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Adesão ao tratamento de pacientes com insuficiência cardíaca em um hospital universitário

Adherence of patients with heart failure to pharmacological and non-pharmacological treatment in a teaching hospital

Adhesión al tratamiento farmacológico y no farmacológico de pacientes con insuficiencia cardíaca en hospital universitario

Resumos

A baixa adesão ao tratamento de pacientes com insuficiência cardíaca (IC) é um dos fatores relacionado a re-internações. Nesta perspectiva, este estudo, conduzido em um hospital universitário no Rio Grande do Sul, buscou descrever a adesão ao tratamento farmacológico e não farmacológico de pacientes admitidos com IC descompensada, relacionando-a com o número de internações e re-internações hospitalares no período de um ano. A adesão farmacológica foi avaliada pela escala de Morisky, e a não farmacológica por meio de um questionário previamente validado. Incluíram-se 252 pacientes, idade média 63±13 anos e 151 (60%) do sexo masculino. Quanto à adesão ao tratamento farmacológico, 118 (47%) referiram alta adesão e 45 (18%) eram aderentes ao tratamento não farmacológico. Não houve relação entre adesão ao tratamento (farmacológico e não farmacológico) e re-internações. Conhecimento prévio dos cuidados não farmacológicos, identificação dos sintomas de congestão e aqueles que já faziam tratamento para IC foram relacionados à adesão.

Insuficiência cardíaca; Adesão à medicação; Hospitalização


Non-compliance in heart failure (HF) patients is one of the factors leading to hospital readmissions. Under this perspective, a study was carried out in a university hospital in Rio Grande do Sul, Brazil, to describe the compliance with pharmacological and non-pharmacological treatments of patients admitted with decompensated HF, relating the compliance to the number of hospital admissions and readmissions during a year's period. The pharmacological compliance was measured through Morisky scale and the non-pharmacological compliance was measured through a previously validated questionnaire. The sample was composed of 252 patients, median age 63±13, 151 (60%) male. For the pharmacological compliance, 118 (47%) patients demonstrated high compliance, and 45 (18%) adhered to non-pharmacological treatment. There was no relation found between treatment compliance (pharmacological or non-pharmacological) and readmissions. Patients who had been treated for HF, had knowledge about non-pharmacological care and were able to identify congestion symptoms demonstrated high compliance.

Heart failure; Medication adherence; Hospitalization


La baja adhesión al tratamiento de pacientes con insuficiencia cardíaca (IC) es uno de los factores relacionados a las re-internaciones. En esta perspectiva, este estudio, realizado en hospital universitario en Rio Grande do Sul, Brasil, buscó describir la adhesión al tratamiento farmacológico y no farmacológico de pacientes con IC descompensada, relacionándola con el número de internaciones y re-internaciones hospitalarias en el período de un año. La adhesión farmacológica fue evaluada por la escala de Morisky, y la no farmacológica, por medio de un cuestionario previamente validado. Se incluyeron 252 pacientes, media de edad 63±13 años, 60% (151) masculino. Sobre la adhesión al tratamiento farmacológico y no farmacológico, se relató alta adhesión en 47% (118) y 18% (45), respectivamente. No hubo relación entre la adhesión al tratamiento y re-internación. Conocimientos previos de cuidados no farmacológicos, identificación de síntomas de congestión y historia previa de tratamiento para IC, fueron relacionados con la adhesión.

Insuficiencia cardíaca; Cumplimiento de la medicación; Hospitalización


ARTIGO ORIGINAL

Adesão ao tratamento de pacientes com insuficiência cardíaca em um hospital universitário

Adhesión al tratamiento farmacológico y no farmacológico de pacientes con insuficiencia cardíaca en hospital universitario

Adherence of patients with heart failure to pharmacological and non-pharmacological treatment in a teaching hospital

Raquel Azevedo de CastroI; Graziella Badin AlitiII; Joelza Chisté LinharesIII; Eneida Rejane RabeloIV

IEnfermeira, Coordenadora de Campo da equipe de Implantação, Monitoramento e Avaliação do Projeto TelessaúdeRS, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil

IIDoutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências Cardiovasculares da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Enfermeira da Clínica de Insuficiência Cardíaca do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil

IIIMestranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Escola de Enfermagem da UFRGS, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil

IVDoutora em Ciências Biológicas: Fisiologia, Professora Adjunta da Escola de Enfermagem da UFRGS, Enfermeira coordenadora da Clínica de Insuficiência Cardíaca do HCPA, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil

Endereço da autora Endereço da autora: Eneida Rejane Rabelo Escola de Enfermagem Universidade Federal do Rio Grande do Sul Rua São Manoel, 963 - Bairro Rio Branco Porto Alegre/RS - Brasil - CEP: 90620-110 E-mail: rabelo@portoweb.com.br

RESUMO

A baixa adesão ao tratamento de pacientes com insuficiência cardíaca (IC) é um dos fatores relacionado a re-internações. Nesta perspectiva, este estudo, conduzido em um hospital universitário no Rio Grande do Sul, buscou descrever a adesão ao tratamento farmacológico e não farmacológico de pacientes admitidos com IC descompensada, relacionando-a com o número de internações e re-internações hospitalares no período de um ano. A adesão farmacológica foi avaliada pela escala de Morisky, e a não farmacológica por meio de um questionário previamente validado. Incluíram-se 252 pacientes, idade média 63±13 anos e 151 (60%) do sexo masculino. Quanto à adesão ao tratamento farmacológico, 118 (47%) referiram alta adesão e 45 (18%) eram aderentes ao tratamento não farmacológico. Não houve relação entre adesão ao tratamento (farmacológico e não farmacológico) e re-internações. Conhecimento prévio dos cuidados não farmacológicos, identificação dos sintomas de congestão e aqueles que já faziam tratamento para IC foram relacionados à adesão.

Descritores: Insuficiência cardíaca. Adesão à medicação. Hospitalização.

RESUMEN

La baja adhesión al tratamiento de pacientes con insuficiencia cardíaca (IC) es uno de los factores relacionados a las re-internaciones. En esta perspectiva, este estudio, realizado en hospital universitario en Rio Grande do Sul, Brasil, buscó describir la adhesión al tratamiento farmacológico y no farmacológico de pacientes con IC descompensada, relacionándola con el número de internaciones y re-internaciones hospitalarias en el período de un año. La adhesión farmacológica fue evaluada por la escala de Morisky, y la no farmacológica, por medio de un cuestionario previamente validado. Se incluyeron 252 pacientes, media de edad 63±13 años, 60% (151) masculino. Sobre la adhesión al tratamiento farmacológico y no farmacológico, se relató alta adhesión en 47% (118) y 18% (45), respectivamente. No hubo relación entre la adhesión al tratamiento y re-internación. Conocimientos previos de cuidados no farmacológicos, identificación de síntomas de congestión y historia previa de tratamiento para IC, fueron relacionados con la adhesión.

Descriptores: Insuficiencia cardíaca. Cumplimiento de la medicación. Hospitalización.

ABSTRACT

Non-compliance in heart failure (HF) patients is one of the factors leading to hospital readmissions. Under this perspective, a study was carried out in a university hospital in Rio Grande do Sul, Brazil, to describe the compliance with pharmacological and non-pharmacological treatments of patients admitted with decompensated HF, relating the compliance to the number of hospital admissions and readmissions during a year's period. The pharmacological compliance was measured through Morisky scale and the non-pharmacological compliance was measured through a previously validated questionnaire. The sample was composed of 252 patients, median age 63±13, 151 (60%) male. For the pharmacological compliance, 118 (47%) patients demonstrated high compliance, and 45 (18%) adhered to non-pharmacological treatment. There was no relation found between treatment compliance (pharmacological or non-pharmacological) and readmissions. Patients who had been treated for HF, had knowledge about non-pharmacological care and were able to identify congestion symptoms demonstrated high compliance.

Descriptors: Heart failure. Medication adherence. Hospitalization.

INTRODUÇÃO

A insuficiência cardíaca (IC) é uma síndrome endêmica causada por disfunção cardíaca, geralmente resultante de disfunção ou perda do músculo miocárdio, caracterizada por dilatação do ventrículo esquerdo ou hipertrofia(1). Manifesta-se tanto de forma crônica como descompensada, levando a sintomas incapacitantes, freqüentes hospitalizações, redução da qualidade de vida, aumento do risco de mortalidade, além de complexo regime terapêutico(1,2).

Um estudo conduzido no Brasil publicado recentemente demonstrou que, de 263 pacientes internados por descompensação da IC, 25,8% foram a óbito após um ano de seguimento e 51,2% procuraram o atendimento de emergência de 1 a 12 vezes durante esse período, demonstrando o cenário preocupante das re-internações(1).

O objetivo do tratamento da IC consiste em alcançar e manter a estabilidade dos pacientes. A adesão ao tratamento com o uso regular das medicações e as alterações no estilo de vida são essenciais para evitar crises de descompensação. Contudo, isto tem sido uma importante limitação para alguns pacientes, e por conta disso, as taxas de readmissões continuam elevadas(3,4).

Na perspectiva de estudos que avaliaram os fatores precipitantes de descompensação da IC, a literatura não tem se modificado ao longo dos últimos anos. Estudos têm enfatizado que a baixa adesão ao tratamento, tanto farmacológico como não farmacológico, configura-se entre esses principais fatores(1,5).

Um estudo prospectivo realizado com 212 pacientes internados em um hospital especializado em São Paulo procurou reconhecer os fatores precipitantes de descompensação da IC. Os autores identificaram que o principal fator precipitante foi a baixa adesão com a medicação, responsável por 24% das descompensações, seguida da evolução da doença (22%) e baixa adesão com a medicação somada à hipertensão (20%)(3).

Vários estudos demonstram que a baixa adesão ao tratamento estaria relacionada a fatores de risco que envolvem problemas sócio-econômicos, distúrbios psicológicos e prejuízos cognitivos, somados às características da doença e à complexidade do tratamento. Além disso, os custos das medicações, as quantidades e seus efeitos, o relacionamento entre profissional de saúde e paciente e os variados tipos de apoio dados são fatores que também contribuem para influenciar na adesão ao tratamento(6,7).

Neste contexto, em que tanto a literatura internacional como dados dos nossos centros indicam que a baixa adesão está envolvida em readmissões de pacientes com IC, este estudo foi delineado com o objetivo de descrever a adesão ao tratamento farmacológico e não farmacológico de pacientes admitidos com IC descompensada e relacionar a adesão com o número de internações e re-internações hospitalares no período de um ano. Resultados desse estudo poderão indicar importantes contribuições que venham a favorecer as estratégias da equipe para melhorar essas taxas.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo transversal. A população constituiu-se de pacientes que internaram na instituição em estudo, pública e universitária, no estado do Rio Grande do Sul. Estabelecemos como critérios de inclusão pacientes com diagnóstico de IC descompensada classe III e IV, conforme classificação de New York Heart Association (NYHA) de qualquer etiologia, com fração de ejeção < 45%, idade maior ou igual a 18 anos, de ambos os sexos e que concordaram em participar do estudo no período de 2005 a 2008. Excluíram-se os pacientes com IC após infarto agudo do miocárdio nos últimos três meses, pacientes com IC secundária à sepse, submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio nos últimos 30 dias e aqueles que tinham seqüelas neurológicas.

Para avaliar a adesão ao tratamento farmacológico foi utilizada a escala de adesão de Morisky, composta de quatro questões dicotômicas com escore variando de 0 (alta adesão) a 4 (baixa adesão). Essa escala foi traduzida para o português e já foi utilizada por um grupo de pesquisadores da cidade do Rio de Janeiro, adicionada a mais dois métodos de avaliação da adesão em um grupo de pacientes hipertensos(8). Os pacientes foram classificados com alto grau de adesão quando as respostas para todas as perguntas foram negativas, e com média adesão quando uma ou duas das respostas foram afirmativas. Quando três ou quatro respostas foram afirmativas, os pacientes foram classificados com baixo grau de adesão(6). Os dados sócio-demográficos e clínicos, motivo da descompensação por IC, sinais, sintomas e classe funcional também foram coletados e registrados em uma ficha clínica.

A adesão ao tratamento não farmacológico foi avaliada pela resposta afirmativa dos pacientes à realização dos cuidados não farmacológicos de restrição hídrica, salina, realização de peso diário e exercício físico. Essas questões fazem parte de um questionário de conhecimento da doença e autocuidado para pacientes com IC validado e publicado pelo nosso grupo(9). Os pacientes foram classificados como aderentes ao tratamento quando realizavam três ou quatro cuidados propostos; caso realizassem dois ou menos, como não aderentes. As re-internações no período de um ano anterior à inclusão no presente estudo foram baseadas em dados de prontuário ou informações dos pacientes e/ou cuidadores.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da instituição, sob número 08-372, e todos os pacientes foram incluídos após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Análises estatísticas

As análises estatísticas foram realizadas utilizando o programa Statistical Package for Social Science (SPSS) versão 14.0. As variáveis contínuas estão expressas como média ± desvio padrão e mediana e intervalo interquartis (percentis 25 e 75) conforme distribuição dos dados. As variáveis categóricas foram expressas como percentuais e números absolutos. Os grupos foram comparados pelos testes qui-quadrado de Pearson, t de Student e ANOVA. Para as associações de dados não paramétricos utilizou-se os testes de Mann Whitney e Kruskal-Wallis. Um valor de P bicaudal menor que 0,05 foi considerado estatisticamente significativo.

Para que fosse possível estimar uma diferença absoluta de 20% na ocorrência de internações prévias (no último ano) entre pacientes aderentes ou não aderentes (16% versus 36%) demonstrada em estudo prévio(10) com um nível de confiança de 0,05 e poder de 90% seriam necessários 218 pacientes.

RESULTADOS

Incluíram-se 252 pacientes internados por IC, com média de idade de 63±13 anos, prevalentemente homens, de cor branca. A principal etiologia da IC foi a hipertensiva, seguida da isquêmica. Cinqueta por cento dos pacientes ganhavam até dois salários mínimos e 50% desses tinham até cinco anos de estudo. A baixa adesão ao tratamento farmacológico ou não farmacológico estava entre as maiores causas de descompensação da IC em 232 (92%) de todos os pacientes estudados. Características demonstradas na Tabela 1.

Na avaliação da adesão ao tratamento farmacológico por meio da escala de Morisky, identificou-se que 112 (47%) de todos os pacientes referiram alta adesão ao tratamento, enquanto que somente 45 (18%) eram aderentes ao tratamento não farmacológico.

A Tabela 2 ilustra os pacientes aderentes e não aderentes ao tratamento farmacológico. Não foi observada relação significativa entre a adesão ao tratamento farmacológico com idade, sexo, número de anos de estudo e o fato de residir sozinho ou não. Da mesma forma, não houve diferença para aqueles que tinham dificuldades de conseguir a medicação, conhecimento prévio da IC ou da identificação dos sinais e dos sintomas de congestão.

A Tabela 3 ilustra os resultados dos pacientes aderentes e não aderentes ao tratamento não farmacológico. Quando se comparou o conhecimento prévio dos pacientes sobre o manejo não farmacológico com relação à adesão a este tratamento, foram estatisticamente mais aderentes aqueles que já possuíam informação sobre os cuidados anteriormente citados. O mesmo ocorreu comparando-se também a adesão ao tratamento não farmacológico e a identificação dos sintomas de descompensação da doença por congestão. Relacionando a realização prévia de tratamento para a IC com a adesão ao tratamento não farmacológico houve uma tendência à significância estatística em ser mais aderente aos cuidados não farmacológicos os pacientes que já faziam tratamento. Não houve relação significativa entre outras variáveis e a adesão ao tratamento não farmacológico.

Quando se relacionou a adesão ao tratamento farmacológico e não farmacológico com o número de internações e re-internações dos pacientes no último ano, não houve significância estatística.

Conhecimento sobre IC

Questionados quanto à informação a respeito do problema de saúde, 151 (60%) dos pacientes com IC tinham conhecimento. Desses, 105 (70%) internaram no hospital por baixa adesão ao tratamento proposto anteriormente. Aproximadamente 66 (44%) desses pacientes referiam alta adesão ao tratamento farmacológico.

DISCUSSÃO

Demonstrou-se neste estudo que a baixa de adesão ao tratamento estava entre as principais causas de descompensação da IC. Pouco menos da metade dos pacientes referiram alta adesão ao tratamento farmacológico, enquanto apenas 18% eram aderentes ao tratamento não farmacológico. Mais da metade dos pacientes sabiam informar sobre IC. O fator relacionado à adesão ao tratamento não farmacológico foi o conhecimento prévio a estes cuidados. Foi identificada uma tendência dos pacientes que já realizavam tratamento prévio em aderir mais a este tratamento.

Estes dados vêm ao encontro de resultados existentes na literatura indicando que 50% dos pacientes com doenças crônicas têm baixa adesão ao tratamento(11). Um estudo recente que descreve os inúmeros problemas relacionados à adesão ao tratamento indica que a baixa adesão está associada aos efeitos adversos e também ao número de medicamentos necessários no tratamento de pacientes com doenças cardiovasculares(12). De acordo com a literatura, a educação sistemática é uma estratégia importante na busca de melhores resultados na adesão ao tratamento(13). Resultados recentes de pacientes com IC acompanhados por meio de consultas de enfermagem - divididos em grupo intervenção (acompanhamento com enfermeira durante seis meses para educação sobre tratamento farmacológico e não farmacológico) e grupo controle -, demonstram que, sem esse acompanhamento, os pacientes apresentaram menos internações hospitalares, o que os autores atribuíram à adesão ao tratamento(14). Nesta perspectiva, é necessário que a equipe identifique os motivos de os pacientes não realizarem adequadamente o tratamento proposto, além de monitorizar com freqüência as atitudes destes em relação ao uso dos medicamentos. Além disso, cabe ressaltar que estudos com pacientes hipertensos em que os pesquisadores utilizaram a escala de adesão de Morisky, dentre outros métodos de avaliação, sugerem que a combinação de mais de um instrumento traz uma idéia melhor do comportamento de adesão do paciente com doenças crônicas(8,15).

Por outro lado, as recomendações de mudanças no estilo de vida diretamente relacionadas ao tratamento não farmacológico apresentam percentuais mais elevados de não adesão(5). Essas recomendações requerem habilidades concernentes ao autocuidado, como, por exemplo, a monitoração do peso, a restrição de sódio e de líquidos, a realização de atividade física e a monitoração dos sinais de descompensação(16). O autocuidado é essencial para alcançar e manter a estabilidade, e a adesão às orientações pode impactar significativamente nos sintomas, na capacidade funcional, no bem-estar, na morbidade e prognóstico(11). Reforça-se a importância de implementar ações visando às lacunas nas orientações sobre IC no que diz respeito ao manejo não farmacológico.

O número de internações e re-internações no período de um ano não se relacionou à adesão ao tratamento farmacológico e não farmacológico. Um estudo conduzido pelo nosso grupo buscou descrever o manejo não farmacológico de pacientes internados com IC na mesma instituição. Demonstrou-se que pacientes com mais re-internações aparentavam conhecimento adequado da doença e eram aqueles com quadro clínico mais grave e prolongado(10). Pacientes que têm múltiplas internações por IC descompensada acabam por aprender mais sobre sua doença; no entanto, isto não se traduz em um melhor comportamento de adesão. As estratégias de educação para o desenvolvimento do autocuidado que podem ser realizadas durante a internação, somadas a um planejamento eficaz antes da alta, poderão ter impacto importante no comportamento dos pacientes e, por conseguinte, na redução dessas taxas.

Os pacientes que possuíam conhecimento prévio a respeito dos cuidados não farmacológicos apresentaram maior adesão a este tratamento. Um recente ensaio clínico randomizado com o objetivo de verificar o efeito da educação e orientação sobre manejo não farmacológico de IC por enfermeira identificou significativa diferença de adesão entre o grupo controle e o grupo para o qual os conhecimentos eram fornecidos, sendo que a principal diferença encontrada refere-se ao controle de peso(17). Reforça-se, assim, que a adesão ao tratamento depende, em parte, do conhecimento e compreensão dos pacientes sobre a doença, embora dados da literatura indiquem que conhecimento não se traduz em menos internações(11). Além disso, outros fatores que contribuem para descompensação da IC, como arritmias, infecções e doença isquêmica do coração, independem do conhecimento prévio e autocuidado dos pacientes(1). Dados de um estudo conduzido no Brasil com pacientes com IC reforçam estes achados: a despeito da adesão satisfatória ao tratamento, outras causas instabilizam o quadro clínico, levando os pacientes à internação(14).

A baixa adesão à medicação, dieta ou reconhecimento tardio dos sinais e sintomas de descompensação é comum e pode ser responsável por mais de um terço das re-internações hospitalares. Alguns dados da literatura demonstram que apenas 5% dos pacientes com IC associam o aumento de peso como sintoma para admissão hospitalar, tolerando em média de três a sete dias antes de procurarem assistência médica(18). Portanto, as orientações fornecidas nem sempre são absorvidas de fato pelos pacientes. Além disso, mesmo quando há entendimento, este não se traduz necessariamente em mais adesão.

A internação hospitalar pode ser um cenário propício para o início das orientações sobre a IC e autocuidado. Nesse momento, a presença dos cuidadores pode, inclusive, facilitar esse processo(15,19).

LIMITAÇÕES DO ESTUDO

Na avaliação da adesão ao tratamento medicamentoso, identificaram-se limitações ao aplicar a escala de Morisky. Essa escala tende a estimar apenas o uso correto ou não das medicações. A avaliação do tratamento não farmacológico foi auto-referida, podendo, da mesma forma, superestimar a adesão a este tratamento.

CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS

A baixa adesão ao tratamento foi a principal causa de descompensação da IC. Variáveis como idade, sexo, escolaridade, situação de residir sozinho e dificuldade de conseguir a medicação não tiveram relação com a adesão ao tratamento. Também não houve relação entre a capacidade de identificar os sinais e sintomas de congestão e conhecimento prévio sobre IC com a adesão ao tratamento farmacológico.

Por meio desse estudo identificou-se que os pacientes com conhecimento prévio eram mais aderentes aos cuidados não farmacológicos. Também para aqueles pacientes que já realizavam algum tratamento, houve uma tendência em ser mais aderente aos mesmos cuidados. O número de internações hospitalares não indicou maior adesão ao tratamento.

A implementação de estratégias de educação sistemática realizadas por enfermeiros com reavaliações periódicas destas abordagens são fundamentais. A família deve ser inserida em todos os momentos no processo de cuidado e educação por meio de participação ativa, a fim de criar um ambiente favorável de empenho e comprometimento com os pacientes.

Diante do exposto, estudos que envolvam o acompanhamento de pacientes em ambiente familiar são necessários para avaliar a real situação de realização dos cuidados.

Recebido em: 22/01/2009

Aprovado em: 07/05/2010

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  • Endereço da autora:
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Dez 2010
    • Data do Fascículo
      Jun 2010

    Histórico

    • Recebido
      22 Jan 2009
    • Aceito
      07 Maio 2010
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