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UM ESTUDO EXPLORATÓRIO DO EFEITO DISPOSIÇÃO NO MERCADO DE AÇÕES DURANTE A PANDEMIA DE COVID-191 1 Recebido em 16/8/2022, aceito em 3/7/2023.

AN EXPLORATORY STUDY OF THE DISPOSITION EFFECT ON THE STOCK MARKET DURING THE COVID-19 PANDEMIC

UN ESTUDIO EXPLORATORIO DEL EFECTO DE DISPOSICIÓN EN LA BOLSA DE VALORES DURANTE LA PANDEMIA DE COVID-19

RESUMO

Este trabalho busca avaliar a ocorrência do efeito disposição, transação a transação, no mercado brasileiro de ações durante a Pandemia de COVID-19; e identificar variáveis que podem explicar tal efeito através de uma aplicação empírica de mínimos quadrados ordinários. O estudo propõe diferentes métricas de efeito disposição a partir de dados intradiários. A pesquisa identifica uma alta proporção de vendas em momentos de alta e, em março de 2020, verifica-se um aumento significativo de operações de compra e venda no mercado de ações. Os resultados sugerem que o efeito disposição é afetado pelo retorno e pela volatilidade do Ibovespa, em altas, e pelo retorno do Ibovespa, em quedas.

Palavras-chave:
Efeito Disposição; Comportamento do Investidor; Finanças Comportamentais

ABSTRACT

This study aims to analyze the intraday disposition effect for each stock trading during the COVID-19 pandemic and to identify macroeconomic or financial variables that can explain the effect through an empirical application of ordinary least squares. The study proposes different intraday metrics of disposition effect. We show a high proportion of sellers at bull markets. In March 2020, there is a significant increase in buying and selling trading volume. The results suggest that disposition effect is affected by the Ibovespa return and volatility when the stock prices go up and by the Ibovespa return, when go down.

Keywords:
Disposition Effect; Investor Behavior; Behavioral Finance

RESUMEN

Este estudio tiene como objetivo analizar el efecto disposición intradía para cada negociación de activos durante la pandemia de COVID-19 e identificar variables macroeconómicas o financieras que puedan explicar el efecto a través de una aplicación empírica de mínimos cuadrados ordinarios. El estudio propone diferentes métricas intradiarias del efecto disposición. Mostramos una alta proporción de vendedores en mercados alcistas. En marzo de 2020, hay un aumento significativo en el volumen de operaciones de compra y venta. Los resultados sugieren que el efecto disposición es afectado por el rendimiento y la volatilidad del Ibovespa cuando los precios de las acciones suben y por el rendimiento del Ibovespa cuando bajan.

Palabras Clave:
Efecto Disposición; Comportamiento del Inversionista; Finanzas Comportamentales

INTRODUÇÃO

A racionalidade do investidor no processo de tomada de decisão e a eficiência da formação de preços no mercado são os principais arcabouços teóricos da econômica clássica. Entretanto, conforme Prates, Costa Jr. e Santos (2019PRATES, W. R.; COSTA JUNIOR, N. C.; SANTOS, A. A. P. Efeito Disposição: Propensão à Venda de Investidores Individuais e Institucionais. Revista Brasileira de Economia, v. 73, n. 1, 2019.) e Barreto (2021BARRETO, P. L. Efeito Disposição: Uma Análise do Comportamento do Investidor Brasileiro. Dissertação de Mestrado profissionalizante em Economia, Rio de Janeiro (Ibmec-RJ), 2021.), verifica-se, através do grande número de artigos publicados nos últimos anos, um amplo questionamento sobre a validade dessas premissas.

Em relação aos vieses que contribuem para a limitação da racionalidade do investidor, o efeito disposição é apontado como um dos mais robustos (Shefrin; Statman, 1985SHEFRIN, H.; STATMAN, M. The disposition to sell winners too early and ride losers too long: Theory and evidence. The Journal of Finance, v. 40, n. 3, p. 777-790, 1985. http://dx.doi.org/10.1111/j.1540-6261.1985.tb05002.x
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; Kaustia, 2010KAUSTIA, M. Prospect theory and the disposition effect. Journal of Financial and Quantitative Analysis, v. 45, n. 3, p. 791-812, 2010.). Este trabalho tem como objetivo avaliar a ocorrência do efeito disposição, transação a transação, no mercado brasileiro de ações durante a pandemia de COVID-19; e identificar variáveis que possam explicar tal efeito. Além disso, pelo fato de estarmos trabalhando com dados intradiários, o estudo propõe diferentes métricas de efeito disposição.

Segundo Shefrin e Statman (1985SHEFRIN, H.; STATMAN, M. The disposition to sell winners too early and ride losers too long: Theory and evidence. The Journal of Finance, v. 40, n. 3, p. 777-790, 1985. http://dx.doi.org/10.1111/j.1540-6261.1985.tb05002.x
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), o efeito disposição é caracterizado por um comportamento em que os investidores apresentam uma predisposição a vender ativos com ganhos de forma antecipada e a postergar as perdas provenientes de posições perdedoras por um longo prazo. Em outras palavras o efeito disposição contraria o conceito de cortar as perdas e manter os ganhos, cut your losses and let your profits run, e contribui para a manutenção de carteiras de ações perdedoras por parte dos investidores sujeitos a esse efeito.

Barberis e Xiong (2009BARBERIS, N.; XIONG, W. What drives the disposition effect? An analysis of a long-standing preference-based explanation. Journal of Finance, v. 64, n. 2, p. 751-784, 2009. http://dx.doi.org/10.1111/j.1540-6261.2009.01448.x
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) explicam parte do efeito disposição através da teoria do prospecto. Segundo os autores os investidores avaliam apenas as perdas realizadas e ignoram perdas no papel ou não realizadas. Isso significa que posições perdedoras não realizadas estão ainda mais sujeitas a análises de conveniência e julgamento pessoal do investidor. Por outro lado, o comportamento do investidor com relação à posição com ganho é de difícil explicação.

Shefrin e Statman (1985SHEFRIN, H.; STATMAN, M. The disposition to sell winners too early and ride losers too long: Theory and evidence. The Journal of Finance, v. 40, n. 3, p. 777-790, 1985. http://dx.doi.org/10.1111/j.1540-6261.1985.tb05002.x
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) também utilizaram a teoria do prospecto para abordar o efeito disposição, que, segundo os autores, pode ser explicado pela contabilidade mental, pelo medo do arrependimento e pela falta de autocontrole.

As linhas que investigam o efeito disposição podem ser divididas em três grandes categorias, em que na primeira, os estudos empíricos buscam identificar o efeito em diferentes países (ODEAN, 1998ODEAN, T. Are investors reluctant to realize their losses? The Journal of Finance, v. 53, n. 5, p. 1775-1798, 1998. http://dx.doi.org/10.1111/0022-1082.00072
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; SHAPIRA; VENEZIA, 2001SHAPIRA, Z.; VENEZIA, I. Patterns of behavior of professionally managed and independent investors. Journal of Banking & Finance, v. 25, p. 1573-1587, 2001.; CALVET; CAMPBELL; SODINI, 2009CALVET, L. E.; CAMPBELL, J. Y.; SODINI, P. Fight or flight? portfolio rebalancing by individual investors. The Quarterly Journal of Economics, v. 124, n. 1, p. 301-348, 2009.) e para diferentes categorias de ativos (KAUSTIA, 2004KAUSTIA, M. Market-wide impact of the disposition effect: evidence from ipo trading volume. Journal of Financial Markets, v. 7, n. 2, p. 207-235, 2004.; CHOE; EOM, 2009CHOE, H.; EOM, Y. The disposition effect and investment performance in the futures market. Journal of Futures Markets: Futures, Options, and Other Derivative Products, v. 29, n. 6, p. 496-522, 2009.); na segunda, temos experimentos de identificação do efeito em ambientes controlados (WEBER; CAMERER, 1998WEBER, M.; Camerer, C. F. The disposition effect in securities trading: An experimental analysis. Journal of Economic Behavior & Organization, v. 33, n. 2, 167-184, 1998. http://dx.doi.org/10.1016/S0167-2681(97)00089-9
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); e na terceira, temos trabalhos que buscam identificar fatores que possam explicar o efeito (KUMAR; LIM, 2008KUMAR, A.; LIM, S. S. How do decision frames influence the stock investment choices of individual investors? Management Science, v. 54, n. 6, p. 1052-1064, 2008., BEN-DAVID; HIRSHLEIFER, 2012BEN-DAVID, I.; HIRSHLEIFER, D. Are investors really reluctant to realize their losses? Trading responses to past returns and the disposition effect. Review of Financial Studies, v. 25, n. 8, p. 2485-2532, 2012.; COSTA JR. et al., 2013COSTA JR., N.; GOULART, M.; CUPERTINO, C., MACEDO, J. Jr.; DA SILVA, S. The disposition effect and investor experience. Journal of Banking and Finance, v. 37, n. 5, p. 1669-1675, 2013. http://dx.doi.org/10.1016/j.jbankfin.2012.12.007
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; RAU, 2014RAU, H. A. The disposition effect and loss aversion: do gender differences matter? Economics Letters, v. 123, n. 1,p . 33-36, 2014.; AHN, 2022AHN, Y. The Anatomy of the Disposition Effect: Which Factors Are Most Important? Finance Research Letters. Volume 44, January, 102040, 2022. https://doi.org/10.1016/j.frl.2021.102040
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). Este artigo contribui para a identificação do efeito disposição, ou seja, para a primeira categoria; e para a identificação de fatores, ou seja, terceira categoria.

Os resultados deste trabalho sugerem que o efeito disposição é afetado pelo retorno e pela volatilidade do Ibovespa na alta; e pelo retorno do Ibovespa na queda. Isso indica que a venda de ativos com retorno positivo é influenciada pela volatilidade. Além disso, mesmo ocorrendo seis eventos de circuit breaker no período estudado, o evento não apresentou significância estatística para explicar o efeito disposição. O entendimento do comportamento do investidor na pandemia é sempre um item que chama a atenção e, identifica-se que, no mês de março, há um aumento significativo de operações de compra e venda no mercado de ações. O índice de operações iniciadas pelo comprador aumentou 84% em relação ao mês anterior, enquanto o de operações iniciadas pelo vendedor aumentou menos, 70%. Para os demais meses, os valores são estatisticamente similares.

No restante do trabalho, a próxima seção conduz uma breve revisão da literatura sobre o tema. Na terceira seção, será apresentada a metodologia aplicada na pesquisa e, na seguinte, a base de dados utilizada e aplicada. Na quinta seção será apresentado os resultados e para finalizar, temos as conclusões na última seção.

1 TEORIA CLÁSSICA X FINANÇAS COMPORTAMENTAIS

A teoria clássica de finanças está baseada no equilíbrio de oferta e demanda do mercado, na racionalidade dos agentes e na eficiência de mercado. Rodolfo (2015RODOLFO, E. R. Finanças Comportamentais: Relevância do efeito atenção no mercado brasileiro de ações. Dissertação de Mestrado profissionalizante em Economia, Rio de Janeiro (Ibmec-RJ), 2015.) afirma que racionalidade é a escolha contínua de uma cesta de bens que traz maior utilidade esperada em cada situação. A eficiência de mercado origina-se do estudo de Fama (1970FAMA, E. F. Efficient capital markets: a review of theory and empirical work. The Journal of Finance, v. 25, n. 2, p. 383-417, Cambridge, May, 1970.), que afirma que os preços dos ativos financeiros refletem toda a informação disponível. O conjunto desses postulados se transformaram em uma ciência simples e elegante, descrita por leis, que visam auxiliar a explicação dos fenômenos nos mercados financeiros, seguindo o exemplo da física e de outras ciências exatas.

Nas últimas décadas, estudos apontam para um comportamento dos investidores diferente do previsto nos modelos. Kahneman e Tversky (1979KAHNEMAN, D.; TVERSKY A. Prospect theory: an analysis of decision under risk. Econometrica, 47(2), 263-292, 1979. http://dx.doi.org/10.2307/1914185
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) foram os pioneiros a abordar aspectos psicológicos que influenciam o comportamento dos indivíduos no mercado financeiro. Simon (1979SIMON, A. Rational decisions making in Business Organizations. The American Economic Review, v. 69, n. 4, p. 493-513, 1979.) sugere que os indivíduos não são estritamente racionais sob certas circunstâncias e que não necessariamente utilizam todas as informações disponíveis, ou da melhor maneira possível. Shleifer e Vishny (1997) abordam as limitações da estrutura do mercado financeiro, que nem sempre permitem que o processo de arbitragem seja capaz de promover a eficiência de mercado.

Com isso, a literatura destaca a importância do estudo dos vieses comportamentais dos agentes econômicos e, principalmente, a importância da incorporação dessas qualidades e defeitos, relacionados à tomada de decisão, nos modelos econômicos, visando melhorar a previsibilidade sobre o comportamento e a formação de preços dos ativos.

Hirshleifer (2015HIRSHLEIFER, D. Behavioral finance. Annual Review of Financial Economics, v. 7, p. 133-159, 2015. https://doi.org/10.1146/annurev-financial-092214-043752
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) afirma que as finanças comportamentais levam em conta as normas sociais e as atitudes morais, considerando como isso tudo afeta as decisões financeiras. A maior contribuição nessa área, principalmente do ponto de vista de explicação do comportamento dos investidores no mercado financeiro, decorre da Teoria das Perspectivas ou Teoria do Prospecto de Kahneman e Tversky (1979KAHNEMAN, D.; TVERSKY A. Prospect theory: an analysis of decision under risk. Econometrica, 47(2), 263-292, 1979. http://dx.doi.org/10.2307/1914185
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). Os autores encontraram três principais vieses cognitivos.

O primeiro sinaliza que, em situações de ganho, as escolhas preferidas são as mais seguras - efeito certeza. O segundo aponta para um desconforto maior com situações de perdas, quando comparadas a situações de ganho de mesma escala. Com isso, indivíduos preferem eventos mais arriscados em situações nas quais há a possibilidade de uma perda certa - efeito reflexo. Em suma, tomadores de decisão são avessos ao risco no domínio dos ganhos; e propensos ao risco no caso de perdas, em que a definição de ganhos ou perdas nos resultados partem de um importante conceito que os autores denominam de ponto de referência.

O terceiro viés mostra que indivíduos simplificam o processo de decisão, desconsiderando componentes idênticos das alternativas e considerando apenas os componentes diferentes. Com isso, verificam-se preferências não consistentes uma vez que a forma de apresentação altera o padrão de respostas - efeito isolamento.

A partir do efeito reflexo e do conceito de ponto de referência, Shefrin e Statman (1985SHEFRIN, H.; STATMAN, M. The disposition to sell winners too early and ride losers too long: Theory and evidence. The Journal of Finance, v. 40, n. 3, p. 777-790, 1985. http://dx.doi.org/10.1111/j.1540-6261.1985.tb05002.x
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) explicam o efeito disposição, verificado nos mercados financeiros, mostrando que variações do preço para um patamar abaixo do preço inicial de compra das ações (ponto de referência) estimulam a exposição ao risco, ou seja, a ampliação da posição ou a manutenção da carteira de ativos. O efeito certeza explica o comportamento verificado em variações do preço para patamares acima do preço inicial, ou seja, a tendência por escolhas mais seguras ou a realização do ganho.

Outros vieses importantes podem ser explicados a partir de Kahneman e Tversky (1979KAHNEMAN, D.; TVERSKY A. Prospect theory: an analysis of decision under risk. Econometrica, 47(2), 263-292, 1979. http://dx.doi.org/10.2307/1914185
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). A aversão à perda é o viés decorrente de escolhas que reagem de forma bastante intensa a uma perda do que a um ganho. A tendência a encontrar somente informações que confirmam a hipótese inicial é denominado de viés de confirmação e, em mercados financeiros, pode criar uma falsa sensação de segurança na seleção de alternativas de investimento. O efeito dotação, tendência a atribuir um valor maior para o ativo que possui em detrimento do valor financeiro justo, pode ser explicado pela aversão à perda desse referido ativo. Como consequência, investidores podem ter menor inclinação a alterar sua posição de investimento.

1.1 Efeito disposição

O efeito disposição é a preferência em auferir, de imediato, posições ganhadoras e postergar o reconhecimento de posições perdedoras. É uma das mais importantes anomalias estudadas em finanças comportamentais (SHEFRIN, 2010SHEFRIN, H. Behavioralizing finance. Hanover, MA: Now Publishers, 2010.; KAUSTIA, 2010KAUSTIA, M. Prospect theory and the disposition effect. Journal of Financial and Quantitative Analysis, v. 45, n. 3, p. 791-812, 2010.). Shefrin (2010SHEFRIN, H. Behavioralizing finance. Hanover, MA: Now Publishers, 2010.) afirma que os indivíduos possuem maior propensão a vender ativos que tenham aumentado de valor. Kaustia (2010KAUSTIA, M. Prospect theory and the disposition effect. Journal of Financial and Quantitative Analysis, v. 45, n. 3, p. 791-812, 2010.) afirma que além de contrariar o conceito de manter lucros e cortar prejuízos, o efeito disposição é prejudicial em termos de compensação de prejuízos pelas regras fiscais.

Barberis e Xiong (2009BARBERIS, N.; XIONG, W. What drives the disposition effect? An analysis of a long-standing preference-based explanation. Journal of Finance, v. 64, n. 2, p. 751-784, 2009. http://dx.doi.org/10.1111/j.1540-6261.2009.01448.x
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) sugerem que mesmo a teoria do prospecto, somada a vieses de comportamento, não explica o efeito disposição em um amplo conjunto de situações. Kahneman, Knetsch e Thaler (1991KAHNEMAN, D.; KNETSCH, J.; THALER, R. The Endowment Effect, Loss Aversion, and Status Quo Bias. Journal of Economic Perspectives, n. 5, p. 193-206, 1991.) sugerem que o viés de status quo, cujo conceito é similar ao de aversão à perda, que implica no fato de indivíduos preferirem manter suas posições, podem auxiliar no entendimento do efeito. Kaustia (2010KAUSTIA, M. Prospect theory and the disposition effect. Journal of Financial and Quantitative Analysis, v. 45, n. 3, p. 791-812, 2010.) também sugere que a contabilidade mental e a teoria do prospecto conseguem explicar o efeito disposição em várias situações.

No Brasil, Lopez et al. (2021LOPEZ, F. H.; PRATES, W. R.; VALCANOVER, V. M.; COSTA JR., N. C. A. Efeito Disposição em Investimentos: Investidores Individuais e Institucionais Agem de Maneira Diferente? Revista Eletrônica de Administração (Porto Alegre), v. 27, p. 210-231, 2021.) identificam que o efeito disposição afeta sempre, e de forma muito forte, os investidores individuais no processo de tomada de decisão. Os autores utilizaram uma amostra de ações negociadas na Bolsa entre 2012 e 2014. Prates, Costa Jr. e Santos (2019PRATES, W. R.; COSTA JUNIOR, N. C.; SANTOS, A. A. P. Efeito Disposição: Propensão à Venda de Investidores Individuais e Institucionais. Revista Brasileira de Economia, v. 73, n. 1, 2019.) utilizam uma base de dados com operações de todos os investidores no mercado de ações brasileiro, sendo analisadas mais de 60 milhões de transações de compra e venda, chegando ao resultado que pessoas físicas estão mais propensas ao efeito disposição e apresentam menor retorno médio em suas carteiras.

Costa Jr. et al. (2008) fazem um experimento de laboratório, que simula um mercado de ações, com alunos de graduação e verificam que a maioria dos indivíduos é afetada pelo efeito disposição. Costa Jr. et al. (2013) identificam que investidores experientes também são afetados pelo efeito disposição. Lucchesi, Yoshinaga e de Castro (2015LUCCHESI, E. P.; YOSHINAGA, C. E.; DE CASTRO, F. H. F. Jr. Disposition effect among Brazilian equity fund managers. Revista de Administração de Empresas, v. 55, n. 1, p. 26-37, 2015. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-759020150104
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) tentam explicar o efeito através da teoria do prospecto e do viés de regressão à média, utilizando informações de 51 fundos de ações do mercado brasileiro. Os autores identificam que a teoria do prospecto explica bem o processo de tomada de decisão.

2 SELEÇÃO DA AMOSTRA

O trabalho utiliza uma amostra que contempla todos os ativos negociados na B3 no período de 01/01/2020 até 31/05/2020. Os ativos e os respectivos dados financeiros foram coletados na base de dados da B3, assim como as respectivas transações e negociações intradiárias. São selecionadas todas as ações ordinárias, preferenciais e units, cujos dados de transações diários estavam disponíveis para o intervalo de tempo do estudo.

A base da B3 é composta por três partes. As primeiras duas partes incluem dados sobre as ordens de compra e venda dos participantes que incluem as negociações intradiárias. A terceira parte contém ações efetivamente negociadas, após um ganho, perda ou uma não variação de preço. Desta base de dados as transações são classificadas em iniciadas pelo comprador ou iniciadas pelo vendedor. A base possui um total de cerca de 300 milhões de operações de compra e venda e contempla todas as operações do mercado acionário disponibilizado na B3.

Além disso, para identificar variáveis econômicas financeiras que influenciam o efeito disposição, seleciona-se as seguintes variáveis: base monetária, taxa de câmbio à vista, expectativa da taxa de câmbio do boletim Focus do Banco Central (mediana), taxa de juros do DI de 1 dia de 3 meses, expectativa da Selic do boletim Focus do Banco Central, CDS de 5 anos do Brasil, retorno do Ibovespa, retorno do Ibovespa ao quadrado (proxy da volatilidade), juros de títulos públicos americanos de 10 anos, inclinação 5-2 anos do DI de 1 dia (diferença diária entre a taxa de juros de 5 anos e a taxa de juros de 2 anos), Índice de Commodity CRB e próprias variáveis dependentes defasadas. O modelo empírico com as variáveis explicativas da regressão linear será selecionado pelo critério VIF e pelo método stepwise.

2.1 Métricas para o efeito disposição

A base de dados compreende informações de preços e hora de negociação em milissegundo. A partir daí, identifica-se se a operação foi iniciada pelo comprador ou pelo vendedor e se o preço no momento da realização dessa operação é maior (positivo), menor (negativo) ou sem variação (neutro), em relação ao preço da operação imediatamente anterior. Com isso, constrói-se uma métrica de iniciador por retorno que é constituída por duas partes. A primeira é o iniciador da operação, que pode ser o comprador (Compra), o vendedor (Venda), ou não identificado (Neutro). A segunda parte é a variação de preço da transação em relação à imediatamente anterior, que pode ser positivo (Pos), negativo (Neg) ou sem variação (Zero). É importante destacar que o iniciador da operação é considerado não identificado (Neutro) nos casos em que a oferta de venda e a oferta de compra aparecem no livro de ofertas no mesmo milissegundo e são imediatamente executadas. Cerca de 1,3% das operações no período foram classificadas como não identificada.

A métrica iniciador por retorno gera os seguintes indicadores: i) Neutro_Zero é a quantidade de operação sem iniciador após uma variação zero no preço; ii) Neutro_Neg é a quantidade de operação sem iniciador após uma queda no preço; iii) Neutro_Pos é a quantidade de operação sem iniciador após alta de preço; iv) Compra_Zero é a quantidade de operação iniciada pelo comprador após uma variação zero no preço; v) Compra_Neg é a quantidade de operação iniciada pelo comprador após uma queda no preço; vi) Compra_Pos é a quantidade de operação iniciada pelo comprador após uma alta do preço; vii) Venda_Zero é a quantidade de operação iniciada pelo vendedor após uma variação zero no preço; viii) Venda_Neg é a quantidade de operação iniciada pelo vendedor após uma queda no preço; e ix) Venda_Pos é a quantidade de operação iniciada pelo vendedor após uma alta do preço.

A partir desta nova base de dados, cria-se métricas para identificação do efeito disposição nos dados intradiários explicitados nas 4 equações abaixo:

V e n d a p o s V e n d a P o s + C o m p r a P o s (1)

O índice reflete a proporção de venda no dia quando o mercado sobe (VendaPos) em relação ao total de operações de compra e venda no dia quando o mercado sobe. Se há efeito disposição, o indivíduo tende a vender mais do que comprar em situações de alta de mercado, sells at gains. Esse índice é denominado de Efeito Disposição de Alta (EA).

C o m p r a N e g V e n d a N e g + C o m p r a N e g (2)

O índice reflete a proporção de compra no dia quando o mercado cai (CompraNeg)em relação ao total de operações de compra e venda no dia quando o mercado cai. Se há efeito disposição, o indivíduo tende a comprar mais (por exemplo, para diminuir o preço médio) em situações de queda de mercado, buys at losses. Esse índice é denominado de Efeito Disposição de Queda (EQ).

V e n d a Z e r o + V e n d a P o s V e n d a P o s + V e n d a N e g + V e n d a Z e r o (3)

O índice reflete a proporção de venda no dia quando o mercado sobe ou permanece de lado em relação ao total de operações de venda no dia em qualquer estado do mercado (alta, queda e movimento de lado). Se há efeito disposição, o indivíduo tende a ter uma menor proporção de vendas em momentos de queda, no sells at loss. Esse índice é denominado de Efeito Disposição de Venda (EV).

C o m p r a Z e r o + C o m p r a N e g C o m p r a Z e r o + C o m p r a N e g + C o m p r a P o s (4)

O índice reflete a proporção de compra no dia quando o mercado cai ou permanece de lado em relação ao total de operações de compra no dia em qualquer estado do mercado (alta, queda e movimento de lado). Se há efeito disposição, o indivíduo tende a ter uma menor proporção de compras em momentos de alta, no buys at gains. Esse índice é denominado de Efeito Disposição de Compra (EC).

3 RESULTADOS DO EFEITO DISPOSIÇÃO

A Tabela 1 apresenta, para cada métrica de iniciador por retorno e em cada um dos 5 meses de estudo, a quantidade de operações com ações.

Tabela 1
Quantidades de Transações com Ações para as Métricas Estudadas de Janeiro a Maio de 2020

Observa-se que no mês de março há um aumento médio de 77% em todas as operações com ações na B3 em relação a fevereiro; e que essa quantidade de operações diminui nos meses seguintes. Isso sugere que o período de conhecimento e declaração da pandemia atraiu investidores para bolsa em busca de saída ou da oportunidade de entrada. Groff (2021GROFF, G. Comportamento do mercado de capitais e dos investidores ao longo da pandemia de COVID-19. TCC, Universidade de Caxias do Sul, 2021. Disponível em: https://repositorio.ucs.br/xmlui/bitstream/handle/11338/10014/TCC%20Gabriel%20Grillo%20Groff.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em:25 mai.2022.
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) compara o comportamento de investidores que já vivenciaram crises financeiras com os que ainda não vivenciaram. Segundo o autor, os primeiros tendem a utilizar o momento como uma oportunidade de entrada ou aumento de posição, enquanto os demais acabam desistindo de suas aplicações, o que gera aumento do volume de transações.

Ainda no mês de março, o índice de operações iniciadas pelo comprador aumentou 84% em relação ao mês anterior, enquanto o de operações iniciadas pelo vendedor aumentou menos, 70%. O teste t de diferença de médias não rejeita a hipótese que o total do número de operações iniciadas pelo comprador é igual ao de operações iniciadas pelo vendedor durante todo o período. Outro ponto interessante a destacar é que, avaliando todas as métricas iniciador por retorno, verificamos que a maior quantidade de operações iniciadas pelo vendedor ou iniciadas pelo comprador é quando a variação no preço é zero, ou seja, Venda_Zero ou Compra_Zero, o que sugere que esse é o momento em que o investidor prefere tomar sua decisão.

Conceitualmente, as métricas de Venda_Neg e Compra_Pos não são situações de efeito disposição, pois é o comportamento esperado, vender após um resultado negativo e comprar após uma tendência de alta, assim como as métricas Neutro_Zero, Neutro_Neg e Neutro_Pos. Considerando a coluna percentual total da tabela que apresenta o somatório de cada linha dividido pelo somatório de todas as linhas, significa que 27,6% das operações não apresentam características do efeito disposição. Se considerarmos ainda que as métricas Compra_Zero e Venda_Zero são neutras, ou seja, de difícil inferência de vieses, podemos afirmar, com 90% de certeza, que não há evidência de efeito disposição nas operações intradiárias do mercado brasileiro em março e, de forma similar, em todos os meses estudados, pois as métricas Compra_Neg e Venda_Pos representam 6,3% e 5,6%, respectivamente. Entretanto, quando avaliamos essas duas métricas por ação em cada dia, identificamos situações que elas correspondem a 100% das operações no dia. A Tabela 2 apresenta a estatística descritiva dessa medida por mês. Há um aumento na média destes dois indicadores a partir de março. O teste t de médias rejeita a hipótese de igualdade da média de março contra a do mês anterior.

Tabela 2
Estatística descritiva do percentual das Métricas Compra_Neg e Venda_Pos em relação ao total de Operações por Ação de Janeiro a Maio de 2020

A Tabela 3 sugere que algumas ações estão mais sujeitas ao efeito no intradiário. Os ativos da Tabela são selecionados compreendendo diferentes condições de liquidez, em relação ao total de liquidez do mercado, para todo o período e somente no mês de março.

Tabela 3
Ativos com maior percentual das Métricas Compra_Neg e Venda_Pos considerando diferentes condições de liquidez em todo o período e considerando o mês de março.

Ao selecionarmos os ativos com número de negócios no segundo quartil, liquidez similar ou maior que a média de liquidez de todas as ações, verificamos que dos dez primeiros ativos com maior percentual das Métricas Compra_Neg e Venda_Pos, todos são BDRs ou Units. O mesmo acontece quando variamos o critério de liquidez das ações para o primeiro e terceiro quartil, com objetivo de avaliar as métricas. No mês de março, os vinte primeiros ativos também são BDRs ou Units. O resultado sugere que esses ativos são mais sujeitos ao efeito disposição.

Para avaliar o efeito disposição dos investidores no mercado de ações brasileiro, seleciona-se cinco indicadores macroeconômicos pelo critério VIF e pelo método stepwise: retorno do Ibovespa, retorno do Ibovespa ao quadrado, expectativa do câmbio, CRBLS e taxa de juros de 3 meses. De acordo com Draper e Smith (1998DRAPER, N.R.; SMITH, H. Applied Regression Analysis. 3th. Ed.New York: Wiley, 1998. https://doi.org/10.1002/9781118625590
https://doi.org/10.1002/9781118625590...
), valores de VIF superiores a 10 possivelmente causam sérias divergências na estimação dos coeficientes. As variáveis dependentes do nosso modelo (EA, EQ, EV e EC) são as métricas sugeridas neste trabalho para medir o efeito disposição. Cada variável dependente, em cada dia, é a média das medidas individuais de todas as ações. O modelo empírico é dado por:

E D t = α + ß 1 I R t + ß 2 I R t 2 + ß 3 C R $ M e d t + ß 4 C R B L S t + ß 5 T 3 m t + ε t (5)

Onde ED é o efeito disposição, IR é o retorno do Ibovespa, IR 2 é a proxy da volatilidade do Ibovespa, CR$Med é a mediana da expectativa do câmbio no relatório Focus do Banco Central, CRBLSé o índice de commodities e T3m é a taxa de juros 3 meses. Além disso, inclui-se a dummy ICB binária, para analisar os eventos de Circuit Breaker e a própria variável defasada, para verificar se a tomada de decisão do investidor é influenciada pelo estado anterior da variável, processo autorregressivo.

Para analisar a existência do efeito disposição, o modelo será separado em quatro equações de modo que sejam divididas em efeito alta, queda, venda e compra. Em concordância com o referencial teórico estudado, os investidores tenderiam a uma maior propensão a vender nos momentos de alta - cuja proxy é o retorno positivo do Ibovespa, retorno positivo das commodities e expectativa de queda do câmbio, da volatilidade e da taxa de juros - para realização dos ganhos e tenderiam a manter a carteira nos momentos de queda.

A Figura 1 apresenta o comportamento dos 4 tipos de efeito disposição construídos neste trabalho. O movimento do efeito alta sugere que ações com retorno positivo tiveram uma maior quantidade de vendas do que de compras no início de março de 2020. O movimento do efeito venda sugere que no primeiro dia útil de março, dia que, apesar das 2 confirmações de Covid-19 no Brasil, o Ibovespa fechou em forte alta de 2%, o critério utilizado pelo investidor para escolha das ações a serem vendidas foi ações com retorno positivo ou retorno zero, em detrimento das ações com retorno negativo. Entretanto, no dia seguinte, em que descobriu-se os primeiros casos de Covid-19 na Argentina e no Chile e o Ibovespa fechou em queda de 1,11%, o critério utilizado foi a venda de ações com retorno negativo. Esses dois dias divergem do comportamento da variável ao longo do tempo e sugerem que as alterações das métricas ocorrem pelo fato de o investidor selecionar o tipo de ativo a partir do comportamento do mercado.

Figura 1
Tipos de Efeito Disposição

O teste t de médias sugere que a média do Efeito Alta do início de março até o dia 11, ou durante todo o mês de março, é estatisticamente diferente a 95% de nível de confiança. Para as demais métricas, não são constatadas diferenças de comportamento.

3.1 Regressão

Com as variáveis selecionadas, temos três modelos de regressões múltiplas: o modelo da Equação 5, o modelo da Equação 5 com a variável dependente com defasagem, foram testadas as defasagens de 1, 5 e 21 dias úteis, e o modelo da Equação 5 com a variável dummy de dia com circuit breaker. A Tabela 4 mostra que a variável retorno do Ibovespa é estatisticamente significativa ao efeito disposição alta e queda ao nível de significância de 1%, em consonância com Hatem (2017HATEM, A. An examination of the relationship between the disposition effect and stock return, volatility, and trading volume: the evidence in US stock markets. International Journal of Managerial and Financial Accounting, Inderscience Enterprises Ltd, vol. 9, n. 3, p. 242-262, 2017.). Este resultado sugere que, quando o retorno do índice é positivo, o investidor está mais propenso a efetuar a venda de ativos com retorno positivo e, no caso de retorno negativo do índice, o investidor tende a comprar ativos com retorno negativo.

Em relação aos efeitos das variáveis macroeconômicas estudadas, a proxy da volatilidade do Ibovespa apresenta significância estatística a um nível de 1%, apenas no efeito alta (EA) e em todas as variantes da regressão. O resultado sugere que, quanto maior a volatidade, maior a quantidade de vendas de ativos com retorno positivo. Isso corrobora os resultados de Dacey e Zielonka (2013DACEY, R.; ZIELONKA, P. High Volatility Eliminates the Disposition Effect in a Market Crisis. Decyzje, n. 20, p. 5-20, 2013.) e Vasudevan (2022VASUDEVAN, V. Some Gains Are Riskier Than Others: Volatility Changes, Belief Revisions, and the Disposition Effect. Available at SSRN, 2022. https://ssrn.com/abstract=3363580 e http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.3363580
https://ssrn.com/abstract=3363580...
). No caso do primeiro artigo, os autores verificam que em momentos de crise, a volatilidade faz com que investidores se desfaçam de suas posições, sejam ganhadoras ou perdedoras. Com isso, os autores chamam atenção ao fato de que, no caso de perda, o comportamento é contrário ao efeito disposição. O sinal é positivo para todas as demais variáveis dependentes, embora não significativo. Ben-David e Hirshleifer (2012) afirmam que o efeito disposição pode ser explicado pela reversão de expectativas do investidor. O resultado da regressão sugere que o retorno e a volatilidade são as variáveis que incentivam essa reversão.

Tabela 4
Resultados MQO

A não significância das variáveis de defasagem sugerem que o efeito disposição não é um movimento autorregressivo, ou seja, a série passada de ocorrência do viés não induz o novo comportamento.

É possível analisar, através dos resultados obtidos, que a variável independente denominada retorno do Ibovespa possui significância em efeito queda (EQ); e não possui, no efeito venda (EV). Isso significa que as vendas, após um movimento de alta, são significativas quando comparadas com a alternativa compra; e não são, quando comparadas com vendas em movimentos de queda ou em mercados neutros. Raciocínio similar se aplica ao efeito alta e efeito compra, ou seja, as compras após movimento de baixa são significativas, quando comparadas com as vendas; e não são, quando comparadas com as compras em movimentos de altas ou em mercados neutros. Esses resultados vão ao encontro de Braga (2021BRAGA, R. O Efeito das Notícias Negativas Sobre o Comportamento dos Investidores: Um Estudo em Tempos de Covid-19, XXI USP International Conference in Accounting, 2021.), que mostra que as pessoas expostas às notícias negativas decorrentes da pandemia de Covid-19 manifestaram tendência maior ao efeito disposição.

O R2 ajustado para ambas as regressões do efeito alta e efeito queda, respectivamente, é de 0,36 e 0,24. Constatou-se ausência de multicolinearidade em todas as regressões, mas o teste Breusch-Pagan indica que os resíduos não possuem variância constante, ou seja, a amostra apresenta heterocedasticidade. Por conta disso, roda-se uma nova regressão pelo procedimento de Newey-West e encontra-se resultados semelhantes. O método consiste em realizar uma correção de heterocedasticidade e de autocorrelação e os resultados encontrados são similares. Os resíduos da regressão não são normalmente distribuídos; porém, acredita-se que o tamanho da amostra é suficientemente grande (ISLAM, 2018ISLAM, M. Sample Size and Its Role in Central Limit Theorem (CLT). Computational and Applied Mathematics Journal, v. 4, n. 1, p. 1-7, 2018.).

O efeito venda e o efeito compra não foram explicados por nenhumas das variáveis macroeconômicas estudadas, sugerindo que o movimento pode ser influenciado apenas pelo aspecto comportamental ou a omissão de alguma variável macroeconômica importante.

A dummy ICB não apresentou significância em nenhuma das 4 regressões, o que indica que o evento dias com Circuit Breaker não influenciaram o efeito disposição.

4 CONCLUSÃO

O objetivo deste trabalho é avaliar a ocorrência do efeito disposição, transação a transação, no mercado brasileiro de ações durante a pandemia de COVID-19, através de um estudo exploratório, sugerir métricas de identificação do efeito e identificar variáveis que podem explicar tal efeito.

A base de dados compreende todos os ativos negociados na B3 no período de 01/01/2020 até 31/05/2020, com todas as respectivas negociações intradiárias por milissegundo.

Observa-se que no mês de março de 2020, há um aumento médio de 77% em todas as operações com ações na B3 em relação a fevereiro e que essa quantidade de operações diminui nos meses seguintes. Apenas no mês de março, o índice de operações iniciadas pelo comprador aumentou 84% em relação ao mês anterior, enquanto o de operações iniciadas pelo vendedor aumentou menos, 70%. Para os demais meses, os valores são estatisticamente similares.

Os resultados indicam que os ativos BDRs e Units são mais sujeitos ao efeito disposição, isto é, verifica-se um percentual maior de quantidades de transação iniciada pelo comprador após uma queda no preço; e de quantidades de transação iniciada pelo vendedor após uma alta do preço. Em relação ao experimento da regressão, o retorno do Ibovespa é positivo e estatisticamente significativo para explicar o efeito disposição alta e efeito disposição queda ao nível de significância de 1%. O resultado sugere que, quando o retorno do índice é positivo, o investidor está mais propenso a efetuar a venda de ativos com retorno positivo e, no caso de retorno negativo do índice, o investidor tende a comprar ativos com retorno negativo. Além disso, os resultados sugerem que a venda de ativos com retorno positivo é influenciada pela volatilidade. O trabalho contribui com a literatura que busca identificar fatores que possam explicar o efeito disposição e que, basicamente, seguem a linha de que o investidor toma sua decisão a partir de variáveis do mercado financeiro. Os resultados deste trabalho apontam para a direção de que a decisão considera o retorno e a volatilidade como variáveis, que incentivam uma reversão de expectativa e um direcionamento para o efeito disposição.

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  • 1
    Recebido em 16/8/2022, aceito em 3/7/2023.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Out 2023
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2023

Histórico

  • Recebido
    16 Ago 2022
  • Aceito
    03 Jul 2023
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