mire “na cabecinha” e atire “para matar”4.

Recentemente, o já encerrado Governo Bolsonaro defendia explicitamente o acirramento discursivo e prático dessa radicalização, num contexto em que “o discurso de ódio, da intolerância, do autoritarismo, da ignorância achou terreno fértil”. A adoção desse novo tipo de subjetividade neoliberal, muito mais do que produzir uma espécie de fascismo de novo tipo, reatualiza práticas escravistas que se encontram no âmago da construção brasileira da subalternidade (CORTIZO; RUVIARO, 2021, p. 83).

Outro aspecto do sistema penal neoliberal a ser enfrentado está na relação de complementaridade que mantém com o mercado de trabalho. A permanência da divisão racial do trabalho empurra a população negra para a informalidade e para a superexploração. Por sua vez, a Reforma Trabalhista implantada pela Lei nº 13.467/2017 fez da classe trabalhadora responsável por garantir sua própria empregabilidade em um mercado de trabalho que apresenta condições cada vez menos favoráveis, além de impor que arcasse sozinha com os riscos do desemprego e da subocupação. Se por um lado, o aumento da vulnerabilidade e da precarização tende a igualar a condição de boa parte da população economicamente ativa àquela há muito vivenciada pela população negra; por outro, o agravamento da condição a que esta já está submetida acirra a movimentação do sistema penal a partir da lógica em que a hierarquia racial da pobreza garante que o público-alvo das agências policiais permaneça o mesmo (FLAUZINA, 2017FLAUZINA, A. L. P. Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro. 2. ed. Brasília: Brado Negro, 2017.; MELLO, 2020MELLO, L. G. de. Reforma trabalhista e desproteção social: um devir negro do mundo. Revista da ABET, v. 19, n. 1, jan./jun. 2020.).

O terceiro aspecto é que esse sistema penal contemporâneo tem como pressuposto de fundo a diferenciação dos indivíduos. Para Flauzina (2017, pFLAUZINA, A. L. P. Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro. 2. ed. Brasília: Brado Negro, 2017.. 101), ainda que ele não invente a intervenção diferencial, “assume-a de maneira clara e a leva às últimas consequências”. Resultado disso é o modo pelo qual opera, ao distinguir os delitos dos consumidores ativos, para quem se direcionam as ditas medidas despenalizadoras; e os delitos dos consumidores falhos, alvos da privação de liberdade neutralizadora (ZAFFARONI et al., 2011ZAFFARONI, E. R. et al. Direito Penal Brasileiro: primeiro volume: Teoria Geral do Direito Penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2011.).

Para o primeiro grupo de consumidores em potencial foram direcionados uma série de substitutivos penais conforme o objetivo latente de que deveriam ser poupados dos rigores do encarceramento. Penas alternativas, transações penais, suspensões condicionais de processos, medidas cautelares diversas da prisão — e em alguma medida os recentes acordos de não persecução penal — foram os institutos mobilizados para que se evitasse o contato daqueles com o cárcere. Considerando que essas medidas, em verdade, tenderam a ampliar o âmbito de atuação do sistema penal, a repercussão negativa dessa tendência certamente não se voltou aos beneficiários da imunização neoliberal (FLAUZINA, 2017FLAUZINA, A. L. P. Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro. 2. ed. Brasília: Brado Negro, 2017.).

Se para o primeiro grupo a pretensão implícita era a de se evitar a prisão a qualquer custo; para o segundo, ela deve ser construída como possibilidade, prolongando ao máximo sua permanência por lá. Para o cumprimento dessa agenda, a Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006) foi fundamental. A política proibicionista por ela articulada se traduz nos nossos expressivos níveis de encarceramento e nas mortes decorrentes das diretrizes belicistas da ação policial, que afetam de maneira especial a população negra. Qualquer discurso de democracia racial é insustentável tendo isso em mente (DUARTE; FREITAS, 2019DUARTE, E. P.; FREITAS, F. da S. Corpos negros sob a perseguição do estado: política de drogas, racismo e direitos humanos no Brasil. Direito Público, [S. l.], v. 16, n. 89, 2019.; FLAUZINA, 2017FLAUZINA, A. L. P. Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro. 2. ed. Brasília: Brado Negro, 2017.).

A agenda de controle diferencial vem sendo formatada por mecanismos que vinculam o medo — sempre ele — à desumanização dos segmentos vulneráveis, cuja imagem é a animalizada e demonizada para que se opere a criminalização. O projeto estético do medo se revela na sua racialização pelos meios de comunicação, baseada nos estereótipos da negritude: a família negra como ente patológico, o homem negro como criminoso e a mulher negra como promíscua e degradante. A demonização desses atores serve para atualizar a política de extermínio que não desaparece da plataforma política das elites. A rigor, o proibicionismo é uma política econômica de movimentação de ativos ilegais para a manutenção de poder político desses pequenos grupos, às custas de vidas negras (DUARTE; FREITAS, 2019DUARTE, E. P.; FREITAS, F. da S. Corpos negros sob a perseguição do estado: política de drogas, racismo e direitos humanos no Brasil. Direito Público, [S. l.], v. 16, n. 89, 2019.; FLAUZINA, 2017FLAUZINA, A. L. P. Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro. 2. ed. Brasília: Brado Negro, 2017.).

O último aspecto do sistema penal neoliberal a ser abordado está na questão carcerária no Brasil. O cárcere apresenta de forma extremada/concentrada as violências de Estado que são mobilizadas para desumanizar os mesmos grupos fora dele. Se aqui as prisões são majoritariamente ocupadas pelos derrotados do processo de colonização, é porque raça é efeito, não causa: é da ordem racial que emana a ordem prisional, mas a segunda retroalimenta a primeira numa construção permanente direcionada à subjugação, à subalternização e à expropriação, ou seja, à produção de um vínculo social de submissão. Se o negro não existe enquanto tal, ele precisa ser constantemente produzido (FLAUZINA; MBEMBE, 2017MBEMBE, A. Crítica da razão negra. 2. ed. Lisboa: Antígona, 2017.; PIRES, 2019; SEGATO, 2007SEGATO, R. L. El color de la cárcel en América Latina: apuntes sobre la colonialidade de la justicia en un continente en desconstrucción. Revista Nueva Sociedad, n. 208, p. 142-161, mar./abr. 2007.).

Mais que a privação de liberdade, o encarceramento significa a negação de uma série de direitos e uma situação de aprofundamento de vulnerabilidades. Tanto o cárcere quanto o pós-encarceramento significam a morte social destes indivíduos negros e negras. O estigma do “ex-presidiário” impõe uma interdição do acesso à cidadania já maculada pela opressão racial em todos os campos da vida, mas que exemplificamos nas perspectivas de acesso ao mercado formal de trabalho5. Não por acaso, a prisão é uma das instituições mais fundamentais no processo de genocídio contra a população negra em curso no país (BORGES, 2021BORGES, J. Encarceramento em massa. São Paulo: Sueli Carneiro; Editora Jandaíra, 2021.).

Desse modo, o sistema penal neoliberal, em vários aspectos, aprofunda o projeto de extermínio já adequado ao mito da democracia racial. O sistema penal brasileiro tem continuamente servido como instrumento estratégico na materialização de uma política genocida no Brasil. É certo que não se trata do único instrumento. Por uma via ativa, vem se ancorando na atuação das agências policiais. Mas não se pode fechar os olhos para os sofisticados mecanismos de omissão, que deixam perecer as pessoas descartáveis, a exemplo da atuação estatal diante da pandemia do novo coronavírus, que cobra em vidas o que foi pavimentado pelas estruturas do racismo (FLAUZINA, 2017FLAUZINA, A. L. P. Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro. 2. ed. Brasília: Brado Negro, 2017.; FLAUZINA; PIRES, 2020FLAUZINA, A.; PIRES, T. Políticas da morte: Covid-19 e os labirintos da cidade negra. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 10, n. 02, p. 74-92, 2020.).

O sistema penal não é único, mas é a face mais visível do atual projeto genocida de Estado. Essa constatação nos encaminha para mobilizar a categoria genocídio como instrumento de declaração política da responsabilidade do Estado, nacional e internacionalmente. Por isso, é fundamental para que se busque, de imediato, a interrupção das práticas de extermínio institucionalizadas - policiamento, proibicionismo e prisão - e na sequência pleitear o processo de reparações voltado para a população negra. No campo prático-político, o desvelamento do modo de atuação da face mais visível do projeto genocida é essencial à emersão das menos visíveis e à derrocada de todas elas (FLAUZINA, 2017FLAUZINA, A. L. P. Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro. 2. ed. Brasília: Brado Negro, 2017.).

Por isso, retomamos a pergunta. Por que Fanon? Por que agora? Porque os processos de racialização definem o grupo inimigo que poderá ser destruído sem exceção para que haja normalidade na situação colonial. Mesmo que os processos contemporâneos de criminalização também recaiam por vezes sobre pessoas brancas, é manifesto que as práticas que os fundamentam foram moldadas a partir da escravidão e de sua herança na colonialidade (ALAGIA; CODINO, 2019ALAGIA, A.; CODINO, R. El legado de Lumumba: la liberación de la criminología. In: La descolonización de la criminología en América. Buenos Aires: Editora Ediar, 2019.; GIAMBERARDINO, 2021GIAMBERARDINO, A. R. Sociocriminologia. 1. ed. Belo Horizonte, São Paulo: D’Plácido, 2021.). A essa altura, já sabemos como Fanon (2005)FANON, F. Os condenados da terra. 1. ed. 2. reimpressão atualizada. Juiz de Fora: Editora UFJF, 2005. propõe a descolonização. Da criminologia à política criminal, surge um chamado à prática, pela interrupção dos processos de extermínio e pela posterior busca por reparação.

A herança colonial presente em nossas práticas punitivas é fator de desequilíbrio, de manutenção de injustiças históricas, e de eliminação de todo um contingente populacional. Qualquer postura diferente de uma tomada de posição contra esses processos de extermínio termina por fortalecê-los. Trata-se de premissa fundamental para o aprofundamento radical de uma crítica abolicionista a tais práticas: a contraposição possível àquela sociabilidade é a abolição da prisão e do sistema penal (FLAUZINA, 2017FLAUZINA, A. L. P. Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro. 2. ed. Brasília: Brado Negro, 2017.; MONTEIRO; DAMASCENO; MORAES, 2021MONTEIRO, V. de O.; DAMASCENO, R. A.; MORAES, R. F. Uma imaginação anticolonial: a epistemologia do abolicionismo penal em torno dos sentidos da violência. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 12, n. 01, p. 497-523, 2021.). Por isso,

é preciso não só o aprofundamento da mencionada radicalidade da crítica abolicionista ao poder punitivo e às categorias e saberes que o sustentam, mas também a problematização e resgate de táticas de resistência a essa dominação que historicamente foram apagadas ou estigmatizadas como irracionais, bárbaras e violentas a partir de concepções da modernidade, como o discurso jurídico, que estão diretamente comprometidas com a violência colonial. (MONTEIRO; DAMASCENO; MORAES, 2021, pMONTEIRO, V. de O.; DAMASCENO, R. A.; MORAES, R. F. Uma imaginação anticolonial: a epistemologia do abolicionismo penal em torno dos sentidos da violência. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 12, n. 01, p. 497-523, 2021.. 513).

O resgate dessas táticas de resistência se revela na práxis e na literatura abolicionista, inclusive brasileira, enquanto movimento composto por pessoas e grupos que reconhecem o sistema penal e a política criminal que o sustenta como estruturas marcadas pela escravidão e pela política de branqueamento do país. Se destas descende diretamente o sistema penal, este também deve ser abolido (DAVIS, 2018DAVIS, A. Estarão as prisões obsoletas? 1. ed. Rio de Janeiro: Difel, 2018.).

A consolidação da raça enquanto elemento organizador da comunidade política transformava o extermínio em possibilidade sempre que as hierarquias raciais produzidas pela escravidão estivessem em risco. Cientes disso, abolicionistas brasileiros como Luiz Gama tensionavam a institucionalidade para além do reformismo e insistiam, no século XIX, que, enquanto a escravidão continuasse, as perspectivas democráticas seriam sombrias. No século XXI, um breve período de ascensão da população negra a bens de consumo veio em conjunto com o abrupto aumento da violência a ela direcionada, seja via extermínio ou encarceramento. É nesse contexto que abolicionistas insistem que um dos pressupostos fundamentais para verdadeira democratização é a urgente abolição do sistema penal - ou, em outras palavras: uma segunda abolição (ALAGIA; CODINO, 2019ALAGIA, A.; CODINO, R. El legado de Lumumba: la liberación de la criminología. In: La descolonización de la criminología en América. Buenos Aires: Editora Ediar, 2019.; BORGES, 2021BORGES, J. Encarceramento em massa. São Paulo: Sueli Carneiro; Editora Jandaíra, 2021.; DAVIS, 2018DAVIS, A. Estarão as prisões obsoletas? 1. ed. Rio de Janeiro: Difel, 2018.; GIAMBERARDINO, 2021GIAMBERARDINO, A. R. Sociocriminologia. 1. ed. Belo Horizonte, São Paulo: D’Plácido, 2021.; QUEIROZ, 2022QUEIROZ, M. O HAITI É AQUI: Ensaio sobre formação social e cultura jurídica latino-americana (Brasil, Colômbia e Haiti, século XIX). 2022. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Direito, Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2022.).

Considerações finais

O momento atual, como já foi dito, é decisivo para o desenvolvimento de perspectivas teóricas como as de Fanon e Flauzina, que localizam raça e racismo como parte integrante do capitalismo e nos permitem compreender as consequências dessa relação no modo como o aparato punitivo do Estado atua sob o marco do neoliberalismo.

Diante da necessidade de conter os processos de extermínio atualmente em curso, torna-se necessário o aprofundamento radical de uma crítica abolicionista a tais práticas, como forma de reorganização e contraposição aos avanços neoliberais que também já se aprofundam nos processos contínuos de desumanização. Por isso, um ímpeto abolicionista fanoniano se consolida na perspectiva de retomada dessa humanidade, pelos meios que forem necessários para a descolonização.

Agradecimentos

Ao professor Cleifson Dias Pereira, por indicar parcela significativa da bibliografia referenciada para a elaboração deste trabalho.

  • Notas

    1 A esse respeito, Sílvio Luiz de Almeida (2019, pALMEIDA, S. L. de. Racismo estrutural. São Paulo: Sueli Carneiro; Pólen, 2019.. 113) é assertivo ao constatar que “o racismo não deve ser tratado como uma questão lateral, que pode ser dissolvida na concepção de classes, até porque uma noção de classe que desconsidera o modo com que esta se expressa enquanto relação social objetiva torna o conceito uma abstração vazia de conteúdo histórico. São indivíduos concretos que compõem as classes à medida que se constituem concomitantemente como classe e como minoria nas condições estruturais do capitalismo. Assim, classe e raça são elementos socialmente sobredeterminados”.
    2 Reforçamos que, para Quijano (2005)QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Ciudad Autónoma de Buenos Aires, Argentina: CLACSO - Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales, 2005. a ideia de raça é, literalmente, uma invenção, por nada ter a ver com a estrutura biológica da espécie humana.
    3 Nesse ponto, tratamos de duas declarações públicas do então Governador do Estado da Bahia, Rui Costa (PT), em dois dos vários casos de terror racial protagonizados pela Polícia Militar na cidade de Salvador. O primeiro deles diz respeito à Chacina do Cabula, o segundo, às agressões registradas em vídeo a um jovem negro de 16 anos de idade. As declarações podem ser acessadas em: https://www.correio24horas.com.br/noticia/nid/e-como-um-artilheiro-em-frente-ao-gol-diz-rui-costa-sobre-acao-da-pm-com-doze-mortos-no-cabula/ e em: https://www.correio24horas.com.br/noticia/nid/rui-costa-pede-punicao-a-pm-que-agrediu-adolescente-caso-isolado/.
    4 Referência explícita às promessas de campanha dos então candidatos ao governo dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo, posteriormente eleitos. Respectivamente: Wilson Witzel (PSC) - Disponível em: https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2018/11/01/a-policia-vai-mirar-na-cabecinha-e-fogo-afirma-wilson-witzel.htm - e João Dória (PSDB) - Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/10/a-partir-de-janeiro-policia-vai-atirar-para-matar-afirma-joao-doria.shtml. Ambos, por motivos distintos, já não ocupam mais tais cargos.
    5 Ainda que careça de estudos mais aprofundados, chama atenção que também a força de trabalho “uberizada” venha sendo submetida a checagens de antecedentes criminais pelas plataformas.
  • Agência financiadora Trabalho parcialmente financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001, Processo nº 88887.664294/2022-00 do Programa DS, entre 01/02/2022 e 28/02/2023.
  • Aprovação por Comitê de Ética e consentimento para participação Não se aplica.
    Consentimento para publicação Autorizamos a publicação do presente trabalho.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Out 2023
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2023

Histórico

  • Recebido
    02 Mar 2023
  • Aceito
    29 Maio 2023
  • Revisado
    04 Jul 2023
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