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Educação básica e o acesso de transexuais e travestis à educação superior

Basic education and access to transexuals and travesties to higher education

RESUMO

O presente artigo tem por objetivo discutir sobre como os debates de gênero e sexualidade durante a educação básica podem interferir no acesso de transexuais e travestis à educação superior, com base nos dados obtidos por meio de pesquisas realizadas por iniciativas de projetos, produções acadêmicas, organizações não governamentais (ONGs), redes de apoio ou de associações, como também por notícias em mídias sociais, além das ações governamentais que têm o intuito de promover equidade e respeito às identidades de gênero na escola. De acordo com o estudo proposto, embora as questões de gênero e sexualidade tenham obtido relevância em políticas e legislações que se vinculam tanto ao campo da educação como a outros campos, estudantes transexuais e travestis ainda têm dificuldade para concluir o período de escolaridade obrigatória. Por conseguinte, propor reflexões e trabalhar conceitos nas escolas de educação básica não é o suficiente, é preciso investir na formação inicial e continuada de todo o corpo docente.

PALAVRAS-CHAVE:
Educação básica; educação superior; transexualidade; travestilidade

ABSTRACT

This article aims to discuss how gender and sexuality debates during basic education can interfere in the access of transsexuals and transvestites to higher education, based on data obtained through research carried out by project initiatives, academic productions, organizations non-governmental organizations (NGOs), support networks or associations, as well as news on social media, in addition to governmental actions aimed at promoting equity and respect for gender identities at school. According to the proposed study, although gender and sexuality issues have gained relevance in policies and legislation that are linked both to the field of education and to other fields, transsexual and transvestite students still have difficulty completing the period of compulsory schooling. Therefore, proposing reflections and working on concepts in basic education schools is not enough, it is necessary to invest in the initial and continuing training of the entire teaching staff.

KEYWORDS:
Basic education; college education; transsexuality; transvestility

Com a hipótese central de que as discussões sobre gênero e sexualidade na escola podem contribuir para o acolhimento de estudantes transexuais e travestis, por meio de coleta de dados quantitativos, além das ações governamentais que têm o intuito de promover equidade e respeito às identidades de gênero na escola, o presente artigo tem por objetivo discutir sobre como os debates de gênero e sexualidade durante a educação básica podem interferir no acesso de transexuais e travestis à educação superior.

Enquanto a expectativa de vida da população brasileira é de 74,9 anos, a de transexuais e travestis é de 35 anos, estando o Brasil como líder no ranking dos países que mais matam pessoas transexuais e travestis no mundo2 2 De acordo com o dossiê da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), publicado em janeiro de 2020 (BENEVIDES; NOGUEIRA, 2020). . A infecção por HIV/AIDS, as intervenções médicas clandestinas e a violência transfóbica são os três maiores indicadores de mortalidade, que estão, direta ou indiretamente, ligados às situações de marginalidade e exclusão social.

Em virtude da construção social e histórica do que é homem e do que é mulher, determinada a partir da matriz biológica feminino/masculino e de concepções morais e religiosas que estigmatizam as identidades de gênero que não correspondem à norma imposta, transexuais e travestis podem sofrer transfobia e ser excluídas/os de ambientes sociais por serem associadas/os ao pecado, à marginalidade e à patologia. Nesse contexto, a escola, como um espaço social historicamente instituído, carrega intrinsecamente determinações da sociedade que a estabelece.

Vide os dados3 3 Os dados foram coletados em 2015, por meio de um questionário aberto, envolvendo estudantes maiores de 13 anos matriculadas/os no ensino fundamental. da Pesquisa Nacional sobre o Ambiente Educacional no Brasil, realizada em 2016 pela Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais: cerca de 60,2% das/os estudantes LGBT se sentem inseguras/os na escola em razão de sua orientação sexual, à medida que 42,8% se sentem inseguras/os em razão de sua expressão de gênero. Nesse contexto, reconhecemos que esse espaço responde de forma hostil às diferenças que não se enquadram no padrão socialmente imposto (GUIZZO; FELIPE, 2015).

Cabe ressaltar que, ao indicarmos e discutirmos sobre as ações necessárias na educação básica, não estamos desvalidando as políticas promulgadas na e para a educação superior, como as resoluções de nome social e cotas por exemplo, pelo contrário, reconhecemos que tais ações podem contribuir para o ingresso de transexuais e travestis que estão inseridas/os em segmentos sociais historicamente excluídos do direito à educação.

Sob essa perspectiva, e considerando que as discussões acerca das questões de gênero, sexualidade, preconceitos raciais e desigualdade de classes sociais devem ocorrer de modo a mitigar as ações discriminatórias, tanto por parte das/os estudantes quanto por parte do corpo docente da instituição, como mencionado anteriormente, o presente estudo tem como objetivo discutir sobre como os debates de gênero e sexualidade durante a educação básica podem interferir no acesso de transexuais e travestis à educação superior.

Para aprofundamento do tema, o artigo está organizado em três partes. Na primeira, denominada “(Pré)conceitos”, explicitamos brevemente os conceitos de gênero, transexualidade e travestilidade. Na segunda, “Políticas, discussões de gênero e espaço escolar”, apresentamos as ações governamentais que têm o intuito de promover equidade e respeito às identidades de gênero na escola e discutimos sobre esse espaço frente às diferenças. Na terceira parte, denominada “Transexuais, travestis e o acesso à educação superior”, analisamos o acesso de estudantes transexuais e travestis à educação superior. Por fim, teremos as considerações finais.

(Pré)conceitos e contextualização

Neste tópico elucidamos que há pessoas que se identificam com determinadas identidades, seja por autopercepção e/ou posicionamento político, contudo, não temos pretensão de fazer classificações de como “deve ser” uma pessoa transexual e/ou travesti, apenas buscamos utilizar, visibilizar e evidenciar a singularidade dos termos. Para a compreensão sobre como são identificadas as pessoas transexuais e travestis na sociedade, o conceito de gênero é o prelúdio nessa discussão. Esse conceito, uma ferramenta política que se constitui sobre os corpos sexuados e que, sobretudo, enfatiza a construção social e histórica acima do sexo biológico, pode ser explicado fazendo parte do sujeito, constituindo-o, de acordo com as concepções e representações estabelecidas na sociedade e no contexto histórico (LOURO, 2000LOURO, Guacira Lopes. Pedagogias da sexualidade. In: LOURO, Guacira Lopes (org.). O corpo educado: pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2000, p. 7-34.).

O gênero é entendido como uma das identidades (étnica, sexual, gênero, classe) que constituem as pessoas, no qual os elementos sociais e culturais são contribuintes. Todavia, é a autopercepção que deve ser considerada: conforme Jesus (2012JESUS, Jaqueline Gomes. Orientações sobre identidade de gênero: conceitos e termos. Guia técnico sobre pessoas intersexuais, travestis e demais transgêneros, para formadores de opinião. 2. ed. Brasília, 2012. Disponível em: http://www.diversidadesexual.com.br/wp-content/uploads/2013/04/G%C3%8ANERO-CONCEITOS-E-TERMOS.pdf. Acesso em: 22 mar. 2020.
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, p. 8), “o que importa, na definição do que é ser homem ou mulher, não são os cromossomos ou a conformação genital, mas a autopercepção e a forma como a pessoa se expressa socialmente”. Nessa perspectiva, a identidade de gênero não está condicionada ao sexo biológico com o qual a pessoa nasce, está relacionada à afinidade com os gêneros masculino e/ou feminino, que são definidos a partir de questões sociais e históricas. Contudo, é pelo modo como as pessoas se sentem, se identificam e se situam no mundo que se estabelece a identidade de gênero, assim como a transexualidade e a travestilidade.

Quando as pessoas têm uma identidade de gênero que não corresponde ao sexo biológico, por exemplo, se reconhecem homem e têm vulva/vagina, são consideradas homens transexuais, ou, quando se reconhecem mulher e têm pênis, são consideradas mulheres transexuais e/ou travestis4 4 Há pessoas que podem se reconhecer mulheres transexuais, mulheres, mulheres travestis ou apenas travestis. É uma questão particular. . Isso posto, tanto a transexualidade quanto a travestilidade são construções identitárias localizadas no campo do gênero (BENTO, 2008BENTO, Berenice. O que é transexualidade. São Paulo: Brasiliense, 2008.). Quando as pessoas se identificam como travestis, muitas são associadas ao pecado e à marginalidade; quando se identificam como transexuais, são associadas à patologia. Essas associações são decorrentes do caráter histórico, político e social das identidades. O termo travesti, por exemplo, “é antigo, muito anterior ao conceito de ‘transexual’ e, por isso, muito mais utilizado e consolidado em nossa linguagem” (JESUS, 2012JESUS, Jaqueline Gomes. Orientações sobre identidade de gênero: conceitos e termos. Guia técnico sobre pessoas intersexuais, travestis e demais transgêneros, para formadores de opinião. 2. ed. Brasília, 2012. Disponível em: http://www.diversidadesexual.com.br/wp-content/uploads/2013/04/G%C3%8ANERO-CONCEITOS-E-TERMOS.pdf. Acesso em: 22 mar. 2020.
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, p. 16), sendo quase sempre citado como sinônimo de “imitação”, “engano” ou de “fingir ser o que não se é”.

Com um contexto mais histórico, o termo travesti tem sido referenciado enquanto um adjetivo pejorativo, ligado “a uma figura hipersexualizada relacionada, quase diretamente, à prostituição, à criminalidade e à marginalidade” (FERREIRA, 2017FERREIRA, Tatiana de Souza. Os processos de entrada e permanência das travestis e das mulheres transexuais no mercado de trabalho. 2017. 45f. Monografia (Graduação em Terapia Ocupacional). Departamento de Terapia Ocupacional, Universidade Federal da Paraíba, 2017., p. 13), em decorrência da grande quantidade de pessoas que se identificam como travestis, trabalham na prostituição e/ou estão em situações de vulnerabilidade. Além da vinculação à prostituição, a imagem da travesti permanece associada a uma figura com baixa escolaridade e baixa renda que, embora haja “um esforço sobretudo por parte dos movimentos sociais para promover uma imagem socialmente aceita, são ainda muito fortes os traços que associam a identidade travesti a aspectos bastante negativos, sendo a prostituição o seu mais forte marcador social” (SAGRILLO, 2017SAGRILLO, Daniel Duarte. Jovens transgêneros: percursos biográficos sobre a busca de si e as relações de trabalho. 2017. 112f. Dissertação (Mestrado em Educação). Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal Fluminense, 2017., p. 30).

Enquanto a identificação travesti está associada a prostituição, drogas, crimes e marginalidade, o termo transexual tem se consolidado por se relacionar a uma ideia higienizada e de maior status social (SOUZA JUNIOR, 2011SOUZA JUNIOR, Samuel Luiz de. Direitos sexuais e políticas públicas: o combate à discriminação para a concretização dos direitos humanos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT) no estado do Pará. 2011. 157f. Dissertação (Mestrado em Direito). Programa de Pós-Graduação em Direito, Universidade Federal do Pará, 2011.). Contudo, a transexualidade permanece categorizada como patologia pela medicina, sendo classificada como “disforia de gênero” no Manual Diagnóstico e Estatístico de Doença Mental (DSM 5). A transexualidade também é nomeada como doença pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), que definiu os critérios para o diagnóstico por meio da Resolução CFM n. 1.652/2002 (atualmente CFM n. 1.955/2010)5 5 Em 2010 a resolução n. 1.652/2002 foi revogada e entrou em vigor a CFM n. 1955/2010, com pequenas alterações sobre a equipe multidisciplinar constituída por médica/o psiquiatra, cirurgiã/o, endocrinologista, psicóloga/o e assistente social. . Essa resolução autoriza e designa a cirurgia de transgenitalização para as pessoas portadoras de “desvio psicológico permanente de identidade sexual”, e foi base para a Portaria n. 1.707/2008 (atualmente n. 2.803/2013), que estabelece o processo transexualizador por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).

Em suma, não são as diferenças estéticas, cirúrgicas ou psicológicas que irão definir a transexualidade e a travestilidade6 6 A única diferença socialmente perceptível é em relação aos homens transexuais, que, segundo Bento (2015, p. 31), relatam sofrer menor rejeição social, manifestada pelos olhares inquisidores, quanto mais conseguem ser reconhecidos socialmente como homens (PEDRA, 2018, p. 43). . Essas autoidentificações acontecem a partir de visões de mundo, de conhecimento e pertencimento, e “as múltiplas diferenças e particularidades vivenciadas pelas pessoas nesse universo social não podem ser reduzidas a categorias ou classificações unificadoras” (BENEDETTI, 2005BENEDETTI, Marcos. Toda feita: o corpo e o gênero das travestis. Rio de Janeiro: Garamond, 2005., p. 17).

Compreendemos que as atribuições da transexualidade à patologia e da travestilidade à marginalidade são estabelecidas e inferiorizadas pela sociedade com base no que é tido como diferente do padrão, podendo ser entendidas como estigmas que desempenham um papel de controle e fazem com que alguns grupos se tornem desvalorizados, enquanto outros se sintam de alguma forma superiores (AGGLETON; PARKER, 2001AGGLETON, Peter; PARKER, Richard. Estigma, discriminação e AIDS. Rio de Janeiro: Abia, 2001.). O estigma é um constructo social, formado em determinado contexto temporal/histórico, que pode levar à exclusão social ao se consolidar em condutas que fazem com que a/o outra/o seja categorizada/o como inferior e/ou rejeitada/o. Essa exclusão social é alusiva ao ato de colocar à margem (social, cultural e politicamente) determinado grupo quando suas diferenças não são toleradas.

Bursztyn (2003BURSZTYN, Marcel (org.). No meio da rua: Nômades, excluídos e viradores. Rio de Janeiro: Garamond, 2003., p. 60) aponta que a exclusão social, quando acompanhada pela estigmatização, refere-se a “um processo social de não reconhecimento do outro ou de pura rejeição. Trata-se de uma representação que tem dificuldades de reconhecer no outro direitos que lhe são próprios”. Ainda que determinada população não esteja formalmente excluída de direitos,

O conceito de exclusão social está mais próximo, como oposição, do de coesão social ou, como sinal de ruptura, do de vínculo social. Por similitude, encontra-se próximo, também, do conceito de estigma e mesmo, embora menos, do desvio. Neste caso, entre outras, a diferença reside no fato de que o excluído não necessita cometer nenhum ato de transgressão, inversamente ao desviante e à semelhança dos que sofrem discriminação pura e simples. A condição de excluído lhe é imputada do exterior, sem que para tal tenha contribuído direta ou mesmo indiretamente. (BURSZTYN, 2000, p. 59).

Em síntese, o autor entende que a exclusão social é similar ao estigma e não depende de nenhum ato de transgressão, isto é, a ruptura dos vínculos sociais não depende de ações por parte da pessoa excluída, de modo que a condição de excluído provém do exterior, da organização da sociedade. No tocante às vivências das pessoas transexuais e travestis, Jesus (2012JESUS, Jaqueline Gomes. Orientações sobre identidade de gênero: conceitos e termos. Guia técnico sobre pessoas intersexuais, travestis e demais transgêneros, para formadores de opinião. 2. ed. Brasília, 2012. Disponível em: http://www.diversidadesexual.com.br/wp-content/uploads/2013/04/G%C3%8ANERO-CONCEITOS-E-TERMOS.pdf. Acesso em: 22 mar. 2020.
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) constata que pode haver uma exclusão estrutural, que se constitui desde o acesso dificultado ou impedido a direitos, ao mercado de trabalho e até mesmo ao uso de banheiros, sobretudo, a que se somam ameaças, agressões e homicídios em razão dos estigmas sobre suas identidades de gênero.

Políticas, discussões de gênero e espaço escolar

As discussões sobre gênero e sexualidade têm ganhado visibilidade política desde o começo dos anos 2000, ao passo que ações governamentais que promovem equidade e respeito às identidades de gênero foram instituídas. Essas ações constituem o processo de transformação da sociedade, no qual a luta política dos movimentos sociais LGBT7 7 A justificativa para o uso da sigla LGBT tem por base seu emprego no campo das políticas públicas, dado que as ações de âmbito federal buscam uma unificação com durabilidade temporal que perpassa gerações. por garantia de direitos tem obtido reconhecimento.

A partir dos anos 2000, especialmente com a ascensão do governo Lula em 2003, o movimento LGBT incorporou em sua agenda a luta pela criminalização da homofobia, ao lado de outras reivindicações, algumas delas direcionadas a públicos específicos: travestis e homens e mulheres trans, por exemplo, que ansiavam pelo reconhecimento e direito ao uso do nome social. No campo da educação, a reivindicação é pela inclusão da temática sobre gênero e diversidade sexual nos currículos escolares. O que diferencia os dois momentos (antes e depois dos anos 2000) é que, com a maior participação dos movimentos sociais no governo, os movimentos passaram a ser cada vez mais representados no Estado e com meios mais eficazes de negociação. (SOUZA, 2016SOUZA, José Antonio Corrêa de. A política educacional brasileira em interface com a diversidade sexual no período de 2003 a 2014. 2016. 172f. Dissertação (Mestrado em Educação). Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Tuiuti do Paraná, 2016., p. 145).

No entanto, no contexto educacional8 8 Ainda que nossos estudos estejam direcionados à educação básica e educação superior, cabe ressaltar que há outros espaços de educação, como os museus, nos quais também ocorrem processos de exclusão, uma vez que, no “âmbito geral dos museus, impera o raciocínio excludente ‘não tenho nada contra’, nos disse certo diretor de um museu mantido por fundos públicos, ‘mas esta não é a missão do meu museu’. Assim tem sido: os museus de arte, medicina, história, tecnologia ou até mesmo os comunitários se protegem em suas missões, que, evidentemente, não incluem a questão LGBT justamente por terem sido construídas em contextos fóbicos” (BAPTISTA; BOITA, 2014, p. 177). , essas ações enfrentam mais resistência para serem aceitas e consolidadas. Embora tenham sido promulgados planos e programas governamentais contendo propostas de ações relativas à educação, conscientização e mobilização frente às questões de gênero e sexualidade, como o Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (2004), o Programa Brasil sem Homofobia (2004), o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (2006), além do documento Gênero e Diversidade Sexual na Escola: Reconhecer Diferenças e Recuperar Preconceitos (2007), a efetivação dessas ações foi executada de modo precário.

Como exemplo, podemos citar a execução do Programa Brasil sem Homofobia (2004). Ainda que tenham sido efetuadas algumas metas relacionadas à realização de conferências e à criação de planos específicos, como o programa foi escrito de modo abrangente, outras atividades propostas ocorreram sem monitoramento, de forma dispersa e sem continuidade, envolvendo muito mais as ONGs do que órgãos estatais (SILVA, 2017SILVA, Tamires Barbosa Rossi. “Experiências multissituadas: entre cursinhos trans e ativismos: quais narrativas, que cidadania é essa?”. 2017. 145f. Dissertação (Mestrado em ciências sociais). Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, 2017.).

O Programa Brasil sem Homofobia foi elaborado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos e publicado pelo Ministério da Saúde em 2004. Resultado de uma articulação entre representantes de entidades nacionais e estaduais do movimento LGBT e o governo federal, o programa apresenta como objetivo promover a cidadania de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais a partir da equiparação de direitos e do combate à violência e à discriminação. Os princípios que o norteiam são:

A inclusão da perspectiva da não discriminação por orientação sexual e de promoção dos direitos humanos de gays, lésbicas, transgêneros e bissexuais, nas políticas públicas e estratégias do Governo Federal, a serem implantadas (parcial ou integralmente) por seus diferentes Ministérios e Secretarias;

A produção de conhecimento para subsidiar a elaboração, implantação e avaliação das políticas públicas voltadas para o combate à violência e à discriminação por orientação sexual, garantindo que o Governo Brasileiro inclua o recorte de orientação sexual e o segmento LGBT em pesquisas nacionais a serem realizadas por instâncias governamentais da administração pública direta e indireta;

A reafirmação de que a defesa, a garantia e a promoção dos direitos humanos incluem o combate a todas as formas de discriminação e de violência e que, portanto, o combate à homofobia e a promoção dos direitos humanos de homossexuais é um compromisso do Estado e de toda a sociedade brasileira. (CNCD, 2004, p. 12-13).

Com base nos princípios da inclusão da não discriminação, reafirmação da defesa e garantia dos direitos humanos, combate às formas de discriminação e violência e elaboração de políticas públicas direcionadas, esse programa é constituído de diferentes ações que preveem medidas para a ampliação da cidadania LGBT em eixos como segurança, cultura, saúde, educação e trabalho. No eixo educação, as ações são referentes a:

Elaborar diretrizes que orientem os Sistemas de Ensino na implementação de ações que comprovem o respeito ao cidadão e à não discriminação por orientação sexual;

Fomentar e apoiar curso de formação inicial e continuada de professores na área da sexualidade;

Formar equipes multidisciplinares para avaliação dos livros didáticos, de modo a eliminar aspectos discriminatórios por orientação sexual e a superação da homofobia;

Estimular a produção de materiais educativos (filmes, vídeos e publicações) sobre orientação sexual e superação da homofobia;

Apoiar e divulgar a produção de materiais específicos para a formação de professores;

Divulgar as informações científicas sobre sexualidade humana;

Estimular a pesquisa e a difusão de conhecimentos que contribuam para o combate à violência e à discriminação de LGBT;

Criar o Subcomitê sobre Educação em Direitos Humanos no Ministério da Educação, com a participação do movimento de homossexuais, para acompanhar e avaliar as diretrizes traçadas. (CNCD, 2004, p. 22-23).

Podemos observar que as ações sobre o direito à educação estão relacionadas especificamente à homofobia e homossexualidade, havendo somente um tópico sobre a sigla LGBT referente à pesquisa e difusão de conhecimentos para o combate à violência e discriminação. Ao longo do documento, as especificidades das pessoas transexuais e travestis têm mais destaque nas ações sobre o direito ao trabalho, direito à segurança e no combate à violência e à impunidade.

No Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos LGBT publicado em 2009, as ações que citam especificidades das pessoas transexuais e travestis são referentes à prevenção e atenção à violência, ao direito à saúde de qualidade pelo SUS, como exemplo a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e implementação do processo transexualizador pelo SUS, e aos programas de enfrentamento à vulnerabilidade.

Esse plano foi elaborado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDH, 2009), apresentando diretrizes e ações para a elaboração de políticas públicas direcionadas para o público LGBT, e tem como objetivos específicos:

3.2.1. Promover os direitos fundamentais da população LGBT brasileira, de inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, dispostos no art. 5º da Constituição Federal;

3.2.2. Promover os direitos sociais da população LGBT brasileira, especialmente das pessoas em situação de risco social e exposição à violência;

3.2.3. Combater o estigma e a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero. (SEDH, 2009, p. 10).

A partir dos objetivos específicos, o documento apresenta ações direcionadas ao público LGBT a serem implementadas por determinados órgãos do governo federal. Essas ações tinham prazos para implementação classificados como curto (para propostas cuja execução estava prevista no Orçamento de 2009) e médio (para as propostas cuja execução estava contemplada no Orçamento de 2010 e 2011). Atentando à educação e com foco nas/os transexuais e travestis, há uma ação proposta a ser instituída a médio prazo, pelo MEC, relacionada à criação de um programa de bolsa de estudo de incentivo à qualificação e/ou educação profissional de transexuais e travestis em diversas áreas9 9 Há outras ações nas quais as pessoas transexuais e travestis estão referenciadas pela sigla LGBT, no entanto, nos atentamos às ações educacionais que tratam dessas pessoas em específico. .

O Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3)10 10 Para assimilar as demandas crescentes da sociedade, o Programa Nacional de Direitos Humanos tem três versões. As duas primeiras foram lançadas durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, em 1996 e em 2002. Enfatizamos discutir sobre a terceira versão, pois é a primeira a discorrer sobre especificidades de transexuais e travestis. foi publicado em 2009, com edição revista e atualizada em 2010, e desenvolvido por meio de conferências nacionais e regionais, de modo que inclui como “alicerce de sua construção, propostas aprovadas em cerca de 50 conferências nacionais temáticas realizadas desde 2003 sobre igualdade racial, direitos da mulher, segurança alimentar, cidades, meio ambiente, saúde, educação, juventude, cultura etc.” (VANUCCHI, 2010VANUCCHI, Paulo. Prefácio. In: BRASIL. Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). rev. e atual. Brasília: SDH/PR, 2010, p. 15-19. Disponível em: https://www.ohchr.org/documents/issues/nhra/programmanacionaldireitoshumanos2010.pdf. Acesso em: 19 mar. 2020.
https://www.ohchr.org/documents/issues/n...
, p. 17).

Esse programa está organizado em seis eixos orientadores - “Interação democrática entre Estado e sociedade civil”; “Desenvolvimento e direitos humanos”; “Universalizar direitos em um contexto de desigualdades”; “Segurança pública, acesso à justiça e combate à violência”; “Educação e cultura em direitos humanos”; “Direito à memória e à verdade” -, subdivididos em 25 diretrizes, 82 objetivos estratégicos e 521 ações programáticas. No eixo “Universalizar direitos em um contexto de desigualdades”, um dos objetivos estratégicos é direcionado à garantia do respeito à livre orientação sexual e identidade de gênero, que apresenta, entre outras propostas, a ação pragmática de desenvolver meios para garantir o uso do nome social de travestis e transexuais. Ainda que não haja referência à educação, evidenciamos que essa ação pode ser considerada também na escola.

Apesar desses programas e planos representarem significativos avanços para a visibilidade social e política dos movimentos LGBT, as prefeituras não instituíram nenhuma ação de combate à homofobia, e o Congresso Nacional não aprovou nenhuma lei referente à cidadania LGBT, a não ser indiretamente na lei Maria da Penha e no Estatuto da Juventude (FERREIRA, 2017FERREIRA, Tatiana de Souza. Os processos de entrada e permanência das travestis e das mulheres transexuais no mercado de trabalho. 2017. 45f. Monografia (Graduação em Terapia Ocupacional). Departamento de Terapia Ocupacional, Universidade Federal da Paraíba, 2017.).

Ademais, também cabe destacar o fundamentalismo religioso que obstaculiza a efetivação de determinadas políticas. Além da suspensão do “Kit Escola sem Homofobia” em 2011, um conjunto de materiais com referências teóricas, conceitos e sugestões de atividades e oficinas para trabalhar a diferença de gênero e a orientação sexual nas escolas, parlamentares religiosos pressionaram o governo para a retirada de questões relacionadas à igualdade de gênero em planos de educação municipais e estaduais no ano de 2014:

Pressionados pelas bancadas religiosas e com respaldo das igrejas evangélicas e católica, deputados de ao menos oito Estados retiraram dos Planos Estaduais de Educação referências a identidade de gênero, diversidade e orientação sexual. Esses planos traçam diretrizes para o ensino nos próximos dez anos. Entre os trechos vetados estão metas de combate à “discriminação racial, de orientação sexual ou à identidade de gênero”, censos sobre situação educacional de travestis e transgêneros e incentivo a programas de formação sobre gênero, diversidade e orientação sexual. As bancadas religiosas afirmam que essas expressões valorizam uma “ideologia de gênero”, corrente que deturparia os conceitos de homem e mulher, destruindo o modelo tradicional de família. Já os que defendem a manutenção dessas referências dizem que as escolas precisam estar preparadas para combater a discriminação de gênero e para dar formação básica sobre sexualidade. O plano inclui temas como número de alunos por sala e remuneração de professores, mas a questão do gênero acabou dominando a discussão. Dos 13 Estados onde já foi aprovado, 8 eliminaram trechos que faziam referências à discussão de gênero, como Pernambuco, Espírito Santo, Paraná e Distrito Federal. (BRITTO; REIS, 2015BRITTO, Patrícia; REIS, Lucas. Por pressão, planos de educação de 8 Estados excluem “ideologia de gênero”. Folha de S, Paulo, 25 de junho de 2015. Disponível em: https://m.folha.uol.com.br/educacao/2015/06/1647528-por-pressao-planos-de-educacao-de-8-estados-excluem-ideologia-de-genero.shtml. Acesso em: 23 mar. 2020.
https://m.folha.uol.com.br/educacao/2015...
).

A inclusão de pautas direcionadas às discussões sobre a igualdade de gênero e sexualidade nos planos visa combater a perpetuação da violência, da desigualdade e da discriminação relacionadas a gênero e orientação sexual que acontecem na escola, haja vista que

[...] a escola não produz as desigualdades (sejam elas de sexualidade, de gênero, de raça ou de classe, por exemplo), mas - muitas vezes - legitima-as na medida em que reitera no seu interior normas postas em circulação na sociedade. Essa reiteração se dá a partir dos comportamentos e falas de todos aqueles que por ela circulam, ou seja, professores, gestores, funcionários, alunos, responsáveis, entre outros. (GUIZZO; FELIPE, 2015, p. 11).

A escola, como um espaço social historicamente instituído, carrega intrinsecamente determinações da sociedade que a estabelece. Consequentemente, produz e reproduz diferenças, distinções e desigualdades por meio de múltiplos mecanismos de classificação, ordenamento e hierarquização que são reforçados a partir de um modelo referência a ser seguido,

No Brasil, operamos, explícita ou implicitamente, com uma identidade referência: o homem branco, heterossexual, de classe média urbana e cristão (Louro, 1998). As outras identidades são constituídas, precisamente, como “outras” em relação a essa referência; em relação à identidade que, por se constituir na norma, no padrão e critério, goza de uma posição não marcada ou, em outros termos, é representada como “não problemática”. [...] a identidade que foge à norma, que se diferencia do padrão, que se toma marcada. Ela escapa ou contraria aquilo que é esperado, ela se desvia do modelo. (LOURO, 2000LOURO, Guacira Lopes. Pedagogias da sexualidade. In: LOURO, Guacira Lopes (org.). O corpo educado: pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2000, p. 7-34., p. 68).

Para Louro (2000LOURO, Guacira Lopes. Pedagogias da sexualidade. In: LOURO, Guacira Lopes (org.). O corpo educado: pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2000, p. 7-34.), a partir do modelo “homem branco, heterossexual, classe média e cristão”, os mecanismos de classificação visam distanciar as outras identidades que são destoantes, tornando-as então marcadas como desviantes da norma, de modo que sejam vigiadas e inferiorizadas. Dessa forma, a escola, ao ser inicialmente concebida para acolher algumas/ns e, posteriormente, requisitada por aquelas/es às/aos quais havia sido negada, se faz diferente para determinados grupos e classes sociais.

Sob essa perspectiva, a escola é um espaço em que circulam preconceitos que colocam em movimento discriminações por gênero, orientação sexual, cor de pele e outras, e se tornam elementos estruturantes desse espaço que “são cotidiana e sistematicamente consentidos, cultivados e ensinados, produzindo efeitos sobre todos/as” (JUNQUEIRA, 2012JUNQUEIRA, Roberto Diniz. Pedagogia do armário e currículo em ação: heteronormatividade, heterossexismo e homofobia no cotidiano escolar. In: MISKOLCI, Richard (org.). Discursos fora de ordem: deslocamentos, reinvenções e direitos. São Paulo: Annablume. 2012, p. 277-305., p. 103), isto é, os preconceitos podem desencadear ações discriminatórias que provocam a dominação de determinados grupos sobre outros e, principalmente, se transformar em dificuldades de acesso ou negação de direitos.

Miranda (2010MIRANDA, Shirley Aparecida de. Diversidade e ações afirmativas: combatendo as desigualdades sociais. Belo Horizonte: Autêntica, 2010.) aponta que as ações discriminatórias na escola podem resultar na exclusão de determinadas/os estudantes. Segundo a autora, a discriminação é uma conduta disseminada em diversos campos da vida social que viola o direito das pessoas, e pode ser observada desde piadas até formas de tratamento e exclusão explícita ou velada. Quando a discriminação acontece no sistema educacional, “compromete a permanência de determinados grupos na escola” (MIRANDA, 2010MIRANDA, Shirley Aparecida de. Diversidade e ações afirmativas: combatendo as desigualdades sociais. Belo Horizonte: Autêntica, 2010., p. 21). Dessa forma, em relação ao cotidiano escolar, estudantes transexuais e travestis,

Com suas bases emocionais fragilizadas, têm que encontrar forças para lidar com o estigma e a discriminação sistemática e ostensiva [...]. As experiências de chacota, ridicularização e humilhação, as diversas formas de opressão e os processos de segregação e guetização a que estão expostas as arrasta como uma “rede de exclusão” que se fortalece, na ausência de ações de enfrentamento ao estigma e ao preconceito. (JUNQUEIRA, 2012JUNQUEIRA, Roberto Diniz. Pedagogia do armário e currículo em ação: heteronormatividade, heterossexismo e homofobia no cotidiano escolar. In: MISKOLCI, Richard (org.). Discursos fora de ordem: deslocamentos, reinvenções e direitos. São Paulo: Annablume. 2012, p. 277-305., p. 18).

Na compreensão de Junqueira (2012JUNQUEIRA, Roberto Diniz. Pedagogia do armário e currículo em ação: heteronormatividade, heterossexismo e homofobia no cotidiano escolar. In: MISKOLCI, Richard (org.). Discursos fora de ordem: deslocamentos, reinvenções e direitos. São Paulo: Annablume. 2012, p. 277-305.), há uma “rede de exclusão” na escola, na qual as diversas formas de opressão e processos de segregação são fortalecidas com a ausência de ações contra o estigma e o preconceito, de forma que transexuais e travestis precisam, muitas vezes sozinhas/os, encontrar forças para lidarem e permanecerem no espaço escolar. Nessa perspectiva, podemos citar a pesquisa realizada por Luma Nogueira de Andrade em 2012ANDRADE, Luma Nogueira de. Travestis na escola: assujeitamento ou resistência à ordem normativa. 2012. 279f. Tese (Doutorado em Educação Brasileira). Programa de Pós-graduação em Educação Brasileira, Universidade Federal do Ceará, 2012., que identifica os elementos que interferem no cotidiano dessas/es estudantes na escola,

1- Não reconhecimento do nome feminino da travesti no momento da frequência e mesmo no cotidiano escolar; 2- Impedimento de acesso ao banheiro feminino; 3- Projeto Pedagógico que não reconhece a existência e singularidades da travesti na escola; 4- Ausência no currículo escolar de livro didático de conhecimentos sobre diversidade sexual; 5- Falta de formação para a comunidade escolar sobre a diversidade sexual, em especial no que se refere às travestis; 6- Desrespeito ao princípio laico do estado; 7- Regimento Escolar que simbolicamente pune as expressões culturais das travestis na escola; ou a ausência deste induzindo os gestores a determinarem normas fundadas em um habitus heteronormativo; 8- Não aceitação ou criação de artifícios para o impedimento da participação das travestis na festa de formatura e em outras celebrações. (ANDRADE, 2012ANDRADE, Luma Nogueira de. Travestis na escola: assujeitamento ou resistência à ordem normativa. 2012. 279f. Tese (Doutorado em Educação Brasileira). Programa de Pós-graduação em Educação Brasileira, Universidade Federal do Ceará, 2012., p. 245).

Frente às formas de opressão e segregação explicitadas nos dados obtidos na pesquisa, reconhecemos que, frente à permanência de estudantes transexuais e travestis, torna-se mais comum ocorrer a “expulsão escolar”.

Para os casos em que as crianças são levadas a deixar a escola por não suportarem o ambiente hostil, é limitador falarmos de “evasão” [...]. Na verdade, há um desejo de eliminar e excluir aqueles que “contaminam” o espaço escolar. Há um processo de expulsão, e não de evasão. É importante diferenciar “evasão” de “expulsão”, pois, ao apontar com maior precisão as causas que levam crianças a não frequentarem o espaço escolar, se terá como enfrentar com eficácia os dilemas que constituem o cotidiano escolar, entre eles, a intolerância alimentada pela homofobia. (BENTO, 2011BENTO, Berenice. Na escola se aprende que a diferença faz a diferença. Revista Estudos Feministas, v. 19, n. 2, 2011, p. 548-559., p. 555).

Concordamos com Bento (2011BENTO, Berenice. Na escola se aprende que a diferença faz a diferença. Revista Estudos Feministas, v. 19, n. 2, 2011, p. 548-559.) ao pontuar que, quando a escola se apresenta como um espaço incapaz de acolher, a saída de estudantes transexuais e travestis não se relaciona apenas à evasão escolar. A expulsão escolar dessas/es estudantes está associada à proibição e/ou desrespeito com o uso do nome social, ao impedimento de utilizar o banheiro de acordo com suas identidades de gênero, e ao preconceito tanto por parte das/os alunas/os quanto das/os profissionais de educação.

A proibição e/ou desrespeito com o nome social é uma das principais formas de excluir as/os estudantes transexuais e travestis, tanto na escola quanto em outros ambientes sociais. Alves e Moreira (2015ALVES, Cláudio; MOREIRA, Maria. Do uso do nome social ao uso do banheiro: (trans) subjetividades em escolas brasileiras. Quaderns de Psicologia. v. 17, n. 3, 2015, p. 59-69. Disponível em: https://www.raco.cat/index.php/QuadernsPsicologia/article/viewFile/303189/392825. Acesso em: 25 mar. 2020.
https://www.raco.cat/index.php/QuadernsP...
) evidenciam que para transexuais e travestis o nome social é mais do que um conjunto de letras, significa o pertencimento e a identificação com o gênero no qual a pessoa se reconhece. O nome social, comumente, é escolhido pela própria pessoa transexual e travesti, uma vez que o nome civil pode ser incongruente com a identidade de gênero reconhecida. Nessa perspectiva, as/os autoras/es afirmam que, quando há a negação/rejeição do nome social pelas outras pessoas, há uma negação do direito de existência,

A população transgênero é historicamente estigmatizada e marginalizada por se desviar dos padrões impostos como normais acerca da identidade de gênero. A ocorrência de violências (físicas, psicológicas e simbólicas) contra essa população é constante. De modo velado, violenta-se o indivíduo ao excluí-lo do convívio social saudável, dificultando seu acesso aos serviços e sequer reconhecendo sua identidade. (SILVA et al., 2017SILVA, Tamires Barbosa Rossi. “Experiências multissituadas: entre cursinhos trans e ativismos: quais narrativas, que cidadania é essa?”. 2017. 145f. Dissertação (Mestrado em ciências sociais). Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, 2017., p. 836).

Na compreensão das/os autoras/es, o não reconhecimento da identidade de gênero de uma pessoa transexual e travesti, tal como o desrespeito com o uso de seu nome social, pode se configurar como uma forma de exclusão do convívio social que pode causar sofrimento, constrangimento e dificuldade de acesso a serviços. Nesse contexto, a obrigatoriedade do uso do nome social é um elemento contribuinte na ampliação e no acesso dessa população a diversos espaços sociais11 11 Ressalta-se a importância do Decreto n. 8.727/2016, que dispõe acerca do uso do nome social para pessoas travestis e transexuais, bem como sobre o reconhecimento de sua identidade de gênero, “que diz respeito à forma como se relaciona com as representações de masculinidade e feminilidade e como isso se traduz em sua prática social, sem guardar relação necessária com o sexo atribuído no nascimento” (BRASIL, 2016). Esse decreto foi regulado em 2018 pelo Supremo Tribunal Federal. . Além do nome social, outra causa da expulsão escolar de estudantes transexuais e travestis está associada ao uso dos banheiros, posto que esse pode se tornar um espaço de violência e exposição:

O banheiro da escola é muito mais que um espaço reservado à realização de necessidades fisiológicas; ele é parte fundamental do processo de construção de identidades e reprodução das diferenças, e é neste espaço que as/os estudantes transexuais e travestis passam por constrangimentos, aversões e diversas outras formas de agressão e segregação. (OLIVEIRA JUNIOR; MAIO, 2016OLIVEIRA JUNIOR, Isaias B. de; MAIO, Eliane R. Re/des/construindo in/diferenças: a expulsão compulsória de estudantes trans do sistema escolar. Revista da FAEEBA - Educação e Contemporaneidade, v. 25, n. 45, 2016, p. 159-172. Disponível em: https://www.revistas.uneb.br/index.php/faeeba/article/viewFile/2292/1598. Acesso em: 10 mar. 2020.
https://www.revistas.uneb.br/index.php/f...
, p. 167).

Para estudantes transexuais e travestis, o impedimento da utilização do banheiro de acordo com suas identidades de gênero reflete intolerância às suas diferenças e pode interferir na escolarização. Segundo as/os autoras/os, o banheiro é mais que um espaço reservado às necessidades fisiológicas, integra o processo de reconhecimento e aceitação das/os referidas/os estudantes, sobretudo, o impedimento do uso pode legitimar o preconceito e ações discriminatórias.

As ações discriminatórias dizem respeito às agressões verbais e físicas que estudantes transexuais e travestis podem sofrer por parte das/os colegas de classe. No entanto, a expulsão escolar também pode ser ocasionada pelo silenciamento das/os profissionais da educação que não sabem lidar com a realidade dessas/es estudantes:

Na maioria das vezes, a escola é um dos principais desencadeadores desses processos de exclusão expressos por uma violência anunciada, na maioria das vezes por parte do corpo discente, e outra violência velada e/ou silenciada, pelos/as agentes escolares. Cabe ainda destacar que essas formas de violência, sobretudo a anunciada, muitas vezes se consagra em outra forma de violência a qual definimos como violência materializada, incidindo diretamente na possibilidade de prejuízo e/ou violação física por parte da pessoa exposta. (FRANCO; CICILLINI, 2015, p. 9).

Franco e Cicillini (2015) salientam que a violência anunciada por parte das/os alunas/os e, em conjunto, a violência velada pelo corpo docente, como, por exemplo, a omissão e a invisibilização diante da discriminação, constituem o processo de expulsão de estudantes transexuais e travestis, que, somando à exclusão social, originada no ambiente familiar e sucedida a outros setores, pode limitar o acesso à educação superior, à melhoria das qualificações profissionais e ao mercado de trabalho.

Transexuais, travestis e o acesso à educação superior

Excluídas/os do ambiente familiar e escolar, Helio Irigaray (2010IRIGARAY, Hélio. Identidades sexuais não hegemônicas: a inserção dos travestis e transexuais no mundo do trabalho sob a ótica queer. In: ENCONTRO DE ESTUDOS ORGANIZACIONAIS DA ANPAD, 6., Anais… Florianópolis/SC: Universidade Federal de Santa Catarina, 2010. Disponível em: http://www.anpad.org.br/admin/pdf/eneo425.pdf. Acesso em: 27 set. 2020.
http://www.anpad.org.br/admin/pdf/eneo42...
) aponta que o preconceito e os estigmas dos quais os transexuais e travestis são alvos podem influir e limitar o acesso à educação superior. Um exemplo do limitado acesso são os resultados de uma pesquisa realizada entre 2011 e 2015 pelo projeto “Direitos e violência na experiência de travestis e transexuais na cidade de Belo Horizonte: construção de um perfil social em diálogo com a população”, que, de acordo com Scote (2017SCOTE, Fausto Delphino. Será que temos mesmo direitos a universidade? O desafio do acesso e a permanência de pessoas transexuais no ensino superior. 2017. 152f. Dissertação (Mestrado em Educação). Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de São Carlos, 2017., p. 25), mostra que,

[...] embora a maioria das travestis pesquisadas tenha conseguido terminar o ensino médio, é muito pequeno o número das que conseguem ingressar nas universidades. Com relação à taxa de escolaridade das 138 entrevistadas que frequentaram a escola - tendo como base a última série cursada com aprovação - observa-se que: 6,5% (8) não passaram da 4a série do Ensino Fundamental; 25,4% (35) estudaram entre a 5ª e a 8ª série do Ensino Fundamental; 59,4% (82) estudaram até o 3º ano do Ensino Médio. Quanto ao Ensino Superior: 6,5% (9) declararam tê-lo iniciado sem, no entanto, ter se formado; apenas 2,2% (3) responderam possuir o Ensino Superior Completo. 0,7% (1) encontrava-se na alfabetização de adultos, no período de aplicação do questionário. Ou seja, 91,3% das entrevistadas não passaram do Ensino Médio.

Os resultados da pesquisa apontam que, de 138 entrevistadas, 82 concluíram o ensino médio, no entanto, em relação à educação superior, 9 declararam ter ingressado mas não concluíram e apenas 3 são formadas. Ou seja, embora a maioria das mulheres transexuais e travestis pesquisadas tenha conseguido concluir o ensino médio, o número das que conseguem ingressar nas universidades ainda é relativamente baixo. Essa pesquisa foi realizada pelo Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT (Nuh) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), sob a coordenação do professor Marco Aurélio Máximo Prado, e levantou dados sobre escolaridade, família, trabalho, religião, transformação do corpo, saúde, violência, políticas públicas, lazer e perfil social de mulheres transexuais e travestis que trabalham na prostituição no município de Belo Horizonte e região metropolitana.

Os dados obtidos pela pesquisa não são de âmbito nacional, não havendo, também, dados produzidos e disponibilizados pelo poder público que considerem o recorte transexual e travesti, referente à população LGBT. A ausência de dados nacionais dificulta a obtenção de informações sobre as vivências dessas pessoas em determinadas áreas, como saúde, educação, trabalho, e em diferentes regiões (PEDRA, 2018PEDRA, Caio Benevides. Acesso à cidadania por travestis e transexuais no Brasil: um panorama da atuação do Estado no enfrentamento das exclusões. 2018. 275f. Dissertação (Mestrado em Administração Pública). Fundação João Pinheiro, Escola de Governo Professor Paulo Neves de Carvalho, 2018.).

As pesquisas realizadas e os dados disponíveis são oriundos de notícias em mídias sociais, ou são resultados de iniciativas de projetos, produções acadêmicas, organizações não governamentais (ONGs), redes de apoio ou de associações12 12 Como a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT) e a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes). . Como exemplo, uma pesquisa realizada pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) verificou que 90% das mulheres transexuais e travestis vivem da prostituição como fonte de renda devido à dificuldade de inserção no mercado formal de trabalho (PEDRA, 2018PEDRA, Caio Benevides. Acesso à cidadania por travestis e transexuais no Brasil: um panorama da atuação do Estado no enfrentamento das exclusões. 2018. 275f. Dissertação (Mestrado em Administração Pública). Fundação João Pinheiro, Escola de Governo Professor Paulo Neves de Carvalho, 2018.).

Como não há dados oficiais - por exemplo, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) ou do MEC - sobre como e quantas/os transexuais e travestis ingressam na educação superior anualmente, a pesquisa que contabilizou a vivência de transexuais e travestis na educação superior foi divulgada pela reportagem “No ensino superior, o espelho da exclusão de pessoas trans”, escrita pelas/os jornalistas Bianca Gomes, Caio Faheina e João Ker em 2019GOMES, Bianca; FAHEINA, Caio; KER, João. No ensino superior, o espelho da exclusão de pessoas trans. Estadão. São Paulo, 5 de junho de 2019. Disponível em: https://arte.estadao.com.br/focas/capitu/materia/no-ensino-superior-o-espelho-da-exclusao-de-pessoas-trans. Acesso em: 13 out. 2020.
https://arte.estadao.com.br/focas/capitu...
, veiculada em O Estadão. Segundo a matéria, transexuais e travestis representam cerca de 0,1% do total de 420 mil estudantes das universidades federais, a partir de um levantamento realizado em 2018 pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), em parceria com o Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assistência Estudantil (Fonaprace).

Nesse contexto, movimentos de transexuais e travestis e ONGs têm criado projetos direcionados à escolarização de transexuais e travestis, como o Coletivo Transformação, realizado em São Paulo (SP), o TransEnem e a ONG TransVest, em Belo Horizonte (MG) e Porto Alegre (RS), o Prepara Trans, em Goiânia (GO), o Prepara, Nem!, no Rio de Janeiro (RJ), e o Transviando o Enem, em Salvador (BA). Todos esses projetos oferecem cursinhos preparatórios para a realização do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) especificamente para transexuais e travestis.

Já no contexto da educação superior, as universidades públicas também têm promovido ações direcionadas ao acesso e à permanência, como resoluções internas acerca do nome social e cotas específicas para a referida população. Como exemplo, em 2009, a Universidade Federal do Amapá (Unifap) foi a primeira instituição a implementar uma resolução dispondo sobre a inclusão do nome social de estudantes e servidoras/es transexuais e travestis. Conforme uma notícia publicada em 2016, de 63 universidades federais, em média, 50 já tinham resoluções a respeito do uso do nome social (LEWER, 2016LEWER, Laura. 13 universidades estaduais não têm resolução para uso do nome social. G1 Educação. 17/5/2016. Disponível em: https://g1.globo.com/educacao/noticia/14-universidades-federais-nao-tem-resolucao-para-uso-do-nome-social.ghtml. Acesso em: 10 mar. 2020.
https://g1.globo.com/educacao/noticia/14...
).

Em relação às cotas, a Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) dispôs um processo seletivo com reserva de vagas para transexuais e travestis no ano de 2018, bem como a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) criou vagas para pessoas trans em seis programas de pós-graduação. Em 2019, a Universidade do Estado da Bahia (Uneb) também adotou o sistema de cotas para essa população, na graduação e pós-graduação. Nessa perspectiva, ainda que o número de transexuais e travestis que concluem o período de escolaridade básica seja ínfimo, a luta política pela conquista de direitos tem surtido efeito, e as universidades têm buscado se adequar ao compor novas ações institucionais.

Ademais, aqui também cabe ressaltar a importância das cotas para negras/os, haja vista que as intersecções (CRENSHAW, 2012CRENSHAW, Kimberlé. A interseccionalidade na discriminação de raça e gênero. Painel: Cruzamentos raça e gênero. São Paulo: Ação Educativa, 2012.), como raça e classe, são condições que também podem interferir na relação de transexuais e travestis com o acesso à educação superior, uma vez que essas diferenciações sociais enfrentam outras discriminações estruturadas pela dominação e opressão, como o racismo e o classismo.

Considerações finais

Analisamos que o acesso à educação no Brasil, ainda que estabelecido como um direito na Constituição Federal de 1988, tem sido limitado por aspectos como renda familiar, cor/etnia, gênero, questões socioeconômicas e culturais etc. Em consequência, a educação superior, que era reservada para a camada privilegiada da sociedade, ainda tem sido restringida pela diferença econômica e cultural perpetuada pela seleção histórica.

Nesse segmento, ao direcionarmos o olhar para a escola, identificamos que as desigualdades sociais também são perpetuadas e reforçadas por meio de ações discriminatórias e/ou mediante silenciamento por parte do corpo docente. Como consequência, determinadas/os estudantes são “expulsas/os” desse espaço em razão da ausência de reconhecimento de direitos e acolhimento às diferenças.

Conforme discutido inicialmente, embora as questões de gênero e sexualidade tenham obtido relevância em políticas e legislações que se vinculam tanto ao campo da educação como a outros campos, estudantes transexuais e travestis ainda têm dificuldade para concluir o período de escolaridade obrigatória. Por conseguinte, propor reflexões e trabalhar conceitos nas escolas de educação básica não é o suficiente, é preciso investir na formação inicial e continuada de todo o corpo docente.

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    » https://www.ohchr.org/documents/issues/nhra/programmanacionaldireitoshumanos2010.pdf
  • 2
    De acordo com o dossiê da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), publicado em janeiro de 2020 (BENEVIDES; NOGUEIRA, 2020).
  • 3
    Os dados foram coletados em 2015, por meio de um questionário aberto, envolvendo estudantes maiores de 13 anos matriculadas/os no ensino fundamental.
  • 4
    Há pessoas que podem se reconhecer mulheres transexuais, mulheres, mulheres travestis ou apenas travestis. É uma questão particular.
  • 5
    Em 2010 a resolução n. 1.652/2002 foi revogada e entrou em vigor a CFM n. 1955/2010, com pequenas alterações sobre a equipe multidisciplinar constituída por médica/o psiquiatra, cirurgiã/o, endocrinologista, psicóloga/o e assistente social.
  • 6
    A única diferença socialmente perceptível é em relação aos homens transexuais, que, segundo Bento (2015, p. 31), relatam sofrer menor rejeição social, manifestada pelos olhares inquisidores, quanto mais conseguem ser reconhecidos socialmente como homens (PEDRA, 2018, p. 43).
  • 7
    A justificativa para o uso da sigla LGBT tem por base seu emprego no campo das políticas públicas, dado que as ações de âmbito federal buscam uma unificação com durabilidade temporal que perpassa gerações.
  • 8
    Ainda que nossos estudos estejam direcionados à educação básica e educação superior, cabe ressaltar que há outros espaços de educação, como os museus, nos quais também ocorrem processos de exclusão, uma vez que, no “âmbito geral dos museus, impera o raciocínio excludente ‘não tenho nada contra’, nos disse certo diretor de um museu mantido por fundos públicos, ‘mas esta não é a missão do meu museu’. Assim tem sido: os museus de arte, medicina, história, tecnologia ou até mesmo os comunitários se protegem em suas missões, que, evidentemente, não incluem a questão LGBT justamente por terem sido construídas em contextos fóbicos” (BAPTISTA; BOITA, 2014, p. 177).
  • 9
    Há outras ações nas quais as pessoas transexuais e travestis estão referenciadas pela sigla LGBT, no entanto, nos atentamos às ações educacionais que tratam dessas pessoas em específico.
  • 10
    Para assimilar as demandas crescentes da sociedade, o Programa Nacional de Direitos Humanos tem três versões. As duas primeiras foram lançadas durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, em 1996 e em 2002. Enfatizamos discutir sobre a terceira versão, pois é a primeira a discorrer sobre especificidades de transexuais e travestis.
  • 11
    Ressalta-se a importância do Decreto n. 8.727/2016, que dispõe acerca do uso do nome social para pessoas travestis e transexuais, bem como sobre o reconhecimento de sua identidade de gênero, “que diz respeito à forma como se relaciona com as representações de masculinidade e feminilidade e como isso se traduz em sua prática social, sem guardar relação necessária com o sexo atribuído no nascimento” (BRASIL, 2016). Esse decreto foi regulado em 2018 pelo Supremo Tribunal Federal.
  • 12
    Como a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT) e a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Dez 2020
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2020

Histórico

  • Recebido
    16 Maio 2020
  • Aceito
    13 Out 2020
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