Ensino do Iramuteq para uso em pesquisas qualitativas segundo vídeos do YouTube: estudo exploratório-descritivo

RESUMO

Objetivos:

identificar os conteúdos e características dos vídeos postados na rede social YouTube que tratam do uso do software Iramuteq como ferramenta para auxiliar as pesquisas qualitativas e discutir a contribuição desta rede social para a difusão do conhecimento, especialmente no contexto da pandemia de COVID-19.

Método:

estudo exploratório-descritivo de abordagem qualitativa, realizado com vídeos do YouTube, coletados em junho de 2021 e submetidos à análise temática.

Resultados:

foram identificados 43 vídeos sobre a temática pesquisada, sendo a maioria (69,76%) publicado no período de 2020–2021. Quanto ao conteúdo, identificaram-se cinco categorias.

Conclusão:

os vídeos explanam sobre a instalação do Iramuteq, o preparo do corpus textual, os erros identificados por usuários do software e métodos para corrigi-los, as análises lexicais desenvolvidas pelo programa e como utilizá-lo. O conteúdo é apresentado de forma teórica e prática por meio da apresentação da interface do software. Assim, observa-se a contribuição do YouTube para o desenvolvimento do ensino e difusão do conhecimento, tanto por constituir-se como uma fonte para pesquisa como também por suscitar diálogos entre pesquisadores, especialmente em um contexto de pandemia.

DESCRITORES
Mídias Sociais; Informação; COVID-19; Pesquisa Qualitativa; Ensino; Software

Abstract

Objectives:

to identify the contents and characteristics of videos posted on YouTube that deal with Iramuteq software use as a tool to assist qualitative research and discuss the contribution of this social network to dissemination of knowledge, especially in the context of the COVID-19 pandemic.

Method:

this is an exploratory-descriptive study with a qualitative approach, carried out with YouTube videos, collected in June 2021 and subjected to thematic analysis.

Results:

a total of 43 videos on the researched topic were identified, with the majority (69.76%) published from 2020–2021. As for content, five categories were identified.

Conclusion:

the videos explain about Iramuteq installation, the textual corpus preparation, the errors identified by users and methods to correct them, the lexical analysis developed by the program and how to use it. The content is presented in a theoretical and practical way through the software interface presentation. Thus, YouTube’s contribution to developing teaching and disseminating knowledge is observed, both because it constitutes itself as a source for research and because it fosters dialogues between researchers, especially in a pandemic context.

DESCRIPTORS
Social Media; Information; COVID-19; Qualitative Research; Teaching; Software

RESUMEN

Objetivos:

identificar los contenidos y características de los videos publicados en la red social YouTube que abordan el uso del software Iramuteq como herramienta para ayudar a la investigación cualitativa y discutir la contribución de esta red social a la difusión del conocimiento, especialmente en el contexto de la pandemia de COVID-19.

Método:

estudio exploratorio-descriptivo con abordaje cualitativo, realizado con videos de YouTube, recolectados en junio de 2021 y sometidos a análisis temático.

Resultados:

se identificaron 43 videos sobre el tema investigado, la mayoría (69,76%) publicados en el período 2020-2021. En cuanto al contenido, se identificaron cinco categorías.

Conclusión:

los videos explican sobre la instalación de Iramuteq, la preparación del corpus textual, los errores identificados por los usuarios del software y los métodos para corregirlos, el análisis léxico desarrollado por el programa y cómo utilizarlo. El contenido se presenta de forma teórica y práctica a través de la presentación de la interfaz del software. Así, se observa la contribución de YouTube al desarrollo de la docencia y la difusión del conocimiento, tanto porque se constituye como fuente de investigación como porque provoca diálogos entre investigadores, especialmente en un contexto pandémico.

DESCRIPTORES
Medios de Comunicación Sociales; Información; COVID-19; Investigación Cualitativa; Enseñando; Programas Informático

INTRODUÇÃO

No campo da ciência, é comum a dicotomia entre pesquisas quantitativas e qualitativas, bem como a valorização dos estudos quantitativos em detrimento das investigações científicas de caráter qualitativo, evidenciando, inclusive, uma perspectiva destacada de racionalidade para as abordagens metodológicas quantitativas. Todavia, é preciso considerar que, de acordo com o fenômeno a ser investigado, é a pesquisa qualitativa que poderá proporcionar o aprofundamento pertinente da realidade e da essência do foco do estudo, resultando na produção de um conhecimento crítico, emancipador e comprometido com a transformação social(¹). Outrossim, a aliança entre o qualitativo e o quantitativo é uma articulação que pode ser apropriada, favorecendo em muitos casos, a melhor compreensão do real, representando assim, ganhos à pesquisa e à produção científica.

Considerando-se os avanços tecnológicos, bem como a incorporação de ferramentas que auxiliam o desenvolvimento das pesquisas, observa-se desde a década de 1980 o uso crescente de programas computacionais conhecidos como Computer Aided Qualitative Dada Analysis Software (CAQDAS)(²), aplicados aos estudos qualitativos. São inúmeros os softwares disponíveis na atualidade, e os três mais utilizados em pesquisas qualitativas, no âmbito da saúde, requerem licença para uso(³). Tal fato pode dificultar o acesso dos pesquisadores a esses programas, especialmente no Brasil, onde observam-se constantes cortes financeiros destinados à pesquisa.

Frente a essa questão, os softwares de acesso livre e gratuito ganham notoriedade. É o caso do Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Texts es de Questionnaires (Iramuteq), desenvolvido pelo pesquisador francês Pierre Ratinaud em 2009, e que vem sendo crescentemente utilizado em pesquisas qualitativas no Brasil e em âmbito internacional, uma vez que conta com dicionários completos em várias línguas(⁴).

O Iramuteq é desenvolvido na linguagem Python e utiliza funcionalidades providas pelo software estatístico R, o qual também é de acesso livre e gratuito(³). No contexto brasileiro, as pesquisas com Iramuteq tiveram início em 2013, mas uma scoping review realizada a partir do Banco de Teses e Dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) identificou que o uso do referido software nas pesquisas qualitativas, produzidas no âmbito dos programas de pós-graduação da área da saúde, apresenta-se com algumas inconsistências como: utilizá-lo como técnica de análise de dados; uso em pequeno volume de texto e uso da Classificação Hierárquica Descendente (CHD), mesmo diante de um aproveitamento insatisfatório, ou seja, menor que 75% do material analisado(³).

Em função dessas inconsistências, é essencial conhecer em profundidade o Iramuteq, para que se alcance o rigor científico desejado à pesquisa e que as funcionalidades do software permitam atingir sua completa eficiência no gerenciamento e na recuperação de dados qualitativos(²).

Corroborando o exposto, uma outra questão que merece destaque foi apontada por um estudo de revisão, no qual foi identificado que há subutilização dos recursos técnicos do Iramuteq, o que limita a compreensão mais ampla do fenômeno estudado(⁵). Nesse sentido, cabe ponderar que, apesar da interface do Iramuteq ser simples de manejar, o programa propicia diferentes possibilidades de análise textual e de matrizes, e, em cada uma dessas, há inúmeras funcionalidades, parâmetros e resultados a serem exibidos, de modo que esses ainda podem e precisam ser explorados nas pesquisas. É o caso, principalmente, das matrizes, ou seja, dos materiais textuais organizados em planilhas e que compõem bancos de dados a serem explorados, tais como os resultados de testes de evocação livre de palavras(⁶).

Nesse sentido, é fundamental instrumentalizar os pesquisadores sobre a utilização do software, o que pode ser feito mediante capacitações presenciais e/ou remotas, por exemplo, por meio de vídeos tutoriais, aulas síncronas e assíncronas em plataformas digitais, entre outros canais. Destaca-se, ainda, que, as análises lexicais utilizando o Iramuteq, além de agilizar o tratamento dos dados, especialmente diante de um grande volume textual, podem ampliar o rigor metodológico da pesquisa, pois, ao usar os seus recursos, os pesquisadores obtêm informações com bases estatísticas para analisar o significado dos termos/palavras no corpus. Esse processo permite elaborar a análise qualitativa dos dados com maior profundidade, visto que confere transparência quanto ao processo de inferência e análise do material processado e aumentam as possibilidades de aprofundamento e confiabilidade dos resultados(⁵).

Ademais, ressalta-se que o uso do programa não tem por intenção afastar e/ou substituir o papel do pesquisador na análise dos dados. Pelo contrário, o pesquisador assume papel central, responsabilizando-se tanto pela preparação do corpus textual a ser analisado quanto também conduzindo as análises dos dados a partir dos resultados produzidos pelo software(²,³). Nesse sentido, convém destacar que o preparo do corpus textual é etapa fundamental, afinal, refere-se ao momento em que, após unificar todo conteúdo textual a ser analisado em um arquivo único, o pesquisador deve fazer uma crítica e minuciosa verificação do texto. Procede-se evitando erros ortográficos, padronizando siglas, uniformizando o uso de sinônimos, retirando o uso de vícios de linguagem, entre outros aspectos, que tornarão o material mais robusto para análise(⁶). Todavia, nesse processo, ressalta-se que não se deve interferir no sentido do conteúdo produzido.

Para além do exposto, observou-se empiricamente que o número de vídeos publicados online sobre o Iramuteq aumentou nos últimos anos (2020–2021). Tal fato pode ser atribuído ao contexto da pandemia de COVID-19, porque, ao invés de treinamentos e cursos presenciais nos grupos de pesquisa e nas universidades, esses cenários foram substituídos por salas e plataformas virtuais. Ademais, pelo fato de que, nesta crise sanitária, recomenda-se o distanciamento social, teve-se como tendência dar mais visibilidade às mídias sociais e às de informação, ressaltando a importância de introduzir novas tecnologias ao processo ensino-aprendizagem(⁷).

Corroborando este pensamento, pode-se considerar que, ao explorar as potencialidades da internet (sistema global de redes de computadores interligados) e suas mídias sociais de comunicação para socializar o conhecimento, promove-se uma revolução no modelo de produção, distribuição e atualização do saber e da ciência, consagrando esses dispositivos como importantes estratégias para disseminação da informação na sociedade e no âmbito acadêmico.

Diante do contexto, definiu-se como objetivos deste estudo identificar os conteúdos e características dos vídeos postados na rede social YouTube que tratam do uso do Iramuteq como ferramenta para auxiliar as pesquisas qualitativas e discutir as contribuições das mídias sociais como estratégias de difusão do conhecimento, especialmente no contexto da pandemia de COVID-19.

MÉTODO

Desenho do Estudo

Estudo descritivo-exploratório de abordagem qualitativa, realizado na rede social YouTube (www.youtube.com), considerando os critérios da ferramenta COREQ.

O YouTube foi escolhido, por ser uma das plataformas de redes sociais mais importante para o compartilhamento de vídeos, com acesso livre a usuários da internet(⁸). Ou seja, a proposta da plataforma escolhida para coleta dos dados vai ao encontro daquela adotada pelo idealizador do Iramuteq, uma vez que, além da gratuidade em relação ao acesso do conteúdo, permite, a partir da interação/participação da comunidade, ampliar a sua divulgação/utilização e aperfeiçoar o seu desenvolvimento a partir dos comentários dos usuários apontados na referida rede social(⁹).

Critérios de Seleção dos Vídeos e Coleta de Dados

Para a identificação dos vídeos e o acesso aos conteúdos, definiu-se um protocolo de pesquisa com cinco etapas: (i) demarcação do tema, do objetivo e da questão norteadora; (ii) estabelecimento da estratégia de busca (captação dos vídeos); (iii) análise dos vídeos; (iv) extração dos dados; e (v) apresentação e divulgação dos resultados primordiais.

A coleta dos dados ocorreu nos dias 08 e 09 de junho de 2021, a partir da combinação das palavras-chave (tags) “iramuteq” e “pesquisa qualitativa”. Esses termos foram digitados na caixa de pesquisa disponível pela própria plataforma. A seguir, atribuíram-se os seguintes filtros disponíveis no YouTube para selecionar os vídeos: tipo de publicação (vídeo) e apresentação dos resultados (classificados por data de envio). Vale ressaltar que não houve filtro com recorte temporal, na expectativa de identificar o maior quantitativo de vídeos disponíveis.

Os critérios de inclusão dos vídeos foram abordar conteúdos referentes ao Iramuteq e a pesquisa qualitativa e estar em áudio ou legenda nos idiomas português, inglês ou espanhol, independentemente do tempo de duração e do público-alvo (acadêmicos de graduação ou pós-graduação, da área da saúde ou não). Os critérios de exclusão foram vídeos com problemas no áudio, dificultando a compreensão dos conteúdos ou sem legendas, possuir conteúdo duplicado, aqueles com teor meramente comercial, ou seja, com o intuito de divulgar uma marca e/ou vender um produto, que tratassem sobre outro tipo de pesquisa que não a qualitativa (e.g., bibliometria) e apresentassem conteúdo duvidoso ou fake news.

Para verificação deste último critério, consideraram-se as recomendações da British Broadcasting Corporation(¹⁰). Ou seja, os conteúdos dos vídeos foram submetidos à verificação de veracidade, que adotou o sistema de pontuação de 0, 1 ou 2 para cada critério (canal, conteúdo e comentários), sendo 0 para não confiável/prejudicial, 1 para duvidoso/questionável e 2 para confiável/parece bom. Em síntese, após a soma da pontuação, os vídeos foram classificados em não confiável (0 a 2 pontos), duvidoso (3 a 5 pontos) e confiável (6 pontos). Esse critério, que trata sobre a qualidade dos vídeos, seguiu os mesmos fundamentos adotados em investigações similares, visto que não há, até o momento, instrumento validado e específico para tal avaliação(¹¹,¹²).

Ademais, cabe considerar que, para avaliar a qualidade das informações apresentadas pelos vídeos no que diz respeito à fidedignidade da utilização do software, os pesquisadores as confrontaram com as orientações do tutorial do Iramuteq, disponível na página “Iramuteq.org”(⁶).

Inicialmente, foram encontrados 91 vídeos a partir da leitura dos títulos, e, com a visualização avançada do material e verificação da veracidade, resultaram em 43 vídeos no corpus de estudo. Essa etapa de coleta e organização dos dados foi realizada por dois autores. A síntese do processo metodológico de constituição do corpus está ilustrada na Figura 1.

Figura 1.
Processo de constituição do corpus. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2021.

Na sequência, foram selecionados os endereços eletrônicos dos vídeos identificados e dispostos em uma planilha do Microsoft Excel 2016. Assim, os pesquisadores poderiam ter acesso irrestrito ao material e fazer consultas, sempre que necessário.

Posteriormente, cada vídeo foi analisado individualmente, procedendo-se à identificação de temas, síntese de seu conteúdo e categorização. Os temas e as categorias foram, inicialmente, elaborados por dois pesquisadores do estudo em tela. Salienta-se que, em caso de dúvidas ou divergências em relação ao processo de elaboração dos temas e categorização do material, um terceiro componente efetuava outra verificação do processo, a fim de elucidar as dúvidas e possibilitar a coerência metodológica no referido procedimento.

Análise dos Dados

Os dados foram analisados de acordo com os indicadores presentes em uma planilha do Microsoft Excel 2016. Tal planilha foi desenvolvida pelos autores deste manuscrito, com o intuito de facilitar a tabulação dos dados e foi adaptada de instrumentos previamente validados e utilizados em inquéritos de perfil similar na intenção de estandardizar a extração das informações(¹¹–¹⁴). Assim, identificou-se: (i) data da publicação e número total de visualizações (descritos no próprio vídeo); (ii) tempo de duração do vídeo; (iii) autor responsável pela publicação (pessoa física, jurídica ou outro); (iv) abordagem de conteúdo (se o conteúdo do Iramuteq se apresenta na forma teórica ou prática, se descreve todas as possibilidades de análise ou apenas uma, vantagens e desvantagens).

Aspectos Éticos

Por não envolver contato de qualquer natureza com os personagens dos vídeos ou os proprietários de canal, e considerando que os dados utilizados são provenientes de sítio eletrônico de acesso aberto e livre (domínio público), não houve necessidade de submeter esta pesquisa ao comitê de ética em pesquisa. Todavia, destaca-se que foram respeitadas as diretrizes da plataforma YouTube(¹⁵).

RESULTADOS

Os 43 vídeos selecionados foram produzidos e publicados em canal do YouTube por pessoas físicas (05 professores, 02 acadêmicos de graduação e 05 pós-graduação), empresas de consultorias acadêmicas (08 vídeos) e, principalmente, por grupos, núcleos e laboratórios de pesquisa vinculados à Instituições de Ensino Superior (23 vídeos). A Figura 2 permite observar o quantitativo de vídeos publicados por período/ano.

Figura 2.
Iramuteq e pesquisas qualitativas no YouTube entre o período de 2016 e 09/06/2021. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2021.

Nota-se que os vídeos produzidos no período de 2020–2021 (até a data da coleta dos dados – 09/06/2021) já representavam 69,76% do material produzido, superando de forma expressiva o quantitativo de vídeos produzidos em anos anteriores.

Os vídeos tiveram seus conteúdos caracterizados a partir de temas comuns e organizados em cinco categorias: Instalação do Iramuteq; Preparo do corpus textual; Erros do Iramuteq; Análises do Iramuteq; Iramuteq nas pesquisas qualitativas – vídeos de curta, média e longa duração.

Consideraram-se vídeos de curta (aqueles com no máximo 15 minutos), média (material com mais de 15 minutos e com até 60 minutos, ou seja, o tempo médio de uma hora/aula) e longa duração (gravações com mais de uma hora). Optou-se por essa subdivisão somente nesta categoria, em função do volume de vídeos que a compõe (n = 22), especialmente, pelo fato da maioria deles serem de longa duração (n = 10), diferente do que ocorreu em todas as demais categorias.

A quantidade de visualizações (views) dos vídeos é uma métrica que estabelece relação com o interesse dos usuários do YouTube em relação à temática apresentada. A Tabela 1 aponta o número de views dos vídeos (até a data da coleta dos dados) por categoria.

Tabela 1.
Views dos vídeos por categoria (n = 43) – Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2021.

Categorias	Views	Total de vídeos
Categoria 1: Instalação do Iramuteq	21.353	7
Categoria 2: Preparo do corpus textual	21.999	2
Categoria 3: Erros do Iramuteq	9.620	2
Categoria 4: Análises do Iramuteq	56.909	10
Categoria 5: Iramuteq nas pesquisas qualitativas	74.342	22
Subcategoria 5.1: Vídeos de curta duração	15.520	8
Subcategoria 5.2: Vídeos de média duração	51.452	4
Subcategoria 5.3: Vídeos de longa duração	7.370	10
Todas as categorias	184.223	43

Instalação do Iramuteq (N = 07)

Essa categoria reúne seis vídeos em que os autores explicam o processo de instalação do Iramuteq para o sistema operacional Windows^® e somente um vídeo aborda a instalação no Mac^® (sistema operativo desenvolvido e distribuído pela Apple^®). A maioria dos vídeos é de curta duração (até 15 minutos) e tem por objetivo auxiliar as pessoas interessadas em usar o Iramuteq a instalar adequadamente o programa. Portanto, resgatam instruções que são apresentadas no tutorial do Iramuteq, demonstrando na prática o passo a passo para download e instalação primeiramente do software R e, posteriormente, do Iramuteq.

Os vídeos dessa categoria foram desenvolvidos por diferentes canais e autores, sendo: um acadêmico vinculado a um programa de mestrado de educação profissional tecnológica; uma professora do curso de psicologia; uma monitora de Psicologia Social vinculada a um laboratório de pesquisa de uma universidade federal do sul do país; um grupo de pesquisa sobre Comportamento em Transportes e Novas tecnologias; e um laboratório de pesquisa de psicologia social de uma universidade do nordeste do país. Esse último vídeo mencionado inicia uma série de 09 vídeos que integram um curso de introdução ao Iramuteq e estão publicados no YouTube desde 2017.

Também é preciso destacar que dois vídeos dessa categoria estão publicados em um canal comercial que auxilia acadêmicos quanto ao campo de metodologia científica, disponibilizando vídeos acerca dos desafios de fazer ciência. O referido canal é fruto de um projeto de extensão de uma universidade federal iniciado em 2018 que se transformou em consultoria acadêmica em 2019 e no ano de 2020 passou a oferecer serviços no campo metodológico e cursos via Telegram (serviço de mensagens instantâneas baseado na nuvem e disponível para smartphones ou tablets, computadores e também como aplicação web)(¹⁶).

Preparo do Corpus Textual (N = 02)

Os vídeos nesta categoria enfatizam a preparação do corpus textual para que este possa ser processado pelo Iramuteq. O corpus é o conjunto de textos construído pelo pesquisador e que se pretende analisar(⁶). Portanto, pode ser formado por um conjunto de entrevistas transcritas, publicações de notícias ou reportagens, entre outros elementos textuais, escolhidos pelo pesquisador de acordo com o que se pretende investigar. Ressalta-se que é um arquivo único de texto salvo na modalidade texto.txt, separado por linhas de comando de acordo com as variáveis da pesquisa, conforme estabelecido pelo pesquisador, levando-se em consideração seu objeto de estudo(⁶).

Um dos vídeos é apresentado por uma professora vinculada a um Laboratório de Estudos e Práticas em Psicologia e Saúde, que tem a proposta de articular ensino, pesquisa e extensão na psicologia com interface em saúde e políticas públicas. Apesar de ser um vídeo curto (13 minutos e 23 segundos), é didático e apresenta a diferenciação na nomenclatura usada pelos softwares Alceste e Iramuteq, discorre sobre a quantidade de textos que pode compor o banco de dados e como separar esses textos por meio de linhas de comando ou de metadados. Também informa o número de identificação do material (texto que se segue) e as características (variáveis), que são importantes para o delineamento da pesquisa.

Além disso, o vídeo mostra, por meio de um exemplo prático, como um corpus é preparado, se monotemático ou organizado em subtemas, e a importância de revisar o texto conforme as orientações do tutorial do software, a fim de produzir uma análise com bom aproveitamento.

O outro vídeo desta categoria foi produzido por um acadêmico vinculado a um curso de mestrado de educação profissional e tecnológica. Antes de discorrer sobre o preparo do corpus propriamente dito, o autor do vídeo destaca a relevância de verificar se os pacotes do R estão atualizados, para que não haja falhas/menções de erro durante o processamento das análises.

Diferentemente do vídeo anteriormente citado e que compõe esta categoria, neste material, o corpus é trabalhado na ferramenta bloco de notas, enquanto que, no anterior, era apresentado e manipulado através de um documento do Microsoft Word ^®. Todavia, ao final do preparo do corpus, observa-se que, em ambos os vídeos, os documentos produzidos são salvos no formato UTF-8, o qual é reconhecido pelo Iramuteq. Também há esclarecimento nos dois vídeos sobre o tipo de conteúdo textual que pode ser submetido ao software e à indicação do tutorial do Iramuteq, para que o corpus seja preparado no Libre Office^® ou no Open Office^®, por serem de acesso livre.

Erros do Iramuteq (N = 02)

Os vídeos nesta categoria enfatizam métodos para resolver possíveis erros do Iramuteq. Porquanto, o software utiliza o ambiente estatístico do R, os erros apresentados geralmente estabelecem relação com a desatualização de pacotes de análise do R. Esses, por sua vez, podem ser verificados através do menu preferências, opção “edição” e, finalmente, através do botão “verificar”. Outro aspecto que é ressaltado nos vídeos é a compatibilidade entre as versões destes softwares, no momento de produção dos vídeos. Desse modo, as versões mais recentes, compatíveis e indicadas eram a versão 0.7 alpha 2 do Iramuteq e a versão 3.2.3 do R.

Análises do Iramuteq (N = 10)

Os vídeos que compõem essa categoria, de modo geral, discorrem sobre os vários tipos de análise textual que podem ser produzidas com o auxílio do Iramuteq, e apenas um vídeo trata sobre análise de matriz. Há cinco vídeos que apresentam, exclusivamente, cada uma das análises textuais, a saber: estatísticas textuais, método de Reinert (o qual realiza a CHD), pesquisa por especificidade de grupo/análise fatorial de correspondência (AFC), análise de similitude e nuvem de palavras.

Dois outros vídeos integram um minicurso do Grupo de Pesquisa Qualidade do Cuidado e do Ensino de Saúde de uma universidade federal do Rio Grande do Norte. O minicurso foi ofertado em dois dias, sendo apresentadas, no primeiro encontro virtual, as noções básicas sobre o Iramuteq, e o segundo encontro com considerações/abordagens práticas em relação ao uso do software. Vale mencionar que cada encontro teve uma duração média de 2 horas e 20 minutos.

Iramuteq nas Pesquisas Qualitativas – Vídeos de Curta, Média e Longa Duração (N = 08)

Nessa sessão, todos os vídeos tratam da utilização do Iramuteq como ferramenta para auxiliar o processo de tratamento dos dados nas pesquisas qualitativas.

Entre os vídeos de curta duração (n = 8), dois eram apresentações de trabalho usando o Iramuteq e divulgados em eventos científicos ocorridos na internet. Um vídeo discorria sobre as vantagens e desvantagens do uso do Iramuteq, e um outro, além de descrever sobre o software, também apresentava brevemente os programas NVIVO e ATLAS.ti. Esses últimos requerem licença para uso, porém oferecem um período de teste gratuito e são indicados para auxiliar o tratamento dos dados de pesquisas qualitativas.

Há, ainda, nessa subcategoria, outros quatro vídeos, que apresentam os primeiros passos em relação ao uso do Iramuteq, ou seja, são vídeos com dicas sobre o funcionamento do software e suas possibilidades de análise na pesquisa qualitativa.

Quanto aos vídeos de média duração (n = 4), todos apresentam uma breve explicação da utilização do Iramuteq e discutem de forma sucinta os tipos de análise textual que o software proporciona. Pouca ou nenhuma ênfase é dada a análise de matrizes.

Em relação aos vídeos de longa duração (n = 10), destaca-se a diversidade de áreas e público-alvo para os quais têm sido produzidos, a saber: saúde (epidemiologia, trabalho, enfermagem), educação, pesquisa histórica, sociedade e política, ensino de engenharia, administração e ciências contábeis. Todos os vídeos de longa duração foram publicados durante o período de 2020–2021.

DISCUSSÃO

Desde que a pandemia de COVID-19 foi decretada e culminou na suspensão das aulas presenciais, inúmeras iniciativas foram adotadas especialmente pelas universidades públicas, seus programas de graduação e pós-graduação (lato e stricto sensu) para promover a integração entre docentes e discentes, a atualização do conhecimento, bem como a divulgação da ciência, mesmo diante deste novo cenário(¹⁷,¹⁸).

Nesse contexto, novas práticas e metodologias pedagógicas se destacaram, podendo-se citar a produção de lives, webinários, minicursos online e diversos materiais didáticos multimídia. O YouTube se tornou cada vez mais conhecido para os professores/pesquisadores e acadêmicos, possibilitando usarem seu conhecimento para criar conteúdos e disponibilizá-los, auxiliando um elevado quantitativo de pessoas(¹⁹). A universalização e o acesso à tecnologia certamente têm contribuído para um ensino inovador e cada vez mais acessível e diversificado(¹⁸,²⁰), como pôde ser constatado nos vídeos que integraram esta pesquisa.

Ademais, neste momento pandêmico, o uso da tecnologia se apresentou como uma importante ferramenta para “aproximar as pessoas e diminuir as distâncias”, beneficiando o coletivo social. Do ponto de vista da saúde, minimiza os riscos relacionados à transmissão do SARS-CoV-2, visto que substitui os encontros presenciais, quanto em relação ao processo educacional(²¹), rompendo as barreiras do distanciamento físico entre docentes e discentes e outras pessoas/usuários interessados nos temas que estão sendo publicados.

Sabe-se que nem todos os vídeos do YouTube podem ser indicados para fins educativos, em função das inconsistências de conteúdo e inadequações na produção do material digital(²¹). Nesse sentido, é imprescindível uma triagem crítica em relação às fontes de autoria e aos temas/assuntos abordados, para garantir a confiabilidade das informações. Mas, neste estudo, foi interessante notar a qualidade do material produzido e o envolvimento de acadêmicos e docentes na autoria dos materiais que, por vezes, integravam atividades de monitoria, extensão, eventos científicos ou estavam atreladas a projetos e programas de pós-graduação em diversas áreas do conhecimento. A participação dos acadêmicos na gravação de vídeos educativos contribui de forma significativa para o aprendizado, uma vez que os estimula a protagonizar o processo de ensino-aprendizagem(²²).

Neste estudo, a maior parte dos vídeos atende ao recomendado pelos especialistas, que discutem sobre o ensino mediado por tecnologias da informação, pois as gravações não excedem 15–20 minutos(²³,²⁴). Tal critério é recomendado para que não se perca a atenção dos participantes. Além disso, vídeos de poucos minutos do YouTube podem ser mais facilmente absorvidos do que um vídeo contínuo de 50 minutos(¹⁹), a menos que, nestes, outras estratégias sejam utilizadas para produzir interação com o público.

Outra constatação quanto aos vídeos do Iramuteq é que, com a progressão da pandemia em relação ao tempo, evidenciou-se o crescente número de publicações. Nesse sentido, algumas vantagens podem advir desse processo como: atingir um público expressivo; a possibilidade de ir pausando os vídeos enquanto executa o passo a passo do processo de instalação do software; a oportunidade de acesso ao conteúdo sempre que o pesquisador, por exemplo, estiver utilizando o programa e apresentar dúvida em relação a uma informação. Também o fato de poderem verificar enquanto assistem o material e apreendem o conteúdo, de ter acesso não somente às informações teórica, como ainda verificarem a aplicabilidade prática do software e, paralelamente, desenvolverem as habilidades tecnológicas para implementação.

O aumento no número de vídeos sobre o Iramuteq, bem como o de visualizações dos vídeos (as quais já ultrapassaram a marca de 184.223 no dia da coleta), permite inferir que existe o interesse por essa ferramenta. Além disso, acredita-se que a maior visibilidade e discussão do tema nas mídias sociais pode resultar no aumento das produções científicas utilizando o software.

Enfatiza-se que o Iramuteq realiza a lexicometria, ou seja, o tratamento automático dos textos a partir de cálculos estatísticos sobre o vocabulário do corpus analisado(²⁵). Essa abordagem metodológica é especialmente empregada para identificar tendências, simetrias e estilos discursivos subjacentes a padrões de associação entre palavras, expressões e conceitos, reduzindo o material e dando sentido ao aglomerado de dados(²⁶).

Com base nas consignações de Lebart e Salem (1994), o uso da estatística na análise de dados textuais pode ser decomposto, para fins de discussão, em quatro etapas: a construção de um problema de pesquisa; a produção de dados pertinentes ao problema e compatíveis com a estratégia metodológica; o tratamento estatístico do material textual; e a interpretação dos resultados(⁵). Em outras palavras, a escolha e decisão por utilizar o software deve permear todo o planejamento da pesquisa e não somente estar restrito à etapa de tratamento dos dados.

Vale destacar que ainda há muito a ser explorado sobre o Iramuteq e que pode suscitar novos vídeos, como por exemplo, maiores explicações e detalhamentos sobre a CHD, uma vez que essa análise tem sido a mais recorrente nas pesquisas. Sobre ela, ainda pode-se discutir a possibilidade de se trabalhar subcorpus de cada classe, como apresentar graficamente o qui-quadrado de cada léxico por classe, como identificar os segmentos de textos típicos e seus escores (por léxico e por classe), entre outros aspectos.

A pesquisa por especificidade de grupos também pode ser melhor detalhada, sugerindo-se, por exemplo, a sua utilização para avaliar a diferença entre os discursos na perspectiva de gênero, visto que esse tipo de análise permite estabelecer comparações em função de suas modalidades(⁶). É fundamental esclarecer que a escolha pela utilização de uma, duas ou mais técnicas de análise ou a aplicabilidade de uma ou outra dependerá das características do problema e dos objetivos da pesquisa(²⁶). Afinal, a simples alusão ao uso de um software nos materiais produzidos, sem que haja uma completa e adequada descrição dos tipos de análise realizadas ou o referencial teórico de base para a interpretação dos achados, enfraquece a validade dos resultados(²,⁵).

Necessita-se ampliar as discussões sobre as análises de matriz, o uso do software em pesquisas bibliométricas, a reflexão sobre a necessidade do pesquisador se ancorar em um referencial teórico para fazer a análise dos dados, a diferenciação da análise de conteúdo tradicional, da análise lexical desenvolvida pelo software e a possibilidade de conjugar esses tipos de análise(²,⁵), inclusive como já sugerido e desenvolvido em algumas pesquisas. Além disso, há a necessidade de trabalhar dicas sobre a apresentação dos relatórios de pesquisa que utilizaram o Iramuteq, para ajudar o acadêmico/pesquisador a transformar os resultados estatísticos fornecidos pelo software em redação científica.

Acredita-se que até que a condição sanitária relacionada à pandemia de COVID-19 permita o retorno seguro às salas de aula na modalidade presencial, entende-se que o ensino do Iramuteq para uso em pesquisas qualitativas, por meio de vídeos do YouTube, configura-se em relevante estratégia, inclusive pela possibilidade de o acadêmico/pesquisador utilizar esta ferramenta com capacidade técnica e científica, compartilhando sua experiência em relação ao manuseio da ferramenta, as dificuldades e/ou facilidades percebidas, bem como os experimentos desenvolvidos. Mesmo após superada essa fase pandêmica, tal estratégia pode ser considerada e articulada com momentos de ensino ora presencial ora virtual.

Como limitações, este estudo não contemplou vídeos veiculados no âmbito internacional e considerou a captação de dados em uma única plataforma de rede social. No entanto, esta investigação pode servir de incremento para outras pesquisas com desenho metodológico similar ao desenvolvido nesta investigação, porém considerando, por exemplo, a captação de vídeos franceses, uma vez que o Iramuteq teve sua origem na França.

CONCLUSÃO

Os vídeos captados explanam sobre a instalação do Iramuteq, o preparo do corpus textual, os erros identificados por usuários do software e métodos para corrigi-los, as análises lexicais desenvolvidas pelo programa e como utilizá-lo nas pesquisas qualitativas. O conteúdo é descrito de forma teórica e prática, por meio da apresentação da interface do software. A demonstração do passo a passo de utilização do software desmistifica as dificuldades e sana dúvidas que porventura poderiam existir entre aqueles que pretendem e/ou já utilizam o Iramuteq.

Considera-se que, com os vídeos disponíveis, mais pesquisadores terão acesso às informações básicas para manuseio do software, podendo, com isso, optar por utilizá-lo em suas pesquisas. Assim, observa-se a importante contribuição das redes sociais, com foco no YouTube, como estratégia de tecnologia de comunicação e informação para o desenvolvimento do ensino no formato remoto emergencial e das pesquisas.

Evidenciou-se que poucos vídeos abordam a utilização do Iramuteq para processar matrizes. Além disso, há muitos recursos disponíveis no programa que não são sequer citados nos vídeos captados. Essas lacunas servem para sugerir novos vídeos com tais abordagens.

Outrossim, o artigo em tela contribui ao propor que o YouTube se estabeleça como uma mídia social que, em virtude de ser de fácil e amplo acesso, pode tanto se constituir como uma fonte para pesquisa como também pode suscitar diálogos entre pesquisadores, especialmente em um contexto de pandemia. Ou seja, o uso da plataforma pode ser considerada uma importante estratégia de tecnologia de comunicação e informação para o desenvolvimento do ensino no formato remoto emergencial e das pesquisas.

• Apoio financeiro O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  04 Fev 2022
• Data do Fascículo
  2022

Histórico

• Recebido
  09 Maio 2021
• Aceito
  12 Jul 2021