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A questão da resistência cultural, contracultural e política durante o regime militar brasileiro – Grupo Arquitetura Nova

The issue of cultural, counter-cultural, and political resistance during the Brazilian military regime – New Architecture Group

RESUMO

Na década de 1960, a questão da resistência cultural e política durante o regime militar brasileiro motivou intensos debates e manifestações culturais em várias áreas do conhecimento. Com o objetivo de aprofundar os estudos sobre essa questão no campo da arquitetura, elegemos o Grupo Arquitetura Nova (GAN) como vertente de transformação naquele contexto de profundas transformações socioculturais, quando emergiu a contracultura brasileira.

PALAVRAS - CHAVE
Cultura; contracultura; arquitetura; história social

ABSTRACT

In the 1960s, the issue of cultural and political resistance during the Brazilian military regime motivated intense debates and cultural manifestations in various areas of knowledge. In order to deepen the studies on this issue in the field of architecture, we chose the Architecture New Group (GAN), as a transformation in that context of deep socio-cultural transformations, when the Brazilian counterculture emerged.

KEYWORDS
Culture; counterculture; architecture; social history

Na década de 1960, a arquitetura brasileira encontrava-se em posição de prestígio nos cenários nacional e internacional, pelas conquistas da arquitetura e urbanismo modernos, em especial, a realização de Brasília – símbolo da materialização do Plano Nacional de Desenvolvimento do governo Juscelino Kubitschek. Mas, frente à instabilidade no plano político deflagrada pela renúncia do presidente Jânio Quadros, aprofundada pelo conturbado governo João Goulart, que fez emergir o golpe civil-militar de 1964, latente desde a década de 1950, os rumos da arquitetura brasileira foram postos à prova.

Em 1958, os estudantes da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU/USP) Flávio Império (1935-1985)IMPÉRIO, Flávio. Flávio Flávio Império. Organização de Renina Katz e Amélia Hamburger. São Paulo: Edusp, Fapesp, 1999., Rodrigo Lefèvre (1938-1984)_____. Diretrizes (II) e programação referentes às atividades interdepartamentais da FAU. Caramelo, n. 6, p. 1-2, s. d. e Sérgio Ferro (1938-)_____. O canteiro e o desenho. 2. ed. São Paulo: Projeto Editores Associados, 1982. se reuniam para praticar arquitetura, artes plásticas, teatro e discutir suas ideias e ideais marxistas de diferentes matizes: Império, próximo aos trotskistas do Partido Operário Revolucionário (POR); e Ferro e Lefèvre se tornariam membros do Partido Comunista Brasileiro (PCB) de linha soviética. O trio se consolidou como grupo (Grupo Arquitetura Nova – GAN) em 1961 devido à participação no Concurso Internacional de Escolas de Arquitetura da VI Bienal de Artes de São Paulo (FIORI, 2002FIORI, Pedro. Arquitetura Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefèvre, de Artigas aos mutirões. São Paulo: Editora 34, 2002., p. 49).

A década de 1960 foi marcada por novas experiências e intercâmbio de ideias e ideais entre os integrantes do GAN, Centro Pastoral Vergueiro, Teatro de Arena, Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes (CPC/UNE), Faculdade de Filosofia, Teatro Oficina e a cena artística ampla, como declarou Ferro em entrevista a Marcelo Ridenti (2000, p. 200)RIDENTI, Marcelo. Em busca do povo brasileiro: artistas da revolução, do CPC à era da TV. Rio de Janeiro: Record, 2000.. Considerados discípulos do mestre João Batista Vilanova Artigas, principal influência acadêmica e ideológica da FAU/USP, os arquitetos do GAN estavam preparados para a construção de um Brasil moderno e socialmente mais justo; mas, após 1964, o grupo assumiu uma postura crítica ao status quo arquitetônico, político e sociocultural.

Os jovens do GAN são representantes daquela geração que abriu uma “brecha”2 2 Conceito de “brecha” conforme concepção de Edgar Morim: “Por outro lado o espírito do tempo mudou. Antes de 1968, a divisão do trabalho, sua fragmentação, as opressões cronométricas da vida cotidiana, o estatuto da mulheres, dos jovens, dos marginais, da vida urbana, da sexualidade – tudo isso parecia fazer parte da natureza da sociedade, de forma tão evidente quanto as nuvens e as montanhas fazem parte da natureza física. Mas, nos anos 1970, é colocado em questão, frequentemente de maneira difusa, e às vezes de forma virulenta, tudo o que antes não constituía problema. Assim, as aspirações femininas, as ideias ecológicas, o neorregionalismo, o neoarcadismo, o desejo de viver fora dos ritmos artificiais da cidade, da fábrica, do escritório, a comunidade, a autogestão – tudo isso faz parte doravante de nossa problemática dos anos 1970” (MORIN, 2008, p. 34). na sociedade ocidental, quando o espírito do tempo mudou, conforme definiu Edgar Morin (2008, p. 34)MORIN, Edgar. O jogo em que tudo mudou. In: COHN, Sérgio; PIMENTA, Heyk. (Org.). Maio de 68. Rio de Janeiro: Beco do Azougue, 2008.. Na década de 1960, nos países industrialmente avançados, a tecnocracia, os valores morais e comportamentais, a alta cultura modernista, a arquitetura e o urbanismo modernos foram questionados por movimentos juvenis como um fenômeno cosmopolita e transnacional, segundo David Harvey (1992, p. 44)HARVEY, David. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. São Paulo: Edições Loyola, 1992.. Naquela época, estaria surgindo um novo tipo humano, que começa a se manifestar sincronicamente em diversos países: o jovem3 3 Algumas das manifestações juvenis: Estados Unidos – manifestações contra a Guerra do Vietnã, direitos civis e das minorias e explosão de conflitos após os assassinatos de Martin Luther King e Robert Kenedy; Alemanha Ocidental – 1,5 mil estudantes protestam contra a Guerra do Vietnã e após o atentado contra o líder Rudi Dutschke da Associação dos Estudantes Alemães (SDS), vários protestos em Essen, Frankfurt, Colônia, Munique e Stuttgart; Polônia – 5 mil estudantes se reúnem na Universidade de Varsóvia para exigir “liberdade de expressão”, depois os protestos chegariam a Cracóvia, Lublin e Poznan; Japão – jovens em protestos contra a chegada do submarino norte-americano Enterprise; Espanha – a Universidade de Madri é fechada pela polícia devido às manifestações de estudantes antifranquistas; Checoslováquia – a Primavera de Praga foi esmagada por tanques soviéticos; México – na abertura das Olimpíadas, centenas de manifestantes foram mortos a tiros pelas autoridades policiais no episódio conhecido como “Massacre de Tlatetolco” (SAMUEL, 1968). . A geração jovem questionou os valores socioculturais estabelecidos (ou cristalizados) sustentados pela geração precedente com uma série de pautas, tais como: busca por maior liberdade individual, contra abusos predatórios do avanço industrial e opressão tecnocrática, pela ampliação dos direitos civis, igualdade entre gêneros, pacifismo antinuclear e ecologismo. O sociólogo Theodore Roszak (1972)ROSZAK, Theodore. A contracultura: reflexões sobre a sociedade tecnocrática e a oposição juvenil. Rio de Janeiro: Vozes, 1972.4 4 O termo “contracultura” foi cunhado pelo sociólogo norte-americano Theodore Roszak (1972). analisou a nova geração e constatou o surgimento da contracultura norte-americana, caracterizada pelo questionamento ao establishment das instituições dominantes, costumes e padrões comportamentais, em suas alas distintas: hippie e a New Left. As duas são características dos movimentos contraculturais, que, segundo a sociologia, sempre possuem dois aspectos: “o ativismo radical dos que buscam revolucionar politicamente a sociedade e a boêmia dos que a abandonam para viver em isolamento” (BOTTOMORE; OUTWAITTE, 1996BOTTOMRE, Tom; OUTHWAITE, William. Dicionário do pensamento social do século XX. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1996.).

No Brasil, o sociólogo Luciano Martins (2004, p. 16MARTINS, Luciano. A geração AI-5 e Maio de 68: duas manifestações intransitivas. Rio de Janeiro: Argumento, 2004.) identificou o surgimento da contracultura na “geração AI-5” como uma reação à “cultura autoritária” que se consolidou durante o regime militar (1964-1985), e que se transmitiu por práticas cotidianas de censura, violência e desrespeito aos direitos individuais, condicionando comportamentos. Ainda segundo Martins, a geração AI-5 é formada por jovens vindos da classe média ou alta, universitários e, sem um contorno rígido, se manifestou contra a “cultura autoritária” em duas alas antagônicas: a guerrilha, que é uma forma politicamente organizada e engajada, e a alienada, que é marcada pelo uso de drogas como forma de “escapismo”.

Os integrantes do GAN são legítimos representantes da geração AI-5 de ambas as alas – engajada e alienada –, e sua participação foi abrangente: da franca adesão ao projeto nacional-desenvolvimentista à desilusão e posterior ruptura; dos debates da vanguarda artística e teatral reativos ao regime militar à agressão; da militância no PCB à participação na Aliança Libertadora Nacional (ALN) e da luta armada; da crítica à arquitetura da Escola Brutalista Paulista (1953-1973) na perspectiva de Zein (2005a, p. 19)ZEIN, Ruth Verde. A arquitetura da Escola Paulista Brutalista 1953-1973. Tese (Doutorado em Arquitetura). Programa de Pesquisa e Pós-Graduação em Arquitetura, Faculdade de Arquitetura, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2005a. à definição de uma arquitetura alternativa, como discutiremos a seguir.

Do nacional-popular à desilusão

Na década de 1960, a cultura brasileira era permeada pelo pensamento de esquerda e seguidores do conceito nacional-popular em diversos matizes (HOLLANDA, 2004HOLLANDA, Heloísa Buarque de. Impressões de viagem: CPC, vanguarda e desbunde – 1960/70. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2004., p. 21). Muitos intelectuais, artistas, escritores, estudantes e arquitetos, imbuídos de certo “romantismo revolucionário”, aprofundavam a crítica ao modelo capitalista (RIDENTI, 2000RIDENTI, Marcelo. Em busca do povo brasileiro: artistas da revolução, do CPC à era da TV. Rio de Janeiro: Record, 2000., p. 55-57). Os ideais relacionados à modernização, à democratização, ao nacionalismo e à busca pelo “povo” estavam no cerne das manifestações culturais daquele período (HOLLANDA, 2004HOLLANDA, Heloísa Buarque de. Impressões de viagem: CPC, vanguarda e desbunde – 1960/70. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2004., p. 21). Para Marcos Napolitano (2014b, p. 43)_____. No exílio, contra o isolamento: intelectuais comunistas, frentismo e questão democrática nos anos 1970. Estudos Avançados, São Paulo, USP, v. 28, n. 80, jan.-abr., 2014b. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-40142014000100006.
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, o PCB tinha grande presença no cenário cultural: “o aspecto mais paradoxal da história cultural do PCB é a disparidade entre a força do partido, sempre secundária na cena política e social [...], e a forte e, em alguns momentos, até mesmo hegemônica presença dos artistas e intelectuais do Partido na vida cultural brasileira”. Arquitetos que eram filiados ao PCB e comungavam com os ideais revolucionários do partido também se manifestaram, como é possível observar nos inusitados (ou sofríveis) versos de Oscar Niemeyer:

O que fez você, arquiteto, desde que está diplomado? O que é que você fez pra se ver realizado? Trabalha, ganha dinheiro, anda bem alimentado. Nada disso, meu amigo, É grande pra ser louvado. Você só fez atender a homem que tem dinheiro, que vê o pobre sofrer e descansa o ano inteiro na bela casa grã-fina que fez você projetar, esquecido que essa mina um dia vai acabar. [...] Mas se você é honrado, não deve se conformar. Ponha a prancheta de lado e venha colaborar. O pobre cansou da fome que o dólar vem aumentar e vai sair para a luta que Cuba soube ensinar (apud HOLLANDA, 2004HOLLANDA, Heloísa Buarque de. Impressões de viagem: CPC, vanguarda e desbunde – 1960/70. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2004., p. 24).

Em 1964, o GAN teria o desafio de projetar o Plano Piloto e Anteprojeto para a Cidade Satélite de Cotia, a ser implantado a cerca de 25 km da cidade de São Paulo, que contemplaria a construção de 7 mil unidades habitacionais, para cerca 30 mil habitantes. Apesar do nome, o Plano de Cotia não propunha uma “cidade-satélite”, mas uma “cidade dormitório”, com todos os problemas e inconvenientes desse tipo de implantação. Tratava-se de um plano que, guiado pelo urbanismo moderno, levaria para longe dos centros urbanos a parcela da população de baixa renda (REIS FILHO, 1965REIS FILHO, Nestor Goulart. Plano para cidade satélite. Acrópole, ano XXVII, n. 319, jul. 1965, p. 24-27., p. 24), que viveria em um grande conjunto habitacional, com amplo programa: creches, escolas, hotel, centro cívico e sede administrativa para a manutenção das áreas comuns. Reis Filho (1965)REIS FILHO, Nestor Goulart. Plano para cidade satélite. Acrópole, ano XXVII, n. 319, jul. 1965, p. 24-27. apontou semelhanças entre o Plano do GAN e os projetos do estado do bem-estar social britânico no pós-Segunda Guerra Mundial, que procuravam explorar as possibilidades da industrialização da construção.

O projeto do GAN discutiu o impasse político-ideológico em relação à industrialização ou não dos sistemas construtivos no Brasil. Naquela época, se por um lado a manutenção dos métodos construtivos convencionais poderia absorver a mão de obra barata e abundante vinda do meio rural, por outro, não atenderia à grande demanda por habitações nos centros urbanos em franca expansão. Embora a industrialização e as inovações tecnológicas estivessem na pauta das discussões no cenário arquitetônico, não encontraram amparo nas políticas habitacionais brasileiras da época5 5 As políticas federais para o setor habitacional se iniciaram em 1946 com a criação do órgão Fundação da Casa Popular – cujo resultado foi limitado –, que na Era Vargas foi substituído pelos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs), geridos pelos órgãos previdenciários de cada classe trabalhadora. Os IAPs tiveram realizações de sucesso, passando por um momento de inflexão a partir de 1964, quando o regime militar os extinguiu e, em seu lugar, criou o Banco Nacional da Habitação (BNH) para gerir o setor através do Serviço Federal de Habitação e Urbanismo criado em 1966. . Assim, o GAN não conseguiu implementar o sistema construtivo industrializado, e o sistema construtivo convencional se impôs6 6 Cf. declaração de Ferro (2006) na nota de rodapé 23 do texto “A casa popular”. no projeto. O Plano Piloto e Anteprojeto para a Cidade Satélite de Cotia foi abortado devido ao golpe civil-militar e à implantação do regime militar em 1964.

Após a desilusão, o GAN assumiu uma posição crítica em relação ao novo regime e aos rumos da produção arquitetônica no contexto pós-1964. Na perspectiva marxista do GAN, o rumo seguido pela linha hegemônica representada pela Escola Brutalista Paulista (1953-1979) não levaria em conta as questões sociais – no sentido de atender à demanda por mais habitações de interesse social – e não consideraria a participação do operário no processo de produção; além disso, havia grande exploração da mão de obra, baixos salários, insalubridade e risco de acidentes fatais no ambiente de trabalho. Em entrevista a Ridenti (2000, p. 71)RIDENTI, Marcelo. Em busca do povo brasileiro: artistas da revolução, do CPC à era da TV. Rio de Janeiro: Record, 2000., Ferro declarou que tal postura havia começado com a “experiência de canteiro de obras, uma realidade bem palpável, direta”.

O GAN buscou, assim, um sistema construtivo alternativo baseado em técnicas construtivas mais simples, e já plenamente assimiladas pelos operários, a fim de engajá-los numa participação “inteligente” nos processos produtivos. O GAN optou por soluções projetuais em abóbada executadas com lajes mistas –vigotas de concreto e blocos cerâmicos –, numa tentativa de projetar “uma arquitetura barata e fácil de fazer, que pudesse realmente substituir as barbaridades do BNH”, conforme justificou Ferro em entrevista a Marlene Acayaba (1985)ACAYABA, Marlene Milan. Reflexões sobre o brutalismo caboclo; entrevista de Sérgio Ferro a Marlene Milan Acayaba. Projeto, São Paulo, n. 86, abr. 1986, p. 68-70..

O GAN objetivava a produção de casas populares simples, austeras e eficientes, mesmo que a experiência fosse ensaiada em projetos de casas burguesas (ARANTES, 2002ARANTES, Pedro Fiori. Arquitetura Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefèvre, de Artigas aos mutirões. São Paulo: Editora 34, 2002., p. 51). Sua postura crítica estava em sintonia com a cena cultural ampla, como veremos mais adiante.

Dos debates reativos ao regime militar à agressão

O golpe civil-militar de 1964 foi um ponto de inflexão para a cultura brasileira. Intelectuais, artistas e arquitetos que comungavam dos ideais de esquerda e do conceito nacional-popular, passaram a discutir qual seria seu posicionamento frente ao regime militar (MOTA, 2008MOTA, Carlos Guilherme. Ideologia da cultura Brasileira 1933-1974: pontos de partida para uma revisão histórica. São Paulo: Ed. 34, 2008., p. 329).

A primeira manifestação artística de franca oposição ao regime militar veio com o espetáculo musical Opinião7 7 Em balanço sobre a cultura daquela década, a revista Visão descreve o espetáculo como: “uma moça da Zona Sul do Rio, um preto carioca e outro nordestino subiram a um tablado do inacabado Teatro de Arena da Rua Siqueira Campos, em Copacabana, para apresentar um show surpreendente em vários aspectos” (DA ILUSÃO..., 1974). , de 1964, de Oduvaldo Vianna Filho, Armando Costa e Paulo Pontes8 8 Oduvaldo Vianna Filho, Armando Costa e Paulo Pontes foram membros do CPC/UNE (1961-1964). O grupo atuou em várias áreas – cinema, teatro e literatura –, difundindo os ideais de esquerda. O espetáculo Opinião foi conduzido por Nara Leão, musa da bossa nova, José Flores de Jesus, o Zé Keti, e o cantador João do Vale. . No campo das letras, a resistência foi expressa nas páginas da Revista Civilização Brasileira9 9 A Revista Civilização Brasileira teve grande repercussão e distribuição. Seus números chegaram a 40 mil exemplares, brochuras com cerca de 200 páginas,: n. 1, abr. 1965; n. 2., maio 1965; n. 3, jul. 1965; n. 4, set. 1965; n. 5, nov. 1965; n. 6, mar. 1966; n. 7, maio 1966; n. 8, jul. 1966; n. 9-10, set./nov. 1966; n. 11-12, dez. 1966 e mar. 1967; n. 13, maio 1967; n. 14, jul. 1967; n. 15, set. 1967; n. 16, nov.-dez, 1967; n. 17, jan.-fev. 1968; n. 18, mar.-abr., 1968; n. 19-20, maio-ago. 1968; e n. 21-22, set.-dez. 1968; além dos especiais: n. 1, out. 1967; n. 2, jul. 1968; n. 3, set. 1968. (1965-1968), um veículo de grande tiragem que reuniu grandes nomes da intelligentsia brasileira (CZAJKA, 2004CZAJKA, Rodrigo. Redesenhando ideologias: cultura e política em tempos de golpe. História: questões e debates, n. 40, Pós-História/UFPR, Curitiba, 2004, p. 37-57.). Contudo, a participação de arquitetos10 10 Após pesquisar nos 22 números da Revista Civilização Brasileira , constatei apenas dois artigos escritos por arquitetos. A ausência deles naquela publicação foi confirmada pelo historiador Carlos Guilherme Mota (2008), estudioso da RCB. na revista foi inexpressiva, marcando presença com dois artigos: de Luis Carlos Cunha (1968)CUNHA, Luis Carlos. O realismo na arquitetura. Revista Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, n. 18, mar./abr. 1968, p. 177-184 . e de Arthur de Lima Cavalcanti (1965)CAVALCANTI, Arthur de Lima. Política urbana e habitacional. reforma urbana. Revista Civilização Brasileira, n. 2, maio 1965, p. 338-341.. O editor da revista, Ênio da Silveira, também foi responsável pela organização do Comando dos Trabalhadores Intelectuais (CTI). Com reuniões na sede da revista, o CTI teria como meta “apoiar as reivindicações específicas de cada setor da cultura brasileira, fortalecendo-as dentro de uma ação geral, efetiva e solidária” (CZAKJA, 2004CZAJKA, Rodrigo. Redesenhando ideologias: cultura e política em tempos de golpe. História: questões e debates, n. 40, Pós-História/UFPR, Curitiba, 2004, p. 37-57., p. 37). O CTI aglutinou artistas, escritores, professores, atores, artistas plásticos, jornalistas e intelectuais, e contou com a participação do arquiteto Oscar Niemeyer como um dos membros fundadores (CZAKJA, 2004CZAJKA, Rodrigo. Redesenhando ideologias: cultura e política em tempos de golpe. História: questões e debates, n. 40, Pós-História/UFPR, Curitiba, 2004, p. 37-57., p. 37-38).

Nas artes plásticas, o vínculo entre vanguarda e resistência ao regime foi marcado pela mostra Propostas 65 (REIS, 2006REIS, Paulo R. O. Arte e vanguarda no Brasil: os anos 60. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006., p. 74). Coordenada por Waldemar Cordeiro, Proposta 65 contou com a participação dos arquitetos-pintores Maurício Nogueira Lima, Ubirajara Ribeiro, Samuel Szpigel, Rubens Gerchman, Wesley Duke Lee, Hélio Oiticica e dois representantes do GAN: Império e Ferro.

Ferro também elaborou o texto da mostra Proposta 65, no qual defende que à “pintura nova” cabe o restabelecimento de relações mais próximas da realidade e contexto sociocultural, e que a “nova pintura arma-se de todos os instrumentos disponíveis” a fim de “dizer o novo” da maneira que o momento histórico pós-64 necessita e “com a crueza necessária”; afirmou que a unidade da pintura brasileira possa ser encontrada “na sua posição agressiva diante da situação abafante, no seu não conformismo, na sua colocação da realidade como problema em seus vários aspectos, na sua tentativa ampla e violenta de desmistificação” (FERRO, 1979FERRO, Sérgio. Vale tudo. Arte em Revista, São Paulo, ano I, n. 2 mai.-ago. 1979, p. 26-28.). O artista Ferro antecipou o tom agressivo que adotará nos textos específicos sobre arquitetura anos depois: “Arquitetura Nova”, “A casa popular” (FERRO, 2006_____. O canteiro e o desenho. 2. ed. São Paulo: Projeto Editores Associados, 1982.) e “O canteiro e o desenho” (FERRO, 1982_____. O canteiro e o desenho. 2. ed. São Paulo: Projeto Editores Associados, 1982.), como veremos adiante.

O Cinema Novo estabeleceu o vínculo entre o momento histórico e o cinema, onde o papel do cineasta se fundiu como o de intelectual militante (XAVIER, 2001XAVIER, Ismail. Cinema brasileiro moderno. São Paulo: Paz e Terra, 2001., p. 57). Glauber Rocha definiu o ideário de seus pares do Cinema Novo, em “Eztetyka da fome”, de 1965, em que afirma que o “miserabilismo” do Cinema Novo, que expõe a fome como a maior miséria brasileira, faria frente à tendência do cinema de “filmes elegantes, cômicos, rápidos, sem mensagens, de objetivos puramente industriais” (ROCHA, 1996ROCHA, Glauber. Eztetyka da fome. In: PIERRE, Sylvie. Glauber Rocha: textos e entrevistas com Glauber Rocha. Campinas: Papirus, 1996, p. 123-130., p. 65). O GAN, como o Cinema Novo, atacou a industrialização dos processos ao buscar uma nova estética: a “poética da economia”. Fundada no “absolutamente indispensável” e na “eliminação do supérfluo”, a produção arquitetônica do GAN buscou empregar técnicas construtivas tradicionais e adequadas ao subdesenvolvimento brasileiro (FERRO, 2006_____. O canteiro e o desenho. 2. ed. São Paulo: Projeto Editores Associados, 1982., p. 36). Dessa forma, poderiam ser atingidos dois grandes objetivos do grupo: ampliar o acesso do “povo” à boa arquitetura e equacionar a demanda por habitação de interesse social.

Em 1967, as manifestações culturais brasileiras se alteram substancialmente. No cinema, o filme Terra em transeTERRA EM TRANSE. Direção e roteiro de Glauber Rocha. Brasil, 1967, 115 min., DVD., de Glauber Rocha, causou um “autêntico choque, principalmente para artistas e intelectuais de esquerda”, devido ao retrato do “intelectual-poeta-político como figura contraditória, às vezes execrável” (XAVIER, 2001XAVIER, Ismail. Cinema brasileiro moderno. São Paulo: Paz e Terra, 2001., p. 63). O filme tanto marca o fim de uma época e o início de outra, quanto faz um “balanço da derrota da esquerda [...] no calor da hora e a explicação do processo se embaralha com a imprecação indignada de quem se vê impotente” (XAVIER, 2001XAVIER, Ismail. Cinema brasileiro moderno. São Paulo: Paz e Terra, 2001., p. 64). Terra em transe também é considerado o detonador do Tropicalismo na música de Caetano Veloso, Gilberto e Torquato Neto, e a inspiração do teatrólogo Zé Celso Martinez Corrêa na peça O rei da vela, de Oswald de Andrade. A peça, que inaugurou a vertente do “teatro da agressão” do grupo Oficina, seria um espetáculo “contra a burguesia paulista que ainda quer que o teatro lhe ofereça a ilusão de que ela é uma grande burguesia” (CORRÊA, 1979CORRÊA, José Celso Martinez. O rei da vela. Texto integrante do programa da peça. Arte em Revista, ano 1, n. 1, jan./mar. 1979, p. 62-63.).

O intercâmbio de ideias entre a cena teatral e o GAN foi estabelecido pelo cenógrafo Império, que desde a montagem da peça Morte e vida severina, de 1966, havia revolucionado a cenografia brasileira com o emprego de materiais inusuais, como sacos de estopa engomados e amassados para o figurino, e caveiras de boi feitas de papel manchê. Império, sob influência do teatro épico de Bertolt Brecht, descreve o trabalho como: “um teatro onde houvesse projeção de slides, imagens que elucidassem os fatos, puxando-os para nossa realidade cotidiana” (IMPÉRIO, 1999IMPÉRIO, Flávio. Flávio Flávio Império. Organização de Renina Katz e Amélia Hamburger. São Paulo: Edusp, Fapesp, 1999., p. 48). Na análise de Mariângela Lima, o cenógrafo exercitou “o trânsito entre imagem da cultura popular e o palco contemporâneo” que segue um modelo “associativo dos anos 60 que acrescenta ao ideal civilizatório a ideologia socialista, temperada sempre pelo anti-imperialismo e, algumas vezes pelo nacionalismo” (LIMALIMA, Mariângela Alves. Flávio Império e a cenografia do teatro brasileiro. In: KATZ, Renina; HAMBURGER, Amélia Império (Org.). Flávio Império. São Paulo: Edusp, 1999. (Artistas Brasileiros). apud IMPÉRIO, 1999IMPÉRIO, Flávio. Flávio Flávio Império. Organização de Renina Katz e Amélia Hamburger. São Paulo: Edusp, Fapesp, 1999., p. 48). A cenografia de Império teria sinalizado o caminho a ser seguido pelo GAN, segundo Ferro (2006, p. 266)_____. Arquitetura e trabalho livre. Organização e apresentação: Pedro Fiori Arantes. Posfácio de Roberto Schwarz. São Paulo: Cosac Naify, 2006.. O GAN estabeleceu contato muito próximo com o Teatro Oficina, especialmente após o projeto de reconstrução do espaço, que fora destruído num incêndio. Nesse projeto, Império e Lefèvre materializaram a “poética da economia” do GAN ao expor os materiais em seu estado bruto: tijolos aparentes, concreto e urdimentos à mostra. Na análise de Zé Celso, o novo Teatro Oficina contribuiu para novos caminhos cênicos: “talvez eu não sacasse nunca se não tivesse contracenado com a transa arquitetônica-cenográfica do Flávio. Transa com a cultura bruta paulista. Brecht dizia: Mostre os refletores! Flávio acrescentava: ‘Mostre tudo! Uma sala de tijolo e cimento’” (CORRÊA, 1998_____. Primeiro ato: cadernos, depoimentos, entrevistas (1958-1974). Seleção, organização e notas de Ana Helena Camargo Staal. São Paulo: Ed. 34, 1998., p. 74).

Império integrou o Teatro Oficina, realizando cenografia de várias produções, tais como: Um bonde chamado Desejo, O melhor juiz: o rei, Andorra, Dom Juan e Roda viva. Zé Celso e Império conceberam um espetáculo como um programa de auditório onde o protagonista era um cantor popular que se transforma em ídolo instantaneamente. A peça marca o início do “teatro da agressão”, do Oficina (CORRÊA, 1998_____. Primeiro ato: cadernos, depoimentos, entrevistas (1958-1974). Seleção, organização e notas de Ana Helena Camargo Staal. São Paulo: Ed. 34, 1998., p. 99).

Segundo Carlos Mota (2008, p. 219)MOTA, Carlos Guilherme. Ideologia da cultura Brasileira 1933-1974: pontos de partida para uma revisão histórica. São Paulo: Ed. 34, 2008., 1967 representou um momento de transição e radicalização da cultura de esquerda no Brasil, quando têm início as discussões em torno de qual seria “a estratégia política mais adequada aos processos emergentes, a questão da luta armada e da via política etc.”, que teria sido alimentada pela ampla divulgação de autores marxistas ocidentais, como Herbert Marcuse, Theodor Adorno e Walter Benjamin, por exemplo.

Concluindo, o GAN participou intensamente das discussões, e sua produção cultural e contracultural – arquitetura, cenografia, crítica e artes plásticas – é fruto daquele momento histórico, de censura, autocensura e derrota das utopias de esquerda, como veremos mais adiante.

Da militância no PCB à participação na ALN

A crítica ao status quo do GAN foi expressa especialmente pelos textos de Ferro e Lefèvre, alimentados pelo intenso diálogo com autores marxistas ocidentais, como Gyorgy Lukács, Karl Mannheim e Walter Benjamim, e partidários do PCB, como Ferreira Gullar, Leandro Konder e Carlos Marighela.

Lefèvre (1966)LEFÈVRE, Rodrigo Brotero. Uma crise em desenvolvimento. Acrópole, n. 333, out. 1966, p. 22-23., em “Uma crise em desenvolvimento”, questiona a postura dos arquitetos alinhados ao “projeto nacional-desenvolvimentista” e discute a estrutura social estratificada, a hierarquia social, a divisão social do trabalho e os valores reificados. Nesse texto, Lefèvre estabelece um diálogo com Lukács ao citar “Introdução aos escritos estéticos de Marx e Engels”, de 1945, no seguinte trecho:

Na consciência humana o mundo aparece completamente diverso daquilo que na realidade ele é: aparece alterado na sua própria estrutura, deformado nas suas efetivas conexões. Torna-se necessário um trabalho mental de tipo completamente particular para que o homem do capitalismo penetre nesta fetichização e descubra no interior das categorias reificadas (mercadoria, dinheiro, preço etc.) que determinam a vida cotidiana dos homens a verdadeira essência delas, de relações sociais, relações entre homens.

(LUKÁCS, 1965LUKÁCS, Georg. Introdução aos escritos estéticos de Marx e Engels. In: _____. Ensaios sobre literatura. Coordenação e prefácio de Leandro Konder. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965, p. 11-42. (Biblioteca do Leitor Moderno, v. 58)., p. 20).

Lefèvre discorre sobre o processo de democratização, que deveria contemplar a participação do operário, e vê na “participação popular na produção de arquitetura, no seu consumo enquanto atendimento de necessidades materiais e na sua absorção enquanto expressão” uma forma contrária à que teria ocorrido na realização de Brasília, quando foi possível a “experimentação em todos os níveis”, cujas propostas demonstram uma “fase aguda dessa crise em desenvolvimento”, pois até em propostas sem importância “passa-se a dedicar uma atenção anormal, patológica, pretendendo no máximo estabelecer um ‘documentário da linguagem arquitetônica’, quando não só se situar no plano do ‘modismo’” (LEFÈVRE, 1966LEFÈVRE, Rodrigo Brotero. Uma crise em desenvolvimento. Acrópole, n. 333, out. 1966, p. 22-23., p. 23).

Lefèvre estaria assumindo a postura de “narrador” da arquitetura, seguindo a perspectiva de Lukács, em “Narrar e descrever”, de 1936. Nesse texto, Lukács analisa que escritores podem assumir duas posições diferentes frente às transformações de seu tempo: de um lado, escritores como Balzac, Stendhal, Dickens, Tolstoi, que representam a “sociedade burguesa que está se consolidando através de graves crises”, onde eles “viveram esse processo de formação em suas crises, participaram ativamente dele”; de outro lado, escritores como Flaubert e Zola, que iniciaram suas carreiras numa “sociedade burguesa já cristalizada”, estariam formando uma classe de escritores profissionais, no sentido da divisão capitalista do trabalho, tornando-se “observadores críticos da sociedade burguesa” – suas opiniões subjetivas denotam que eles são “filhos da época em que viveram e, por isso, a concepção que eles tinham do mundo sofre constantemente o influxo das ideias do tempo” (LUKÁCS, 1965LUKÁCS, Georg. Introdução aos escritos estéticos de Marx e Engels. In: _____. Ensaios sobre literatura. Coordenação e prefácio de Leandro Konder. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965, p. 11-42. (Biblioteca do Leitor Moderno, v. 58)., p. 57).

Além do diálogo com Lukács, “Uma crise em desenvolvimento” (1966), de Lefèvre, seria uma resposta à crítica de Artigas, que fora publicada no número 319 dedicado ao trabalho do GAN. Embora ambos os textos tratassem do contexto arquitetônico, eles repercutem as discussões e tensões da cena cultural de esquerda.

Artigas, em “Uma falsa crise” (1965), apresenta uma posição moderada em relação ao momento político, postura coerente com o posicionamento dos integrantes do PCB11 11 A partir da “Declaração de março”, o PCB considera que a “Revolução” só seria possível mediante uma “frente única de forças sociais” – proletariado, camponeses, pequena burguesia, e burguesia –, que seria o agente de transformação social. , bem como se estabelece um diálogo com Lukács, em “Arte livre ou arte dirigida” ([1948] 1967), em que o autor discorre sobre a posição do artista frente às questões de seu tempo e a delicada questão de seu posicionamento ideológico. A influência de Lukács sobre o texto de Artigas pode ser observada ao se comparar os seguintes trechos:

A tarefa exclusiva da arte é a de tomar posição nas lutas de seu tempo, da sociedade, das classes sociais; de favorecer a vitória social de uma determinada tendência, a solução de um problema social. Tudo que ultrapasse esta finalidade já pertence à “arte pela arte”.

(LUKÁCS, 1967_____. Arte livre ou arte dirigida?. Revista Civilização Brasileira, ano III, n. 13, maio 1967, p. 159-178., p. 159).

[...] a liberdade artística se funda sobre a subjetividade exacerbada. A personalidade artística reivindica seu direito soberano de escolher o assunto e a forma do que ela representa, unicamente em função das exigências da sua própria inspiração. A noção de liberdade é então, para o artista moderno, uma noção abstrata, formal e negativa: ela só contém a reivindicação de proibir a quem quer que seja de intervir nesta suprema autoridade pessoal.

(LUKÁCS, 1967_____. Arte livre ou arte dirigida?. Revista Civilização Brasileira, ano III, n. 13, maio 1967, p. 159-178., p. 167).

Abaixo, Artigas discute a posição da arquitetura como “arte pela arte” e defende a liberdade artística do arquiteto:

A medida dos resultados da fase funcionalista não se limita na constatação (falsa) de uma crise na qual, considerada a falência do funcionalismo, volta-se a arquitetura a uma posição de arte pela arte. Nem houve falência do funcionalismo, nem a arquitetura se fechou em si mesma. Houve, sim, a superação de uma fase. [...]

(ARTIGAS, 1965ARTIGAS, João Batista Vilanova. Uma falsa crise. Acrópole, São Paulo, n. 319, jul. 1965, p. 21-22., p. 21 – grifos nossos)

A arquitetura reivindica para si uma liberdade sem limites no que tange ao uso formal. Ou melhor, uma liberdade que só respeite a sua lógica interna enquanto arte.

(ARTIGAS, 1965ARTIGAS, João Batista Vilanova. Uma falsa crise. Acrópole, São Paulo, n. 319, jul. 1965, p. 21-22., p. 22 – grifos nossos).

A presença de Lukács nos textos dos arquitetos poderia ser coincidência (ou suposição). Contudo, podemos considerar como evidências o fato de Artigas citar duas publicações daquele ano: Ensaios sobre literatura, de Lukács, organizado por Leandro Konder (também foi citado por Lefèvre); e Cultura posta em questão, de Ferreira Gullar, considerado um leitor de Lukács conforme análise de Carlos Mota (1994, p. 236)MOTA, Carlos Guilherme. Ideologia da cultura Brasileira 1933-1974: pontos de partida para uma revisão histórica. São Paulo: Ed. 34, 2008..

Gullar criticou a grande preocupação dos arquitetos brasileiros com o aspecto formal da arquitetura, em detrimento das questões sociais. Ele argumenta que a ênfase no aspecto formal da arquitetura moderna brasileira se deve ao entendimento da arquitetura como “obra de arte”: “de fato, arte, no seu caso a noção de arte implica uma soma de problemas que não podem ser ignorados” e caberia ao arquiteto “compreender que os obstáculos atualmente insuperáveis de sua profissão decorrem da estrutura econômica do país e só serão vencidos quando a estrutura for transformada” (GULLAR, 1965GULLAR, Ferreira. Cultura posta em questão. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965., p. 41).

Em “Uma falsa crise”, Artigas (1965)ARTIGAS, João Batista Vilanova. Uma falsa crise. Acrópole, São Paulo, n. 319, jul. 1965, p. 21-22. também responde à crítica de Gullar argumentando que a arquitetura, assim como a arte em geral, perdeu a “aura” que ostentava antes da Revolução Industrial, pois: “o caráter cultural da arte, como a experiência destes anos, tende a ser substituído pelo caráter político [...]” (ARTIGAS, 1965ARTIGAS, João Batista Vilanova. Uma falsa crise. Acrópole, São Paulo, n. 319, jul. 1965, p. 21-22.).

No entanto, o argumento de Artigas não cita corretamente Gullar, que diz: “conforme observa Benjamin, na época moderna, o caráter cultual da arte tende a ser substituído pelo caráter político” (GULLAR, 1965GULLAR, Ferreira. Cultura posta em questão. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965. – grifos nossos). Gullar discute o conceito de “aura” desenvolvido por Walter Benjamin12 12 Walter Benjamin, considerado um dos pensadores marxistas mais influentes do século XX, publicou cerca de cinco versões do seminal ensaio. Infelizmente não sabemos qual é a versão utilizada por Artigas e Gullar. em “A obra de arte na época da possibilidade de sua reprodutibilidade técnica”, de 1936. Benjamim (2017, p. 184)BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época da possibilidade de sua reprodução técnica (5. versão). In: _____. Estética e sociologia da arte. Trad. João Barrento. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017. desenvolve sua teoria materialista da arte e esclarece o conceito de “aura” nos seguintes termos: “uma teia singular, composta de elementos especiais e temporais: a aparição única de uma coisa distante, por mais perto que ela esteja”; portanto, a “aura” (ou a unicidade) da obra, foi comprometida pela reprodutibilidade técnica, em outros termos, a reprodutibilidade técnica poderia emancipar a obra de sua “existência parasitária no ritual”, e completa: “A obra de arte reproduzida é cada vez mais a reprodução de uma obra de arte criada para ser reproduzida (cinema)”; e que, “à medida que as obras de arte se emancipam do seu uso cultual (originário), aumentam as ocasiões para que elas sejam expostas” (BENJAMIN, 2017BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época da possibilidade de sua reprodução técnica (5. versão). In: _____. Estética e sociologia da arte. Trad. João Barrento. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017., p. 186) para recepção ótica e tátil. Nesse ensaio, Benjamim também analisa a arquitetura que seria o protótipo de obra de arte “cuja recepção se dá coletivamente, segundo o critério de dispersão”; em que a massa dispersa “envolve-a com o ritmo de suas vagas, absorve-a em seu fluxo” (BENJAMIN, 2017BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época da possibilidade de sua reprodução técnica (5. versão). In: _____. Estética e sociologia da arte. Trad. João Barrento. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017., p. 208).

Concluindo, entendemos que tanto “Uma falsa crise”, de Artigas, quanto “Uma crise em desenvolvimento”, de Lefèvre, estabeleceram um diálogo transdisciplinar com a cena cultural e política, pois refletem o contexto de resistência cultural e artística durante o regime militar brasileiro. No cenário específico da arquitetura, os textos buscam responder aos seguintes questionamentos: qual seria o papel social do arquiteto de esquerda durante o regime militar?; qual seria a participação do arquiteto e da arquitetura no contexto social,?;seu trabalho poderia ser interpretado apenas como “arte-pela arte”? Além disso, repercutem as tensões internas do PCB, pois seus filiados Artigas e Lefèvre estariam assumindo posturas antagônicas frente à crise (aqui leia-se regime militar). Lefèvre estaria “narrando a história” ao assumir a postura de “artista engajado” para lutar contra o regime (na perspectiva de Lukács), e Artigas, por sua vez, “descrevendo a história” de forma moderada, como se justificou anos depois:

Nós tivemos a participação dos arquitetos, na resistência, em vários níveis. Há os que foram para a cadeia. Fiz o possível para fazer os jovens compreenderem que Artigas e Niemeyer não tiveram culpa de a Arquitetura Moderna não ter feito a revolução social no Brasil. Pensavam que nossa contribuição como arquitetos, naquela época, tinha sido na sua essência reacionária. E nós passávamos a ser considerados reacionários porque não conseguimos, com nossa luta, contribuir para a revolução social no Brasil. Isso naturalmente lançou uma grande confusão entre os estudantes, que se repartiram por movimentos políticos em todos os lados. Todos com a intenção de criar um processo revolucionário capaz de lutar contra a tragédia que foi o Golpe de 64.

(ARTIGAS, 1997_____. Arquitetos brasileiros. São Paulo: Instituto Lina Bo e P. M. Bardi/Fundação Vilanova Artigas, 1997., p. 28).

Por fim, os textos revelam que as tensões internas do PCB estariam influenciando as ações dos jovens arquitetos e professores do GAN, especialmente Lefèvre e Ferro, que acabaram por seguir o caminho apontado por Carlos Marighella13 13 O líder comunista Carlos Marighella, então membro da executiva nacional do PCB, desde 1962, entrou em confronto de ideias com o Comitê Central do Partido, com seu livro Por que resisti à prisão (1964). A partir do golpe de 64, discorda da postura de perplexidade do partido diante do novo regime. Em seu texto “A crise brasileira” (MARIGHELLA, 1979, p. 49-88), de 1966, critica a postura oficial do partido quanto à política de alianças com a burguesia conclamando a luta armada para derrubar a ditadura. Em junho de 1967 escreve “Crítica às teses do Comitê Central” (MARIGHELLA, 1979, p. 119-113), em agosto, participa da I Conferência da Organização Latino-Americana de Solidariedade (Olas) contrariando determinação do PCB. Rompe com o partido e é expulso. Em setembro de 1967, 33 dos 37 delegados representantes das bases do partido, em São Paulo, não participam da Conferência Estadual do Partido, para seguir Marighella. .

Marighella, que foi o principal crítico da posição oficial do PCB, em especial da política de alianças com a burguesia e do modelo de desenvolvimento para o Brasil, defendia que o quadro político estabelecido com o golpe civil-militar não seria revertido por caminhos democráticos. Em Por que resisti à prisão, Marighella marcou sua posição, que o levaria a sair do PCB em dezembro de 1966 e se tornar o principal líder da Ação Libertadora Nacional (ALN) e inimigo número 1 do regime militar:

O que quer dizer: a crise brasileira – em todos os sentidos, ou seja, econômico, político ou social – é oriunda da inadaptabilidade da atual estrutura econômica do país. Da sua incapacidade em suportar a carga demasiado pesada a ela superposta. [...] A solução da crise crônica brasileira pela via armada – como solução advinda do proletariado – exige luta árdua e sacrifícios por parte da vanguarda.

(MAGALHÃES, 2012 MAGALHÃES, Mário. Marighella: o guerrilheiro que incendiou o mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012., p. 406).

Em A crise brasileira: ensaios políticos, de 1966, Marighella discute os processos de produção e distribuição de riquezas, privilégios de classe, a influência do imperialismo norte-americano e, principalmente, a “preparação da insurreição armada popular” para a luta de guerrilhas (apud MAGALHÃES, 2012 MAGALHÃES, Mário. Marighella: o guerrilheiro que incendiou o mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012., p. 333).

Concluindo, “Uma crise em desenvolvimento”, de Lefèvre (1966)LEFÈVRE, Rodrigo Brotero. Uma crise em desenvolvimento. Acrópole, n. 333, out. 1966, p. 22-23., é um marco na trajetória do GAN, pois sinaliza a ruptura com Artigas – no plano político e arquitetônico, a influência dos pensadores marxistas ocidentais, o distanciamento em relação aos ideais do PCB e, principalmente, o ingresso na luta armada contra o regime militar.

Da crítica à Escola Brutalista Paulista à definição de uma arquitetura alternativa

Em 1967, Ferro divulga “Arquitetura nova”, um de seus ensaios mais importantes e que definiu o ideário do GAN e os pontos de divergência em relação à Escola Brutalista Paulista de arquitetura, então corrente hegemônica.

“Arquitetura nova” (FERRO, 2006_____. O canteiro e o desenho. 2. ed. São Paulo: Projeto Editores Associados, 1982., p. 47-58) reflete a frustração e o mal-estar de toda uma geração (geração AI-5) diante do regime militar e do desmoronamento do desenvolvimentismo e das utopias das esquerdas: “Brasília marcou o apogeu e a interrupção destas esperanças: logo freamos nossos tímidos e ilusórios avanços sociais e atendemos ao toque militar de recolher” (FERRO, 2006_____. O canteiro e o desenho. 2. ed. São Paulo: Projeto Editores Associados, 1982., p. 47). Trata-se de um manifesto coerente com as vanguardas daquela época: “teatro da agressão”, cinema marginal e poesia marginal, nova objetividade brasileira, e nova figuração, por exemplo. O texto de Ferro é visceral e marca sua posição contracultural em relação à linha hegemônica representada pela Escola Brutalista Paulista:

Hoje assistimos, nas obras de muitos arquitetos da nova geração, à hemorragia das pseudoestruturas. Muitas apresentam um novo desenho das poucas fórmulas estruturais compatíveis com as nossas limitadas possibilidades, geralmente inadaptado às reduzidas dimensões do programa. Sublinhadas artificialmente para evidenciar sua presença, deturpadas para figurar mais “lógica” do que realmente contêm, estas estruturas escondem várias deformações. Comparadas às anteriores, imediatamente revelam seu absurdo: a simplicidade e a eficácia esquecidas pelo prazer do virtuosismo individual. Mas um virtuosismo superficial, condicionado à abolição de um equilíbrio entre o ser e o parecer da estrutura. [...] Mas a “licença poética” tem limites.

(FERRO, 2006_____. O canteiro e o desenho. 2. ed. São Paulo: Projeto Editores Associados, 1982., p. 52).

“Arquitetura nova” revela que as tensões teriam chegado ao clímax no Fórum de Debates da FAU/USP, de 1968, que tinha como objetivo fazer um balanço das atividades acadêmicas, reformular o ensino e guiar as atividades escolares no ano seguinte (LEFÈVRE, s. d._____. Diretrizes (II) e programação referentes às atividades interdepartamentais da FAU. Caramelo, n. 6, p. 1-2, s. d.), mas, devido ao momento político crítico, meses antes da decretação do Ato Institucional número 5 (AI-5), acabou por se caracterizar como um “racha” geracional14 14 Sérgio Ferro considera que divergências existiam em relação aos “caminhos” e não em relação aos objetivos. Informação Pessoal. Palestra de Sérgio Ferro em 28/9/2012. Sobre os detalhes do “racha”, ver: Fiori, 2002, p. 91 . Enquanto Artigas defendia uma posição moderada, o jovem professor Lefèvre (s. d.)_____. Diretrizes (II) e programação referentes às atividades interdepartamentais da FAU. Caramelo, n. 6, p. 1-2, s. d. polemizava: “há épocas em que a relação entre as universidades e a sociedade podem e precisam ser reformadas. Quando essas relações se tornam difíceis, críticas e mesmo caóticas, um esforço move o pensamento e ação se impõe”.

De fato, Artigas defendia a prática profissional representada pelo “desenho”. O GAN, por outro lado, defendia o “canteiro” como ação política (FIORI, 2002FIORI, Pedro. Arquitetura Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefèvre, de Artigas aos mutirões. São Paulo: Editora 34, 2002., p. 45). Na interpretação de Artigas (1997)_____. Arquitetos brasileiros. São Paulo: Instituto Lina Bo e P. M. Bardi/Fundação Vilanova Artigas, 1997., seis anos mais tarde, os jovens arquitetos naquela época estariam mais ricos em propostas e influenciados pelos movimentos estudantis brasileiros e o Maio de 1968. Na França, o Maio de 68 havia posto fim ao sistema Beaux Arts, uma vez que os reformadores alteraram a orientação da disciplina de arquitetura, de obra de “criação” para uma disciplina plural e integrada às pesquisas de urbanismo, sociologia, história e filosofia (BUCKLEY, 2011BUCKLEY, Craig. Utopie: texts and projects, 1967-1978. Edited by Craig Buckley and Jean-Louis Violeau. London: MIT Press, 2011., p. 11).

Desde o início de 1968, Ferro e Lefèvre, do GAN, participavam de ações de guerrilha da ALN, como, por exemplo, a explosão de uma bomba no consulado americano, que mutilou o estudante Orlando Lovecchio Filho (MAGALHÃES, 2012 MAGALHÃES, Mário. Marighella: o guerrilheiro que incendiou o mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012., p. 381). Os arquitetos também mantinham suas atividades acadêmicas a fim de contribuir com a organização, estabelecendo contatos com intelectuais da Universidade ou obtendo informações privilegiadas, como mapas, por exemplo. Em entrevista a Marcelo Ridenti (2002, p. 174)RIDENTI, Marcelo. Em busca do povo brasileiro: artistas da revolução, do CPC à era da TV. Rio de Janeiro: Record, 2000., Ferro declarou as dificuldades daquele período:

Era dificílimo dar aula nesse período. Vinha gente [da polícia] gravar nossas aulas. E nós adquirimos um hábito, quase contraditório, de falar de uma maneira muito rebuscada. Os alunos pegavam, sentiam, apesar do vocabulário bem complicado, da fala quase esotérica, misteriosa. Em 68/69, eu dando aula sobre canteiros de obras da cidade de São Paulo, alunos chorando, e eu falando do canteiro de obras, não com palavras normais. Era uma linguagem cifrada. Mas passava a mensagem, pois: primeiro, os alunos sabiam vagamente que a gente participava de alguma coisa; segundo, sabiam que a gente a estava tentando falar algo para eles; terceiro, sabiam que a gente não podia falar claramente, tinha que falar por metáforas.

Naquele ano, 1968, o GAN realizou o projeto-manifesto da Casa Juarez. Os arquitetos e o casal de proprietários, Dulce e Juarez Lopes Brandão, discutiram a “poética da economia” e formas simples e austeras de morar, que romperiam com a tradição burguesa do bem-morar. A Casa Juarez foi publicada na revista Ou... do Grêmio da FAU, com textos de Lefèvre e Brandão, e pode ser considerada como a síntese da Arquitetura Alternativa do GAN.

Em seu texto, Lefèvre (1971)_____. Casa do Juarez. OU..., GFAU, São Paulo, n. 4, jun. 1971. estabelece um diálogo com os filósofos Walter Benjamin e Henri Lefebvre, além de retomar as principais teses do GAN. Segundo Lefèvre, o projeto da Casa Juarez seguiu dois conceitos fundamentais: a “agressão” mediante elementos da linguagem arquitetônica, que, diferentemente dos “modismos” praticados pelos demais arquitetos, evidenciariam os problemas habitacionais e sociais, pois “cada vez mais a ‘agressão’ deve ser mais contundente, exigindo a substituição do lápis”; e a verificação de uma hipótese para a construção de habitações de interesse social mediante “técnicas de construção e algumas soluções de espaço” já assimiladas e consagradas nos processos de autoconstrução do “povo” (LEFÈVRE, 1971_____. Casa do Juarez. OU..., GFAU, São Paulo, n. 4, jun. 1971.). O projeto da Casa Juarez, portanto, não participaria apenas de uma tendência, mas poderia ser uma referência para alterar o sistema de produção de habitações. Portanto, Lefèvre discute o papel do arquiteto como “autor”, marxista e engajado com as causas sociais, ou seja, como “produtor” de uma obra que poderia indicar o caminho para seus pares e alterar o contexto em que está inserida; seguindo de perto a tese de Walter Benjamin expressa em “Autor como produtor”, a saber:

O que eu pretendo mostrar é que a tendência de uma obra só pode ser politicamente correta se também for literariamente correta. [...]

Assim, antes de perguntar qual é a posição de uma obra literária perante as relações de produção da época, gostaria de perguntar qual é a sua posição dentro delas? Essa pergunta visa diretamente a função que a obra literária assume no âmbito das relações de produção literária de uma época. Visa, em outras palavras, diretamente a técnica literária das obras.

(BENJAMIN, 2017BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época da possibilidade de sua reprodução técnica (5. versão). In: _____. Estética e sociologia da arte. Trad. João Barrento. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017., p. 83).

Embora Benjamin trate do cenário literário, sua tese teria partido do teatro épico de Bertolt Brecht – o trabalho do dramaturgo alemão influenciou o teatro brasileiro, representado pelas montagens do Teatro Oficina, que seguramente o GAN conheceu de perto, como vimos anteriormente.

Voltando ao projeto da Casa Juarez, Lefèvre pretendia que o projeto fosse um modelo suficientemente agressivo que cumpriria o papel de guiar os demais arquitetos noutra direção, diferente do rumo da corrente hegemônica representada pela Escola Brutalista Paulista. Contudo, o arquiteto admitiu ter encontrado dificuldades na realização do projeto devido à “interferência muito grande de alguns aspectos da cultura erudita” e que talvez “o nível de atuação ‘científica’ não tenha sido suficientemente alto”, em outras palavras, a dificuldade seria devida às antinomias insolúveis da sociedade, e o projeto teria sido realizado dentro do possível. Conclui seu texto citando a concepção de utopia do filósofo francês Henri Lefebvre15 15 Henri Lefebvre (1901-1991), sociólogo e filósofo francês, foi professor da Universidade de Estrasburgo e da Universidade de Nanterre a partir de 1965, editor da revista Arguments e fundador do Grupo Utopie. Lefebvre é um crítico do urbanismo moderno e analisa o valor de uso da cidade em detrimento ao valor de troca. O trabalho do filósofo, que se insere no marxismo ocidental, mais voltado aos estudos sobre cultura, sociologia e filosofia, influenciou o urbanismo contemporâneo. (LEFÈVRE, 1971_____. Casa do Juarez. OU..., GFAU, São Paulo, n. 4, jun. 1971.).

Henri Lefebvre integrou o Grupo Utopie, formado por filósofos, sociólogos e arquitetos, entre eles Jean Bauddrillard e Jean-Paul Jungmann. Considerado contracultural, o Grupo Utopie editou a revista Utopie: Sociologie de l’urbain (1967-1978) com publicações de escritos político-filosóficos, críticas ao establishment arquitetônico, às propostas racionais e tecnocráticas do urbanismo moderno, à sociedade de consumo e temas do feminismo e vanguardas artísticas (BUCKLEY, 2011BUCKLEY, Craig. Utopie: texts and projects, 1967-1978. Edited by Craig Buckley and Jean-Louis Violeau. London: MIT Press, 2011., p. 11). Henri Lefebvre foi um grande crítico do urbanismo moderno e, meses antes do Maio de 68, escreveu o clássico ensaio que impactou os rumos do urbanismo contemporâneo: “O direito à cidade” (“Le droit à la ville”).

O projeto da Casa Juarez também foi analisado pelo proprietário, o sociólogo Juarez Lopez Brandão. Ele argumenta sobre como as preocupações tradicionais, como a limpeza e a ordem da casa, e que estão associadas ao passado escravocrata, foram minimizadas no projeto do GAN devido ao emprego de materiais simples, como piso cimentado e paredes de tijolos pintadas de branco (BRANDÃO, 1971BRANDÃO, Antonio Carlos; DUARTE, Milton F. Movimentos culturais de juventude. São Paulo: Moderna, 1990.). Outra consideração do sociólogo diz respeito à solução dos ambientes, que favoreceu as relações familiares e sociais e excluiu a tradicional edícula para criados das casas burguesas. Dessa forma, o sociólogo procura justificar que sua casa não seguiria a tradição paulista de segregação dos ambientes e circulação dos criados (CARRANZA, 2017_____. O quartinho invisível: escovando a história da arquitetura paulista a contrapelo. São Paulo: G&C Arquitectônica, 2017.) .

Concluindo, a Casa Juarez não foi o modelo totalmente agressivo pretendido pelos arquitetos, pois alguns detalhes do projeto foram vetados pela proprietária, dona Dulce, como, por exemplo, a proposta inicial de subdividir os quartos apenas com cortinas de tecido e fechar o pavimento superior com madeira e não alvenaria16 16 Informação pessoal à autora em 2012. . Além disso, o projeto não materializou “plenamente o modelo agressivo pretendido, ao contemplar dois itens programáticos típicos de casas burguesas: piscina e quarto de empregada” (CARRANZA, 2012CARRANZA, Edite Galote Rodrigues. Arquitetura alternativa: 1956-1979. Tese (Doutorado em Arquitetura). Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, 2012., p. 175) . Diferentemente da solução tradicional na forma de edícula no fundo do quintal, o quarto de empregada da Casa Juarez é um volume cilíndrico, pintado na cor vermelha e localizado na porção frontal da fachada a fim de evidenciar as contradições sociais. A Casa Juarez pode ser considerada a síntese das propostas de Arquitetura Alternativa do GAN frente à corrente hegemônica representada ela Escola Brutalista Paulista.

O conturbado ano de 1968 termina com perspectiva de derrota final para a cultura de esquerda, com o recrudescimento do regime militar a partir do AI-5, que originou o período de censura, perseguições e resistência conhecido como “anos de chumbo”. Artigas, que figurou no relatório da comissão especial sobre as atividades subversivas na FAU/USP, foi cassado antes da inauguração da sede da faculdade (ADUSP, 2004ADUSP. O controle ideológico na USP: 1964-1978. São Paulo: Adusp, 2004., p. 19) e o GAN permaneceu exercendo suas atividades acadêmicas.

Em 1969, Ferro divulga o ensaio “A casa popular”, decorrente de suas aulas entre 1968-1969 (FERRO, 2006_____. O canteiro e o desenho. 2. ed. São Paulo: Projeto Editores Associados, 1982.). No ensaio, Ferro (arquiteto e guerrilheiro), discute a manutenção do modo “arcaico” de produção da arquitetura e o papel social do arquiteto. Esse ensaio dará origem ao livro O canteiro e o desenho, publicado em 1979. Na análise de Hugo Segawa (1999, p. 155)SEGAWA, Hugo. Arquiteturas no Brasil: 1900-1990. São Paulo: Edusp, 1990., o livro consagrou Ferro como o principal intelectual alternativo da arquitetura brasileira e, para Roberto Schwarz (2009, p. 439)SCHWARZ, Roberto. Cultura e política. 3. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2009., o livro revelou as contradições entre o discurso e a prática profissional dos arquitetos. Dessa forma, Ferro se tornaria um arquiteto alternativo cuja crítica é consoante e sincrônica aos movimentos contraculturais do cenário internacional (Utopie e New Left) pós-Maio de 1968.

O GAN se dissolveu em 1970 após a prisão de Ferro e Lefèvre em decorrência das ações da ALN (MAGALHÃES, 2012 MAGALHÃES, Mário. Marighella: o guerrilheiro que incendiou o mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012., p. 381). Libertados, Ferro segue para o exílio voluntário na França, onde atuou como professor e pintor; Lefèvre se tornou funcionário de uma grande construtora e voltou a ser professor da FAU/USP, continuando, assim, as pesquisas arquitetônicas do GAN; Império, que não seguiu seus parceiros na luta armada, continuou como professor da FAU/USP e mergulhou em seu trabalho artístico e cenográfico, que o aproximou mais da ala contracultural “boêmia” de inspiração hippie.

Considerações finais

No início da década de 1960, o GAN integrou as manifestações culturais brasileiras que seguiram o conceito nacional-popular. Identificamos na sua atuação sincronicidade de ideias com manifestações culturais e contraculturais do cenário internacional, em um período de profundas mudanças socioculturais em meados da década: New Left e Hippie, norte-americanos, e Grupo Utopie, francês. Os textos do GAN dialogam com autores marxistas ocidentais, como Gyorgy Lukács, Bertolt Brecht, Henri Lefebvre, Walter Benjamim e Herbert Marcuse – embora este último não tenha sido citado diretamente, foi um dos autores mais influentes no Maio 1968 devido a suas teses: a “utopia” entendida como algo possível, porém ainda não realizado (MARCUSE, 1969_____. O fim da utopia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1969., p. 16), e a “grande recusa” aos valores estabelecidos (MARCUSE, 1967MARCUSE, Herbert. Ideologia da sociedade industrial. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1967., p. 34). Nas artes plásticas, o GAN teve contribuição significativa com os trabalhos individuais de Ferro e Império. No teatro, a cenografia de Império materializou o conceito nacional-popular no início da década de 1960 no CPC/UNE e no Teatro de Arena e, em meados da década, foi determinante para a concepção do “teatro da agressão” do grupo Oficina. No plano político, o GAN participou da luta armada contra o regime militar com dois de seus integrantes – Lefèvre e Ferro –, que também fizeram parte da ALN de Marighella. No início da década de 1970, o GAN integrou a ala contracultural boêmia e hippie, com o trabalho do cenógrafo e artista plástico Império. No campo da arquitetura, no início da década de 1960, o grupo assumiu o ideal nacional-popular através da aproximação com o “povo”, representado pela integração entre arquitetos e operários em prol da melhoria das condições do canteiro de obras. Negou o “projeto nacional-desenvolvimentista” e o status quo representado pela nascente Escola Brutalista Paulista, considerada a linha hegemônica da época, ao questionar seus valores, tais como: o uso da tecnologia mais avançada, com ênfase à tecnologia do concreto armado aparente em soluções que valorizam a plástica através do conceito de estrutura como arquitetura; partidos com coberturas planas ou tetos em grelhas; modulação das vedações; e demais soluções visando a uma possível industrialização dos processos. Em meados da década, o GAN definiu sua posição crítica e contrária à produção nos canteiros; ao final da década, definiu e materializou sua Arquitetura Alternativa, contracultural, que objetivava combater o déficit habitacional através da manufatura serial e da “poética da economia” e foi ensaiada em casas burguesas e antiburguesas, como a Casa Juarez.

Concluímos que a obra do GAN – arquitetônica, artística, cenográfica e teórica – é partícipe da contracultura brasileira, pois se posicionou contra o status quo de maneira contundente. Foi dessa forma, através da “ação modificadora” e transdisciplinar, que o GAN integrou a resistência cultural, contracultural e política durante o regime militar brasileiro.

  • 2
    Conceito de “brecha” conforme concepção de Edgar Morim: “Por outro lado o espírito do tempo mudou. Antes de 1968, a divisão do trabalho, sua fragmentação, as opressões cronométricas da vida cotidiana, o estatuto da mulheres, dos jovens, dos marginais, da vida urbana, da sexualidade – tudo isso parecia fazer parte da natureza da sociedade, de forma tão evidente quanto as nuvens e as montanhas fazem parte da natureza física. Mas, nos anos 1970, é colocado em questão, frequentemente de maneira difusa, e às vezes de forma virulenta, tudo o que antes não constituía problema. Assim, as aspirações femininas, as ideias ecológicas, o neorregionalismo, o neoarcadismo, o desejo de viver fora dos ritmos artificiais da cidade, da fábrica, do escritório, a comunidade, a autogestão – tudo isso faz parte doravante de nossa problemática dos anos 1970” (MORIN, 2008MORIN, Edgar. O jogo em que tudo mudou. In: COHN, Sérgio; PIMENTA, Heyk. (Org.). Maio de 68. Rio de Janeiro: Beco do Azougue, 2008., p. 34).
  • 3
    Algumas das manifestações juvenis: Estados Unidos – manifestações contra a Guerra do Vietnã, direitos civis e das minorias e explosão de conflitos após os assassinatos de Martin Luther King e Robert Kenedy; Alemanha Ocidental – 1,5 mil estudantes protestam contra a Guerra do Vietnã e após o atentado contra o líder Rudi Dutschke da Associação dos Estudantes Alemães (SDS), vários protestos em Essen, Frankfurt, Colônia, Munique e Stuttgart; Polônia – 5 mil estudantes se reúnem na Universidade de Varsóvia para exigir “liberdade de expressão”, depois os protestos chegariam a Cracóvia, Lublin e Poznan; Japão – jovens em protestos contra a chegada do submarino norte-americano Enterprise; Espanha – a Universidade de Madri é fechada pela polícia devido às manifestações de estudantes antifranquistas; Checoslováquia – a Primavera de Praga foi esmagada por tanques soviéticos; México – na abertura das Olimpíadas, centenas de manifestantes foram mortos a tiros pelas autoridades policiais no episódio conhecido como “Massacre de Tlatetolco” (SAMUEL, 1968SAMUEL, Albert. A revolta dos estudantes. Revista Civilização Brasileira, ano IV, n. 19 e 20, mai., ago., 1968, p. 101-129.).
  • 4
    O termo “contracultura” foi cunhado pelo sociólogo norte-americano Theodore Roszak (1972)ROSZAK, Theodore. A contracultura: reflexões sobre a sociedade tecnocrática e a oposição juvenil. Rio de Janeiro: Vozes, 1972..
  • 5
    As políticas federais para o setor habitacional se iniciaram em 1946 com a criação do órgão Fundação da Casa Popular – cujo resultado foi limitado –, que na Era Vargas foi substituído pelos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs), geridos pelos órgãos previdenciários de cada classe trabalhadora. Os IAPs tiveram realizações de sucesso, passando por um momento de inflexão a partir de 1964, quando o regime militar os extinguiu e, em seu lugar, criou o Banco Nacional da Habitação (BNH) para gerir o setor através do Serviço Federal de Habitação e Urbanismo criado em 1966.
  • 6
    Cf. declaração de Ferro (2006)_____. O canteiro e o desenho. 2. ed. São Paulo: Projeto Editores Associados, 1982. na nota de rodapé 23 do texto “A casa popular”.
  • 7
    Em balanço sobre a cultura daquela década, a revista Visão descreve o espetáculo como: “uma moça da Zona Sul do Rio, um preto carioca e outro nordestino subiram a um tablado do inacabado Teatro de Arena da Rua Siqueira Campos, em Copacabana, para apresentar um show surpreendente em vários aspectos” (DA ILUSÃO..., 1974DA ILUSÃO do poder a uma nova esperança. Visão, São Paulo, 11 mar. 1974, p. 137-152.).
  • 8
    Oduvaldo Vianna Filho, Armando Costa e Paulo Pontes foram membros do CPC/UNE (1961-1964). O grupo atuou em várias áreas – cinema, teatro e literatura –, difundindo os ideais de esquerda. O espetáculo Opinião foi conduzido por Nara Leão, musa da bossa nova, José Flores de Jesus, o Zé Keti, e o cantador João do Vale.
  • 9
    A Revista Civilização Brasileira teve grande repercussão e distribuição. Seus números chegaram a 40 mil exemplares, brochuras com cerca de 200 páginas,: n. 1, abr. 1965; n. 2., maio 1965; n. 3, jul. 1965; n. 4, set. 1965; n. 5, nov. 1965; n. 6, mar. 1966; n. 7, maio 1966; n. 8, jul. 1966; n. 9-10, set./nov. 1966; n. 11-12, dez. 1966 e mar. 1967; n. 13, maio 1967; n. 14, jul. 1967; n. 15, set. 1967; n. 16, nov.-dez, 1967; n. 17, jan.-fev. 1968; n. 18, mar.-abr., 1968; n. 19-20, maio-ago. 1968; e n. 21-22, set.-dez. 1968; além dos especiais: n. 1, out. 1967; n. 2, jul. 1968; n. 3, set. 1968.
  • 10
    Após pesquisar nos 22 números da Revista Civilização Brasileira , constatei apenas dois artigos escritos por arquitetos. A ausência deles naquela publicação foi confirmada pelo historiador Carlos Guilherme Mota (2008)MOTA, Carlos Guilherme. Ideologia da cultura Brasileira 1933-1974: pontos de partida para uma revisão histórica. São Paulo: Ed. 34, 2008., estudioso da RCB.
  • 11
    A partir da “Declaração de março”, o PCB considera que a “Revolução” só seria possível mediante uma “frente única de forças sociais” – proletariado, camponeses, pequena burguesia, e burguesia –, que seria o agente de transformação social.
  • 12
    Walter Benjamin, considerado um dos pensadores marxistas mais influentes do século XX, publicou cerca de cinco versões do seminal ensaio. Infelizmente não sabemos qual é a versão utilizada por Artigas e Gullar.
  • 13
    O líder comunista Carlos Marighella, então membro da executiva nacional do PCB, desde 1962, entrou em confronto de ideias com o Comitê Central do Partido, com seu livro Por que resisti à prisão (1964). A partir do golpe de 64, discorda da postura de perplexidade do partido diante do novo regime. Em seu texto “A crise brasileira” (MARIGHELLA, 1979MARIGHELLA, Carlos. Escritos de Carlos Marighella. São Paulo: Editorial Livramento, 1979., p. 49-88), de 1966, critica a postura oficial do partido quanto à política de alianças com a burguesia conclamando a luta armada para derrubar a ditadura. Em junho de 1967 escreve “Crítica às teses do Comitê Central” (MARIGHELLA, 1979MARIGHELLA, Carlos. Escritos de Carlos Marighella. São Paulo: Editorial Livramento, 1979., p. 119-113), em agosto, participa da I Conferência da Organização Latino-Americana de Solidariedade (Olas) contrariando determinação do PCB. Rompe com o partido e é expulso. Em setembro de 1967, 33 dos 37 delegados representantes das bases do partido, em São Paulo, não participam da Conferência Estadual do Partido, para seguir Marighella.
  • 14
    Sérgio Ferro considera que divergências existiam em relação aos “caminhos” e não em relação aos objetivos. Informação Pessoal. Palestra de Sérgio Ferro em 28/9/2012. Sobre os detalhes do “racha”, ver: Fiori, 2002FIORI, Pedro. Arquitetura Nova: Sérgio Ferro, Flávio Império e Rodrigo Lefèvre, de Artigas aos mutirões. São Paulo: Editora 34, 2002., p. 91
  • 15
    Henri Lefebvre (1901-1991), sociólogo e filósofo francês, foi professor da Universidade de Estrasburgo e da Universidade de Nanterre a partir de 1965, editor da revista Arguments e fundador do Grupo Utopie. Lefebvre é um crítico do urbanismo moderno e analisa o valor de uso da cidade em detrimento ao valor de troca. O trabalho do filósofo, que se insere no marxismo ocidental, mais voltado aos estudos sobre cultura, sociologia e filosofia, influenciou o urbanismo contemporâneo.
  • 16
    Informação pessoal à autora em 2012.
  • Este artigo é decorrente do trabalho final da disciplina “A questão da resistência cultural e política durante o regime militar brasileiro”, ministrada pelo prof. dr. Marcos Napolitano em 2010NAPOLITANO, Marcos. 1964: história do regime militar brasileiro. São Paulo: Contexto, 2014a., e da tese de doutorado Arquitetura alternativa 1956-1979 (CARRANZA, 2012).
  • CARRANZA, Edite Galote. A questão da resistência cultural, contracultural e política durante o regime militar brasileiro – Grupo Arquitetura Nova. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, Brasil,n. 76, p. 73-92, ago. 2020.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Ago 2020
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2020

Histórico

  • Recebido
    17 Abr 2019
  • Aceito
    15 Jul 2020
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