Prevalência de lesões por fricção em adultos e idosos hospitalizados

RESUMO

Objetivo:

Identificar a prevalência, os fatores relacionados e classificar as Lesões por Fricção em adultos e idosos hospitalizados.

Método:

Estudo de prevalência com adultos e idosos em unidades de internação e de tratamento intensivo de um hospital do Sul do Brasil. Utilizou-se a STAR Skin Tear Classification System para análise das lesões. Os dados foram coletados por exame físico e consulta em prontuário. Calculou-se a Razão de Prevalência por Regressão de Poisson com variância robusta.

Resultados:

Participaram 148 pacientes. Foram encontradas 29 Lesões por Fricção (média 1,6±0,7) em 18 indivíduos (prevalência de 12,2%). As variáveis idade, pele friável, alimentação por cateter enteral, grau de dependência, uso de anti-hipertensivo, micronutriente, diurético, antidepressivo e de antifúngico foram associadas às lesões na análise bivariada. No modelo final multivariado, anti-hipertensivo RP 2,42 (IC 95% 1,01-5,77), antidepressivo RP 2,72 (IC 95% 1,1-6,33) e micronutriente RP 4,93 (IC 95% 1,64-14,80) mantiveram relação.

Conclusão:

A prevalência de lesões foi de 12,2%, evidenciando sua presença no cenário de atenção em saúde, sobretudo nos cuidados de enfermagem. Protocolos assistenciais precisam ser elaborados para sua prevenção, identificação e tratamento precoce.

DESCRITORES:
Ferimentos e Lesões; Fricção; Pele; Pacientes Internados; Cuidados de Enfermagem

ABSTRACT

Objective:

To identify the prevalence, related factors and to classify Skin Tears in hospitalized adults and older adults.

Method:

Prevalence study with adults and older adults in inpatient and intensive care units of a hospital in the South Region of Brazil. The STAR Skin Tear Classification System was used to analyze the lesions. Data were collected by physical examination and consultation of medical records. The Poisson Regression Prevalence Ratio with robust variance was calculated.

Results:

The participants were 148 patients. There were 29 Skin Tears (mean 1.6 ± 0.7) in 18 individuals (prevalence of 12.2%). The variables age, friable skin, enteral feeding catheter, degree of dependence, use of antihypertensives, micronutrients, diuretics, antidepressants, and antifungals were associated with lesions in the bivariate analysis. In the final multivariate model, antihypertensives PR 2.42 (95%CI 1.01-5.77), antidepressants PR 2.72 (95%CI 1.1-6.33) and micronutrients PR 4.93 (95%CI 1.64-14.80) maintained a relationship.

Conclusion:

The prevalence of injuries was 12.2%, showing they are present in the health care setting, especially in nursing care. Care protocols need to be developed for the prevention, identification and early treatment of ST.

DESCRIPTORS:
Wounds and Injuries; Friction; Skin; Inpatients; Nursing Care

RESUMEN

Objetivo:

Identificar la prevalencia y los factores relacionados de las Lesiones por Fricción en adultos y adultos mayores hospitalizados.

Método:

Se trata de un estudio de prevalencia realizado entre adultos y adultos mayores en las unidades de internación y de tratamiento intensivo de un hospital del Sur de Brasil. Se utilizó el STAR, Skin Tear Classification System, para analizar las lesiones. Los datos se recogieron mediante examen físico y consulta de prontuario. Se calculó la Razón de Prevalencia por Regresión de Poisson con varianza robusta.

Resultados:

Participaron 148 pacientes. Se encontraron 29 Lesiones por Fricción (media 1,6±0,7) en 18 individuos (prevalencia del 12,2%). Las variables edad, piel friable, alimentación por catéter enteral, grado de dependencia, uso de antihipertensivo, micronutriente, diurético, antidepresivo y antimicótico estaban asociadas a las lesiones en el análisis bivariado. En el modelo final multivariado, antihipertensivo RP 2,42 (IC 95% 1,01-5,77), antidepresivo RP 2,72 (IC 95% 1,1-6,33) y micronutriente RP 4,93 (IC 95% 1,64-14,80) se mantuvieron relacionados.

Conclusión:

La prevalencia de las lesiones era del 12,2%, lo que demuestra su presencia en el escenario de la atención en salud, sobre todo en los cuidados de enfermería. Es necesario elaborar protocolos asistenciales para su prevención, identificación y tratamiento precoz.

DESCRIPTORES:
Heridas y Lesiones; Fricción; Piel; Pacientes Internos; Atención de Enfermería

INTRODUÇÃO

As Lesões por Fricção (LF), denominadas de Skin Tears em inglês, são definidas como lesões traumáticas advindas da fricção, contusão e/ou cisalhamento da pele, acometendo, principalmente, as extremidades dos membros. Ocorrem, sobretudo, nos extremos de idade (idosos e neonatos) e em indivíduos criticamente doentes e/ou dependentes de cuidados. Caracterizam-se pela separação entre a derme e a epiderme ou entre essas e a hipoderme^(1-2).

Apesar de possuírem definição e estudos desde meados de 1990, as LF ainda carecem de dados epidemiológicos, especialmente nos países latino-americanos, onde pesquisas sobre o tema são escassas. Alguns pesquisadores sugerem que, embora possam ser mais prevalentes que as Lesões por Pressão, as LF passam despercebidas, talvez por serem feridas traumáticas rasas e, equivocadamente, relacionadas como inerentes ao processo de envelhecimento^(1-4).

O impacto das LF está vinculado ao aumento da dor, dos custos e da internação, além do desenvolvimento de feridas crônicas, diminuição da mobilidade e da qualidade de vida^(5-6). Contudo, medidas simples como a identificação dos pacientes com risco e a implementação de protocolos de prevenção parecem impactar a gravidade ou mesmo prevenir as LF^(3,7).

A ocorrência de LF está atrelada a fatores de risco intrínsecos e extrínsecos, sendo que muitos desses ainda necessitam ser mais bem definidos. Os fatores conhecidos incluem extremos de idade, sexo feminino, raça caucasiana, alteração nutricional, uso de medicamentos (como anti-inflamatórios, corticoides, imunossupressores e anticoagulantes), fumo, comorbidades, dependência para atividades e alteração sensorial, entre outros^(1,6). Estudos internacionais apontam prevalência entre 3,9 e 22%^(2,8).

A identificação dos indivíduos com esses fatores de risco e a implementação de medidas de prevenção têm sido eficazes para evitar as LF, diminuir suas taxas e minimizar a sua gravidade⁽⁹⁾. Assim, no intuito de oferecer subsídios teóricos acerca das LF no contexto brasileiro, tendo vista a escassez de estudos nacionais, surgiram as seguintes questões de pesquisa: qual a prevalência de LF em pacientes adultos internados em um hospital brasileiro? Quais características estão relacionadas à ocorrência de LF?

Partindo dessas questões norteadoras, este estudo tem como objetivo geral identificar a prevalência de Lesões por Fricção em pacientes adultos e idosos internados em um hospital da Região Metropolitana de Porto Alegre/RS. Os objetivos específicos são: classificar o tipo de LF e identificar os fatores relacionados à sua presença.

O estudo justifica-se tendo em vista o impacto econômico, clínico e social das LF, a escassez de estudos nacionais (especialmente no contexto do atendimento público de saúde do Brasil) e a tendência de aumento do número de casos dessas lesões em decorrência do envelhecimento populacional⁽⁴⁾.

MÉTODO

DESENHO DO ESTUDO

Trata-se de um estudo de prevalência.

CENÁRIO

Foi desenvolvido em três Unidades de Internação Adulto (clínica e cirúrgica) e uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de um hospital da Região Metropolitana de Porto Alegre/RS. O Hospital, geral e de médio porte, atende convênio público pelo Sistema Único de Saúde (SUS), convênios privativos e pacientes na forma particular.

POPULAÇÃO

A população do estudo compreendeu todos os pacientes admitidos nas Unidades de Internação Adulto ou na UTI do hospital durante o período de coleta de dados.

Os critérios de inclusão foram os seguintes: possuir idade igual ou superior a 18 anos e estar internado nos leitos de UTI ou na Unidade de Internação Adulto nos dias da coleta de dados. Os critérios de exclusão foram estar internado em um dos leitos psiquiátricos (usuários de drogas ou tentativas de suicídio), da maternidade e/ou em quartos com medidas de bloqueio epidemiológico para doenças transmitidas por contato, gotículas ou partículas aéreas, devido à restrição de entrada nesses quartos, conforme solicitação do controle de infecção hospitalar.

As três Unidades de Internação Adulto somam 129 leitos, dos quais muitos são destinados à maternidade, não havendo número exato pré-definido para distribuição. A UTI possui 10 leitos fixos. Assim, a capacidade máxima para internação de adultos é de 139 leitos, considerando Unidades de Internação Adulto e UTI. Foi calculada amostra de 148 sujeitos, considerando prevalência de 22% de LF⁽⁸⁾ com erro amostral menor que 5%. Realizaram-se duas coletas de dados para alcançar o total de 148 pacientes que aceitaram participar do estudo, pois houve 25 recusas, 48 exclusões pelos critérios e 57 leitos vagos.

COLETA DE DADOS

O período de coleta de dados ocorreu nos dias 17 de outubro e 17 de novembro do ano de 2017. Foi realizado teste piloto, com cinco pacientes, antes da coleta de dados oficial, a fim de adequação do instrumento e sistematização do processo. A partir disso, os dados foram coletados por um enfermeiro, pesquisador responsável com título de doutorado, e por quatro acadêmicos de enfermagem, que foram submetidos a treinamento teórico-prático sobre a avaliação das LF. Foram abordados conteúdos referentes à sua definição, identificação, classificação e fatores relacionados, bem como a aplicabilidade uniforme do instrumento.

O instrumento continha dados sociodemográficos (sexo, idade, cor da pele) e clínicos. As variáveis clínicas investigadas foram diagnóstico médico, Índice de Massa Corporal (IMC), alimentação recebida por cateter gástrico/enteral ou via oral, suporte de oxigênio por algum tipo de dispositivo auxiliar ou ventilação em ar ambiente, característica da pele, dependência para Atividades Básicas da Vida Diária (ABVD) e utilização de cateteres vasculares, fita/dispositivo adesivo na pele, contenção mecânica, medicamentos ou micronutrientes. Foram consideradas micronutrientes as vitaminas e a glicose.

Foi realizado o exame físico nos pacientes, que consistiu na inspeção visual (realizada em única vez) com a finalidade de buscar lesões, avaliar o tipo de pele e categorizar as LF, quando detectadas. A pele friável (avaliada subjetivamente) foi considerada como aquela de característica frágil, quebradiça, com turgor diminuído e semelhante a uma “folha de papel”.

Para a avaliação das LF, utilizou-se a STAR Skin Tear Classification System, adaptada para o Brasil como Sistema de Classificação STAR - Lesão por Fricção⁽¹⁰⁾. A versão adaptada obteve nível moderado e estatisticamente significativo de concordância quando aplicada na prática clínica, a qual propõe cinco categorias (1a, 1b, 2a, 2b e 3):

Categoria 1a: lesão por fricção cujo retalho de pele pode ser realinhado à posição anatômica normal (sem tensão excessiva) e a coloração da pele ou do retalho não se apresenta pálida, opaca ou escurecida;

Categoria 1b: lesão por fricção cujo retalho de pele pode ser realinhado à posição anatômica normal (sem tensão excessiva) e a coloração da pele ou do retalho apresenta-se pálida, opaca ou escurecida;

Categoria 2a: lesão por fricção cujo retalho de pele não pode ser realinhado à posição anatômica normal (sem tensão excessiva) e a coloração da pele ou do retalho não se apresenta pálida, opaca ou escurecida;

Categoria 2b: lesão por fricção cujo retalho de pele não pode ser realinhado à posição anatômica normal (sem tensão excessiva) e a coloração da pele ou do retalho apresenta-se pálida, opaca ou escurecida;

Categoria 3: lesão por fricção cujo retalho de pele está completamente ausente.

Os dados de categorização das LF, quando prevalentes, eram avaliados por dois pesquisadores, sendo um deles o pesquisador com maior titulação acadêmica (doutorado). O Índice de Katz modificado foi utilizado para avaliar as ABVD no momento do exame físico. O índice indica quando o paciente é independente (a soma de pontos é 06) ou dependente (entre 01 e 05 pontos). O escore zero aponta total dependência⁽¹¹⁾.

Os diagnósticos médicos foram coletados do prontuário e agrupados conforme Classificação Internacional das Doenças (CID-10)⁽¹²⁾. Para a classificação IMC, foi utilizada a definição da Organização Mundial de Saúde⁽¹³⁾: magreza (menor que 18,5 Kg/m²), normal (entre 18,5 a 24,9 Kg/m²), sobrepeso (25 a 29,9 Kg/m²), obesidade (entre 30 e 39,9 Kg/m²) e obesidade grave (a partir de 40 Kg/m²). As informações de peso e altura foram coletadas conforme relato do paciente ou, como segunda opção, do prontuário, conforme registro do serviço de nutrição da instituição. Não se obteve tal informação de todos os pacientes da amostra.

ANÁLISE E TRATAMENTO DOS DADOS

A análise dos dados foi realizada pelo programa Statistical Package for Social Sciences for Windows versão 25, utilizando-se estatística descritiva (frequência, percentual, média e desvio padrão) e inferencial (Razão de Prevalência com intervalo de confiança de 95%) por meio de análise de Regressão de Poisson com variância robusta (bi e multivariada). Realizaram-se dois modelos de regressão multivariada: o primeiro incluindo todas as variáveis que apresentaram relação significativa (p<0,05) com a ocorrência de LF na análise bivariada e o segundo modelo excluiu a variável idade. Não foi incluída a variável pele friável no modelo multivariado, na medida em que é, sabidamente, relacionada com LF. Foram considerados estatisticamente significativos os valores com p bicaudal <0,05.

ASPECTOS ÉTICOS

A pesquisa foi aprovada por Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Luterana do Brasil, sob o Parecer 2.306.692/2017, em conformidade com a Resolução nº. 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde, sobre pesquisas com seres humanos. A participação no estudo envolveu riscos mínimos ao paciente, visto que não houve intervenções, mas somente entrevista e exame físico, sendo estes compreendidos como desconforto pelo tempo e pela manipulação dos sujeitos. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

RESULTADOS

A amostra de 148 sujeitos caracteriza-se por discreta predominância de indivíduos do sexo feminino (n=76;51,3%), com média de idade de 60,1±19 anos, sem companheiro (n=76; 51,3%) e de cor branca (n=120; 81,0%), seguida de parda (n=18; 12,2%) e negra (n=10; 6,8%).

A prevalência de LF foi de 12,2% (n=18). Não se identificaram LF em pacientes internados na UTI (p=0,128). Quanto ao número de LF, dez pessoas (55,6%) possuíam uma lesão, cinco estavam com duas e três pessoas com três, representando média de 1,6±0,7 lesões por paciente, de um total de 29 LF. Os locais de ocorrência e a classificação das LF estão descritos na Tabela 1.

Tabela 1
Características relacionadas às Lesões por Fricção - Região Metropolitana de Porto Alegre, RS, Brasil, 2017.

Variáveis	n=29
Local e classificação da Lesão por Fricção	n(%)
Cabeça 1a	1(3,4)
Braço Esquerdo 1a	2(7,0)
Braço Esquerdo 3	1(3,4)
Antebraço Direito 1a	6(20,7)
Antebraço Direito 1b	2(7,0)
Antebraço Direito 3	1(3,4)
Antebraço Esquerdo 1a	6(20,7)
Antebraço Esquerdo 3	2(7,0)
Mão Direita 1a	1(3,4)
Mão Esquerda 1b	2(7,0)
Coxa Direita 2b	1(3,4)
Coxa Esquerda 3	1(3,4)
Perna Direita 1b	1(3,4)
Perna Esquerda 1a	1(3,4)
Perna Esquerda 1b	1(3,4)

Entre os diagnósticos médicos, predominaram as doenças do aparelho respiratório (18,5%), digestivo (14,3%), circulatório (14,3%), geniturinário (10,9%), lesões, envenenamentos e outras causas externas (9,2%) e doenças endócrinas, nutricionais e metabólicas (5,9%). No estudo, não houve relação estatisticamente significativa entre a prevalência de LF conforme o grupo de doenças.

Prevaleceram pacientes com peso alterado (66,7%), distribuídos conforme IMC: magreza (7,7%), sobrepeso (33,3%), obesidade (22,3%) e obesidade grave (3,4%). O IMC normal foi encontrado em 33,3% dos pacientes. A maioria alimentava-se via oral (78,4%), ao passo que 32 (21,6%) com cateter enteral. A ventilação ocorria com uso de alguma terapia de oxigênio em 42 indivíduos (28,4%). Os sujeitos com alguma dependência representaram 66,2% (n=98), enquanto 31,8% (n=47) eram totalmente independentes e 33,1% (n=49) possuíam total dependência.

Encontrou-se a seguinte frequência de uso de medicamentos, conforme os cinco grupos farmacológicos mais utilizados: 87 (58,8%) antimicrobiano, 63 (42,6%) antiulceroso, 56 (37,8%) anticoagulante, 48 (32,4%) anti-hipertensivo e 38 (25,7%) analgésico/antitérmico.

A maioria dos indivíduos (91,2%) utilizava algum dispositivo endovenoso, sendo 20 (14,8%) com cateter central e 115 (85,2%) com cateter periférico curto. Além disso, 134 (90,5%) possuíam alguma fita adesiva junto à pele e 25 (16,9%) estavam com contenção mecânica nos membros. A pele friável foi identificada em 52 (35,1%) dos pacientes.

Houve maior frequência (79,3%) de LF nos membros superiores (23 lesões), seguida de cinco nos membros inferiores (17,2%). Somente uma lesão não ocorreu nos membros. Quanto à categorização, 17 (58,6%) eram lesões 1a, seis 1b (20,7%), cinco do tipo 3 (17,3%) e uma 2b (3,4%).

Conforme Tabela 2, foi estatisticamente maior a frequência de LF nos pacientes idosos, com alimentação por cateter enteral, com pele friável e naqueles com total dependência (escore zero) para ABVDs.

Tabela 2
Distribuição das Lesões por Fricção e Razão de Prevalência conforme variáveis preditoras na amostra - Região Metropolitana de Porto Alegre, RS, Brasil, 2017.

Variáveis	Com LF	Sem LF	RP	IC	p
	n(%)	n(%)
Sexo
Feminino	11(14,5)	65(85,5)	1,00
Masculino	7(9,7)	65(90,3)	0,672	0,27-1,63	0,381
Idade
Até 59 anos	3(4,7)	61(95,3)	1,00
60 anos ou mais	15(17,9)	69(82,1)	3,81	1,15-12,60	0,028
Cor da pele
Branca	15(12,5)	105(87,5)	1,00
Negra/parda	3(10,7)	25(89,3)	0,85	0,26-2,76	0,796
Pele friável
Não	4(4,2)	92(95,8)	1,00
Sim	14(26,9)	38(73,1)	6,46	2,24-18,62	0,001
Índice de massa corporal*
Normal	6(15,4)	33(84,6)	1,00
Alterado	9(11,5)	69(88,5)	0,75	0,28-1,95	0,556
Alimentação
Via oral	10(8,6)	106(91,4)	1,00
Cateter enteral	8(25,0)	24(75,0)	2,90	1,24-6,74	0,013
Oxigenação
Ventilando em ar ambiente	11(10,4)	95(89,6)	1,00
Terapia com oxigênio	7(16,7)	35(83,3)	1,60	0,66-3,86	0,290
Cateter venoso
Não	2(15,4)	11(84,6)	1,00
Sim	16(11,9)	119(88,1)	1,29	0,33-5,03	0,706
Fita adesiva
Não	1(7,1)	13(92,9)	1,00
Sim	17(12,7)	117(87,3)	0,56	0,81-3,91	0,562
Contenção mecânica
Não	14(11,4)	109(88,6)	1,00
Sim	4(16,0)	21(84,0)	0,71	0,25-1,98	0,515
Índice de Katz
Outro	8(8,1)	91(91,9)	1,00
Total dependência	10(20,4)	39(79,6)	2,52	1,06-5,99	0,036

• LF: Lesão por Fricção. RP: Razão de Prevalência. IC: Intervalo de confiança.
• ^*
  n=117

A Tabela 3 apresenta os grupos farmacológicos considerados fatores relacionados às LF. Houve maior ocorrência de LF naqueles em uso de anti-hipertensivo, micronutriente, diurético, antidepressivo e antifúngico.

Tabela 3
Distribuição das Lesões por Fricção e Razão de Prevalência conforme uso de medicamentos - Região Metropolitana de Porto Alegre, RS, Brasil, 2017.

Variáveis	Com LF	Sem LF	RP	IC-95%	p
	n(%)	n(%)
Anti-hipertensivo
Não	8(8,0)	92(92,0)	1,00
Sim	10(20,8)	38(79,2)	2,60	1,09-6,17	0,030
Micronutriente
Não	14(10,4)	120(89,6)	1,00
Sim	4(28,6)	10(71,4)	2,73	1,04-7,18	0,041
Diurético
Não	10(8,7)	105(91,3)	1,00
Sim	8(24,2)	25(75,8)	2,78	1,19-6,49	0,017
Antidepressivo
Não	12(9,2)	119(90,8)	1,00
Sim	6(35,3)	11(64,7)	3,85	1,66-8,92	0,002
Antifúngico
Não	16(11,2)	127(88,8)	1,00
Sim	2(40,0)	3(60,0)	3,57	1,11-11,50	0,033
Corticoide
Não	14(11,5)	108(88,5)	1,00
Sim	4(15,4)	22(84,6)	1,34	0,48-3,74	0,576
Antimicrobiano
Não	5(8,2)	56(91,8)	1,00
Sim	13(14,9)	74(85,1)	1,82	0,68-4,84	0,229

• LF: Lesão por Fricção. RP: Razão de Prevalência. IC: Intervalo de confiança.

Não se verificou diferença estatisticamente significativa (p>0,05) quanto à frequência de LF e aos demais grupos farmacológicos. A Tabela 4 apresenta os resultados das análises de Regressão de Poisson Multivariada das variáveis preditoras com a prevalência de LF. A variável idade foi incluída no primeiro e excluída no segundo modelo de análise.

Tabela 4
Análise multivariada das variáveis preditoras e do uso de medicamentos com a ocorrência de Lesões por Fricção - Região Metropolitana de Porto Alegre, RS, Brasil, 2017.

Variáveis	RP	IC-95%	p	RP	IC-95%	p
Idade	2,14	0,60-7,68	0,240
Anti-hipertensivo	2,41	0,99-5,87	0,053	2,42	1,01-5,77	0,046
Diurético	2,08	0,78-5,53	0,142	2,39	0,93-6,17	0,070
Antidepressivo	2,55	1,06-6,13	0,036	2,72	1,17-6,33	0,019
Micronutriente	5,25	1,69-16,32	0,004	4,93	1,64-14,80	0,004
Antifúngico	1,40	0,48-4,11	0,535	1,37	0,49-3,85	0,541
Uso cateter enteral	1,34	0,40-4,42	0,627	1,44	0,39-5,21	0,579
Índice de KATZ	1,59	0,50-4,98	0,426	1,83	0,48-6,93	0,369

• RP: Razão de Prevalência. IC: Intervalo de confiança.

No primeiro modelo, apenas antidepressivos e micronutrientes estiveram associados às LF, aumentando o risco em 2,55 e 5,25 vezes, respectivamente. No segundo modelo, sem a variável idade, anti-hipertensivo (RP 2,42), antidepressivo (RP 2,72) e micronutrientes (RP 4,93) mantiveram relação com ocorrência de LF.

DISCUSSÃO

A prevalência de LF foi de 12,2% maior que resultados de estudos conduzidos em Singapura (6,2%)⁽¹⁴⁾, Japão (3,9%)⁽²⁾, Austrália (8% e 11%)^(6,15-16) e Brasil (3,3%)⁽¹⁷⁾, e menor que estudo do Canadá (22%)⁽⁸⁾. Essas diferenças podem estar relacionadas às diversidades metodológicas de amostra das diferentes pesquisas, especialmente relacionadas à idade e ao cenário do estudo. Enquanto alguns investigaram somente idosos^(2,8), outros incluem, também, pacientes neonatos/pediátricos⁽¹⁵⁾ e adultos^(14,17), em contextos como instituições de longa permanência^(2,8), cuidados oncológicos⁽¹⁷⁾ ou em tratamento intensivo⁽¹⁴⁾. Na presente pesquisa, consideraram-se tanto pacientes adultos quanto idosos hospitalizados em unidades de internação clínica/cirúrgica ou de terapia intensiva.

Não foram encontradas LF nos 15 pacientes da UTI, o que pode estar relacionado ao tamanho da amostra ou também ao maior cuidado que esses pacientes recebem por estarem em situação de saúde mais grave. Nas UTIs, ocorre um melhor dimensionamento quantitativo do trabalho de enfermagem, o que proporciona cuidado mais constante, podendo favorecer o não desenvolvimento de LF. Nas unidades de internação, os profissionais de enfermagem possuem mais pacientes sob o seu cuidado, o que é fator de risco, pois o nível de cuidado de enfermagem afeta diretamente a ocorrência de lesões na pele⁽¹⁸⁾.

Os idosos tiveram maior frequência de LF (17,9% versus 4,7%), sendo que tal característica está relacionada ao próprio processo de envelhecimento. Atrelada a isso, a ocorrência também foi maior naqueles classificados com pele friável (26,9% versus 4,3%). Outros estudos também identificam a idade avançada como fator de risco para LF^(6,15), ao passo que estudo brasileiro com pacientes hospitalizados com câncer não encontrou relação⁽¹⁷⁾.

A pele dos idosos é mais predisposta a LF em virtude das diversas alterações fisiológicas que ocorrem durante o processo de envelhecimento, como diminuição de nocicepção e sensibilidade tátil, capacidade de sintetizar colágeno, vascularização, resposta inflamatória e espessuras da derme e do tecido subcutâneo^(2,19-20). A boa organização dos componentes biológicos, estruturais e funcionais da pele possibilita ao organismo mantê-la protegida. Em idosos, a diminuição da camada lipídica torna o mecanismo de proteção menos eficiente. Além da camada de gordura, a produção das glândulas sebáceas e sudoríparas formam o manto hidrolipídico, que torna a pele mais resistente. Tal proteção é facilmente afetada com uso de produtos como solventes e repetidas lavagens com enxágue insuficiente, alterando o pH e diminuindo a camada da pele⁽²¹⁾, como ocorre nos hospitais.

A alimentação por cateter enteral esteve relacionada à maior prevalência de LF (25% versus 8,6%), divergente de estudo com idosos japoneses⁽¹⁸⁾. Não houve relação entre as lesões conforme o IMC, o que é uma realidade em estudos internacionais^(17-18).

Além disso, houve diferença estatisticamente significativa quanto à prevalência de LF nos pacientes em uso de micronutrientes, tanto na análise bivariada como na multivariada (risco 4,93 vezes maior). As evidências de relação entre má nutrição e Lesões por Pressão são identificadas na literatura científica, mas tal clareza de relação não ocorre com as LF. Todavia, recomendações de consensos internacionais apontam a necessidade de otimizar a nutrição e hidratação sistêmica para a prevenção de LF^(1,6).

Com relação à frequência/distribuição das lesões, a média foi de 1,6±0,7 LF por sujeito com lesão, sendo que 10 (55,5%) possuíam uma lesão e o número máximo foi de três LF. A predominância de uma lesão também é evidenciada em outros achados, como em estudo com 2197 adultos hospitalizados na Austrália⁽⁶⁾ (61,5% com uma LF). Em idosos residentes em intuição de longa permanência no Japão, nenhum paciente possuía múltiplas LF⁽¹⁸⁾. Salienta-se que a maioria dos estudos não contabiliza a frequência de LF por pessoa, o que dificulta a discussão dos dados. A predominância de uma lesão pode indicar que os cuidados com a pele aumentam especialmente após o surgimento da primeira LF, o que diminui a ocorrência de outras.

A predominância das LF nos membros superiores (23) e inferiores (5) é associada, na literatura, à movimentação dos membros, uso de dispositivos intravasculares ou necessidade de auxílio para mobilização, transferência ou locomoção⁽²²⁾, situações comuns em unidades de internação. A ocorrência em membros superiores é predominante na literatura internacional: 43% em pacientes em cuidado agudo de Singapura⁽¹⁴⁾, 49,4% em pacientes australianos⁽⁶⁾, 50% em idosos de instituições de longa permanência no Japão⁽²⁾ e 60,4% em idosos australianos hospitalizados⁽²³⁾.

A maior prevalência de LF em pacientes totalmente dependentes tem sido explicada pelo estado clínico e cognitivo do paciente, o que culmina com a necessidade de ajuda para as situações de transferências, mobilização, posicionamento no leito e auxílio para as atividades básicas, como já evidenciado na literatura internacional^(1,3,17,22). No presente estudo, foi encontrada relação entre grau de dependência e LF somente na análise bivariada, o que não se confirmou no modelo de regressão.

Houve maior frequência de LF categoria 1a (17 lesões), enquanto cinco eram categoria 3. Esses dados divergem dos estudos realizados na Austrália⁽⁶⁾, em Singapura⁽¹⁴⁾ e no Brasil⁽¹⁷⁾, em que predominaram as lesões categoria 3 (38,8%; 43%, e 55,5%, respectivamente). Em idosos de casas de longa permanência no Japão⁽¹⁸⁾, houve maior incidência de LF categoria 1b (57,1%).

O uso de adesivos e dispositivos médicos não tem demonstrado relação com a ocorrência de LF⁽¹⁷⁾, embora alguns autores a associem à remoção de fitas e curativos adesivos^(4,9). Tais conflitos de resultados podem estar relacionados ao tipo e à qualidade dos adesivos disponíveis em cada cenário, bem como aos produtos utilizados para sua remoção.

Encontrou-se relação, na análise bivariada, entre o uso de anti-hipertensivos, micronutrientes, diuréticos, antifúngicos e antidepressivos com maior prevalência de LF, não havendo associação com o uso de corticoides e anticoagulantes. Na literatura internacional, não está bem definida a relação entre medicamentos e LF: enquanto alguns estudos têm assinalado a polifarmácia e uso crônico de corticoides^(1,18) como fatores associados às LF, outras pesquisas não encontraram essa relação^(2,21), necessitando, portanto, de maiores evidências.

No modelo multivariado, anti-hipertensivos, antidepressivos e micronutrientes mantiveram relação significativa com a ocorrência de LF, aumentando em 2,42, 2,72 e 4,93, respectivamente. No modelo em que se incluiu a variável idade, não se encontrou relação com a ocorrência de LF, apontando que estas podem ocorrer em qualquer idade e não são exclusivas de idosos. A relação com o uso de antidepressivos divergiu dos achados de estudos sobre LF, os quais são usualmente associados à utilização crônica de corticoides (pelo potencial efeito colateral na inibição da síntese de colágeno)^(1,18), anticoagulantes (pela maior predisposição para equimose e púrpura senil)⁽²⁴⁾ ou polifarmácia⁽²⁵⁾. Estudos com maior tamanho amostral e específico sobre medicamentos e LF são prementes para esclarecer sua relação.

Salienta-se, ainda, que o estudo possui limitações quanto à amostragem de apenas um hospital e àquelas relacionadas à coleta de algumas variáveis em prontuário, podendo diminuir a acurácia da medida, especialmente no que se refere à análise nutricional (peso, altura e IMC), que necessita de avaliação objetiva e precisa.

CONCLUSÃO

O estudo identificou prevalência de 12,2% de LF em adultos e idosos hospitalizados, a qual pode ser considerada alta em comparação à de outras investigações sobre o tema. Evidencia, portanto, que as LF estão presentes no cenário de atuação do enfermeiro e que medidas precisam ser adotadas para sua prevenção, identificação e tratamento, embora seu reconhecimento como evento adverso seja atual e pouco pesquisado no Brasil.

Nesse sentido, é essencial fornecer cuidados diários a indivíduos com pele frágil, identificando pacientes com risco para LF, mesmo que não haja instrumento específico para isso. A criação e a implementação de protocolos assistenciais para prevenção e tratamento de LF podem auxiliar para prevenir e minimizar danos aos pacientes com risco. É preciso, também, uma maior ênfase sobre LF na formação do enfermeiro, tanto na graduação quanto na educação permanente continuada das instituições de saúde, a fim de capacitar a nova e atual geração de enfermeiros que cuidará da população idosa.

Apesar das limitações, o estudo avança para compreender o estado da arte sobre LF no contexto do atendimento público de saúde no Brasil, que ainda carece de dados epidemiológicos. Salienta-se a necessidade de ampliar as pesquisas sobre as LF no contexto brasileiro, especialmente estudos longitudinais e com foco na polifarmácia, tendo em vista que tais lesões estão presentes especialmente nos idosos, população que mais cresce no cenário mundial. Também há necessidade de estudos para elaboração de instrumentos para avaliação de risco, bem como de intervenções para a prevenção e manejo de LF.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  16 Abr 2021
• Data do Fascículo
  2021

Histórico

• Recebido
  20 Ago 2019
• Aceito
  22 Ago 2020