Alterações cognitivas em enfermeiros que atuam em unidades de terapia intensiva

RESUMO

Objetivo:

Medir os níveis de estresse, ansiedade, depressão dos enfermeiros que atuam em UTI, relacionando-os com os níveis de atenção do antes e após jornada de 24 horas.

Método:

Estudo observacional analítico, de abordagem quantitativa, realizado com 18 enfermeiros submetidos a um inventário de estresse, ansiedade e depressão, avaliação dos níveis de atenção e funcionamento psicomotor.

Resultados:

61% possuem estresse positivo. Depressão foi verificada em 33%; de ansiedade, em 99,9%. Forte correlação entre estresse e depressão (ρ=0,564 com p<0,05) e ansiedade (ρ=1 com p<0,05). Correlação fraca entre estresse e o tempo de execução da tarefa em M2 (ρ = 0,055) para o TMT A, fato que não ocorreu em M0 (ρ=-0,249).

Conclusão:

O estudo mostra que a carga trabalho dos enfermeiros que atuam em UTI, em turnos de 24 horas, está correlacionada com a elevação dos níveis de estresse, diminuição do processo de atenção e declínio psicomotor.

Descritores:
Enfermeiros; Desempenho Psicomotor; Unidade de Terapia Intensiva; Cognição; Assistência de Enfermagem

ABSTRACT

Objective:

To measure the levels of stress, anxiety, and depression of nurses working in ICUs, relating them to levels of attention before and after 24 hours.

Method:

An observational, quantitative, analytical study with 18 nurses undergoing an inventory of stress, anxiety, and depression, as well as assessment of attention levels and psychomotor functioning.

Results:

Sixty-one percent showed positive for stress. Depression was observed in 33%; and anxiety in 99.9%. A strong correlation between stress and depression (ρ = 0.564 with p <0.05) and anxiety (ρ = 1 with p <0.05) was observed. There was a weak correlation between stress and task execution time in M2 (ρ = 0.055) for TMT A, a fact that did not occur in M0 (ρ = -0.249).

Conclusion:

The study shows that the workload of the nurses working in 24-hour shifts in the ICU is correlated with high levels of stress, decreases in the attention process, and psychomotor decline.

Descriptors:
Nurses; Psychomotor Performance; Intensive Care Unit; Cognition; Nursing Care

RESUMEN

Objetivo:

Medir los niveles de estrés, ansiedad y depresión en enfermeros actuantes en UTI, relacionándolos con los niveles de atención anteriores y posteriores a jornada de 24 horas.

Método:

Estudio observacional, analítico, de abordaje cuantitativo, realizado con 18 enfermeros que completaron inventario de estrés, ansiedad y depresión; evaluación de niveles de atención y funcionamiento psicomotor.

Resultados:

61% sufre estrés positivo. Verificada depresión en 33%; ansiedad en 99,9%. Fuerte correlación entre estrés y depresión (ρ=0,564 con p<0,05) y ansiedad (ρ=1 con p<0,05). Correlación débil entre estrés y tiempo de ejecución de la tarea en M2 (ρ = 0,055) para el TMT A, hecho que no replicado en M0 (ρ=-0,249).

Conclusión:

El estudio muestra que la carga laboral de los enfermeros actuantes en UTI en turnos de 24 horas está correlacionada con la elevación de los niveles de estrés, disminución del proceso de atención y declinación psicomotora.

Descriptores:
Enfermero; Desempeño Psicomotor; Unidades de Cuidados Intensivos; Cognición; Atención de Enfermería

INTRODUÇÃO

A função cognitiva compreende processos mentais associados à atenção, percepção, pensamento, aprendizado e memória, dentre outros. Alterações cognitivas resultam em interações sociais pobres, dificuldade de exercer atividades laborais e de autocuidado. Interferem diretamente na qualidade de vida dos indivíduos e, possivelmente, interfiram, também, na qualidade da assistência prestada pelo enfermeiro ao cliente^1-2.

O termo estresse foi trazido da Engenharia e Física e tornou-se popular em outras áreas por ser definido, manipulado e mensurado de maneira fácil. O estresse pode ser definido como qualquer situação de tensão aguda ou crônica que produza uma mudança de comportamento físico e no estado emocional, além de uma resposta de adaptação psicofisiológica, podendo ser negativa ou positiva^3-4.

Sabe-se que profissionais da equipe de enfermagem, para exercerem suas tarefas, requerem concentração e, para isso, condições físicas e psicológicas devem estar harmonizadas. O nível de estresse a que são submetidos durante a jornada de trabalho torna-se um fator predisponente para que o desgaste físico e psicológico se instale^1,5.

Quadros depressivos têm o poder de reduzir a cognição. O estresse afeta diretamente as relações interpessoais, uma vez que a irritabilidade, anedonia (perda da capacidade de sentir prazer), ansiedade e depressão, presentes em quadros mais avançados, impossibilitam relacionamentos afetivos plenos e interferem nas relações ocupacionais^5-6.

Dentre todos os ambientes onde os enfermeiros prestam seus cuidados, estudos divergem quanto a quais desses possuem uma maior quantidade de fatores estressores. Entretanto a maior parte deles mostra que ambientes fechados, como as Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), possuem uma grande quantidade de fatores estressores para os enfermeiros^7-8.

Sendo assim, é preciso verificar a capacidade de atenção e funcionamento psicomotor (tempo de reação e velocidade de desempenho) de enfermeiros que atuam em UTI, durante o cuidado. Além disso, identificarem-se os efeitos do estresse nos processos de atenção e funcionamento psicomotor dos enfermeiros que atuam em UTI`s e evidenciar se há diferença na capacidade de atenção e no funcionamento psicomotor dos enfermeiros, quando iniciam e terminam sua jornada de trabalho.

A relevância deste estudo está em investigar como os corpos dos profissionais de enfermagem que trabalham em UTI respondem à jornada de 24 horas de trabalho. Como exemplo disso, destaca-se a publicação pela Agência de Vigilância Sanitária - ANVISA, da Resolução - RDC Nº 26⁹, de 11 de maio de 2012, que altera a Resolução RDC Nº 07, de 24 de fevereiro de 2010, que dispõe sobre os requisitos mínimos para funcionamento de Unidades de Terapia Intensiva.

Dessa forma, o objetivo deste estudo é medir os níveis de estresse, ansiedade, depressão dos enfermeiros que atuam em UTI, relacionando-os com os níveis de atenção, antes e após jornada de 24 horas.

MÉTODO

Aspectos éticos

O protocolo foi iniciado após aprovação no Comitê de Ética em Pesquisa em 20 de setembro de 2011 e respeitou a Resolução nº 466/12 da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP).

Desenho, local do estudo e período

Trata-se de um estudo observacional analítico, com abordagem quantitativa, que abarcou profissionais de enfermagem que cumpriam jornadas de trabalhado por um período de 24 horas e os submeteu a uma bateria de testes neuropsicológicos, a um inventário de estresse, ansiedade, depressão.

O cenário do estudo foi uma UTI de um Hospital privado localizado na Cidade do Rio de Janeiro, realizado nos meses de junho a outubro de 2013.

População ou amostra; critérios de inclusão e exclusão

A amostra foi composta por 18 enfermeiros que atuavam e que cumpriam jornada de trabalho de 24 horas ininterruptas, seja por troca entre profissionais ou por necessidade institucional (necessidade prévia da escala mensal de trabalho ou necessidade imediata da unidade de serviço). Foram excluídos do estudo enfermeiros que, comprovadamente, apresentassem histórico de distúrbios neurológicos e psiquiátricos e aqueles com história de consumo excessivo de álcool e drogas ilícitas.

Protocolo do estudo

Primeira Etapa → início do turno de 24h - M0

Como para a interpretação dos desempenhos obtidos em testes neuropsicológicos se devem levar em consideração algumas variáveis demográficas, todos os sujeitos responderam a um Questionário Informativo (QI) para caracterização da amostra.

Em seguida, foi entregue o Inventário de Sintomas de Stress para Adultos de LIPP (ISSL), o Inventário de Ansiedade Estado-traço (IDATE ou STAI) e o Inventário de Depressão de Beck (BDI). Esses questionários foram preenchidos pelos participantes no decorrer do turno de trabalho e entregues ao investigador ao final de sua participação do estudo¹⁰.

Posteriormente à entrega dos questionários, os enfermeiros foram convidados a participar dos seguintes testes neuropsicológicos: TAVIS (versão 4.0) e Teste de Trilhas A e B. O TAVIS é um teste computadorizado que avalia três aspectos da atenção (sustentação, seletividade e alternância), por meio de um programa computadorizado.

No TAVIS, foram registrados tempo de estímulo-resposta entre o aparecimento do estímulo e o comando por meio de um joystick, erros e acertos a partir de estímulos na tela. Os erros foram classificados em Erros por Ação (quando se responde a um estímulo errado) e Erros por Omissão (quando se deixa de responder a um estímulo correto).

Na população do estudo. foi aplicada somente a Tarefa 03 pelo fato desta se aproximar dos objetivos propostos. A opção pela Tarefa 3 se deu pela necessidade de entender como a atenção sustentada em enfermeiros pode ser influenciada por um turno de 24 horas.

Os Testes de Trilhas A e B foram utilizados na avaliação de habilidades visomotoras, atenção e flexibilidade cognitiva dos sujeitos. Avaliam-se a atenção sustentada na parte A, atenção alternada e flexibilidade na parte B^1,11.

Os testes foram realizados em um ambiente privado, sem interferência externa, em que o investigador e o sujeito tiveram privacidade para a aplicação. O tempo de realização dos testes foi registrado por meio de um cronômetro.

Segunda Etapa→ término do turno de 24h - M2

Imediatamente após as 24 horas trabalhadas, os profissionais foram novamente submetidos aos mesmos testes neuropsicológicos aplicados na Etapa M0 e devolveram os questionários devidamente respondidos.

Os testes neuropsicológicos foram avaliados por meio das médias, medianas, desvios padrão e coeficientes de variação entre as etapas M0 e M2.

Análise dos resultados e estatística

Os dados coletados foram alocados em uma planilha eletrônica disponível pelo software do PAWS Statistic 18. Foram aplicados os testes Shapiro-Wilke Kolmogorov-Smirnov (KS. Test) e o Teste de Wilcoxon para análise dos testes neuropsicológicos aplicados. Sempre será adotado um valor de p<0,05 para significado estatístico.

RESULTADOS

Os resultados obtidos no início e ao final do turno de 24h (período de 07 horas às 07 horas do dia posterior ou das 19 horas às 19 horas do dia posterior) foram comparados, o que possibilitou a verificação do comportamento destes elementos no período.

Na tabela a seguir, estão descritas as frequências que caracterizam os participantes do estudo.

Com relação à hora de descanso no plantão, apesar de esta não ser uma prática instituída no cenário do estudo, 15 (83,3%) enfermeiros referiram que descansam durante o plantão. Apenas 02 (11,1%) enfermeiros referiram que trabalham 24 h ininterruptamente, 13 (72,2%) referem trabalhar 21 horas em um turno de 24 h. Apenas um profissional (5,5%) referiu que trabalha 18 horas durante um turno de 24h, dedicando 06h ao repouso. Dois participantes (11,1%) referiram que descansam apenas 2 horas no plantão, dedicando 22 h ao trabalho ininterrupto na unidade de terapia intensiva.

Tabela 1
Dados Demográficos - Enfermeiros, Unidade de Terapia Intensiva, Rio de Janeiro, Brasil, 2013

Dados demográficos
Sexo	F	%
Masculino	07	38,9
Feminino	11	61,1
Idade	n	Média	DP
Total	18	30,3	± 5,5
Escolaridade	F	%
Graduação	9	50
Pós-Graduação	9	50
Antropometria	n	Média	DP
Peso (kg)	15	74	± 13,96
Altura (cm)	16	166,71	± 5,01
IMC	15	26,5	± 5,06
Níveis pressóricos	n	Média	DP
PAS	9	122,6	± 12,1
PAD	9	75,5	± 6,9
Estado Civil	F	%
Solteiro	10	55,6
Casado	08	44,4
Nº de filhos	F	%
Nenhum	12	66,7
01	02	27,8
03	01	5,6
Nº de Empregos	F	%
01	13	72,2
02	03	16,7
03	02	11,1
Sono/dia (h)	n	Média	DP
Total	16	6,1	± 1,51

• Nota: IMC: índice massa corporal; PAS: pressão arterial sistólica; PAD: pressão arterial diastólica; DP: desvio padrão.

Testagem Cognitiva - Teste de Trilhas A e B

Os testes de Shapiro-Wilk e Kolmogorov-Smirnov (KS Test) mostraram que os dados não possuíam uma distribuição normal. Sendo assim, utilizou-se o teste de Wilcoxon para comparar os pontos de observações (M0 - início do turno de 24h e M2 - final do turno de 24 h para Trilha A e B), o que mostrou que não houve diferença relevante entre os tempos observados (p>5%).

Tabela 2
Tempo e Erro no Teste de Trilha, início e término turnos 24h, Enfermeiros, Unidade de Terapia Intensiva, Rio de Janeiro, Brasil, 2013

	Tempo no Teste de Trilha
	Trilha A		Trilha B
Tempo (s)	Média (DP)	Mediana (IQR)	Média (DP)	Mediana (IQR)
M0	34,6 (4,9)	35 (29,2-38,7)	64,3(16,7)	63,5 (52,3-74,7)
M2	38,7 (10,4)	37 (31,8- 43,2)	67,8 (23,8)	64,5 (30,5-98,5)
	Erro no Teste de Trilha
	Trilha A		Trilha B
Erro	Média (DP)	Mediana (IQR)	Média (DP)	Mediana (IQR)
M0	0,13 (0,3)	0 (0)	0,9 (1,5)	0,5 (0-1,0)
M2	0,75 (1,0)	0 (0-2,0)	1,3 (1,6)	1,0 (0-1,0)

• Nota: DP: desvio padrão; IQR: intervalo interquartílico; M0: início do turno de 24h; M2: término do turno de 24h.

TAVIS 4.0

Apenas 13 indivíduos foram analisados neste teste. A perda de 5 (27%) enfermeiros se deveu por dois motivos: 1) demora em conseguir o software para iniciar as testagens; e 2) desistência de alguns indivíduos de realizarem o plantão de 24 h sem aviso aos investigadores. Neste último, os participantes somente realizavam 12 h de plantão, sendo assim, não houve dados comparativos para este. Ressalta-se que, mesmo não tendo participado da etapa final do estudo, foi possível obter o QI, ISSL, IDATE e o BDI.

Os resultados do TAVIS não foram apenas quantitativos, mas também qualitativos. Sinais de distração, irritabilidade e desconfiança com o teste foram apresentados pelos participantes do estudo, principalmente na fase M2. Um dos participantes, na realização do teste TAVIS 4.0, que dura aproximadamente 10 minutos, após o turno de 24 horas, por volta do oitavo minuto de realização do teste dormiu.

Os testes de Shapiro Wilke KS. Test mostraram que os dados para o tempo, erro de omissão e erro de ação não apresentavam uma distribuição normal. Sendo assim, os dados foram analisados pelo teste de Wilcoxon, em que os resultados obtidos para tempo (p = 0.068), erros por omissão (p = 0.088) e erros por ação (p = 0.409) foram maiores que 5%. Sendo assim, conclui-se que a diferença entre os tempos, erros por omissão e erros por ação, possivelmente não interfiram na capacidade atentiva dos enfermeiros.

Inventário de Sintomas de Stress para Adultos de LIPP

Dentre os 18 enfermeiros investigados, 61% (n=11) apresentaram diagnóstico positivo para estresse. Os 33% (n=6) restantes apresentavam os sintomas de estresse, mas inferiores aos limites estabelecidos por Lipp⁶. Daqueles que apresentavam diagnóstico positivo para estresse, 45% (n=5) possuem os escores acima dos limites em mais de um quadro. Apenas um participante (5,5%) não referenciou nenhum dos sintomas de estresse.

Quanto àqueles que o estresse estava presente, 100% encontravam-se na fase de resistência, em 73% houve o predomínio dos sintomas psicológicos (n=8). Em 18%, o predomínio dos sintomas físicos (n=2). Em 9% (n=1), a porcentagem foi semelhante entre sintomas físicos e psicológicos. Neste caso o indivíduo apresenta tendência para ter sintomas tanto em uma área quanto outra.

Inventário de depressão

Os dados encontrados na amostra para os 18 participantes.

Tabela 3
Participantes com sintomas de depressão, Enfermeiros, Unidade de Terapia Intensiva, Rio de Janeiro/RJ/Brasil, 2013

Pontuação	Quadro depressivo	n	%
0-9	Ausente	12	66,6
10-18	Leve a moderado	01	5,5
19-29	Moderado a severo	05	27,7
30-63	Severo	-	-

• Nota: N: número de participantes; %: relação percentual.

Os enfermeiros avaliados, neste estudo, em sua maioria, não apresentam sinais tendenciosos a estados depressivos, entretanto, aproximadamente 33% dos avaliados apresentam minimamente sinais preocupantes e passíveis de serem elevados a um status maior de depressão.

Inventário de ansiedade

A seguir, é descrito um quadro com um resumo dos dados encontrados em nossa amostra para os 18 sujeitos para as duas partes.

Tabela 4
Escala Inventário Ansiedade-Estado, Enfermeiros, Unidade de Terapia Intensiva, Rio de Janeiro, Brasil, 2013

Pontuação	Nível de ansiedade	n	%
20-34	Baixo	03	16.6
35-49	Moderado	11	61.1
50-64	Elevado	04	22.2
65-80	Altíssimo	-	-

• Nota: N: número de participantes; %: relação percentual.

Tabela 5
Escala Inventário Ansiedade-Traço, Enfermeiros, Unidade de Terapia Intensiva, Rio de Janeiro, Brasil, 2013

Pontuação	Nível de ansiedade	n	%
20-34	Baixo	06	33.3
35-49	Moderado	09	50.0
50-64	Elevado	03	16.6
65-80	Altíssimo	-	-

• Nota: N: número de participantes; %: relação percentual.

Com o resultado das duas escalas do Inventário de Ansiedade, estado e traço, observa-se que o nível de ansiedade moderado é o mais evidente. Na avaliação sobre ansiedade-estado, os enfermeiros podem apresentar sentimentos de tensão ou apreensão, por consequência do aumento de atividade do sistema nervoso autônomo. Já na avaliação sobre a ansiedade-traço, os enfermeiros podem ter percepções de ansiedade distintas reagindo de formas diferentes em cada situação estressora.

DISCUSSÃO

Sobre os dados demográficos

Com relação à idade da população investigada, a média foi de 30,3 anos. Isto vai ao encontro dos dados disponibilizados pelo Conselho Federal de Enfermagem sobre a análise feita em 2011 em sua base de dados que evidencia que a maior parte dos profissionais de enfermagem encontra-se na faixa etária de 25-35 anos, a qual concentra cerca de 36% dos enfermeiros no Brasil¹².

Com relação à distribuição por sexo, houve predomínio do número de mulheres (61,1%). Isso pode ser explicado pela história da enfermagem no Brasil e no mundo que experimentou intensa feminização a partir da institucionalização da enfermagem moderna a partir do final do século XIX. Estes dados também vão ao encontro dos dados apresentados pelo Conselho Federal de Enfermagem no ano de 2011 que atribuem um percentual de 87,35% para os trabalhadores mulheres nesta profissão¹².

Evidenciou-se um número equivalente entre enfermeiros graduados (50%) e aqueles pós-graduados (50%). Ressaltamos que a pós-graduação se refere apenas a lato sensu. Os dados evidenciados se assemelham aos da literatura que mostram predomínio do grau de especialista e doutores para enfermeiras mulheres e de graduação e mestrado para homens¹³.

O IMC evidenciou que os indivíduos variaram da normalidade à obesidade segundo os critérios estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS). São indicados que os indivíduos com valores iguais ou superiores a 30 são obesos e, valores iguais ou superiores a 25, considerados sobrepeso¹⁴.

Por outro lado, dados deste estudo indicam o predomínio de profissionais que atuam somente em um emprego (72%). Com relação às horas de sono houve uma média de 6,1± 1,51 horas por dia.

Sobre o estresse, ansiedade e depressão

O estudo não identificou estresse indivíduos nas fases mais avançadas (quase exaustão e exaustão), mas sim nas fases de alerta e resistência, com predomínio desta última. A presença de indivíduos nesta fase do estresse vão ao encontro de outras pesquisas que utilizam outros métodos de diagnóstico de estresse^2-3,7-9.

Ao estabelecer uma correlação (não paramétrica de spearman -ρ) entre estresse ansiedade e depressão na amostra do estudo observou-se uma forte correlação entre estresse e depressão (ρ = 0,564 com p<0,05) e entre estresse e ansiedade (ρ = 1 com p<0,05).

Além de patologias que podem surgir a partir dos distúrbios psicológicos, distúrbios físicos são comuns nos trabalhadores de enfermagem⁸.

Estudo sobre os níveis de ansiedade e depressão em enfermeiros que trabalham em turnos revelou que 92% apresentavam quadro de ansiedade com predomínio de um nível de ansiedade moderada. Outros 60% da amostra apresentavam quadro de depressão, sendo os níveis medianos presentes em 60%¹⁵. Estes dados são opostos àqueles que foram encontrados nesta pesquisa, na qual grande parte dos sujeitos (66.6%) não apresenta sintomas de depressão.

Os enfermeiros que avaliamos realizavam, obrigatoriamente, um plantão de 24 h, entretanto, este não é um turno de trabalho permanente na unidade, sendo realizado eventualmente pelos profissionais de enfermagem. Dentre os investigados, 94,5% atuavam em turnos diurnos, o que corrobora com outro estudo⁷, quanto aos níveis moderados de ansiedade Traço e Estado para enfermeiros que atuam nestes turnos.

Sobre a testagem cognitiva

Os resultados dos testes neuropsicológicos condizem com os descritos na literatura. Alguns aspectos de comportamento se mostraram pior frente à situação do ser submetido ao teste do que propriamente na sua execução. A literatura mostra que pacientes com lesões cerebrais têm predisposição com curta duração de atenção, distração, impulsividade, desorganização, irritabilidade, perplexidade e desconfiança. Pacientes sobre efeito de estresse podem se comportar como sujeitos com deterioração cerebral¹¹.

O resultado encontrado no Teste de Trilhas, quando comparados com os valores de referência descritos na literatura para a população adulta normal, percebe-se que os tempos estão acima daqueles descritos. Isso sugere que a amostra já apresente disfunções atencionais¹¹.

Ao estabelecer a correlação entre o estresse e os tempos obtidos no teste de trilha A e B, pode-se observar que para o teste de trilha A, existe uma correlação fraca entre o estresse e o tempo de execução da tarefa em M2 (ρ = 0,055), fato que não ocorre em M0 (ρ = -0,249).

Com relação ao teste de trilhas B, ao estabelecermos uma correlação entre o estresse e o tempo de execução da tarefa em M0 (ρ = -0,314) e M2 (ρ = -0,150), pode-se observar que houve uma correlação negativa entre os tempos. Com isso pode-se inferir que o estresse não influencie na flexibilidade cognitiva dos enfermeiros.

Estudos sobre o desempenho cognitivo de adultos com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) revelou que os participantes apresentaram queixas de atenção. Apesar da metodologia e da população deste estudo ser distinta daquela que foi utilizada, o teste neuropsicológico aplicado aos adultos do grupo controle evidenciou que os testes de atenção, memória, destreza visomotora e flexibilidade cognitiva não se mostraram alterados naqueles com queixas de déficit de atenção^5,16.

Pessoas com menores idades e maior grau de escolaridade obtêm melhor desempenho em tarefas atencionais, o que sugere a influência destas variáveis no processo de atenção. Esses dados corroboram com o que se obteve, entretanto não podemos inferir que a escolaridade influencie nos testes atencionais¹⁶.

O fato de o estresse ser predominante na fase de resistência sugere que os processos cognitivos investigados tenham sofrido pouca variação nos tempos propostos. Pesquisas ainda são controversas em suas conclusões, por mostrar que o estresse ora aumenta o nível de atenção ora reduz^3,16. Estudo experimental constatou que o estresse prejudica o processo de atenção devido ao aumento do número de informações irrelevantes³.

A bateria de testes que utilizada foi aplicada em um ambiente reservado, longe de interferências externas, entretanto o macroambiente do cuidado ainda permanece como um fator estressor. Mensurações em laboratório nem sempre representam as reais demandas da vida (validade ecológica). Sendo assim, é necessário considerar as queixas e o comportamento apresentado durante a aplicação de testagens¹¹.

Estudo focado no impacto do estresse no trabalho e da influência cognitiva sobre incidentes de segurança nos hospitais (todos os tipos de erros)¹⁷, contribui para ilustrar os achados desta pesquisa. Amostra composta de 279 enfermeiros coreanos que atuavam na assistência direta aos doentes em 5 hospitais diferentes. Concluiu-se que os fatores que mais interferem para a segurança dos clientes são o turno de trabalho (OR= 6,85) e a insuficiência cognitiva (OR= 2,92). Cabe ressaltar que o instrumento de análise cognitiva utilizado neste estudo também avaliava a os processos de atenção e memória.

Estudos definem como situações que indicam déficits atencionais: conversas em que os sujeitos frequentemente solicitam que as perguntas ou instruções dos testes sejam repetidas (desatenção); quando há interrupção frequente por parte do interlocutor (impulsividade) ou quando o examinado está fazendo duas tarefas informalmente (falando com o examinador e realizando as tarefas selecionadas)^5,18-20.

Vale ressaltar que os participantes deste estudo, após 24 horas de trabalho, iniciavam diálogos com o pesquisador sobre questões alheias ao momento, demonstravam aparente inquietação ao realizar a bateria de testes pela segunda vez - agitação motora dos membros inferiores. Ficou evidente que todos os profissionais ao realizarem os testes após um turno de 24 horas, não apresentavam concentração para a realização dos testes.

Trabalho prolongado, que demande alta concentração para o desenvolvimento, que a todo momento é interrompido por algum fato, que gere indecisão (questionamentos) para ser realizado, resultam em um esforço compensatório. Têm relação com o esforço cognitivo extra despendido, no caso de enfermeiros, ao executar suas ações sob condições adversas. Para que se mantenham as condições cognitivas ideais é preciso um maior custo mental^20-22.

Quadros de depressão e estresse favorecem a hipoprosexia. Há tendência à perda da capacidade de concentração, compreensão e dificuldade de percepção sobre estímulos ambientais. É possível ocorrer dificuldade para desenvolver atividades psíquicas complexas como o pensamento, raciocínio e organização de informações^19,23.

Nossos resultados, vão ao encontro ao que se compreendia sobre o conflito velocidade-precisão. Estudos revelam que este termo aborda a relação inversamente proporcional entre a velocidade e a precisão do movimento. Nesse caso, com o aumento da velocidade a precisão espacial diminui e, de maneira inversa, a melhora da precisão resulta em uma diminuição da velocidade^23-24.

O teste de trilhas contribui para avaliar a atenção sustentada e alternada, assim como a função motora dos indivíduos. A contabilização dos erros foi feita a partir do terceiro erro cometido pelos enfermeiros como descrito em alguns estudos^1,23,25.

Destaca-se o fato de que em M2, o tempo de execução no teste de trilha B apresentar uma variabilidade e uma assimetria maior. Quanto aos erros, mesmo que dentro do esperado, o seu aumento sugere que a flexibilidade cognitiva dos sujeitos esteja em declínio¹⁹.

Quando avaliamos a esta situação para o campo da enfermagem, infere-se que o processo de trabalho em UTI's, que é extremamente dinâmico, sofra declínio após 24 horas.

Para a enfermagem, isto pode significar a minoração de um trabalho rico em detalhes. Simplificar um evento pode trazer transtornos irreversíveis. Neste estudo se observam dois problemas. O primeiro relativo à minoração dos efeitos que um trabalho em turno de 24h e extensas cargas horárias de trabalho causem em processos cognitivos como atenção/concentração, memória e capacidade psicomotora. O segundo é o efeito que causam na ação de cuidar por parte do enfermeiro.

Limitações do estudo

Este estudo não pretende esgotar o tema, ao contrário, abre perspectivas para ampliação de novas investigações acerca dos desgastes físicos, mentais e emocionais a que ficam expostos os enfermeiros após jornadas de 24 horas em unidades de tratamento intensivo, inclusive, susceptíveis aos riscos de cometer erros ao cuidar dos clientes internados nessas unidades.

Contribuições para a área da enfermagem, saúde ou política pública

O estudo contribui para a área de planejamento do cuidado e assistência de enfermagem em unidades de tratamento intensivo, considerando que seus resultados correlacionam a elevação dos níveis de estresse, diminuição do processo de atenção e declínio psicomotor dos enfermeiros que trabalham em escalas de 24 horas.

CONCLUSÃO

A amostra revelou presença de estresse em 61% dos enfermeiros, com predomínio na fase de resistência e sintomas psicológicos, segundo o inventário utilizado. Destes, 45% apresentaram escores brutos acima dos limites em mais de uma fase do estresse, o que leva ao risco de mudança para fases mais danosas do estresse. Cerca de 33% dos participantes apresentaram sintomas de depressão e cerca de 99,9% sintomas de ansiedade, alcançando níveis elevados de ansiedade-estado em 22,2% e em 16,6% em ansiedade-traço.

Houve correlação plena entre estresse e ansiedade, e uma correlação substancial para estresse e depressão (p<0,005).

Os tempos que os indivíduos levaram para realizar o teste tanto no início do turno quanto após 24 horas de trabalho, estão acima daqueles encontrados na literatura para uma população teoricamente normal. Entretanto não houve correlação entre o estresse e os tempos de realização tanto da trilha A quanto na trilha B. Os enfermeiros demonstraram algum nível de desatenção, mas demonstram menos impulsividade quando comparados o início e o final de um turno de 24 h.

Com relação ao funcionamento psicomotor os indivíduos apresentaram o conflito velocidade-precisão, característico de declínio psicomotor.

Os resultados deste estudo nos direcionam a novas pesquisas na mesma linha de investigação. Entretanto há necessidade de considerar variáveis importantes que não foram controladas desde o início e que podem ter gerado uma confusão, como por exemplo, o descanso dos enfermeiros durante o turno de 24 horas.

REFERENCES

• ¹
  Faria CA, Alves HVD, Charchat-Fichman H. The most frequently used tests for assessing executive functions in aging. Dement Neuropsychol[Internet]. 2015[cited 2015 Oct 12];9(2):149-55. Available from: http://www.scielo.br/pdf/dn/v9n2/1980-5764-dn-09-02-00149.pdf
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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  Jan-Feb 2018

Histórico

• Recebido
  23 Out 2016
• Aceito
  04 Dez 2016