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ESCRAVOS HIPOTECADOS, CAMPINAS - 1865-1874* * Maria Alice Rosa Ribeiro: levantamento de dados e montagem de planilhas Excel, pesquisa bibliográfica, sustentação teórica, redação; Maria Aparecida Alvim de Camargo Penteado: levantamento de dados e montagem de planilhas Excel.

SLAVES AS COLLATERALS, CAMPINAS - 1865-1874

Resumo

O artigo tem por objetivo analisar o crédito por meio das escrituras públicas de empréstimo a juros com obrigações hipotecárias no município de Campinas, de 1865 a 1874, transcritas do Livro n. 2, “Inscrições de Hipotecas Especiais”. A análise concentra-se na propriedade escrava fornecida pelos devedores aos credores para assegurar o empréstimo. Procuramos analisar a composição dos escravos hipotecados, de acordo com sexo, origem, idade, e a riqueza patrimonial e ocupação dos principais devedores e credores hipotecários.

Palavras-chave:
Escravos; hipotecas; relações de crédito; economia cafeeira; Campinas

Abstract

The article aims at analyzing credit based on notarial deeds on loans, pledged by public mortgage, in the county of Campinas, Province of São Paulo, from 1865 to 1874. The information is based on the general mortgage register - Book n. 2 - denominated ‘Inscrições de Hipotecas Especiais’. The analysis concentrates on the role of slave property as collateral in the mortgage market. We showed the composition of the collateralized slaves in terms of sex, origin and age, and the wealth and occupations of creditors and debtors.

Keywords:
Slaves; mortgage; credit relations; coffee economy; Campinas

Introdução

Em 2018 completaram-se 130 anos da Lei Áurea. Em dois lacônicos artigos, a Princesa Regente decretou e sancionou a lei: “É declarada extincta, desde a data d’esta Lei, a escravidão no Brasil”; “Revogam-se as leis contrárias”. Encerravam-se, assim, mais de três séculos de escravidão no Brasil, último país do mundo a extinguir o regime de trabalho escravo como base da sociedade e da vida econômica. Sem prever qualquer anteparo aos cativos libertos, como acesso à terra, à educação, ao trabalho e à remuneração dignos, a lei lançou milhares de pessoas libertas do cativeiro no mercado, “sem lenço e sem documento”, apenas com a identidade estampada na cor da pele e com direito à exclusão econômica e social. E a vida seguiu.

Esse é um momento especial para escrevermos sobre um tema pouco abordado pela historiografia econômica da escravidão, que diz respeito ao papel da propriedade escrava cedida como garantia nos contratos públicos de escrituras de empréstimo hipotecário.1 1 Um primeiro artigo sobre hipotecas com uma visão geral foi publicado pelas autoras em 2018 (RIBEIRO; PENTEADO, 2018). Nosso universo de pesquisa é formado pelas escrituras públicas de hipotecas transcritas no Livro nº 2 - Inscrição Especial de Hipotecas -, de Campinas para o período de 1865 a 1874.2 2 Os livros Inscrição Especial de Hipotecas compõem o acervo documental pertencente ao Cartório de Registro de Título e Documentos (CRTD), em custódia no Centro de Memória - Universidade Estadual de Campinas (CMU - Unicamp). Para este artigo utilizamos o livro classificado como: S3, IH, L11, 1868-1875. Neste artigo, pretendemos esmiuçar as características das cessões de direitos de propriedades reais pelo devedor ao credor para assegurar o pagamento da dívida hipotecária. Dentre as garantias reais, vamos analisar de forma mais aprofundada a cessão do direito da propriedade escrava, vale dizer, os escravos hipotecados. Embora o estudo se restrinja a Campinas, consideramos que o caso particular pode servir de referência para o todo, ou que o local reflete o todo. Na segunda metade do século XIX, Campinas teve grande importância econômica e social. Foi o centro econômico de uma vasta região, por onde o café penetrou nas antigas propriedades de cana e de engenhos de açúcar, propiciando a convivência de culturas e produções diversificadas: cana, algodão, arroz, milho, feijão e criação de animais. Fruto da expansão cafeeira, a região foi cunhada de Oeste Paulista e seu dinamismo atraiu populações livres e escravas e a instalação de uma infraestrutura urbana, de uma rede de atividades comerciais e industriais e de um sistema de transporte ferroviário. Campinas tornou-se o centro da economia escrava paulista, abrigando o maior contingente de escravos da província de São Paulo e um importante sistema de transporte ferroviário, composto pelo entroncamento de duas redes de estradas de ferro que ligavam o porto de Santos a Campinas, passando pela capital e seguindo em direção ao interior paulista até atingir a província de Minas Gerais. Logo, a localidade estudada teve importante participação na construção da sociedade brasileira do século XIX. Foi dela, também, que saíram os líderes republicanos que ocupariam postos de destaque por toda a República Velha.

O período estudado corresponde a dez anos. Começa com as transcrições dos títulos de escrituras públicas de obrigações hipotecárias referentes ao ano de 1865 e termina no ano de 1874. O artigo está estruturado em quatro seções, afora a introdução e as considerações finais. Na primeira tratamos da legislação hipotecária com respeito às garantias previstas. Na segunda narramos casos da historiografia envolvendo a relação creditícia e escravos hipotecados. Na terceira, analisamos os principais bens patrimoniais dados em garantia pelos devedores aos credores. Na quarta abordamos a composição dos escravos hipotecados, de acordo com sexo, origem, idade e ocupações e a riqueza patrimonial dos principais devedores e credores.

A legislação do crédito hipotecário, garantias reais e escravos

A Lei nº 1.237, de 24 de setembro de 1864, reformou a legislação hipotecária e definiu que as hipotecas seriam reguladas pela lei civil, e não pelo Código Comercial (BRASIL, [2002]), revogando as disposições relativas à hipoteca de bens de raiz. Em 26 de abril de 1865 foi aprovado o Decreto nº 3.453, que regulamentou a lei, estabelecendo as bases operacionais da reforma hipotecária. O livro por nós analisado, n. 2, segue as determinações do artigo 26 do Decreto n. 3.453, contendo o registro das inscrições das hipotecas convencionais especializadas e contemplando a população masculina adulta e parte da população feminina adulta, solteiras e viúvas somente.

Embora aprovadas nos anos de 1864 e 1865, a reforma e a regulamentação da legislação hipotecária eram objeto de discussão havia mais de uma década. Em Um estadista do Império, Joaquim Nabuco revela que o biografado, seu pai, José Thomas Nabuco de Araújo, foi o autor da legislação de hipotecas, quando ministro da Justiça (RIBEIRO, 2012RIBEIRO, Maria Thereza Rosa. Controvérsias da questão social: liberalismo e positivismo na causa abolicionista. Porto Alegre: Zouk, 2012., p. 75-97)3 3 Agradecemos à autora por seus comentários à atuação de Nabuco de Araújo na reforma da legislação hipotecária. . Segundo Joaquim Nabuco, seu pai, como ministro da Justiça, contribuiu muito para o ordenamento jurídico da nação, pois ele havia sido juiz e jurisconsulto. Assim, as grandes realizações em matéria jurídica tiveram como móvel inspirador os relatórios de Nabuco de Araújo de 1854 a 1857 e de 1866 e o programa liberal de 1869, também, por ele redigido (NABUCO, 1897NABUCO, Joaquim. Um estadista do império: Nabuco de Araújo: sua vida, suas opiniões, sua época, tomo primeiro: 1813-1857. Rio de Janeiro: H. Garnier, 1897., p. 268). Entre as proposições de Nabuco de Araújo, destacava-se o projeto de reforma hipotecária. Logo após ter assumido o ministério da justiça em 1853, Nabuco de Araújo redigiu o projeto de reforma hipotecária, que, entretanto, levou mais de 10 anos para ser aprovado na Lei nº 1.237, de 24 de setembro de 1864, e no Decreto nº 3.453, de 26 de abril de 1865. Até então, a legislação hipotecária resumia-se ao Decreto nº 482, de 14 de novembro de 1846, que regulamentava a Lei nº 317, de 21 de outubro de 1843,4 4 O Art. 35 da Lei nº 317 de 21 de outubro de 1843 dizia “Fica creado hum Registro geral de hypothecas, nos lugares e pelo modo que o Governo estabelecer nos seus Regulamentos”. O regulamento veio três anos depois com o decreto nº 482, de 14 de novembro de 1846. a qual criara o registro geral das hipotecas. O decreto de 14 de novembro de 1846 determinava no artigo 2º que:

As hipotecas deverão ser registradas no Cartório do Registro Geral da Comarca onde forem situados os bens hipotecados. Fica, porém excetuada desta regra a hipoteca que recair sobre escravos, a qual deverá ser registrada, no registro da Comarca em que residir o devedor. (NABUCO, 1897NABUCO, Joaquim. Um estadista do império: Nabuco de Araújo: sua vida, suas opiniões, sua época, tomo primeiro: 1813-1857. Rio de Janeiro: H. Garnier, 1897., p. 269)

Como pode ser lido no referido artigo, a legislação hipotecária de 1846 previa que a obrigação de dívida poderia recair sobre escravos, porém nada mais estabelecia em relação às garantias ou aos bens hipotecados. Segundo Nabuco de Araújo, o registro geral das hipotecas servia mediocremente para informar ao emprestador a existência de outros contratos com os mesmos bens hipotecados, mas não informava se a propriedade estava ou não alienada. Esse registro “não é senão um epigrama”, definia Nabuco de Araújo (NABUCO, 1897NABUCO, Joaquim. Um estadista do império: Nabuco de Araújo: sua vida, suas opiniões, sua época, tomo primeiro: 1813-1857. Rio de Janeiro: H. Garnier, 1897., p. 269).

Em seu discurso, por ocasião da apresentação do projeto de reforma hipotecária em 20 de agosto de 1856, Nabuco de Araújo reiterou a opinião sobre o arremedo de legislação hipotecária existente até então com a assertiva “não temos um registro que previna contra outra espécie de estelionato mais prejudicial, que consiste em hipotecar a coisa já alheada” (NABUCO, 1897NABUCO, Joaquim. Um estadista do império: Nabuco de Araújo: sua vida, suas opiniões, sua época, tomo primeiro: 1813-1857. Rio de Janeiro: H. Garnier, 1897., p. 271). Joaquim Nabuco acrescentava que o primeiro esboço de reforma hipotecária, elaborado por seu pai, foi submetido ao jurisconsulto Teixeira de Freitas (MONTEIRO, 1967MONTEIRO, Washington de Barros. Augusto Teixeira de Freitas. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, vol. 62, n. 2, p. 305-318, 1967. Disponível em: <https://bit.ly/2NEes0X>. Acesso em: 24/05/2018.
https://bit.ly/2NEes0X...
, p. 305-318, PENA, 2001)5 5 Augusto Teixeira de Freitas (1816-1883) foi um reconhecido jurisconsulto brasileiro; em 1855, foi contratado pelo governo imperial para realizar a codificação das leis civis para elaborar o Código Civil, ainda inexistente, reclamado desde a Independência. Em três anos, Teixeira de Freitas apresentou a Consolidação das Leis Civis em 1.333 artigos, constituindo no “extrato fiel da legislação em vigor”. Em 1864 elaborou o Esboço do Código Civil mais completo, com 4.908 artigos. Entretanto, as divergências na comissão do Código Civil acabaram por abandonar o projeto de Teixeira de Freitas. Somente em 1916 foi promulgado o Código Civil elaborado por Clóvis Beviláqua. Até a promulgação do código vigorou a consolidação das leis civis redigida por Teixeira de Freitas e publicada em 1858. Cf. MONTEIRO (1967). Para a atuação de Teixeira de Freitas como presidente do Instituto dos Advogados do Brasil (IAB), consulte o primeiro capítulo de Pena (2001). , que o qualificou como um projeto organizado, no qual se vislumbrava “o minucioso trabalho do paciente jurisconsulto (…), e, sobretudo as noções de economia social, as largas vistas do homem de Estado, que sabe compreender as verdadeiras necessidades do seu país” (NABUCO, 1897NABUCO, Joaquim. Um estadista do império: Nabuco de Araújo: sua vida, suas opiniões, sua época, tomo primeiro: 1813-1857. Rio de Janeiro: H. Garnier, 1897., p. 269-271). Para Teixeira de Freitas a proposta refletia as “verdadeiras necessidades do país” sintetizadas nas suas palavras:

Uma nação peculiarmente agrícola, que pode tirar o melhor partido de sua imensa riqueza territorial, cuja propriedade imóvel e rural se acha amortecida e, não inspirando a necessária confiança, torna a condição dos proprietários sumamente desvantajosa em relação a de outras classes da sociedade, que maior benefício pode esperar do seu governo do que uma boa legislação hipotecária? (NABUCO, 1897NABUCO, Joaquim. Um estadista do império: Nabuco de Araújo: sua vida, suas opiniões, sua época, tomo primeiro: 1813-1857. Rio de Janeiro: H. Garnier, 1897., p. 270)

Teixeira de Freitas considerava que o nosso direito se ressentia da falta de um “sistema da publicidade das hipotecas”, sendo o registro de 1846, “um mesquinho regulamento para o registro das hipotecas” (NABUCO, 1897NABUCO, Joaquim. Um estadista do império: Nabuco de Araújo: sua vida, suas opiniões, sua época, tomo primeiro: 1813-1857. Rio de Janeiro: H. Garnier, 1897., p. 270).

Nabuco de Araújo criticava a situação do crédito para a agricultura, no qual imperava “a presunção de insolvabilidade”, “o descrédito” e o “desar”, qualitativos empregados à figura do agricultor e do proprietário que hipotecava os seus bens. “É muito comesinho dizer-se - Fulano está perdido, porque hipotecou seus bens, o inverso deste quadro é o que devemos desejar. (…) Era demasiado desejar que a lavoura pudesse estar toda hipotecada e próspera” (NABUCO, 1897NABUCO, Joaquim. Um estadista do império: Nabuco de Araújo: sua vida, suas opiniões, sua época, tomo primeiro: 1813-1857. Rio de Janeiro: H. Garnier, 1897., p. 272).

Para Joaquim Nabuco, seu pai foi o fundador de um “gênero de crédito” ainda desconhecido, no qual a “má dívida era para ele um mero acidente sem importância em uma vasta expansão”. Nabuco de Araújo elaborou a legislação do crédito territorial, sustentado na riqueza territorial rural dominante em uma economia baseada na agricultura. Para ele o crédito hipotecário com garantias em imóveis rurais era “o grande motor da atividade agrícola”. “A reforma hipotecária foi toda de Nabuco”, conclui seu biógrafo e filho (NABUCO, 1897NABUCO, Joaquim. Um estadista do império: Nabuco de Araújo: sua vida, suas opiniões, sua época, tomo primeiro: 1813-1857. Rio de Janeiro: H. Garnier, 1897., p. 272).

A importância da propriedade escrava entre as garantias reais do crédito hipotecário foi ignorada por Teixeira de Freitas e silenciada pelo autor do O Abolicionismo. Ambos se referiam somente à riqueza territorial sem mencionar os escravos, que eram, de fato, a principal garantia dos empréstimos hipotecários. Não se tratava, como exprimia Teixeira de Freitas, de “tirar o melhor partido de sua imensa riqueza territorial, cuja propriedade imóvel e rural se acha amortecida” (FREITAS, 2003FREITAS, Augusto Teixeira de. Consolidação das leis civis, vol. 1. Prefácio de Ruy Rosado de Aguiar. Obra fac-similar. Brasília: Senado Federal, 2003. Disponível em: <https://bit.ly/2MCYpB2>. Acesso em: 23/05/2018.
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, p. xxxvii), mas despertar a propriedade escrava como garantia juridicamente segura e de aceitação geral.6 6 Parece que o jurisconsulto Teixeira de Freitas possuía certa aversão, vergonha ou constrangimento em admitir a existência da escravidão em nosso país. Não é por menos que na introdução da obra Consolidação das Leis Civis, ele fez a seguinte advertência: “Cumpre advertir, que não há um só lugar no texto, onde se trate de escravos. Temos, é verdade, a escravidão entre nós; mas, esse mal é uma exceção, que lamentamos; condenado a extinguir-se uma época mais, ou menos, remota; façamos também uma exceção, um capítulo avulso, na reforma das nossas Leis Civis; não a maculemos com disposições vergonhosas, que não podem servir para a posteridade: fique o estado de liberdade sem o seu correlativo odioso. As Leis concernentes à escravidão (que não são muitas) serão pois classificadas à parte e formarão o nosso Código Negro”(FREITAS, 2003, grifos em itálico do autor, em negrito nossos). Assim, a legislação civil brasileira de 1858 foi concebida sem referências à escravidão e aos escravos.

Na lei da reforma hipotecária, considerou-se o elemento a assegurar o crédito - os escravos - sob a designação de “acessórios ao imóvel agrícola”. Assim os cativos tornaram-se essenciais nas garantias, rivalizando com os bens de raiz, terras, plantações e benfeitorias etc. Cabe chamar a atenção que a Lei nº 1.237, de 24 de setembro de 1864, explicitou que o escravo, sendo ele propriedade ou domínio do devedor e vinculado ao imóvel hipotecado, poderia ser colocado entre as garantias reais, estabelecendo como obrigatório especificar os nomes e características dos escravos no contrato. A lei definiu que as garantias se estenderiam a todas as benfeitorias que fossem acrescidas ao imóvel na vigência do contrato, como “as acessões naturais”, nas quais se incluem “as crias nascidas das escravas hipotecadas” (BRASIL, 1864BRASIL. Lei nº 1.237, de 24 de setembro de 1864. In: BRASIL. Collecção das Leis do Imperio do Brasil de 1864, vol. 1, parte 2. Rio de Janeiro: Typographia Nacional , 1864, p. 69-86. Disponível em: http://legis.senado.leg.br/legislacao/ Acesso em: 12 jan. 2018. (Coleção de Leis do Império do Brasil - Publicação Original)
http://legis.senado.leg.br/legislacao/...
, p. 70, 72). Logo, os escravos futuros, ainda não existentes, nasciam hipotecados em decorrência da hipoteca de suas mães.

Escravos hipotecados e a historiografia

A legislação hipotecária desprezou a controvérsia sobre a natureza jurídica do escravo - se regido pelo regime jurídico das coisas ou das pessoas - res ou persona?7 7 O debate sobre o instituto jurídico da escravidão não será abordado neste artigo. Ver a respeito na bibliografia consultada: Malheiro (1866), Moraes (1966), Nóbrega (1955), Ribas (1982) e Sento-Sé (2000). Pouco importava se o escravo fosse pessoa, coisa, objeto móvel ou animal, semovente. Acima da controvérsia - coisa ou pessoa - paira o direito de propriedade que assegurava ao senhor o domínio e o poder. Nada poderia agredir ou negar o direito de propriedade da mercadoria adquirida pela compra ou por herança ou doação.8 8 O Supremo Tribunal de Justiça, cuja existência e competências foram estabelecidas no artigo 163 da Carta Imperial de 1824, entendeu que a “liberdade não pode se presumir se houver agressão ao direito de propriedade do dominus sobre o escravo”. Essa foi a decisão proferida pela corte máxima em 5 de julho de 1832 publicada no Diário do Rio de Janeiro de 23 de agosto de 1832, constando a declaração “que não se podia conceder nestes casos liberdade aos escravos em prejuízo dos direitos de propriedade, i.e., contra o princípio aqui firmado”. O princípio firmado era de que causas de liberdade pelo nosso antigo Direito (§4º do título 11, do Livro 4, das Ordenações Filipinas) sempre foram reputadas causas pias (…), por conseguinte gozando de todo o favor, segundo Cândido Mendes de Almeida. Em outras palavras, as causas pias não poderiam inibir o exercício do direito de propriedade. Cf. Campello (2013).

Com base na importância do direito de propriedade, Kilbourne (1995) critica a historiografia econômica norte-americana por ignorar o “conjunto de direitos de propriedade” ao tratar a escravidão como mais uma forma de organização do trabalho comparável à baseada no trabalho livre. Segundo o autor:

O peso da evidência sugere que o crescimento da escravidão moderna não pode ser atribuído a vantagens na organização da produção ou da política, mas a um terceiro conjunto de fenômenos (…) direitos de propriedades (…) proprietários podiam fazer coisas com escravos que não podiam fazer com pessoas livres. Escravos podiam ser comprados e vendidos; eles podiam ser transportados para qualquer local onde a escravidão fosse legal; eles podiam ser destinados para qualquer tarefa sem qualquer direito legal de recusar ou renunciar. (KILBOURNE, 1995KILBOURNE, Richard Holcombe. Debt, investment, slaves: credit relations in East Feliciana Parish, Louisiana, 1825-1885. Tuscaloosa: The University of Alabama Press, 1995., p. 49)

Assim, também no Brasil, a historiografia econômica tende a ignorar o direito de propriedade que permitia ao senhor utilizar a propriedade - o escravo -, para assegurar ao credor o pagamento da dívida. Logo, a presença de escravos foi recorrente nas escrituras de obrigação hipotecárias e, mais do que isso, se tornou preponderante nas transações de crédito que tiveram lugar na sociedade campineira, como vamos demonstrar na próxima seção. Valendo-se dos direitos de propriedade sobre os escravos, os senhores poderiam deles dispor como melhor lhes aprouvesse.

Poucos estudos sobre a escravidão no Brasil foram feitos sob a perspectiva da figura do escravo hipotecado. Alguns casos retratavam uma visão de mundo, costumes de uma época e polêmicas diplomáticas da fronteira sul, que comprometeram as relações entre o estado imperial brasileiro e a república uruguaia, envolvendo extradição de escravos hipotecados no território brasileiro e transportados para aquela república.

O caso descrito foi lavrado no Parecer de 20 de março de 1858 do Conselho de Estado do Império, de autoria de Eusébio de Queiroz (1812-1868) e do Visconde do Uruguai, Paulino José Soares de Sousa (1807-1866), tendo sido posteriormente aprovado pelo Imperador e referendado pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, José Maria da Silva Paranhos (1819-1880) (GRINBERG, 2009GRINBERG, Keila. Escravidão e Relações Diplomáticas Brasil e Uruguai, século 19.Curitiba. In: ENCONTRO ESCRAVIDÃO E LIBERDADE NO BRASIL MERIDIONAL, 4, 2009, Curitiba. Anais. Curitiba: UFPR, 2009, p. 1-9. Disponível em: <https://bit.ly/2Zw5PrN>. Acesso em: 14/07/2018.
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; BRASIL, 2005BRASIL. Secretaria de Estado dos Negócios do Império e Estrangeiros. O Conselho de Estado e a política externa do Império: consultas da Seção dos Negócios Estrangeiros: 1858-1862. Rio de Janeiro: CHDD; Brasília: Funag, 2005. Disponível em: <https://bit.ly/2MEEHoA>. Acesso em: 20/07/2018.
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). A decisão do conselho referia-se ao episódio ocorrido na província de São Pedro do Rio Grande do Sul, onde um proprietário, Porfírio Fernandes Siqueira, hipotecou três escravos ao credor, Francisco Manoel dos Passos, residente em Pelotas, por dívida contraída. Na vigência do contrato, o devedor, com o intuito de livrar seus escravos da obrigação hipotecária, levou os três cativos para a República Oriental do Uruguai, onde a legislação considerava livres os escravos que lá chegassem. Desde 1842, aquela República declarara extinta a escravidão em seu território.

Alerta-nos o autor do ensaio histórico-jurídico-social sobre a escravidão no Brasil que, por nosso direito, o escravo pode obter a liberdade por meio da saída do território do Império, sendo livre ao regressar. Continua Perdigão Malheiro:

O Direito Internacional privado, por exceção à regra geral sobre o estatuto da pessoa, tem consignado o princípio de que, se um escravo chega a um país onde a escravidão não é tolerada, ele fica desde logo livre; e conseguintemente que, como livre deve ser reconhecido em qualquer outro. (MALHEIRO, 1866MALHEIRO, Agostinho Marques Perdigão. A escravidão no Brasil: ensaio histórico, jurídico e social: parte 1: jurídica. Rio de Janeiro: Typographia Nacional , 1866. Disponível em: <https://bit.ly/2L3RDCx>. Acesso em: 23/05/2018.
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, p. 126)9 9 Ver também: Araújo (2008).

Tantos foram os conflitos diplomáticos entre o Império do Brasil e a República do Uruguai, que se firmou um acordo de extradição de escravos fugidos ou que entraram naquela república sem a intenção de se libertarem. Prossegue Perdigão Malheiro, na nota de rodapé 534:

Modernamente está em vigor o art. 6º do Trat. de 12 de outubro de 1851 entre o Brasil e Montevidéu, e aplicado pelas notas reversaes de 20 de julho e 10 de setembro de 1858, sobre o modo de se efetuar a devolução, e sobre os casos em que esta deva ter lugar. Pelo art. 6º do cit. Trat. a entrega só podia ter lugar no caso de fuga (Relat. de Estrangeiros de 1859 - Conselheiro Paranhos); mas pelas notas reversaes aditaram-se os dois seguintes: o de transpor o escravo fortuitamente, e com permissão do senhor a fronteira, por ex., em seguimento de algum animal que, disparando, passar para o Estado oriental; o de transpor a fronteira por ordem do senhor em serviço ocasional e momentâneo, ou entrar no território da República em ato de serviço contínuo, quando as fazendas ou estâncias abrangerem terreno de ambos países. (…) Ficou acordado: 1º que só nesses três casos deixará o escravo de ser reputado livre; 2º que a entrega só poderá ter lugar por via extradição: punido quem de outro modo proceder; 3º que, à exceção desses casos únicos, todos os mais serão livres desde que pisem o território da República: e livre devem reputar no Brasil, se a este voltarem. (MALHEIRO, 1866MALHEIRO, Agostinho Marques Perdigão. A escravidão no Brasil: ensaio histórico, jurídico e social: parte 1: jurídica. Rio de Janeiro: Typographia Nacional , 1866. Disponível em: <https://bit.ly/2L3RDCx>. Acesso em: 23/05/2018.
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, p. 127).

No caso em tela, como os escravos hipotecados ao credor foram levados por iniciativa do seu senhor, não se configurava a extradição como restituição dos escravos ao proprietário. Por sua vez, a legislação hipotecária previa a anulação a favor do credor de qualquer alienação, por venda ou doação, dos bens hipotecados realizada pelo devedor posteriormente ao registro.10 10 Art. 13 do Decreto nº 482, de 14 de novembro de 1846 (BRASIL, 1847). No caso narrado, o credor hipotecário, inconformado com a perda do seu direito real - os três escravos -, recorreu ao presidente da província sul-rio-grandense para que reclamasse a extradição dos escravos brasileiros junto à legação imperial em Montevidéu. Sendo negada a extradição, o presidente da província demandou consulta à Seção de Justiça e Negócios Estrangeiros do Conselho de Estado, que, em resposta, confirmou a negativa do governo uruguaio. Os pareceristas reconheceram que o acordo de extradição estabelecera o princípio da devolução dos escravos fugidos, mas não daqueles trazidos por seus senhores. No caso, os escravos seguiam a vontade do seu senhor, logo, não cabia a eles contrariar. Consequentemente, o Conselho de Estado selou o prejuízo do credor hipotecário, vítima da artimanha fraudulenta do devedor que não lhe pagou a dívida e que, indiretamente, alforriou os escravos hipotecados. O parecer dizia:

O escravo ignora as transações de que é objeto, não entra, não pode entrar no exame delas: obedece a seu senhor. Se este o traz para o Estado Oriental, quaisquer que sejam as obrigações contraídas haja ou não hipotecas, por aquele simples fato, o escravo adquire sua liberdade, é livre nesta república, é liberto no Brasil. Ambos os governos estão obrigados a manter-lhe o direito que lhe concederam, nem um pode reclamar a sua devolução, nem o outro pode concedê-la. (BRASIL, 2005BRASIL. Secretaria de Estado dos Negócios do Império e Estrangeiros. O Conselho de Estado e a política externa do Império: consultas da Seção dos Negócios Estrangeiros: 1858-1862. Rio de Janeiro: CHDD; Brasília: Funag, 2005. Disponível em: <https://bit.ly/2MEEHoA>. Acesso em: 20/07/2018.
https://bit.ly/2MEEHoA...
, p. 33)

Outro caso referente à hipoteca de escravos encontramos no livro de crônicas e crítica literária Gordos, magros e guenzos, de José Almino de Alencar (2017)ALENCAR, José Almino de. Em torno de dois despachos de Machado de Assis. In: ALENCAR, José Almino de. Gordos, magros e guenzos: crônicas. Recife: Cepe, 2017, p. 1-34.. Em um dos capítulos, o autor traz um parecer escrito por Machado de Assis (1839-1908), quando o escritor fluminense ocupava o cargo de chefe da segunda seção da Agricultura da Secretaria do Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas em 1877 (ALENCAR, 2017ALENCAR, José Almino de. Em torno de dois despachos de Machado de Assis. In: ALENCAR, José Almino de. Gordos, magros e guenzos: crônicas. Recife: Cepe, 2017, p. 1-34., p. 1-34). Vamos aproveitar o despacho de Machado de Assis, trazido por Alencar, para destacar a presença de escravos como garantia e a relação entre devedores e credores, em outro momento, no pós-Lei do Ventre Livre.11 11 Com a Lei do Ventre Livre, Lei nº 2.040, de 28 de setembro de 1871 (BRASIL, 1871), as relações entre os escravos e senhores tornaram-se mais complexas e exigentes no cumprimento das determinações impostas pela lei, entre elas a matrícula, sem a qual o escravo era considerado liberto. Machado de Assis foi escritor, poeta, contista, jornalista, porém a remuneração que assegurou sua sobrevivência veio do trabalho de mais de 40 anos como funcionário público.12 12 Sobre Machado de Assis como funcionário do Ministério da Agricultura veja: Zahler (2012). De acordo com Chalhoub (2003), Machado de Assis chefiou a seção de meados de 1870 até fins da década de 1880. Os principais assuntos tratados pela seção eram política de terras e escravidão. Foi como chefe da segunda seção da Diretoria da Agricultura que redigiu o despacho do processo, envolvendo o destino do escravo Cândido: se mantido livre ou escravizado. O fato ocorreu em Guaratinguetá, município do Vale do Paraíba paulista, onde foi registrada a escritura de empréstimo hipotecário entre Francisco Cordeiro da Silva Guerra, agricultor e devedor, e Joaquim Pereira Rangel, comerciante e credor. Entre as garantias cedidas pelo devedor constavam vários escravos. Sucedeu que o devedor não honrou a dívida, assim, o direito de propriedade dos escravos deveria ser transferido ao credor. Na época do vencimento do título, o credor Joaquim Pereira Rangel verificou que um dos escravos não havia sido matriculado pelo devedor e, então, solicitou ao devedor fazê-lo, mas este se negou, alegando que o escravo era liberto. Percebendo a resistência do devedor, Joaquim Rangel tentou ele próprio matricular o escravo, mas como não dispunha do direito de propriedade não pode fazê-lo. Ainda dentro do prazo de encerramento da matrícula, 30 de setembro de 1873, a Secretaria do Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas expediu o Aviso nº. 324, de 18 de setembro de 1873, pelo qual permitiu que credores hipotecários levassem escravos hipotecados à matrícula, quando os proprietários se recusassem a fazê-lo. Entretanto, Joaquim Rangel, por estar em viagem, perdeu o prazo, segundo o coletor de rendas do município de Guaratinguetá.

Em resumo, essa era a origem da petição feita pelo credor à Princesa Isabel em 20 de março de 1877, quase quatro anos depois do encerramento do prazo da matrícula. Na petição, o credor se exime da culpa de negligência, atribuindo-a ao devedor, por agir de má-fé para lesá-lo, e ao coletor de rendas, por impor embaraços à matrícula. Seguindo os trâmites, a petição foi encaminhada à segunda seção da Agricultura, onde o encarregado do despacho era o chefe da seção, Joaquim Maria Machado de Assis. No despacho, Machado de Assis assevera:

A exposição de fatos é bastante para fazer rejeitar esta pretensão segundo meu parecer (…) parece, a primeira vista, que o mesmo Suplicante poderia ser admitido a matricular o escravo de que se trata. Não obstante, convém ponderar. 1. Que a concessão feita pelo Aviso de 18 de setembro, destinando-se a ressalvar o direito do credor hipotecário, não pode subsistir, uma vez extinto o prazo da matrícula, embora subsista a hipoteca. 2. Que sendo vários os escravos hipotecados (a hipoteca foi feita primeiramente a Arão Lima depois ao Suplicante), Silva Guerra somente deixou de dar a matrícula o de nome Cândido, fato que coincide com a declaração feita por ele, em março de 1873, de que Cândido era liberto. A presunção é a favor da liberdade; e o exame do direito com que Silva Guerra a concedeu e das condições em que foi concedido, se a título gratuito ou oneroso, escapa à ação administrativa. 3. (…) é também certo que o Aviso de 18 de setembro de 1873 chegou ao município de Guaratinguetá, antes de terminar o prazo da matrícula, conforme se vê do atestado do Coletor, que, aliás, acrescenta acharse o Suplicante de viagem nessa ocasião, tendo conhecimento do Aviso quando já não podia realizar a matrícula. (…) Entendo, pois, conforme disse acima, que a petição de Rangel carece de fundamento. Ao Suplicante não aproveita a faculdade concedida no art. 19 de Reg. citado, não só pela razão, já exposta, de que a decisão de 18 de setembro, a meu ver, não subsiste depois de extinto do prazo, como pela que o próprio Suplicante dá em seu requerimento: não cabe ao credor hipotecário provar um domínio que não tem.

Machado de Assis 12/05/1877. (ASSIS, 1877 apud ALENCAR, 2017ALENCAR, José Almino de. Em torno de dois despachos de Machado de Assis. In: ALENCAR, José Almino de. Gordos, magros e guenzos: crônicas. Recife: Cepe, 2017, p. 1-34., p. 27-31, grifos nossos)

A historiografia brasileira estudou pouco o tema dos escravos hipotecados,13 13 No âmbito da historiografia econômica, encontramos menções a hipotecas de escravos nos estudos: Marcondes (2017), Melo (2015), Schulz (2013), Flausino (2006). Flausino estuda o mercado de compra e venda de escravos em Mariana (MG), mas acaba por estender seu estudo para abordar secundariamente o mercado de hipotecas com escravos como garantia, considerando a composição da escravaria nos contratos. e por isso os casos narrados adquirem interesse. Eles apontam a presença não desprezível de escravos hipotecados em uma relação conflituosa entre devedores e credores e a ação do poder judiciário ou público na solução das desavenças. Vimos nos casos narrados que houve ações fraudulentas dos devedores contra seus credores, e prevaleceu a liberdade contra a escravidão. Se no primeiro caso o credor não teve meios de impedir a fraude do devedor, no segundo ele foi negligente em duas ocasiões - ao não verificar a matrícula dos escravos antes de emprestar e ao perder o prazo concedido aos credores para realizar a matrícula. Mesmo incorrendo em duas falhas, o credor demandou a interferência do poder imperial. Cândido era liberto, logo não poderia figurar na lista dos bens hipotecados, como concluiu Machado de Assis.

Nos Estados Unidos, a principal nação escravista do século XIX, também a historiografia econômica dedicou pouco à pesquisa sobre o papel dos escravos no crédito, como garantia real de pagamento. Uma exceção é o estudo de Kilbourne (1995), cuja pesquisa é circunscrita a uma pequena paróquia do estado Louisiana, que fazia parte do cotton belt. A economia de East Feliciana Parish (EFP) era dominada pela agricultura de plantation de algodão; 40% dos 700 domicílios estavam envolvidos com essa plantação; 66% de todos os domicílios possuíam no mínimo um escravo. Em 1860, a população livre era de quatro mil e a escrava excedia a dez mil (Kilbourne, 1995, p.15). Segundo Kilbourne (1995, p. 6), antes da Guerra da Secessão, dois terços dos milionários dos Estados Unidos viviam no sul. A fonte pesquisada foram os registros de hipotecas (mortgage records), que totalizaram, para os anos selecionados,14 14 Os períodos selecionados para o estudo são 1825-1829/ 1834-1839/1841-1846/1853-1868. Kilbourne (1995, p. 13-14) pesquisou também vendas de escravos e de terras para anos examinados: 1847, 1850, 1853, 1856 e 1859, completando sua pesquisa sobre a natureza do mercado de terras e de escravos. mais de cinco mil hipotecas e envolveram 10% da riqueza bruta dos habitantes da localidade, de acordo com o censo de 1860. O estudo mostra que o escravo era o ativo mais líquido, portanto mais facilmente transformado em dinheiro, razão pela qual, ele serviu de colateral para o crédito hipotecário. Outros ativos, a terra e as plantações de algodão, não possuíam as qualidades inerentes à propriedade escrava, sendo mais complicado e demorado transformá-los em dinheiro; ou seja, não tinham liquidez e, ao mesmo tempo, eram estáticos, impossíveis de serem transportados para outras localidades para dinamizar o mercado. A Guerra da Secessão e a emancipação dos escravos nos Estados Unidos, segundo o autor, destruíram um sólido sistema financeiro apoiado na principal riqueza do sul - o escravo -, colateral dos débitos de maior valor e de longo prazo. O trauma da emancipação dos escravos para os estados algodoeiros refletiu-se na destruição do fator que dava sustentação a uma extensa e sofisticada rede de crédito.

Nossa pesquisa envolve fontes documentais semelhantes às utilizadas por Kilbourne - os registros das inscrições de hipotecas -, nas quais o devedor cedia ao credor uma garantia, um direito sobre uma propriedade real que poderia ser transferida e vendida no caso da falta do pagamento do valor principal e dos juros. Nas próximas seções analisamos o crédito hipotecário em Campinas, explorando as garantias e, em especial, os escravos hipotecados (Figura 1). A figura 1 retrata a página 52 verso, do livro Inscrição Especial de Hipotecas, na qual consta o registro do empréstimo hipotecário da fazenda Das Dores e de seus 71 escravos, como segue:

Figura 1
Hipoteca do proprietário da fazenda Das Dores, Pedro José dos Santos Camargo

Fazenda denominada Das Dores com cafesais, terras e bemfeitorias a beira da estrada que desta cidade vai para o Amparo, e com as divisas constantes da escritura de hipotecas, e como acessórios também hipotecados, 71 escravos, cujos nomes e idades sexo e estado constam da respectiva escritura de hipoteca.15 15 Características do imóvel dado em garantia da Escritura Pública de Hipoteca, nº de ordem 169, datada de 31/08/1871, Livro 11, p. 52v. S3, IH, L11, 1868-1875. Essa fazenda-engenho pertenceu ao Padre Diogo Antonio Feijó que a adquiriu em 1809. Depois do falecimento do regente Feijó, foi vendida, em 1843, para Joaquim José dos Santos Camargo, pai de Pedro José dos Santos Camargo. Em 1875, Pedro José dos Santos Camargo vendeu-a a Eliseu Leite de Barros e José de Sousa Siqueira e, mais tarde, passou para Pedro Américo de Camargo Andrade (PUPO, 1983, p. 128, 202).

Escrituras públicas de empréstimo com obrigação de hipotecas em Campinas 1865-1874

Dividimos a análise em dois quinquênios, 1865 a 1869 e 1870 a 1874, e discriminamos três categorias de contratos hipotecários, segundo os imóveis fornecidos em garantia: rurais, urbanos e mistas (rurais e urbanos) e, em seguida, discriminamos dentro dessas categorias as que possuíam escravos como colaterais.

Para o primeiro período estudado, 1865 a 1869, encontramos um total de 105 hipotecas, que totalizavam o valor de 2.221:040$832 (dois mil duzentos e vinte e um contos, quarenta mil e oitocentos e trinta e dois réis). Dessas, 39 apresentavam imóveis rurais como garantias, totalizando o valor de 1.799:178$166 (um mil setecentos e noventa e nove contos, cento e setenta e oito mil, cento e sessenta e seis réis), ou seja, em 81% do valor das hipotecas constavam como garantias propriedades rurais e seus acessórios. Portanto, os empréstimos hipotecários eram preferencialmente realizados por devedores ligados às atividades agrícolas campineiras. Das hipotecas com garantias rurais, 29, ou seja, 74% incluíam escravos. O valor monetário do empréstimo com garantias rurais e escravos atingiu a importância de 1.509:094$640 (um mil quinhentos e nove contos, noventa e quatro mil, seiscentos e quarenta réis), o que representou 68% do valor total das escrituras de hipotecas do quinquênio. Logo, os contratos com garantias rurais e escravos eram os mais expressivos no mercado de crédito hipotecário em Campinas.

O número de escravos nas escrituras do quinquênio (1865-1869) totalizou 1.096. Deste total, 885 estava alocado nos contratos com garantias rurais, ou seja, 80,7% dos cativos eram ligados a atividades rurais.

Em termos numéricos, as escrituras com garantias de imóveis urbanos (prédios, casas, terrenos) atingiam um total de 53 hipotecas, ou seja, 50,4%, porém, em termos de valor monetário, a participação desses contratos era baixa, 4,2%. A presença de escravos era proporcionalmente a mais baixa, 1,09% sobre o total de cativos, o que era de esperar, pois a lei previa somente a hipoteca de escravos como “acessórios dos imóveis agrícolas”. Independentemente da legislação, o número de hipotecas com garantias urbanas e escravos era menor, pois o contingente de cativos dedicados às atividades urbanas era também menor. A legislação foi omissa em relação a prédios urbanos.16 16 Art. 140, parágrafo 2ª do Decreto nº. 3.453, de 26 de abril de 1865 (BRASIL, 1865).

Por fim, as escrituras com garantias mistas eram em menor número, apenas 13, ou seja, 12%. Em termos de valor, eram superiores às escrituras com garantias apenas urbanas, pois normalmente o imóvel agrícola era mais bem avaliado. A participação no valor total chegou a quase 15%. Todos os escravos hipotecados nessa categoria de escritura vinculavam-se às propriedades rurais, e atingiram 199 cativos, ou seja, 18% do total.

Na Tabela 1, evidenciamos os dados de forma mais precisa, pois estão discriminamos nas três categorias de contratos, segundo os imóveis dados em garantia.

Tabela 1
Crédito hipotecário, segundo as garantias reais. Campinas, 1865-1869

No quinquênio seguinte, 1870-1874, o valor total do crédito foi de 4.213:307$047 (quatro mil duzentos e treze contos, trezentos e sete mil e quarenta e sete réis). As escrituras com garantias rurais totalizaram o valor de 2.332:602$829 (dois mil trezentos e trinta e dois contos, seiscentos e dois mil, oitocentos e vinte nove réis), registrando uma participação de 55,4% do valor do crédito e assinalando uma queda em relação ao quinquênio anterior. Em parte, essa queda foi compensada pelo crescimento dos contratos com garantias mistas, que evoluíram de 327:785$636 (trezentos e vinte e sete contos, setecentos e oitenta e cinco mil e seiscentos e trinta e seis réis) para 1.244:439$347 (um mil duzentos e quarenta e quatro contos, quatrocentos e trinta e nove mil e trezentos e quarenta e sete réis), dobrando a participação no valor total de 15% para 30% de um quinquênio para outro. Do mesmo modo, a participação das hipotecas negociadas exclusivamente com garantias urbanas cresceu de 4% para 15%, de um quinquênio a outro.

Verifica-se que nas Tabelas 1 e 2 as garantias rurais com escravos sofreram queda de participação no valor total, passando de 67,9% (1865-1869) para 51,7% (1870-1874). Mesmo assim, mantiveram o predomínio, evidenciando dominante presença dos proprietários de terras e de escravos como demandantes de crédito.

Tabela 2
Crédito hipotecário, segundo as garantias reais. Campinas, 1870-1874

Mesmo com a queda das hipotecas com garantias rurais e escravos, a participação das hipotecas com escravos no valor total manteve-se de um período para outro em torno de 81%, graças à elevação das hipotecas mistas com escravos.

Com respeito ao crédito com garantias urbanas, houve, em termos de valor monetário emprestado, uma elevação expressiva, de 4,2% para 15,1%, evidenciando o processo de urbanização por que passava Campinas na década de 1870.

Quanto ao número de escravos, observa-se uma elevação da ordem de 53%, passando de 1.096 para 1.677. Chama a atenção a redistribuição dos escravos nas escrituras com garantias rurais e mistas. Para o primeiro período, os contratos com a presença de escravos estavam concentrados nas garantias rurais, 80,7%, enquanto os contratos com garantias mistas com escravos eram de 18,2%. Já no período seguinte, observa-se uma mudança: a participação das garantias rurais com cativos caiu para 66,7%, e das mistas com cativos elevou-se para 33,3%. Isso pode denotar que os proprietários rurais diversificaram seu patrimônio e passaram a investir em imóveis urbanos incluídos nas garantias dos seus empréstimos.

Podemos concluir que ocorreu diversificação na composição da riqueza dos tomadores de empréstimos. Na década de 1870 teve início um movimento de instalação, na cidade, de residências mais luxuosas, casarões, mansões e palacetes, refletindo o enriquecimento da elite cafeicultora. Campinas começou a atrair um contingente cada vez maior de fazendeiros, que antes moravam na fazenda e passavam os finais de semana na cidade. Com a expansão da produção cafeeira, com a complexidade de comercialização e do financiamento, a elite passou a acompanhar mais de perto os negócios, a comercialização, as atividades ligadas às companhias de estradas de ferro, às atividades fabris produtoras de máquinas de beneficiamento do café, têxtil etc. Havia inúmeras residências que ostentavam o luxo permitido pelo café. Não só os negócios atraíam a elite para a cidade, mas também as novidades culturais, artísticas e literárias, que se multiplicaram com o crescimento da riqueza e da urbanização, estimulando a mudança de antigos costumes.17 17 Cf. estudos de Bianconi, Renata (2002), Camillo (1998), Galzerani (2016), Hadler (2007), LAPA (1996) e Pupo (1969).

Por fim, a Tabela 3 mostra a síntese dos títulos públicos hipotecários com a presença de escravos na garantia. Destacamos que, apesar de as hipotecas sem escravos serem quantitativamente expressivas - 61% (1865-1869) e 72% (1870-1874) sobre o total de hipotecas -, em termos de valor, elas representavam menos de 20%. Chama a atenção que nos dois quinquênios não houve mudança significativa na participação das hipotecas com escravos no valor total do crédito, a qual girou em torno de 81%, conforme a Tabela 3.

Tabela 3
Síntese: crédito hipotecário, segundo o número e valor de hipotecas com garantias com escravos e sem escravos. Campinas, 1865-1874

Em seu estudo sobre crédito em uma das mais ricas localidades algodoeiras da Louisiana, em 1860, Kilbourne (1995, p. 73) encontrou uma participação do valor dos escravos mais elevada, de 80% das garantias, nas transações hipotecárias (mortgages) executadas sobre terras e escravos. Kilbourne mostra que a ampla rede de crédito criada nos estados escravistas se apoiava no fato do ativo escravo dispor de uma qualidade que nenhum outro possuía - a liquidez -, ou seja, poderia ser transformado em dinheiro facilmente, o que permitiu sua ampla aceitação como garantia de empréstimos. Em comparação a outro ativo, o escravo possuía a locomobilidade, faculdade de ser facilmente transportado de uma localidade para outra e a longa distância. O desenvolvimento do mercado de escravos negociado em cash e a locomobilidade propiciaram que escravos e dinheiro circulassem, conectando todas as partes de um extenso sistema de trocas interprovinciais. Logo, a liquidez era assegurada pelo dinamismo do mercado. Kilbourne avalia que a presença desse mercado de compra e venda de escravos no interior dos estados escravagistas tornou os escravos atrativos como colaterais de empréstimos. Consequentemente, a determinação do preço do escravo e o fluxo de renda por ele gerado eram amplamente conhecidos por todos os interessados em vender ou comprar, estimulando mais o crédito e a circulação de dinheiro e de homens e mulheres escravizados.

Escravos hipotecados, devedores e credores

Até aqui tratamos de compor o plano geral: a presença de escravos nas garantias do pagamento de empréstimos. Nesta seção vamos identificar os escravos, abordando a composição dos cativos apresentados à hipoteca pelos proprietários, em termos de sexo, origem e idade. Em seguida, vamos conhecer os senhores que, ao tomarem dinheiro adiantado, cediam a propriedade escrava como garantia. Por fim, vamos conhecer os credores, os proprietários do capital-dinheiro que aceitavam a propriedade escrava como garantia.

Nossa análise se inicia com a distribuição das hipotecas em classes: 1. hipotecas com escravos e sem escravos; e 2. hipotecas com escravos nominados (registro do nome) e hipotecas sem escravos nominados. A Tabela 4 traz uma síntese das informações que obtivemos e mostra a totalidade de escravos nominados e não nominados.

Tabela 4
Hipotecas e escravos nominados e não nominados totais e participações. Campinas, 1865-1874

Cabe um esclarecimento: o Livro 2 transcreve a escritura de hipoteca, entretanto não é o documento original do contrato, ele é registro público. Constatamos que, algumas vezes, o escrivão, ao transcrever, não copiava todas as informações contidas na escritura e, por essa razão, em algumas transcrições não constava o nome do escravo.18 18 A localização das escrituras originais depende de uma busca junto aos cartórios de notas de Campinas, que faremos na próxima etapa, por ora nossa pesquisa se concentra nos livros disponíveis no CMU.

Da Tabela 4 inferimos que, nos dez anos analisados, o número de hipotecas com escravos nominados chegou a 71% do total de hipotecas com escravos. O crescimento da participação relativa de escravos nominados nas transcrições de escrituras de hipotecas, de um quinquênio para o outro, deve-se, provavelmente, à obrigatoriedade de constar o número de matrícula instituído pela Lei do Ventre Livre. Os escravos nominados passaram de 68% para 74%.19 19 Esses dados se referem ao livro de inscrição de hipotecas que utilizamos. Nas escrituras originais, necessariamente, os escravos deveriam estar nominados de forma completa, como determinava a lei. Depois da instituição da matrícula, em 1871, a obrigação tornou-se mais imperiosa, pois escravo sem matrícula era livre. Talvez o escrivão fosse descuidado ou, por falta de tempo ou preguiça, não copiava o documento original na íntegra. Mais adiante voltaremos a tratar do impacto dessa lei sobre as hipotecas.

Na Tabela 5 apresentam-se as quantidades e a proporção de escravos nos contratos hipotecários referentes aos períodos de 1865 a 1874. Novamente, utilizamos a classificação - escravos nominados e não nominados - para designar aqueles que constavam com o nome e aqueles sem informações individualizadas. No último caso, o escrivão fez constar apenas o número total de escravos na hipoteca, sem especificar nome, origem e idade.

Tabela 5
Escravos nominados e não nominados. Campinas, 1865-1874

Nas hipotecas que traziam os nomes dos escravos foi possível identificar o sexo, inferindo pelos nomes femininos e masculinos.

Com base no nome do escravo, foi possível conhecer a composição por sexo dos cativos, retratada na Tabela 6. Se compararmos a divisão por sexo da Tabela 6 com a registrada no Recenseamento Geral do Império, de 1872,20 20 Na maioria das províncias do Brasil, o Recenseamento Geral do Império foi realizado em 1872. Entretanto, na província de São Paulo foi feito em 30 de janeiro de 1874. Para efeitos de referência, vamos denominá-lo de Recenseamento de 1872, porém sabemos que os dados se referem ao ano de 1874. constatamos pequenas diferenças. No primeiro censo imperial, de 1872, a população cativa de Campinas era de 13.685 indivíduos, sendo 8.806 homens e 4.879 mulheres, a proporção de escravos era igual a 64,3% e a razão de sexo era igual a 180 homens para cada grupo de 100 mulheres (BASSANEZI, 1998BASSANEZI, Maria Silvia C. Beozzo (org.). São Paulo do passado: dados demográficos. Campinas: Nepo/Unicamp, 1998.). Para o período pesquisado (1865-1874), o total de cativos hipotecados nominados foi 1.361, ou seja, 10% da população escravizada total, sendo 916 homens e 445 mulheres, resultando na proporção de homens de 67,3%, um pouco acima da verificada no recenseamento de 1872. O indicador da razão de sexo foi também mais elevado - 206 homens por grupo de 100 mulheres -, refletindo um maior desequilíbrio de sexo do que aquele verificado na sociedade campineira.

Tabela 6
Escravos nominados nas hipotecas, segundo sexo. Campinas, 1865-1874

Quanto à origem, pelo Recenseamento Geral do Império de 1872, Campinas possuía a maior população escrava da província de São Paulo: 13.685 cativos. Destes, 1.199 eram pessoas de procedência africana, ou seja, 8,8%, sendo o percentual igual a 10,6% no total dos cativos e a 5,2% no total das cativas. Nas inscrições de hipotecas, o registro da população africana divergia dessas proporções, pois, como se pode verificar na Tabela 7, a proporção de africanos era bastante elevada - chegava a 28% (1865-1869) e 22% (1870-1874) -, sendo as localidades de procedência mais citadas Cabinda, Cassange, Mina e Moçambique. Nas hipotecas, os africanos eram mais do que o dobro do contingente existente em Campinas, de acordo com o recenseamento de 1872. Portanto, tinham presença mais expressiva nos contratos hipotecários.

Tabela 7
Escravos nominados nas hipotecas, segundo sexo e origem. Campinas, 1865-1874

A proporção de africanos em relação a africanas situava-se entre 76% e 80% nos dois quinquênios, respectivamente, refletindo a preferência dominante pelo homem no tráfico atlântico. Essa mesma preferência manifesta-se no recenseamento de 1872, que registrou 941 africanos para 258 africanas, ou seja, os homens representavam 78,4% dos cativos trazidos do continente africano. Nas inscrições de escrituras hipotecárias, a idade média dos africanos era 41 anos e a dos nascidos no país 23 anos; o que era esperado, pois desde 1850 a importação de escravos da África estava proibida. No quinquênio 1870-1874, os africanos estavam mais envelhecidos, com idade média de 51 anos, contra 24 anos dos crioulos. A maior presença de africanos na escravaria hipotecada nos leva a pensar que os devedores tenham adquirido a escravaria de origem africana por meio da herança recebida de seus progenitores ou parentes, e não da compra. Esse pressuposto decorre do fato de que, no mercado de compra e venda de escravos, a preferência na aquisição recaia sobre cativos em idade produtiva, entre 15 e 40 anos, justamente a faixa etária na qual o contingente de africanos, em razão da lei da abolição do tráfico internacional de 1850, era escasso.

Outra característica da população escrava hipotecada consta na Tabela 8, que mostra a composição etária. A primeira observação a ser feita diz respeito ao impacto da Lei do Ventre Livre sobre as hipotecas com escravos. Na primeira faixa etária, crianças abaixo de 9 anos, percebe-se uma queda da participação de um quinquênio para o outro, de 17% para 9%, refletindo a eliminação dos ingênuos ou nascidos depois de 28 de setembro de 1871 das garantias hipotecárias. Na faixa etária de zero a quatro anos, há uma queda na participação relativa de 9% para 2%, embora, em termos absolutos, se verifique uma elevação no número de cativos de 18 para 21 de um período para outro. Portanto, os ingênuos participavam como garantia de hipotecas, mas com tendência decrescente e com a idade mínima mais elevada. Tomando a faixa etária classificada como crianças - de zero a 14 anos -, ou seja, cativos que não poderiam ser separados dos pais no momento da venda, segundo o Decreto nº 1.695, de 15 de setembro de 1869, para o período de 1865 a 1869 a participação atingia 25,63%, passando para 16,67% no quinquênio de 1870-1874. Em termos absolutos, o número de cativos entre zero e 14 anos cresceu de 51 para 147.

Tabela 8
Escravos nominados nas hipotecas, segundo faixas etárias. Campinas, 1865-1874

Na faixa de 20 a 29 anos houve um aumento expressivo provocado pelo aumento do tráfico interno interprovincial de escravos. Após a abolição do tráfico internacional, a elite cafeeira campineira tornou-se uma voraz compradora de escravos de outras províncias, passando a abastecer a crescente lavoura cafeeira por meio do comércio interno de cativos. Observarmos que, somando as faixas de 20 a 49 anos, houve um aumento pouco expressivo, indicando a preferência por escravos com idade menor que 30 anos. As faixas acima de 50 anos mostraram um aumento de 8% para 15%, denotando o envelhecimento da escravaria.

Esmiuçando um pouco mais os dados, com os olhos voltados para o grupo de escravos mais produtivos, faixa etária de 15 a 40 anos, verificamos, pela Tabela 9, que a participação desses escravos correspondia a mais da metade: 63% (1865-1869) e 53% (1870-1874). A idade média dos escravos girava em torno da mínima, 26 anos, e da máxima, 28 anos.

Tabela 9
Escravos hipotecados de 15 a 40 anos. Campinas, 1865 - 1874

Concluímos que a composição por sexo, origem e idade dos escravos hipotecados refletia com pequenas variações a composição da população escrava existente na sociedade de Campinas. Predominavam escravos masculinos nascidos no país na faixa mais produtiva (15 a 40 anos), que atingiram a participação de 71%. A nota divergente é a forte presença de africanos nas garantias da dívida. Nossa hipótese para explicar esse fato é que os devedores detinham maior quantidade de escravos africanos recebidos por herança. Aparentemente, no registro de escravos hipotecados, o proprietário arrolava todos os escravos empregados na lavoura.

Por fim, vamos analisar os devedores e os credores. Quem eram os senhores que hipotecavam o direito da propriedade escrava em troca do crédito? Quem eram os credores, proprietários do capital-dinheiro, que aceitavam escravos como a principal garantia do dinheiro adiantado?

Um indicador das propriedades possuídas pelos devedores expressa-se no tamanho do seu plantel de escravos. Embora não possa ser tomado por riqueza total dos devedores, pois eles poderiam dispor em hipoteca de uma parte de seu patrimônio ou riqueza. De qualquer modo, a classificação dos proprietários em cinco classes, em função do tamanho do plantel, nos permite avaliar sob prisma distinto quem eram os devedores.21 21 Empregamos a tipologia utilizada por Ricardo Salles, que distinguiu cinco grandes grupos de proprietários em Vassouras com base nos tamanhos de plantéis de escravos, segundo as informações extraídas dos inventários post-mortem, entre 1821 e 1880 (SALLES, 2008, p. 155-163).

Na Tabela 10, os microproprietários, com até quatro escravos, foram responsáveis por 27% do número de hipotecas. Em termos de valor, eles representavam apenas 2,3% das hipotecas negociadas no quinquênio de 1865-1869. Estes, junto dos pequenos proprietários (com um a 19 escravos), eram responsáveis por 63,4 % das hipotecas. Em compensação, atingiam apenas 11,5% do valor do empréstimo hipotecário dos anos 1865 a 1869. Além dos escravos, as propriedades hipotecadas na faixa de até 19 escravos caracterizavam-se por serem sítios e pequenas fazendas de cultura de alimentos. Em quase todas as propriedades o café era produzido.

Tabela 10
Proprietários de escravos, segundo o tamanho do plantel, número de hipotecas, número de escravos e valor do crédito. Campinas, 1865-1869

Em contraste com os micro e pequenos proprietários, os grandes e megaproprietários, com mais de 50 escravos, eram responsáveis por 17% do número de hipotecas e por 70% do valor dos empréstimos hipotecários registrados em Campinas no primeiro quinquênio. Eles possuíam típicas fazendas, com milhares de pés de café e culturas de alimentos destinadas à subsistência da escravaria, dos administradores e de suas famílias. É possível verificar na Tabela 10 a forte correlação entre o número de escravos hipotecados e o valor do crédito. O principal ativo hipotecado era o escravo e o valor do crédito confirmava a maior ou menor presença de escravos hipotecados.

A Tabela 11 traz o mesmo conjunto de dados para o segundo quinquênio, 1870-1874. Os micro e os pequenos proprietários (de um a 19 escravos) reduziram sua participação no número de hipotecas de 63,4% para 40% e, em termos de valor, sofreram uma queda acentuada, de 11,5% para 4,9% do total do empréstimo hipotecário.

Tabela 11
Proprietários de escravos, segundo o tamanho do plantel, número de hipotecas, número de escravos e Valor do crédito. Campinas, 1870-1874

Os dados da Tabela 11 mostram indubitavelmente que houve uma concentração do crédito nos grandes e megaproprietários, que elevaram sua participação no total das escrituras de 17% para 34,3% e, em termos de valor, passaram de 70% para 78,2% do total dos empréstimos hipotecários concedidos em Campinas.

Quanto à característica da propriedade real dada em garantia, percebe-se uma crescente presença de fazendas com milhares de pés de café. O grande e o megaproprietário tendiam a especializar a propriedade no cultivo do café, enfim, na principal mercadoria agrícola destinada aos mercados mundiais.

Quanto aos escravos, a Tabela 11 registra que 49% pertenciam aos megaproprietários, aqueles com plantel de mais de 100, que por sua vez detinham 44,5% do crédito. Juntos, os grandes e os megaproprietários eram responsáveis por 77% dos escravos e detinham uma participação no crédito de 78,2% do valor.

Há diferenças de conjuntura e institucionais entre os dois quinquênios. O término da Guerra do Paraguai em março de 1870 liberou recursos despendidos no conflito bélico para aumentar a oferta de crédito para a lavoura. Em 1873, foi firmado o acordo entre o governo e a diretoria do Banco do Brasil, que selou a retomada da ideia de transformar o banco em uma instituição voltada para financiamento da lavoura (MARCONDES, 2017). No âmbito da legislação escravista abolicionista, a Lei do Ventre Livre alterou os procedimentos da concessão de crédito hipotecário. Ao instituir a matrícula dos escravos, a Lei Rio Branco trouxe maior garantia à transferência do direito de propriedade escrava, preparando o caminho para que as operações de crédito ocorressem em um ambiente institucional mais seguro, menos arriscado e com menores chances de disputas jurídicas decorrentes dos calotes e das dificuldades de execuções de dívidas.

O crédito foi alterado pela nova proposta de funcionamento da carteira hipotecária, apresentada pela diretoria do Banco do Brasil e aprovada pelo governo por meio da Lei nº 2.400, de 17 de setembro de 1873 (RIBEIRO; PENTEADO, 2018, p. 39-45). Por essa regulamentação ficaram estabelecidos: alongamento do prazo da obrigação, que passou de seis para dez a 25 anos; juros nunca superiores a 6% ao ano, contrastando com os praticados no mercado até então, de 12%, 15% e, mesmo, 18% ao ano; amortização “lenta e desassombrada”, não podendo ser superior a 5% da importância da dívida, de modo a não prejudicar o lavrador, diante das “frustrações de safras”, decorrentes de acidentes climáticos ou de invasões de pragas.

No quinquênio de 1870-1874, o Banco do Brasil tornou-se mais atuante e competitivo, ao oferecer prazos alongados, juros módicos e amortizações com menor desembolso. Somente no ano de 1874, o Banco do Brasil foi responsável por 57% do crédito hipotecário em Campinas. Os contratos negociados tinham prazo médio de 13 anos, taxa de juros de 6% ao ano, amortização anual não superior a 5% do capital emprestado e taxa de administração de 0,2%.

Paulatinamente, o Banco do Brasil passou a ocupar o lugar dos capitalistas privados, emprestadores de dinheiro a juros, e dos comerciantes, em especial dos comissários de café, que praticavam juros médios de 12% ao ano, prazo médio inferior a dois anos para liquidação.

Os principais devedores do Banco do Brasil, que solicitaram empréstimo no valor máximo legal de 120 contos de réis, foram o comendador Joaquim Bonifácio do Amaral e esposa; João de Souza Camargo e esposa; Antonio Egydio de Souza Aranha e esposa e Augusto Xavier Bueno de Andrade e esposa. Esses proprietários hipotecaram as conhecidas fazendas cafeeiras de Campinas, respectivamente Sete Quedas, com 200 mil pés de café e 127 escravos; Santa Cândida, com 135 mil pés de café e 70 escravos; Fazenda Campo e Tuyiti, com 140 mil pés de café e 70 escravos; e São Bento, com 130 mil pés de café e 75 escravos. Além das benfeitorias de natureza diversa e semoventes, os quatro devedores hipotecaram o direito de propriedade de 342 escravos, de ambos os sexos e idades variadas.

Assim, o Banco do Brasil recebeu escravos como garantia. É importante enfatizar que a data prevista dos contratos expirava em setembro de 1888, ou seja, após a abolição da escravidão. É claro que em 1874 não se poderia prever o término do regime de trabalho escravo. Porém certo é que, em 13 de maio de 1888, data da abolição da escravidão no Brasil, muitos devedores hipotecários e proprietários de escravos viram suas garantias virarem pó. O que aconteceu com os credores que viram suas hipotecas perderem as garantias? Essa é uma questão que nos mobiliza a prosseguir a investigação.

A Tabela 12 sintetiza as profissões dos principais credores que receberam como garantias escravos. Para o quinquênio de 1865-1869, constata-se a ausência de instituições bancárias. A oferta de crédito estava concentrada nas mãos dos capitalistas privados, pessoas com capital-dinheiro disponível e que emprestavam a juros, e dos negociantes, principalmente comissários de café (RIBEIRO; PENTEADO, 2018RIBEIRO, Maria Alice Rosa & PENTEADO, Maria Aparecida Alvim de Camargo. Uma sociedade vista por suas hipotecas, Campinas, 1865-1874. História e Economia, São Paulo, vol. 20, n. 1, 2018, p. 15-53.).

Tabela 12
Profissões dos credores com garantias escravos, número de hipotecas, número de escravos e valor do crédito. Campinas, 1865-1874

A Tabela 13 mostra a participação dos principais credores em termos de profissões e instituições no crédito hipotecário de Campinas. O Banco do Brasil vai se situar na liderança dos credores, sendo responsável por 37% das hipotecas, 57% dos escravos e 43% do valor do crédito. Embora o Banco do Brasil dominasse as operações com colaterais escravos, enfatizamos que de um quinquênio a outro houve de fato a alteração significativa na participação de capitalistas privados e negociantes. Ambos os segmentos de credores, capitalistas e negociantes, perderam mercado de crédito hipotecário para as instituições bancárias e, principalmente, para o Banco do Brasil.

Tabela 13
Participação das principais profissões e instituições credoras no crédito hipotecário. Campinas, 1865-1874

Uma questão que nos intriga é por que razão os credores, em especial a principal instituição bancária do país, o Banco do Brasil, aceitava como garantia escravos. Uma primeira hipótese é que o escravo era o principal ativo da riqueza bruta de qualquer pessoa com alguma propriedade. A participação do plantel de cativos em inventários selecionados de Campinas girava em torno de 40% da riqueza patrimonial bruta entre 1830 e 1870. Com a ascensão do movimento abolicionista na década de 1880 e com a perspectiva do fim do trabalho escravo, o peso do ativo humano no conjunto patrimonial perdeu importância até que, nos fins de1887, passou a representar de 10% a 11% da riqueza bruta, mesmo assim elevada para um único item. Além de ser o ativo de maior valor no patrimônio, o escravo, após a abolição do tráfico internacional, tornou-se uma mercadoria demandada pela elite campineira, que precisava de braços para expandir as plantações de café, substituindo os antigos canaviais e engenhos. Portanto havia uma crescente demanda por escravos, apesar da elevação do preço e de um mercado bastante concorrencial. Sob esse ponto de vista, o escravo tinha liquidez, ou seja, facilmente se transformava em dinheiro. Há poucos estudos sobre o mercado de compra e venda de escravos em Campinas, o que dificulta afirmar como eram as formas de pagamento nas transações de compra e venda - a crédito ou à vista em dinheiro. A mobilidade do escravo era um fato incontestável e, ao longo da segunda metade do século XIX, Campinas tornou-se uma grande importadora de escravos. Estudos do comércio interprovincial mostram as transferências de escravos das regiões econômicas em crise ou em declínio, como a economia nordestina (algodão, açúcar etc.) e sulista (charqueadas), para a região cafeeira em expansão. Logo, parece não ter havido dificuldade para o credor hipotecário negociar o escravo no caso de sofrer um calote. Foram as demoras, os prolongados e burocratizados trâmites cartoriais, as reclamações mais recorrentes dos credores, mas isso atingia a todas as garantias reais e não era prerrogativa exclusiva dos escravos hipotecados. Assim parece que não havia razão de preferir outro ativo patrimonial, propriedade real, como garantia ao invés do escravo. As dificuldades eram as mesmas sem usufruir da liquidez e mobilidade gozadas pelo ativo humano.

Considerações finais

Como diz Stein, o século XIX brasileiro girou em torno da escravidão, logo, o crédito hipotecário não poderia ignorar a realidade que o rodeava. Concebido pelas reformas hipotecárias, nas vagas da abolição do tráfico, que interromperam o abastecimento africano e elevaram o preço do escravo em meio à onda expansionista do café, o crédito utilizou a principal riqueza dos proprietários - o escravo - como garantia do pagamento ao proprietário do capital adiantado ao devedor. O crédito hipotecário, nas palavras de Nabuco de Araújo (Nabuco, 1897), serviria para despertar a riqueza que se achava “amortecida” - a “propriedade imóvel e rural” -, mas na verdade o crédito hipotecário utilizou predominantemente como garantia a propriedade escrava, a maior riqueza dos senhores.

Nosso estudo revelou que 81% do valor das escrituras públicas de hipotecas tinha como garantias reais propriedades rurais e seus acessórios no quinquênio de 1865 a 1869. Dessas hipotecas, as que incluíam escravos representavam 67,9% do valor total do crédito negociado. Logo, os devedores eram indivíduos preferencialmente proprietários rurais escravistas ligados às atividades agrícolas campineiras. Os proprietários urbanos participavam como devedores em 4,2% do valor do crédito, embora fossem titulares de 50% do total de hipotecas do período. Considerando todas as hipotecas rurais, urbanas e mistas que incluíam escravos entre as garantias, a participação chegou a 82,2% no valor total das escrituras. Os credores eram predominantemente capitalistas e negociantes (comissários de café e comerciantes em geral), responsáveis por 98,51% do crédito hipotecário ofertado no mercado campineiro.

Para o quinquênio seguinte, a análise constatou uma queda das hipotecas com garantias rurais, que passaram de 81% para 55,4% do valor total, porém essa redução foi compensada pelo aumento das hipotecas com garantias mistas. Desse modo, as hipotecas com garantias rurais e mistas com escravos registraram uma participação de 81,1% no valor do crédito. Isso significa que os principais devedores eram grandes e megaproprietários escravistas e cafeicultores que diversificaram o patrimônio com a inclusão nas garantias de propriedades urbanas, casarões, palacetes, terrenos etc. Isso evidencia o aumento da concentração da propriedade e da riqueza, propiciado pela expansão da economia cafeeira, e o momento de auge da urbanização de Campinas nos anos de 1870. Importante ressaltar que a participação dos escravos nas garantias manteve-se igual a 81,2% do valor total do crédito realizado entre os anos de 1870 e 1874.

Uma mudança a ser destacada foi que a entrada do Banco do Brasil como credor hipotecário e sua atuação fortemente competitiva deslocou os antigos credores, capitalistas e negociantes, do mercado de crédito em Campinas. Essa instituição foi responsável por 43% do valor do crédito e deteve 57% dos escravos hipotecados.

Quanto à composição dos escravos, a análise revelou que o total dos hipotecados nos dez anos estudados correspondeu a 2.773, ou seja, 20% da população escrava registrada no primeiro Recenseamento Geral do Império de 1872. Desse total, temos informações de sexo, origem e idade para 1.361, sendo 916 homens e 445 mulheres, uma proporção de 67,3%, e uma razão de sexo de 206 homens por grupo de 100 mulheres. Chama a atenção a origem, pois a análise mostrou uma participação mais expressiva de africanos entre os cativos hipotecados do que aquela registrada no recenseamento de 1872.

Por fim, quanto à idade para os 1.081 cativos cuja informação estava disponível, 591, ou seja, 56,67%, pertenciam à faixa dos mais produtivos, de 15 a 40 anos. Considerando-se os homens nesta faixa, a participação atinge 71%. Com poucas variações, a composição demográfica (sexo, origem e idade) dos escravos hipotecados espelhava a composição da população escrava existente na sociedade campineira.

Nossas conclusões são preliminares porque este estudo cobriu apenas os primeiros dez anos do crédito hipotecário em Campinas. Pretendemos prosseguir nas investigações e percorrer um longo tempo que se encerra com dois episódios marcantes: a abolição da escravidão e o encilhamento.

  • *
    Maria Alice Rosa Ribeiro: levantamento de dados e montagem de planilhas Excel, pesquisa bibliográfica, sustentação teórica, redação; Maria Aparecida Alvim de Camargo Penteado: levantamento de dados e montagem de planilhas Excel.
  • 1
    Um primeiro artigo sobre hipotecas com uma visão geral foi publicado pelas autoras em 2018 (RIBEIRO; PENTEADO, 2018RIBEIRO, Maria Alice Rosa & PENTEADO, Maria Aparecida Alvim de Camargo. Uma sociedade vista por suas hipotecas, Campinas, 1865-1874. História e Economia, São Paulo, vol. 20, n. 1, 2018, p. 15-53.).
  • 2
    Os livros Inscrição Especial de Hipotecas compõem o acervo documental pertencente ao Cartório de Registro de Título e Documentos (CRTD), em custódia no Centro de Memória - Universidade Estadual de Campinas (CMU - Unicamp). Para este artigo utilizamos o livro classificado como: S3, IH, L11, 1868-1875.
  • 3
    Agradecemos à autora por seus comentários à atuação de Nabuco de Araújo na reforma da legislação hipotecária.
  • 4
    O Art. 35 da Lei nº 317 de 21 de outubro de 1843 dizia “Fica creado hum Registro geral de hypothecas, nos lugares e pelo modo que o Governo estabelecer nos seus Regulamentos”. O regulamento veio três anos depois com o decreto nº 482, de 14 de novembro de 1846.
  • 5
    Augusto Teixeira de Freitas (1816-1883)FREITAS, Augusto Teixeira de. Consolidação das leis civis, vol. 1. Prefácio de Ruy Rosado de Aguiar. Obra fac-similar. Brasília: Senado Federal, 2003. Disponível em: <https://bit.ly/2MCYpB2>. Acesso em: 23/05/2018.
    https://bit.ly/2MCYpB2...
    foi um reconhecido jurisconsulto brasileiro; em 1855, foi contratado pelo governo imperial para realizar a codificação das leis civis para elaborar o Código Civil, ainda inexistente, reclamado desde a Independência. Em três anos, Teixeira de Freitas apresentou a Consolidação das Leis Civis em 1.333 artigos, constituindo no “extrato fiel da legislação em vigor”. Em 1864 elaborou o Esboço do Código Civil mais completo, com 4.908 artigos. Entretanto, as divergências na comissão do Código Civil acabaram por abandonar o projeto de Teixeira de Freitas. Somente em 1916 foi promulgado o Código Civil elaborado por Clóvis Beviláqua. Até a promulgação do código vigorou a consolidação das leis civis redigida por Teixeira de Freitas e publicada em 1858. Cf. MONTEIRO (1967)MONTEIRO, Washington de Barros. Augusto Teixeira de Freitas. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, vol. 62, n. 2, p. 305-318, 1967. Disponível em: <https://bit.ly/2NEes0X>. Acesso em: 24/05/2018.
    https://bit.ly/2NEes0X...
    . Para a atuação de Teixeira de Freitas como presidente do Instituto dos Advogados do Brasil (IAB), consulte o primeiro capítulo de Pena (2001)PENA, Eduardo Spiller. Pajens da casa imperial: jurisconsulto, escravidão e lei de 1871. Campinas: Editora Unicamp: Centro de Pesquisas em História Social da Cultura, 2001..
  • 6
    Parece que o jurisconsulto Teixeira de Freitas possuía certa aversão, vergonha ou constrangimento em admitir a existência da escravidão em nosso país. Não é por menos que na introdução da obra Consolidação das Leis Civis, ele fez a seguinte advertência: “Cumpre advertir, que não há um só lugar no texto, onde se trate de escravos. Temos, é verdade, a escravidão entre nós; mas, esse mal é uma exceção, que lamentamos; condenado a extinguir-se uma época mais, ou menos, remota; façamos também uma exceção, um capítulo avulso, na reforma das nossas Leis Civis; não a maculemos com disposições vergonhosas, que não podem servir para a posteridade: fique o estado de liberdade sem o seu correlativo odioso. As Leis concernentes à escravidão (que não são muitas) serão pois classificadas à parte e formarão o nosso Código Negro”(FREITAS, 2003FREITAS, Augusto Teixeira de. Consolidação das leis civis, vol. 1. Prefácio de Ruy Rosado de Aguiar. Obra fac-similar. Brasília: Senado Federal, 2003. Disponível em: <https://bit.ly/2MCYpB2>. Acesso em: 23/05/2018.
    https://bit.ly/2MCYpB2...
    , grifos em itálico do autor, em negrito nossos). Assim, a legislação civil brasileira de 1858 foi concebida sem referências à escravidão e aos escravos.
  • 7
    O debate sobre o instituto jurídico da escravidão não será abordado neste artigo. Ver a respeito na bibliografia consultada: Malheiro (1866)MALHEIRO, Agostinho Marques Perdigão. A escravidão no Brasil: ensaio histórico, jurídico e social: parte 1: jurídica. Rio de Janeiro: Typographia Nacional , 1866. Disponível em: <https://bit.ly/2L3RDCx>. Acesso em: 23/05/2018.
    https://bit.ly/2L3RDCx...
    , Moraes (1966)MORAES, Evaristo. A campanha abolicionista (1879-1888). 2ª edição. Brasília, DF: Editora UnB, 1966., Nóbrega (1955)NÓBREGA, Vandick Londres da. História e sistema do direito privado romano . Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1955., Ribas (1982)RIBAS, Joaquim. Direito civil brasileiro. Rio de Janeiro: Rio, 1982. e Sento-Sé (2000)SENTO-SÉ, Jairo Lins de Albuquerque. Trabalho escravo no Brasil na atualidade. São Paulo: LTr, 2000..
  • 8
    O Supremo Tribunal de Justiça, cuja existência e competências foram estabelecidas no artigo 163 da Carta Imperial de 1824, entendeu que a “liberdade não pode se presumir se houver agressão ao direito de propriedade do dominus sobre o escravo”. Essa foi a decisão proferida pela corte máxima em 5 de julho de 1832 publicada no Diário do Rio de Janeiro de 23 de agosto de 1832, constando a declaração “que não se podia conceder nestes casos liberdade aos escravos em prejuízo dos direitos de propriedade, i.e., contra o princípio aqui firmado”. O princípio firmado era de que causas de liberdade pelo nosso antigo Direito (§4º do título 11, do Livro 4, das Ordenações Filipinas) sempre foram reputadas causas pias (…), por conseguinte gozando de todo o favor, segundo Cândido Mendes de Almeida. Em outras palavras, as causas pias não poderiam inibir o exercício do direito de propriedade. Cf. Campello (2013)CAMPELLO, André Emmanuel Batista Barreto. A escravidão no Império do Brasil: perspectivas jurídicas. Notícias: Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional, Brasília, DF, 22/01/2013. Disponível em: <https://bit.ly/2a21Ol1> Acesso em: 18/05/2018.
    https://bit.ly/2a21Ol1...
    .
  • 9
    Ver também: Araújo (2008)ARAÚJO, Thiago Leitão de. Escravidão, fronteira e liberdade: políticas de domínio, trabalho e luta em um contexto produtivo agropecuário (vila da Cruz Alta, província do Rio Grande de São Pedro, 1834-1884). Dissertação de mestrado em História, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008. Disponível em: <https://bit.ly/2U8t6iu>. Acesso em: 14/07/2018.
    https://bit.ly/2U8t6iu...
    .
  • 10
    Art. 13 do Decreto nº 482, de 14 de novembro de 1846 (BRASIL, 1847).
  • 11
    Com a Lei do Ventre Livre, Lei nº 2.040, de 28 de setembro de 1871 (BRASIL, 1871BRASIL. Decreto nº 4.835, de 1º de dezembro de 1871. Regulamento para a matrícula especial dos escravos e dos filhos livres de mulher escrava. In: BRASIL. Collecção das Leis do Imperio do Brasil de 1871, vol. 1, parte 2. Rio de Janeiro: Typographia Nacional , 1871. p. 708. Disponível em: <https://bit.ly/2U5Sg0Y>. Acesso em: 17/07/2018.
    https://bit.ly/2U5Sg0Y...
    ), as relações entre os escravos e senhores tornaram-se mais complexas e exigentes no cumprimento das determinações impostas pela lei, entre elas a matrícula, sem a qual o escravo era considerado liberto.
  • 12
    Sobre Machado de Assis como funcionário do Ministério da Agricultura veja: Zahler (2012)ZAHLER, Paccelli José Maracci. Machado de Assis no Ministério da Agricultura. Revista Cerrado Cultural, [s.l.], 01/04/2012. Disponível em: <https://bit.ly/2zsRnpO>. Acesso em: 17/07/2018.
    https://bit.ly/2zsRnpO...
    . De acordo com Chalhoub (2003)CHALHOUB, Sidney. Machado de Assis, historiador. São Paulo: Companhia das Letras, 2003., Machado de Assis chefiou a seção de meados de 1870 até fins da década de 1880. Os principais assuntos tratados pela seção eram política de terras e escravidão.
  • 13
    No âmbito da historiografia econômica, encontramos menções a hipotecas de escravos nos estudos: Marcondes (2017)MARCONDES, Renato Leite. Hipotecas, mudanças institucionais e o Banco do Brasil na segunda metade do século XIX. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE HISTÓRIA ECONÔMICA, 12; CONFERÊNCIA INTERNACIONAL DE HISTÓRIA DE EMPRESAS, 13, 2017, Niterói. Anais . Niterói: ABPHE, 2017, p. 1-20., Melo (2015)MELO, Keila Cecília. Senhores e possuidores: estrutura fundiária, unidades rurais pró-indiviso e o mercado de terras em Minas Gerais: São José do Rio das Mortes, c.1830 a c.1856. Dissertação de mestrado em História, Universidade Federal de São João del-Rei, São João del-Rei, 2015. Disponível em: <https://bit.ly/2MK3rvp>. Acesso em: 14/07/2018.
    https://bit.ly/2MK3rvp...
    , Schulz (2013)SCHULZ, John. A crise financeira da abolição. Tradução de Denis Augusto Fracalossi 2ª edição. São Paulo: Edusp, 2013., Flausino (2006)FLAUSINO, Camila Carolina. Negócios da escravidão: tráfico interno de escravos em Mariana, 1850-1886. Dissertação de mestrado em História, Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, 2006.. Flausino estuda o mercado de compra e venda de escravos em Mariana (MG), mas acaba por estender seu estudo para abordar secundariamente o mercado de hipotecas com escravos como garantia, considerando a composição da escravaria nos contratos.
  • 14
    Os períodos selecionados para o estudo são 1825-1829/ 1834-1839/1841-1846/1853-1868. Kilbourne (1995, p. 13-14)KILBOURNE, Richard Holcombe. Debt, investment, slaves: credit relations in East Feliciana Parish, Louisiana, 1825-1885. Tuscaloosa: The University of Alabama Press, 1995. pesquisou também vendas de escravos e de terras para anos examinados: 1847, 1850, 1853, 1856 e 1859, completando sua pesquisa sobre a natureza do mercado de terras e de escravos.
  • 15
    Características do imóvel dado em garantia da Escritura Pública de Hipoteca, nº de ordem 169, datada de 31/08/1871, Livro 11, p. 52v. S3, IH, L11, 1868-1875. Essa fazenda-engenho pertenceu ao Padre Diogo Antonio Feijó que a adquiriu em 1809. Depois do falecimento do regente Feijó, foi vendida, em 1843, para Joaquim José dos Santos Camargo, pai de Pedro José dos Santos Camargo. Em 1875, Pedro José dos Santos Camargo vendeu-a a Eliseu Leite de Barros e José de Sousa Siqueira e, mais tarde, passou para Pedro Américo de Camargo Andrade (PUPO, 1983, p. 128, 202).
  • 16
    Art. 140, parágrafo 2ª do Decreto nº. 3.453, de 26 de abril de 1865 (BRASIL, 1865BRASIL. Decreto nº 3.453, de 26 de abril de 1865. Manda observar o Regulamento para execução da Lei nº 1237 de 24 de Setembro de 1854, que reformou a legislação hypothecaria. In: BRASIL. Collecção das Leis do Imperio do Brasil de 1865, vol. 1, parte 2. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1865, p. 152-167. Disponível em: <https://bit.ly/2LacliI>. Acesso em: 08/01/2018.
    https://bit.ly/2LacliI...
    ).
  • 17
    Cf. estudos de Bianconi, Renata (2002)BIANCONI, Renata. Dinâmica econômica e formas de sociabilidade: aspectos da diversificação das atividades urbana em Campinas (1870-1905). Dissertação de mestrado em Economia, Universidade Estadual de campinas, Campinas, 2002., Camillo (1998)CAMILLO, Ema E. R. Guia histórico da indústria nascente em Campinas (1850-1897). Campinas: Mercado de Letras: Centro de Memória Unicamp, 1998., Galzerani (2016)GALZERANI, Maria Carolina Bovério. O almanaque, a locomotiva da cidade moderna: campinas, décadas de 1870-1880. Campinas: CMU Publicações, 2016., Hadler (2007)HADLER, Maria Silvia Duarte Trilhos de modernidade: memória e educação urbana dos sentidos. Tese doutorado em Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2007., LAPA (1996)LAPA, José Roberto do Amaral. A cidade: os cantos e os antros: Campinas: 1850-1900. São Paulo: Edusp, 1996. e Pupo (1969)PUPO, Celso Maria de Mello. Campinas, seu berço e juventude. Campinas: Academia Campinense de Letras, 1969. (Publicações da Academia Campinense de Letras, vol. 20)..
  • 18
    A localização das escrituras originais depende de uma busca junto aos cartórios de notas de Campinas, que faremos na próxima etapa, por ora nossa pesquisa se concentra nos livros disponíveis no CMU.
  • 19
    Esses dados se referem ao livro de inscrição de hipotecas que utilizamos. Nas escrituras originais, necessariamente, os escravos deveriam estar nominados de forma completa, como determinava a lei. Depois da instituição da matrícula, em 1871, a obrigação tornou-se mais imperiosa, pois escravo sem matrícula era livre. Talvez o escrivão fosse descuidado ou, por falta de tempo ou preguiça, não copiava o documento original na íntegra.
  • 20
    Na maioria das províncias do Brasil, o Recenseamento Geral do Império foi realizado em 1872. Entretanto, na província de São Paulo foi feito em 30 de janeiro de 1874. Para efeitos de referência, vamos denominá-lo de Recenseamento de 1872, porém sabemos que os dados se referem ao ano de 1874.
  • 21
    Empregamos a tipologia utilizada por Ricardo Salles, que distinguiu cinco grandes grupos de proprietários em Vassouras com base nos tamanhos de plantéis de escravos, segundo as informações extraídas dos inventários post-mortem, entre 1821 e 1880 (SALLES, 2008SALLES, Ricardo. E o Vale era o escravo: Vassouras, século XIX: senhores e escravos no coração do Império. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008., p. 155-163).

Fontes

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    Editado por

    Editores responsáveis pela publicação: Júlio Pimentel Pinto e Flavio de Campos

    Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Jul 2020
    • Data do Fascículo
      2020

    Histórico

    • Recebido
      13 Dez 2018
    • Aceito
      29 Jul 2019
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