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Functional Capacity Index: adaptação cultural e mensuração da validade e confiabilidade

RESUMO

Objetivo

Realizar adaptação cultural do Functional Capacity Index (FCI) para língua portuguesa e verificar sua confiabilidade e validade em vítimas de acidente de trânsito.

Método

Estudo metodológico para adaptação cultural do FCI. Confiabilidade e validade foram verificadas em amostra de conveniência de acidentados de trânsito, no município de São Paulo. Dados do prontuário do paciente foram coletados retrospectivamente em 2015. Confiabilidade verificada pelo coeficiente alfa de Cronbach e validade pela correlação de Spearman e teste de Mann-Whitney.

Resultados

O FCI em português foi aplicado em 50 vítimas de acidente de trânsito. A consistência interna alcançou valores de alfa de Cronbach >0,70. O FCI correlacionou com índice de Katz, não correlacionou com a gravidade do trauma e o FCI de pacientes de trauma foi superior em comparação aos sem trauma.

Conclusão

O FCI em português mostrou consistência interna satisfatória, permitindo mensurar a capacidade funcional, discriminando pessoas com e sem lesões traumáticas.

Palavras-chave
Tradução; Estudo de validação; Atividades cotidianas; Ferimentos e lesões; Acidentes de trânsito

ABSTRACT

Objective

To carry out a cultural adaptation of the Functional Capacity Index (FCI) into Portuguese and to verify its reliability and validity in traffic accident victims.

Method

Methodological study for cultural adaptation of the FCI. Reliability and validity were verified in a convenience sample of traffic accident victims, in São Paulo city. Data from the patient’s medical record were collected retrospectively in 2015. Reliability verified by Cronbach’s alpha coefficient and validity by Spearman’s correlation and Mann-Whitney test.

Results

The FCI in Portuguese was applied to 50 traffic accident victims. The internal consistency reached Cronbach’s alpha values >0.70. The FCI correlated with the Katz index, did not correlate with the severity of trauma and the FCI of trauma patients was higher compared to those without trauma.

Conclusion

The FCI in Portuguese showed satisfactory internal consistency, allowing the measurement of functional capacity, discriminating against people with and without traumatic injuries

Keywords
Translating; Validation study; Activities of daily living; Wounds and injuries; Accidents; traffic

RESUMEN

Objetivo

Realizar adaptación cultural del Índice de Capacidad Funcional (FCI) al portugués y verificar su fiabilidad y validez en víctimas de accidentes de tráfico.

Método

Estudio metodológico para adaptación cultural de FCI. Fiabilidad y validez se verificaron en muestra de conveniencia de víctimas de accidentes de tránsito, en la ciudad de São Paulo. Datos del registro del paciente se recopilaron retrospectivamente en 2015. Fiabilidad verificada por coeficiente alfa de Cronbach y validez por correlación de Spearman y prueba de Mann-Whitney.

Resultados

FCI en portugués se aplicó a 50 víctimas de accidentes de tránsito. Consistencia interna alcanzó valores alfa de Cronbach >0,70. FCI se correlacionó con índice de Katz, no se correlacionó con gravedad del trauma y FCI de pacientes con trauma fue mayor en comparación con aquellos sin trauma.

Conclusión

FCI en portugués mostró consistencia interna satisfactoria, permitiendo medir capacidad funcional, discriminando personas con y sin lesiones traumáticas.

Palabras clave
Traducción; Estudio de validación; Actividades cotidianas; Heridas y traumatismos; Accidentes de tránsito

INTRODUÇÃO

Os acidentes de trânsito (AT) são responsáveis pela elevada mortalidade e morbidade das dezenas de milhões de pessoas portadoras de lesões não fatais com incapacidade temporária ou permanente11. World Health Organization (CH) [Internet]. Geneva: WHO; c2018-2021 [cited 2019 Apr 21]. Global status report on road safety 2018; [about 1 screen]. Available from: https://www.who.int/violence_injury_prevention/road_safety_status/2018/en/
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. O impacto das lesões traumáticas nas atividades de vida diária (AVD) pode evidenciar as consequências do trauma para o paciente, a família e a sociedade, além do custo decorrente da assistência hospitalar e reabilitação22. Roshanfekr P, Khodaie-Ardakani MR, Ardakani HMA, Sajjadi H. Prevalence and socio-economic determinants of disabilities caused by road traffic accidents in Iran; a national survey. Bull Emerg Trauma. 2019 [cited 2019 Apr 21];7(1):60-6. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6360010/
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/article...
-33. Weijermars W, Bos N, Stipdonk H. Health burden of serious road injuries in the Netherlands. Traffic Inj Prev. 2016;17(8):863-9. doi: https://doi.org/10.1080/15389588.2016.1157591
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.

A habilidade do indivíduo para desempenhar atividades que permitam cuidar de si e viver de forma independente é definida como capacidade funcional (CF). Dessa forma, a incapacidade (disability) é caracterizada pela deficiência do rendimento funcional, ou seja, no desempenho das AVD44. Linden M. Definition and assessment of disability in mental disorders under the perspective of the International Classification of Functioning Disability and Health (ICF). Behav Sci Law. 2017;35(2):124-34. doi: https://doi.org/10.1002/bsl.2283
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. Instrumentos genéricos e específicos foram desenvolvidos para mensurar de forma objetiva a CF. Para os pacientes de trauma, existem instrumentos que avaliam a função física a fim de identificar déficits (incapacidade e prejuízo) e aqueles que avaliam estado de saúde e qualidade de vida abrangendo aspectos físico, psicológico, afetivo e social55. Martino C, Russo E, Santonastaso DP, Gamberini E, Bertoni S, Padovani E, et al. Long-term outcomes in major trauma patients and correlations with the acute phase. World J Emerg Surg. 2020;15:6. doi: https://doi.org/10.1186/s13017-020-0289-3
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.

O Functional Capacity Index (FCI) foi desenvolvido e validado, em 1996, nos Estados Unidos da América e disponível somente no idioma inglês66. MacKenzie EJ, Damiano A, Miller T, Luchter S. The development of the Functional Capacity Index. J Trauma. 1996;41(5):799-807. doi: https://doi.org/10.1097/00005373-199611000-00006
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. Trata-se de um instrumento específico para avaliar as funções física e cognitiva após trauma, tendo como base o conceito de CF.66. MacKenzie EJ, Damiano A, Miller T, Luchter S. The development of the Functional Capacity Index. J Trauma. 1996;41(5):799-807. doi: https://doi.org/10.1097/00005373-199611000-00006
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,77. MacKenzie EJ, Sacco WJ, Luchter S, Ditunno JF, Staz CF, Gruen GS, et al. Validating the Functional Capacity Index as a measure of outcome following blunt multiple trauma. Qual Life Res. 2002;11:797-808. doi: https://doi.org/10.1023/a:1020820017658
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O construto da CF que fundamenta o FCI é a capacidade do indivíduo para executar determinadas tarefas importantes para a vida cotidiana, sendo definida apenas em termos físicos e cognitivos, sem incluir aspectos psicossociais66. MacKenzie EJ, Damiano A, Miller T, Luchter S. The development of the Functional Capacity Index. J Trauma. 1996;41(5):799-807. doi: https://doi.org/10.1097/00005373-199611000-00006
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-77. MacKenzie EJ, Sacco WJ, Luchter S, Ditunno JF, Staz CF, Gruen GS, et al. Validating the Functional Capacity Index as a measure of outcome following blunt multiple trauma. Qual Life Res. 2002;11:797-808. doi: https://doi.org/10.1023/a:1020820017658
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.

Considerando o alcance do FCI para retratar a CF dos pacientes que sofreram lesões traumáticas não fatais e da importância de analisar e monitorar o comprometimento e o progresso da funcionalidade física e cognitiva das vítimas de trauma no Brasil, optou-se por realizar adaptação cultural do Functional Capacity Index (FCI) para língua portuguesa e verificar sua confiabilidade e validade em vítimas de acidente de trânsito.

MÉTODO

Este estudo metodológico sobre adaptação cultural e validação do FCI no português do Brasil foi realizado após a autorização concedida pela autora do instrumento e aprovação dos Comitês de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo - Unifesp (CAAE: 31111014.4.0000.5505 no aprovação do projeto: 674.527) e da Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo (CAAE: 31111014.4.3001.0086 no aprovação do projeto: 719.484). Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Functional Capacity Index

O FCI possibilita avaliar a extensão das limitações ou a capacidade reduzida em vítimas de acidente de trânsito, portadores de lesão traumática, um ano após alta hospitalar. Assim, permite monitorar o comprometimento e o progresso da funcionalidade física e cognitiva durante a reabilitação, avaliar custos e carga social resultantes da deficiência do rendimento funcional, analisar a epidemiologia das incapacidades resultantes de lesões traumáticas para aplicação de ações preventivas, controle e redução de agravos88. McMurry TL, Sherwood C, Poplin GS, Seguí-Gómez M, Crandall J. Implications of functional capacity loss and fatality for vehicle safety prioritization. Traffic Inj Prev. 2015;16 Suppl 2:S140-S145. doi: https://doi.org/10.1080/15389588.2015.1052875
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-99. McMurry TL, Poplin GS, Crandall J. Functional recovery patterns in seriously injured automotive crash victims. Traffic Inj Prev. 2016;17 Suppl 1:21-6. doi: https://doi.org/10.1080/15389588.2016.1201202
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As dimensões que compõem o FCI são: alimentação, função sexual, função excretora, deambulação, movimento das mãos e braços, flexão/elevação, função visual, função auditiva, fala e função cognitiva. Cada dimensão tem de três a seis níveis de funcionalidade que discriminam diferenças mensuráveis. Os níveis de capacidade são classificados por letras sendo “a” indicativa de perfeita funcionalidade e “b / c / d / e / f” indicativas de diferentes níveis de comprometimento da funcionalidade até a incapacidade total. A combinação das letras, de cada dimensão, define o “perfil” da limitação e permite verificar o progresso, a estabilização ou a piora da CF em diferentes intervalos de tempo. As dez dimensões do FCI compõem as questões sobre a avaliação da capacidade funcional.

A avaliação do conjunto das limitações, expressa por uma pontuação global do FCI, foi desenvolvida a partir da atribuição de pesos às dimensões e valores para cada nível de funcionalidade que refletissem o impacto do comprometimento no dia a dia. Em cada dimensão, o melhor nível de funcionalidade foi considerado zero e o pior, 100 pontos. A atribuição de valores aos níveis intermediários de funcionalidade foi realizada por um grupo de 114 representantes, de diferentes segmentos da população, com ou sem experiência em limitação da CF, para julgamento do provável impacto de cada nível na vida cotidiana. A pontuação global do FCI resulta da operação matemática entre os pesos das dimensões e os valores dos níveis de funcionalidade utilizando a fórmula:66. MacKenzie EJ, Damiano A, Miller T, Luchter S. The development of the Functional Capacity Index. J Trauma. 1996;41(5):799-807. doi: https://doi.org/10.1097/00005373-199611000-00006
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F C I = 1 - Π ( 1 - w i u i x i )

Sendo: wi = peso da dimensão e ui (xi ) = valor do nível da dimensão

Processo de Adaptação Cultural

A adaptação cultural do FCI foi realizada considerando as etapas de tradução, síntese, retrotradução, revisão por comitê de especialistas e pré-teste1010. Beaton D, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz MB. Recommendations for the cross-cultural adaptation of the DASH & QuickDASH outcome measures contributors to this document. Toronto: Institute for Work & Health; 2007 [cited 2019 Apr 21]. Available from: https://www.researchgate.net/profile/Claire-Bombardier-2/publication/265000941_Recommendations_for_the_Cross-Cultural_Adaptation_of_the_DASH_QuickDASH_Outcome_Measures_Contributors_to_this_Document/links/53fdd6140cf22f21c2f85143/Recommendations-for-the-Cross-Cultural-Adaptation-of-the-DASH-QuickDASH-Outcome-Measures-Contributors-to-this-Document.pdf
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. A tradução foi realizada de maneira independente por dois brasileiros bilíngues com fluência em inglês, denominados tradutores (T1 e T2). Os objetivos da tradução e a finalidade do instrumento foram informados ao tradutor da área da saúde (T1) com a intenção de produzir uma tradução mais equivalente em termos técnicos com o instrumento original. Ao tradutor leigo (T2), nem os objetivos do estudo e nem a finalidade do índice foram informados para se obter uma tradução compatível com a linguagem da população em geral1010. Beaton D, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz MB. Recommendations for the cross-cultural adaptation of the DASH & QuickDASH outcome measures contributors to this document. Toronto: Institute for Work & Health; 2007 [cited 2019 Apr 21]. Available from: https://www.researchgate.net/profile/Claire-Bombardier-2/publication/265000941_Recommendations_for_the_Cross-Cultural_Adaptation_of_the_DASH_QuickDASH_Outcome_Measures_Contributors_to_this_Document/links/53fdd6140cf22f21c2f85143/Recommendations-for-the-Cross-Cultural-Adaptation-of-the-DASH-QuickDASH-Outcome-Measures-Contributors-to-this-Document.pdf
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. As versões original e traduzida foram comparadas e analisadas concomitantemente por um professor de línguas e um pesquisador com experiência em tradução e adaptação de instrumentos para consenso e obtenção da versão traduzida (VT).

Para a retrotradução, a VT foi entregue a outros dois tradutores profissionais bilíngues, um brasileiro (RT1) e um norte-americano (RT2), que trabalharam independentemente. A versão retrotraduzida (VRT) resultou do consenso dos mesmos dois profissionais da etapa anterior.

A análise da equivalência do instrumento traduzido com o original foi realizada em encontro presencial por um Comitê de Especialistas com seis integrantes: um médico com título de mestre e experiência superior a cinco anos em reabilitação e trauma; um professor de línguas português/inglês com formação de nível superior, título de doutor e experiência acima de cinco anos em ensino; duas enfermeiras com título de doutor e pesquisadoras com cinco anos ou mais de experiência em adaptação cultural e análise de conceito; uma enfermeira com título de doutor e pesquisadora em trauma com mais de cinco anos de experiência; e, uma enfermeira com mais de cinco anos de experiência em cuidados intensivos e trauma. A versão original do FCI, a VT e a VRT foram entregues aos especialistas para a versão final do instrumento em português. Os membros analisaram as equivalências semântica, idiomática, cultural e conceitual para a versão definitiva1010. Beaton D, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz MB. Recommendations for the cross-cultural adaptation of the DASH & QuickDASH outcome measures contributors to this document. Toronto: Institute for Work & Health; 2007 [cited 2019 Apr 21]. Available from: https://www.researchgate.net/profile/Claire-Bombardier-2/publication/265000941_Recommendations_for_the_Cross-Cultural_Adaptation_of_the_DASH_QuickDASH_Outcome_Measures_Contributors_to_this_Document/links/53fdd6140cf22f21c2f85143/Recommendations-for-the-Cross-Cultural-Adaptation-of-the-DASH-QuickDASH-Outcome-Measures-Contributors-to-this-Document.pdf
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. Após essa etapa, o pré-teste foi realizado para verificar a compreensão dos termos da versão traduzida em 30 pacientes1010. Beaton D, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz MB. Recommendations for the cross-cultural adaptation of the DASH & QuickDASH outcome measures contributors to this document. Toronto: Institute for Work & Health; 2007 [cited 2019 Apr 21]. Available from: https://www.researchgate.net/profile/Claire-Bombardier-2/publication/265000941_Recommendations_for_the_Cross-Cultural_Adaptation_of_the_DASH_QuickDASH_Outcome_Measures_Contributors_to_this_Document/links/53fdd6140cf22f21c2f85143/Recommendations-for-the-Cross-Cultural-Adaptation-of-the-DASH-QuickDASH-Outcome-Measures-Contributors-to-this-Document.pdf
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.

Mensuração da Confiabilidade e da Validade

A confiabilidade e a validade do FCI em português foram realizadas numa amostra de conveniência com pessoas que sofreram acidente de trânsito, maiores de 18 anos, atendidas e internadas no Hospital Universitário/Unifesp, que tiveram alta hospitalar há um ano. Os acidentados de trânsito sem lesões anatômicas ou que foram dispensados no pronto-socorro (PS) não foram incluídos na amostra. A seleção de pacientes foi realizada a partir da listagem de internações do PS de março/2014 retroagindo até outubro/2013. Do total de 4.278 internações no período, somente 278 pacientes atendidos no PS possuíam fichas digitalizadas e o motivo do atendimento pôde ser verificado. Desses, 112 relacionavam-se a acidentes de trânsito e seus prontuários foram consultados. Devido à impossibilidade de contato telefônico e/ou dados incorretos no prontuário, uma amostra de conveniência com 50 pacientes foi constituída. A coleta de dados foi realizada de março a junho de 2015, em formulário próprio com dados de identificação, sociodemográficos (idade, sexo e escolaridade), data do evento, lesões anatômicas e o FCI traduzido.

O FCI foi aplicado em entrevista via ligação telefônica com gravação, como no estudo original66. MacKenzie EJ, Damiano A, Miller T, Luchter S. The development of the Functional Capacity Index. J Trauma. 1996;41(5):799-807. doi: https://doi.org/10.1097/00005373-199611000-00006
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-77. MacKenzie EJ, Sacco WJ, Luchter S, Ditunno JF, Staz CF, Gruen GS, et al. Validating the Functional Capacity Index as a measure of outcome following blunt multiple trauma. Qual Life Res. 2002;11:797-808. doi: https://doi.org/10.1023/a:1020820017658
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. No contato telefônico, inicialmente, a pesquisadora se apresentava e fazia a leitura do termo de consentimento livre e esclarecido. Após o aceite do paciente para participar da pesquisa, realizava-se a leitura de cada dimensão e seus respectivos níveis, sendo repetida sempre que necessário.

A confiabilidade do FCI em português foi verificada pela análise da consistência interna1111. Souza AC, Alexandre NMC, Guirardello EB. Psychometric properties in instruments evaluation of reliability and validity. Epidemiol Serv Saude. 2017;26(3):649-59. doi: https://doi.org//10.5123/s1679-49742017000300022
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. Para verificar se o instrumento estava congruente com as propriedades do objeto a ser mensurado, foram analisadas as validades de critério do tipo concorrente e de construto do tipo discriminante e convergente1111. Souza AC, Alexandre NMC, Guirardello EB. Psychometric properties in instruments evaluation of reliability and validity. Epidemiol Serv Saude. 2017;26(3):649-59. doi: https://doi.org//10.5123/s1679-49742017000300022
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. Na validade de critério concorrente, verificou-se a correlação dos escores do instrumento traduzido com escores de outra medida similar, considerando-o como padrão ouro, que avalia a independência do indivíduo para realizar as AVD, o Índice de Independência nas Atividades de Vida Diária - Índice de Katz1212. Lino VTS, Pereira SRM, Camacho LAB, Ribeiro Filho ST, Buksman S. [Cross-cultural adaptation of the Independence in Activities of Daily Living Index (Katz Index)]. Cad Saude Publica. 2008; 24(1):103-12. Portuguese. doi: https://doi.org/10.1590/S0102-311X2008000100010
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, ou seja, se os resultados do FCI corresponderam aos do Índice de Katz1111. Souza AC, Alexandre NMC, Guirardello EB. Psychometric properties in instruments evaluation of reliability and validity. Epidemiol Serv Saude. 2017;26(3):649-59. doi: https://doi.org//10.5123/s1679-49742017000300022
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Para análise da validade de construto discriminante, ou seja, para verificar se o construto do FCI não está indevidamente relacionado com construto do qual deveria divergir1111. Souza AC, Alexandre NMC, Guirardello EB. Psychometric properties in instruments evaluation of reliability and validity. Epidemiol Serv Saude. 2017;26(3):649-59. doi: https://doi.org//10.5123/s1679-49742017000300022
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, além do grupo de pacientes de acidente de trânsito (grupo “acidentados”), outro grupo de igual tamanho e sem história prévia de trauma (grupo “não acidentados”) foi entrevistado. Essas pessoas estavam cadastradas na Unidade Básica de Saúde com o modelo de Estratégia de Saúde da Família, da região sudeste do município de São Paulo. Os critérios de seleção foram ter idade maior que 18 anos e não serem portadores de doenças que comprometessem a CF (por ex. insuficiência cardíaca congestiva, acidente vascular encefálico, doença de Parkinson, Alzheimer e demência). A seleção do grupo não acidentados considerou pareamento individual por sexo, idade (5 anos a mais ou a menos dos pacientes do grupo acidentados) e escolaridade. Os objetivos do estudo foram apresentados aos participantes da pesquisa e o FCI foi aplicado por contato telefônico.

Para a validade de construto convergente1111. Souza AC, Alexandre NMC, Guirardello EB. Psychometric properties in instruments evaluation of reliability and validity. Epidemiol Serv Saude. 2017;26(3):649-59. doi: https://doi.org//10.5123/s1679-49742017000300022
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, a gravidade do trauma, mensurada com o Injury Severity Score (ISS), foi utilizada como construto relacionado para verificar sua correlação com a CF resultante um ano após o acidente de trânsito. A correlação foi realizada para verificar se quanto maior a gravidade do trauma maior comprometimento da CF. O ISS é um índice anatômico amplamente utilizado na determinação da gravidade do trauma por correlacioná-lo com sobrevivência e mortalidade. O cálculo do ISS tem como base a gravidade de três lesões mais graves em diferentes regiões corpóreas. A gravidade das lesões é definida no dicionário da Abbreviated Injury Scale (AIS), cujos níveis de gravidade AIS variam de 1 (leve), 2 (séria), 3 (moderada), 4 (grave), 5 (crítica) a 6 (potencialmente fatal). A gravidade do trauma é proporcional ao incremento da pontuação ISS que varia de 1 a 751313. Association for the Advancement of Automotive Medicine (US). The Abbreviated Injury Scale (AIS): 2005 Revision, Update 2008. Des Plaines, IL: AAAM; 2008. .

Para a análise do grau de concordância entre os especialistas, foi utilizado o Índice de Validade de Conteúdo (IVC), considerando aceitável valores acima de 90,0%1111. Souza AC, Alexandre NMC, Guirardello EB. Psychometric properties in instruments evaluation of reliability and validity. Epidemiol Serv Saude. 2017;26(3):649-59. doi: https://doi.org//10.5123/s1679-49742017000300022
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. A confiabilidade do FCI foi realizada com o Coeficiente Alfa de Cronbach, considerando valor de alfa acima de 0,7 (α > 0,7) como mínimo aceitável para afirmar que o instrumento é confiável1111. Souza AC, Alexandre NMC, Guirardello EB. Psychometric properties in instruments evaluation of reliability and validity. Epidemiol Serv Saude. 2017;26(3):649-59. doi: https://doi.org//10.5123/s1679-49742017000300022
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,1414. Heale R, Twycross A. Validity and reliability in quantitative studies. Evid Based Nurs. 2015;18(3):66-7. doi: https://doi.org/10.1136/eb-2015-102129
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. Para a validade de critério do tipo concorrente (escores FCI versus escores do índice de Katz) e de construto convergente (escores FCI versus escores ISS), aplicou-se o teste de correlação de Spearman. Para verificar a homogeneidade entre os grupos acidentados e não acidentados, foi utilizado o teste t-Student ou Mann-Whitney para variáveis contínuas e qui-quadrado para variáveis categóricas. A análise da validade de construto discriminante foi realizada por meio do teste de Mann-Whitney, comparando-se os postos dos escores FCI derivados das respostas dos indivíduos do grupo acidentados e não acidentados a respeito da sua capacidade funcional. O nível de significância estatística considerado nas análises foi de 5%.

RESULTADOS

Nas versões traduzidas, oito itens discordantes foram observados nas dimensões função excretora, inclinação/elevação, fala e função cognitiva. O consenso nos itens discordantes foi facilmente alcançado, pois eram palavras sinônimas e redação de estilos diferentes sem alterar o significado do texto, definindo-se, assim, a VT. Na VRT, seis itens discordantes nas dimensões deambulação, função auditiva e função visual foram identificadas, porém as palavras diferentes tinham significados semelhantes às originais. A análise da VRT indicou boa qualidade das versões traduzidas e da síntese.

Na verificação das equivalências semântica, idiomática, cultural e conceitual pelo Comitê de Especialistas, do total de 58 itens analisados (título, dimensões e níveis de funcionalidade), 28 (48,3%) apresentaram taxa de concordância menor que 90,0%. Na segunda reunião do Comitê, 53 itens (91,4%) obtiveram consenso acima de 90,0% e cinco (8,6%) não alcançaram a taxa de concordância pré-estabelecida, devido a discordância de um especialista. Apesar disso, prevaleceu o texto definido pela maioria dos membros do Comitê.

A denominação em português do FCI foi Índice de Capacidade Funcional. Contudo, para manter uma linguagem reconhecida internacionalmente, a denominação em inglês e a sigla FCI foram mantidas. Os produtos do processo de adaptação cultural foram enviados para a autora do FCI.

Na etapa do pré-teste, os entrevistados relataram que o significado foi claramente compreendido após a leitura de cada nível das dimensões e sugeriram que a palavra “locomoção” fosse mencionada entre parênteses na dimensão deambulação e as palavras “funcionamento do intestino e/ou da bexiga” fossem apresentadas entre parênteses na dimensão função excretora.

A versão final do FCI em português está apresentada no figura 1.

Figura 1 -
Versão final do Functional Capacity Index, traduzido e adaptado para o português do Brasil, São Paulo/SP, 2015

A confiabilidade e a validade foram verificadas numa amostra de 50 vítimas de acidente de trânsito com média de idade de 35 anos (DP 12,8), 60,0% eram adultos jovens com idade entre 18 e 34 anos, 88,0% do sexo masculino e 50,0% com escolaridade de nível médio completo/incompleto. A maioria dos pacientes (62,0%) sofreu acidente de motocicleta e ficaram internados de 2 a 14 dias (62,0%). As regiões corpóreas mais acometidas foram os membros inferiores (26,3%) e a cabeça (16,0%), sendo que 48,0% das lesões foram classificadas como sendo de gravidade moderada, de acordo com a AIS. O ISS indicou nível de gravidade global do trauma como leve e moderado em 82,0% dos pacientes.

A tabela 1 mostra que os valores do Alfa de Cronbach das dimensões do FCI foram acima de 0,7, contribuindo de maneira semelhante para o valor total da confiabilidade do instrumento, que se mostrou satisfatória.

Tabela 1 -
Consistência interna do FCI traduzido para a língua portuguesa, São Paulo/SP, 2015

Na validade de critério concorrente, os valores do FCI correlacionaram-se de forma fraca mas significante com os valores do índice de Katz (r = 0,387 e p = 0,006), ou seja, quanto menor o escore Katz, menor o valor do FCI. Quanto à validade de construto convergente, os valores do FCI não correlacionaram com os escores do ISS (r = - 0,118 e p = 0,415).

Para a validade de construto discriminante, os grupos acidentados e não acidentados foram estatisticamente semelhantes conforme mostra a Tabela 2.

Tabela 2 -
Grupos acidentados e não acidentados segundo as variáveis idade, sexo e escolaridade. São Paulo/SP, 2015

Na análise da validade de construto discriminante, observou-se que os valores do FCI foram estatisticamente superiores no grupo acidentados em comparação ao grupo não acidentados (média FCI: 35,5 vs 5,6; p<0,001), discriminando-os.

DISCUSSÃO

A adaptação cultural do FCI para obtenção da versão brasileira foi satisfatória, observando-se que os pacientes compreenderam claramente o significado dos termos apresentados.

A validação da FCI em português foi realizada com uma amostra de características similares com as do instrumento original66. MacKenzie EJ, Damiano A, Miller T, Luchter S. The development of the Functional Capacity Index. J Trauma. 1996;41(5):799-807. doi: https://doi.org/10.1097/00005373-199611000-00006
https://doi.org/10.1097/00005373-1996110...
-77. MacKenzie EJ, Sacco WJ, Luchter S, Ditunno JF, Staz CF, Gruen GS, et al. Validating the Functional Capacity Index as a measure of outcome following blunt multiple trauma. Qual Life Res. 2002;11:797-808. doi: https://doi.org/10.1023/a:1020820017658
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, assim como as entrevistas que foram realizadas por meio de contato telefônico, com aproximadamente a mesma duração de nove minutos.

Neste estudo, os valores de alfa de Cronbach de todas as dimensões se mostraram satisfatórias (α >0,7), indicando que o FCI é um instrumento estável e confiável para utilização em pacientes que sofreram acidente de trânsito. Estudos realizados com FCI não verificaram sua consistência interna com esse coeficiente, não sendo possível comparar os resultados. Estudos futuros aplicando-se o FCI em pacientes com maior gravidade do trauma ou que sofreram outros mecanismos de trauma, além de aplicação presencial, poderiam revelar outros valores de alfa, indicando maior ou menor consistência.

Na validade de critério concorrente, observou-se correlação entre o FCI e o Katz, ou seja, quanto menor o comprometimento da CF, maior é a independência para realizar as AVD. Considerando-se que a amostra foi constituída predominantemente de pacientes com trauma leve a moderado, o escore FCI mostrou que havia pacientes com pouco comprometimento da CF, possibilitando o retorno às AVD. Assim, a correlação com o Katz confirmou o desempenho do FCI em mensurar a CF nos indivíduos avaliados, corroborando com o pressuposto da validade de critério concorrente.

Vale lembrar que o Katz foi desenvolvido para avaliar o estado funcional do idoso para realizar seis atividades de forma independente1212. Lino VTS, Pereira SRM, Camacho LAB, Ribeiro Filho ST, Buksman S. [Cross-cultural adaptation of the Independence in Activities of Daily Living Index (Katz Index)]. Cad Saude Publica. 2008; 24(1):103-12. Portuguese. doi: https://doi.org/10.1590/S0102-311X2008000100010
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. O Katz tem sido utilizado amplamente para avaliar a independência do indivíduo para realizar as AVD pós alta hospitalar, incluindo-se os pacientes críticos1515. Vieira RCA, Paiva WS, Oliveira DV, Guirado VMP, Lança EFC, Sousa RMC. Recovery of patients with pure diffuse axonal injury who remained in a coma for 6 hours or more. World Neurosurg. 2018;109:140-6. doi: https://doi.org/10.1016/j.wneu.2017.09.101
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-1616. Mafra JMS, Silva JM, Silveira LTY, Tanaka C, Fu C. Age and severity of disease compromising the functional status recovery of critically ill patients after hospital discharge: an observational study. Br J Med Med Res. 2015;9(2):1-10. doi: https://doi.org/10.9734/BJMMR/2015/18456
https://doi.org/10.9734/BJMMR/2015/18456...
. Apesar da correlação entre o FCI e o Katz, chamou a atenção quinze casos de pacientes com escores FCI elevados e escores Katz iguais a zero. Provavelmente, a explicação plausível é por se tratar de pacientes que apresentavam limitações em dimensões não contempladas no Katz, tais como função sexual, deambulação, inclinação/elevação, movimentação das mãos/braços e função cognitiva. Apesar desses instrumentos medirem construtos similares, apresentam diferenças nos seus componentes, podendo repercutir nos resultados da avaliação de suas propriedades.

Na validade de construto discriminante, o FCI distinguiu condições que são reconhecidas como opostas. Algumas considerações são necessárias, pois apesar dos grupos terem sido discriminados, pacientes que não sofreram acidentes de trânsito podem apresentar CF comprometida devido a comorbidades ou à idade. Os resultados do FCI devem ser analisados com cautela, pois a incapacidade pode ser decorrente de doença crônica e não ser consequência de lesão traumática. Convém lembrar que as definições de funcionalidade na avaliação do estado funcional devem ser observadas tanto para crianças quanto para idosos1212. Lino VTS, Pereira SRM, Camacho LAB, Ribeiro Filho ST, Buksman S. [Cross-cultural adaptation of the Independence in Activities of Daily Living Index (Katz Index)]. Cad Saude Publica. 2008; 24(1):103-12. Portuguese. doi: https://doi.org/10.1590/S0102-311X2008000100010
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-1313. Association for the Advancement of Automotive Medicine (US). The Abbreviated Injury Scale (AIS): 2005 Revision, Update 2008. Des Plaines, IL: AAAM; 2008. .

Na validade de construto convergente, esperava-se que quanto maior a gravidade do trauma (ISS), maior seria o comprometimento funcional (FCI), mas a correlação não foi constatada. Acredita-se que a diferença de tempo na aplicação de cada índice justifica a ausência de correlação entre eles, uma vez que o ISS foi calculado a partir dos registros hospitalares durante a internação (fase aguda) e o FCI foi aplicado um ano após a alta hospitalar. A recuperação do paciente está relacionada a múltiplos fatores, tais como as condições clínicas do paciente, a estrutura da instituição de atendimento e o acompanhamento pós alta hospitalar, podendo comprometer em menor ou maior escala a capacidade do indivíduo após um ano.

É importante ressaltar que o ISS é um índice anatômico utilizado para determinar a gravidade do trauma com base no potencial de ameaça imediata à vida, portanto, não foi desenvolvido para predizer a CF relacionada à saúde pós-trauma. Outro aspecto a ser considerado, foi o predomínio de lesões leve, moderada ou séria na amostra. Uma opção para verificar a CF relacionada às lesões dos pacientes conforme a gravidade, seria analisar o acometimento ou a recuperação da funcionalidade de acordo com a região corpórea comprometida1313. Association for the Advancement of Automotive Medicine (US). The Abbreviated Injury Scale (AIS): 2005 Revision, Update 2008. Des Plaines, IL: AAAM; 2008. .

Ainda existem poucos estudos que avaliam exclusivamente a CF de pessoas que sofreram acidente de trânsito e seu retorno às atividades, sendo mais comum os estudos referentes à qualidade de vida relacionada à saúde que podem analisar a CF como um dos itens77. MacKenzie EJ, Sacco WJ, Luchter S, Ditunno JF, Staz CF, Gruen GS, et al. Validating the Functional Capacity Index as a measure of outcome following blunt multiple trauma. Qual Life Res. 2002;11:797-808. doi: https://doi.org/10.1023/a:1020820017658
https://doi.org/10.1023/a:1020820017658...
-99. McMurry TL, Poplin GS, Crandall J. Functional recovery patterns in seriously injured automotive crash victims. Traffic Inj Prev. 2016;17 Suppl 1:21-6. doi: https://doi.org/10.1080/15389588.2016.1201202
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,1717. Gabbe BJ, Simpson PM, Cameron PA, Ponsford J, Lyons RA, Collie A, et al. Long-term health status and trajectories of seriously injured patients: a population-based longitudinal study. PLoS Med 2017;14(7):e1002322. doi: https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1002322
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-2020. Gabbe BJ, Simpson PM, Harrison JE, Lyons RA, Ameratunga S, Ponsford J, et al. Return to work and functional outcomes after major trauma: who recovers, when, and how well? Ann Surg. 2016;263(4):623-32. doi: https://doi.org/10.1097/SLA.0000000000001564
https://doi.org/10.1097/SLA.000000000000...
. Dessa forma, devido à pequena quantidade de artigos utilizando-se o FCI, ressalta-se a importância da aplicação desse instrumento em diferentes contextos para avaliar e aprimorar o desempenho do índice.

CONCLUSÕES

A adaptação cultural do FCI, como instrumento de medida da CF de vítimas de acidente de trânsito um ano após a alta hospitalar, permitiu concluir que a aplicação da versão traduzida e adaptada ao português brasileiro mostrou resultados satisfatórios quanto a consistência interna, correlação com outro índice que avalia a CF e discriminação da CF entre pessoas com e sem lesões traumáticas.

Com vistas a ampliar a análise do desempenho do FCI, sugere-se pesquisas futuras para a aplicação em pessoas com diferentes tipos de trauma, seja contuso, penetrante ou queimadura.

Algumas limitações encontradas neste estudo devem ser relatadas. Primeiramente, a pesquisa foi realizada em um único centro, dificultando a composição da amostra com um número maior de pacientes que sofreram acidente de trânsito, considerando o cálculo do tamanho da amostra nos diferentes níveis de gravidade do trauma. Segundo, apesar das seis tentativas de contato telefônico em dias e horários diferentes, houve grande dificuldade de encontrar os pacientes após um ano da alta hospitalar, principalmente pela elevada quantidade de números de telefone incorretos. Sabe-se que em poucas residências há telefone fixo, a maioria das pessoas possui telefone móvel e a mudança do número é relativamente frequente, impossibilitando o contato. Além disso, a pesquisa via contato telefônico ainda é pouco utilizada no Brasil, fazendo com que muitas pessoas fiquem receosas, recusando-se em participar. Terceiro, a entrevista telefônica limita o entrevistador às respostas que está ouvindo e, às vezes, o entrevistado pode omitir alguma informação ou ter uma interpretação errônea; presencialmente, isso poderia ser percebido pelo entrevistador que, consequentemente, repetiria a pergunta. E, por fim, a validação do constructo do FCI traduzido para analisar seu modelo estrutural, por meio da análise fatorial confirmatória, não foi verificada e deverá ser explorada futuramente.

A contribuição deste estudo foi adaptar à realidade brasileira um instrumento específico para pacientes de trauma, capaz de avaliar as limitações físicas e cognitivas. Ressalta-se que a repercussão do trauma na saúde do indivíduo é mais abrangente, com consequências psicossociais tanto para a vítima de trauma quanto para seus familiares. Desta forma, o FCI deve ser associado a outros instrumentos, permitindo uma análise mais ampla, que aborde além da recuperação funcional e cognitiva, contemplando a recuperação emocional, bem como o seu retorno à sociedade, ambos determinantes da qualidade de vida do indivíduo.

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Editado por

Editor associado

Graziella Aliti

Editor-chefe

Maria da Graça Oliveira Crossetti

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Nov 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    05 Ago 2020
  • Aceito
    02 Ago 2021
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