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Fatores relacionados à dor musculoesquelética de enfermeiros no âmbito hospitalar: estudo transversal

RESUMO

Objetivo

Analisar a relação entre dor musculoesquelética e variáveis sociodemográficas e laborais de enfermeiros no âmbito hospitalar.

Método

Pesquisa transversal, descritiva, realizada de dezembro/2019 a março/2020 com 83 enfermeiros de um hospital. Avaliadas características sociodemográficas e laborais relacionadas com a dor e analisadas com estatística descritiva e inferencial.

Resultados

75,9% apresentaram dor, formigamento e dormência no último ano. Regiões mais acometidas: pescoço, parte superior das costas e ombros; 36% avaliaram sua dor como moderada e 14,6%, intensa; verificada diferença estatística significativa entre intensidade da dor e jornada diária (p = 0,046) e turno de trabalho (p = 0,029).

Conclusão

Enfermeiros sentem dor musculoesquelética em diversas regiões anatômicas e a intensidade da mesma está relacionada com o tempo de formação e atuação na enfermagem, turno e carga horária semanal de trabalho.

Palavras-chave
Saúde do trabalhador; Dor; Enfermeiras e enfermeiros; Hospitais; Assistência hospitalar; Segurança do paciente

ABSTRACT

Objective

To analyze the relationship between musculoskeletal pain and sociodemographic and labor variables of nurses in the hospital setting.

Method

Cross-sectional, descriptive research, carried out from December/2019 to March/2020, with 83 nurses from a philanthropic hospital. Sociodemographic, labor, pain-related characteristics were assessed and analyzed with descriptive and inferential statistics.

Results

75.9% had pain, tingling and numbness in the last year. Most affected regions: neck, upper back, and shoulders; 36% rated their pain as moderate and 14.6% severe; Nurses who work 8 hours a day, 40/44 hours a week and work at night, assessed their pain with greater intensity; there was a correlation between pain intensity and daily working hours (p = 0.046) and work shift (p = 0.029).

Conclusion

Nurses feel musculoskeletal pain in several anatomical regions and its intensity is related to the training time and acting in nursing, shift and weekly workload.

Keywords
Occupational health; Pain; Nurses; Hospitals; Hospital care; Patient safety

RESUMEN

Objetivo

Analizar la relación entre el dolor musculoesquelético y las variables sociodemográficas y laborales del enfermero en el ámbito hospitalario.

Método

Investigación descriptiva transversal, realizada de diciembre/2019 a marzo/2020, con 83 enfermeros de un hospital filantrópico. Las características sociodemográficas, laborales y relacionadas con el dolor fueron evaluadas y analizadas con estadística descriptiva e inferencial. Resultados: El 75,9% presentó dolor, hormigueo y entumecimiento en el último año. Regiones más afectadas: cuello, espalda alta y hombros; El 36% calificó su dolor como moderado y el 14,6% severo; Las enfermeras que trabajan 8 horas al día, 40/44 horas a la semana y trabajan de noche, valoraron su dolor con mayor intensidad; hubo correlación entre la intensidad del dolor y la jornada laboral diaria (p = 0,046) y el turno de trabajo (p = 0,029).

Conclusión

Los enfermeros experimentan dolor musculoesquelético en varias regiones anatómicas y su intensidad está relacionada con el tiempo transcurrido desde la formación y actuación en enfermería turno y la carga de trabajo semanal.

Palabras clave
Salud laboral; Dolor; Enfermeras y enfermeros; Hospitales; Atención hospitalaria; Seguridad del paciente

INTRODUÇÃO

A saúde do trabalhador busca compreender as relações entre trabalho e processos de saúde/doença. Nessa acepção, fatores institucionais, humanos e clínicos, como exigência de maior produtividade, precarização e intensificação do trabalho, déficit de pessoal, fragilidades nas relações, aumento das internações, tempo de permanência e mortalidade, são preditores de adoecimento laboral11. Arboit EL, Camponogara S, Freitas EO. Fatores relacionados à intensificação do trabalho da enfermagem hospitalar. Res Soc Dev. 2021;10(1):e22210111703. doi: https://doi.org/10.33448/rsd-v10i1.11703
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. Nesse ínterim, a dor musculoesquelética constitui importante problema na saúde do trabalhador em diferentes faixas etárias e graus de incapacidade funcional, traduzidas por absenteísmo, afastamentos permanentes, altos custos de tratamento e indenizações22. Silva JF, Silva HF, Granadeiro DS, Raimundo DD, Vieira GC, Granadeiro RMA, et al. Sintomas osteomusculares relacionados ao trabalho: implicações para a enfermagem. Res Soc Dev. 2020;9(9):e356997237. doi: https://doi.org/10.33448/rsd-v9i9.7237
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Conceituada como uma consequência de agravos do sistema musculoesquelético33. Oliveira VC, Almeida RJ. Aspectos que determinam as doenças osteomusculares em profissionais de enfermagem e seus impactos psicossociais. J Health Sci. 2017;19(2):130-5. doi: https://doi.org/10.17921/2447-8938.2017v19n2p130-135
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, na enfermagem, a dor musculoesquelética resulta de exigências para o desempenho da assistência e do desgaste físico decorrente da atividade profissional44. Petersen RS, Marziale MHP. Analysis of work capacity and stress among nursing professionals with musculoskeletal disorders. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(3):e67184. doi: https://doi.org/10.1590/1983-1447.2017.03.67184
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) e, acomete, principalmente, as regiões cervical, torácica e lombar55. Silva TPD, Araújo WN, Stival MM, Toledo AM, Burke TN, Carregaro RL. Musculoskeletal discomfort, work ability and fatigue in nursing professionals working in a hospital environment. Rev Esc Enferm USP. 2018;52:e03332. doi: https://doi.org/10.1590/s1980-220x2017022903332
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. A assistência de enfermagem demanda atividades manuais que exigem força e destreza física, as quais favorecem a ocorrência de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT) e lesões por esforços repetitivos (LER), com diferentes graus de incapacidade66. Silva VLS, Camelo SHH, Soares MI, Resck ZMR, Chaves LDP, Santos FC, et al. Leadership practices in hospital nursing: a self of manager nurses. Rev Esc Enferm USP. 2017;51:e03206. doi: https://doi.org/10.1590/s1980-220x2016099503206
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Mundialmente, a enfermagem conta com cerca de 28 milhões de profissionais77. World Health Organization [Internet]. WHO and partners call for urgent investment in nurses. Geneva: WHO; 2020 [cited 2021 Feb 8]. Available from: https://www.who.int/es/news/item/07-04-2020-who-and-partners-call-for-urgent-investment-in-nurses
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. No Brasil, a profissão é representada por cerca de 2,2 milhões de profissionais, dos quais mais de 558 mil enfermeiros, e grande parte atua na rede hospitalar88. Conselho Federal de Enfermagem [Internet]. Relatório da OMS destaca papel da enfermagem no mundo. Brasília: COFEN; 2020 [cited 2021 Feb 8]. Available from: http://www.cofen.gov.br/relatorio-da-oms-destaca-papel-da-enfermagem-no-mundo_78751.html
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. Nesse sentido, estudos sobre a saúde física e psíquica desses trabalhadores são relevantes, visto que doenças ocupacionais impactam nos diferentes âmbitos (pessoal, familiar, social e laboral) da vida do indivíduo, interferem no cuidado e na segurança do paciente e têm repercussões na rede de atenção à saúde.

A tensão psicológica vivenciada pela enfermagem, aliada ao esforço físico do trabalho, contribui para o adoecimento33. Oliveira VC, Almeida RJ. Aspectos que determinam as doenças osteomusculares em profissionais de enfermagem e seus impactos psicossociais. J Health Sci. 2017;19(2):130-5. doi: https://doi.org/10.17921/2447-8938.2017v19n2p130-135
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. A vulnerabilidade da enfermagem a distúrbios musculoesqueléticos está relacionada às condições de trabalho, que envolvem ritmo acelerado, subdimensionamento de pessoal, fragmentação de tarefas, posturas inadequadas, força física excessiva e jornadas prolongadas, fatores determinantes de agravos musculoesqueléticos que evoluem para limitações laborais55. Silva TPD, Araújo WN, Stival MM, Toledo AM, Burke TN, Carregaro RL. Musculoskeletal discomfort, work ability and fatigue in nursing professionals working in a hospital environment. Rev Esc Enferm USP. 2018;52:e03332. doi: https://doi.org/10.1590/s1980-220x2017022903332
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Em estudo com 27 enfermeiros e 83 técnicos/auxiliares de enfermagem em um hospital público, foi verificada associação entre doenças musculoesqueléticas e redução da capacidade para o trabalho33. Oliveira VC, Almeida RJ. Aspectos que determinam as doenças osteomusculares em profissionais de enfermagem e seus impactos psicossociais. J Health Sci. 2017;19(2):130-5. doi: https://doi.org/10.17921/2447-8938.2017v19n2p130-135
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. Destaca-se a necessidade de medidas de apoio e de controle de riscos para prevenir o adoecimento e promover a saúde do profissional de enfermagem, e a importância de ações e intervenções educativas com esses trabalhadores a partir de evidências sobre capacidade para o trabalho, estresse e distúrbios musculoesqueléticos44. Petersen RS, Marziale MHP. Analysis of work capacity and stress among nursing professionals with musculoskeletal disorders. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(3):e67184. doi: https://doi.org/10.1590/1983-1447.2017.03.67184
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A identificação de distúrbios musculoesqueléticos atrelados às condições de trabalho na enfermagem subsidia gestores e colaboradores na busca por soluções a fim de reduzir a ocorrência desses agravos99. Sousa FCA, Tinoco KF, Siqueira HDS, Oliveira EH, Silva WC, Rodrigues LAS. Lesões músculo esqueléticas relacionadas ao trabalho da enfermagem. Res Soc Dev. 2020;9(1):e78911656. doi: https://doi.org/10.33448/rsd-v9i1.1656
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. Dentre as estratégias que podem ser utilizadas, são explicitadas a análise ergonômica do ambiente laboral, a disponibilidade de recursos tecnológicos que reduzam o esforço físico e posturas prejudiciais, o dimensionamento de pessoal adequado à demanda assistencial, a educação continuada do trabalhador para adesão às medidas preventivas, a garantia de direitos trabalhistas e o investimento em pesquisas relacionadas à temática99. Sousa FCA, Tinoco KF, Siqueira HDS, Oliveira EH, Silva WC, Rodrigues LAS. Lesões músculo esqueléticas relacionadas ao trabalho da enfermagem. Res Soc Dev. 2020;9(1):e78911656. doi: https://doi.org/10.33448/rsd-v9i1.1656
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Essas considerações, aliadas ao posicionamento dos autores, demonstram a relevância desta pesquisa, na medida em que a dor musculoesquelética pode ser prevenida ou tratada precocemente e, dessa forma, preservar a saúde dos trabalhadores da enfermagem, bem como a qualidade da assistência prestada por esses profissionais e pela organização hospitalar como um todo. Assim, objetiva-se, com o presente estudo, analisar a relação entre dor musculoesquelética e variáveis sociodemográficas e laborais de enfermeiros no âmbito hospitalar.

MÉTODO

A construção e o relato deste estudo se deram em conformidade às diretrizes do Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE), recomendado para estudos observacionais.

Trata-se de um estudo exploratório, transversal e analítico, desenvolvido em um hospital filantrópico, com 208 leitos, referência macrorregional em saúde para 125 municípios da região noroeste do estado do Rio Grande do Sul. A população-alvo do estudo compreendeu 90 enfermeiros.

Não foi realizado cálculo de tamanho amostral, uma vez que todos os enfermeiros da instituição eram elegíveis e foram convidados a participar da pesquisa. Contudo, do total de 90 profissionais elegíveis, aceitaram participar do estudo 83(92,2%). Este quantitativo possibilita inferir que tais dados apresentam nível de confiança de 95% e erro amostral de 3%, o que demonstra reprodutibilidade dos dados coletados.

Em relação aos critérios de elegibilidade, foram considerados como critérios de inclusão ser enfermeiro e atuar na instituição. Foram excluídos cinco enfermeiros que no período da coleta de dados estavam em férias e afastados por doença ou licença maternidade e dois que não aceitaram participar.

Utilizou-se um questionário sociodemográfico, clínico e laboral elaborado pelas pesquisadoras que contempla as variáveis sexo, idade, estado civil, filhos, tempo de formado, cursos de pós-graduação, cargo, tempo de atuação na profissão, turno de trabalho, carga horária, unidade de trabalho, estado de saúde, prática de atividade física, tempo de lazer, problemas de saúde, uso de medicamentos, se fumante, se ingere bebida alcoólica e afastamentos do trabalho.

O Questionário Nórdico de Sintomas Musculoesqueléticos (QNSO) adaptado para a cultura brasileira1010. Barros ENC, Alexandre NMC. Cross-cultural adaptation of the Nordic musculoskeletal questionnaire. Int Nurs Rev. 2003;50(2):101-8. doi: https://doi.org/10.1046/j.1466-7657.2003.00188.x
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contempla 36 questões múltiplas e binárias quanto a problemas como dor, formigamento/dormência nos últimos 12 meses e nos últimos sete dias, impedimento de realizar atividades normais e se consultou algum profissional da área da saúde, médico ou fisioterapeuta, por causa dessa condição, nos últimos 12 meses, em nove regiões anatômicas: pescoço, ombros, parte superior das costas, cotovelos, punhos/mãos, parte inferior das costas, quadril/coxas, joelhos, tornozelos/pés1010. Barros ENC, Alexandre NMC. Cross-cultural adaptation of the Nordic musculoskeletal questionnaire. Int Nurs Rev. 2003;50(2):101-8. doi: https://doi.org/10.1046/j.1466-7657.2003.00188.x
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A Escala Analógica para Avaliação da Dor (EVA) tem enumeração de 0 a 10, em que 0 representa “sem dor” e 10, “dor máxima”. Para a classificação dos níveis de dor, utilizou-se os escores: sem dor, 0; dor leve, de 1 a 4; dor moderada, de 5 a 6; e dor intensa, de 7 a 101111. Nascimento JCC. Avaliação da dor em pacientes com câncer em cuidados paliativos a luz da literatura. Saúde Ciênc Ação. 2017 [cited 2021 Feb 8];3(1):11-26. Available from: https://revistas.unifan.edu.br/index.php/RevistaICS/article/view/329/248
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A coleta de dados ocorreu no período de dezembro de 2019 a março de 2020. Para a operacionalização, os enfermeiros de todos os turnos e unidades da instituição foram contatados pessoalmente, convidados a participar e esclarecidos sobre os objetivos e etapas da pesquisa. Os dados foram coletados, inicialmente, pela autora principal da pesquisa, com uso de formulários impressos e, sequencialmente, devido à pandemia de Covid-19, os respectivos instrumentos foram encaminhados de forma on-line aos participantes pelo Google Forms.

Os dados foram digitados no programa Excel® por dois digitadores independentes, sendo posteriormente comparados para o controle de possíveis erros de digitação, a fim de reduzir vieses. Os retornos obtidos de forma on-line foram conferidos e dados incompletos foram excluídos.

Os dados foram transferidos para o software Statistical Package for Social Science (SPSS), versão 22.0, e analisados com estatística descritiva e inferencial. Para a caracterização das variáveis sociodemográficas, laborais e clínicas dos participantes foi utilizada estatística descritiva. As variáveis qualitativas foram descritas por meio de frequência relativa e absoluta e as variáveis quantitativas, por medidas de tendência central e dispersão. Na avaliação da variável intensidade da dor, utilizou-se a mediana com os quartis, dividindo o conjunto ordenado de dados em quatro partes iguais (cada parte representa 1/4 dos participantes). Assim, o Q1 = primeiro quartil = quartil inferior = é o valor referente aos 25% da amostra ordenada; a mediana, refere-se ao valor até ao qual se encontra 50% da amostra ordenada; e, o Q3 =terceiro quartil (designado por Q3/4) = quartil superior = valor referente aos 75% da amostra ordenada ou valor a partir do qual se encontram 25% dos valores mais altos.

Empregaram-se testes de associação e/ou correlação das variáveis categóricas, conforme assimetria da distribuição pelo teste de normalidade de Shapiro-Wilk e pelos testes de Mann-Whitney U e Kruskal Wallis, sendo considerados significativos valores de p < 0,05. Quando utilizado teste de Kruskal Wallis, foi realizado o teste post-hoc de Dunn-Bonferroni, teste de comparação múltipla usado após a aplicação de testes não paramétricos com três ou mais fatores.

Foram observados todos os preceitos éticos conforme as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos e complementares1212. Conselho Nacional de Saúde (BR). Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Aprova diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial União. 2013 jun 13 [cited 2021 Feb 8];150(112 Seção 1):59-62. Available from: https://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?data=13/06/2013&jornal=1&pagina=59&totalArquivos=140
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. Após autorização do hospital local de coleta de dados, o estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade sob CAAE n° 18791319.7.0000.5350 e aprovado sob Parecer n° 3.657.852.

RESULTADOS

Participaram da pesquisa 83 enfermeiros. Na Tabela 1 são apresentadas características sociodemográficas e profissionais dos participantes. Constata-se que a amostra é predominantemente feminina (84,3%), jovem, sendo o maior percentual com idade entre 31 a 40 anos (51,8%), casada (54,2%) e com filhos (56,6%).

Em relação ao tempo de formação, o maior percentual é de formados há mais de cinco anos (61,4%). Ainda, a maioria dos enfermeiros afirma ter realizado cursos de pós-graduação, subsídio necessário para ter expertise em cada área de atuação. No que tange às características laborais, evidencia-se que 41% exercem a enfermagem há mais de 10 anos, 66,3% atuam no período diurno, 63,9% realizam 6 horas diárias e a maioria (81,9%) cumpre 36 horas semanais. Praticamente 60% deles referem não ocupar cargo de chefia.

Tabela 1-
Caracterização sociodemográfica e profissional de enfermeiros (n = 83) que atuam em um hospital geral. Rio Grande do Sul, Brasil, 2019/2020

Sequencialmente, a Tabela 2 explicita os resultados referentes à forma como os participantes avaliam suas condições de saúde. Constata-se que a maioria deles (74,7%) avalia como bom seu estado de saúde; entretanto, mais da metade afirma como pouco suficiente seu tempo para lazer e 38,6% praticam atividade física. Quando questionados sobre diagnóstico de problema de saúde, a maioria refere não apresentar e não ter se afastado do trabalho; mais de 60% afirmam não fazer uso contínuo de medicamentos, porém 47% fazem uso eventual de analgésicos, ansiolíticos, sedativos e antidepressivos. Aliado a isso, destaca-se que percentual elevado refere consumo de bebida alcoólica “às vezes”.

Tabela 2 -
Hábitos de vida e saúde de enfermeiros (n = 83) que atuam em um hospital geral. Rio Grande do Sul, Brasil, 2019/2020

Em continuidade, a Figura 1 mostra os resultados referentes à ocorrência de distúrbios musculoesqueléticos. A mesma demonstra que a grande maioria dos enfermeiros apresentou dor, formigamento e/ou dormência nos últimos 12 meses e que mais da metade afirma ter apresentado algum desses sintomas nos últimos sete dias que antecederam a coleta de dados.

Figura 1 -
Frequência de distúrbios musculoesqueléticos nos diferentes períodos referidos por enfermeiros (n = 83) que atuam em um hospital geral. Rio Grande do Sul, Brasil, 2019/2020

Sequencialmente, na Tabela 3 estão descritos os resultados referentes à dor musculoesquelética por região anatômica referida pelos participantes. Verifica-se que, quanto à ocorrência da dor, nos últimos 12 meses, as regiões mais afetadas foram pescoço (38,6%), parte superior das costas (37,3%) e ombros (34,9%). Alguns profissionais, porém, em menores percentuais, referiram dor na parte inferior das costas, nos punhos/mãos e nos tornozelos/pés.

Quando questionados quanto a limitações para realizar atividades normais do cotidiano no último ano, os enfermeiros referiram que a dor em punhos e mãos e na parte inferior das costas foram as mais limitantes. Já no que tange às respostas referentes à consulta com profissional de saúde no mesmo período, a maioria foi motivada pela ocorrência de distúrbios musculoesqueléticos na região do pescoço, nos punhos e nas mãos, seguidos dos ombros e da parte inferior das costas. Quanto à dor musculoesquelética nos últimos sete dias que antecederam a coleta de dados, os maiores percentuais foram de dor na parte superior das costas (26,5%), no pescoço (25,3%) e nos ombros (19,3%), seguidos por parte inferior das costas, punhos e mãos e tornozelos e pés, em menor percentual.

Tabela 3-
Frequência de distúrbios musculoesqueléticos por região anatômica referidos por enfermeiros (n = 83) que atuam em um hospital geral. Rio Grande do Sul, Brasil, 2019/2020

Quanto à intensidade da dor, praticamente metade deles (49,4%) referiu dor leve. Entretanto, além de referir dor em mais de uma região anatômica, 36% dos participantes avaliaram sua dor como moderada e 14,6 %, como intensa.

A Tabela 4 apresenta as características sociodemográficas e de trabalho segundo a avaliação da intensidade da dor referida pelos enfermeiros. Constata-se que enfermeiros formados e que atuam na enfermagem a mais de 10 anos, que cumprem carga horária de trabalho de 40 a 44 horas semanais, e aqueles que atuam no período noturno avaliaram sua dor como de maior intensidade. Foi verificada diferença estatística entre intensidade da dor e jornada diária (p = 0,046) e turno de trabalho (p = 0,029). Na avaliação dos p-valores das comparações duas a duas, verificou-se diferença estatística na variável “jornada de trabalho”, entre a jornada de 6 horas com a de 8 horas(p=0,016); e, na categoria “turno de trabalho”, ocorreu diferença entre o turno diurno com o Misto/troca folgas(p=0,021) e também, com o turno noturno e o Misto/troca folgas(p=0,016).

Tabela 4 -
Avaliação da intensidade da dor de enfermeiros (n = 83) que atuam em um hospital geral relacionada às características sociodemográficas e laborais. Rio Grande do Sul, Brasil, 2019/2020

DISCUSSÃO

As características do trabalho do enfermeiro no âmbito hospitalar favorecem a exposição a diversos riscos que contribuem para o adoecimento físico e psíquico e repercutem no âmbito pessoal, profissional e organizacional. Essa afirmativa emerge de reflexões a partir dos resultados do presente estudo, que demonstram que enfermeiros que atuam em um hospital geral sentem dor musculoesquelética de intensidade moderada a alta, em diferentes regiões anatômicas. E, que a intensidade da dor musculoesquelética tem relação com a jornada e o turno de trabalho, e com o tempo de formação e atuação na enfermagem.

O enfermeiro vivencia situações como dificuldades do trabalho em equipe, falta de autonomia e dimensionamento de pessoal inadequado, que repercutem na fragmentação da assistência e requerem flexibilidade e reorganização constantes. O cenário pode, então, ser de dor, medo e incertezas, o que contribui para a tensão, o estresse e a dor musculoesquelética no profissional.

Menor autonomia e oportunidade de participação em decisões importantes, falta de controle sobre o tempo, necessidade de ajustar tarefas inesperadas, aumento da pressão institucional, flexibilidade das horas de trabalho e compromisso organizacional são características organizacionais comuns em instituições hospitalares1313. Aeschbacher R, Addor V. Institutional effects on nurses’ working conditions: a multi-group comparison of public and private non-profit and forprofit healthcare employers in Switzerland. Hum Resour Health. 2018;16(1):58. doi: https://doi.org/10.1186/s12960-018-0324-6
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. Ajustes ou compensações que qualifiquem condições laborais inerentes às características institucionais dependem de contextos políticos e econômicos e do nível de competitividade do setor de saúde de cada país1313. Aeschbacher R, Addor V. Institutional effects on nurses’ working conditions: a multi-group comparison of public and private non-profit and forprofit healthcare employers in Switzerland. Hum Resour Health. 2018;16(1):58. doi: https://doi.org/10.1186/s12960-018-0324-6
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A dor musculoesquelética referida pelos participantes deste estudo em determinadas regiões anatômicas e associada a algumas características sociodemográficas e laborais sugere que sua ocorrência se dá pelo esforço físico, falta de condicionamento adequado e posicionamento incorreto. Essa dor é um indicativo de alerta tanto para os enfermeiros quanto para os gestores da instituição hospitalar, pois pode se tornar crônica e, gradativamente, inviabilizar o exercício profissional, com danos à saúde pessoal, à segurança da assistência e à organização.

Neste sentido, o fato de a maioria dos enfermeiros afirmar ter apresentado dor, formigamento e/ou dormência musculoesquelética no último ano e de um menor percentual ter experimentado alguns desses sintomas nos últimos sete dias que antecederam a coleta de dados é merecedor de atenção e sugere mudança da tipologia da dor, de aguda para crônica. A dor aguda é conceituada como sinal de alerta fisiológico e tem duração limitada, cessando com a resolução do processo nóxico; a dor crônica, por sua vez, é como uma doença que persiste após a cura da lesão inicial, cujo nexo causal pode não ser identificado, o que não invalida sua existência e diagnóstico1414. Raja SN, Carr DB, Cohen M, Finnerup NB, Flor H, Gibson S, et al. The revised International Association for the Study of Pain definition of pain: concepts, challenges, and compromises. Pain. 2020;161(9):1976-82. doi: https://doi.org/10.1097/j.pain.0000000000001939
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. Faz-se necessária atenção do enfermeiro quanto aos fatores de risco para lesões musculoesqueléticas associados à prática do cuidar na enfermagem1515. Moura MIRL, Martins MMFPS, Ribeiro OMPL. Musculoskeletal symptoms of hospital nurses: contribution of rehabilitation nurses. Referência. 2019;4(23):121-30. doi: https://doi.org/10.12707/RIV19035
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Ressalta-se a força tarefa multinacional instituída pela Associação Internacional para Estudos da Dor (IASP) para atualização da definição de dor como “experiência sensitiva e emocional desagradável associada, ou semelhante àquela associada, a uma lesão tecidual real ou potencial”1414. Raja SN, Carr DB, Cohen M, Finnerup NB, Flor H, Gibson S, et al. The revised International Association for the Study of Pain definition of pain: concepts, challenges, and compromises. Pain. 2020;161(9):1976-82. doi: https://doi.org/10.1097/j.pain.0000000000001939
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. A dor constitui experiência sensitiva individual, influenciada por fatores biológicos, psicológicos e sociais e que, embora, em geral, cumpra papel adaptativo, pode repercutir no bem-estar do indivíduo e na vida profissional1414. Raja SN, Carr DB, Cohen M, Finnerup NB, Flor H, Gibson S, et al. The revised International Association for the Study of Pain definition of pain: concepts, challenges, and compromises. Pain. 2020;161(9):1976-82. doi: https://doi.org/10.1097/j.pain.0000000000001939
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Os resultados desta investigação nos remetem a reflexões do quanto a dor pode interferir no cotidiano desses profissionais, sobretudo diante do fato de a maioria avaliar seu estado de saúde como bom, afirmar não ter diagnóstico de problemas de saúde e continuar no exercício profissional, mesmo com dor. Isso nos leva a pensar na forma como esses desenvolvem suas atividades laborais, quais fatores desencadeiam dor e o que os torna propensos a erros e danos na assistência. A dor tem impacto negativo na vida e na saúde do indivíduo e de sua família, e o processo álgico, quando crônico, tem repercussões no sono, na atividade, na cognição, no humor, nos relacionamentos e no desempenho pessoal e profissional33. Oliveira VC, Almeida RJ. Aspectos que determinam as doenças osteomusculares em profissionais de enfermagem e seus impactos psicossociais. J Health Sci. 2017;19(2):130-5. doi: https://doi.org/10.17921/2447-8938.2017v19n2p130-135
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O fato de as regiões anatômicas mais acometidas pela dor musculoesquelética serem pescoço, ombros e parte superior das costas vai ao encontro de investigação realizada com 260 enfermeiros de um hospital português, em que a maioria dos participantes apresentava dor musculoesquelética em pelo menos um segmento corporal, e as regiões mais acometidas a coluna lombar, a cervical e a dorsal1515. Moura MIRL, Martins MMFPS, Ribeiro OMPL. Musculoskeletal symptoms of hospital nurses: contribution of rehabilitation nurses. Referência. 2019;4(23):121-30. doi: https://doi.org/10.12707/RIV19035
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. Resultados semelhantes foram evidenciados em pesquisa com 211 profissionais de enfermagem de um hospital de ensino brasileiro, em que a maioria apresentava dor em uma ou mais regiões anatômicas, e as regiões mais afetadas a lombar e o pescoço1616. Santos HEC, Marziale MHP, Felli VEA. Presenteeism and musculoskeletal symptoms among nursing professionals. Rev Latino-Am Enfermagem. 2018;26:e3006. doi: https://doi.org/10.1590/1518-8345.2185.3006
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. Desfechos estes que denotam que, características do trabalho do enfermeiro no ambiente hospitalar contribuem para o adoecimento físico do profissional.

A atuação como enfermeira no âmbito hospitalar possibilita afirmar que o subdimensionamento de pessoal, o absenteísmo e o presenteísmo são aspectos que implicam na sobrecarga de trabalho e comprovadamente podem contribuir para o adoecimento físico e psíquico. Sobrecarga física, movimentos repetitivos, longas jornadas, ritmo e organização do trabalho, prazos, produtividade, ambiente físico e falta de controle dos riscos ocupacionais culminam no adoecimento físico e mental do trabalhador1717. Cargnin ZA, Schneider DG, Vargas MAO, Machado RR. Non-specific low back pain and its relation to the nursing work process. Rev Latino-Am Enfermagem. 2019;27:e3172. doi: https://doi.org/10.1590/1518-8345.2915.3172
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. O trabalho de enfermagem requer alta carga física e mental, o que contribui para a ocorrência de distúrbios musculoesqueléticos44. Petersen RS, Marziale MHP. Analysis of work capacity and stress among nursing professionals with musculoskeletal disorders. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(3):e67184. doi: https://doi.org/10.1590/1983-1447.2017.03.67184
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Subdimensionamento de pessoal, rotatividade de profissionais, absenteísmo, aumento das taxas de internação, tempo de permanência, gravidade do estado clínico dos pacientes11. Arboit EL, Camponogara S, Freitas EO. Fatores relacionados à intensificação do trabalho da enfermagem hospitalar. Res Soc Dev. 2021;10(1):e22210111703. doi: https://doi.org/10.33448/rsd-v10i1.11703
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e não utilização de dispositivos e tecnologias que favoreçam a prática do cuidar1515. Moura MIRL, Martins MMFPS, Ribeiro OMPL. Musculoskeletal symptoms of hospital nurses: contribution of rehabilitation nurses. Referência. 2019;4(23):121-30. doi: https://doi.org/10.12707/RIV19035
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são fatores que interferem na carga de trabalho da enfermagem, com consequente adoecimento do profissional.

Em contrapartida, o acesso e a utilização de tecnologias reduzem o esforço físico e as posturas inadequadas na assistência e estão associados à adesão de medidas preventivas pelos trabalhadores1818. Souza Y, Pai DD, Junqueira LM, Macedo ABT, Tavares JP, Chaves EBM. Characterization of nurse staffing who are away from work due to musculoskeletal disorders in a university hospital. Rev Enferm UFSM. 2020;10(10):1-17. doi: https://doi.org/10.5902/2179769236767
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. Também, a prática regular de exercícios físicos é benéfica à saúde, bem como exercícios de alongamento muscular reduzem o nível de dor e interferem positivamente nas atividades laborais e na vida diária1919. Silva Filho JN, Gurgel JL, Porto F. Influence of stretching exercises in musculoskeletal pain in nursing professionals. Fisioter Mov. 2020;33:e003317. doi: https://doi.org/10.1590/1980-5918.033.ao17
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Outro resultado merecedor de reflexões, discussões e ações diz respeito à análise do relato da mensuração da dor pelos enfermeiros, classificada como moderada e intensa, que totaliza mais de 50% dos participantes. Esse resultado, aliado ao percentual de enfermeiros (47%) que referiu uso de analgésicos, ansiolíticos, sedativos e antidepressivos, alerta para o quanto a dor pode favorecer iatrogenias, comprometer a assistência, a segurança da equipe e do paciente e a imagem institucional, inclusive a ponto de, gradativamente, inviabilizar a atuação profissional. Condições laborais fragilizadas e a intensificação do trabalho acarretam no adoecimento do profissional, com repercussões na qualidade da assistência ao paciente11. Arboit EL, Camponogara S, Freitas EO. Fatores relacionados à intensificação do trabalho da enfermagem hospitalar. Res Soc Dev. 2021;10(1):e22210111703. doi: https://doi.org/10.33448/rsd-v10i1.11703
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A automedicação é prática comum entre enfermeiros, em especial no que tange ao uso de analgésicos e anti-inflamatórios não esteroidais para tratamento de cefaléia e dor muscular, e está atrelada ao conhecimento farmacológico e ao manuseio e acesso facilitado aos medicamentos2020. Machado J, Silva CM, Peder LD. Concepções sobre automedicação entre profissionais de enfermagem. Rev Bras Pesq Ciênc Saúde. 2020;7(13):10-15. doi: https://doi.org/10.6084/m9.figshare.12838025
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. Entretanto, existem riscos não menos importantes que as interações medicamentosas, como o retardo no diagnóstico e tratamento adequado, a fadiga e as más condições de trabalho, com repercussão na segurança do profissional e da assistência.

Ainda em relação à avaliação da dor dos participantes da pesquisa, pode-se afirmar que ela difere de indivíduo para indivíduo, por se tratar de um sinal vital subjetivo, influenciado por questões fisiológicas, psicológicas e sociais. Além disso, os enfermeiros com maior carga horária diária e/ou de jornada de trabalho semanal, formados e que atuam na enfermagem a mais de 10 anos e, os que atuam no período noturno avaliaram sua dor como mais intensa. O maior risco de adoecimento de profissionais de enfermagem está entre os que cumprem jornadas laborais extensas, com sobrecarga de trabalho e falta de tempo para o autocuidado1818. Souza Y, Pai DD, Junqueira LM, Macedo ABT, Tavares JP, Chaves EBM. Characterization of nurse staffing who are away from work due to musculoskeletal disorders in a university hospital. Rev Enferm UFSM. 2020;10(10):1-17. doi: https://doi.org/10.5902/2179769236767
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Esse resultado pode ser justificado pelo fato de que uma carga horária de trabalho maior e a atuação profissional por maior tempo, implicam em maior exposição aos riscos inerentes do ambiente de trabalho, ao menor tempo para convivência familiar e social e à redução do tempo para repouso e recuperação do organismo. Também, pela atuação à noite, turno em que geralmente ocorre o subdimensionamento de pessoal, em especial do quantitativo de enfermeiros, o que exige assumir funções além da assistência, concomitantes à gerência da equipe de enfermagem e, por vezes, à supervisão e coordenação de serviços de hotelaria, higienização, administração, entre outros.

A precarização e intensificação do trabalho podem ocasionar efeitos adversos na segurança e na saúde ocupacional11. Arboit EL, Camponogara S, Freitas EO. Fatores relacionados à intensificação do trabalho da enfermagem hospitalar. Res Soc Dev. 2021;10(1):e22210111703. doi: https://doi.org/10.33448/rsd-v10i1.11703
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. Sobrecarga de trabalho, pressão de tempo e exigência de maior esforço culminam em práticas laborais inseguras, com repercussões na segurança individual e dos ambientes de trabalho de uma organização11. Arboit EL, Camponogara S, Freitas EO. Fatores relacionados à intensificação do trabalho da enfermagem hospitalar. Res Soc Dev. 2021;10(1):e22210111703. doi: https://doi.org/10.33448/rsd-v10i1.11703
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A análise dos resultados desta pesquisa, aliada ao posicionamento de diversos autores, em nível mundial, mostram que o trabalho do enfermeiro no ambiente hospitalar pode ser indutor de sofrimento e adoecimento físico e psíquico. Diante dessa realidade, muito pode ser feito, tanto pelo enfermeiro quanto pelos gestores, no sentido de modificar essa condição. No entanto, para que isso ocorra, faz-se necessário o diagnóstico destas situações, a promoção do conhecimento, a tomada de atitudes e a implementação de ações direcionadas à promoção da saúde, bem como à prevenção de agravos ocupacionais e à manutenção de um ambiente de trabalho seguro e adequado, com vistas à excelência do cuidado.

CONCLUSÃO

Enfermeiros que atuam em um hospital geral sentem dor musculoesquelética, em diversas regiões anatômicas, e a intensidade dessa dor tem relação com o turno de trabalho, a jornada diária e a carga horária semanal de trabalho, o tempo de formação e de atuação na enfermagem. Os participantes da pesquisa necessitam de maior aporte de conhecimentos sobre a saúde do trabalhador, as condições ambientais e os danos à saúde, aliado a ações institucionais de promoção da saúde e prevenção de danos (muitas vezes irreversíveis, com repercussões negativas na segurança do paciente e na instituição como um todo).

Os resultados deste estudo podem subsidiar reflexões, discussões e atitudes, de modo a serem utilizados como indicadores de ações e intervenções com ênfase na mobilização de estratégias pelos gestores de instituições de saúde. Aponta-se estratégias que vão desde a organização do trabalho, que inclui análise das condições físicas, adequação do quadro de pessoal, quanti e qualitativamente, gerenciamento da carga horária diária e semanal, a implementação de ginástica laboral e pausas pré-estabelecidas na jornada de trabalho e disponibilidade e uso de tecnologias que favoreçam o cuidar em enfermagem com qualidade e segurança.

Dentre as limitações desta investigação o fato de ter sido realizada em apenas um hospital nos impossibilita generalizar os resultados. Sugere-se a realização de novos estudos voltados à ampliação do conhecimento sobre ergonomia e medidas institucionais que contribuam positivamente nas condições de trabalho e na qualidade de vida dos profissionais; desenvolvimento de competências científicas, tecnológicas e sociológicas; e terapias que possibilitem ao enfermeiro o autocuidado, a percepção de sua condição de saúde e a identificação de fatores de risco do ambiente laboral, com vistas ao melhor enfrentamento.

Os resultados desta investigação são igualmente importantes por evidenciarem o papel relevante dos enfermeiros, ampliarem a relação política e dialógica e possibilitarem maior reconhecimento e valorização dessa categoria profissional.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    31 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    28 Abr 2021
  • Aceito
    06 Dez 2021
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