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Pesquisa em enfermagem: uma modalidade convergente - assistencial (Série Enfermagem- REPENSUL)

RESENHA

Pesquisa em enfermagem: uma modalidade convergente - assistencial (série enfermagem- REPENSUL)

Iraci dos Santos

Professora Titular de Pesquisa em Enfermagem da UERJ (aposentada). Professora Adjunta da Faculdade de Enfermagem, UERJ. Responsável pela Disciplina Seminário de Pesquisa I, do Programa de Mestrado em Enfermagem. Professora da Disciplina Processo de Trabalho e da Administração da Assistência de Enfermagem, no Programa de Graduação em Enfermagem. Membro do Conselho Editorial da REBEn

TRENTINI, Mercedes; PAIM, Lygia. PESQUISA EM ENFERMAGEM: Uma Modalidade Convergente - Assistencial (Série Enfermagem- REPENSUL). Florianópolis: Ed. da UFSC, 1999.162 p.

A leitura deste livro me fezxecordar duas citações de dois grandes educadores que muito me impressionam. A primeira, sobre a obrigatoriedade do aprender advinda aos seres humanos desde o seu nascer e por toda sua vida de convivência, no mundo, com os outros e consigo, da autoria de Bernard Charlot (1997); a segunda, é uma referência de Paulo Freire, feita em uma Conferência na UERJ, sobre o que as pessoas fazem com o que aprendem. Naquela ocasião, dizia o pensador: quem sabe ler, entende o mundo e aquele que escreve, transforma o mundo. E com estas recordações fui me encantando com a recente obra de Mercedes Trentini e Lygia Paim pois ela reflete seus anos de aprendizagem nas práticas assistencial e de docência. Na verdade, é além disto, haja vista as autoras revelarem um compromisso com a comunidade de enfermagem, ao defenderem a possibilidade da cientifização do fazer profissional desta área do conhecimento.

Trata-se, portanto, de um livro cuja leitura é até obrigatória, principalmente para os que pensam na atividade científica como privilégio dos acadêmicos, dos teóricos, abstracionistas e devaneadores. Ele abre as portas para o pensar, o fazer com responsabilidade, qual seja, a da cientificidade. Não o fazer por fazer, o resolver problemas imediatos, imprevistos ou obrigatórios, tais como o da sobrevivência do cliente e também do profissional. Mas, sobretudo, a responsabilidade pela aventura da descoberta, do conhecimento, como algo imprescindível na vida dos seres humanos; pois a meu ver é isto que mantém o desafio pela vida, é o próprio sabor do que vale a vida ser vivida.

Assim, é que a experiência de Mercedes e Lygia na prática docente do curso de mestrado, lidando com alunas (os) inconformadas (os) por não poderem visualizar de imediato como pesquisar, teorizar sua prática assistencial, e, também, como incorporar os resultados de suas pesquisas nesta mesma prática, permitiu a criação deste paradigma científico: A Pesquisa Convergente - Assistencial. Para mim que defendo os campos de prática, sejam eles de ensino, assistência, administração, pesquisa ou extensão universitária como os laboratórios/fontes de conhecimento, este livro representa um avanço, por sistematizar os procedimentos que conduzem á cientifização do saber/fazer profissional.

Nesta Resenha, julgo oportuno descrever,também, o espaço-tempo-coletivo-transicional no qual tomei conhecimento desta obra. Foi num evento científico- o 51º Congresso Brasileiro de Enfermagem, em Florianópolis, em 1999, durante um Curso de Pesquisa Científica, ministrado pelas autoras. Desde aí se depreende sua responsabilidade pela divulgação e correspondente credibilidade na contribuição dela para a comunidade de enfermagem. Ressalte-se, ainda, o apoio da Editora da UFSC na publicação do livro, o que revela valorização do trabalho dos professores dessa Instituição de ensino. Desse modo, grande foi a receptividade dos participantes do Curso fazendo-se notar, inclusive, pelo seu espanto ao constatar a viabilidade e obrigatoriedade do pesquisar o próprio fazer cotidiano profissional a partir da problematização da realidade e da necessidade e do desejo de entender as subjetividades próprias dos seres humanos, suas sensibilidade, criatividade e curiosidade natural.

A contribuição desse livro se estende, também, a outros profissionais de outras áreas do conhecimento .sobretudo aos interessados pela pesquisa aplicada, por desmistificar esta atividade como exclusiva dos espaços acadêmicos. Além disso, as autoras abordam, em linguagem acessível a diversos níveis de compreensão, elementos componentes da pesquisa científica, desde a fase de concepção, problematização, busca bibliográfica e suporte teórico, instrumentação da pesquisa propriamente dita, análise e interpretação da produção de dados. Para os pesquisadores iniciantes ou não, faz-se um destaque na propriedade com que Mercedes e Lygia explicitam justificando as características e diferenças dos métodos e técnicas nas abordagens quantitativa e qualitativa. Sem o habitual lugar comum, de sempre relacionar, de forma negativa, a pesquisa quantitativa ao paradigma cartesiano e á filosofia positivista glorificando as vantagens da qualitativa, as autoras apresentam seu entendimento de como se deve optar por uma delas.

Embora as autoras reforcem nas várias seções do livro que esta modalidade de pesquisa é própria das abordagens qualitativas e da enfermagem, o espaço- tempo aberto para sua implementação, ao meu olhar, sensibilidade e compreensão das possibilidades de pesquisa, deixa margens para produções de dados quantificados. Isto, pela própria natureza do trabalho de enfermagem e de outros dedicados ao entendimento do ser humano, dar-lhe suporte em suas fragilidades e reforço a suas potencialidades. Certamente, tudo isto requer subjetividade e algumas objetividades quantificáveis pela investigação científica.

Ao exemplificar a aplicação da Pesquisa Convergente - Assistencial a partir de uma realidade empírica, as autoras mostram a angústia advinda aos pesquisadores em formação, quais sejam os alunos dos cursos de pós graduação "stricto sensu" decorrente do seu apego aos objetos de estudo, principalmente quando estes são incompreendidos. Neste caso, tornase claro o dissolver dessa angústia, pelo caminhar através do paradigma da Pesquisa Convergente - Assistencial, o qual representa, no falar de Mercedes e Lygia, a articulação da pesquisa, assistência e participação dos envolvidos no espaço da pesquisa.

E, aqui, recordo-me de Gauthiere Santos (1999) ao apresentarem a Sociopoética, uma abordagem no conhecimento do homem com ser político e social; e o Grupo - Pesquisador, um método de pesquisa que privilegia a participação dos envolvidos na pesquisa como coresponsáveis na produção dos dados e validação dos resultados. Noto, portanto, nestes dois paradigmas, uma convergência de pensamentos, de filosofia, de ideologia. Uma convergência que estrutura um agir político e transformador; e que faz as pessoas lembrarem que o exercício da cidadania plena de uns torna-se possível a partir do respeito e consideração da cidadania dos outros.

Sendo assim, há que se procurar desenvolver nas pessoas a credibilidade nas possibilidades e potencialidades de pesquisar e criar desde o seu modo de ser, conhecer viver, conviver e fazer profissional, cotidianamente; há que se alertar as pessoas para a necessidade da construção coletiva de saberes visando ao bem comum da humanidade. Nisto acredito como uma forma de bem-estar no mundo e de auto realização pessoal e profissional; e, a meu ver, esta é, também, uma proposta do livro - Pesquisa em Enfermagem: Uma Modalidade Convergente- Assistencial.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Set 2014
  • Data do Fascículo
    Dez 1999
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