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INFLUÊNCIA DA INGESTÃO ALIMENTAR SOBRE O HEMOGRAMA

Uma das análises necessárias à classe médica e que pode oferecer importantes indicações no que se refere ao diagnóstico e terapêutica é o hemograma (1)1 BARBOSA, N.C. - Interpretação do hemograma. An. Brasil. Ginec. 55: 133-138, 1963..

Os laboratórios fazem geralmente outros tipos de exames e, como para muitos deles é exigido que o paciente esteja em jejum, ficou então, estabelecido como norma geral que o hemograma deva também ser feito nestas condições (5)2 BETHELL, F. et al. - Quantitative and qualitative variations in normal leucocytes. Physiological Rev., 23: 279-301, 1943.

VIEIRA ROMEIRO (l0)10 VIEIRA ROMEIRO - Exame do sangue. In: ______ Semiologia médica 11.ª ed., Rio de Janeiro, Ed. Guanabara Koogan, cap. 10, 1968., LIMA e cols. (6)6 LIMA, A.O. et al. - Métodos de laboratório aplicados à clínica. 4.ª ed., Rio de Janeiro, Ed. Guanabara Koogan, 1969. recomendam que o sangue para exame hematológico deve ser colhido em jejum de várias horas. Entretanto, para JANNINI & JANNINI, F.º(5)5 JANNINI, P. JANNINI FILHO, P. Colheita do material e técnica de exame. In: ______ Interpretação clínica do hemograma. 7.ª ed., São Paulo, Gráfica São José, cap. 2, 1973. o hemograma pode ser feito a qualquer hora, antes ou depois da alimentação.

Em alguns casos, o exame hematológico é pedido com a finalidade de auxílio diagnóstico quando o paciente está febril. Assim, a urgência do exame, a tensão dos familiares, não permitem que se espere até o dia seguinte para a colheita do material em jejum (5)5 JANNINI, P. JANNINI FILHO, P. Colheita do material e técnica de exame. In: ______ Interpretação clínica do hemograma. 7.ª ed., São Paulo, Gráfica São José, cap. 2, 1973..

Acresce ainda o problema dos pacientes de ambulatório, residentes em outras cidades, que viajam para fazer o exame e, às vezes, pela orientação inadequada alimentam-se ficando, assim, impedidos de realizar o exame, causando-lhes sérios transtornos de ordem econômica. emocional e retardo no início do tratamento. Quando os pacientes internados se alimentam, a colheita do material fica também para o dia seguinte, salvo resolução médica em contrário.

Como se tem verificado, quando o organismo é acometido de processo febril, se o sangue for colhido no dia seguinte para esperar que o paciente esteja em jejum, o quadro hematológico deste dia pode mascarar o processo anterior e; nestas condições, o hemograma será a característica do quadro atual e não a do que se desejava analisar (5)5 JANNINI, P. JANNINI FILHO, P. Colheita do material e técnica de exame. In: ______ Interpretação clínica do hemograma. 7.ª ed., São Paulo, Gráfica São José, cap. 2, 1973..

Sabe-se que, em circunstâncias fisiológicas, pode haver desvios da fórmula leucocitária. É comum a leucocitose fisiológica do recém-nascido, podendo ainda ser observada no período menstrual, na gravidez, no parto e exercícios musculares exaustivos; de maneira análoga pode surgir leucocitose como resultado da secreção de adrenalina nos casos de "stress", medo, dor e anóxia (88 NERY, A.L.B. et al - Hemograma: série branca. In: ______ Laboratório para o clínico. Rio de Janeiro, Livraria Atheneu, cap. 6, 1973.,33 DEPLA, M. et FUNEL, P. - Variation spontanée de l'hemograme moyen d'une population de travailleurs. Rev. Franc. Etudes Clin. et Biol., 7: 752-754, 1962.).

Com relação a alimentação, parece ainda haver divergência de opiniões se o sangue para hemograma deve ou não ser colhido em jejum e se as alterações ocorridas tem ou não siginificado.

Considerando a importância do exposto, propusemo-nos a estudar a influência da ingestão alimentar sobre o hemograma.

MATERIAL E MÉTODOS

Selecionou-se como população de estudo, universitárias de Ribeirão Preto, como idade entre 19 e 29 anos.

Foram incluídas no estudo, 20 voluntárias sem queixa de moléstia, com sinais vitais dentro dos limites de normalidade e que não estivessem recebendo tratamento medicamento. Chamamos de limites de normalidade a temperatura entre 36, 2.ºC e 36,9.ºC; a freqüência cardíaca entre 62 e 97 batimentos/min; a pressão arterial sistólica entre 135,84 e 99,09 mm Hg a diastólica entre 87,03 e 57,12 mm Hg (44 HOUSSAY, B.A. et al. - Temperatura corporal y su regulacion. In : ______ Fisiologia humana. 4.ª ed. Buenos Aires, El Teneo, cap. 52, 1972.,77 MACHADO, M.H. - Freqüência cardíaca, freqüência respiratória em pessoas do grupo etário 14 - 19 anos. Ribeirão Preto, 1972, Tese de doutoramento, Escola de Enmagem de Ribeirão Preto, USP, (Mimeogr.).,1111 VINHA, V.H.P. - Estudo da presão arterial em policiais militares do grupo etário 20 - 50 anos. Ribeirão Preto, USP, (mimeograf.).).

Os indivíduos foram divididos casualmente, através de sorteio, em dois grupos: experimental e controle.

Em ambos os grupos foi colhida uma primeira amostra de sangue pela manhã, através de punção venosa, estando os indivíduos em jejum por um período mínimo de 8 horas, e em repouso de pelo menos 10 minutos.

No grupo experimental, após a primeira colheita, cada elemento recebeu o desjejum que constou de café com leite adoçado (200ml), pão (50 g) com manteiga (10 g). Após 60 minutos do desjejum, colheu-se uma segunda amostra de sangue em idênticas condições da primeira amostra.

No grupo controle as participantes não receberam alimentação e foi colhida uma segunda amostra simultâneamente ao seu par do grupo experimental.

Todas as amostras de sangue variando de 4,0 a 4,5 ml foram colocadas em frascos que comportam 10 ml (padronizados pelo Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, USP) que continham como anticoagulante 50 de EDTA (Na+ 10%) Após serem codificados (código numérico), os frascos foram encaminhados ao laboratório de hematologia para contagem de eritrócitos e leucócitos, e dosagem de hemoglobina, onde utiliza-se o aparelho Colter-Counter modelo F.N. para realização de exames deste tipo (9)9 PLATT, W.L. - Color atlas and textbook of hematology. Priladelphia Toronto J.B. Lippincott, 1969..

Com interesse em comparar resultados das variáveis entre grupo experimental e grupo controle e, sabendo-se que existe uma variabilidade biológico inerente a esta medida, acrescido do erro de técnica, efetuamos numa primeira etapa a medida desta variabilidade e do erro. Isto foi feito da seguinte maneira: foi colhido sangue de quatro indivíduos. De cada indivíduo colheu-se 18 ml de sangue que foi distribuído em quatro frascos idênticos contendo o mesmo anticoagulante citado anteriormente, codificados (código numérico) e enviados ao laboratório para contagem dos eritrócitos e leucócitos, e dosagem de hemoglobina.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A contagem dos G.V. (glóbulos vermelhos), G.B. (glóbulos brancos) e dosagem da Hb (hemoglobina) do grupo experimental e grupo controle, são apresentados na tabela I.

TABELA I
Contagem dos G.V., G.B., dosagem de Hb para o grupo experimental e grupo controle.

A tabela II mostra as diferenças entre as variáveis obtidas na l.ª amostra e 2.ª amostra e ainda as medidas de posição e variabilidade. Para estes dados, ao se efetuar o teste de duas médias para populações correlatas encontrou-se valores de t que são assinalados na tabela II.

TABELA II
Diferença entre as variáveis obtidas na primeira e segunda amostra para grupo experimental e para grupo controle.

Da observação da tabela II, no teste de duas médias para populações correlatas (oc = 0,05) vemos que, para o grupo experimental, a alteração é significante para G.V. e G.B. não sendo, porém, significante para Hb. Para o grupo controle a variação é significante para os G.V., G.B. e Hb.

Os resultados do estudo para verificar a variabilidade biológica inerente a esta medida acrescida do erro de técnica, na contagem de eritrócitos, leucócitos e dosagem de hemoglobina são mostrados na tabela III.

TABELA III
Contagem de G.V., G.B. e dosagem de Hb obtidos em diferentes amostras no mesmo indivíduo.

As alterações que ocorrem nos dois grupos, conforme tabela II, situam-se dentro da variabilidade da medida inerente à técnica (tabela III); embora tenha ocorrido elevação dos elementos sangüíneos no G.E., que teve a alimentação como uma variável a mais e, no G.C. em que esses elementos diminuiram estando os indivíduos em jejum, sentimos necessidade de estudos posteriores para estabelecer relação entre essas variações.

Nas condições em que se apresentam nossos resultados e em que o experimento foi realizado, chegamos a admitir que, na colheita de sangue para hemograma, a alimentação não provoca alteração dos elementos sangüíneos.

Estendemos nossos agradecimentos ao Prof. Dr. Antonio Ruffino Netto, Assistente Doutor do Departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, USP, pelas sugestões apresentadas.

  • HUMEREZ, D.C., colaboradores - Influência da ingestão alimentar sobre o hemograma. Rev. Bras. Enf.; RJ, 28: 54-59, 1975.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • 1
    BARBOSA, N.C. - Interpretação do hemograma. An. Brasil. Ginec. 55: 133-138, 1963.
  • 2
    BETHELL, F. et al. - Quantitative and qualitative variations in normal leucocytes. Physiological Rev, 23: 279-301, 1943.
  • 3
    DEPLA, M. et FUNEL, P. - Variation spontanée de l'hemograme moyen d'une population de travailleurs. Rev. Franc. Etudes Clin. et Biol., 7: 752-754, 1962.
  • 4
    HOUSSAY, B.A. et al. - Temperatura corporal y su regulacion. In : ______ Fisiologia humana 4.ª ed. Buenos Aires, El Teneo, cap. 52, 1972.
  • 5
    JANNINI, P. JANNINI FILHO, P. Colheita do material e técnica de exame. In: ______ Interpretação clínica do hemograma 7.ª ed., São Paulo, Gráfica São José, cap. 2, 1973.
  • 6
    LIMA, A.O. et al. - Métodos de laboratório aplicados à clínica 4.ª ed., Rio de Janeiro, Ed. Guanabara Koogan, 1969.
  • 7
    MACHADO, M.H. - Freqüência cardíaca, freqüência respiratória em pessoas do grupo etário 14 - 19 anos. Ribeirão Preto, 1972, Tese de doutoramento, Escola de Enmagem de Ribeirão Preto, USP, (Mimeogr.).
  • 8
    NERY, A.L.B. et al - Hemograma: série branca. In: ______ Laboratório para o clínico Rio de Janeiro, Livraria Atheneu, cap. 6, 1973.
  • 9
    PLATT, W.L. - Color atlas and textbook of hematology Priladelphia Toronto J.B. Lippincott, 1969.
  • 10
    VIEIRA ROMEIRO - Exame do sangue. In: ______ Semiologia médica 11.ª ed., Rio de Janeiro, Ed. Guanabara Koogan, cap. 10, 1968.
  • 11
    VINHA, V.H.P. - Estudo da presão arterial em policiais militares do grupo etário 20 - 50 anos Ribeirão Preto, USP, (mimeograf.).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Abr-Jun 1975
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