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Efeitos da pandemia de Covid-19 sobre o acesso aos canais de comercialização dos agricultores familiares: estudo qualitativo no município de Mariana - MG

Effects of the Covid-19 pandemic on market access by family farmers: qualitative study in the municipality of Mariana - MG

Resumo:

Este artigo trata do efeito da pandemia de Covid-19 sobre o acesso aos mercados por agricultores familiares em Mariana. A pesquisa se orientou teoricamente pela discussão sobre a construção social dos mercados acessados por agricultores familiares. Foi utilizada como modelo analítico uma tipologia de mercados desenvolvida por Schneider (2016) que diferencia os principais canais de comercialização acessados pelos agricultores familiares no Brasil de modo a avaliar possíveis alterações nas formas de comercialização durante a pandemia. Trata-se de um estudo exploratório e descritivo, contando com uma metodologia qualitativa, consistindo na realização de entrevistas semiestruturadas com os agricultores familiares de Mariana. Por meio da análise de conteúdo das entrevistas, foi possível identificar que não se alteraram os canais de comercialização disponíveis no contexto pandêmico, mas, devido às restrições de acesso, somando-se à ausência de incentivos e políticas públicas, os agricultores foram impactados, destacando-se a redução expressiva em sua renda.

Palavras-chave:
agricultura familiar; construção social de mercados; pandemia de covid-19

Abstract:

This paper addresses the effect of the COVID-19 pandemic on access to markets by family farmers in Mariana. The research was theoretically guided by the discussion on the social construction of markets accessed by family farmers. A typology of markets developed by Schneider (2016) was used as an analytical model - which differentiates the main market channels accessed by family farmers in Brazil in order to assess possible changes in the forms of marketing during the pandemic. This is an exploratory and descriptive study, with a qualitative methodology consisting of semi-structured interviews with family farmers in Mariana. Through the content analysis of the interviews, it was possible to identify that the marketing channels available in the pandemic context did not change, but, due to access restrictions, in addition to the absence of incentives and public policies, farmers were impacted, highlighting the significant reduction in their income.

Keywords:
family farming; social construction of markets; COVID-19 pandemic

INTRODUÇÃO

Este trabalho trata dos impactos da pandemia de Covid-19 sobre as condições de acesso aos mercados pelos agricultores familiares no município de Mariana, Minas Gerais.

O município de Mariana ficou mundialmente conhecido devido ao rompimento da barragem de rejeitos da empresa Samarco S.A em 2015, que foi um dos maiores desastres socioambientais já provocados por mineradoras. Nesse município, os agricultores familiares foram todos direta ou indiretamente atingidos e prejudicados pelo rompimento da barragem. Durante algum tempo, o principal espaço de comercialização dos agricultores familiares na região, a feira livre do município de Mariana, permaneceu fechado. Mesmo após a reabertura, os negócios realizados na feira foram duramente afetados devido à crise permanente que se instalou em Mariana, comprometendo a renda dos agricultores familiares e até mesmo a segurança alimentar e nutricional da população local.

A população de Mariana e, especificamente, os agricultores familiares ainda não haviam se recuperado cinco anos depois da crise gerada pelo rompimento da barragem, quando a pandemia de Covid-19 a atingiu, assim como a todo o mundo. Nesse caso específico, o somatório de duas crises, uma, de caráter econômico em consequência de um crime socioambiental e outra, de caráter econômico e sanitário, gerou graves consequências sobre as condições de vida dos agricultores familiares do município.

Os efeitos da pandemia que afetou agricultores em todo mundo e que, no caso específico de Mariana, atingiu àqueles que sofriam os efeitos de outra crise, ainda são pouco conhecidos. São necessários mais estudos sobre os efeitos, de médio e longo prazo, da pandemia de Covid-19 sobre as condições de produção e comercialização de produtos alimentares, em específico os oriundos da agricultura familiar, bem como as consequências sobre o abastecimento, a segurança alimentar e os sistemas agroalimentares.

O cenário de pandemia vivenciado no Brasil e no mundo, desde o ano de 2020, trouxe consequências severas para a sociedade em diversas dimensões, como a saúde, a vida, a sociabilidade e a economia. O potencial nocivo da Covid-19 não decorre apenas de sua dimensão sanitária, mas, também, dos reflexos no âmbito econômico e na distribuição e acesso aos alimentos (Comissão Econômica para a América Latina, 2020Comissão Econômica para a América Latina - CEPAL. (2020). Cómo evitar que la crisis del COVID-19 se transforme em uma crisis alimentaria: aciones urgentes contra el hambre em América Latina y el Caribe. Informe COVID-19. Recuperado em 15 de junho de 2021, de https://www.cepal.org/es/publicaciones/45702-como-evitar-que-la-crisis-covid-19-se-transforme-crisis-alimentaria-acciones
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). Tais reflexos, que afetam de maneira geral a população brasileira, assumem características específicas em relação aos agricultores familiares, principais produtores de alimentos no país (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2020Food and Agriculture Organization of the United Nations - FAO. (2020). Coronavirus disease 2019 (COVID-19) and family farming. Recuperado em 4 de abril de 2022, de https://www.fao.org/family-farming/detail/fr/c/1300574/
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).

Como em praticamente todo o território nacional, logo no início da pandemia, os governos decretaram a paralisação das aulas presenciais. Devido à ausência dos alunos nas escolas e a consequente suspensão da alimentação escolar, o acesso aos recursos do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) foi criticamente afetado, colocando em risco a situação financeira dos agricultores que dependiam efetivamente desse mercado.

Somando-se às limitações de acesso a um dos principais canais de comercialização para os agricultores, constituído pelo mercado institucional, as restrições sanitárias nos estabelecimentos comerciais e medidas para conter a circulação de pessoas levaram ao fechamento das feiras livres, o que impactou negativamente nas condições socioeconômicas dos agricultores e na economia do município.

Em tal contexto, foi realizada a pesquisa que ora apresentamos. Neste estudo, buscou-se levantar dados de natureza qualitativa referentes às percepções dos sujeitos da pesquisa - os agricultores familiares de Mariana - sobre fatores relacionados à pandemia que influenciaram suas condições de vida, em especial, no que se refere à produção e à comercialização de alimentos.

Os efeitos da pandemia sobre agricultores e sistemas agroalimentares em todo o mundo têm sido recentemente estudados, bem como as avaliações e recomendações de organizações supranacionais ligadas a pautas como a alimentação e a segurança alimentar têm sido difundidas (Batista et al., 2020Batista, I.C., Souza, P.C., & Teixeira, D.B. (2020). Impacto da pandemia Covid-19 na agricultura familiar: uma proposta de pesquisa. In Anais do VI Fórum de Pesquisa e Extensão da Universidade de Marília. Vol. 2. Recuperado em 25 de outubro de 2022, de https://oficial.unimar.br/wp-content/uploads/2021/01/VOLUME-2-CIENCIAS-AGRARIAS-VI-FORPEX-2020.pdf.
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; Cavalli et al., 2020Cavalli, S., Soares, P., Martinelli, S., & Schneider, S. (2020). Family farming in times of Covid-19. Revista de Nutrição, 33, e200180. https://doi.org/10.1590/1678-9865202033e200180
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; Comissão Econômica para a América Latina, 2020Comissão Econômica para a América Latina - CEPAL. (2020). Cómo evitar que la crisis del COVID-19 se transforme em uma crisis alimentaria: aciones urgentes contra el hambre em América Latina y el Caribe. Informe COVID-19. Recuperado em 15 de junho de 2021, de https://www.cepal.org/es/publicaciones/45702-como-evitar-que-la-crisis-covid-19-se-transforme-crisis-alimentaria-acciones
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; Instituto Interamericano de Cooperación para la Agricultura, 2020Instituto Interamericano de Cooperación para la Agricultura - IICA. (2020). La agricultura familiar y el abastecimento agroalimentario ante la pandemia COVID-19 em América Latina y el Caribe. Costa Rica: Programa de Desarrollo Territorial y Agricultura Familiar. Recuperado em 15 de junho de 2021, de http://repositorio.iica.int/handle/11324/11226
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; Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2020Food and Agriculture Organization of the United Nations - FAO. (2020). Coronavirus disease 2019 (COVID-19) and family farming. Recuperado em 4 de abril de 2022, de https://www.fao.org/family-farming/detail/fr/c/1300574/
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; Refe PENSSAN, 2021Refe PENSSAN. (2021). Inquérito nacional sobre insegurança alimentar no contexto da pandemia da Covid-19 no Brasil. Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar. Recuperado em 26 de junho de 2021, de http://olheparaafome.com.br/VIGISAN_Inseguranca_alimentar.pdf
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; Mendes et al., 2021Mendes, L., Canella, D. S., Araújo, M. L., Jardim, M. Z., Cardoso, L. O., & Pessoa, M. C. (2021). Food environments and the COVID-19 pandemic in Brazil: analysis of changes observed in 2020. Public Health Nutrition, 25(1), 32-35. http://dx.doi.org/10.1017/S1368980021003542
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; Schneider et al., 2020Schneider, S., Cassol, A., Leonardi, A., & Marinho, M. M. (2020). Os efeitos da pandemia da Covid-19 sobre o agronegócio e a alimentação. Estudos Avançados, 34(100), 167-188. http://dx.doi.org/10.1590/s0103-4014.2020.34100.011
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; Souza et al., 2021Souza, B., Bernardes, M., Vieira, V., Francisco, P., Marín-León, L., Camargo, D., & Segall-Corrêa, A. (2021). (In)segurança alimentar no Brasil no pré e pós pandemia da COVID-19: reflexões e perspectivas. Interamerican Journal of Medicine and Health, 3, e202101001.; van der Ploeg, 2021van der Ploeg, J. D. (2021). O sistema alimentar em tempos de Covid-19: ensinamentos para o futuro. Revista Agricultura: Experiências em Agroecologia, 3, 5.). Contudo, são necessários mais estudos sobre os efeitos de médio e longo prazo da pandemia de Covid-19 sobre as condições de produção e comercialização de produtos alimentares, em específico, aqueles oriundos da agricultura familiar, bem como as consequências sobre o abastecimento, a segurança alimentar e os sistemas agroalimentares.

As estratégias adotadas para coibir o avanço da Covid-19, como o fechamento de espaços para comercialização de produtores locais bem como a cessação das compras públicas, destacaram a fragilidade do sistema alimentar e contribuíram para um impacto negativo na comercialização de alimentos produzidos pela agricultura familiar (Cavalli et al., 2020, pCavalli, S., Soares, P., Martinelli, S., & Schneider, S. (2020). Family farming in times of Covid-19. Revista de Nutrição, 33, e200180. https://doi.org/10.1590/1678-9865202033e200180
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. 3). Em Mariana, pode-se observar esse tipo de efeito. Durante a pandemia, os principais mercados em que os agricultores familiares estão inseridos, sobretudo os mercados públicos e institucionais, sofreram grandes restrições de acesso e redução de demanda.

Como alternativas potenciais para a garantia do abastecimento alimentar, pode-se apontar as cadeias curtas de alimentos que sofrem menos com as restrições de deslocamento e seu fortalecimento poderia aumentar as oportunidades de trabalho e contribuir para a melhoria da qualidade de vida (Cavalli et al., 2020, pCavalli, S., Soares, P., Martinelli, S., & Schneider, S. (2020). Family farming in times of Covid-19. Revista de Nutrição, 33, e200180. https://doi.org/10.1590/1678-9865202033e200180
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. 3). Com esse intuito, os autores apresentam estratégias que podem ser adotadas para minimizar o impacto negativo na produção, comercialização, bem como na renda dos agricultores familiares decorrente das ações para controle da pandemia. Estas estratégias dependem da atuação dos próprios agricultores e de suas organizações, mas - de maneira importante - do poder público. No caso em estudo, contudo, o trabalho de adaptação e desenvolvimento de estratégias para enfrentamento dos problemas decorrentes da pandemia aparenta ter sido unicamente desenvolvido por parte dos próprios agricultores familiares, como relatado nas entrevistas e na pesquisa exploratória documental. Esses apontamentos nos permitem contextualizar nossa pesquisa, onde foram observados efeitos severos da pandemia sobretudo sobre o acesso a canais de comercialização tradicionalmente utilizados pelos agricultores, com a consequente perda de renda e a falta de incentivos e políticas públicas.

Visando contribuir para a compreensão das condições de comercialização de produtos da agricultura familiar no contexto pandêmico, apresentamos, neste artigo, resultados de pesquisa realizada entre os anos de 2020 e 2021 com agricultores de Mariana. A pesquisa almejou responder à seguinte pergunta: quais foram os efeitos da pandemia sobre a comercialização de alimentos produzidos por agricultores familiares em Mariana? Os objetivos do trabalho foram: discutir o acesso dos agricultores familiares aos mercados considerando o momento pré-pandêmico e possíveis mudanças durante a pandemia; observar e analisar os efeitos econômicos e sociais da pandemia na produção, na comercialização e, consequentemente, nas condições de vida dos agricultores familiares de Mariana.

Foi realizada uma pesquisa de caráter exploratório e descritivo, contando com uma metodologia qualitativa baseada, principalmente, na realização de entrevistas semiestruturadas com agricultores familiares. Após a coleta de dados, partiu-se para a análise de conteúdo, cujo desenvolvimento e resultados são apresentados adiante. Na análise dos dados, procuramos nos situar em relação à discussão sobre construção social de mercados da agricultura familiar e utilizamos uma tipologia de mercados da agricultura familiar proposta por Schneider (2016)Schneider, S. (2016). Mercados e agricultura familiar. In F. Marques, M. Conterato & S. Schneider (Eds.), Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural (pp. 93-140). Porto Alegre: Editora da UFRGS. como modelo analítico.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Para a interpretação dos dados da pesquisa, foi utilizada, como modelo analítico, a tipologia dos mercados da agricultura familiar elaborada por Schneider (2016)Schneider, S. (2016). Mercados e agricultura familiar. In F. Marques, M. Conterato & S. Schneider (Eds.), Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural (pp. 93-140). Porto Alegre: Editora da UFRGS.. Esta tipologia é construída pelo autor no contexto da discussão sobre construção social dos mercados da agricultura familiar. Para Schneider (2016, pSchneider, S. (2016). Mercados e agricultura familiar. In F. Marques, M. Conterato & S. Schneider (Eds.), Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural (pp. 93-140). Porto Alegre: Editora da UFRGS.. 95), os mercados são parte de processos sociais de produção e reprodução das atividades econômicas e das unidades familiares, influenciando a vida das pessoas, sua cultura, moldando e modificando instituições, sendo motivo, também, para conflitos, protestos e disputas. Diante da realidade social em que os mercados estão inseridos, a relação dos agricultores familiares nesses espaços é composta de particularidades e desafios.

Para além da consideração sobre os efeitos potencialmente desestruturantes da inserção mercantil sobre as formações sociais camponesas e de agricultores familiares, a discussão atual tem se centrado na análise do processo de construção social dos mercados e das diversas formas de inserção dos agricultores em mercados plurais. A abordagem da construção social dos mercados é creditaria do pensamento de Polanyi (2000)Polanyi, K. (2000). A grande transformação: as origens da nossa época (2ª ed.). Rio de Janeiro: Campus., sobretudo de sua noção de embeddedness (imersão ou incrustação) e de sua revisão formulada por Granovetter (2007)Granovetter, M. (2007). Ação econômica e estrutura social: o problema da imersão. RAE Eletrônica, 6(1), 1-41. http://dx.doi.org/10.1590/S1676-56482007000100006
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, tendo recebido contribuições importantes de outros autores no campo da sociologia econômica (Bourdieu, 2005Bourdieu, P. (2005). O campo econômico. Política e Sociedade, 4(6), 15-58.; Fligstein, 1996Fligstein, N. (1996). Markets as politics: a political-cultural approach to market institutions. American Sociological Review, 61(4), 1. http://dx.doi.org/10.2307/2096398
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; Steiner & Vatin, 2010Steiner, P., & Vatin, F. (2010). Introduction: le fait économique comme fait social. In P. Steiner & F. Vatin (Eds.), Traité de sociologie économique. Paris: Quadrige; PUF.).

No Brasil, essa abordagem tem sido adotada por um número crescente de pesquisadores do meio rural e da agricultura familiar (Wilkinson, 2008Wilkinson, J. (2008). Mercados, redes e valores: o novo mundo da agricultura familiar. Porto Alegre: Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Rural, Editora da UFRGS.; Conterato et. al, 2013Conterato, M., Niederle, P. A., Triches, R. M., Marques, F. C., & Schultz, G. (2013). Mercados e agricultura familiar: interfaces, conexões e conflitos (358 p. ). Porto Alegre: Via Sapiens. Recuperado em 16 de junho de 2021, de http://www.ufrgs.br/pgdr/publicacoes/livros/outras-publicacoes/mercados-e-agricultura-familiar-interfaces-conexoes-e-conflitos
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; Marques, Conterato e Schneider, 2016Marques, F., Conterato, M., & Schneider, S. (Eds.). (2016). Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural. Porto Alegre: Editora da UFRGS.). Maluf (2004, pMaluf, R. (2004). Mercados agroalimentares e a agricultura familiar no Brasil: agregação de valor, cadeias integradas e circuitos regionais. Ensaios FEE, 25(1), 299-322. Recuperado em 17 de junho de 2021, de https://revistas.dee.spgg.rs.gov.br/index.php/ensaios/article/view/2061
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. 305) aponta a diferença dos enfoques econômicos convencionais e aqueles em que os mercados são pensados como resultado de construção social. O autor considera a relevância da análise que passa a se pautar em elementos como os processos que levam à construção do próprio valor dos produtos, as relações estabelecidas entre os agentes (produtivos, comerciais e financeiros) assim como a instituição das formas associativas, unindo produtores e demais envolvidos na produção e na distribuição dos alimentos.

A partir desta abordagem, são considerados os fatores que favorecem ou restringem as relações dos produtores com os mercados levando em conta o nível de imersão em relações sociais, culturais e de poder. Esta abordagem nos interessa, pois a pandemia é um fator atípico que potencialmente restringiria a inserção mercantil dos agricultores familiares, o que se procurou investigar na pesquisa, além dos possíveis efeitos de uma eventual restrição.

Partindo da perspectiva da construção social dos mercados, às questões tradicionais como remuneração da atividade agrícola pelas agroindústrias e exploração dos atravessadores, unem-se outras com enfoque no funcionamento, nas condições de acesso, nas barreiras à entrada, nas formas de institucionalização e nas possibilidades de criação de novos mercados (Oliveira & Mello, 2006 apud Gastal et al., 2014, pGastal, M., Xavier, J. H. V., Rocha, J. C. C. G., Mendonça, A. P. B., & Silva, W. H. (2014). Construção social de mercados pela agricultura familiar em Unaí, MG: potencialidades e limitações. Cadernos de Ciência & Tecnologia, 31(2), 315-348.. 318).

Considerando a realidade da agricultura familiar e levando em conta os princípios mencionados, Schneider (2016, pSchneider, S. (2016). Mercados e agricultura familiar. In F. Marques, M. Conterato & S. Schneider (Eds.), Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural (pp. 93-140). Porto Alegre: Editora da UFRGS.. 115) constrói uma tipologia dos mercados acessados por agricultores familiares no Brasil baseada no grau de integração e inserção nos mercados, além do tipo e do destino do que é produzido. A tipologia proposta visa expressar a diversidade de canais de comercialização com suas regras e processos de institucionalização específicos. O cruzamento entre variáveis resulta em uma tipologia formada por quatro tipos de mercados em que os agricultores familiares se inserem e que são apresentados a seguir.

Os mercados de proximidade são aqueles onde predominam relações de troca entre pessoas, realizadas via parentesco, conhecimento e reciprocidade com foco nos aspectos valorativos e qualidade dos bens trocados. De acordo com Schneider (2016, pSchneider, S. (2016). Mercados e agricultura familiar. In F. Marques, M. Conterato & S. Schneider (Eds.), Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural (pp. 93-140). Porto Alegre: Editora da UFRGS.. 123), os mecanismos de circulação e distribuição de produtos e mercadorias comercializados buscam o deslocamento físico mais restrito possível, sendo realizado, preferencialmente, on spot (no local). Esses mercados se conformam em locais específicos, como povoados rurais e pequenos municípios, e suas trocas materiais estão imersas em relações socialmente construídas na reciprocidade e no interconhecimento, atuando, também, como dispositivos de controle e regulação.

Mercados locais e territoriais se configuram por trocas monetizadas, tendo a situação de intercâmbio cada vez mais orientada pela oferta e demanda, em que os agentes produzem para vender ou trocam para ganhar, sendo, assim, um exemplo de economia mercantil simples. Neste caso, a distribuição e a circulação dos produtos deixam de ser feitas por quem produz e passa a existir um intermediário na transação por meio dos atravessadores, que utilizam mecanismos de controle e regulação para manter sua influência e garantir a compensação de seus interesses e custos, como preços diferenciados, certificado de produtos, entre outros. Feiras regionais e espaços públicos para venda, como os leilões, são exemplos deste mercado.

O terceiro tipo, que compreende os mercados convencionais, é caracterizado por mercados de produtos, bens e mercadorias que se orientam pela oferta e demanda de poderosos agentes privados, que realizam negócios em variados níveis e modos com o objetivo de vender para comprar e vice-versa. Diferentemente dos mercados territoriais, estes dispensam o local físico, com o campo de atuação nas esferas da distribuição e da circulação nacional e global, bastando que existam oferta e demanda e seja possível fazer lucro. Os agricultores que se inserem nestes mercados são altamente dependentes de contratos a montante (produção) e a jusante (distribuição), especialmente os que produzem commodities.

Os agricultores familiares têm se inserido de forma crescente no Brasil nos mercados públicos e institucionais - este quarto tipo de mercado tem como principal agente o Estado ou alguma organização pública. Os mercados públicos, mesmo com um alto grau de regulamentação e controle, são destinos de grande interesse para os produtos e mercadorias dos agricultores, pois são fortemente dirigidos pela demanda, o que tende a elevar os preços pagos, e possuem a garantia de recebimento do pagamento. Estes mercados, por sua vez, não possuem um local específico de atuação e são criados para atender a demandas como a da alimentação escolar, compra de produtos para cestas básicas ou, então, atender a equipamentos públicos, como os hospitais.

Os quatros tipos de mercados da agricultura familiar apresentados genericamente podem ser detalhados pela diferença do tipo de agricultor que os acessa, o lócus ou alcance espacial, a natureza ou características dos mercados, as formas de regulação ou controle existentes e os canais de comercialização utilizados. De um ponto de vista sociológico, os tipos de mercados mencionados são analisados pela relação entre as variáveis de integração aos mercados e o tipo e destino do que é produzido, o processo social em curso possibilita observar as relações sociais dominantes e como elas se articulam. Os diversos canais de comercialização apresentados, uma vez que são socialmente construídos, coexistem com distintos mecanismos de regulação e controle, ou seja, as instituições.

Consideramos que esse modelo analítico pode ser bastante útil na interpretação dos efeitos da pandemia sobre as formas de acesso e as condições de comercialização por agricultores familiares, permitindo analisar se houve alterações em condições sociais, econômicas e institucionais relevantes com implicações, em termos de restrições e consequências que estas têm. De tal modo, buscou-se uma reflexão sobre os impactos da pandemia sobre as condições de produção e comercialização de alimentos oriundos da agricultura familiar em Mariana à luz desse modelo analítico.

Este trabalho deverá se somar, assim, aos estudos que têm contribuído para a compreensão dos efeitos socioeconômicos da pandemia sobre os agricultores familiares e sobre o sistema agroalimentar (Batista et al., 2020Batista, I.C., Souza, P.C., & Teixeira, D.B. (2020). Impacto da pandemia Covid-19 na agricultura familiar: uma proposta de pesquisa. In Anais do VI Fórum de Pesquisa e Extensão da Universidade de Marília. Vol. 2. Recuperado em 25 de outubro de 2022, de https://oficial.unimar.br/wp-content/uploads/2021/01/VOLUME-2-CIENCIAS-AGRARIAS-VI-FORPEX-2020.pdf.
https://oficial.unimar.br/wp-content/upl...
; Cavalli et al., 2020Cavalli, S., Soares, P., Martinelli, S., & Schneider, S. (2020). Family farming in times of Covid-19. Revista de Nutrição, 33, e200180. https://doi.org/10.1590/1678-9865202033e200180
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; Mendes et al., 2021Mendes, L., Canella, D. S., Araújo, M. L., Jardim, M. Z., Cardoso, L. O., & Pessoa, M. C. (2021). Food environments and the COVID-19 pandemic in Brazil: analysis of changes observed in 2020. Public Health Nutrition, 25(1), 32-35. http://dx.doi.org/10.1017/S1368980021003542
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; Schneider et al., 2020Schneider, S., Cassol, A., Leonardi, A., & Marinho, M. M. (2020). Os efeitos da pandemia da Covid-19 sobre o agronegócio e a alimentação. Estudos Avançados, 34(100), 167-188. http://dx.doi.org/10.1590/s0103-4014.2020.34100.011
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; Souza et al., 2021Souza, B., Bernardes, M., Vieira, V., Francisco, P., Marín-León, L., Camargo, D., & Segall-Corrêa, A. (2021). (In)segurança alimentar no Brasil no pré e pós pandemia da COVID-19: reflexões e perspectivas. Interamerican Journal of Medicine and Health, 3, e202101001.; Preiss et al., 2022Preiss, P. V., Silva, G. P., Deponti, C. M., & Deggerone, Z. (2022). Impacto da Covid-19 na comercialização de alimentos da agricultura familiar no Rio Grande do Sul. Eutopía Revista de Desarrollo Económico Territorial, 21, 9-29.).

METODOLOGIA

A pesquisa realizada foi de caráter exploratório e descritivo, na medida em que se buscou estabelecer uma aproximação com o tema dos efeitos da pandemia sobre as formas de comercialização dos agricultores familiares e elaborar uma problemática. A metodologia empregada foi do tipo qualitativo. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com agricultores familiares do município a partir de um roteiro elaborado e aprovado pelo comitê de ética responsável, incluindo questões que abordam as formas e canais de comercialização acessados pelos agricultores e os efeitos da pandemia sobre estes mercados1 1 Registro no Comitê de Ética sob CAAE 50373821.1.0000.5150, data de aprovação no CEP: 30 de outubro de 2021. . Devido às condições sanitárias vigentes no período da realização da pesquisa de campo, o número de entrevistados foi reduzido, mantendo-se, contudo, a preocupação em representar a diversidade que compõe a agricultura familiar de Mariana e o critério de saturação para as informações mais relevantes para a pesquisa, ou seja, aquelas referentes ao acesso a mercados2 2 A respeito das entrevistas semiestruturadas, realizadas entre outubro e novembro de 2021, cabe ressaltar que as mesmas foram aplicadas em campo, seguindo todos os protocolos sanitários necessários para a ocasião. . Após a coleta de dados, partiu-se para a análise de conteúdo, cujos desenvolvimento e resultados são apresentados adiante.

O público entrevistado foi definido, inicialmente, a partir de um recorte de diferentes grupos que compõem o todo da agricultura familiar no município, quais sejam:

a) agricultores familiares convencionais;

b) agricultores com produção orgânica e agroecológica;

c) agricultores atingidos pelo rompimento da barragem de Fundão;

d) mulheres, em especial, lideranças femininas na agricultura familiar;

e) produtores de leite e gado;

  1. f

    agricultores assentados3 3 Essas categorias foram definidas a partir de trabalhos de pesquisa anteriores na região desenvolvidos pelo Núcleo de Pesquisa e Extensão em Desenvolvimento Econômico e Social (NUPEDES/UFOP), do qual os autores são membros. .

Foram realizadas seis entrevistas semiestruturadas gravadas com os agricultores familiares durante o período de outubro a novembro de 2021, além de conversas não gravadas e observações em campo, incluindo propriedades rurais e espaços de comercialização, como feiras locais. Considerando as restrições de circulação e medidas sanitárias durante a realização da pesquisa, optou-se por reduzir o número de entrevistados e selecionar informantes-chave de ambos os sexos que representavam diferentes categorias de agricultores, de diferentes regiões do município e que ocupavam, também, posições de representação e liderança no setor.

Os entrevistados foram classificados e identificados do seguinte modo, apresentado no Quadro 1:

Quadro 1

Buscou-se entrevistados que correspondessem aos diferentes grupos de agricultores do município. Mas, como pode-se observar no Quadro 1 acima, um entrevistado pode representar mais de um grupo ou tipo de agricultor. Na escolha dos entrevistados, observou-se, especialmente, o tipo de produção - se convencional ou orgânica e agroecológica, se apenas produção agrícola ou agropecuária - considerando que potencialmente são destinadas a canais de comercialização distintos, o que buscou-se verificar na pesquisa. Quanto ao sexo do entrevistado, este foi tomado como relevante a partir de resultados de pesquisa anterior realizada no mesmo município que revela que mulheres têm maior participação na produção orgânica e agroecológica, destinam uma parcela maior da produção para o consumo familiar e têm maior engajamento em organizações de representação, tendendo a ocupar posições de liderança nas mesmas4 4 Resultados do Projeto Panorama, desenvolvido pelo NUPEDES e em fase de finalização e divulgação dos resultados, que buscou realizar uma caracterização da agricultura familiar na região, com foco na produção orgânica e agroecológica. .

As entrevistas, que constituem o corpus central da pesquisa, foram realizadas presencialmente. Os entrevistados foram convidados a responder a partir de sua própria experiência e percepção e não como representantes de uma categoria. Após a realização das entrevistas, buscou-se comparar a experiência dos entrevistados com a de outros agricultores da mesma categoria por meio de conversas não gravadas, realizadas, em geral, de forma remota, por contato telefônico, checando-se a saturação das informações. É importante ressaltar que, por se tratar de pesquisa exploratória e com um número reduzido de entrevistados, há limitações nos resultados no que se refere à possibilidade de generalização. Ainda assim, a pesquisa revela efeitos significativos da pandemia para os agricultores familiares que coadunam com pesquisas recentes, com especial destaque para os efeitos sobre a renda (Batista et al., 2020Batista, I.C., Souza, P.C., & Teixeira, D.B. (2020). Impacto da pandemia Covid-19 na agricultura familiar: uma proposta de pesquisa. In Anais do VI Fórum de Pesquisa e Extensão da Universidade de Marília. Vol. 2. Recuperado em 25 de outubro de 2022, de https://oficial.unimar.br/wp-content/uploads/2021/01/VOLUME-2-CIENCIAS-AGRARIAS-VI-FORPEX-2020.pdf.
https://oficial.unimar.br/wp-content/upl...
; Cavalli et al., 2020Cavalli, S., Soares, P., Martinelli, S., & Schneider, S. (2020). Family farming in times of Covid-19. Revista de Nutrição, 33, e200180. https://doi.org/10.1590/1678-9865202033e200180
https://doi.org/10.1590/1678-9865202033e...
; Mendes et al., 2021Mendes, L., Canella, D. S., Araújo, M. L., Jardim, M. Z., Cardoso, L. O., & Pessoa, M. C. (2021). Food environments and the COVID-19 pandemic in Brazil: analysis of changes observed in 2020. Public Health Nutrition, 25(1), 32-35. http://dx.doi.org/10.1017/S1368980021003542
http://dx.doi.org/10.1017/S1368980021003...
; Schneider et al., 2020Schneider, S., Cassol, A., Leonardi, A., & Marinho, M. M. (2020). Os efeitos da pandemia da Covid-19 sobre o agronegócio e a alimentação. Estudos Avançados, 34(100), 167-188. http://dx.doi.org/10.1590/s0103-4014.2020.34100.011
http://dx.doi.org/10.1590/s0103-4014.202...
; Souza et al., 2021Souza, B., Bernardes, M., Vieira, V., Francisco, P., Marín-León, L., Camargo, D., & Segall-Corrêa, A. (2021). (In)segurança alimentar no Brasil no pré e pós pandemia da COVID-19: reflexões e perspectivas. Interamerican Journal of Medicine and Health, 3, e202101001.; Preiss et al., 2022Preiss, P. V., Silva, G. P., Deponti, C. M., & Deggerone, Z. (2022). Impacto da Covid-19 na comercialização de alimentos da agricultura familiar no Rio Grande do Sul. Eutopía Revista de Desarrollo Económico Territorial, 21, 9-29.).

À medida em que se realizavam as entrevistas, o conteúdo era transcrito para facilitar o processo de análise que se deu em três etapas apresentadas a seguir. Optou-se por uma apresentação detalhada do processo de análise e não apenas dos resultados, considerando a necessidade de maior sistematicidade e objetividade na pesquisa qualitativa de modo a permitir uma melhor avaliação de seus resultados.

Primeira etapa de análise:

Na primeira etapa, após a transcrição completa das entrevistas, seu conteúdo foi trabalhado buscando-se levantar as principais informações a serem analisadas, distinguindo entre o período anterior e aquele de ocorrência da pandemia. Essas informações foram dispostas em um quadro, cruzando-se com elementos que permitissem a identificação e categorização dos agricultores. As informações que permitiam identificar o produtor foram nome, localidade, condição legal, tamanho da propriedade e tempo na atividade. As informações selecionadas para análise, considerando o momento anterior e durante a pandemia, foram:

a. atividades desenvolvidas na propriedade;

b. renda familiar;

c. fontes de renda;

d. número de pessoas trabalhando no estabelecimento;

e. quantidade destinada ao consumo familiar;

f. quantidade média mensal comercializada;

g. preço médio dos produtos;

h. canais de comercialização acessados;

i. comercialização por meios digitais;

j. dificuldades percebidas para a comercialização;

k. avaliação da situação econômica.

Completando a primeira etapa da análise, verificou-se a saturação das respostas e procedeu-se à análise do conteúdo das entrevistas organizado no quadro buscando identificar recorrências nas respostas e especificidades significativas a serem exploradas nas etapas seguintes.

As principais recorrências, que são analisadas a seguir, foram:

  1. a

    O acesso aos mercados de tipo local/territorial e mercados públicos/institucionais sendo bastante afetado;

  2. b

    dificuldades de comercialização em geral;

  3. c

    redução da renda dos agricultores em até 80%.

Segunda etapa de análise:

Na segunda etapa da análise, cada entrevista foi trabalhada individualmente por meio da análise de conteúdo e seu conjunto foi perscrutado, buscando identificar termos e questões recorrentes a serem discutidos em relação à perspectiva teórica adotada no trabalho.

Algumas semelhanças foram observadas diante das respostas às perguntas relacionadas a caracterização do perfil do agricultor, sendo que todos os agricultores afirmaram possuir mais de dez anos de experiência na atividade, indicando o possível envelhecimento da população rural, e serem membros de associações e/ou cooperativas, o que indica a importância crescente no associativismo na região.

Além disso, semelhanças em relação ao efeito na renda familiar por conta da pandemia também foram observadas, sendo que poucos agricultores encontraram uma maneira de contrapor os efeitos decorrentes das ações para controle da pandemia e todos os agricultores afirmaram ter observado uma redução na renda familiar, variando de 40% a 80%.

Como medida para contenção da propagação do vírus, as feiras locais e vendas em espaços públicos foram interrompidas, assim como as aulas presenciais também foram suspensas aos níveis municipal, estadual e federal, afetando a maior parte dos mercados acessados pelos agricultores familiares, o que nos ajuda a entender a semelhança das percepções dos agricultores sobre os efeitos da pandemia na comercialização e, consequentemente, na renda deles5 5 O Decreto municipal nº 10.030/2020, de 16 de março de 2020, declarou situação de emergência em saúde pública no Município de Mariana e, dentre outros, suspendeu as atividades escolares presenciais e vendas em feiras livres e espaços públicos no âmbito do Município de Mariana. Mais informações podem ser acessadas em Mariana (2021). .

A análise se concentrou, a partir de então, na interpretação das percepções dos agricultores sobre tais fatores, em diálogo com os referenciais teóricos da pesquisa.

Terceira etapa de análise:

Na terceira etapa, analisou-se o conjunto das entrevistas considerando a diversidade de mercados acessados pelos agricultores e possíveis mudanças durante a pandemia, a partir da tipologia de Schneider (2016)Schneider, S. (2016). Mercados e agricultura familiar. In F. Marques, M. Conterato & S. Schneider (Eds.), Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural (pp. 93-140). Porto Alegre: Editora da UFRGS.. Para tanto, criou-se um quadro (Quadro 2) onde foram relacionadas as informações coletadas em cada uma das entrevistas às variáveis do modelo analítico, quais sejam: lócus ou alcance espacial, natureza das trocas, formas de regulação canais de comercialização e tipo de mercado. O Quadro 2 é apresentado, acompanhado de discussão, na seção seguinte.

Quadro 2

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Por meio da análise das entrevistas, foi possível observar aspectos recorrentes nas respostas para a maioria das questões, o que indica uma percepção comum acerca de efeitos da pandemia que afetaram a todos. As singularidades observadas no quadro construído na primeira etapa da análise puderam ser aprofundadas e discutidas. De modo geral, observou-se que as diferentes categorias de agricultores definidas neste trabalho apresentaram resultados semelhantes acerca dos efeitos enfrentados pela restrição do acesso aos canais de comercialização.

Ao serem questionados quanto à possível redução da renda durante a pandemia, uma agricultora, que pode ser considerada uma liderança feminina na agricultura familiar no município, afirmou:

“Eu moro sozinha e minha mãe já é aposentada, então eu conseguia mais ou menos dois salários que dava pra me sustentar e cobrir os gastos com a plantação. Quando a feira parou, caiu mais da metade, mas eu segurei as pontas até a feira voltar, eu precisava vender. Desde o começo, fui contra parar a feira, foi muito desespero, não sabia o que ia fazer. Foi uns 60%, 70%” [de redução da renda] (Entrevistada 3).

A partir das entrevistas, percebeu-se que as perdas para os homens responsáveis pela unidade produtiva foram menores. Nesse sentido, um agricultor e criador de gado para a produção de leite relatou uma perda na renda de cerca de 50%. Por sua vez, um agricultor, considerado convencional (não realiza produção orgânica ou agroecológica), relata:

“Reduziu uns 40% no começo porque não podia mais vender na rua, mas depois liberou e voltou ao normal” (Entrevistado 1).

Já um agricultor com produção orgânica e agroecológica, atingido pelo rompimento da Barragem de Fundão, relata:

“Caiu cerca de 50% de venda, o mesmo de produção. A renda caiu né, se antes eu vendia 100 reais eu passei a vender 50 reais, então quando você vai ver a renda cai” (Entrevistado 4).

Contudo, uma possível diferenciação do impacto da pandemia sobre a renda dos produtores conforme o gênero é um assunto que demanda mais investigação.

Outro ponto observado foi a redução da mão de obra nas propriedades, que afetou diretamente a manutenção da produção. Entre os entrevistados, os agricultores familiares que possuíam mais de duas pessoas trabalhando no estabelecimento antes da pandemia afirmaram ter sua mão de obra reduzida. Por conta do fluxo de renda reduzido no começo da pandemia, estes trabalhadores migraram para a cidade em busca de outras oportunidades de emprego para o sustento de suas famílias. Mesmo que a demanda por produtos permanecesse a mesma, aumentou-se a dificuldade para manutenção da produção. Em relação ao número de trabalhadores no estabelecimento antes da pandemia, alguns agricultores relataram redução na mão de obra, tanto da própria família quanto contratada:

“Nós éramos nove pessoas com os filhos e parentes que trabalhavam na horta, e hoje estamos só nós dois (Entrevistada 2).

“Eu tinha dez trabalhadores antes da pandemia, hoje eu estou só com dois, porque as pessoas foram deslocadas para trabalhar na cidade, cortaram o transporte também, então hoje meu problema é o transporte e encontrar pessoas que queiram trabalhar lá na horta” (Entrevistado 4).

Devido ao efeito negativo da pandemia sobre a comercialização dos produtos e na redução da mão de obra disponível, como relatado pelos agricultores, uma das consequências apresentadas foi a redução das atividades e das variedades produzidas no estabelecimento, outro fator que prejudicou o soerguimento das vendas, dada a redução de opções de alimentos a serem comercializados. Os produtos que demandam um cultivo mais cuidadoso ou investimento maior foram retirados da escala de produção.

Apenas um agricultor, do tipo convencional, afirma ter aumentado a variedade de produtos como forma de investimento para retomada das vendas. Chama a atenção o fato de que, entre os entrevistados, este agricultor é quem afirma ter enfrentado a menor redução na renda familiar, sendo esta em cerca de 40%. Conforme esse agricultor:

“A princípio, teve uma pequena queda, mas normalizou rápido, pois investi em variedade de produção. [...] Aumentei algumas variedades e me ajudou a retomar as vendas. [...] Piorou um pouco (a situação financeira) porque os preços das coisas subiram, mas teve colega que sofreu mais” (Entrevistado 1).

Essa perspectiva nos leva a acreditar que aqueles que, de alguma forma, investiram em diferenciação de produtos e alcance de novos mercados foram os que sofreram menos com os impactos da crise sanitária, podendo indicar um possível caminho para a mitigação dos efeitos da pandemia.

Quando questionados sobre a variedade de atividades produtivas desenvolvidas no estabelecimento e a alteração por conta da pandemia, os produtores assentados afirmaram haver grande redução, principalmente, dos folhosos e leguminosos, como revela a entrevistada:

“A gente não planta a quantidade que a gente plantava antes, não. Antes, a gente plantava brócolis, espinafre, quiabo, repolho, pra escola mesmo, cenoura, beterraba. Hoje, nós diminuímos só mexemos mesmo com alface, couve, almeirão, cebola e salsinha” (Entrevistada 2).

Para alguns agricultores, um dos motivos para a redução de variedade foram o tempo dedicado à plantação reduzido e a falta de mão de obra:

Sim, algumas variedades eu não dei conta de plantar, porque algumas variedades [você] tem que plantar e cuidar. Eu parei com as frutíferas, principalmente as bananas, que eu produzia muito e hoje tá abandonada” (Entrevistado 4).

Através das informações coletadas pelas entrevistas semiestruturadas, foram observados relatos semelhantes quanto às restrições significativas de acesso aos canais de comercialização dos agricultores familiares de Mariana, impactando negativamente a renda e condição socioeconômica deles. Assim, os mercados de proximidade se tornaram a principal saída para minimizar os efeitos das restrições sanitárias.

Os agricultores que estavam inseridos nos mercados públicos/institucionais afirmaram grande redução das vendas, sobretudo nos momentos em que os canais de escoamento dos produtos foram suspensos como medida de controle da propagação do coronavírus. Quando questionados quanto aos mercados que comercializavam sua produção e a alteração por conta da pandemia, destacaram-se:

“Feiras livres semanais, delivery e merenda escolar. Perdemos as feiras e a merenda escolar” (Entrevistada 6).

A maior parte era na feira e um pouco para os vizinhos. Sem a feira, eu não tinha onde vender e, em Bandeirantes [distrito do município de Mariana], não tinha muita procura. Tive dificuldade para fazer entrega de cesta porque não tinha transporte e a prefeitura não forneceu mais o veículo que me levava para a feira. A prefeitura não deu nenhum apoio para nós agricultores, fechou a feira e deixou a gente na mão sem ter onde vender” (Entrevistada 3).

Para os agricultores que comercializavam nos mercados convencionais, como, por exemplo, a venda para laticínios, atravessadores e supermercados, foi afirmado que o preço do produto para revenda foi reduzido durante a pandemia. Pode-se considerar que esses agricultores sofreram mais fortemente os efeitos não só da pandemia, mas de um sistema alimentar altamente concentrado, onde os ganhos econômicos são privatizados enquanto as perdas são socializadas, culminando em um empobrecimento dos agricultores e trabalhadores enquanto os impérios alimentares e a acumulação de riqueza se beneficiam. Diante deste cenário, os agricultores inseridos nestes mercados se encontram em uma situação de alta dependência de contratos a montante e a jusante, como pode ser percebido no seguinte relato:

“O que impactou mais o preço do leite é o que o pessoal produzia e vendia direto na rua, da Porto Alegre [empresa do setor de laticínios]. Não teve como mexer muito, não, porque eles que dão o preço. O leite ainda tinha um mercado, que era a Porto Alegre, só que o preço pago pelo litro foi lá embaixo, porque o pessoal não tinha dinheiro, acaba impactando geral da cadeia. No começo da pandemia, o leite caiu cerca de 20 centavos por litro para o produtor. [...] Com a carne também foi assim, porque o povo da nossa região que mexe com carne não consegue vender pra fora, vende pros açougueiros e o pessoal da região, então tinha muita dificuldade de vender o gado para abate. Quando conseguia, vendia abaixo do preço de mercado, porque a procura estava muito baixa e a oferta estava muito alta, então foi uma bola de neve né, prejudicou muita gente” (Entrevistado 5).

Sem a garantia de renda básica emergencial para agricultores familiares, crédito rural ou qualquer outro tipo de assistência por parte dos órgãos públicos, os agricultores tiveram suas vendas reduzidas por conta da restrição dos canais de escoamento dos produtos, chegando a perder parte de sua produção devido à dificuldade de adaptação ao novo sistema de mercado imposto pela crise sanitária. A deficiência de alternativas para minimizar o impacto negativo na produção e na comercialização se deve, também, à inexistência relatada de apoio para a classe por parte dos agentes envolvidos na construção e regulação dos mercados, assim como a falta de centros específicos de abastecimento de alimentos locais produzidos pela agricultura familiar6 6 Em pesquisa realizada no site oficial da Prefeitura, é possível encontrar a divulgação em maio de 2021 do Plano Municipal de Desenvolvimento e Recuperação Econômica, um pacote com 10 projetos de lei aprovados pelo Poder Legislativo que visa a retomar a economia local afetada pela Covid-19 onde 3 projetos são relacionados à agricultura familiar. Porém, em uma análise dos gastos por programas através do Portal Transparência, verifica-se que não fora realizado nenhum gasto até o momento com nenhum dos 3 projetos: Programa Municipal de Crédito Emergencial ao Pequeno Produtor Rural; Programa Municipal de Incentivo à Produção de Alimentos; e Programa de Agricultura Familiar Social - PAFS (Meireles, 2021). .

Cabe ressaltar que não só a renda dos agricultores foi afetada, bem como a redução do acesso ao alimento produzido pelos principais produtores de alimentos do país refletiram no aumento dos níveis de insegurança alimentar, colocando em risco o abastecimento alimentar dos grupos de maior vulnerabilidade socioeconômica, como o caso das crianças de escolas públicas que realizavam sua principal refeição nutritiva através da merenda escolar7 7 Mais de 39 bilhões de unidades de refeição de merendas escolares foram perdidas globalmente desde o início da pandemia de Covid-19 devido ao fechamento de escolas, de acordo com relatório divulgado pelo Escritório de Pesquisas do UNICEF – Innocenti e o Programa Mundial de Alimentos (PMA) (Fundo das Nações Unidas para a Infância, 2021). .

Outra questão recorrente apresentada nas entrevistas foi a queda na quantidade vendida, sendo que todos os agricultores entrevistados afirmaram redução na quantidade vendida, o que se configura como mais uma das consequências relatadas resultantes da restrição de acesso aos mercados. Em uma tentativa de manter seus clientes, a maioria dos agricultores entrevistados afirmou que não aumentaram os preços de seus produtos, mesmo com a alta dos insumos de produção e outros materiais, reduzindo ainda mais o lucro obtido. Quando questionados sobre a alteração do preço médio de cada produto por unidade por conta da pandemia, os relatos foram semelhantes entre os tipos de agricultores entrevistados:

“Eu mantive os valores dos produtos, não aumentei. Hoje, o maior problema que nós temos é que a renda das pessoas caiu muito. Eu tinha pessoas do Cruzeiro do Sul [bairro de Mariana] que compravam muito comigo, 50 a 60 reais para a família, e cortou para a metade. Então teve uma interferência muito grande nesse ponto. Eu não perdi os clientes, mas a compra reduziu, se eu tivesse aumentado [os preços] ia reduzir mais ainda, não é que as pessoas não querem comprar é que a renda caiu muito dessas pessoas” (Entrevistado 4).

Quando questionados quanto à tentativa de venda através de novos canais, como por exemplo pela internet, a maioria afirmou que essa tentativa teria existido no começo da pandemia, principalmente, por meio do aplicativo de mensagens WhatsApp, mas que não teriam obtido sucesso. Uma das razões possíveis para o insucesso do novo canal pode ter sido o fato de não terem construído sua base de clientes pela internet antes da pandemia, o que poderia ter trazido mais experiência com a nova ferramenta. Além disso, os agricultores relataram a dificuldade para o transporte, fato evidenciado ao observar o caso dos agricultores que já comercializavam pela internet antes da crise e já possuíam estrutura qualificada e que conseguiram manter a clientela através da entrega de cestas nas residências. A confiabilidade e reputação já estabelecidas foram fatores determinantes para a manutenção da demanda pelos produtos da agricultura familiar frente ao aumento da demanda por delivery feito por supermercados e sacolões, os mercados convencionais. Ao perguntar sobre a experiência de comercialização pela internet, os agricultores que tiveram sua primeira experiência após o início da pandemia relataram:

Sim, a gente colocava no grupo aqui de Cachoeira [do Brumado, distrito do município de Mariana], eles encomendavam, nossa filha colocou. Hoje não tá fazendo mais. [...] Acabou que não deu certo, elas (as filhas) tentaram nos restaurantes, mas também não conseguimos. Teve um restaurante que queria pegar na nossa mão, mas ele pagava muito pouco, aí não valia a pena. E a gente ainda ia levar” (Entrevistada 2).

No começo, pela internet, mas não deu certo, não tinha como fazer as entregas” (Entrevistado 1).

O agricultor de produção orgânica e agroecológica que já comercializava pela internet antes da pandemia enfrentou um problema diferente, mesmo com a clientela já estabelecida, que foi a falta de mão de obra afetando a continuidade das entregas:

Eu vendia pela internet já antes da pandemia pelo WhatsApp, mas eu tive que cortar por causa da produção que diminuiu quando perdi os trabalhadores, aí não tinha produto. Mas, antes, a pessoa fazia o pedido da cesta pelo WhatsApp e eu entregava pra ela” (Entrevistado 4).

Com o objetivo de compreender o efeito da pandemia sobre a produção para consumo próprio e o cuidado com a saúde, os agricultores familiares foram questionados quanto à alteração destes aspectos. Verifica-se que houve aumento ou manutenção da produção para consumo próprio por parte da maioria dos agricultores, cenário desencadeado devido à alta dos preços dos alimentos nos mercados convencionais. Além disso, atividades onde o investimento empregado com insumos era menor, como a criação de galinhas, porcos e peixes, foram priorizadas. Apenas um agricultor afirmou ter reduzido a produção para consumo próprio e aumentado as compras em supermercados. O mesmo afirma que isso se deu pela falta de mão de obra enfrentada em sua propriedade. A respeito da produção que era destinada ao consumo familiar e alterações durante a pandemia, foi afirmado:

Eu parei de produzir arroz, feijão e milho, por não dar conta de produzir e estou comprando no supermercado, então isso me afetou. Mas eu tento consumir o mínimo possível de supermercado” (Entrevistado 4).

Sempre produzi para consumo próprio, isso não mudou, não deixei de comprar o que precisava, mas com mais cuidado, não dava pra fazer muita graça” (Entrevistada 6).

Ao final da entrevista semiestruturada, perguntou-se aos agricultores como eles avaliavam a situação econômica deles após o início da pandemia. De maneira unânime, eles afirmaram ter enfrentado uma piora em sua situação financeira diante dos desafios impostos pela restrição de comercialização que sofreram. Entre as respostas, destacaram-se os relatos da produtora assentada e do produtor de orgânico e agroecológico, que ressaltam a importância da classe e do acesso à alimentação:

“A gente quase passou [dificuldade] né? Assim, a gente não teve mais a vida que a gente tinha antes, de comer à vontade. Não entrava dinheiro, não tinha como comprar. Mas a gente venceu, graças a Deus. Passamos dificuldades, mas tivemos sabedoria para controlar. E o bom que ninguém adoeceu, também, porque aí era mais problema ainda, e Deus ouviu o pedido da gente. Vencemos e tá bom” (Entrevistada 2).

“Se você for olhar, hoje, a agricultura familiar foi um pouco abandonada, por causa do agronegócio, que visa mais à exportação. E, na agricultura familiar, a gente tem dificuldades. Eu, nem tanto, porque estudei muito e tenho mais conhecimento técnico, então eu sei os itens certos para usar para produzir, mas pras pessoas que precisam de assistência técnica, não tá muito fácil não. Pras pessoas que não têm a informação igual eu tenho, a pandemia foi muito pior. Foi difícil, porque, no início, a feira de sábado parou, a feira noturna até hoje não voltou, então são esses os pontos críticos, [para] as pessoas que precisavam de assistência, a perda foi maior” (Entrevistado 4).

A partir da análise do conteúdo das entrevistas, observaram-se os seguintes aspectos gerais, no que se refere ao impacto da pandemia de Covid-19 sobre o acesso a mercados, a partir das percepções dos próprios agricultores:

a. redução na renda familiar, variando de 40% a 80%;

b. redução da mão de obra nas propriedades;

c. redução das atividades desenvolvidas e das variedades produzidas no estabelecimento;

d. restrições significativas de acesso aos canais de comercialização anteriormente acessados, sendo que os mercados de proximidade se tornaram o principal canal de comercialização acessado;

e. queda na quantidade vendida;

f. redução da margem de lucro;

g. tentativa de venda através de novos canais, como, por exemplo, pela internet, mas com dificuldades;

h. aumento ou manutenção da produção para consumo próprio;

i. inexistência relatada de apoio por parte do poder público;

j. piora geral na situação financeira das famílias.

Para a interpretação desses resultados, aplicamos a tipologia de mercados acessados por agricultores familiares desenvolvida por Schneider (2016)Schneider, S. (2016). Mercados e agricultura familiar. In F. Marques, M. Conterato & S. Schneider (Eds.), Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural (pp. 93-140). Porto Alegre: Editora da UFRGS.. O autor considera que as formas de produção se diferem umas das outras quanto aos objetivos que perseguem, fazendo com que a inserção nos mercados assuma um papel decisivo em sua diferenciação (Schneider, 2016, pSchneider, S. (2016). Mercados e agricultura familiar. In F. Marques, M. Conterato & S. Schneider (Eds.), Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural (pp. 93-140). Porto Alegre: Editora da UFRGS.. 110). A tipologia de mercados desenvolvida pretende servir de referencial para análise de distintos modelos produtivos e de comercialização no contexto da agricultura familiar através da segmentação das formas de compra e venda de produtos e mercadorias, mas, também, explicando as dinâmicas de interação e o processo de diferenciação da categoria social (Schneider, 2016, pSchneider, S. (2016). Mercados e agricultura familiar. In F. Marques, M. Conterato & S. Schneider (Eds.), Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural (pp. 93-140). Porto Alegre: Editora da UFRGS.. 114).

Deggerone (2021)Deggerone, Z. (2021). Caracterização dos mercados agroalimentares no Alto do Uruguai - RS: um estudo sobre o processo de mercantilização da agricultura familiar em Aratiba - RS (Tese de doutorado). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre., em sua recente pesquisa de doutorado, emprega essa tipologia para análise da diversidade de formas de comercialização de agricultores familiares em um município do Rio Grande do Sul. A pesquisadora considera que, para usarmos a tipologia apresentada por Schneider (2016)Schneider, S. (2016). Mercados e agricultura familiar. In F. Marques, M. Conterato & S. Schneider (Eds.), Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural (pp. 93-140). Porto Alegre: Editora da UFRGS., é necessário levarmos em conta a diferenciação dos mercados a partir de cinco variáveis:

1) tipo de agricultor que os acessa;

2) o locus e/ou alcance espacial;

3) a natureza ou características dos mercados;

4) as formas de regulação ou controle existentes e

5) os canais de comercialização utilizados (Deggerone, 2021, pDeggerone, Z. (2021). Caracterização dos mercados agroalimentares no Alto do Uruguai - RS: um estudo sobre o processo de mercantilização da agricultura familiar em Aratiba - RS (Tese de doutorado). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.. 67).

Em seu trabalho, a fim de classificar os mercados da agricultura familiar em Aratiba, a autora priorizou duas dessas variáveis: os mecanismos institucionais e os canais de comercialização utilizados pelos agricultores (Deggerone, 2021Deggerone, Z. (2021). Caracterização dos mercados agroalimentares no Alto do Uruguai - RS: um estudo sobre o processo de mercantilização da agricultura familiar em Aratiba - RS (Tese de doutorado). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.).

De acordo com Deggerone (2021, pDeggerone, Z. (2021). Caracterização dos mercados agroalimentares no Alto do Uruguai - RS: um estudo sobre o processo de mercantilização da agricultura familiar em Aratiba - RS (Tese de doutorado). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.. 28), a classificação elaborada por Schneider (2016)Schneider, S. (2016). Mercados e agricultura familiar. In F. Marques, M. Conterato & S. Schneider (Eds.), Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural (pp. 93-140). Porto Alegre: Editora da UFRGS. é conveniente para categorizar os mercados da agricultura familiar, pois não apenas segmenta as formas de compra e venda de produtos e mercadorias, mas, também, explica as dinâmicas que envolvem os processos de interação econômica dos agricultores familiares. Cabe ressaltar que a pesquisa de Deggerone (2021)Deggerone, Z. (2021). Caracterização dos mercados agroalimentares no Alto do Uruguai - RS: um estudo sobre o processo de mercantilização da agricultura familiar em Aratiba - RS (Tese de doutorado). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. foi desenvolvida em contexto pandêmico e atestou a pertinência do modelo analítico empregado que, acreditamos, mostra-se oportuna para caracterizar, também, os mercados existentes em Mariana.

Em nossa pesquisa, priorizaram-se as seguintes variáveis:

1) tipo de agricultor;

2) locus;

3) natureza das trocas;

4) canais de comercialização.

Nosso trabalho não explorou diretamente as formas de regulação, que se referem às instituições que controlam e estabilizam o mercado, apesar deste aspecto ser considerado importante na perspectiva da construção social dos mercados. Em relação aos aspectos institucionais, foi abordada, apenas brevemente, a relação dos agricultores com a Prefeitura por meio da verificação do orçamento municipal e da execução de políticas públicas para o setor. Nesse sentido, pode-se observar a inexistência de políticas para o soerguimento da agricultura familiar no município até o momento da pesquisa.

Em relação às variáveis exploradas, a primeira delas se refere ao tipo de agricultor. Além da categorização empregada por Schneider (2016)Schneider, S. (2016). Mercados e agricultura familiar. In F. Marques, M. Conterato & S. Schneider (Eds.), Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural (pp. 93-140). Porto Alegre: Editora da UFRGS., que diferencia os agricultores entre aqueles menos integrados a mercados (camponeses) e aqueles com maior inserção em mercados distintos, procuramos considerar a diversidade local da agricultura familiar, por tratar-se de seis tipos de agricultores, como apresentado anteriormente.

Pode-se perceber, pela pesquisa, que os tipos distintos de agricultores de Mariana não apresentam grande diferenciação no que refere aos canais de comercialização acessados antes e durante a pandemia. Estes agricultores ainda sofreram impactos devido, sobretudo, ao fechamento dos principais canais de comercialização afetados, com pouca diferenciação entre as categorias.

Em relação à variável locacional, ao discutir os distintos tipos de mercado, Schneider (2016)Schneider, S. (2016). Mercados e agricultura familiar. In F. Marques, M. Conterato & S. Schneider (Eds.), Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural (pp. 93-140). Porto Alegre: Editora da UFRGS. considera que nos mercados de proximidade o alcance físico-espacial é quase exclusivamente local. Nos mercados territoriais, há uma variação entre local e regional, enquanto, nos mercados convencionais, praticamente não existe local definido e, nos mercados públicos-institucionais, a espacialidade é multivariada. Já em relação à natureza das trocas, o autor afirma que elas se referem à natureza da produção, ao direcionamento para uso próprio ou troca e venda, bem como ao sentido ou objetivo que é atribuído pelos agricultores. Esse sentido perpassa pelas relações interpessoais, laços de reciprocidade, formas diversificadas e complementares, e trocas baseadas em valores e formas mercantis.

Os mercados em que os agricultores de Mariana entrevistados estão inseridos são, principalmente, os mercados de proximidade e os mercados públicos e institucionais, destinos de grande interesse para os agricultores devido à regulamentação e ao controle por parte do Estado ou organização pública que tende a garantir o pagamento e a manutenção da demanda.

Em uma avaliação baseada no modelo proposto por Schneider, considerando vendas em feiras locais e espaços públicos, entregas diretas de cestas e venda para a alimentação escolar, os principais canais observados pela análise das entrevistas são regulados pela amizade e reciprocidade no caso dos canais que pertencem aos mercados de proximidade. Por sua vez, são regulados por contratos públicos e leis os canais de comercialização atrelados a mercados públicos e institucionais.

A fim de relacionar, de forma esquemática, as variáveis apresentadas pelo modelo proposto por Schneider com os dados de nossa pesquisa, elaborou-se o Quadro 2 com o cruzamento de tais informações:

Entre os entrevistados, todos comercializam nos mercados de proximidade, com predominância de canais como as entregas diretas, na propriedade e em feiras locais. A importância dos mercados de proximidade neste caso se explica, também, pela existência de uma importante e tradicional feira de produtores organizada pela prefeitura municipal, que incorpora boa parte dos produtores locais, sendo que todos os entrevistados comercializam neste espaço. Os mercados convencionais, onde predominam canais como a comercialização via atravessadores, são acessados pelos agricultores com produção convencional, ou seja, que não se diferencia como orgânica ou agroecológica. Já aqueles produtores com produção orgânica ou agroecológica tendem a comercializar, além dos mercados de proximidade, especialmente em feiras, nos mercados públicos e institucionais. Contudo, os mercados públicos são acessados, também, por produtores convencionais. Somente dois agricultores, um convencional e um com produção orgânica, relataram não participar dos mercados institucionais devido à totalidade de sua produção já ter outros destinos, considerados vantajosos por eles.

Observa-se, com os resultados analisados, que essa tipologia de mercados da agricultura familiar é bastante atual e, mesmo depois da pandemia, não foi observada a criação de novos canais de comercialização diferentes dos apresentados pelo modelo. Verificou-se, de fato, o fechamento temporário e maiores restrições de acesso aos canais de comercialização existentes, implicando, sobretudo, a perda de renda para os produtores. Contudo, não se verificou alteração nas variáveis constantes no modelo.

A comercialização de alimentos produzidos pela agricultura familiar em meios digitais tem se ampliado no Brasil e se tornado objeto de análise há algum tempo (Niederle, Schneider & Cassol, 2021Niederle, P., Schneider, S., & Cassol, A. (Eds.). (2021). Mercados alimentares digitais: inclusão produtiva, cooperativismo e políticas públicas (1ª ed., Vol. 1, 382 p.). Porto Alegre: UFRGS.). Durante a pandemia, este fenômeno se acelerou e a “digitalização” se tornou ainda mais importante devido às medidas de restrição da circulação (Niederle et al., 2021Niederle, P., Schneider, S., & Cassol, A. (Eds.). (2021). Mercados alimentares digitais: inclusão produtiva, cooperativismo e políticas públicas (1ª ed., Vol. 1, 382 p.). Porto Alegre: UFRGS.; Gazolla e Aquino, 2021Gazolla, M., & Aquino, J. R. (2021). Reinvenção dos mercados da agricultura familiar no Brasil: a novidade dos sites e plataformas digitais de comercialização em tempos de Covid-19. Estudos Sociedade e Agricultura, 29(2), 427-460. http://dx.doi.org/10.36920/esa-v29n2-8
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; Schneider et al., 2020Schneider, S., Cassol, A., Leonardi, A., & Marinho, M. M. (2020). Os efeitos da pandemia da Covid-19 sobre o agronegócio e a alimentação. Estudos Avançados, 34(100), 167-188. http://dx.doi.org/10.1590/s0103-4014.2020.34100.011
http://dx.doi.org/10.1590/s0103-4014.202...
).

No caso estudado, o uso de meios digitais de comercialização pelos agricultores familiares foi bastante restrito. Contudo, mesmo nos casos em que houve a utilização de meios de comercialização digitais, não se observam alterações nas variáveis da tipologia, como, por exemplo, o alcance locacional, pois os agricultores em geral comercializam para os mesmos clientes que atendiam de forma física. Esta observação coaduna com pesquisas recentes que indicam que as plataformas digitais tendem a ser empregadas na comercialização em circuitos curtos e mercados regionais, bem como apontam suas limitações e a desigualdade no acesso (Gazolla & Aquino, 2021Gazolla, M., & Aquino, J. R. (2021). Reinvenção dos mercados da agricultura familiar no Brasil: a novidade dos sites e plataformas digitais de comercialização em tempos de Covid-19. Estudos Sociedade e Agricultura, 29(2), 427-460. http://dx.doi.org/10.36920/esa-v29n2-8
http://dx.doi.org/10.36920/esa-v29n2-8...
).

Além disso, o uso de meios digitais também não levou à criação de uma nova categoria na tipologia desenvolvida por Schneider (2016), oSchneider, S. (2016). Mercados e agricultura familiar. In F. Marques, M. Conterato & S. Schneider (Eds.), Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural (pp. 93-140). Porto Alegre: Editora da UFRGS. que reforça sua pertinência e aplicabilidade. Ainda que a pandemia não tenha implicado uma alteração nos canais de comercialização disponíveis, tampouco, aparentemente, um aprofundamento da diferenciação entre os produtores, ela afetou as condições de acesso aos mercados e, consequentemente, a renda dos agricultores familiares.

CONCLUSÕES

Por meio da utilização da tipologia dos mercados para a agricultura familiar elaborada por Schneider (2016, pSchneider, S. (2016). Mercados e agricultura familiar. In F. Marques, M. Conterato & S. Schneider (Eds.), Construção de mercados e agricultura familiar: desafios para o desenvolvimento rural (pp. 93-140). Porto Alegre: Editora da UFRGS..127), buscou-se compreender com mais profundidade a forma com que estes mercados são construídos socialmente, considerando a diversidade dos próprios agricultores e de suas formas de produção, o alcance espacial, a natureza dos mercados e os canais acessados, no contexto de pandemia no município de Mariana. Observou-se que a pandemia não alterou as formas de comercialização normalmente empregadas pelos agricultores familiares, mas teve efeitos, principalmente, sobre a restrição de acesso aos principais mercados - de proximidade e institucionais - impactando negativamente na renda das famílias.

Nesse sentido, a tentativa de adoção de formas de comercialização mediadas pela tecnologia, por exemplo, pode ser considerada dentro das categorias já presentes no modelo empregado, não alterando características fundamentais como o tipo de produtor, as regras predominantes em cada mercado e, sequer, no caso estudado, o alcance locacional, na medida em que mesmo os agricultores que utilizaram a internet para comercializar continuaram operando nos mercados de proximidade.

Dessa forma, ao analisarmos o efeito da pandemia sobre o acesso aos mercados, produção e condição de vida dos agricultores familiares, foi possível identificar que um dos principais desafios enfrentados pelos agricultores foi lidar com a redução da renda durante a crise sanitária.

As restrições significativas de acesso aos canais de comercialização trouxeram à tona a importância do debate a respeito das redes locais e regionais de produção para manutenção da segurança alimentar dos municípios. Assim, a pandemia evidenciou a necessidade de reorganização do sistema alimentar em que estamos inseridos. Para tanto, é necessário reconhecermos a relevância numérica da agricultura familiar e o importante papel que ela tem na geração de emprego e renda, desempenhando um papel estratégico não só para a produção de alimentos, mas, também, para a construção de soluções concretas para a melhoria da condição de vida no meio rural e da qualidade de vida para os que consomem os produtos da agricultura familiar.

A partir desta pesquisa, foi possível evidenciar que a suspensão e o fechamento dos mercados tradicionalmente acessados pelos agricultores, assim como a retração da demanda por alimentos decorrente do desemprego crescente e da perda do poder de compra dos consumidores, trouxeram efeitos significativos para a condição de vida dos agricultores familiares. No caso específico de Mariana, foram observados efeitos negativos da pandemia em diversos aspectos da produção familiar, como a dificuldade da manutenção da produção e da comercialização, a alta do preço dos insumos, a restrição do transporte e a redução de mão de obra, o que culminou na queda da renda dos agricultores familiares, que vieram a se somar aos efeitos da crise anterior decorrente do desastre socioambiental.

Ante esse cenário, faz-se extremamente necessário o desenvolvimento de novas dinâmicas de comercialização e estratégias de apoio para o soerguimento dos agricultores familiares, através de ferramentas tecnológicas para auxílio das vendas e criação de novas plataformas baseadas em sistemas que garantam e ampliem o acesso aos produtos da agricultura familiar local. A pandemia da Covid-19 trouxe mudanças significativas à maneira como nos organizamos como indivíduos, porém, a partir do cenário de incerteza em que nos encontramos, seus efeitos sobre a saúde e a economia global serão observados também a médio e longo prazos, trazendo a urgente reflexão sobre o modo como produzimos, processamos e distribuímos os alimentos.

A ausência de incentivos e novas estratégias de enfrentamento por parte dos órgãos públicos, relatada pelos agricultores, contribuiu, sem dúvida, para agravar a situação vivenciada. Acreditamos que este ponto, pouco explorado em nossa pesquisa, deixa aberto um caminho para estudos futuros, tratando dos aspectos institucionais dos sistemas alimentares, tanto no contexto pandêmico quanto no pós-pandemia.

  • 1
    Registro no Comitê de Ética sob CAAE 50373821.1.0000.5150, data de aprovação no CEP: 30 de outubro de 2021.
  • 2
    A respeito das entrevistas semiestruturadas, realizadas entre outubro e novembro de 2021, cabe ressaltar que as mesmas foram aplicadas em campo, seguindo todos os protocolos sanitários necessários para a ocasião.
  • 3
    Essas categorias foram definidas a partir de trabalhos de pesquisa anteriores na região desenvolvidos pelo Núcleo de Pesquisa e Extensão em Desenvolvimento Econômico e Social (NUPEDES/UFOP), do qual os autores são membros.
  • 4
    Resultados do Projeto Panorama, desenvolvido pelo NUPEDES e em fase de finalização e divulgação dos resultados, que buscou realizar uma caracterização da agricultura familiar na região, com foco na produção orgânica e agroecológica.
  • 5
    O Decreto municipal nº 10.030/2020, de 16 de março de 2020, declarou situação de emergência em saúde pública no Município de Mariana e, dentre outros, suspendeu as atividades escolares presenciais e vendas em feiras livres e espaços públicos no âmbito do Município de Mariana. Mais informações podem ser acessadas em Mariana (2021)Mariana. Prefeitura Municipal. (2021). Legislação: decretos. Recuperado em 29 de novembro de 2021, de http://www.mariana.mg.gov.br/imprimir-diario-oficial/1273
    http://www.mariana.mg.gov.br/imprimir-di...
    .
  • 6
    Em pesquisa realizada no site oficial da Prefeitura, é possível encontrar a divulgação em maio de 2021 do Plano Municipal de Desenvolvimento e Recuperação Econômica, um pacote com 10 projetos de lei aprovados pelo Poder Legislativo que visa a retomar a economia local afetada pela Covid-19 onde 3 projetos são relacionados à agricultura familiar. Porém, em uma análise dos gastos por programas através do Portal Transparência, verifica-se que não fora realizado nenhum gasto até o momento com nenhum dos 3 projetos: Programa Municipal de Crédito Emergencial ao Pequeno Produtor Rural; Programa Municipal de Incentivo à Produção de Alimentos; e Programa de Agricultura Familiar Social - PAFS (Meireles, 2021Meireles, M. G. (2021). Prefeitura de Mariana investe cerca de R$ 37 milhões na recuperação da economia local. Recuperado em 9 de dezembro de 2021, de https://www.mariana.mg.gov.br/noticia/6339/prefeitura-de-mariana-investe-cerca-de-r-37-milhoes-na-recuperacao-da-economia-local
    https://www.mariana.mg.gov.br/noticia/63...
    ).
  • 7
    Mais de 39 bilhões de unidades de refeição de merendas escolares foram perdidas globalmente desde o início da pandemia de Covid-19 devido ao fechamento de escolas, de acordo com relatório divulgado pelo Escritório de Pesquisas do UNICEF – Innocenti e o Programa Mundial de Alimentos (PMA) (Fundo das Nações Unidas para a Infância, 2021Fundo das Nações Unidas para a Infância - UNICEF. (2021). A perda de mais de 39 bilhões de merendas escolares desde o início da pandemia anuncia uma crise nutricional, dizem UNICEF e PMA. Recuperado em 29 de novembro de 2021, de https://www.unicef.org/brazil/comunicados-de-imprensa/perda-de-mais-de-39-bilhoes-de-merendas-escolares-desde-o-inicio-da-pandemia-anuncia-crise-nutricional
    https://www.unicef.org/brazil/comunicado...
    ).
  • Como citar: Singulano, M. A., Viana, F. D. F., & Inácio, I. L. E. (2023). Efeitos da pandemia de Covid-19 sobre o acesso aos canais de comercialização dos agricultores familiares: estudo qualitativo no município de Mariana - MG. Revista de Economia e Sociologia Rural, 61(4), e263633. https://doi.org/10.1590/1806-9479.2022.263633
  • JEL Classification: Z13

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    02 Maio 2022
  • Aceito
    19 Set 2022
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