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Qualidade de vida de mulheres acometidas por câncer de mama localmente avançado ou metastático

RESUMO

Objetivos:

Identificar os principais domínios de qualidade de vida afetados em mulheres com câncer de mama localmente avançado ou metastático hospitalizadas; e analisar a associação entre o nível de qualidade de vida e o estadiamento do câncer.

Método:

Estudo transversal, quantitativo, realizado no Rio de Janeiro, Brasil, entre março e julho de 2017. Entrevistaram-se 199 mulheres. Aplicou-se o European Organization for Research and Treatment of Cancer Quality of Life Questionnarie Core 30, com análise no Statistical Package for the Social Sciences e teste Kruskal-Wallis.

Resultados:

A média do status de saúde global foi 32,04. Na escala funcional, o funcionamento cognitivo teve maior média (60,47) e o desempenho pessoal a menor média (12,48). A fadiga apresentou maior média (69,57). O status de saúde global e a escala funcional (exceto social) reduziram seus escores à medida que o estadiamento avançava.

Conclusão:

O estadiamento do câncer interferiu na qualidade de vida dessas mulheres.

Palavras-chave:
Neoplasias da mama; Qualidade de vida; Cuidados paliativos; Perfil de saúde

ABSTRACT

Objectives:

To identify the main affected domains of quality of life of hospitalized women with locally advanced or metastatic breast cancer; and to analyze the association between the level of quality of life and stage of cancer.

Method:

This was a cross-sectional quantitative, study conducted in Rio de Janeiro, Brazil, between March and July 2017. Interviews were performed with 199 women. The researchers administered the European Organization for Research and Treatment of Cancer Quality of Life Questionnaire Core 30, with analysis using the Statistical Package for the Social Sciences software and the Kruskal-Wallis test.

Results:

Mean global health status was 32.04. On the functional scales, cognitive functioning scored the highest (60.47), while role functioning scored the lowest (12.48). Fatigue presented the highest mean (69.57). The scores for global health status and the functional scales (with the exception of the social functioning) decreased as staging progressed.

Conclusion:

The stage of cancer affects the quality of life of the studied sample of women.

Keywords:
Breast neoplasms; Quality of life; Palliative care; Health profile

RESUMEN

Objetivos:

Identificar los dominios de calidad de vida afectados en mujeres hospitalizadas con cáncer de mama localmente avanzado o metastásico; analizar la asociación entre el nivel de calidad de vida y la estadificación del cáncer.

Método:

Estudio cuantitativo transversal realizado en Río de Janeiro, entre marzo y julio de 2017. 199 mujeres fueron entrevistadas. Se aplicó el European Organization for Research and Treatment of Cancer Quality of Life Questionnarie Core 30, para análisis el Statistical Package for the Social Sciences y la prueba Kruskal-Wallis.

Resultados:

El estado de salud global promedio fue 32.04. El funcionamiento cognitivo tuvo el promedio más alto (60.47) y el desempeño personal más bajo (12.48). Fatiga presentó el promedio más alto (69.57). El estado de salud global y la escala funcional (excepto social) redujeron sus puntajes a medida que avanzaba la estadificación.

Conclusión:

La estadificación del cáncer interfirió con la calidad de vida de estas mujeres.

Palabras clave:
Neoplasias de la mama; Calidad de vida; Cuidados paliativos; Perfil de salud

INTRODUÇÃO

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), qualidade de vida (QV) relaciona-se com a percepção que a pessoa tem de si mesma, da sua posição na vida de acordo com o contexto cultural e valores nos quais ela vive e em relação as suas metas, expectativas e preocupações11. World Health Organization (CH). WHOQoL Measuring quality of life. Geneva: WHO; 1997 [cited 2018 Jan 12]. Available from: Available from: https://www.who.int/mental_health/media/68.pdf
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. Trata-se de uma informação subjetiva, mas que tem sido trabalhada em pesquisas quantitativas para entendimento das relações/associações entre fatores externos e internos à pessoa e sua pior ou melhor QV22. Müller V, Nabieva N, Häberle L, Taran FA, Hartkopf AD, Volz B, et al. Impact of disease progression on health-related quality of life in patients with metastatic breast cancer in the PRAEGNANT breast cancer registry. Breast. 2018;37:154-60. doi: https://doi.org/10.1016/j.breast.2017.08.008
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-44. Freire MEM, Sawada NO, França ISX, Costa SFG, Oliveira CDB. Health-related quality of life among patients with advanced cancer: an integrative review. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(2):357-67. doi: https://doi.org/10.1590/S0080-6234201400002000022
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. Diante deste conceito, apreende-se que o câncer de mama compromete a QV das mulheres em todas as esferas das suas vidas.

Ao se tratar das variáveis relacionadas à fase da doença e ao seu tratamento, estudos revelam que há impacto negativo na QV das mulheres com câncer de mama se estiverem em estadios mais avançados, manifestando algum sintoma físico, especialmente gastrointestinais, e/ou psicossociais, ainda que em tratamentos anticâncer, mesmo com objetivos paliativos22. Müller V, Nabieva N, Häberle L, Taran FA, Hartkopf AD, Volz B, et al. Impact of disease progression on health-related quality of life in patients with metastatic breast cancer in the PRAEGNANT breast cancer registry. Breast. 2018;37:154-60. doi: https://doi.org/10.1016/j.breast.2017.08.008
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,55. Sawada NO, Nicolussi AC, Paula JM, Caro MPG, Garcia CM, Quintana FC. Quality of life of Brazilian and Spanish cancer patients undergoing chemotherapy: an integrative literature review. Rev Latino-Am Enfermagem. 2016;24:e2688. doi: https://doi.org/10.1590/1518-8345.0564.2688
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.

O estadiamento clínico das mulheres com câncer de mama é baseado na história e avaliação clínica, nos exames de imagem e na biópsia, variando de acordo com a classificação TNM (T = tumor, N = linfonodos e M = metástase); tipo histológico do tumor; grau de diferenciação (grau I - carcinoma bem diferenciado; grau II - moderadamente diferenciado; grau III - pouco diferenciado); e com a expressão dos receptores hormonais: Human Epidermal Growth Factor Receptor-2 (HER2), de estrogênio e progesterona. O estadiamento mais inicial é 0 (carcinoma in situ - Tis) e o mais avançado é IV, e as demais classificações (I, II e III), com suas subdivisões, dependem das variadas combinações desses fatores66. American Joint Committee on Cancer. AJCC Cancer Staging Manual. Chicago: American College of Surgeons; 2018 [cited 2019 Nov 10]. Available from: Available from: https://cancerstaging.org/references-tools/deskreferences/Documents/AJCC%20Cancer%20Staging%20Form%20Supplement.pdf
https://cancerstaging.org/references-too...
.

O câncer de mama localmente avançado compreende os casos em que a massa tumoral no diagnóstico é grande (>5cm), ou pode ser de qualquer tamanho invadindo estruturas adjacentes e/ou linfonodos, ou seja, a partir do estadiamento clínico IIB. Uma vez que outras partes do corpo são afetadas pelas células do tumor primário da mama, considera-se câncer de mama metastático (estadiamento IV). Assim, o estadiamento IV caracteriza-se pela presença de metástase (M1), independentemente dos demais fatores77. Simos D, Clemons M, Ginsburg OM, Jacobs C. Definition and consequences of locally advanced breast cancer. Curr Opin Support Palliat Care. 2014 [2018];8(1):33-8. doi: https://doi.org/10.1097/SPC.0000000000000020
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.

O comprometimento da QV de mulheres com câncer de mama relaciona-se às manifestações da doença e aos seus tratamentos, incluindo a quimioterapia, a radioterapia, a cirurgia e a hormonioterapia, que podem causar e/ou exacerbar efeitos colaterais e distúrbios psicossociais. A depender do tratamento implementado e da fase da doença, a mulher pode ter sua QV afetada, por exemplo, em decorrência de dor, náuseas, vômitos, fadiga, insônia, queda de cabelo, linfedema, depressão, mutilação, presença de feridas e medo da morte88. Çömez A, Karayurt Ö. We as spouses have experienced a real disaster!: a qualitative study of women with breast cancer and their spouses. Cancer Nurs. 2016;39(5):E19-E28. doi: https://doi.org/10.1097/NCC.0000000000000306
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Para prestação do cuidado integral e humanitário são relevantes embasamentos científicos que permitam conhecer e avaliar a QV dessas mulheres, de modo a guiar o desenvolvimento de comportamentos saudáveis, resiliência e ajustamento à doença.

Assim, apresenta-se a seguinte questão norteadora: o estadiamento do câncer interfere na QV de mulheres com câncer de mama localmente avançado ou metastático?

Objetivou-se identificar os principais domínios de QV relacionada à saúde afetados em mulheres com câncer de mama localmente avançado ou metastático hospitalizadas; e analisar a associação entre o nível de QV e o estadiamento do câncer nesta população.

MÉTODO

Estudo transversal, quantitativo, oriundo de dissertação de mestrado99. Lima EOL. Qualidade de vida de mulheres acometidas por câncer de mama localmente avançado ou metastático [dissertação]. Rio de Janeiro (RJ): Universidade Federal do Rio de Janeiro; 2018 [cited 2019 Nov 10]. Available from: Available from: http://objdig.ufrj.br/51/teses/870115.pdf
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, realizado em um Centro de Referência de Alta Complexidade em Oncologia, no Rio de Janeiro, Brasil. Este centro possui cinco unidades conforme as especialidades. O estudo foi realizado na unidade hospitalar especializada no tratamento e controle do câncer de mama, no setor de Internação Clínica (IC), que disponibiliza 26 leitos distribuídos em sete enfermarias.

A população do estudo foi composta por mulheres com câncer de mama hospitalizadas nestas enfermarias no período entre março e julho de 2017, totalizando 289 pacientes. A partir da aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, operacionalizada por meio da consulta aos prontuários, todas as mulheres elegíveis foram entrevistadas, ou seja, 199 mulheres. Este número foi superior ao da amostra de 180 mulheres resultante do teste Anova, que considerou como estimativa a população de 383 mulheres hospitalizadas no segundo semestre de 2016.

Foram critérios de inclusão: mulheres com idade igual ou maior a 18 anos, com câncer de mama localmente avançado, ou seja, em estadiamentos clínicos IIB e III (A, B e C), devido à grande capacidade de desenvolvimento de metástases, e com metástase comprovada, ou seja, no estadiamento IV.

Foram critérios de exclusão: mulheres com confusão mental ou prostração e comprometimento cognitivo afetando a capacidade de leitura e compreensão; cujo tumor primário não foi na mama; com qualquer fator limitante, como dor, após três tentativas de abordagem no período de coleta de dados; que não estavam com o prontuário médico no momento da entrevista ou que realizaram o tratamento inicial fora da referida instituição. Especifica-se que a avaliação da confusão mental e do comprometimento cognitivo se deu por meio de leitura de prontuário e consulta aos membros da equipe de saúde.

Das 90 pacientes que não participaram da pesquisa 74% apresentaram quadro de confusão mental ou prostração; 9% recusaram-se a participar; 6% o tumor primário não estava localizado na mama; 4% a doença estava em estadio I (A e B) ou IIA, que apesar da evolução pouco previsível, de forma geral, apresenta tumor de alto grau histológico, com ausência de receptores hormonais; 4% realizaram o tratamento inicial em outra instituição, e 2% não estavam com o prontuário.

Para a produção dos dados foi realizada entrevista com aplicação do European Organization for Research and Treatment of Cancer Quality of Life Questionnarie Core 30 (EORTC QLQ-C30), versão 3.0, validado no Brasil1010. Michels FA, Latorre MR, Maciel MS. Validity, reliability and understanding of the EORTC-C30 and EORTC-BR23, quality of life questionnaires specific for breast cancer. Rev Bras Epidemiol. 2013 [cited 2017 Nov 11];16(2):352-63. doi: https://doi.org/10.1590/S1415-790X2013000200011
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. Trata-se do instrumento de QV relacionado à saúde mais utilizado nas pesquisas, com bons índices de validade, reprodutibilidade e compreensão55. Sawada NO, Nicolussi AC, Paula JM, Caro MPG, Garcia CM, Quintana FC. Quality of life of Brazilian and Spanish cancer patients undergoing chemotherapy: an integrative literature review. Rev Latino-Am Enfermagem. 2016;24:e2688. doi: https://doi.org/10.1590/1518-8345.0564.2688
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,1010. Michels FA, Latorre MR, Maciel MS. Validity, reliability and understanding of the EORTC-C30 and EORTC-BR23, quality of life questionnaires specific for breast cancer. Rev Bras Epidemiol. 2013 [cited 2017 Nov 11];16(2):352-63. doi: https://doi.org/10.1590/S1415-790X2013000200011
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O módulo suplementar para avaliação da QV em pacientes com câncer de mama (EORTC-BR23) não foi utilizado nesta pesquisa, pois devido às condições clínicas das mulheres durante a hospitalização, bem como à dinâmica e rotinas do próprio cenário, foi preciso gerenciar o tempo das entrevistas e focar nos aspectos gerais contemplados nas funções do questionário EORTC QLQ-C30. Destaca-se que a especificidade do EORTC-BR23 se concentra nas questões relacionadas à imagem corporal e à sexualidade.

O questionário EORTC QLQ-C30 foi produzido pela EORTC, originalmente na língua inglesa, sendo realizada a tradução para o português do Brasil pela própria instituição. Sua obtenção, em sítio eletrônico da EORTC é gratuita considerando o uso para fins acadêmicos. Contém 30 perguntas, sendo multidimensional, com o objetivo de avaliar a QV relacionada à saúde. É dividido em três dimensões: escala funcional (funcionamento físico, desempenho pessoal, emocional, cognitivo e social), escala de sintomas (fadiga, náuseas e vômitos, dor, dispnéia, insônia, perda de apetite, constipação, diarreia e dificuldade financeira) e QV geral. As respostas são apresentadas em forma de escala Likert para as escalas funcional e de sintomas: 1 - não, 2 - pouco, 3 - moderadamente e 4 - muito. Já a escala de QV geral é avaliada de 1 a 7, em que 1 é péssima e 7 é ótima QV.

As entrevistas foram realizadas em uma sala independente, privativa e livre de ruídos, ou nas próprias enfermarias, a depender da preferência e condição de locomoção da mulher. Foi respeitada a vontade da mulher no que diz respeito à presença ou ausência do seu acompanhante no momento da entrevista.

Os dados foram codificados e analisados com o auxílio do programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 24. E as pontuações do questionário EORTC QLQ-C30 foram calculadas de acordo com as regras estabelecidas pelo manual da EORTC, com intervalo de 0 a 100, onde escores baixos indicam pior QV e escores mais elevados sugerem melhor QV para a escala funcional e de QV geral. Já para a escala de sintomas, maiores escores indicam maior sintomatologia, consequentemente, pior QV.

Na análise dos resultados foram identificados os principais domínios de QV afetados. Para efetuar a comparação das três populações de cada fase de estadiamento (II, III e IV) foi proposta a realização de testes de hipóteses para mais de duas populações, nos quais valores de p<0,05 (nível de significância estabelecido) foram considerados como significativos.

Para a verificação da pré-suposição de normalidade dos dados que possibilitaria a utilização de testes paramétricos, foi realizado o teste de Shapiro-Wilk, além da análise gráfica por histogramas. Porém, a hipótese de normalidade foi rejeitada ao avaliar todas as escalas do questionário. Assim, para tal comparação, optou-se pela abordagem não paramétrica, pois foi conferido que os dados não atendiam tal exigência.

Para avaliar a questão norteadora de que houve interferência do estadiamento do câncer na QV dessas mulheres foi realizado o teste de Kruskal-Wallis. Com a finalidade de saber quais dessas populações apresentavam funções de distribuições diferentes, utilizou-se uma extensão deste teste, chamado de teste de comparações múltiplas com Kruskal-Wallis.

Foram respeitados os princípios éticos da pesquisa com seres humanos, de acordo com a Resolução nº 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa das instituições proponente e coparticipante em março de 2017, com os respectivos certificados de apresentação para apreciação ética: 63765417.5.0000.5238 e 63765417.5.3001.5274. As participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, e os questionários não foram identificados.

RESULTADOS

Os resultados da aplicação do questionário EORTC QLQ-C30 estão na tabela 1. No status de saúde global observou-se a média de 32,04 e desvio padrão de 20,87 em torno dessa média, apresentando, assim, uma maior concentração de resultados abaixo da metade da escala. Nota-se que o valor máximo foi de 91,67, o que indica que nenhuma das mulheres apresentou QV em sua pontuação máxima da escala.

Ao analisar a escala funcional, observa-se que o domínio de maior valor médio foi a do funcionamento cognitivo (60,47), apresentando também o maior desvio padrão em torno da média (33,43), demostrando uma maior dispersão de resultados. Nota-se, também, que os domínios de desempenho pessoal (12,48) e físico (27,67) apresentaram os menores valores da escala funcional, sugerindo serem as funções mais afetadas. O desvio padrão da escala de desempenho pessoal foi o menor (22,14), indicando maior concentração em torno da média.

Na escala de sintomas, podem-se observar valores de médias mais elevadas para fadiga (69,57), dificuldades financeiras (69,01) e dor (67,42). Porém, a dificuldade financeira apresentou o maior desvio padrão (38,85).

Dispneia (42,38), insônia (47,40) e perda de apetite (53,10) apresentaram desvio padrão em torno da média elevado, indicando que, apesar de médias mais baixas, algumas mulheres são bastante afetadas por tais sintomas.

Destaca-se que em todos os domínios da escala funcional e da escala de sintomas há pontuações nas extremidades mínima (0,00) e máxima (100,00).

Tabela 1 -
Estatísticas descritivas do questionário EORTC QLQ-C30. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2017

Após analisar como se distribuem os dados referentes aos principais domínios de QV afetados nesta população, faz-se necessário observar como esses valores se distribuem em relação às fases de estadiamento atual da doença. Para isso, é importante salientar que das 199 mulheres entrevistadas, 145 estavam na fase de estadiamento atual IV, enquanto 31 mulheres estavam na fase de estadiamento III, e 23 no estadiamento II.

Conforme observado no gráfico 1, em relação ao status global de saúde, nota-se que a média diminuiu de acordo com o avanço do estadiamento da doença, apresentando as seguintes médias: estadiamento II - 41,30, estadiamento III - 36,02, e estadiamento IV - 29,71.

Gráfico 1 -
Resultados da qualidade de vida global e da escala funcional por estadiamento da doença atual. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2017 Fonte: Dados da pesquisa, 2017.

Ao se analisar a escala funcional, observa-se que a média das funções cognitiva e social foram as que obtiveram as maiores pontuações para todas as fases de estadiamento. Embora com escores mais elevados em comparação com os demais domínios da escala funcional, de acordo com o avanço do estadiamento da doença as pontuações diminuem.

Em contrapartida, a escala de desempenho pessoal foi a que obteve a menor pontuação em todas as fases de estadiamento. Mas, ressalta-se que o estadiamento III obteve uma maior pontuação em relação aos demais, não apresentando a mesma tendência dos demais domínios da escala funcional.

Para esclarecer este fato foi realizada uma análise mais aprofundada do desempenho pessoal, observando a pontuação individual de cada mulher para este domínio. Uma possível razão para este domínio não ter seguido a tendência dos demais, ou seja, diminuir o escore de acordo com o pior estadiamento atual da doença, é a presença de outliers, pois detectou-se que três mulheres que se encontravam na fase de estadiamento III apresentaram pontuações altas (100, 83,3 e 83,3).

Para verificar tal hipótese, foi realizada uma análise associando o estadiamento atual com o desempenho pessoal excluindo-se essas três mulheres, o que manteve o comportamento deste domínio fora da tendência dos demais, ou seja, a pontuação média da escala de desenvolvimento pessoal no estadiamento III continuou sendo maior que a do estadiamento II (Gráfico 2).

Em relação à escala de sintomas verifica-se que os três domínios que obtiveram as maiores médias foram a fadiga, dificuldade financeira e dor. As ordens de colocação variaram de acordo com a fase de estadiamento da doença. Nos estadiamentos II e IV, as maiores médias foram, respectivamente, fadiga, dificuldade financeira e dor; enquanto no estadiamento III as maiores médias foram dificuldade financeira, dor e fadiga (Gráfico 3).

A associação entre o nível de QV relacionada à saúde e a interferência do estadiamento do câncer nesta população pode ser observada nos gráficos 1 e 3, bem como na tabela 2. Observa-se que há piora da QV e da escala funcional, além de um aumento dos níveis de sintoma das mulheres com o estadiamento da doença atual mais avançado.

Gráfico 2 -
Desempenho pessoal das 28 mulheres no estadiamento III. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2017

Gráfico 3 -
Resultados da escala de sintomas por estadiamento da doença atual. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2017

A tabela 2 traz os resultados do teste de Kruskal-Wallis para testar a hipótese nula de que todas as populações possuem funções de distribuição iguais contra a hipótese alternativa de que ao menos duas das populações possuem funções de distribuição diferentes. O nível de significância estabelecido foi o valor p < α = 0,05.

Afirma-se que existem evidências estatísticas para rejeitar a hipótese de que o status global de saúde não apresenta diferenças de acordo com a fase de estadiamento da doença. Na escala funcional a hipótese nula foi rejeitada para quase todos os domínios, exceto para o funcionamento social. Entretanto, nota-se claramente, que tanto suas medianas quanto os intervalos interquartis de 25% e 75% decrescem conforme avança o estadiamento da doença.

E por fim, para a escala sintomática obteve-se um valor p maior do que o nível de significância estabelecido, portanto não estatisticamente significantes para afirmar que a fase de estadiamento da doença é um fator que influencia seus domínios.

Tabela 2 -
Medianas das escalas do questionário EORTC QLQ-C30 separadas por fase de estadiamento atual da doença. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2017

DISCUSSÃO

Em relação ao status global de saúde das 199 mulheres, observou-se a média de 32,04 e mediana de 33,33. Algumas mulheres apresentaram pontuação 0, porém a máxima foi de 91,67, evidenciando que nenhuma das mulheres apresentou QV relacionada à saúde em sua pontuação máxima da escala; e os seus domínios manifestaram-se com intensidade variada44. Freire MEM, Sawada NO, França ISX, Costa SFG, Oliveira CDB. Health-related quality of life among patients with advanced cancer: an integrative review. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(2):357-67. doi: https://doi.org/10.1590/S0080-6234201400002000022
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Na Alemanha, ao avaliar a QV de mulheres com câncer de mama metastático que realizavam quimioterapia paliativa, porém, ambulatorialmente, verificou-se que o status global de saúde foi, em média, 56,41111. Puetzler J, Feldmann Jr. RE, Brascher AK, Gerhardt A, Benrath J. Improvements in health-related quality of life by comprehensive cancer pain therapy: a pilot study with breast cancer outpatients under palliative chemotherapy. Oncol Res Treat. 2014;37(9):456-62. doi: https://doi.org/10.1159/000365537
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. Resultado similar foi encontrado em estudo também realizado na Alemanha que comparou a QV de pacientes com câncer de mama sem progressão e com progressão da doença; foi verificado que o status global de saúde das mulheres com progressão foi inferior, 52,2 comparado com 56,822. Müller V, Nabieva N, Häberle L, Taran FA, Hartkopf AD, Volz B, et al. Impact of disease progression on health-related quality of life in patients with metastatic breast cancer in the PRAEGNANT breast cancer registry. Breast. 2018;37:154-60. doi: https://doi.org/10.1016/j.breast.2017.08.008
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O contexto de realização das pesquisas supracitadas, muitas vezes relacionado ao perfil de saúde das mulheres e às diferenças socioeconômicas, culturais e ambientais gerais entre Brasil e Alemanha, pode influenciar na divergência de valores atribuídos ao status global de saúde, uma vez que, na Alemanha, os resultados foram significativamente superiores ao da presente pesquisa. Além disso, as estatísticas apontam maior taxa de mortalidade por câncer de mama em países em desenvolvimento econômico, como o Brasil, indicando atraso no diagnóstico, deficiências na caracterização dos fatores prognósticos, e pior QV no curso da doença33. Edib Z, Kumarasamy V, Abdullah NB, Rizal AM, Al-Dubai SAR. Most prevalent unmet supportive care needs and quality of life of breast cancer patients in a tertiary hospital in Malaysia. Health Qual Life Outcomes. 2016;14:26. doi: https://doi.org/10.1186/s12955-016-0428-4
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Infere-se que, na hospitalização as mulheres possam apresentar piora do status global de saúde devido às diferentes indicações, que na prática clínica estão relacionadas à exacerbação de sinais e sintomas por progressão da doença e/ou toxicidade da terapêutica realizada. Pacientes que apresentam metástase, maioria da amostra deste estudo, manifestam com maior intensidade sintomas como fadiga, náuseas e vômitos, dispneia, e perda de apetite, com impacto negativo na QV22. Müller V, Nabieva N, Häberle L, Taran FA, Hartkopf AD, Volz B, et al. Impact of disease progression on health-related quality of life in patients with metastatic breast cancer in the PRAEGNANT breast cancer registry. Breast. 2018;37:154-60. doi: https://doi.org/10.1016/j.breast.2017.08.008
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Estudo realizado no nordeste do Brasil, verificou o status global de saúde de 76,14, porém, 43,4% das mulheres investigadas não tinham realizado nenhum outro tratamento a não ser a quimioterapia com objetivo neoadjuvante. Os autores relatam que a maioria das mulheres não apresentou confinamento em cama, e não necessitou de ajuda para as atividades de vida diárias, e, ainda, a condição física e o tratamento não interferiram na vida familiar1212. Lôbo SA, Fernandes AFC, Almeida PC, Carvalho CML, Sawada NO. Quality of life in women with breast cancer undergoing chemotherapy. Acta Paul Enferm. 2014 ;27(6):554-9. doi: https://doi.org/10.1590/1982-0194201400090
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Assim, mulheres com câncer de mama avançado hospitalizadas encontram-se mais debilitadas. O presente estudo evidenciou que o estadiamento do câncer interferiu na QV dessas mulheres, tendo as médias do status global de saúde se comportado da seguinte forma de acordo com o estadiamento atual da doença: estadiamento II = 41,30; estadiamento III = 36,02; e estadiamento IV = 29,71.

Assim, a doença avançada representou impacto negativo na QV relacionada à saúde. Quanto mais avançado o estadiamento do câncer de mama no diagnóstico, conjugado com o comprometimento dos desempenhos pessoal, físico e emocional, maiores são as possibilidades de a mulher ter pior QV33. Edib Z, Kumarasamy V, Abdullah NB, Rizal AM, Al-Dubai SAR. Most prevalent unmet supportive care needs and quality of life of breast cancer patients in a tertiary hospital in Malaysia. Health Qual Life Outcomes. 2016;14:26. doi: https://doi.org/10.1186/s12955-016-0428-4
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A função cognitiva apresentou maior valor médio (60,47), o que representa preservação da memória e da capacidade de concentração para atividades de lazer. Já o desempenho pessoal foi o que apresentou menor valor médio (12,48), sendo a função mais comprometida. O funcionamento emocional foi o domínio que obteve a terceira maior pontuação (37,7). Destaca-se que 74,37% das mulheres tinham até cinco dias de internação no momento da entrevista, e as perguntas do questionário se relacionam à percepção da mulher acerca do seu estado emocional, se nervosa ou deprimida, o que pode potencializar com a recente hospitalização.

Apesar do funcionamento emocional ter apresentado um escore baixo, trata de questões muitas vezes negligenciadas, seja pelo auto relato da mulher ou pela equipe de saúde no delineamento das condutas, e que podem refletir na pior QV33. Edib Z, Kumarasamy V, Abdullah NB, Rizal AM, Al-Dubai SAR. Most prevalent unmet supportive care needs and quality of life of breast cancer patients in a tertiary hospital in Malaysia. Health Qual Life Outcomes. 2016;14:26. doi: https://doi.org/10.1186/s12955-016-0428-4
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Os desempenhos pessoal (12,48) e físico (27,67) foram os domínios com maior comprometimento. O desempenho pessoal foi avaliado com base na realização de atividades diárias e de trabalho, bem como na prática de hobby ou lazer. A percepção acerca da realização dessas atividades pode estar relacionada às limitações impostas pelo contexto hospitalar, e acima de tudo, pelo motivo da internação.

A ocupação é uma estratégia importante para manutenção da QV, em decorrência da sua estreita relação com o desempenho pessoal1313. Brekke MF, la Cour K, Brandt Å, Peoples H, Wæhrens EE. The association between ADL ability and quality of life among people with advanced cancer. Occup Ther Int. 2019:2629673. doi: https://doi.org/10.1155/2019/2629673
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. Uma vez que 72,86% das mulheres estavam no estadiamento atual IV, é preciso realinhar os objetivos terapêuticos de modo a contribuir para formação da QV percebida pela mulher, a partir da intensificação dos cuidados paliativos para aumentar as possibilidades da mulher realizar as atividades de vida diárias com autonomia e dignidade, de receber um cuidado integral, seja no domicílio ou na internação, e assim, promover QV44. Freire MEM, Sawada NO, França ISX, Costa SFG, Oliveira CDB. Health-related quality of life among patients with advanced cancer: an integrative review. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(2):357-67. doi: https://doi.org/10.1590/S0080-6234201400002000022
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Na escala funcional, ao realizar o teste de Kruskal-Wallis comparando os três estadiamentos foi observado que existem evidências estatísticas para afirmar que as escalas de funcionamento físico, desempenho pessoal, emocional e cognitivo apresentam diferença significante com valor p < α = 0.05, conforme a doença avança.

Ao analisar a escala sintomática das 199 mulheres observa-se que as três escalas que obtiveram as maiores médias foram a fadiga (69,57), dificuldade financeira (69,01) e dor (67,42). O sintoma que apresentou menor média foi a diarreia (8,21), porém existem indivíduos da amostra que apresentaram pontuação 100 neste sintoma.

A fadiga é um sintoma importante relacionado ao câncer que interfere na QV, evidenciada em outro estudo como o de maior destaque na escala sintomática, com escore de 51,9(11). Sobre a relação entre QV e fadiga relacionada ao câncer, níveis mais elevados de fadiga nessas situações estão associados com uma menor QV global1212. Lôbo SA, Fernandes AFC, Almeida PC, Carvalho CML, Sawada NO. Quality of life in women with breast cancer undergoing chemotherapy. Acta Paul Enferm. 2014 ;27(6):554-9. doi: https://doi.org/10.1590/1982-0194201400090
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,1414. Fabi A, Falcicchio C, Giannarelli D, Maggi G, Cognetti F, Pugliese P. The course of cancer related fatigue up to ten years in early breast cancer patients: what impact in clinical practice? Breast. 2017;34:44-52. doi: https://doi.org/10.1016/j.breast.2017.04.012
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A fadiga é um sintoma multifatorial e subjetivo, envolve não apenas aspectos biológicos, mas também cognitivos e psicológicos. É o sintoma mais frequente em mulheres com câncer de mama, mas pouco se conhece sobre seus mecanismos44. Freire MEM, Sawada NO, França ISX, Costa SFG, Oliveira CDB. Health-related quality of life among patients with advanced cancer: an integrative review. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(2):357-67. doi: https://doi.org/10.1590/S0080-6234201400002000022
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,1414. Fabi A, Falcicchio C, Giannarelli D, Maggi G, Cognetti F, Pugliese P. The course of cancer related fatigue up to ten years in early breast cancer patients: what impact in clinical practice? Breast. 2017;34:44-52. doi: https://doi.org/10.1016/j.breast.2017.04.012
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-1616. Chan RJ, Yates P, McCarthy AL. The development and preliminary testing of an instrument for assessing fatigue self-management outcomes in patients with advanced cancer. Cancer Nurs. 2017;40(1):48-57. doi: https://doi.org/10.1097/NCC.0000000000000347
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Ao analisar a fadiga isoladamente verifica-se que foi o sintoma que obteve a maior pontuação de média nas mulheres com estadiamento IV (70,88). Estudos apontam estreita relação entre fadiga e pior QV, devido, principalmente, à maior dependência de outras pessoas para os cuidados diários, desamino e fraqueza44. Freire MEM, Sawada NO, França ISX, Costa SFG, Oliveira CDB. Health-related quality of life among patients with advanced cancer: an integrative review. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(2):357-67. doi: https://doi.org/10.1590/S0080-6234201400002000022
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O escore da náusea e vômito foi 34,0. Infere-se que se deve aos efeitos colaterais dos tratamentos realizados, ao estadiamento avançado da doença e suas alterações metabólicas, além do próprio processo de hospitalização com mudança da alimentação, por exemplo, que passa a ser substituída pela alimentação do hospital. Estes sintomas comprometem o bem-estar físico e aumentam ainda mais a sensação de fraqueza55. Sawada NO, Nicolussi AC, Paula JM, Caro MPG, Garcia CM, Quintana FC. Quality of life of Brazilian and Spanish cancer patients undergoing chemotherapy: an integrative literature review. Rev Latino-Am Enfermagem. 2016;24:e2688. doi: https://doi.org/10.1590/1518-8345.0564.2688
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Destaca-se que, o segundo valor de médias mais elevadas foi o que se refere às dificuldades financeiras (69,01). O complexo processo de tratamento e o gerenciamento de todos os problemas que podem surgir no curso da doença, como manifestação de sintomas, efeitos colaterais, necessidade de hospitalização, podem afetar a condição financeira. Apesar dos dados terem sido coletados em uma instituição pública de saúde, com atendimento gratuito, uma condição financeira baixa pode interferir no nível de suporte necessário para melhor QV33. Edib Z, Kumarasamy V, Abdullah NB, Rizal AM, Al-Dubai SAR. Most prevalent unmet supportive care needs and quality of life of breast cancer patients in a tertiary hospital in Malaysia. Health Qual Life Outcomes. 2016;14:26. doi: https://doi.org/10.1186/s12955-016-0428-4
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A dor obteve a terceira maior pontuação (67,2) na escala de sintomas. Mas, apesar disso, deve-se considerar a magnitude do seu valor, o que vai ao encontro das referências que tratam da importância da dor em pacientes com câncer44. Freire MEM, Sawada NO, França ISX, Costa SFG, Oliveira CDB. Health-related quality of life among patients with advanced cancer: an integrative review. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(2):357-67. doi: https://doi.org/10.1590/S0080-6234201400002000022
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-55. Sawada NO, Nicolussi AC, Paula JM, Caro MPG, Garcia CM, Quintana FC. Quality of life of Brazilian and Spanish cancer patients undergoing chemotherapy: an integrative literature review. Rev Latino-Am Enfermagem. 2016;24:e2688. doi: https://doi.org/10.1590/1518-8345.0564.2688
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A dor descontrolada pode afetar a QV das mulheres. É importante que ocorra o manejo eficiente desse sintoma, seja através de tratamento farmacológico ou não-farmacológico, para que se possa, potencialmente, melhorar a QV. A percepção e a intensidade da dor podem estar conjugadas com o comprometimento de múltiplas esferas inerentes ao ser humano, sendo preciso trata-la na perspectiva da “dor total”1111. Puetzler J, Feldmann Jr. RE, Brascher AK, Gerhardt A, Benrath J. Improvements in health-related quality of life by comprehensive cancer pain therapy: a pilot study with breast cancer outpatients under palliative chemotherapy. Oncol Res Treat. 2014;37(9):456-62. doi: https://doi.org/10.1159/000365537
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Os dados evidenciam que a dor no estadiamento III (75,8) foi maior que no estadiamento IV (67,1). Na prática clínica observa-se o uso comum de opióides principalmente em pacientes em estadiamento IV, podendo resultar em melhor controle da dor. Mas, salienta-se o escore alto para este sintoma em todos os estadiamentos.

Merece destaque que ao analisar a escala de sintomas em relação as fases de estadiamento da doença observa-se que o valor p foi maior do que o nível de significância estabelecido, portanto não estatisticamente significante para afirmar que a fase de estadiamento é um fator que influencia a escala sintomática.

CONCLUSÃO

O status global de saúde apresentou média de 32,04; seu valor máximo registrado foi de 91,67, indicando que nenhuma das 199 mulheres apresentou QV relacionada à saúde na pontuação máxima da escala. Os domínios da escala funcional que apresentaram maior e menor média foram, respectivamente, funcionamento cognitivo (60,47) e desempenho pessoal (12,48). Já na escala sintomática, fadiga apresentou a maior média (69,57) e diarreia a menor (8,21).

Ao comparar os resultados de QV entre as fases de estadiamento II, III e IV, foi possível identificar que o status global de saúde, bem como a escala funcional, com exceção da social, apresentaram diferenças estatisticamente significantes, pois reduziram seus escores à medida que o estadiamento avançou. Conclui-se que o estadiamento do câncer interferiu na QV relacionada à saúde de mulheres com câncer de mama localmente avançado, especialmente, das que apresentaram metástases.

Das implicações para a prática os resultados oferecem subsídios para melhorar a QV das mulheres com câncer de mama avançado ou metastático. Uma vez que o planejamento assistencial em enfermagem e saúde toma como base o conhecimento dos principais domínios de QV afetados, torna-se possível direcionar ações para promover fatores que melhoram a QV, bem como prevenir, evitar ou minimizar os fatores negativos. A relação da pior QV com o estadiamento mais avançado da doença apresenta como desafio a necessidade de garantir cuidados paliativos. Resultados com melhor QV na condição da doença crônica podem reduzir custos dos serviços de saúde.

É de grande relevância social analisar a QV dessas mulheres, e o impacto que a doença e seus tratamentos causam em suas vidas. As mulheres e seus familiares encontram-se fragilizados e sensíveis pela doença, indicando a necessidade de implementação de ações para ajudá-los nos ajustamentos para melhorar e manter a QV.

Aponta-se como limitações a realização do estudo em um único cenário, que atende exclusivamente pelo Sistema Único de Saúde. Convém considerar as diferenças das características sociais, demográficas e culturais no Brasil e no mundo, tendo cautela na replicação dos resultados. Porém, ressalta-se que os resultados desta amostra corroboraram com dados das literaturas nacional e internacional.

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Editado por

Editor associado:

Helga Gouveia

Editor-chefe:

Maria da Graça Oliveira Crossetti

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    02 Set 2019
  • Aceito
    06 Jan 2020
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