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Pensamento lésbico: uma ginga epistemológica contra-hegemônica

Lesbian Thinking: A Counter-Hegemonic Epistemological Ginga

Pensamiento lésbico: una ginga epistemológica contra hegemónica

Resumo:

Reconhecendo o movimento de lésbicas como corpo político constituído por pessoas e organizações produtoras de identidades lésbicas e outras identidades sexuais contra-hegemônicas, nosso propósito, neste artigo, é apresentar fios teóricos das correntes políticas do pensamento lésbico produzidos no ocidente, sobretudo no século XX. Para tanto, assumimos a pesquisa bibliográfica como dispositivo metodológico, e o resultado é um mapa em aberto do pensamento de ativistas lésbicas precursoras do campo da lesbianidade no ocidente. Aqui, a ginga, ou o gingar, se constitui numa metalinguagem dotada de recursividade e deslocamentos.

Palavras-chave:
lésbica; movimento de lésbicas; pensamento lésbico

Abstract:

Recognizing the lesbian movement as a political body made up of people and organizations that produce lesbian identities and other counter-hegemonic sexual identities, the purpose of this study is to present theoretical threads of the political currents of the lesbian thought produced in the West, especially in the twentieth century. To this end, we assume bibliographic research as a methodological device, and the result is an open map of the thinking of lesbian activists who are precursors to the field of lesbianism in the West. Here, the ginga, or the gingar, constitutes a metalanguage endowed with recursion and displacements.

Keywords:
Lesbian; Lesbian movement; Lesbian thinking

Resumen:

Reconociendo el movimiento lésbico como un cuerpo político constituido por personas y organizaciones productoras de identidades sexuales lesbianas y otras contrahegemónicas, el propósito de este estudio es presentar los hilos teóricos de las corrientes políticas del pensamiento lésbico producido en Occidente, especialmente en el siglo XX. Para ello, asumimos la investigación bibliográfica como dispositivo metodológico, y el resultado es un mapa abierto del pensamiento de las activistas lesbianas precursoras del campo del lesbianismo en Occidente. Aquí, ginga, o gingar, se constituye en un metalenguaje dotado de recursividad y desplazamientos.

Palabras clave:
lesbianas; movimiento lésbico; pensamiento lésbico

Introdução

As organizações e os movimentos de lésbicas representam uma comunidade diversa, produtora de constantes debates sobre seu posicionamento identitário, sobre as diferentes estruturas de alianças, sobre seus objetivos, estratégias políticas e os estilos de vida (Gracia Trujillo BARBADILLO, 2008BARBADILLO, Gracia Trujillo. Deseo y resistencia: treinta años de movilización lesbiana en el estado español. Madrid: Egales, 2008.). No mundo ocidental, surgem, a partir dos anos 60, em contexto de revolução do pensamento político em nível internacional e transnacionalização do capitalismo, que se apoia numa nova divisão internacional, sexual, de classe e racial do trabalho (Jules FALQUET, 2006FALQUET, Jules. De la cama a la calle: perspectivas teóricas lésbico-feministas. Bogotá: Brecha Lésbica, 2006.; 2004FALQUET, Jules. Breve reseña de algunas teorias lésbicas. México: Fem-e-libros, 2004.).

Como sujeito social que articula uma proposta política e se posiciona frente a um contexto afetado por crise econômica e política, surgem em diferentes lugares e épocas após a rebelião ocorrida no bar Stonewall Inn, em Nova York, em 28 de junho de 1969, quando lésbicas, gays, drag queens, transexuais reagiram à repressão policial, corriqueira nos bares e casas noturnas frequentadas por homossexuais. Depois da revolta, a palavra de ordem passou a ser visibilidade, iniciando lutas coletivas pelo reconhecimento dos direitos de homossexuais em diferentes partes do mundo. A experiência de luta e resistência evidencia, desde então, que, para as pessoas LGBT,1 1 Gay, Lésbica, Bissexual, Transexual, Travesti. é preciso reconhecimento da família, da sociedade, do Estado.

O reconhecimento de si, da dor e do prazer comum em torno da sexualidade não heterossexual emerge nas lutas coletivas, pela liberdade sexual, contra o racismo, pelos direitos das mulheres, bem como na esfera artística e nas lutas pela descolonização e pela independência dos seus países, como dispositivo que converge e articula os movimentos de lésbicas como ato de resistência (Cheryl CLARK, 1990), produtos culturais, textos e contextos diversificados. Nessa perspectiva, qualquer tentativa de homogeneizá-los em conceito único, perspectiva única, é fadada ao fracasso. Como texto-ação feminista, linguagem em movimento, são produtos e produtores de teorias lésbicas, correntes políticas dos nossos feminismos.

Com essa compreensão, o propósito deste estudo (Zuleide SILVA, 2016SILVA, Zuleide Paiva. Sapatão não é bagunça: estudo sobre as organizações lésbicas da Bahia. 2016. Doutorado (Programa de Pós-Graduação em Difusão do Conhecimento) - UFBA, IFBA, UNEB, UEFS, SENAI-CIMATEC, LNCC, Salvador, BA, Brasil.)2 2 Este é um desdobramento do Capítulo 4, da tese “Sapatão não é bagunça: estudo das organizações lésbicas da Bahia”, defendida pela autora em 2016, sob orientação da coautora, no Programa de Pós-Graduação em Difusão do Conhecimento (UFBA, UNEB, IFBA, UEFS, LNCC, SENEI, CIMATEC). Ver: Silva (2016). é apresentar fios teóricos das correntes políticas do pensamento lésbico produzidos no ocidente no século XX. Para tanto, assumimos a pesquisa bibliográfica como dispositivo metodológico. O resultado é um mapa em aberto do pensamento de ativistas lésbicas precursoras do campo da lesbianidade. Reconhecendo as teorias lésbicas como um discurso invisibilizado sobre a realidade que nos constitui, empregamos o termo pensamento lésbico, e não teoria lésbica, não por apreender o pensamento como menor, mas por entender que, no Brasil, as reflexões produzidas por pensadoras lésbicas, independente do espaço geopolítico que as mesmas ocupam no processo de produção do conhecimento, são periféricas, pouco conhecidas, negadas pelo androcentrismo da ciência. O uso do termo pensamento lésbico é, portanto, uma forma de resistência, crítica que questiona as formas de produção da ciência moderna problematizando seus princípios e fundamentos. É ginga discursiva que coloca em xeque os fundamentos epistemológicos da ciência moderna, fornecendo elementos para a construção de saberes não hegemônicos. Essa noção de ginga é inspirada na Capoeira Angola e indica um falso conflito, a não aceitação do mundo autorizado, num jogo em que necessito do corpo da outra pessoa para enfrentar aquilo que, sozinha, na infidelidade eterna do espelho, eu não consigo (Rosangela Janja Costa ARAUJO, 2013ARAUJO, Rosangela Costa. “Abrindo a roda: conhecimentos que gingam”. Revista Z Cultural, v. 02, p. 01-19, 2013.). Assim, gingar é blasfemar a ciência, como propõe Dona Haraway (1999HARAWAY, Donna. “Saberes localizados”. Cadernos Pagu, v. 5, p. 7-41, 1999.). É questionar seus postulados, princípios, crenças, valores. É duvidar do instituído, do natural. É visibilizar outras vozes, outros corpos, outras lutas. É produzir outra ciência.

Nosso pensamento é resistência, epistemologia contra-hegemônica

A lesbianidade como campo teórico do feminismo emerge nos primórdios da segunda onda do feminismo, quando ativistas e pesquisadoras lésbicas de diferentes espaços de saber, regiões e países, buscaram entender e explicar a opressão feminina desde a experiência lésbica. Reconhecendo que tal pensamento se modifica nas viagens que faz de um país para o outro, fato que dificulta sua classificação em distintas correntes teóricas que alimentam e produzem as práticas políticas da lesbianidade (FALQUET, 2006), apresentamos a seguir fragmentos do pensamento lésbico situados em cinco correntes teórico-políticas dos nossos feminismos. Mesmo reconhecendo os limites da classificação adotada, consideramos importante essa distinção para melhor compreensão da potência do pensamento lésbico como ginga epistemológica, ato de resistência à imposição da heterossexualidade.

Lesbofeminismo Cultural

O lesbofeminismo cultural critica o heterofeminismo, entendido como feminismo produzido por mulheres heterossexuais, por sua falta de reflexão sobre a questão da heterossexualidade, apesar do seu investimento na solidariedade entre as mulheres e da sua luta contra o heteropatriarcado, que acorrenta a sexualidade não heterossexual, formatando e hierarquizando corpos masculinos e femininos.

Uma das autoras mais conhecidas dessa corrente é a norte-americana Adrienne Rich (2010RICH, Adrienne. “Heterossexualidade compulsória e a existência lésbica”. Revista Bagoas, v. 4, n. 5, p. 17-44, 2010.), (1929-2012), que fez da palavra instrumento de luta acreditando que, para realizar transformações concretas na sociedade, é necessário estabelecer uma relação mais próxima entre o discurso e o real.

Certa de que a compreensão da vida social estruturada pela linguagem exige a produção de modelos complexos que demonstrem como a linguagem é estruturada, Rich (2010RICH, Adrienne. “Heterossexualidade compulsória e a existência lésbica”. Revista Bagoas, v. 4, n. 5, p. 17-44, 2010.) buscou na história elementos para construir um modelo explicativo da lesbianidade, criticando a falta de reflexão das feministas heterossexuais acerca da presença e da importância que as lésbicas têm no campo feminista como uma prática intelectual resultante da ideologia patriarcal que fomenta a heterossexualidade obrigatória, categoria teorizada pela autora como uma norma social que exige e causa a invisibilidade lésbica no campo científico e fora dele. Sua reflexão promove a luta contra a heterossexualidade obrigatória, instituição política que diminui a autonomia das mulheres e, como tal, é ginga discursiva contra o patriarcado e todas as formas de exploração e subordinação que direciona as mulheres e as lésbicas ao matrimônio e à maternidade como destino inviolável, além de promover o apagamento do conhecimento produzido pelas lésbicas. Assim, a reflexão da autora evidencia a instituição heterossexual como sistema de opressão que tem forçado as lésbicas a mentirem sob pena de serem etiquetadas como pervertidas, criminosas, doentes.

Questionado como e por que a escolha feita pelas mulheres que gostam de outras mulheres como grandes amigas, parceiras, amantes, integrantes de uma mesma comunidade tem sido invalidada, forçada à clandestinidade, Rich afirma que o apagamento do conhecimento produzido pelas lésbicas - epistemicídio - é estratégia de manutenção da heterossexualidade compulsória. Seu argumento aponta que as lentes da heterossexualidade compulsória percebem a existência lésbica através de uma escala que parte do desviante ao odioso ou simplesmente a inviabiliza. Para Rich, não é suficiente que o pensamento feminista tenha reconhecido a produção intelectual das lésbicas, pois o epistemicídio que acontece por meio da negligência total ou virtual da existência lésbica em um amplo conjunto de textos, inclusive da produção acadêmica feminista, não é só uma ação antilésbica, mas antifeminista em suas consequências, distorce igualmente a experiência das mulheres heterossexuais. Sua expectativa é de que as feministas heterossexuais se desloquem da zona de conforto oferecida pela heterossexualidade e passem a achar problemático ler, escrever e ensinar a partir de uma perspectiva não examinada de heterocentricidade.

Ciente da dificuldade das companheiras heterossexuais em relação à existência lésbica, pensada como categoria que “sugere tanto o fato da presença histórica de lésbicas quanto da nossa criação contínua do significado dessa mesma existência” (RICH, 2010RICH, Adrienne. “Heterossexualidade compulsória e a existência lésbica”. Revista Bagoas, v. 4, n. 5, p. 17-44, 2010., p. 35), a autora expressa seu desejo de “encorajar as feministas heterossexuais no exame da heterossexualidade como uma instituição política que retira o poder das mulheres” (RICH, 2010, p. 19), imprimindo expectativa de que outras lésbicas sejam sensibilizadas para sentir a “profundidade e a amplitude de identificação e de vínculos entre mulheres” (RICH, 2010, p. 19).

A identificação e o vínculo entre mulheres, que são contínuos e potencialmente revolucionários, são conceituados como continuum lésbico, “um impulso politicamente ativado, não apenas uma validação de vidas pessoais” (RICH, 2010RICH, Adrienne. “Heterossexualidade compulsória e a existência lésbica”. Revista Bagoas, v. 4, n. 5, p. 17-44, 2010., p. 19). Esse conceito trata do resgate, ao longo da história, de experiências entre mulheres, das solidariedades, cumplicidades, cooperação entre mulheres, independente de relações sexuais entre as mesmas. Assim, continuum lésbico é aporte teórico-político capaz de incitar novas questões e de esboçar um diálogo possível e necessário entre lésbicas e feministas heterossexuais para o devido desmantelamento da heterossexualidade obrigatória como instituição reguladora da sexualidade.

Reconhecendo o apagamento das lesbianidades como uma violência, Rich (2010RICH, Adrienne. “Heterossexualidade compulsória e a existência lésbica”. Revista Bagoas, v. 4, n. 5, p. 17-44, 2010.) afirma que, para desmantelar o esquema de violência a que estão submetidas as mulheres em função do seu gênero e as lésbicas em função tanto do gênero quanto da sexualidade - violências correlatas. é preciso colocar em questão a heterossexualidade obrigatória, que está ligada às formas de produção capitalistas que fomentam a segregação por sexo na esfera do trabalho, impondo às mulheres posição social menos valorada na divisão do trabalho. Nessa perspectiva, a heterossexualidade não é uma simples prática sexual. É uma imposição institucionalizada para garantir o acesso físico, econômico e emocional dos homens sobre as mulheres, cuja alternativa conceitual é o continuum lésbico e a existência lésbica, que desmantelam a naturalidade da heterossexualidade.

Embora seja inegável a contribuição de Rich, a estadunidense Gayle Rubin (RUBIN; Judith BUTLER, 2003RUBIN, Gayle; BUTLER, Judith. “Tráfico sexual: entrevista”. Cadernos Pagu, n. 21, p. 157-209, 2003.) criticou seu pensamento, argumentando que a definição da lesbianidade como relações de apoio mútuo entre as mulheres, sem conteúdo sexual, torna difícil distinguir uma lésbica de uma não lésbica. Rubin discorda do que ela chama de “obscurantismo da categoria continuum lésbico” (p. 173) que, na sua perspectiva, toma a amizade romântica entre mulheres do século XIX como uma espécie de “modelo ideal da existência lésbica”.

Reconhecendo a potência da crítica de Rubin, compreendemos que não há lésbica fora da história. Acreditamos na abordagem histórica como caminho para entendimento da lesbianidade. Assim, a contribuição de Rich é imprescindível à ginga lésbica por visibilidade e reconhecimento.

Lesbofeminismo radical

Como tendência marcadamente francófona, o lesbofeminismo radical articula uma análise mais complexa da opressão feminina (FALQUET, 2006). Nessa tradição, as lésbicas certamente escapam da apropriação privada por parte dos homens, mas não se livram da apropriação coletiva.

Monique Wittig (2010WITTIG, Monique. El pensamiento heterosexual y otros ensayos. 2 ed. Barcelona: Egales, 2010.) (1935-2003), francesa erradicada nos Estados Unidos, é uma das representantes mais conhecidas dessa corrente por radicalizar o discurso anunciado de que as lésbicas não são mulheres. Essa afirmação rompe com o binarismo do pensamento heterossexual, colocando em evidência que a mulher só existe como termo que estabiliza e consolida a relação binária e de oposição ao homem que sustenta a heterossexualidade. Afirmar-se lésbica, negar-se mulher, nessa perspectiva, significa uma recusa da heterossexualidade, uma ação política de desmantelamento da ciência androcêntrica.

Na construção dos seus argumentos, Wittig retoma o debate de Rich (2010WITTIG, Monique. El pensamiento heterosexual y otros ensayos. 2 ed. Barcelona: Egales, 2010.) sobre a heterossexualidade compulsória como uma instituição, e desloca o debate refletindo sobre a mesma como um regime político denominado Pensamento Hetero, responsável pela criação e manutenção das categorias que funcionam como conceitos universais em todos os campos do saber, a exemplo de mulher, homem, sexo, diferença.

Pensando o mundo a partir de redes discursivas devidamente conectadas, Wittig coloca em questão a visão científica da realidade, afirmando que a psique naturalizada, não afetada pela história nem trabalhada pelos conflitos de classe, promove um arsenal de invariáveis (símbolos socialmente construídos, mitos, crenças) que são facilmente impostos ao inconsciente coletivo e individual através de teorias e terapias desenvolvidas pelo discurso científico, que produz a psique, naturaliza os símbolos socialmente construídos e manipula nossas interpretações dos mesmos através do poder da ciência, sobretudo da psicanálise. Assim, a dominação e a subordinação das mulheres são entendidas a partir do modelo baseado em uma posição de senhor e outra de sujeição.

Nessa tradição, a dominação das mulheres é entendida como a condição de estar sujeitada ao comando direto de um homem individual, e a dominação masculina como uma relação de poder dialética em que um superior masculino comanda uma subordinação feminina. Assim, a solução do problema da opressão das mulheres está na luta de classes, na incorporação da mulher na produção social, que criaria as bases para a libertação feminina. A luta de classe, nessa mirada, é o que permite resolver a contradição entre duas classes opostas, mas a classe é de sexo, de acordo com a autora.

Assim como Rich (2010RICH, Adrienne. “Heterossexualidade compulsória e a existência lésbica”. Revista Bagoas, v. 4, n. 5, p. 17-44, 2010.), Wittig afirma que as discussões das feministas heterossexuais partem de um princípio universal inquestionável: as relações humanas são heterossexuais. Esse princípio se corporifica na obrigatoriedade da relação sexual entre homens e mulheres sociais. Retomando a importância do materialismo histórico para a compreensão das mulheres como um grupo social, não natural, sua voz ecoa, afirmando que não tem nenhum destino biológico, psicológico ou econômico que determine o papel da mulher na sociedade. Seu argumento evidencia que a existência lésbica destrói na prática a análise teórica que aponta as mulheres como um grupo natural, ou seja, a existência lésbica evidencia que a divisão da sociedade entre homens e mulheres é política. Sua crítica às feministas heterossexuais, e mesmo às lésbicas norte-americanas que insistem em considerar que a base da opressão feminina é biológica e histórica, aponta que essa perspectiva de análise consiste em buscar nos homens e nas mulheres uma razão biológica para explicar a divisão sexual, excluindo os direitos sociais. Assim, nega toda e qualquer leitura naturalizada da realidade social, ressaltando a necessidade de uma consciência lésbica que jamais duvide de que mulher é uma construção política, sendo para as lésbicas uma construção que, embora bastante limitada (porque reducionista), é totalmente opressora, de tal maneira que, ao negá-la, se expõem a acusações de não serem “verdadeiras mulheres”, ou mesmo de serem mulheres que querem ser homens.

Wittig faz do humor e da literatura uma arma a seu favor na batalha das ideias, ironizando os xingamentos dirigidos às lésbicas, que nos acusam de querermos ser homens. Tomando como exemplo as butch, lésbicas masculinizadas, ressalta que se negar a ser mulher não significa querer ser homem e, mesmo que uma butch deseje com todas as suas forças, ela jamais será um homem. Para ser homem, é preciso mais que uma aparência de homem, é preciso ter consciência de homem. Desse modo, uma lésbica pode ser qualquer outra coisa, pode ser uma não mulher, um não homem, um produto da sociedade, não da natureza, considerando que as categorias mulher e homem são políticas e não dados naturais. Esse argumento reconhece que a recusa da heterossexualidade significa, mesmo que não se tenha consciência disso, a negação de ser homem ou mulher. Nessa mirada, a lesbianidade tanto é um exercício identitário quanto um rechaço do poder econômico, ideológico e político do homem. Dessa forma, a luta lesbofeminista radical é por uma sociedade sem sexo.

Wittig nos convida a lutar dentro da classe mulheres, assumindo que a classe é de sexo. Essa luta de classe, que é coletiva e aproxima mulheres sociais, exige, sobretudo, o reconhecimento das pluralidades do ser, a ressignificação e a valorização das nossas especificidades, especialmente dos nossos medos e da nossa passividade, entendida como medo justificado. Reconhecendo a importância autoral das lésbicas na tarefa histórica de definirem em termos materialistas o que considera como sendo opressão e analisar as mulheres como classe, Wittig ressalta que a nossa primeira tarefa é a consciência de classe e destruição do mito mulher. Mas, para constituir-nos como classe, não devemos nos suprimir como indivíduo, pois nenhum indivíduo pode ser reduzido à sua opressão. O que está em jogo é uma definição de indivíduo, assim como uma definição de classe, pois não há luta possível para alguém privado de uma identidade; é preciso uma motivação interna para lutar. As lésbicas radicais percebem a opressão de mulheres como enraizadas no sexo, não na performance de um gênero. As mulheres são oprimidas porque os homens exploram nossos meios de reprodução, e não porque nos parecemos ou agimos como mulheres. Essa mirada rejeita a ideia de que o gênero é um sentimento da pessoa. Sem classe e sem consciência de classe, não há sujeitos, somente indivíduos alienados. A compreensão da realidade, nessa perspectiva, exige um movimento contínuo de ida e vinda entre a realidade conceitual e a realidade material, e isso só se faz através da linguagem. Assim, a lesbianidade oferece a única forma de vivermos livremente, pois lésbica é uma categoria revolucionária que está além das categorias mulher e homem.

Embora o pensamento de Wittig esteja situado no conjunto de teorias de um ponto de vista, produzindo e conclamando o prisma lésbico, o que Wittig almeja é a passagem do ponto de vista particular para o ponto de vista universal. Para ela, não existe uma escrita feminina. Utilizar e propagar essa expressão é um erro grave, considerando que essa expressão reforça a noção androcêntrica de que as mulheres e as lésbicas não pertencem à história e que a escrita não é uma produção material. Esse elogio da diferença é retrocesso que fragiliza a política comprometida com o questionamento das categorias que naturalizam a mulher social. Assim, o gênero é um indicador linguístico da oposição social entre os sexos que deve ser eliminado, e a linguagem é instrumento a ser empregado em propostas políticas, um material especial porque é o lugar, o meio pelo qual se esclarece e também se esconde o sentido. Para Wittig, é tarefa da escritora interessar-se pelas letras, pelo concreto, pela visibilidade da linguagem, pela sua forma material, trabalhando palavra por palavra. A lesbiana como escritora deve assumir um ponto de vista particular e também universal. Na prática, isso significa assumir o ponto de vista particular como ponto de partida, estratégia, para chegar ao universal.

Sem negar a importância do pensamento de Wittig, Butler (2003BUTLER, Judith. Problemas de gênero. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.) tece críticas radicais ao seu trabalho, afirmando que, em defesa do sujeito cognitivo a lésbica, Wittig não critica o sujeito universal, o substitui. Para Butler, “a lésbica de Wittig”, como sujeito que pode realizar a universalidade concreta por meio da liberdade, confirma, ao invés de contestar, as promessas normativas dos ideais humanistas cuja premissa é a metafísica da substância. Porém, Butler reconhece que Wittig oferece uma crítica alternativa ao mostrar que não é possível significar as pessoas na linguagem sem a marca do gênero. Relativizando essa crítica, percebemos o pensamento de Wittig como fundamental para a tessitura de uma epistemologia lésbica. Ao afirmar que as lésbicas não são mulheres, provocando tensões nos campos da ciência e da política, a autora nos coloca de frente com uma questão polifônica que Butler não se propõe a responder. Afinal, se as lésbicas não são mulheres, o que são? Que prática, para além do sexo, define essa classificação? Como pensar as lésbicas para além da diferença sexual? Questões dessa natureza, inexoravelmente, fazem emergir fantasmas do essencialismo que tanto assustam pesquisadoras e pesquisadores, em busca de uma sociedade sem sexos, sem gêneros, como a desejada por Wittig.

Sabemos que o signo lésbica, assim como o signo mulher, não esgota a possibilidade de ser do corpo lesbiano, pois há uma diversidade de experiências em cada pessoa. Como bem mostra Berenice Bento (2011BENTO, Berenice. “Política da diferença: feminismo e transexualidade”. In: COLLING, Leandro (Org.). Stonewall 40 + o que no Brasil?. Salvador: EDUFBA, 2011. p. 79-110.), a dimensão plural encontrada no mundo vivido é “desidratada quando nos deslocamos para o nível da política institucional, seja nos partidos políticos, no parlamento, no executivo” (p. 87). Essa desidratação, promovida pela heterossexualidade obrigatória, não está no androcentrismo da ciência, que tanto invisibiliza a existência lésbica quanto nega a sua pluralidade, aprisionando-a aos limites da categoria mulher. Para a pergunta o que é uma lésbica, a resposta de Wittig é contundente: “Uma lésbica deve ser qualquer outra coisa, uma não mulher, um não homem, um produto da sociedade e não da natureza” (WITTIG, 2010WITTIG, Monique. El pensamiento heterosexual y otros ensayos. 2 ed. Barcelona: Egales, 2010., p. 35, tradução nossa).

Lesbofeminismo separatista

A lesbiandade separatista é corrente americana que investe na criação de espaços físicos e simbólicos somente para lésbicas, reunindo lésbicas feministas que nos anos 70 se dedicaram a compartilhar uma vida comum, onde pudessem viver tão distantes do mundo dominado pelos homens quanto possível. Segundo Falquet (2006), embora essa corrente tenha expressões e conotações bastante diversas, no geral, a criação de espaços próprios para abrigar uma nova visão do mundo é o que a caracteriza.

Uma das suas expoentes é Jill Johnston (1973JOHNSTON, Jill. Lesbian nation. New York: Simon & Schuster, 1973.) (1929-2010), que no livro Lesbian nation convida os homens a eliminar as qualidades que possuem enquanto homens. Para Johnston, homem é algo não relacionado com a natureza. A natureza é a mulher e o homem é um intruso. O homem sintonizado com a natureza é aquele que se desmasculiniza ou se elimina como homem.

Conforme Tina Giannoulis (2015GIANNOULIS, Tina. Lesbian Nation [Resenha]. GLBTQ, 2015. Disponível em Disponível em http://www.glbtqarchive.com/ssh/lesbian_nation_S.pdf . Acesso em 12/02/2021.
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), entre as ideias radicais de Johnston que se tornou pedra angular da corrente separatista, há a noção de que todas as mulheres são lésbicas, exceto aquelas que não sabem disso. Com essa perspectiva, as separatistas afirmam que o lesbianismo é o objetivo final do feminismo, acreditando que quando as mulheres começam a valorizar a si mesmas e a outras mulheres, naturalmente, elas deslocam sua energia emocional dos homens para focar as lésbicas.

Para Mary Daly (1978DALY, Mary. Gynecology: the Metaethics of Radical Feminism. Boston: Beacon Press, 1978.) (1928-2010), as separatistas se baseiam na noção de que as mulheres vivem num estado permanente de atrocidade, apreendido pela autora como a condição na qual as mulheres têm sobrevivido às violências e torturas ao longo da história da civilização. Nessa perspectiva, a masculinidade é tão radicalmente deficiente que é uma condição completamente impraticável. Seu ponto de vista sobre o futuro dos homens e das mulheres é o separatismo como um meio de as mulheres se livrarem da opressão sexista. Com a mesma perspectiva, Johanna Martina Wood (2013WOOD, Johanna Martina. Patriarchy, feminism and Mary Daly: a Systematic-theological enquiry into daly’s Engagement with gender Issues in christian Theology. 2013. Doutorado (Theology) - University of South Africa, South Africa.) ressalta que as violências referidas por Johnston e Daly incluem a violência doméstica, abusos, estupros, incestos, a indústria do sexo e o tráfico internacional de mulheres. Essa condição na qual as mulheres vivem é criada e defendida por um sistema de ideias representado pelas religiões, pela psicanálise, pela pornografia, sexologia, ciência, medicina e pelas ciências sociais.

Para a inglesa Sheila Jeffreys (1996JEFFREYS, Sheila. La herejía lesbiana: Una perspectiva feminista de la revolución sexual lesbiana. Madrid: Ediciones Cátedra; Universitad de Valencia - Instituto de la Mulher, 1996. Disponível em Disponível em http://porelpanylasrosas.weebly.com/libros/libro-completo-la-herejia-lesbiana-sheila-jeffreys . Acesso em 12/02/2021.
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), que transita entre as correntes radical e separatista, a ênfase na necessidade de criação de espaços próprios para as lésbicas também se mostra necessária à corrente radical e à corrente feminista, pois a base dessas correntes é a noção de patriarcado como sistema responsável pela reprodução e manutenção do estado de atrocidade. Para Jeffreys, as lésbicas feministas foram instrumentais na criação das bases da comunidade lésbica, que hoje favorece que jovens mulheres comecem a se entender como lésbicas. Na filosofia lésbica feminista, a teoria e a prática lesbiana são construídas através do feminismo, daí a compreensão feminista de que o pessoal é político. Isso significa que todos os aspectos da vida lésbica são analisados a partir do projeto feminista para a sociedade. Para Jefreys (1996, p. 2), a ideia fundamental do feminismo é a importância do holismo e da conectividade, pois tudo afeta tudo, tudo está relacionado com tudo, ninguém vive no vácuo, nenhum aspecto da nossa vida é totalmente independente dos outros.

Embora reconhecendo a importância das nações lésbicas como espaços de socialização e amor entre iguais, onde são desenvolvidas práticas políticas e análises que utilizam o pensamento lésbico como base, acreditamos que a formação de comunidades constituídas exclusivamente por lésbicas em questões que não sejam dos direitos das mulheres, e a sua libertação, é reacionária, se enquadra nos projetos da supremacia masculina para manter as lésbicas segregadas, excluídas em um “não lugar”. Porém, enquanto a sociedade desumanizar as lésbicas, negando seus saberes, sua cultura e sua existência, é preciso a construção e a manutenção de comunidades lésbicas como estratégia de resistência ao domínio heterossexual.

Lesbofeminismo interseccional

A corrente interseccional aponta o apagamento da produção textual das lésbicas negras no campo feminista. Conforme Monique Dorsainvil (2007DORSAINVIL, Monique. Resisting the Margins: Black Lesbian Self-Definition and Epistemology. 2007. Bacharelado (Artes) - Faculty of Emory College of Arts and Sciences, Emory University, Estados Unidos.), os estudos sobre as mulheres focam a subordinação feminina em função do gênero, mas ignoram tanto a exclusão feminina baseada na raça, como ignoram a exclusão das mulheres em função da classe e da sexualidade. Questionando quem são as lésbicas negras, como elas experimentam, interpretam e atuam no mundo, como lidam com o racismo, sexismo e lesbofobia, Dorsainvil afirma que a realidade vivida no feminismo evidencia que a ausência das lésbicas negras na produção intelectual feminista é uma forma de violência.

Uma resposta para as questões apresentadas por Dorsainvil é dada pela caribenha-americana Audre Lorde (1934-1992), uma das teóricas mais citadas para estimular a comunidade lésbica feminista a pensar sobre a natureza e a política das diferenças. Lorde (1984LORDE, Audre. Sister outsider. Freedom: The Crossing Press, 1984.; HERÉTICA DIFUSÃO LESBOFEMINISTA, 1992HERÉTICA DIFUSÃO LESBOFEMINISTA. “Textos escolhidos de Audre Lorde”. Herética difusão lesbofeminista, 1992, p. 9. Disponível em Disponível em https://we.riseup.net/assets/171382/AUDRE%20LORDE%20COLETANEA-bklt.pdf . Acesso em 20/01/2021.
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) mudou o foco da análise, passou de uma abordagem em que a diferença constituía uma obrigação com a qual se precisava lidar responsavelmente na construção de coalizões para um foco no qual a diferença é vista como motor que move atos autenticamente revolucionários. Ao focar em primeiro plano as qualidades da diferença, a autora impulsiona uma nova forma de discurso feminista se apresentando e sendo apresentada por outras a partir de seus marcadores sociais, como negra, lésbica, feminista, socialista, guerreira, poeta, mãe, filha de um casal inter-racial. Evidenciando suas diferenças, reconhece que a ofuscação da diferença que existe entre as mulheres vai, no limite, tirar dos trilhos qualquer programa ou teoria feminista. Como destaca Harriet Malinowitz (2013MALINOWITZ, Harriet. “Estudos lesbianos e teoria cuíer”. Tradução de Tatiana Nascimento dos Santos e Luiza Rocha Rabelo. Revista do Cean, v. 2, jul./dez. 2013., p. 128), ao falar de si e visibilizar suas identidades multifacetadas, Lord segue os passos de Sojourner Truth, que no século XIX “fragmentou o ‘nós’ das feministas brancas com seu ‘eu’, levando suas generalizações sobre a mulheridade à obsolescência, lançando a categoria ‘mulher’ além de seus parâmetros limitantes”.

Dorsainvil (2007DORSAINVIL, Monique. Resisting the Margins: Black Lesbian Self-Definition and Epistemology. 2007. Bacharelado (Artes) - Faculty of Emory College of Arts and Sciences, Emory University, Estados Unidos.), reconhecendo o apagamento do conhecimento das lésbicas negras no feminismo como uma ação racista, reitera a importância da abordagem perspectivista, que leva em consideração o ponto de vista das mulheres negras (Patricia Hill COLLINS, 2000COLLINS, Patricia Hill. Black feminist thought: knowledge, consciousness and the politics of empowerment. 2 ed. Nova Iorque: Routledge, 2000.). Essa abordagem sustenta que a localização dos grupos nas relações hierárquicas de poder produz desafios comuns para os indivíduos nesses grupos e que os desafios comuns podem fomentar ângulos semelhantes de visão, levando a um conhecimento do grupo ou ponto de vista situado que, por sua vez, pode influenciar a ação política da coletividade.

O legado intelectual de Collins é um importante mecanismo para compreender e construir o conhecimento das lésbicas negras como ferramenta necessária à construção de uma epistemologia lésbica negra que evidencia um ponto de vista da e para as lésbicas negras. Como destaca Dorsainvil (2007DORSAINVIL, Monique. Resisting the Margins: Black Lesbian Self-Definition and Epistemology. 2007. Bacharelado (Artes) - Faculty of Emory College of Arts and Sciences, Emory University, Estados Unidos., p. 11), o ponto de vista das lésbicas negras reconhece a corrente separatista das lésbicas radicais brancas como bastante limitada, e nega explicitamente uma aliança com as mesmas, uma vez que as radicais separatistas apenas reconhecem o patriarcado, e por extensão o sexismo e a opressão de gênero como as principais fontes de opressão das mulheres e das lésbicas. Essa afirmativa é fundamentada pelo ponto de vista do Combahee River Coletivo (COLETIVO COMBAHEE RIVER, 2019COLETIVO COMBAHEE RIVER. “Manifesto do Coletivo Combahee River”. Plural, Revista do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da USP, São Paulo, v. 26, n. 1, p. 197-207, 2019.), criado em Boston, em 1974, com o compromisso de lutar contra a opressão de gênero, racial, sexual, heterossexual e classista.

Como ressalta Falquet (2018FALQUET, Jules. “História do Coleetivo Cabahee River”. Lutas Sociais, v. 22, n. 40, p. 124-137, 2018.), longe de resvalar para uma análise em termos de identidades separadas e concorrentes, uma das maiores contribuições teóricas e políticas do Combahee foi ter começado a pensar simultaneamente a opressão. A solidariedade é a base organizacional e reflexiva do grupo. A gênese do feminismo negro, de acordo com o Combahee, está na realidade histórica das mulheres afro-americanas, na luta de vida e de morte dessas mulheres para garantir a sobrevivência e a libertação do povo negro. À medida que as lésbicas negras contribuem para que diferentes comunidades e movimentos reflitam sobre suas identidades e situação de opressão em que as mesmas se constituem, seria praticamente impossível para elas a adoção de uma ideologia lésbica separatista. Essa impossibilidade está nas raízes genealógicas do feminismo negro.

O ponto de vista das lésbicas negras do Combahee evidencia que a identidade lésbica negra não pode ser compreendida longe da intersecção das opressões por elas vivenciadas. Conforme afirma Cheryl Clarke (1990CLARKE, Cheryl. “Lesbianism: An Act of Resistance”. In: GROSS, Larry; WOODS, James D. The Columbia Reader on Lesbians and Gay Men in Media, Society, and Politics. New York: Columbia University Press, 1990. p. 134-137.), ser lésbica negra em uma cultura imperialista, (re)produtora da supremacia masculina, do capitalismo, da misoginia, da homofobia e do racismo é um ato de resistência. Esse enquadramento da lesbianidade, sugerindo que as lésbicas escapam do destino das mulheres e que a mulher que se elege lesbiana vive perigosamente, evoca o pensamento de Wittig (2010WITTIG, Monique. El pensamiento heterosexual y otros ensayos. 2 ed. Barcelona: Egales, 2010.), apontando a heterossexualidade como um mal que atinge as lésbicas em sua pluralidade.

Clarke ressalta que não há só um tipo de lesbiana, não há apenas um tipo de comportamento lésbico e não há apenas um tipo de relação lésbica, consequentemente, não há só um tipo de resposta às pressões que sofrem as mulheres para viver como lésbicas. Essa ressalva não nega a lealdade racial afirmada no ponto de vista do Combahee, porém, afirma que as relações com a comunidade negra se fazem muito problemáticas para as lésbicas negras e para os homossexuais, colocando em questão o sexismo e a homofobia do homem negro. Para Clarke, os homens negros têm mais oportunidade para oprimir as negras, e assim fazem. De forma contundente, a autora evidencia que a luta antirracista não alcança o sexismo, tampouco a opressão sexual vivenciada pelas lésbicas. Para ela, as negras envolvidas na luta antirracista, assim como as lésbicas brancas envolvidas na luta antissexista, têm que resistir a intimidação e manipulação geradas pela cegueira da causa única, apontada como uma tática perniciosa.

Clarke traz para o debate as relações étnico-raciais, afirmando que foi criado e propagado na América o tabu contra as relações entre pessoas negras e brancas para evitar que negras e negros, brancas e brancos que compartilham uma mesma opressão se organizem contra a opressão comum. Seu argumento aponta que a branquitude garante privilégios para as mulheres brancas assim como a masculinidade garante privilégio aos homens negros, reconhecendo que a mulher negra, que não tem a brancura nem a masculinade, tem a heterossexualidade, que os homens negros e brancos manipulam ao seu bel prazer. Clarke também reconhece que o trabalho da mulher negra, como o trabalho da mulher pobre, foi roubado e explorado pelo homem branco capitalista. Em função dessa realidade, ressalta que, quando negras e brancas tentam se unir, seja política, emocional ou sexualmente, as negras são acusadas de traidoras da luta antirracial. A autora nos mostra que a lesbianidade feminista tem um potencial transformador, capaz de unir negras e brancas na luta contra a heterossexualidade obrigatória. Para Clarke, sendo a lesbianidade feminista uma visão antirracista, anticlassista, antissexista, então todas pessoas que batalham para transformar o caráter das relações nessa cultura têm algo a aprender com as lesbianas. Essa perspectiva posiciona a lesbianidade feminista num quadro epistemológico em que todas as pessoas são capazes de aprender, ensinar e transformar-se.

O pensamento de Clarke, conectado ao pensamento das demais lésbicas aqui citadas, forma a tela discursiva de onde emergem ferramentas que dão sentido à lesbianidade feminista como uma teoria do conhecimento capaz de legitimar as lésbicas como sujeitas do conhecimento, cujo conteúdo é tão diverso quanto a própria lesbianidade política e social.

Lesbitransinter feminismo

Reconhecendo que os movimentos de lésbicas surgiram nos movimentos feministas, Yan María Yaoyólotl Castro (2004CASTRO, Yan María Yaoyólotl. “El Movimiento lésbico feminista en México: su independencia respecto a los movimientos feminista heterossexual y gay y su misión histórica”. In: ENCUENTRO DE LESBIANAS FEMINISTAS DE LATINOAMÉRICA Y EL CARIBE, 6, 2004, México, ALAI. Anais ... México/Agencia Latinoamericana de Información - ALAI, 2004.), que se posiciona desde a corrente lesbofeminista, afirma que o neopatriarcado capitalista, inimigo comum das lésbicas feministas, tem tratado de acabar com o feminismo protagonizado pelas lesbianas por meio de todos os meios possíveis. Mas, afirma Castro, este não é o único inimigo dos movimentos de lésbicas. Existem outros inimigos, que se expressam através da misoginia (ódio das mulheres), da lesbofobia (ódio das lésbicas) e das tentativas internas de patriarcalizar o feminismo. Para Castro (2004), atualmente, três frentes de guerra estão golpeando os movimentos de lésbicas: a) as ideologias queer, por meio das indústrias transnacionais, acadêmicas e intelectuais a serviço do monopólio do conhecimento e informação capitalista; b) a perspectiva trans, por meio das indústrias hospitalares, médico-cirúrgica, farmacêutica e cosmética, visando induzir as pessoas que se encontram definindo sua própria sexualidade a mudá-la parcialmente ou mudar de sexo; c) a proposta cyborgue, por meio da cibernética da biotecnologia, através de um discurso científico que combina máquinas com organismos vivos, humanos e animais, a fim de produzir super-homens e robocops. Essas três frentes de guerra, na perspectiva da autora, são aparatos ideológicos cuja função tem sido utilizada para justificar e apontar o Mercado da Diversidade Sexual, cujo propósito oculto é comercializar os corpos, normalizar a violência sexual e mesclar sexualidades opressivas e sexualidades não opressivas, para além de institucionalizar a sexualidade não heteronormativa, centrada nos valores da heterossexualidade obrigatória (CASTRO, 2004CASTRO, Yan María Yaoyólotl. “El Movimiento lésbico feminista en México: su independencia respecto a los movimientos feminista heterossexual y gay y su misión histórica”. In: ENCUENTRO DE LESBIANAS FEMINISTAS DE LATINOAMÉRICA Y EL CARIBE, 6, 2004, México, ALAI. Anais ... México/Agencia Latinoamericana de Información - ALAI, 2004., p. 2, tradução nossa).

O posicionamento da autora exclui os movimentos de lésbicas feministas das frentes de lutas dos movimentos da diversidade sexual, afirmando que o “L” pertence ao movimento feminista, não aos movimentos da diversidade sexual. Reflete ainda os embates e disputas internas no movimento feminista pelo sujeito do feminismo, que nos Estados Unidos começou na Conferência Lésbica Costa Oeste, realizada em Los Angeles, em 1973, quando feministas radicais e pessoas transexuais se viram numa batalha acirrada; de um lado, mulheres transexuais afirmando que são mulheres porque se sentem mulheres, pensam como mulheres; de outro, feministas radicais afirmando que qualquer pessoa nascida homem mantém o privilégio masculino na sociedade, mesmo que escolha viver como mulher (Michele GOLDBERG, 2014GOLDBERG, Michele. “What is a woman? The dispute between radical feminism and transgenderism”. The New Yorker - American Chronicles [online], August 4, 2014. Disponível em Disponível em https://www.newyorker.com/magazine/2014/08/04/woman-2 . Acesso em 12/02/2021.
https://www.newyorker.com/magazine/2014/...
). Desse conflito, emerge na América Latina o movimento Lesbitransinter feminismo.

Na América Latina, como salientam Ana Lucía Ramírez Mateus e Diana Elizabeth Castellanos Leal (Gabrielle Esteban) (2013), o movimento de lésbicas tem passado por transformações a partir das rupturas e descontinuidades provocadas pela construção de sujeitxs subaltenizadxs3 3 Utilizamos o x conforme discussões do 1º Encontro Lesbitransinter feminista Venir al Sul, realizado no Paraguai, em 2013, sobre como ampliar e reivindicar os modos de nomear o gênero; e para nos referir às pessoas com identidade de gênero não binária que propõem seu lugar de anunciação enquanto um gênero não determinado pelo masculino ou pelo feminino, pleiteando a indefinição como lugar político de criatividade e resistência. pelo discurso feminista radical. Essa discussão foi acirrada no 3º EFLAC - Encontro Feminista Latino-Americano e do Caribe, ocorrido em 1985, no Brasil, quando as lésbicas, sobretudo as que assumiam a identidade de gênero masculina, e as mulheres negras, foram rechaçadas pelas mulheres brancas heterossexuais, que as acusaram de tentar dividir a luta das mulheres. O mesmo ocorreu no 10º EFLAC, também realizado no Brasil, em 2005, onde a presença e a participação das mulheres transexuais foram duramente questionadas. Nesses encontros, a categoria mulher, denotando uma identidade comum para o sujeito político do feminismo, foi criticada por seu fracasso em explicar os mecanismos da opressão de gênero em contextos culturais específicos em que ela existe.

A polêmica que se deu em torno da participação das mulheres transexuais nos espaços feministas também foi acirrada nos ELFLAC - Encuentro Lesbico Feminista Latinoamericano y Caribenho, realizados desde 1987, sobretudo no VIII ELFLAC, realizado na Guatemala, em 2010, quando mulheres transexuais foram impedidas de participarem do encontro, causando cizânia no interior dos movimentos de lésbicas.

Como afirma Andrea Alvarado (2010ALVARADO, Andrea. Los desaciertos del VIII Encuentro Lésbico Feminista [online], 2010. Disponível em Disponível em http://www.caladona.org/grups/uploads/2012/01/los-desaciertos-del-viii-encuentro-lesbico-feminista.doc . Acesso em 10/01/2021.
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), a questão da identidade lesbiana foi o pano de fundo do VIII ELFLAC. Para essa autora, as opiniões sobre o tema são diversas e muitas vezes contraditórias entre si. O tema requer análise consciente e aprofundada, pois não se trata de “sacar o femeninistrômeto, nesse caso o lesbianômetro” (ALVORADO, 2010, p. 1) para definir quem pode e quem não pode fazer parte do movimento de lésbicas. Segundo Norma Mogrovejo (2010MOGROVEJO, Norma. “Los encuentros lésbicos feministas latinoamericanos y del Caribe en la era del postfeminismo”. Revista Digital Universitaria, v. 11, n. 9, 1 sep. 2010.), os ELFLAC surgem da resistência às políticas heterocentradas dos feminismos, da prática falocêntrica e misógina dos movimentos homossexuais e dos partidos de esquerda que, em conjunto, insistem em invisibilizar as lésbicas e suas demandas. Surgem caracterizados como um espaço próprio e autônomo e se apresentam como a maior e mais potente ação coletiva das organizações lésbicas da América Latina e do Caribe. Porém, a busca da autonomia transita por sinuosos caminhos que têm afetado a experiência organizativa das lésbicas, e a presença de cooperação internacional, assim como a interlocução com o Estado, leva à institucionalização do movimento de lésbicas, como aconteceu com os movimentos feministas e outros movimentos sociais, modificando assim sua lógica de ação social. De acordo com Mogrovejo, os financiamentos quase sempre condicionam as agendas dos movimentos e tendem a priorizar práticas que integram valores da heterossexualidade e do mercado neoliberal, gerando burocracias representativas e falsas lideranças.

No bojo do debate sobre os rumos do pensamento e movimento de lésbicas, o VIII ELFLAC foi convocado como uma resistência crítica às novas formas de colonialidade produtora de dependências, promovendo a defesa de políticas autogestivas e de temáticas que problematizam o ser lésbica para além do âmbito puramente sexual e identitário. Em relação ao impedimento da participação das mulheres transexuais no VIII ELFLAC, Mogrovejo (2010MOGROVEJO, Norma. “Los encuentros lésbicos feministas latinoamericanos y del Caribe en la era del postfeminismo”. Revista Digital Universitaria, v. 11, n. 9, 1 sep. 2010.) ressalta que ainda que a cooperação internacional tivesse tentado fazer valer suas influências e preferências, parte dos grupos considerou inviável tal participação enquanto outros, identificados como militantes da diversidade sexual, defenderam a entrada e a permanência das pessoas transexuais. Mogrovejo critica a política da Diversidade Sexual, afirmando que essa política tem respondido mais aos interesses das financiadoras internacionais.

Concordando com Mogrovejo, Marian Pessah (2011PESSAH, Marian. “Ser lésbica ou lésbika politika”. In: SEMINÁRIO ENLAÇANDO SEXUALIDADES, 2, 2011, Salvador, Uneb. Anais ... Salvador: Uneb, 2011.) diz que o debate no EFLAC foi tenso. De um lado, um grupo de lésbicas feministas desejava que o VIII ELFLAC abrisse espaço para conhecer e dialogar com as trans lésbicas; de outro, as lésbicas radicais negaram com veemência essa possibilidade. Em tom de autocrítica, Pessah ressalta que o problema da inclusão das pessoas trans não se resolve cercando os espaços. Sua sensação é de que os ELFLAC “já eram”, explodiram. Dos estilhaços, em 2012, surgiu o 1º “Venir al Sur” - Encontro Lesbitransinter Feminista da América Latina e do Caribe, realizado no Paraguai, em 2012.

Esse Encontro foi pensado, produzido e vivido desde a dissidência sexual, reunindo todas as vozes, todos os corpos e todas as práticas para “bailar, foder, inventar, beijar, revolucionar, compartir, apreender, rir, criar, propor, sonhar, denunciar, transformar” (AIREANA, 2018AIREANA. Grupo de los derechos de las lesbianas. Venir al Sul [online]. Paraguay, 2018. Disponível em Disponível em https://www.aireana.org.py/tomando-fuerza/venir-al-sur/ . Acesso em 10/02/2021.
https://www.aireana.org.py/tomando-fuerz...
, tradução nossa). Como ressaltam Ramirez Mateus e Castellanos Leal (2012, p. 42, tradução nossa), o Venir al Sur “[...] marca uma ruptura no interior dos movimentos de lésbicas feministas ao introduzir um giro discursivo que abre a porta do ‘quarto próprio’ para construir um feminismo sem paredes”.

Com a mesma perspectiva, o 2º Venir al Sur, se anunciando como um feminismo para todas, não para algumas, foi realizado na Costa Rica, em 2015, com o desafio de definir estratégias de enfrentamento à violência patriarcal desde um feminismo de corpos e vozes múltiplas no qual a arte, o afeto, a imaginação e a poesia revolucionam a vida, e se experimenta a potência política dos orgasmos, do riso, da festa, da criatividade. O 3º Venir al Sur aconteceu no México, em 2018. Como bem reconhece Lala Mujika (2015MUJIKA, Lala. “Venir al Sur, Feminismo con F, de Feliz”. Galde [Blog], 2015. Disponível em Disponível em http://www.galde.eu/venir-al-sur-feminismos-con-f-de-feliz/ . Acesso em 12/02/ 2021.
http://www.galde.eu/venir-al-sur-feminis...
), Venir al Sur é “Feminismo com F de Feliz”, definido fundamentalmente como “um espaço onde as práticas de arte de prazer feministas são reconhecidas e vividas como experiências de ação política capazes de revolucionar nossos mundos e construir feminismos sem paredes, sem exclusões, sem hierarquias” (MUJIKA, 2015MUJIKA, Lala. “Venir al Sur, Feminismo con F, de Feliz”. Galde [Blog], 2015. Disponível em Disponível em http://www.galde.eu/venir-al-sur-feminismos-con-f-de-feliz/ . Acesso em 12/02/ 2021.
http://www.galde.eu/venir-al-sur-feminis...
, tradução nossa).

Para nós, o Venir al Sur é campo fértil de debates no campo da lesbianidade, espaço de formação e possibilidades múltiplas de compartilhamento de experiências, conhecimentos, ideias e afetos entre gente diferente, plural, singular, rebelde, resistente. Não sem estranhamento, nossa participação nesses encontros foi uma experiência de escuta e diálogo afetivo e político com lésbicas trans feministas de “pau e peito”, “sem peito, sem pau”, gente que ri, canta, dança e encanta, disposta a romper com as barreiras da língua, do corpo, do desejo e das normas heterossexuais. Uma grande oportunidade de reflexão sobre nossas práticas militantes. A experiência afetiva e política com lésbicas trans feministas e outras pessoas que se reivindicam transinster feministas, reconhecendo de forma crítica sua incidência na transformação das sociedades patriarcais, fortaleceu nosso reconhecimento e a valoração do papel que as mulheres da diversidade tiveram, têm e seguem tendo no desenvolvimento prático e teórico dos movimentos feministas na América Latina e no Caribe. Esse reconhecimento é combustível para nossa luta coletiva pelos direitos humanos das pessoas LGBT no Brasil.

Reconhecendo que a população transexual é uma das mais discriminadas por parte das estruturas e serviços estatais e da sociedade em geral, concordamos com Ramírez Mateus e Castellanos Leal (2012RAMÍREZ MATEUS, Ana Lucía; CASTELLANOS LEAL, Diana Elizabeth. “Autorizar una voz para desautorizar un cuerpo: producción discursiva del lesbianismo feminista oficial”. Íconos - Revista de Ciencias Sociales, n. 45, p. 41-57, 2012.), quando dizem que o discurso político que exclui o “L” das frentes de luta da diversidade que reúne pessoas esquisitxs, subalternizadxs, e exclui essas pessoas dos movimentos de lésbicas, é o “discurso lésbico feminista oficial”, produzido por um feminismo essencialista, raivoso e excludente. Esse discurso autoriza uma voz para desautorizar outras, legitima um corpo para deslegitimar outros.

O pensamento Lesbotransinter feminista sugere que a discussão em torno do sujeito do feminismo é permeada por questões que podem ser apreendidas, por um lado, pela desconstrução do estatuto da categoria mulher/mulheres como sujeito universal do feminismo e, por outro, pela assunção de um sujeito relacional e situacional, tomando a pluralidade de discursos e práticas como caminho consequente da diversidade de identidade de sujeitos feministas que se mostram.

Diante do conflito que separa as hermanas, entendemos que é preciso construir pontes entre os feminismos, e mais que construir pontes, é preciso criar encruzilhadas para potencializar o pensamento lésbico como um construto político plural, diverso e, como tal, um bem público. Compreendemos, como sugere Luis Carlos Santos (2012SANTOS, Luis Carlos. “Ancestralidade e liberdade: em torno de uma filosofia africana no Brasil”. Revista Sul-Americana de Filosofia e Educação, n. 18, p. 48-61, maio/out. 2012., p. 49), “que a liberdade é o desejo pela diversidade, mas sem perder o ponto de vista das unidades, pois assim não perde a perspectiva da encruzilhada, construtora da diversidade”. A diversidade é encantamento do mundo, e o encantamento é função da liberdade!

Conhecimento lésbico como bem público

Percebido como um conhecimento localizado (HARAWAY, 1999HARAWAY, Donna. “Saberes localizados”. Cadernos Pagu, v. 5, p. 7-41, 1999.), o pensamento lésbico é uma entre tantas outras pautas da sociedade de aprendizagem onde a produção do conhecimento se estende para além dos muros das universidades e ganha diferentes espaços socioculturais, políticos e econômicos. Nessa sociedade, como bem pontua Teresinha Fróes (2000FRÓES, Teresinha. “Sociedade da informação, sociedade do conhecimento, sociedade da aprendizagem: implicações ético-políticas no limiar do século”. In: LUBISCO, Nídia Maria Lienert; BRANDÃO, Lídia Maria Batista (Orgs.). Informação e informática. Salvador: EDUFBA, 2000. p. 283-306.), lugares tradicionais de produção e difusão da informação e do conhecimento ampliam suas funções articulando-se em redes, virtualizando-se, intercambiando âmbitos públicos e privados, individuais e coletivos.

Desde a sociedade de aprendizagem, “que agrega valor a dados da realidade, sistematizando-os e disponibilizando-os, produzindo conhecimento a partir de processos de interação cujos lastros são informações novas reconstruídas” (FRÓES, 2000FRÓES, Teresinha. “Sociedade da informação, sociedade do conhecimento, sociedade da aprendizagem: implicações ético-políticas no limiar do século”. In: LUBISCO, Nídia Maria Lienert; BRANDÃO, Lídia Maria Batista (Orgs.). Informação e informática. Salvador: EDUFBA, 2000. p. 283-306., p. 7), o pensamento lésbico, em todos espaços e tempos, questiona a invisibilidade da existência lésbica nos processos de produção e difusão do conhecimento nos espaços formais de educação. Porém, pensamos com Fróes que esses espaços, com poucas exceções, não têm cumprido seu papel consignado de produção e socialização do saber historicamente produzido; não têm fomentado a construção pessoal do conhecimento, a formação para o trabalho e a produção de identidades coletivas, em especial a de indivíduos que (con)formam a cidadania. Descontentes, reconhecendo com Cláudia Regina Lahni e Daniela Auad (2019LAHNI, Cláudia Regina; AUAD, Daniela. “Não é mole não, ser feminista, professora e sapatão: apontamentos de uma história a partir do espaço das lésbicas e da lesbianidade na produção de conhecimento sobre mídia”. Anos 90: Revista do Programa de Pós-Graduação em História [online], Porto Alegre, v. 26, 2019, e2019301. Disponível em https://seer.ufrgs.br/anos90/article/view/90001. ISSN 1983-201X. DOI: 10.22456/1983-201X.90001.
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) que “Não é mole não, ser feminista, professora e sapatão”, pois o estigma que nos marca em função do gênero e da sexualidade não heterossexual tem resultado em silenciamentos, agressões, mortes ao longo da história; nos rebelamos contra a invisibilidade lésbica, reconhecendo que “ser professora, pesquisadora, feminista, mãe e sapatão pode ser as formas - as melhores formas que conhecemos até o momento - para viver e, com a nossa vida, construir a democracia para todas as pessoas” (LAHNI; AUAD, 2019LAHNI, Cláudia Regina; AUAD, Daniela. “Não é mole não, ser feminista, professora e sapatão: apontamentos de uma história a partir do espaço das lésbicas e da lesbianidade na produção de conhecimento sobre mídia”. Anos 90: Revista do Programa de Pós-Graduação em História [online], Porto Alegre, v. 26, 2019, e2019301. Disponível em https://seer.ufrgs.br/anos90/article/view/90001. ISSN 1983-201X. DOI: 10.22456/1983-201X.90001.
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, p. 15). Assim, nos desafiamos a lesbianizar a ciência produzindo e socializando o pensamento lésbico em espaços formais de educação como um bem público. Nessa perspectiva, o pensamento lésbico é elemento estruturante das políticas de informação para o enfrentamento e superação da lesbofobia produzida pelo pensamento hetero.

Conforme Maria Nélida González de Gomes (1999GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. “Da política de informação ao papel da informação na política contemporânea”. Revista Internacional de Estudos Políticos, Rio de Janeiro, UERJ/NUSEG, v. 1, n. 1, p. 67-93, abr. 1999.), a política de informação é um conjunto de ações e decisões que são tomadas buscando preservar ou até mesmo alterar um regime de informação, que podem ser políticas micro ou macro, realizadas de forma explícita ou não. Nessa perspectiva, servem para configurar instrumentos decisionais e normativos por meio dos quais se expressa o que é desejável e prioritário para o grupo. Assim, as políticas de informação têm como meta a construção coletiva da inteligência comunicacional, sendo que as redes de informação se movimentam no sentido de que o conhecimento e suas condições de produção estariam no mundo natural e social; além disso, haveria um monitoramento informacional, por meio de avaliação, reflexão crítica e idealização dos grupos (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 1999GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. “Da política de informação ao papel da informação na política contemporânea”. Revista Internacional de Estudos Políticos, Rio de Janeiro, UERJ/NUSEG, v. 1, n. 1, p. 67-93, abr. 1999.).

Com essa mirada, a política de informação comprometida com o enfrentamento e superação da lesbofobia é política de visibilidade, cujo desafio é informar à sociedade que existem outras formas possíveis de organizar a vida, outros sentimentos, outros mundos fora da heterossexualidade obrigatória, tornando possível e visível a existência lésbica em diferentes contextos, confrontando assim a política do silêncio, da invisibilidade, “que é a melhor aliada da política do esquecimento” (Tania NAVARRO SWAIN, 2002NAVARRO SWAIN, Tania. “Feminismos e lesbianismo: quais os desafios?”. Labrys - Estudos Feministas [online], n. 1-2, jul./dez. 2002. Disponível em Disponível em https://www.labrys.net.br/labrys1_2/femles.html . Acesso em 12/02/ 2021.
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, p. 30). Essa política representa uma contradição à ordem naturalizada da heterossexualidade dominada pelo masculino, e o pensamento lésbico se configura como tesoura que rasga o pano do patriarcado, tornando visíveis corpos femininos racializados que pulsam, amam, e celebram o amor entre mulheres. Essa política alimenta a produção de um sistema de pensamento que concebe a lesbianidade como ato de resistência a um projeto hegemônico de sociedade que exclui as lésbicas da condição de cidadã. Assim, o pensamento lésbico é produtor de insumos informacionais que potencializam o exercício da cidadania, uma vez que fomenta a consciência lésbica, que é concebida por Sidney Abbott e Bárbara Love (1973ABBOT, Sidney; LOVE, Bárbara. Sappho was a right-on woman: a liberated view lesbianism. New York: Stein and Day Publishers, 1973.) como um processo arrebatador de consciência de si que reflete em todas as ações e interações, exigindo tomada de decisão e consciência que jamais duvida de que mulher e lésbica são construções políticas, não existem a priori.

Considerações finais

Os movimentos de lésbicas são aqui reconhecidos como as expressões mais radicais das lutas feministas, uma vanguarda da luta sexopolítica contra o patriarcado, instâncias onde se busca construir com outros segmentos sociais oprimidos as bases de uma sociedade justa, onde não haja opressão social sexista, racista, classista, imperialista, dentre outras formas de opressão sintetizadas pelo sistema econômico, político e social patriarcal sexual capitalista. Com esse entendimento, este texto é inconcluso, mas cumpre seu propósito refletindo fragmentos do pensamento lésbico que, em conjunto, expressam uma crítica feminista à ciência moderna e à sociedade que não reconhece as lésbicas como produtoras de conhecimento válido. Como produto de uma luta situada, é um esforço para resgatar matrizes teóricas que alimentam e são alimentadas pelos movimentos de lésbicas. Assumindo a existência lésbica como conceito-chave para nossos feminismos, sugere que o pensamento lésbico é bem público que se constitui na luta feminista contra a estigmatização, pelo direito de ser e viver livremente a sexualidade. O pensamento das autoras lésbicas aqui citadas busca soluções coletivas, fomentando uma consciência de grupo que tantas vezes resulta na organização política como estratégia para reverter a situação em que se encontram as lésbicas.

Como lesbianas, adentramos o campo da análise conscientes de que trabalhar com essa temática é tarefa para quem desafia o androcentrismo da ciência, que alimenta o patriarcado que tantas vezes cala nossas vozes, ceifa nossas vidas. Assim, percebemos a luta dos movimentos de lésbicas e o pensamento lésbico como dispositivos que geram consciência política da injustiça e da discriminação que nos atinge como lésbicas. Com esses movimentos, seguimos em processos de produção e difusão do pensamento lésbico em busca de reconhecimento e visibilidade, reverberando a invisibilidade lésbica como vulnerabilidade que precisa ser reversível para que a subjetivação pela linguagem opere seu efeito.

Compreendemos a necessidade política dos nossos feminismos falarem através da identidade mulher/mulheres. Mas, contestamos a construção de uma singularidade feminina que procure unificar as mulheres. Entendemos que essas identidades, assim como a identidade lésbica, devem ser desenvolvidas como unidade coletiva, e não individual. O que está em jogo não é o que define o “nós” dos movimentos identitários, mas o papel do movimento no cenário da política sexual brasileira. Dessa forma, assumindo a ginga como um movimento que se atualiza na sua própria recursividade, reconhecemos o pensamento lésbico como ginga que ensina outras formas de produzir conhecimento, de ecoar outras vozes, visibilizando e potencializando outros corpos, outra ciência.

Afetadas pela pandemia bolsonarista, que nega a ciência, elimina as diferenças e faz apologia à ditadura, nos cabe perguntar como nós, professoras e professores em movimentos por uma educação emancipadora, contribuímos com o processo de produção e difusão de conhecimentos contra-hegemônicos. Reconhecemos o pensamento lésbico como conhecimento válido? Compartilhamos esse pensamento em nossas salas de aula? Citamos autoras lésbicas em nossas produções? Por fim, reiteramos: pensamento lésbico é revolucionário. Constituído de práxis política (militância/movimento) e de teorização (pensamento/conhecimento) que se confundem e se nutrem mutuamente, pensamento lésbico é bem público para a construção do mundo que queremos, embora não saibamos como será esse mundo.

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  • 1
    Gay, Lésbica, Bissexual, Transexual, Travesti.
  • 2
    Este é um desdobramento do Capítulo 4, da tese “Sapatão não é bagunça: estudo das organizações lésbicas da Bahia”, defendida pela autora em 2016, sob orientação da coautora, no Programa de Pós-Graduação em Difusão do Conhecimento (UFBA, UNEB, IFBA, UEFS, LNCC, SENEI, CIMATEC). Ver: Silva (2016).
  • 3
    Utilizamos o x conforme discussões do 1º Encontro Lesbitransinter feminista Venir al Sul, realizado no Paraguai, em 2013, sobre como ampliar e reivindicar os modos de nomear o gênero; e para nos referir às pessoas com identidade de gênero não binária que propõem seu lugar de anunciação enquanto um gênero não determinado pelo masculino ou pelo feminino, pleiteando a indefinição como lugar político de criatividade e resistência.
  • Como citar esse artigo de acordo com as normas da revista:

    SILVA, Zuleide Paiva; ARAUJO, Rosangela Janja Costa. “Pensamento lésbico: uma ginga epistemológica contra-hegemônica”. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 29, n. 3, e82446, 2021
  • Financiamento:

    Não se aplica
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    Não se aplica
  • Aprovação de comitê de ética em pesquisa:

    Não se aplica

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Nov 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    28 Jun 2021
  • Revisado
    18 Ago 2021
  • Aceito
    30 Ago 2021
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