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Autoeficácia e medo da dor ao movimento na lombalgia crônica: uma intervenção desenvolvida por enfermeiras

RESUMO

Objetivo:

Testar o efeito de intervenções para lombalgia crônica desenvolvidas por enfermeiros no Programa para Aumentar a Autoeficácia e Diminuir o Medo da Dor e Evitação do Movimento.

Método:

Ensaio clínico, com 81 pacientes, realizado em 2016, no Ambulatório de Dor em São Luís, Maranhão, Brasil. Os grupos receberam: A (educação e exposição), B (educação) e C (controle). Realizaram-se testes Qui-quadrado, Exato de Fisher, ANOVA e Kruskal Wallis.

Resultados:

Pacientes dos grupos A e B melhoraram a autoeficácia, ansiedade, depressão e incapacidade, comparados ao grupo C. A redução no medo da dor e evitação do movimento foi maior no Grupo A, que também apresentou diminuição na dor atual e escores gerais de dor, comparado ao Grupo B e C.

Conclusão:

A Educação foi efetiva no aumento da Crença de Autoeficácia. Para a Crença de Medo da Dor e Evitação ao Movimento e intensidade da dor, a associação com exposição mostrou melhores resultados.

Palavras-chave:
Autoeficácia; Medo; Dor lombar; Ansiedade; Depressão; Cuidados de enfermagem

ABSTRACT

Objective:

To test the effect of interventions to chronic low back pain developed by nurses in the Program to Increase Self-efficacy and Reduce the Fear of Pain and Avoidance of Movement.

Method:

Clinical trial, with 81 patients, carried out in 2016, at the Pain Outpatient Clinic in São Luís, Maranhão, Brazil. The groups received: A (education and exposure), B (education) and C (control). Chi-square, Fisher’s Exact, ANOVA and Kruskal Wallis tests were performed.

Results:

Patients in groups A and B improved self-efficacy, anxiety, depression, and disability, compared to group C. The reduction in fear of pain and avoidance of movement was greater in Group A, which also showed a decrease in current pain and overall scores compared to Group B and C.

Conclusion:

Education was effective in increasing the Self-Efficacy Belief. For the Belief of Fear of Pain and Avoidance of Movement and pain intensity, the association with exposure showed better results.

Keywords:
Self efficacy; Fear; Low back pain; Anxiety; Depression; Nursing care

RESUMEN

Objetivo:

Evaluar el efecto de las intervenciones para el dolor lumbar crónico desarrolladas por las enfermeras en el programa para aumentar la autoeficacia y reducir el miedo al dolor y evitar el movimiento.

Método:

Ensayo clínico, con 81 pacientes, realizado en 2016, en la Clínica del Dolor en São Luís, Maranhão, Brasil. Los grupos recibieron: A (educación y exposición), B (educación) y C (control). Se realizaron pruebas de Chi-cuadrado, Exacta de Fisher, ANOVA y Kruskal Wallis.

Resultados:

Los pacientes en los grupos A y B mejoraron la autoeficacia, la ansiedad, la depresión y la discapacidad, en comparación con el grupo C. La reducción en el miedo al dolor y la evitación del movimiento fue mayor en el Grupo A, que también mostró una disminución en el dolor actual y las puntuaciones generales de en comparación con los grupos B y C.

Conclusión:

Educación fue efectiva para aumentar la creencia en la autoeficacia. Para la creencia del miedo al dolor y la evitación del movimiento y la intensidad del dolor, la asociación con la exposición mostró mejores resultados.

Palabras clave:
Autoeficacia; Miedo; Dolor de la región lumbar; Ansiedad; Depresión; Atención de enfermería

INTRODUÇÃO

A lombalgia atualmente é um problema de saúde pública, com elevados custos para o sistema de saúde e sociedade11. Erp RMA, Huijnen IPJ, Jakobs MLG, Kleijnen J, Smeets RJEM. Effectiveness of primary care interventions using a biopsychosocial approach in chronic low back pain: a systematic review. Pain Pract. 2019;19(2):224-41. doi: https://doi.org/10.1111/papr.12735
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-22. Riley SP, Bialosky J, Coronado RA. Are changes in fear-avoidance beliefs and self-efficacy mediators of discharge function and pain in patients with acute and chronic low back pain? J Orthop Sports Phys Ther. 2020;50(6):301-8. doi: https://www.jospt.org/doi/10.2519/jospt.2020.8982
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. A prevalência atinge cerca de 70% a 85% da população, sendo que 10% evoluem para o quadro de lombalgia crônica. Esta apresenta maior impacto da vida dos pacientes, com quadros aumentados de incapacidade, ansiedade e depressão22. Riley SP, Bialosky J, Coronado RA. Are changes in fear-avoidance beliefs and self-efficacy mediators of discharge function and pain in patients with acute and chronic low back pain? J Orthop Sports Phys Ther. 2020;50(6):301-8. doi: https://www.jospt.org/doi/10.2519/jospt.2020.8982
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-33. Oliveira DS, Mendonça LVF, Sampaio RSM, Castro-Lopes JMPD, Azevedo LFR. The impact of anxiety and depression on the outcomes of chronic low back pain multidisciplinary pain management: a multicenter prospective cohort study in pain clinics with one-year follow-up. Pain Med. 2019;20(4):736-46. doi: https://doi.org/10.1093/pm/pny128
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.

Crenças disfuncionais, pensamentos catastróficos e imobilidade contribuem para o aumento da incapacidade e alterações do humor em pacientes com lombalgia crônica11. Erp RMA, Huijnen IPJ, Jakobs MLG, Kleijnen J, Smeets RJEM. Effectiveness of primary care interventions using a biopsychosocial approach in chronic low back pain: a systematic review. Pain Pract. 2019;19(2):224-41. doi: https://doi.org/10.1111/papr.12735
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. Dentre as crenças, as de autoeficácia e medo da dor e evitação do movimento têm se mostrado relevantes. A Crença de Autoeficácia refere-se à auto avaliação sobre o quanto o indivíduo é capaz de lidar com as situações e a de Medo da dor e Evitação do Movimento propõe que o medo catastrófico de sentir dor leva à evitação do movimento, pelo desconforto e temor que este resulte em nova ou piora da lesão22. Riley SP, Bialosky J, Coronado RA. Are changes in fear-avoidance beliefs and self-efficacy mediators of discharge function and pain in patients with acute and chronic low back pain? J Orthop Sports Phys Ther. 2020;50(6):301-8. doi: https://www.jospt.org/doi/10.2519/jospt.2020.8982
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As Crenças de Autoeficácia e de Medo da Dor e Evitação do Movimento são negativamente correlacionadas em pacientes com lombalgia e preditoras de incapacidade e de alterações de humor. Quanto menor a Crença de Autoeficácia, maior a quantidade de comportamentos dolorosos e de evitação do movimento. A maior evitação do movimento resulta em aumento da dor pelo desuso, diminuição da atividade e da funcionalidade. Há também estreita relação entre essas crenças e depressão e ansiedade33. Oliveira DS, Mendonça LVF, Sampaio RSM, Castro-Lopes JMPD, Azevedo LFR. The impact of anxiety and depression on the outcomes of chronic low back pain multidisciplinary pain management: a multicenter prospective cohort study in pain clinics with one-year follow-up. Pain Med. 2019;20(4):736-46. doi: https://doi.org/10.1093/pm/pny128
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.

Pacientes com autoeficácia baixa e medo da dor e evitação do movimento elevado são os de maior risco para desenvolverem incapacidade e por isso necessitam intervenções específicas para a modificação dessas crenças. O uso da exposição como estratégia para diminuir a crença de medo da dor e evitação do movimento tem mostrado resultados promissores e a modificação da crença de autoeficácia ainda é pouco explorada como estratégia para lidar com pacientes com lombalgia crônica22. Riley SP, Bialosky J, Coronado RA. Are changes in fear-avoidance beliefs and self-efficacy mediators of discharge function and pain in patients with acute and chronic low back pain? J Orthop Sports Phys Ther. 2020;50(6):301-8. doi: https://www.jospt.org/doi/10.2519/jospt.2020.8982
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A exposição em pacientes com lombalgia consiste em promover situações na qual o paciente executa os movimentos que teme, semelhante à exposição utilizada nos casos de fobias. As situações temidas são hierarquizadas e o paciente é exposto, de forma gradual, da situação de menor medo à situação que gera maior medo44. Schemer L, Schroeder A, Ørnbøl E, Glombiewski JA. Exposure and cognitive-behavioural therapy for chronic back pain: an RCT on treatment processes. Eur J Pain. 2019;23(3):526-38. doi: https://doi.org/10.1002/ejp.1326
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Os resultados na crenças de autoeficácia e medo da dor e evitação do movimento, incapacidade e redução da intensidade dolorosa podem ser potencializados quando a educação é aliada à exposição, pois possibilita ao paciente informar-se e refletir sobre a existência de crenças disfuncionais, pensamentos catastróficos e potenciais problemas associados ao comportamento de evitação do movimento55. O’Keeffe M, O’Sullivan P, Purtill H, Bargary N, O’Sullivan K. Cognitive functional therapy compared with a group-based exercise and education intervention for chronic low back pain: a multicentre randomised controlled trial (RCT). Br J Sports Med. 2020;54(13):782-89. doi: https://doi.org/10.1136/bjsports-2019-100780
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Considerando que os pacientes com lombalgia crônica, que apresentam crenças de autoeficácia baixa e medo da dor e evitação do movimento elevado, serem considerados os de maior risco para incapacidade 22. Riley SP, Bialosky J, Coronado RA. Are changes in fear-avoidance beliefs and self-efficacy mediators of discharge function and pain in patients with acute and chronic low back pain? J Orthop Sports Phys Ther. 2020;50(6):301-8. doi: https://www.jospt.org/doi/10.2519/jospt.2020.8982
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, foi realizado este estudo com o objetivo testar o efeito de intervenções para lombalgia crônica desenvolvidas por enfermeiros no Programa para Aumentar a Autoeficácia e Diminuir o Medo da Dor e Evitação do Movimento (PROAME).

A hipótese deste estudo foi que o PROAME completo, composto por 3 sessões de intervenções educativas associadas às 3 sessões de exposição, mostrariam resultados melhores na modificação das crenças, pensamentos catastróficos, incapacidade, ansiedade, depressão e intensidade dolorosa, do que somente as intervenções educativas ou o grupo controle.

MÉTODO

Delineamento do estudo e período

Trata-se de um ensaio clínico, randomizado e cegado para o desfecho, realizado de janeiro a abril de 2016. Está descrito de acordo com o Consolidated Standards of Reporting Trials (CONSORT) para ensaios clínicos não farmacológicos. O estudo faz parte de uma Escola de Coluna com Programa de Reabilitação para Lombalgia. As intervenções foram conduzidas por enfermeiras com aprimoramento em terapia cognitivo-comportamental, e contaram com o suporte de um fisioterapeuta e educador físico.

População e amostra

A população foi composta por pacientes com lombalgia crônica. Para o cálculo do tamanho da amostra adotou-se poder da amostra de 80%, nível de significância de 5%. A amostra estimada foi de 81 pacientes, organizados em três grupos, com 27 pacientes por grupo.

Recrutamento e critérios de inclusão

Os pacientes foram recrutados no Ambulatório de Dor da Universidade Federal do Maranhão, segundo os critérios de inclusão: presença de lombalgia há pelo menos seis meses; idade entre 18 anos e 65 anos; escolaridade igual ou superior a seis anos; capacidade de comunicação verbal e compreensão preservada; disponibilidade para comparecer às sessões do programa e escore na Escala de Autoeficácia para Dor Crônica ≤182 pontos e na Escala Tampa de Cinesiofobia ≥ 51 pontos.

Randomização e composição dos grupos

Foram randomizados 81 participantes em três grupos. Houve necessidade de remarcação da intervenção e avaliação, sem perda de seguimento. Os participantes foram analisados por intenção de tratamento sem exclusões na análise (Figura 1).

Os participantes foram avaliados durante o pré e pós-teste, por meio dos seguintes instrumentos: escala de autoeficácia para dor crônica, escala tampa de cinesiofobia, escala de pensamentos catastróficos sobre dor, escala hospitalar de ansiedade e depressão, escala oswestry disability index e intensidade dolorosa.

Todos os pacientes receberam o tratamento convencional que consistia em consultas médicas e tratamento farmacológico. A randomização dos três grupos foi realizada em blocos:

Grupo A (Educação + Exposição):

Este grupo recebeu 3 sessões de educação e 3 sessões de exposição, totalizando um mês e duas semanas de Programa. O propósito desse grupo foi avaliar se a educação associada à exposição ao movimento modificaria as crenças de Autoeficácia e de Medo da dor e evitação do movimento, e demais desfechos secundários.

Grupo B (Educação):

Este grupo recebeu 3 sessões de educação. O propósito desse grupo foi avaliar se somente intervenções educativas modificariam as crenças de Autoeficácia e de Medo da dor e evitação do movimento, e demais desfechos secundários.

Grupo C (Controle):

Este grupo recebeu apenas o atendimento convencional do Ambulatório de Dor Crônica. O propósito foi verificar se o tratamento convencional sozinho modificaria as crenças de Autoeficácia e Medo da dor e evitação do movimento, e demais desfechos secundários.

Figura 1 -
Fluxograma de recrutamento da amostra. Brasil, 2019

Descrição das intervenções

Educação

A fase de educação consistiu em aulas em grupos de até 10 pacientes (sessões 1 e 2) e da análise cognitiva pelo Ciclo Vicioso (sessão 3), de forma individual. Nas aulas almejou-se modificar as Crenças de Autoeficácia e de Medo da Dor e Evitação do Movimento através da aprendizagem por informação, observação e persuasão social. Os objetivos foram que os pacientes percebessem em sua experiência dolorosa, crenças e comportamentos errôneos, para que compreendessem a importância de modificar concepções distorcidas. Participaram dessa fase pacientes dos Grupos A e B.

Na primeira sessão (em grupo) os pacientes receberam a cartilha educativa elaborada pelos pesquisadores e orientações sobre lombalgia, causas, sintomas e tratamento. Os pacientes tiveram oportunidade de verbalizar suas concepções e experiência dolorosa e compartilhá-las com o grupo.

Na segunda sessão (em grupo) foram explicadas as Crenças de Autoeficácia e de Medo da Dor e Evitação do Movimento e sua importância nos quadros de lombalgia crônica. O profissional articulava aspectos das crenças com as concepções e vivências relatadas pelos pacientes na sessão anterior.

A terceira sessão (individual) visou à construção do Ciclo Vicioso do Medo da Dor e Evitação do Movimento, a partir de um exemplo de dor relatado pelo próprio paciente. O Ciclo propõe a análise de uma situação de dor em 4 aspectos: sentimento, emoção, comportamento e consequências. A pesquisadora relembrou e enfatizou a articulação entre pensamentos, sentimentos, comportamentos e a influência desses na funcionalidade e incapacidade do paciente. O paciente relatou uma situação de dor vivida por ele e, com a ajuda da pesquisadora, identificou nela o significado que atribuiu à situação (pensamento), o sentimento que essa atribuição lhe causou (emoção) e a mudança de humor decorrente, analisou o que se seguiu (comportamento) após a atribuição de significado e sentimento ao evento doloroso e as consequências desses comportamentos em termos de funcionalidade (consequência).

Exposição

A fase de exposição foi composta pelas sessões 4, 5 e 6, todas individuais. Somente os pacientes do Grupo A participaram.

Na quarta sessão os pacientes graduaram o dano que poderia advir de cada movimento e escolheram os movimentos que gostariam de serem expostos. Utilizaram 40 fotos de atividades da vida diária que representavam movimentos. As fotos foram originárias da Série de Fotografias das Atividades Diárias (PHODA) e, a cada uma delas, o paciente atribuiu um escore de possível prejuízo à sua coluna vertebral, utilizando uma escala de 0-100 (Termômetro do prejuízo)66. Oliveira CB, Franco MR, Demarchi SJ, Smeets RJEM, Huijnen IPJ, Morelhão PK, et al. Psychometric properties of the photograph series of daily activities-short electronic version (PHODA-SeV) in patients with chronic low back pain. J Orthop Sports Phys Ther. 2018;48(9):719-27. doi: https://doi.org/10.2519/jospt.2018.7864
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. Tal pontuação serviu para estabelecer a hierarquia do medo de se lesionar com determinado movimento.

Entre as atividades graduadas acima de 50 no termômetro do prejuízo, solicitou-se aos pacientes que escolhessem cinco atividades que desejariam serem expostos nas duas sessões seguintes. As exposições foram graduais, isto é, da atividade com menor escore no termômetro do prejuízo para a de maior escore.

As sessões cinco e seis foram as exposições às atividades escolhidas pelos pacientes. Cada paciente foi exposto às cinco situações que escolheu, nas duas sessões, para permitir o fortalecimento da autoeficácia e diminuição do medo da dor e evitação do movimento.

Cada movimento foi modelado pela equipe e explicado detalhadamente ao paciente como fazê-lo. Os pacientes executaram as atividades com auxílio e foram encorajados a realizá-las sozinhos.

Desfechos e categorias de análise

Desfechos primários

Os escores da Crença de Autoeficácia e de Medo da dor e Evitação do Movimento foram os desfechos primários. A autoeficácia foi avaliada pela Escala de Autoeficácia para Dor Crônica77. Vergeld V, Utesch T. Pain-related self-efficacy among people with back pain: a systematic review of assessment tools. Clin J Pain. 2020;36(6):480-94. doi: https://doi.org/10.1097/AJP.0000000000000818
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e a Crença de Medo da Dor e Evitação do Movimento pela Escala Tampa de Cinesiofobia88. Gregg CD, McIntosh G, Hall H, Watson H, Williams D, Hoffman CW. The relationship between the Tampa Scale of Kinesiophobia and low back pain rehabilitation outcomes. Spine J. 2015;15(12):2466-71. doi: https://doi.org/10.1016/j.spinee.2015.08.018
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.

Os pontos de corte foram estabelecidos por meio de Curva ROC. Utilizando-se o escore ≤40 do índice de Incapacidade de Oswestry estimou-se a prevalência de incapacidade e foram ajustadas curvas ROC para Autoeficácia e Medo da dor e evitação do movimento em relação a essa prevalência. Os escores de autoeficácia menores ou iguais a 182 foram considerados baixos e os maiores que 182, elevados (sensibilidade 73,0% e especificidade 61,6%). Os escores de medo e evitação abaixo de 51 foram considerados baixos e os maiores ou iguais a 51, elevados (sensibilidade 57,4% e especificidade 61,6%).

Desfechos secundários

Ansiedade, depressão, incapacidade, pensamento catastrófico e dor foram considerados desfechos secundários.

O pensamento catastrófico foi avaliado pela Escala de Pensamentos Catastróficos99. Wheeler CHB, Williams ACC, Morley SJ. Meta-analysis of the psychometric properties of the Pain Catastrophizing Scale and associations with participant characteristics. Pain. 2019;160(9):1946-53. doi: https://doi.org/10.1097/j.pain.0000000000001494
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. A ansiedade e depressão foram avaliadas pela Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão1010. Turk DC, Dworkin RH, Trudeau JJ, Benson C, Biondi DM, Katz NP, et al. Validation of the hospital anxiety and depression scale in patients with acute low back pain. J Pain. 2015;16(10):1012-21. doi: https://doi.org/10.1016/j.jpain.2015.07.001
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e a incapacidade foi avaliada pelo Índice de Incapacidade de Oswestry1111. Lee CP, Fu TS, Liu CY, Hung CI. Psychometric evaluation of the Oswestry Disability Index in patients with chronic low back pain: factor and Mokken analyses. Health Qual Life Outcomes. 2017;15:192. doi: https://doi.org/10.1186/s12955-017-0768-8
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. A dor foi avaliada por meio da escala numérica (0-10) para as variáveis “dor agora” e “dor no contexto geral”.

Instrumentos

Escala de Autoeficácia para Dor Crônica

A Escala de Autoeficácia para Dor Crônica é uma escala específica para mensurar a percepção de autoeficácia e a capacidade para lidar com as consequências da dor em pacientes com dor crônica. A escala consiste em 22 itens divididos em três fatores ou domínios: autoeficácia para o controle da dor (AED), autoeficácia para função física (AEF) e autoeficácia para controle de sintomas (AES). A soma dos três domínios fornece o escore total que varia de 30 a 30077. Vergeld V, Utesch T. Pain-related self-efficacy among people with back pain: a systematic review of assessment tools. Clin J Pain. 2020;36(6):480-94. doi: https://doi.org/10.1097/AJP.0000000000000818
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Escala Tampa de Cinesiofobia

A Escala Tampa de Cinesiofobia avalia o medo de lesão durante o movimento. Consiste em um questionário autoaplicável, composto por 17 itens que abordam dor, medo do movimento e intensidade dos sintomas. Os escores variam de um a quatro pontos. Para a obtenção do escore total final é necessária a inversão dos escores das questões 4, 8, 12 e 16. O escore final pode variar de 17 a 68 pontos. Quanto maior a pontuação, maior o grau de cinesiofobia, ou seja, medo excessivo e debilitante do movimento e atividade física88. Gregg CD, McIntosh G, Hall H, Watson H, Williams D, Hoffman CW. The relationship between the Tampa Scale of Kinesiophobia and low back pain rehabilitation outcomes. Spine J. 2015;15(12):2466-71. doi: https://doi.org/10.1016/j.spinee.2015.08.018
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.

Escala de Pensamentos Catastróficos sobre Dor

A escala de Pensamentos Catastróficos sobre dor é composta por 9 itens em escala Likert que varia de 0 a 5 pontos. O escore total é a soma dos itens divididos pelo número de itens respondidos, sendo que o escore mínimo pode ser 0 e o máximo 5. Não há pontos de corte nessa escala. Escores mais elevados indicam maior presença de pensamentos catastróficos99. Wheeler CHB, Williams ACC, Morley SJ. Meta-analysis of the psychometric properties of the Pain Catastrophizing Scale and associations with participant characteristics. Pain. 2019;160(9):1946-53. doi: https://doi.org/10.1097/j.pain.0000000000001494
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.

Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão

A Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão avalia presença de sintomas de ansiedade e depressão. Possui 14 itens, sendo sete para ansiedade e sete para depressão. Cada um dos itens pode ser pontuado de zero a três, compondo uma pontuação máxima de 21 pontos para cada escala. Apresenta como ponto de corte 9 para ansiedade e 9 para depressão1010. Turk DC, Dworkin RH, Trudeau JJ, Benson C, Biondi DM, Katz NP, et al. Validation of the hospital anxiety and depression scale in patients with acute low back pain. J Pain. 2015;16(10):1012-21. doi: https://doi.org/10.1016/j.jpain.2015.07.001
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Escala Oswestry Disability Index

A Escala Oswestry Disability Index (ODI) avalia incapacidade em pacientes com dor lombar. A escala é composta por 10 itens que variam de 0 a 5. A primeira sessão avalia a intensidade da dor e os demais avaliam o efeito incapacitante da dor em algumas atividades diárias: cuidados pessoais (tomar banho, vestir-se, etc.), andar, dormir, vida sexual, vida social, locomoção, etc. O escore total varia de 0 (sem incapacidade) a 100 (incapacidade máxima)1111. Lee CP, Fu TS, Liu CY, Hung CI. Psychometric evaluation of the Oswestry Disability Index in patients with chronic low back pain: factor and Mokken analyses. Health Qual Life Outcomes. 2017;15:192. doi: https://doi.org/10.1186/s12955-017-0768-8
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.

Série de fotografias das atividades diárias - versão eletrônica curta (PHODA-SeV) para lombalgia

O PHODA-Sev é um conjunto de 40 fotografias que apresentam situações consideradas por pessoas com lombalgia como de risco para causar dor e lesão à coluna vertebral. O paciente é orientado a graduar o prejuízo/dano à sua coluna em cada situação apresentada nas fotos por meio do “termômetro de dano/prejuízo”, graduado de 0 a 100. A média é calculada somando-se o escore de cada foto e dividindo-se por 4066. Oliveira CB, Franco MR, Demarchi SJ, Smeets RJEM, Huijnen IPJ, Morelhão PK, et al. Psychometric properties of the photograph series of daily activities-short electronic version (PHODA-SeV) in patients with chronic low back pain. J Orthop Sports Phys Ther. 2018;48(9):719-27. doi: https://doi.org/10.2519/jospt.2018.7864
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. Não há pontos de corte, quanto maior o escore, maior o medo. O objetivo com o seu uso foi conhecer a opinião do paciente sobre o “risco de dano” de cada situação e escolher as situações de exposição.

Análise estatística

Os dados foram digitalizados em planilha Excel e analisados no programa estatístico R. As variáveis quantitativas foram analisadas por meio de médias, medianas e desvio padrão e para as variáveis qualitativas foram calculadas frequência absoluta e relativa. Para a comparação entre os Grupos (A, B e C) quanto aos desfechos primários e secundários, foram feitos Testes Qui-quadrado, Exato de Fisher, ANOVA e Kruskal Wallis, conforme características das variáveis e normalidade dos dados.

Aspectos éticos

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da USP, número CAAE 13647313.1.0000.5392. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

RESULTADOS

A Tabela 1 mostra a distribuição sócio demográfica da amostra. A frequência entre os sexos foi equitativa, a média da idade foi de 44,9 anos, a média de escolaridade foi de 9,9 anos e a renda familiar mensal média foi de R$ 1790,59. No Grupo A, dois participantes não apresentaram renda. Entre os avaliados, 70,4% estavam inativos, em média a 26,7 meses. Dentre os inativos, 71,9% estavam em licença saúde e 9,9% em litígio trabalhista. Não houve diferença entre os Grupos quanto às características sócio demográficas.

Tabela 1 -
Caracterização sociodemográfica dos pacientes com lombalgia crônica nos grupos A, B e C. Brasil, 2019

Pela Tabela 2 nota-se que após as intervenções os pacientes do Grupo A e do Grupo B melhoraram os escores da Crença de Autoeficácia nos três domínios (dor, funcionalidade e controle de sintomas) e na autoeficácia geral. A redução nos escores da Crença de Medo da Dor e Evitação do Movimento foi maior no Grupo A do que no Grupo ao B. As Crenças de Autoeficácia e Medo da Dor e Evitação do Movimento ficaram estáveis nos pacientes do Grupo C. Melhora de pensamentos catastróficos ocorreu no Grupo A e no Grupo B mas piorou no Grupo C.

Tabela 2 -
Autoeficácia, medo da dor e evitação do movimento e pensamentos catastróficos nos Grupos A, B, C durante o pré-teste e pós-teste. Brasil, 2019.

A Tabela 3 mostra os escores de ansiedade, depressão, incapacidade, pensamentos catastróficos e dor nos pacientes dos Grupos A, B e C, no pré e pós-teste. No pré-teste, o escore médio de ansiedade, nos três Grupos, foi compatível com ansiedade; o escore médio de depressão foi limítrofe nos Grupo A e B e compatível com depressão no Grupo C, considerando-se os pontos de corte sugeridos na Escala de HADS. A incapacidade nos Grupos A e B foi moderada e semelhante; no Grupo C a incapacidade foi intensa e superior aos demais Grupos. Nota-se que os pacientes do Grupo A e do Grupo B após a intervenção melhoraram, igualmente, os escores de ansiedade, depressão, incapacidade e pensamento catastrófico (p<0,001).

No momento do pré-teste os pacientes dos três Grupos apresentavam intensidade dolorosa média acima de sete. O Grupo A mostrou diminuição das médias dos escores da “dor agora” e “dor geral” comparando-se o pré e pós-teste e o Grupo B mostrou diminuição da média do escore dor agora e aumento das médias do escores de dor geral. O Grupo C mostrou aumento nas médias dos escores da dor agora e dor geral. Os Grupos tiveram diferentes desempenhos e a análise (Tabela 3) indica que o Grupo A melhorou após a intervenção nos dois indicadores (dor agora e dor geral), quando comparado aos Grupos B e C.

Tabela 3 -
Ansiedade, depressão, incapacidade, pensamento catastrófico e dor nos Grupos A, B e C durante o pré-teste e pós-teste. Brasil, 2019

DISCUSSÃO

A comparação entre os grupos mostrou que as intervenções de educação e exposição foram eficazes na modificação de crenças, pensamentos catastróficos, incapacidade, ansiedade e depressão. No entanto, especificamente para a Crença de Medo da Dor e Evitação do Movimento e para a intensidade da dor, o Grupo A, que recebeu as duas intervenções (educação e exposição) obteve melhores resultados. A melhora similar nos escores da Crença de Autoeficácia no Grupo A e B, causou surpresa, pois esperava-se melhor desempenho dos pacientes do Grupo A visto terem recebido a intervenção mais complexa (educação e exposição ao movimento), ambas com potencial para melhor as duas crenças.

Educação é uma estratégia poderosa na modificação de crenças e comportamentos e alguns estudos mostraram que a educação potencializa os efeitos da exposição quando utilizada como primeira intervenção55. O’Keeffe M, O’Sullivan P, Purtill H, Bargary N, O’Sullivan K. Cognitive functional therapy compared with a group-based exercise and education intervention for chronic low back pain: a multicentre randomised controlled trial (RCT). Br J Sports Med. 2020;54(13):782-89. doi: https://doi.org/10.1136/bjsports-2019-100780
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. As estratégias educacionais utilizadas neste estudo foram focadas em aspectos que conseguem modificar crenças: as aulas em grupo permitiram o uso de experiência vicária, (observação de outros pacientes que vivenciam situações semelhantes); o pesquisador durante as aulas pôde exercer persuasão e o reforçou positivamente as opiniões e comportamentos desejáveis manifestos pelos pacientes. A sessão individual de educação para a construção do Ciclo Vicioso do Medo da dor e Evitação do Movimento permitiu ao pesquisador reforçar positivamente comportamentos desejáveis.

A maior redução nos escores da Crença de Medo da Dor e Evitação do Movimento no grupo que recebeu a exposição era esperada, pois o Grupo A pôde vivenciar experiências de domínio, como a execução das atividades. A experiência de domínio é um dos fatores que mais contribuem na formação das crenças relacionadas à dor e a exposição permite que o paciente vivencie as situações temidas. À medida que os pacientes realizavam as atividades escolhidas na exposição, reforçavam a capacidade de desempenhar os movimentos de forma bem-sucedida44. Schemer L, Schroeder A, Ørnbøl E, Glombiewski JA. Exposure and cognitive-behavioural therapy for chronic back pain: an RCT on treatment processes. Eur J Pain. 2019;23(3):526-38. doi: https://doi.org/10.1002/ejp.1326
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.

Uma pesquisa avaliou 88 participantes em três tipos de tratamento psicológico: Exposição longa, Exposição curta e Terapia Comportamental Cognitiva (TCC). Todos os participantes estavam com níveis elevados de ansiedade e incapacidade relacionadas à dor. A exposição foi mais eficaz que a TCC na redução da incapacidade relacionada ao movimento. Exposição e TCC não diferiram na redução da intensidade da dor. Exposição curta superou a Exposição longa após 10 sessões, o que significa que os indivíduos melhoraram mais rapidamente quando foram oferecidas menos sessões, corroborando com os achados deste estudo1212. Glombiewski JA, Holzapfel S, Riecke J, Vlaeyen JWS, de Jong J, Lemmer G, et al. Exposure and CBT for chronic back pain: an RCT on differential efficacy and optimal length of treatment. J Consult Clin Psychol. 2018;86(6):533-45. doi: https://doi.org/10.1037/ccp0000298
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.

Outros autores avaliaram os escores de medo em seis pacientes submetidos a exposição durante o pré-teste, pós-teste e três meses de seguimento. A porcentagem de diminuição foi de 41% para 88% entre o pré-teste e pós-teste, e de 54% para 100% entre o pré-teste e três meses de seguimento. Também não há um programa educativo claramente definido e nem grupos de comparação1313. Boersma K, Linton S, Overmeer T, Jansson M, Vlaeyen J, de Jong J. Lowering fear-avoidance and enhancing function through exposure in vivo: a multiple baseline study across six patients with back pain. Pain. 2004;108(1-2):8-16. doi: https://doi.org/10.1016/j.pain.2003.03.001
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.

A avaliação de uma série de casos mostrou a influência da educação na exposição gradual e atividade gradual. A amostra foi constituída por seis pacientes divididos em dois grupos: um grupo recebia educação e exposição e o outro educação e atividade gradual. Os resultados mostraram que os escores de medo da dor e evitação do movimento diminuíram após a educação, e caíram ainda mais com a exposição, com diminuição média de 21 pontos. O comportamento de vigilância em relação à dor reduziu 30% após a educação e 70% após a exposição. Os escores de incapacidade caíram em média três pontos com a educação e 13 pontos após a exposição1414. de Jong JR, Vlaeyen JWS, Onghena P, Goossens MEJB, Geilen M, Mulder H. Fear of movement/(re)injury in chronic low back pain: education or exposure in vivo as mediator to fear reduction? Clin J Pain. 2005;21(1):9-17. doi: https://doi.org/10.1097/00002508-200501000-00002
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. Esses dados assemelham-se aos observados na presente pesquisa.

Um ensaio clinico randomizado com 83 pacientes comparou três grupos: um grupo recebeu exposição gradual (fazer uma atividade/movimento), outro, atividade gradual (treinamento físico) e o terceiro, ficava em lista de espera. O tratamento da exposição gradual consistiu em oito sessões com duração de quatro semanas. As comparações dos efeitos no pós-teste mostraram que o grupo exposição teve melhores desfechos no medo da dor e evitação do movimento (p=0,02), autoeficácia (p=0,03), incapacidade (p=0,06) ansiedade e depressão (p=0,02). Somente os pensamentos catastróficos não diferiram entre os grupos (p=0,07)1515. Woods MP, Asmundson GJG. Evaluating the efficacy of graded in vivo exposure for the treatment of fear in patients with chronic back pain: a randomized controlled clinical trial. Pain. 2008;136(3):271-80. doi: https://doi.org/10.1016/j.pain.2007.06.037
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.

Outra pesquisa, multicêntrica, avaliou a efetividade da exposição gradual versus atividade gradual em pacientes com lombalgia crônica sobre a catastrofização e percepção de prejuízo. Foram randomizados dois grupos com 85 pacientes com lombalgia crônica e medo da dor e evitação do movimento. Os resultados mostraram que a exposição foi mais efetiva que a atividade gradual na redução da catastrofização (p=0,01) e percepção de prejuízo nas atividades (p<0,001). A catastrofização e a percepção de dano nas atividades foram mediadoras da incapacidade nesses pacientes (p<0,001). Cerca de metade dos pacientes, independente do grupo apresentou melhora na incapacidade1616. Leeuw M, Goossens MEJB, Breukelen GJP, de Jong JR, Heuts PHTG, Smeets RJEM, et al. Exposure in vivo versus operant graded activity in chronic low back pain patients: results of a randomized controlled trial. Pain. 2008;138(1):192-207. doi: https://doi.org/10.1016/j.pain.2007.12.009
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.

Neste estudo os pacientes também foram avaliados quanto a intensidade dolorosa. Embora o foco maior do programa fosse na modificação de crenças, pode-se observar melhora da intensidade da dor nos pacientes do Grupo A (no Grupo B ficou estável ou piorou e Grupo C piorou). Esse dado é de certo modo intrigante, visto que nenhuma ação farmacológica a mais foi feita para modificar a intensidade da dor, mas sugere que componentes avaliativo-cognitivo e afetivo-emocional da dor podem influenciar na percepção da intensidade dolorosa1717. Urits I, Hubble A, Peterson E, Orhurhu V, Ernst CA, Kaye AD, et al. An update on cognitive therapy for the management of chronic pain: a comprehensive review. Curr Pain Headache Rep. 2019;23(8):57. doi: https://doi.org/10.1007/s11916-019-0794-9
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.

Outros autores, à semelhança do observado, demonstraram que o tratamento de exposição foi efetivo não apenas para a modificação das crenças e comportamento, mas também repercutiu na diminuição da intensidade dolorosa1818. Linton SJ, Boersma K, Jansson M, Overmeer T, Lindblom K, Vlaeyen JWS. A randomized controlled trial of exposure in vivo for patients with spinal pain reporting fear of work-related activities. Eur J Pain. 2008;12(6):722-30. doi: https://doi.org/10.1016/j.ejpain.2007.11.001
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-2020. Leonhardt C, Kuss K, Becker A, Basler HD, de Jong J, Flatau B, et al. Graded exposure for chronic low back pain in older adults: a pilot study. J Geriatr Phys Ther. 2017;40(1):51-9. doi: https://doi.org/10.1519/JPT.0000000000000083
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. Um estudo avaliou a intensidade dolorosa em seis pacientes durante dez sessões que envolviam educação e exposição e observaram que a intensidade dolorosa não aumentou durante a exposição e durante o período pré e pós- teste houve redução de 65% para dois pacientes, 14%-22% para três pacientes e somente um não apresentou alteração1313. Boersma K, Linton S, Overmeer T, Jansson M, Vlaeyen J, de Jong J. Lowering fear-avoidance and enhancing function through exposure in vivo: a multiple baseline study across six patients with back pain. Pain. 2004;108(1-2):8-16. doi: https://doi.org/10.1016/j.pain.2003.03.001
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.

Um estudo crossover, comparou dois grupos de pacientes (n=46) com lombalgia crônica, função reduzida e medo da dor e evitação do movimento: aqueles que receberam atendimento usual seguido de exposição gradual aos que receberam exposição seguida de atendimento usual. Observaram, em ambos os grupos, redução de um ponto nos escores de dor entre o pré-teste e pós-teste. Os autores não encontraram diferenças na intensidade dolorosa entre os grupos, de acordo com a ordem de tratamento recebida1818. Linton SJ, Boersma K, Jansson M, Overmeer T, Lindblom K, Vlaeyen JWS. A randomized controlled trial of exposure in vivo for patients with spinal pain reporting fear of work-related activities. Eur J Pain. 2008;12(6):722-30. doi: https://doi.org/10.1016/j.ejpain.2007.11.001
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.

Pesquisas de intervenção, envolvendo ensaios clínicos e abordagem cognitivo-comportamental conduzidos por enfermeiros são escassos na literatura. Desenhou-se um programa breve, detalhadamente descrito, de fácil execução e que pode ampliar a atuação dos enfermeiros junto a pacientes com lombalgia crônica. Enfermeiros que atuam em ambulatórios e clínicas especializadas no atendimento a esses pacientes, ao realizar a consulta de enfermagem podem incorporar na avaliação dos pacientes, os instrumentos validados para lombalgia crônica utilizados na presente pesquisa. Com base nos resultados da avaliação, o programa proposto contendo pacotes de intervenções de enfermagem, pode ser incorporado na instituição e ajustado conforme o contexto local.

Pesquisas futuras devem avaliar a existência de generalização dos efeitos da exposição e a duração do efeito. A generalização do efeito refere-se a conhecer se a maior autoeficácia e menor medo ao movimento a determinadas atividades, estenderiam-se para atividades a que os pacientes não foram expostos. A duração do efeito refere-se a quanto tempo as crenças permanecem desejáveis, após o término do programa. Outro aspecto a ser testado seria analisar o efeito da realização de exercícios após a exposição.

A dor crônica apresenta aspectos biopsicossociais, como crenças e humor, que modificam a experiência dolorosa e a funcionalidade, e precisam ser avaliados e ajustados. Estratégias de intervenção desenhadas para atuar sobre crenças disfuncionais, com eficácia comprovada na pesquisa clínica, embasam a prática de enfermagem baseada em evidências e valorizam o papel do enfermeiro.

Como limitação aponta-se a inexistência de um grupo que recebesse somente a intervenção exposição, o que permitiria isolar o efeito da exposição ao da educação.

CONCLUSÃO

No presente estudo hipotetizou-se que as Crenças de Autoeficácia e Medo da Dor e Evitação do Movimento seriam modificadas por um programa educativo e de exposição aos movimentos temidos, e essa hipótese foi confirmada. Educação somente foi tão efetiva quanto educação aliada à exposição ao movimento no aumento da Crença de Autoeficácia mas, a associação educação e exposição ao movimento foi ainda mais efetiva na diminuição da Crença de Medo da Dor e Evitação ao Movimento. Ocorreu também diminuição de pensamentos catastróficos nos Grupos A e B.

Quanto aos desfechos secundários observou-se nos Grupos A e B melhora da ansiedade, da depressão e da incapacidade. Para o desfecho dor, somente no Grupo A, o que recebeu educação associada à exposição, observou-se melhora na intensidade da dor.

O presente estudo tem várias contribuições para o avanço da pesquisa nessa área: foi pioneiro ao estabelecer como critérios de inclusão a presença de crenças de autoeficácia baixa e medo da dor e evitação do movimento elevado em pacientes com lombalgia crônica; foi inédito ao definir pontos de corte para crença “baixa” e “alta”; compararam-se duas intervenções, educativa somente e educativa associada à exposição; tanto o programa educativo como a exposição foram minuciosamente desenhados e descritos, o que pouca vezes se encontrou na literatura. Ainda, nesta pesquisa incluiu-se, de modo aleatório, significativo número de pacientes nos diferentes Grupos, diferentemente da maior parte dos estudos que analisou reduzido número de pacientes.

Nesta pesquisa as aulas em grupo e individuais foram cuidadosamente planejadas para influírem nas Crenças de Autoeficácia e Medo da Dor e Evitação do Movimento, o que talvez explique os resultados bastante positivos alcançados somente com o programa educativo.

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Editado por

Editor associado:

Cecília Helena Glanzner

Editor-chefe:

Maria da Graça Oliveira Crossetti

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Dez 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    01 Jul 2020
  • Aceito
    31 Maio 2021
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