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Populismo, autoritarismo e resistência democrática: as cortes constitucionais no jogo do poder

Populism, authoritarianism, and institutional resistance: constitutional courts in the game of power

Resumo

O constitucionalismo democrático foi a ideologia vitoriosa do século XX, tendo derrotado as alternativas que se apresentaram ao longo das décadas: o comunismo, o fascismo, o nazismo, os regimes militares e os fundamentalismos religiosos. Nessas primeiras décadas do século XXI, no entanto, alguma coisa parece não estar indo bem, num quadro que vem sendo descrito como de recessão democrática. O artigo identifica três fenômenos que estão por trás desse processo histórico: o populismo, o extremismo e o autoritarismo, assim como suas causas políticas, econômico-sociais e culturais-identitárias. Após uma análise do contexto mundial, o texto coloca o foco na experiência brasileira dos últimos anos, narrando as ameaças à legalidade constitucional e a reação das instituições. Na parte final discutem-se os limites e possibilidades das cortes constitucionais no seu papel de defesa do constitucionalismo e da democracia.

Palavras-chave:
Constitucionalismo; Democracia; Populismo; Extremismo; Autoritarismo; Supremas cortes; Cortes constitucionais

Abstract

Democratic constitutionalism was the victorious ideology of the 20th century, having defeated the alternatives that presented themselves over the decades: communism, fascism, Nazism, military regimes, and religious fundamentalism. However, in these first decades of the 21st century, something seems not to be going well. Some describe it as a democratic recession. The article identifies three phenomena that lie behind this historical process: populism, extremism, and authoritarianism, as well as their political, economic-social, and cultural-identity causes. Then, after an analysis of the world context, the article focuses on the Brazilian experience in recent years, narrating the threats to constitutional legality and the reaction of institutions. In the final part, the limits and possibilities of the constitutional courts in their role of defending constitutionalism and democracy are discussed.

Keywords:
Constitutionalism; Democracy; Populism; Extremism; Authoritarianism; Supremas cortes; Cortes constitucionais

I. Introdução1 1 Algumas ideias e passagens dos capítulos II e III deste texto foram publicadas na Revista do Cebri - Brazilian Journal of International Affairs 1/33, 2022.

O texto que se segue procura fazer uma reflexão objetiva acerca do estado da arte da democracia no mundo e no Brasil. De início, assenta-se a ideia de democracia constitucional, com a demonstração de que foi ela a ideologia vitoriosa do século XX. Em seguida passa-se à análise do desgaste da democracia no mundo contemporâneo, num contexto que vem sendo referido como recessão democrática, democracias iliberais e constitucionalismo abusivo, em meio a outras qualificações depreciativas. O diagnóstico dos problemas do momento atual passa pela identificação de três fenômenos conceitualmente distintos, mas frequentemente associados, que são o populismo, o extremismo e o autoritarismo, bem como suas causas políticas, econômico-sociais e culturais-identitárias. Na sequência, abre-se um capítulo específico sobre o estado da democracia no Brasil, notadamente após as eleições de 2018 e, já agora, às vésperas das eleições de 2022. O capítulo final discute como as democracias sobrevivem, com ênfase no papel das cortes supremas ou cortes constitucionais, narrando histórias de sucesso e de fracasso. Em desfecho, procura-se identificar os fatores por trás dos casos em que as cortes constitucionais foram capazes de proteger a democracia em face do populismo autoritário.

II. A democracia no mundo: a ascenção do populismo autoritário

1. A democracia e suas três dimensões

O constitucionalismo democrático foi a ideologia vitoriosa do século XX. Nesse arranjo institucional fundiram-se duas ideias que não se confundem, quer nas suas origens, quer no seu conteúdo: constitucionalismo e democracia. Constitucionalismo remonta às revoluções liberais dos séculos XVII e XVIII e significa, essencialmente, Estado de direito, poder limitado e respeito aos direitos fundamentais. Sua consolidação nos países da Europa e nos Estados Unidos se deu ao longo do século XIX. No Brasil, a Constituição de 1824 possuía alguns traços liberais, mas, na sua essência, trazia a marca da origem absolutista imprimida por D. Pedro I, ainda que atenuada, substancialmente, ao longo do segundo reinado. Democracia, por sua vez, desde suas origens gregas, significa participação popular no exercício do poder, soberania do povo, governo da maioria. O ideal democrático apenas se consolida, verdadeiramente, quando já avançado o século XX, com a consagração do sufrágio universal. Somente então viram-se inteiramente superadas as restrições à participação de todos no processo eleitoral, como as de renda, religião, raça e gênero.

Nada obstante, a maior parte das democracias do mundo reserva uma parcela de poder político para um órgão que não é eleito, mas que extrai sua legitimidade da competência técnica e da imparcialidade. Trata-se do Poder Judiciário, em cujo topo, no caso brasileiro, está o Supremo Tribunal Federal. Desde o final da 2ª Guerra Mundial, praticamente todos os Estados democráticos adotaram um modelo de supremacia da Constituição, tal com interpretada por uma suprema corte ou por um tribunal constitucional, encarregados do controle de constitucionalidade das leis e atos do Poder Executivo. Foi a prevalência do modelo americano de constitucionalismo, com a superação da fórmula que predominara na Europa, até então, que era a supremacia do Parlamento. Tais cortes e tribunais podem declarar a inconstitucionalidade de atos do Legislativo e do Executivo, tendo como um de seus principais papeis arbitrar as tensões que muitas vezes existem entre constitucionalismo e democracia - i.e., entre direitos fundamentais e soberania popular. Cabe a essas cortes e tribunais protegerem as regras do jogo democrático e os direitos de todos contra eventuais abusos de poder por parte da maioria, bem como resolver impasses entre os Poderes. Em muitas partes do planeta, elas têm sido um importante antídoto contra o autoritarismo (ISSACHAROFF, 2015ISSACHAROFF, Samuel. Fragile democracies: contested power in the era of Constitutional Courts. Cambridge: Cambridge University Press, 2015., p. i ).

Em suma: o Estado democrático de direito, como referido no art. 1º da Constituição brasileira, é um regime político fundado na soberania popular, com eleições livres e governo da maioria, bem como em poder limitado, Estado de direito e respeito aos direitos fundamentais de todos, aí incluído o mínimo existencial. Sem terem as suas necessidades vitais satisfeitas, as pessoas não têm condições de ser verdadeiramente livres e iguais. Há também um elemento emocional, humanístico, na democracia, que é o sentimento de pertencimento, de participação efetiva em um projeto coletivo de autogoverno, em que todos e cada um merecem igual consideração e respeito (DWORKIN, 2008DWORKIN, Ronald. Is democracy possible here. Princeton: Princeton University Press, 2008., p. iii, 1997, p. 131). Quem se sente excluído não tem razão para apoiá-la e é presa fácil de tentações populistas e autoritárias.

A democracia contemporânea é feita de votos, direitos e razões. Isso dá a ela três dimensões diversas: a) a democracia representativa, que tem como elemento central o voto e como protagonistas o Congresso Nacional e o Presidente da República, que são agentes públicos eleitos pela vontade popular; b) a democracia constitucional, que tem como elemento central os direitos fundamentais e como protagonista o Poder Judiciário, em cuja cúpula está o Supremo Tribunal Federal2 2 Para deixar claro, a corte suprema dá a última palavra, mas não é a “dona” da Constituição: sua interpretação deve levar em conta os demais atores institucionais e o sentimento social. V. Barroso (2018, p. 2219): “A jurisdição constitucional deve funcionar como uma etapa da interlocução mais ampla com o legislador e com a esfera pública, sem suprimir ou oprimir a voz das ruas, o movimento social e os canais de expressão da sociedade. Nunca é demais lembrar que o poder emana do povo, não dos juízes”. ; e c) a democracia deliberativa, que tem como elemento central o debate público, o oferecimento de razões, de justificações para as decisões políticas, e como protagonista a sociedade civil (BARROSO, 2018_______. Contramajoritário, representativo e iluminista: os papeis das cortes constitucionais nas democracias. Revista Direito e Práxis, vol. 9, n. 4, p. 2171-2228, 2018., p. 2200). De fato, a democracia não se limita ao momento do voto. Ela se manifesta, também, no respeito aos direitos fundamentais de todos, inclusive das minorias. Os derrotados no processo político majoritário não perdem a condição de sujeitos de direito e de participantes do processo político-social. Além disso, a democracia é feita de um debate público contínuo, que deve acompanhar as decisões políticas. Um debate aberto a todas as instâncias da sociedade, o que inclui movimentos sociais, imprensa, universidades, sindicatos, associações, cidadãos comuns, autoridades etc.

2. A democracia como ideologia vitoriosa do século XX e a recessão democrática atual

Como assinalado logo ao início, o constitucionalismo democrático prevaleceu historicamente, em boa parte do mundo, sobre os projetos alternativos que com ele concorreram ao longo do século XX. Foram eles o comunismo, após a Revolução Russa de 1917; o fascismo, irradiado a partir da Itália de Mussolini, com início nos anos 20; o nazismo, sob a liderança de Hitler na Alemanha, a partir dos anos 30; os regimes militares, que dominaram a América Latina, a Ásia, a África e mesmo alguns países europeus no segundo pós-guerra; e o fundamentalismo religioso, que teve como marco a revolução dos aiatolás no Irã, em 1979. O modelo vencedor consagrou a centralidade e a supremacia da Constituição - e não do partido, das Forças Armadas ou das escrituras religiosas. Alguns autores chegaram mesmo a falar no fim da história, celebrando a democracia liberal como o ponto culminante da evolução institucional da humanidade (FUKUYAMA, 1989_______. The end of history. The National Interest, n. 16, p. 3-18, 1989., 1992)3 3 V. tb. Mounk (2020). .

De fato, foram diversas as ondas de democratização (HUNTINGTON, 1991HUNTINGTON, Samuel P. The third wave: democratization in the late twentieth century. Journal of Democracy, vol. 2, n. 2, 1991.)4 4 Huntington (1991) foi o primeiro a utilizar a ideia de “ondas de democratização”: a primeira onda teria ocorrido na primeira metade do século XIX, quando os países crescentemente foram adotando a ideia de sufrágio universal; a segunda se deu após o fim da Segunda Guerra Mundial; e a terceira a partir dos anos 70. O texto é anterior ao florescimento de democracias após o fim do modelo comunista. . Uma delas se deu ao final da Segunda Guerra Mundial, num ciclo que incluiu a Alemanha, a Itália, o Japão e mesmo o Brasil, que, no entanto, voltou a cair no autoritarismo nos anos 60. A segunda onda veio nos anos 70, atingindo países como Portugal, Espanha e Grécia. Uma terceira onda se formou nos anos 80, em países da América Latina, como Brasil, Chile, Argentina, Uruguai. E, logo à frente, com a queda do muro de Berlim, os anos 90 assistiram à democratização e reconstitucionalização dos países da Europa Central e Oriental, incluindo Hungria, Polônia e Tchecoslováquia. Também nos anos 90, com o fim do Apartheid, veio a democratização da África do Sul e de outros países no continente. Na virada para o século XXI, mais de uma centena de países adotara esse modelo, de acordo com a Freedom House5 5 Em 1900, nenhum país do mundo tinha seus governantes eleitos por sufrágio universal. Em dezembro de 1999, 119 países poderiam ser identificados como democráticos. V. Freedom House (1999) e Barroso (2019a). .

Apesar do sucesso narrado na breve retrospectiva feita acima, nos últimos tempos alguma coisa parece não estar indo bem. Há uma onda populista, extremista e autoritária atingindo inúmeras partes do mundo, levando muitos autores a se referirem a uma recessão democrática (DIAMOND, 2015DIAMOND, Larry. Facing up to the democratic recession. Journal of Democracy, n. 26, p. 141, 2015.) ou a um retrocesso democrático (HUQ; GINSBURG, 2018HUQ, Aziz; GINSBURG, Tom. How to lose a constitutional democracy. UCLA Law Review, n. 65, 2018., p. 91 e s.), como já mencionado anteriormente. Os exemplos foram se acumulando ao longo dos anos: Hungria, Polônia, Turquia, Rússia, Geórgia, Ucrânia, Bielorrússia, Filipinas, Venezuela, Nicarágua e El Salvador, entre outros. Em todos esses casos, a erosão da democracia não ocorreu por golpe de Estado, sob as armas de algum general e seus comandados. Nos exemplos acima, o processo de subversão democrática se deu pelas mãos de presidentes e primeiros-ministros inicialmente eleitos pelo voto popular (LEVITSKY; ZIBLATT, 2018LEVITSKY, Steven; ZIBLATT, Daniel. How democracies die. New York: Crown, 2018., p. 3).

Em seguida, paulatinamente, vêm as medidas que pavimentam o caminho para o autoritarismo: concentração de poderes no Executivo, perseguição a líderes de oposição, mudanças nas regras eleitorais, cerceamento da liberdade de expressão, enfraquecimento das cortes supremas com nomeação de juízes submissos e expurgo dos independentes, novas constituições ou emendas constitucionais com abuso de poder pelas maiorias, inclusive para ampliação do período de permanência no poder, com reeleições sucessivas6 6 Sobre o tema, v. o amplo levantamento feito por Versteeg et al. (2020), onde registrou: “Globally, no fewer than one-third of the incumbents who reached the end of their prescribed term pursued some strategy to remain in office”. . O grande problema com a construção dessas democracias iliberais7 7 Aparentemente, o termo foi utilizado pela primeira vez por Zakaria (1997). Na prática política contemporânea, foi encampado pelo líder autoritário húngaro Viktor Orbán. é que cada tijolo, individualmente, é colocado sem violação direta à ordem constitucional vigente. O conjunto final, porém, resulta em supressão de liberdades, de eleições verdadeiramente livres e competitivas, bem como a fragilização das instituições independentes e dos árbitros imparciais. Este processo tem sido caracterizado como constitucionalismo abusivo (LANDAU, 2013LANDAU, David. Abusive Constitutionalism. UC Davis Law Review, v. 47, n. 1, p. 189-260, 2013.) ou legalismo autocrático (SCHEPPELE, 2018SCHEPPELE, Kim Lane. Autocratic legalism. The University of Chicago Law Review, n. 85, p. 545, 2018.).

3. Três fenômenos diversos: populismo, extremismo e autoritarismo

Há três fenômenos distintos em curso em diferentes partes do mundo: a) o populismo; b) o extremismo; e c) o autoritarismo. Eles não se confundem entre si, apesar de muitas superposições, mas quando se manifestam simultaneamente - o que tem sido frequente - trazem graves problemas para a democracia constitucional. Populismo é um conceito que vem sendo intensamente revisitado nos últimos tempos, com a conotação frequentemente negativa de manipulação de medos, necessidades e anseios da população. Como regra, oferece soluções simplórias - e erradas - para problemas complexos, atendendo demandas imediatas que cobram preço alto no futuro8 8 A esse propósito, escreveu Issacharoff (2020, p. 1135): “Populism tends to pitch itself to base impulses, to desires for immediate reward, to disregard for the future, whether it be the destruction of the rainforest, the prorogation of Parliament, or the momentary inflation of the currency”. . O extremismo caracteriza-se pela intolerância, pela inaceitação do diferente e pela rejeição ao pluralismo político, valendo-se comumente de ameaças de violência. E o autoritarismo envolve a repressão truculenta aos opositores, a intimidação ou cooptação das instituições de controle e diferentes formas de censura, permitindo o mando autoritário e sem accountability. A seguir, uma breve nota sobre cada uma dessas disfunções.

O populismo tem um núcleo ideológico bastante tênue, que é a divisão artificial da sociedade em “nós, o povo” e “eles, a elite”. Na maioria dos casos, tem a marca de lideranças personalistas e carismáticas, que chegam ao poder com um discurso anti-establishment - mesmo quando claramente fazem parte dele - e se apresentando como “diferentes de tudo isso que está aí”. O populismo possui, ademais, uma natureza antipluralista, na medida em que seus líderes se apresentam como os únicos representantes legítimos do povo, com exclusão de todas as outras forças políticas. Em rigor, não se trata de uma ideologia, verdadeiramente, porque é imperativo que venha acompanhado de alguma doutrina política que lhe é externa, seja conservadora, liberal ou socialista. De fato, populismos podem ser de esquerda (Perón, Evo Morales, Rafael Correa) ou de direita (Orbán, Erdogan, Duterte). Dentro dessa visão, o populismo é um arremedo de ideologia, que precisa ser combinada com outra, constituindo antes uma estratégia de discurso e de ação. Com frequência, vem associado a uma postura nacionalista e à exploração do sentimento religioso. Outra característica é a necessidade de apontar um inimigo, para embasar o discurso antagônico e beligerante, seja contra o comunismo, a globalização, os judeus, a imigração, os muçulmanos, um partido, um líder político ou qualquer outro que a ocasião ofereça9 9 Sobre a definição e caracterização do populismo, v. Moffitt (2020, p. 10 e s.), Mudde (2004, p. 543) e Muller (2016). .

O extremismo político10 10 O extremismo pode se manifestar em diferentes domínios da vida, inclusive no plano religioso, como documentam inúmeros eventos históricos, da Inquisição ao Jihadismo. se manifestou, ao longo da história, em ambos os campos ideológicos11 11 À esquerda, por exemplo, com Stalin e Pol Pot, e à direita, com Mussolini e Hitler. . Na quadra atual, o mundo assiste a uma onda radical de direita. Três dos países mais populosos do mundo - Índia, Estados Unidos e Brasil - estão ou estiveram, recentemente, sob lideranças com essa identidade doutrinária. Não figura sob esse rótulo, naturalmente, o conservadorismo político, cuja filosofia não entra em tensão com as instituições democráticas tradicionais12 12 Conservadorismo, no sentido de preservação dos valores tradicionais, prudência nos processos de transformação social e ênfase no individual sobre o coletivo é uma das opções legítimas do mainstream político, estando ou tendo estado no poder em democracias consolidadas, como Alemanha, Reino Unido, França e Estados Unidos. . O extremismo ameaçador é o que prega medidas como, por exemplo, fechamento do Legislativo, substituição integral dos juízes das supremas cortes, demonização da imprensa “elitista”, das ONGs “esquerdistas” e que veem comunistas em toda parte. Intolerância, agressividade e violência frequentemente acompanham o ideário marcado por nativismo (nacionalismo mais xenofobia), machismo, misoginia, homofobia, racismo, negacionismo científico e ambiental, rejeição a organismos internacionais de direitos humanos, exploração abusiva da religião e discursos de ódio de naturezas diversas13 13 Sobre o apelo emocional das teorias conspiratórias e sobre a degeneração do conservadorismo em extremismo, v. Applebaum (2020, p. 45 e s). . Com exceção de regimes ditatoriais, como o de Franco, na Espanha, e Pinochet, no Chile, a extrema direita, desde a 2ª Guerra Mundial, havia ficado confinada a minorias situadas na margem da história. Nos últimos anos, porém, ela vem ingressando no mainstream da política, chegando ao poder pelo voto popular e minando a democracia “por dentro”14 14 Sobre o tema e as ideias deste parágrafo, v. Mudde (2019, p. 2, 3, 18, 20, 168 e 172). .

O autoritarismo, por sua vez, é recorrente na vida dos povos, desde o início do processo civilizatório. Com exceção dos breves e limitados períodos da era de ouro de Atenas e da República, em Roma, o despotismo, o mando feudal e o absolutismo acompanharam toda a trajetória humana. Esse quadro só começa a se alterar com as revoluções liberais do final dos séculos XVII e XVIII, sendo que a democracia só veio a se estabelecer, verdadeiramente, ao longo do século XX, como já assinalado. Ainda assim, houve recaídas dramáticas. Após a 2ª Guerra Mundial, a democracia se generaliza pelo mundo ocidental, em processos históricos ocorridos em diferentes partes do planeta, sucessivamente, incluindo Europa continental, América Latina, Europa Central e Oriental e África, como já detalhado. Não obstante essas ondas de democratização na segunda metade do século passado, o autoritarismo subsiste como uma tentação permanente em todos os continentes. Regimes autoritários implicam concentração de poder, com baixo ou nenhum grau de controle, enfraquecimento do Estado de direito e da separação de Poderes, perseguição a adversários políticos, censura à imprensa e ausência de eleições livres e competitivas. No mundo do populismo extremista, um fenômeno que tem se espalhado é a apropriação abusiva - porque formal, e não substantiva - do desenho institucional, conceitos e doutrinas da democracia constitucional para encobrir projetos autoritários (DIXON; LANDAU, 2021DIXON, Rosalind; LANDAU, David. Abusive constitutional borrowing: legal globalization and the subversion of liberal democracy. Oxford: Oxford University Press, 2021., p. 3 e 176)15 15 V. Dixon e Landau (2021, p. 3 e 176): “[A]busive constitutional borrowing is a significant phenomenon, serving as a dark side of liberal democratic discourse and of comparative constitutional law”. .

Como se procurou demonstrar acima, populismo, extremismo e autoritarismo são fenômenos distintos, apesar de eventuais superposições. Ultimamente, porém, têm andado juntos, ameaçando a subsistência de inúmeras democracias. Em casos mais agudos, podem degenerar em fascismo16 16 O fascismo se caracteriza por líderes que dividem em vez de unir, pela supressão de direitos dos não-alinhados, pela exaltação exacerbada da grandeza da nação e pela disposição de utilizar da violência e quaisquer outros meios para atingir seus objetivos. Sobre o tema, v. Albright (2018, p. 11, 118 e 245). . Episódios como o Brexit, a eleição de Donald Trump e a reação à sua derrota mostram que nem mesmo democracias consolidadas escapam dos vendavais contemporâneos. Em países como Turquia, Hungria e Polônia, há mesmo dificuldade em se afirmar que a democracia tenha sobrevivido em todos os seus elementos essenciais. O populismo extremista e autoritário se utiliza de estratégias semelhantes nos diferentes países em que procura se instalar, e que incluem: a) comunicação direta com seus apoiadores, mais recentemente utilizando as mídias sociais; b) by-pass ou cooptação das instituições intermediárias, que fazem a interface do povo com o governo, como o Legislativo, a imprensa e organismos da sociedade civil; e c) ataques às supremas cortes e tribunais constitucionais, com a tentativa de capturá-las e ocupá-las com juízes submissos. Tais cortes têm, precisamente, o papel constitucional de limitar o poder. Na verdade, as constituições institucionalizam e limitam o poder político, atribuindo a tais tribunais o papel de fazê-la valer.

Impossível não registrar, nesse contexto, o impacto da revolução tecnológica ou digital sobre a vida contemporânea, com destaque para o papel desempenhado pelas mídias sociais. A internet revolucionou o mundo da comunicação interpessoal e social, ampliou exponencialmente o acesso à informação e ao conhecimento e, ademais, criou um espaço público onde qualquer pessoa pode manifestar suas ideias, opiniões e divulgar fatos. Nesse sentido, é impossível exagerar sua importância para a democratização da sociedade em escala global, universalizando bens e utilidades que anteriormente constituíam privilégios de alguns. No plano político, ela foi igualmente fundamental para processos históricos importantes - ainda que não inteiramente bem-sucedidos - como foi, por exemplo, a Primavera Árabe.

Anteriormente à internet, a difusão de notícias e de opiniões dependia, em grande medida, da imprensa profissional. Cabia a ela apurar fatos, divulgar notícias e filtrar opiniões pelos critérios da ética jornalista. Havia, assim, um controle editorial mínimo de qualidade e de veracidade do que se publicava. Não que não houvesse problemas: o número de veículos de comunicação é limitado e nem sempre plural, as empresas jornalísticas têm seus próprios interesses e, além disso, nem todos distinguiam, com o cuidado que se impõe, fato de opinião. Ainda assim, havia um grau mais apurado de controle sobre aquilo que se tornava público. A internet, com o surgimento de sites, blogs pessoais e, sobretudo, das mídias sociais, possibilitou a ampla divulgação e circulação de ideias, opiniões e informações sem qualquer filtro. A consequência negativa, porém, foi que também permitiu a difusão da ignorância, da mentira e de atentados à democracia.

Em todo o mundo, plataformas tecnológicas como Facebook, Instagram, Youtube, Whatsapp, Twitter e TikTok passaram a ter um peso importante no processo político-eleitoral17 17 No Brasil, de acordo com pesquisa realizada pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal em 2019, 79% da população tem como principal fonte de informação o Whatsapp. Em segundo lugar vem a televisão (50%), seguido do Youtube (49%), Facebook (44%) e portais de notícias (38%). Jornais impressos, apenas 8%. https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2019-12/whatsapp-e-principal-fonte-de-informacao-do-brasileiro-diz-pesquisa. . Embora haja variação de país para país, as mídias sociais tiveram papel decisivo em eleições nos Estados Unidos, Índia, Hungria e Brasil, entre outras, bem como no processo de votação do Brexit. Um dos grandes problemas da atualidade tem sido o uso da internet e seus instrumentos para a disseminação de ódio, notícias falsas, desinformação e teorias conspiratórias por movimentos populistas, extremistas e autoritários, como estratégia para chegada ao poder e sua manutenção. Por isso mesmo, em diversas partes do mundo, legisladores e reguladores discutem a melhor forma de exercer o controle da internet, sem comprometer a liberdade de expressão18 18 Sobre mídias sociais e seu impacto sobre a vida e as democracias contemporâneas, v. Barroso (2022) e Fukuyama (2021). . Os alvos são os comportamentos coordenados inautênticos - uso de robôs, perfis falsos e outros esquemas para forjar engajamento e afogar manifestações de terceiros - e as campanhas de desinformação, além da prática de crimes (terrorismo, pedofilia etc). Cria-se um ambiente no qual as pessoas já não divergem apenas quanto às suas opiniões, mas também quanto aos próprios fatos. Pós-verdade e fatos alternativos são palavras que ingressaram no vocabulário contemporâneo. Uma das manifestações do autoritarismo é a tentativa de desacreditar o processo eleitoral para, em caso de derrota, poder alegar fraude e deslegitimar o vencedor.

4. Algumas causas da erosão democrática

Há um conjunto de fatores que conduziram ao avanço do populismo de direita em países diversos, incluindo os Estados Unidos, a Grã-Bretanha (Brexit) e o Brasil. É possível sistematizar esses diferentes fatores em três categorias: políticas, econômico-sociais e culturais-identitárias19 19 Sobre o tema, v. Barroso (2019b). . As causas políticas estão na crise de representatividade das democracias contemporâneas, em que o processo eleitoral não consegue dar suficiente voz e relevância à cidadania. “Não nos representam”, é o bordão da hora20 20 V. Castells (2018). . Em parte, porque a classe política se tornou um mundo estanque, descolado da sociedade civil, e em parte pelo sentimento de que o poder econômico-financeiro globalizado é que verdadeiramente dá as cartas. Daí a ascensão dos que fazem o discurso anti-elite, antiglobalização e contra a “velha política”.

As causas econômico-sociais estão no grande contingente de trabalhadores e profissionais que perderam seus empregos21 21 Em final de 2018, quando se realizaram as eleições presidenciais no Brasil, por exemplo, a taxa de desemprego estava em torno de 12%, alcançando mais de 13 milhões de pessoas (POLITO; CONCEIÇÃO, 2019). ou viram reduzidas as suas perspectivas de ascensão social (ISSACHAROFF, 2018_______. Populism versus democratic governance. In: GRABER, Mark A.; LEVINSON, Sanford; TUSHNET, Mark. Constitutional democracy in crisis?. Oxford: Oxford University Press, 2018., p. 447)22 22 “A combinação da desaceleração econômica depois de 2008 e o impacto do comércio globalizado nos salários nos países industrializados avançados manchou a legitimidade dos regimes democráticos como um jogo interno, um meio de institucionalizar as prerrogativas da elite” (ISSACHAROFF, 2018, p. 447). V. tb. Canzian (2019). , quer pela pobreza endêmica quer porque se tornaram pouco relevantes23 23 V. Harari (2018, p. 34 e s). no mundo da globalização, da nova economia do conhecimento e da automação, que enfraquecem as indústrias e atividades mais tradicionais (INGLEHART; NORRIS, 2016INGLEHART, Ronald F.; NORRIS, Pippa. Trump, Brexit, and the rise of populism: economic have-nots and cultural backlash. HKS Faculty Research Working Paper Series, RWP16-026, 2016., p. 2, 2019). Sem mencionar as políticas de austeridade pregadas por organizações internacionais e países com liderança econômica mundial (TROTMAN, 2013TROTMAN, Andrew. Angela Merkel: ‘Austerity makes it sound evil, I call it balancing the budget’. The Telegraph, 23 abr. 2013. Disponível em: https://www.telegraph.co.uk/finance/financialcrisis/10013814/Angela-MerkelAusterity-makes-it-sound-evil-I-call-it-balancing-the-budget.html. Acesso em: 20 ago. 2019.
https://www.telegraph.co.uk/finance/fina...
; CERULUS; GABRIEL, 2017CERULUS, Laurens. Sigmar Gabriel: ‘Merkel’s austerity is driving EU to brink of collapse’. Politico, 8 jan. 2017. Disponível em: https://www.politico.eu/article/sigmar-gabriel-angela-merkel-austerity-isdriving-eu-to-brink-of-collapse/. Acesso em: 20 ago. 2019.
https://www.politico.eu/article/sigmar-g...
), que reduzem as redes de proteção social. Por fim, as causas culturais identitárias: há um contingente de pessoas que não professam o credo cosmopolita, igualitário e multicultural que impulsiona a agenda progressista de direitos humanos, igualdade racial, políticas feministas, casamento gay, defesa de populações nativas, proteção ambiental e descriminalização de drogas, utilização da ciência como critério informador de políticas públicas, entre outras modernidades. Estas pessoas, que se sentem desfavorecidas ou excluídas no mundo do “politicamente correto”, apegam-se a valores tradicionais que lhes dão segurança e o sonho da recuperação de uma hegemonia perdida24 24 V. Castells (2018). .

Em interessante insight, Yascha Mounk (2018_______. The people vs. democracy. Cambridge: Harvard University Press, 2018. E-book., partes I e II) observa que a democracia liberal padece de duas disfunções: (i) as democracias iliberais ou democracias sem direitos; e (ii) o liberalismo sem democracia ou direitos sem democracias. Ao analisar as democracias iliberais, em que líderes populistas eleitos vão paulatinamente suprimindo direitos, identifica três fatores que lhes dão causa: a estagnação social, a perda da hegemonia racial e a perda do filtro da mídia na comunicação social, pelo advento das redes sociais. Por outro lado, identifica ele, também, o que denominou de liberalismo sem democracia. Trata-se de fenômeno associado à maior complexidade da vida moderna, com perda do protagonismo do Legislativo como órgão de representação popular. De fato, nas últimas décadas, assistiu-se à ascensão de órgãos não eletivos na tomada de decisões que influenciam drasticamente a vida das pessoas, como, por exemplo, as agências reguladoras, os bancos centrais, as cortes constitucionais e órgãos e agências internacionais, que concretizam tratados e convenções internacionais.

III. A democracia no Brasil: ameaças, resistência e superação

Assentadas algumas bases teóricas e descrito o cenário mundial, cumpre agora analisar como o processo histórico do populismo extremista autoritário impactou o Brasil. Em 1º de janeiro de 2019, Jair Bolsonaro assumiu a presidência da República, após derrotar Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores, obtendo quase 58 milhões de votos (55,13%). O ex-Presidente Luís Inácio Lula da Silva não pôde concorrer em razão da Lei da Ficha Limpa, por possuir, na ocasião, condenação criminal em 2º grau. Capitão reformado do Exército, o Presidente eleito se apresentou como o candidato anti-establishment, apesar de ter sido Deputado Federal por sete mandatos, entre 1991 e 2018. Seus três filhos maiores também tinham carreiras políticas. Apesar da ironia, não é incomum membros da tradicional elite política, econômica ou empresarial se apresentarem como “verdadeiros” representantes do povo. Viktor Orbán, da Hungria, por exemplo, estudou na Universidade de Oxford com bolsa de estudo (scholarship) custeada por ninguém menos do que George Soros, de quem se tornaria arqui-inimigo. E Donald Trump, ícone populista, é um herdeiro bilionário que frequentou algumas das mais afamadas universidades americanas (Ivy league schools) (FRIEDMAN, 2018, p. 2).

1. O cenário da ascensão de Jair Bolsonaro

A Presidente Dilma Rousseff foi temporariamente afastada do cargo em 12.05.2016, após autorizada a instauração do procedimento de impeachment, sendo definitivamente destituída pelo Senado Federal em 31.08.2016. A justificativa formal foram as denominadas “pedaladas fiscais” - violação de normas orçamentárias -, embora o motivo real tenha sido a perda de sustentação política. O Vice-Presidente Michel Temer assumiu o cargo até a conclusão do mandato, tendo procurado implementar uma agenda liberal cujo percurso foi abalado por sucessivas acusações de corrupção. Em duas oportunidades a Câmara dos Deputados impediu a instauração de ações penais contra o Presidente.

Até a queda da Presidente Dilma Rousseff, o Partido dos Trabalhadores havia permanecido 14 anos no governo. Não é o caso de se fazer aqui o balanço de realizações e desacertos do período. O fato inexorável é que, como não é incomum acontecer, após uma década e meia no poder o desgaste político se tornara inevitável. Havia na sociedade expressiva demanda por alternância no poder. Escândalos ao longo do período incluíram o Mensalão, o Petrolão, os Sanguessugas e outros episódios de corrupção, relatados em diversas colaborações premiadas de agentes públicos e empresários. A tudo se somou o descontrole fiscal revelado a partir do final de 2014, dando lugar a um quadro grave de recessão, desemprego e desinvestimento, com a perda pelo país do grau de investimento atribuído por agências internacionais. Na verdade, o país chegou a sonhar que o futuro havia chegado, com indicadores extremamente favoráveis, que levaram a revista The Economist de 12.11.2009 a celebrar a decolagem e a perspectiva de o Brasil se tornar a quinta maior economia do mundo. Não aconteceu. E em 24.09.2013, quatro anos depois, a mesma revista noticiou que o Brasil, ainda uma vez, desperdiçara uma chance. A queda foi traumática.

Foi nesse contexto que surgiu e ganhou corpo a improvável candidatura de Jair Bolsonaro. Político que jamais estivera no mainstream ou no centro dos processos decisórios, era conhecido por manifestações retóricas radicais, como a defesa da ditadura, da tortura e a declaração de que se pudesse fuzilaria o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso. Ao votar a favor do impeachment da Presidente Dilma, prestou homenagem a um militar acusado de ser notório torturador durante o período ditatorial. A ascensão de Bolsonaro coincidiu com o sucesso de movimentos da direita radical em diferentes partes do mundo, capturando parte significativa das bases conservadoras, dos Estados Unidos à Hungria. Com utilização profissional e eficiente das mídias sociais, o candidato conseguiu catalisar o eleitorado que já não queria mais o PT no poder. Muitas das visões radicais acabaram encobertas por promessas que atendiam demandas importantes da sociedade, como enfrentamento da corrupção, liberalismo econômico e supressão da velha política do “toma lá dá cá”. Singularmente, o bolsonarismo aglutinou dois segmentos opostos: de um lado, os que estavam frustrados com as promessas constitucionais não cumpridas; e, de outro, os insatisfeitos com as promessas que foram cumpridas25 25 Sobre o tema, v. Nunes (2022). .

Iniciado o governo, o combate à corrupção foi simbolizado pela indicação do ex-juiz Sergio Moro para o Ministério da Justiça. Não durou. Moro deixou o Ministério, pouco mais de um ano após o início do governo, acusando o Presidente de interferir na Polícia Federal, inibindo o enfrentamento da corrupção. Para tocar a agenda liberal, foi indicado o economista Paulo Guedes, formado na Escola de Chicago, apelidado de “Posto Ipiranga”, pois resolveria todos os problemas. A agenda liberal tampouco durou. Passada a Reforma da Previdência, houve relaxamento da responsabilidade fiscal e paralisia das privatizações, gerando inúmeras baixas na equipe ministerial. Quanto à superação da velha política, o Presidente aliou-se ao tradicional Centrão, estigmatizado pela imprensa pela voracidade por cargos e verbas públicas. É célebre a frase de Stephen Holmes de que “a democracia é feita de promessas, decepções e da administração da decepção” (HOLMES, 2017HOLMES, Stephen. How democracies die. 13 mar. 2017. 1 vídeo. (86 min). Publicado pelo canal The Graduate Institute Geneva. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=nHr6Mcqq-Ek. Acesso em: 12 jul. 2019.
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).

2. Ameaças às instituições

Bolsonaro se elegeu seguindo a cartilha populista tradicional: o povo simples, puro e conservador contra as elites sofisticadas, corrompidas e “esquerdistas”. Como inevitável, logo se colocou o conflito que marca as relações entre o populismo e a democracia: não há como cumprir as promessas de campanha sem se confrontar com as instituições supostamente ocupadas pelos representantes dessas elites. Na verdade, o populismo tem uma falha conceitual de origem: elites não são uma categoria homogênea, não correspondem a um bloco social único. Justamente ao contrário, existem diversas “elites”. Existem, é certo, elites extrativistas que precisam ser enfrentadas, porque colocam o Estado a serviço dos seus interesses. Elas são poderosas no Brasil. Mas existem elites qualificadas e indispensáveis no serviço público, da carreira diplomática aos pesquisadores de instituições de ponta; existem elites intelectuais que pensam e indicam rumos para o país, nas universidades e em diversos think tanks; existem elites empresariais verdadeiramente empreendedoras, decisivas para o emprego e para a geração de riquezas. Na prática, o discurso anti-elite acaba se transformando num discurso anti-democrático, anti-científico e anti-empreendedorismo. Além disso, povo tampouco é um conceito unitário (PRENDERGAST, 2019PRENDERGAST, David. The judicial role in protecting democracy from populism. German Law Journal, vol. 20, n. 2, p. 245-262, 2019.)26 26 “Populist claims are misconceived to begin with in presupposing a definitive unitary people” (PRENDERGAST, 2019, p. 246). . Num mundo plural, qualquer grupo que se apresente como único representante do povo assume um viés excludente e autoritário.

Os ataques às instituições vieram articuladamente, de sites, blogs e canais de extrema direita, pregando invasão e fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal, com retirada à força de seus membros. Revelou-se a existência de esquemas profissionais de desestabilização democrática, com suspeita de financiamento público em alguns casos, potencializados pelo uso massivo das redes sociais, alimentadas por fanáticos, mercenários (que monetizam o ódio e a mentira), trolls27 27 Troll, na linguagem da internet, identifica o usuário que veicula mensagens inflamatórias, agressivas e frequentemente falsas para produzir engajamento pela raiva, indignação, ódio e radicalismo. e seguidores acríticos. A participação pessoal do Presidente em manifestações antidemocráticas gerou preocupações até mesmo em setores que o apoiavam politicamente. Os exemplos foram se multiplicando: a) comparecimento a uma manifestação na porta da sede do comando do Exército, onde se pedia a volta da ditadura militar; b) ataques diários à Justiça Eleitoral, ofensas pessoais aos seus integrantes e acusações falsas de fraude eleitoral em pleitos anteriores; c) desfile de tanques de guerra na Praça dos Três Poderes, com claros propósitos intimidatórios; d) pedido de impeachment de Ministro do Supremo Tribunal Federal, em razão de decisões judiciais que desagradavam o Presidente; e) mudança de diretor-geral e de superintendentes da Polícia Federal por atuarem com independência; e f) ataques reiterados a jornalistas e órgãos de imprensa, assim como uso da verba publicitária oficial para cooptar apoios de conglomerados de comunicação social.

Curiosa e paradoxalmente, o momento que gerou maior temor para a estabilidade do regime democrático foi, também, o ponto de reversão do golpismo institucional. Tratou-se da grande manifestação convocada para o 7 de setembro, Dia da Independência. Com aluguel de centenas de ônibus no interior e pagamento de refeições, os organizadores concentraram as manifestações em São Paulo e Brasília, com a expectativa de mais de um milhão de pessoas em cada uma delas. As bandeiras das manifestações eram heterogêneas e incluíam o fechamento do Supremo Tribunal Federal, o impeachment de Ministros da Corte e o voto impresso com contagem pública manual. Alguns manifestantes defendiam a volta do regime militar, com manutenção do Presidente no poder. Outros exigiam o fechamento da representação diplomática da China, fora outras idiossincrasias. O Presidente compareceu a ambas as manifestações, ofendeu diretamente um Ministro do STF, acusou outro de pretender fraudar as eleições e afirmou que não mais cumpriria decisões judiciais com as quais não concordasse.

O comparecimento popular, todavia, foi menos de um décimo do esperado, demonstrando o tamanho diminuto da direita radical. Também causou frustração a muitos na militância a não adesão das polícias militares à manifestação, tendo as tropas estaduais permanecido disciplinadas. Nenhum oficial militar graduado fez qualquer sinal de apoio. Além disso, houve reação imediata das instituições e da imprensa. Em suma, não havia respaldo popular nem de qualquer setor relevante à quebra da legalidade. A verdade surpreendente é que 48 horas após a manifestação, o Presidente modificou inteiramente o discurso, justificando-se pelo “calor do momento” (BOLSONARO..., 2021) e procurando aqueles a quem havia ofendido para se explicar como podia. Dias depois, em entrevista à revista Veja, negou qualquer intenção de golpe e, subitamente, passou a afirmar ter confiança nas urnas eletrônicas e no processo eleitoral, que havia atacado por meses a fio (LIMA; POLICARPO JUNIOR, 2021LIMA, Mauricio; JUNIOR, Policarpo. “A chance de um golpe é zero”, diz Bolsonaro em entrevista à Veja. Veja, 24 set 2021. Disponível em: https://veja.abril.com.br/politica/a-chance-de-um-golpe-e-zero-diz-bolsonaro-em-entrevista-a-veja/. Acesso em: 28 fev. 2022.
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).

3. A resistência democrática

As repetidas ameaças à legalidade constitucional e à estabilidade das instituições geraram firme reação de múltiplos setores. Em primeiro lugar, a imprensa, a despeito de boicotes publicitários e das próprias dificuldades contemporâneas do seu modelo de negócios, foi um bastião de resistência. Distinguindo com propriedade fato de opinião, manteve o tom crítico e desempenhou com desassombro o papel fiscalizador que lhe cabe. Apesar dos muitos temores de envolvimento das Forças Armadas, também as suas lideranças souberam resistir a seduções indevidas. O Ministro da Defesa e os comandantes militares deixaram o cargo com altivez, por não concordarem, segundo divulgado, com o uso político e intimidatório da instituição28 28 Segundo o ex-Ministro da Defesa e da Segurança Pública, Raul Jungmann, o Presidente da República teria determinado que jatos da Força Aérea Brasileira sobrevoassem o prédio do Supremo Tribunal Federal acima da velocidade do som para estourar os vidros do prédio, em ameaça aos juízes da Corte. A recusa teria motivado a demissão. Jungmann: Bolsonaro determinou que jatos sobrevoassem STF para quebrar vidros (JUNGMANN..., 2021). . O Supremo Tribunal Federal, que vinha dividido no tema do combate à corrupção, uniu-se na defesa da democracia. Nessa linha, reiterou compromissos com a liberdade de expressão, com a preservação de conselhos da sociedade civil, com o devido processo legal legislativo e, sobretudo, confrontando os ataques às instituições desferidos por grupos extremistas. Em diferentes investigações, que vieram a ser reunidas em um único inquérito, que apura a atuação de organizações criminosas, o Tribunal coibiu, com oitivas, buscas e apreensões e mesmo prisões preventivas, as ameaças de violência contra seus Ministros e suas instalações29 29 Também o Tribunal Superior Eleitoral, integrado por três Ministros do STF, enfrentou os comportamentos antidemocráticos instaurando procedimentos para apurar falsas alegações de fraude contra o sistema eletrônico de votação, bem como determinando a “desmonetização” de sites e canais que difundiam desinformação contra o processo eleitoral e contra a democracia. .

Relativamente à pandemia, diante de posições de autoridades que negavam ou minimizavam sua importância e consequências, o Supremo Tribunal Federal (STF) produziu uma longa série de decisões que preservaram a saúde da população e salvaram milhares de vida. De fato, o Tribunal (i) assegurou o poder dos estados e dos municípios tomarem medidas para proteger a população, (ii) impediu o lançamento da campanha convocando a população a voltar para as ruas e para o trabalho, quando todas as entidades médicas recomendavam recolhimento, (iii) afirmou constituir erro grosseiro, para fins de responsabilização de agentes públicos, a não observância dos consensos médico-científicos, (iv) determinou a divulgação do plano de vacinação, (v) ordenou a vacinação compulsória e (v) a proteção das comunidades indígenas, entre outros julgados. Em ação movida por Senadores, o STF determinou, igualmente, a instauração de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) pelo Senado Federal para apurar a atuação do governo federal durante a pandemia. Nos termos da Constituição, se um terço dos parlamentares da casa legislativa requererem, a instauração é obrigatória, por constituir direito das minorias parlamentares. O relatório final da CPI foi devastador para o governo.

Finalmente, após as manifestações de 7 de setembro, com as graves ameaças do Presidente da República às instituições, houve duros pronunciamentos do Presidente do Congresso Nacional, do Presidente do Supremo Tribunal Federal e, igualmente, do Presidente do Tribunal Superior Eleitoral.

Feita a análise do contexto mundial de ascensão do populismo autoritário e do seu impacto específico no Brasil, cabe, por fim, analisar como as democracias têm reagido ao fenômeno, com foco especial no papel desempenhado por supremas cortes e cortes constitucionais.

IV. Como as democraciais sobrevivem

1. O papel decisivo (e ambíguo) das supremas cortes e cortes constitucionais

Já se encontra assentado de longa data na teoria constitucional que as supremas cortes e as cortes constitucionais, ao exercerem o controle de constitucionalidade (judicial review), desempenham dois grandes papeis que legitimam sua atuação: (i) a proteção das regras de funcionamento da democracia e (ii) a proteção dos direitos fundamentais de todos. O desempenho de tais tribunais é um antídoto contra o abuso de poder por parte das maiorias. Governos populistas, no entanto, com frequência, são hostis aos valores constitucionais (MULLER, 2016MULLER, Jan-Werner. What is populism?. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 2016. E-book.), por defenderem o poder ilimitado das maiorias políticas, atacarem os mecanismos de checks and balances, desprezarem as minorias (políticas, raciais, religiosas, sexuais) e até mesmo subordinarem os direitos fundamentais à “vontade do povo”. Sem surpresa, é comum a existência de uma exacerbada tensão entre governos populistas e cortes supremas, cujo papel é, precisamente, manter o poder político nos limites da Constituição. Não por acaso, são elas - juntamente com as autoridades eleitorais - alvos frequentes de ataques do populismo autoritário.

Supremas cortes e cortes constitucionais têm um papel decisivo em governos populistas, às vezes para bem e outras para mal. Quando conseguem preservar sua efetiva independência, elas funcionam como importante anteparo contra o avanço sobre as instituições democráticas. Há algumas histórias de sucesso no desempenho dessa função. É certo, por outro lado, que lideranças autoritárias procuram capturar ou enfraquecer as supremas cortes, atacando-as verbalmente e, também, mediante dois comportamentos replicados mundo afora: (i) “empacotamento” das cortes com juízes submissos, forçando a abertura de vagas com mudanças nas regras de aposentadoria, impeachments ou aumento no número de cadeiras; e (ii) aprovação de emendas constitucionais e legislação que retiram poderes jurisdicionais e administrativos dos tribunais ou dificultam sua atuação. Na verdade, atores antidemocráticos se valem dessas duas estratégias para colocar os tribunais a serviço dos propósitos governamentais, beneficiando-se da legitimidade que o endosso do Judiciário pode dar às suas ações (DIXON; LANDAU, 2021DIXON, Rosalind; LANDAU, David. Abusive constitutional borrowing: legal globalization and the subversion of liberal democracy. Oxford: Oxford University Press, 2021., p. 92 e 177). Em diferentes países essas duas estratégias funcionaram, transformando as cortes em linhas auxiliares do poder político autoritário. Nesse cenário, elas deixam, por exemplo, de declarar a inconstitucionalidade de emendas, leis e atos que claramente afrontam a Constituição, em razão de sua posição de subordinação aos outros Poderes. Ou, em quadro ainda mais grave, assumem um papel proativo no autoritarismo, banindo partidos adversários do governo de plantão e contribuindo para a persecução de membros da oposição30 30 Foi o que ocorreu, por exemplo, em países como Camboja e Tailândia, onde as cortes superiores se valeram da doutrina “da democracia militante para suprimir a competição eleitoral” (militant democracy to suppress electoral competition), e na Venezuela, país no qual a suprema corte atuou para neutralizar e paralisar o Congresso de oposição. V. Dixon e Landau (2021, p. 178). . Em suma: no combate ao populismo extremista e antidemocrático, cortes supremas e tribunais constitucionais podem ser parte da solução ou parte do problema. Alguns exemplos ilustram o ponto.

2. Histórias de sucesso e de derrota na resistência democrática

O Brasil tem sido um caso de sucesso na resistência democrática ao populismo extremista e autoritário, como já noticiado acima. O Supremo Tribunal Federal reagiu energicamente aos ataques contra as instituições e contra o próprio tribunal, com decisões que preservaram a democracia, com procedimentos criminais e com pronunciamentos incisivos de seu presidente. Da mesma forma, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), órgão do Poder Judiciário que organiza e supervisiona nacionalmente as eleições no país, também teve papel decisivo na reação a ataques antidemocráticos. O Brasil adota, desde 1996, um sistema de votação por urnas eletrônicas que eliminou um passado de fraudes eleitorais que ocorriam com o voto de papel. Pois o Presidente da República, por meses a fio, acusou falsamente o sistema de ser fraudulento, na velha lógica do populismo autoritário de se antecipar a eventual derrota acusando o sistema de não ser idôneo. No caso brasileiro, dando um toque de surrealismo ao enredo, o Presidente atacava o sistema pelo qual se elegera por larga margem. O TSE se opôs fortemente, e com sucesso, à proposta de retorno ao voto impresso “com contagem pública manual”, apresentada ao Congresso Nacional, com apoio do Presidente, e que veio a ser rejeitada. Como o voto de papel com contagem manual sempre foi o caminho para a fraude eleitoral no Brasil, muitos suspeitavam de intenções ocultas e golpistas na tentativa de retroceder ao modelo antigo. Isso num momento em que o Presidente aparecia em larga desvantagem nas pesquisas de intenção de voto para as eleições de 2022.

Nos Estados Unidos, nas eleições de 2020, o Presidente Donald Trump, candidato à reeleição, alegou sem provas a existência de fraude, mesmo antes do início da votação. Foi derrotado por Joe Biden no Colégio Eleitoral - 306 votos a 232 - e na contagem nacional por mais de 7 milhões de votos. Ainda assim, Trump jamais reconheceu a vitória do adversário. Antes pelo contrário, seus apoiadores propuseram mais de 60 ações judiciais procurando anular eleições em diferentes estados, sem êxito em qualquer delas. A própria Suprema Corte rejeitou duas ações endossadas pelo Presidente (CUMMINGS; GARRISON; SERGENT, 2021ŞEN, İlker Gökhan. The final death blow to the Turkish Constitutional Court. VerfBlog, 28 jan. 2021. Disponível em: https://verfassungsblog.de/death-blow-tcc/. Acesso em: 28 fev. 2022.
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). Em 6 de janeiro de 2021, centenas de pessoas invadiram e vandalizaram o Capitólio, sede do Congresso, tentando impedir a proclamação do resultado das eleições. Houve sete mortos e mais de uma centena de feridos. Uma semana após o ataque, Trump sofreu impeachment na Câmara dos Deputados, por incitação à insurreição. Foi igualmente condenado no Senado, por 57 votos a 43, número que não atingiu a maioria de 2/3 necessária para o seu afastamento, que seria de 67 votos. O ponto que se quer ressaltar aqui, no entanto, é que o Judiciário, inclusive a Suprema Corte, não cedeu aos apelos do líder populista inconformado com a derrota, tendo preservado o resultado eleitoral e a democracia. No aniversário de um ano do episódio, em 6 de janeiro de 2022, ainda subsistiam uma guerra de narrativas e muitas cicatrizes abertas (EVERY DAY..., 2022).

Alguns anos antes, em cenário menos dramático, mas em decisão de grande importância histórica, a Corte Constitucional da Colômbia, em 2010, declarou inconstitucional emenda à Constituição que permitia a reeleição do Presidente da República para um terceiro mandato, emenda que beneficiaria o incumbente Álvaro Uribe (COLÔMBIA, 2010)31 31 Sobre o tema, v. Pulido (2013). . A decisão seguiu a linha de um precedente antigo da Suprema Corte da Índia (ÍNDIA, 1973) e veio a reforçar uma tendência que se consolidaria mais à frente - para bem e para mal - do reconhecimento de inconstitucionalidade de emendas constitucionais, por fundamentos processuais ou substantivos32 32 Um dos pioneiros na discussão doutrinária desse tema Albert (2009, p. 21-31). . Tal inconstitucionalidade se caracteriza por emendas que rompem com a identidade do texto constitucional originário, em violação a princípios estruturantes, caracterizando verdadeira substituição da Constituição, como enfatizou a Corte Constitucional colombiana33 33 Sobre o tema, v. Barroso (2019c). . O primeiro precedente na matéria, relativamente à vedação da possibilidade de reeleição, ocorrera na Costa Rica, em situação inversa: a Sala Constitucional da Suprema Corte, em 2003, afirmou que a proibição absoluta de reeleição, mesmo que para mandato não consecutivo, interferia de maneira inconstitucional com um direito político fundamental. Com isso, o ex-Presidente Oscar Arias pôde voltar a concorrer, dezesseis anos depois de haver deixado o cargo. Tal decisão, no entanto, que era razoável e foi proferida em um país de democracia estável, viria a ser invocada por populistas autoritários para derrubar vedações à reeleição e perpetuarem-se no cargo34 34 V. Roznai (2019, p. 93-116). .

A prática populista de esvaziar, capturar e aparelhar supremas cortes tem como marco histórico o expurgo de quatro dos cinco juízes da Suprema Corte da Argentina por Juan Domingo Perón, logo após sua eleição em 1946 (ARATO, 2017ARATO, Andrew. Populism, the Courts and Civil Society. 4 dez. 2017. Disponível em:https://ssrn.com/abstract=3082596. Acesso em: 28 fev. 2022.
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, p. 1) 35 35 “Admittedly, no current populist government has gone as far as Peron’s in 1947 when he has initiated the impeachment and trial of 4 out of 5 Supreme Court justices, with one of them resigning before impeachment succeeded” (ARATO, 2017, p. 1). . Ali teve início uma longa tradição de interferência do Executivo na corte daquele país (CASTAGNOLA, 2018CASTAGNOLA, Andrea. Manipulating courts in new democracies: forcing judges off the bench in Argentina. Milton: Routledge, 2018.). Na história recente, são muitos os casos que seguiram esse caminho. Um dos exemplos mais emblemáticos é o da Corte Constitucional da Hungria, que desfrutou de poder, prestígio e independência após a redemocratização do país, com a dissolução da União Soviética. Após a chegada ao poder de Viktor Orbán e de seu partido Fidez, em 2010, esse quadro se deteriorou progressivamente. O roteiro seguido foi o previsível: empacotamento, retirada de poderes relevantes e captura. Nessa linha, emendas constitucionais e ampla legislação aprovadas no Parlamento dominado pelo Fidez aumentaram o número de juízes da Corte de 11 para 15, reduziram a idade de aposentadoria para abrir novas vagas36 36 O Tribunal de Justiça da União Europeia considerou que a lei que reduzia a idade de aposentadoria de juízes, procuradores e notários públicos de 70 para 62 anos incompatível com as normas que regeu a União Europeia (COMISSÃO EUROPEIA, 2012). , alteraram critérios de nomeação de juízes aumentando a ingerência político-partidária e retiraram competências de controle de constitucionalidade (judicial review), especialmente em relação às emendas constitucionais. Em 2013, o governo já detinha total controle da Corte e de outras instituições, como o Parlamento, a mídia e as universidades. Ícone do populismo autoritário de direita no mundo, Orbán é considerado por alguns estudiosos um “típico ditador do século XXI” (the ultimate twenty-first-century dictator) (CHOTINER, 2021CHOTINER, Isaac. Why conservatives around the world have embraced Hungary’s Viktor Orbán. The New Yorker, 21 ago. 2021. Disponível em: https://www.newyorker.com/news/q-and-a/why-conservatives-around-the-world-have-embraced-hungarys-viktor-orban. Acesso em: 28 fev. 2022.
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)37 37 Sobre a deterioração institucional da Hungria, v. Scheppele (2018, p. 549 e s); Dixon e Landau (2021, p. 89 e 92); e Mounk (2020, p. 31). .

O Tribunal Constitucional da Polônia também passou por vicissitudes análogas, até ser inteiramente controlado pelo Partido Lei e Justiça (Law and Justice Party). As tensões entre o Tribunal e o governo começaram ainda em 2015, quando se deu a recusa em dar posse a cinco juízes que haviam sido indicados pelo Sejm (Câmara dos Deputados) que se encontrava em final de mandato38 38 A manobra do Partido Civic Platform era de fato questionável, uma vez que três dos cinco juízes substituídos somente concluiriam seus mandatos após as eleições. V. Arato (2017, p. 6). . Na sequência, vieram leis que antecipavam a aposentadoria dos juízes39 39 Tal como se passou com procedimento análogo na Hungria, a O Tribunal de Justiça da União Europeia, considerou que tal legislação violava princípios da União Europeia, com destaque para a inamovibilidade de juízes (UNIÃO EUROPEIA, 2019). , limitavam sua jurisdição, exigiam supermaioria para a invalidação de leis (de maioria passou para 2/3) e, mais grave ainda, davam poder discricionário ao Executivo para publicar ou não as decisões do Tribunal (DIXON; LANDAU, 2021DIXON, Rosalind; LANDAU, David. Abusive constitutional borrowing: legal globalization and the subversion of liberal democracy. Oxford: Oxford University Press, 2021., p. 93). Em fevereiro de 2020, uma carta aberta assinada por mais de duas dezenas de ex-juízes que o haviam integrado, inclusive diversos de seus ex-presidentes, denunciou que o Tribunal “havia sido virtualmente abolido” (has virtually been abolished) (CONSTITUTIONAL..., 2020).

O Tribunal Constitucional da Turquia, a seu turno, era conhecido por sua importante atuação na promoção de um Estado laico e de um governo secular. Em 2010, no entanto, quando Recep Tayyp Erdogan era Primeiro-Ministro, uma emenda constitucional alterou as normas referentes à composição do Tribunal, ao processo de seleção de juízes e às regras de votação (ARATO, 2017ARATO, Andrew. Populism, the Courts and Civil Society. 4 dez. 2017. Disponível em:https://ssrn.com/abstract=3082596. Acesso em: 28 fev. 2022.
https://ssrn.com/abstract=3082596...
, p. 5). Segundo críticos, o Tribunal foi “domesticado” (tamed), passando a ser controlado pelo governo (ŞEN, 2021ŞEN, İlker Gökhan. The final death blow to the Turkish Constitutional Court. VerfBlog, 28 jan. 2021. Disponível em: https://verfassungsblog.de/death-blow-tcc/. Acesso em: 28 fev. 2022.
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). Raras e eventuais decisões desfavoráveis ao Executivo despertam ameaças de retaliação, como o fechamento do Tribunal (ERDOGAN..., 2021) e a limitação ou fragmentação de seus poderes por uma nova Constituição (ERDOGAN’S…, 2021).

Na América Latina, os casos de retaliação às cortes constitucionais e tentativas de captura se sucedem. Um precedente mais remoto ocorreu em 1997, no Peru, quando três juízes do Tribunal Constitucional que votaram contra a interpretação que permitia um terceiro mandato ao Presidente Alberto Fujimori foram afastados (SIMS, 1997SIMS, Calvin. Peru’s Congress is assailed over its removal of judges. New York Times, 31 mai. 1997. Disponível em: https://www.nytimes.com/1997/05/31/world/peru-s-congress-is-assailed-over-its-removal-of-judges.html. Acesso em: 28 fev. 2022.
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)40 40 A Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 31 jan. 2001, condenou o Peru por violação às garantias da magistratura (the right to judicial protection) e ao pagamento de indenização aos três juízes afastados (ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS, 2001). . Nos dias atuais, o caso mais dramático e emblemático é o da República Bolivariana da Venezuela. Hugo Chávez foi eleito presidente em 1998, tomou posse em 1999, mesmo ano em que fez aprovar uma nova Constituição, tendo permanecido no poder, em sucessivas reeleições, até sua morte, em 2013. Em 2002, sofreu uma tentativa de golpe de Estado, tendo logrado retornar ao poder dois dias depois. Em 2004, em retaliação ao Tribunal Supremo de Justiça, que havia absolvido os comandantes militares rebeldes, o Congresso dominado por Chávez aumentou o número de juízes do Tribunal de 20 para 32, na primeira intervenção de “empacotamento” do órgão de cúpula do Judiciário. A mesma lei facilitou o afastamento de juízes pelo Congresso, o que logo foi posto em prática com a remoção do vice-presidente do Tribunal. Desde então, Chávez e seu governo assumiram o controle da corte suprema (VENEZUELA…, 2004).

Entre 2005 e 2014, não houve sequer uma decisão desfavorável ao governo central41 41 V. Corrales (2015, p. 44). -42 42 Nesse período, o Tribunal validou inúmeras leis que transformavam a Venezuela em um regime ditatorial, por cercearem a liberdade de expressão, perseguirem adversários, mudarem regras eleitorais em favor do governo e retirarem a concessão de veículos de mídia de oposição. V. Urribarri (2011, p. 876.) . Após a morte de Chávez, em 2013, e a ascensão de Nicolau Maduro, a deterioração econômica levou a uma expressiva vitória da oposição na eleição parlamentar de 2015. Antes da posse do novo Congresso, no entanto, o Legislativo que concluía o seu termo nomeou, em 23.12.2015, 13 novos juízes titulares e 21 substitutos para o Tribunal, sem a observância do procedimento próprio previsto na Constituição e na legislação (ORE, 2015ORE, Diego. Venezuela’s outgoing Congress names 23 Supreme Court Justices. Reuters, 23 dez. 2015. Disponível em: https://www.reuters.com/article/us-venezuela-politics-idUSKBN0U626820151223. Acesso em: 28 fev. 2022.
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)43 43 V. Constituição da Venezuela, art. 264 e Lei Orgânica do Tribunal Supremo de Justiça, art. 38. . A partir daí, o Tribunal Supremo de Justiça desempenhou o seu pior papel: tornou-se aliado do Presidente para neutralizar e paralisar o Congresso oposicionista. Por entender descumprida uma decisão de afastamento de parlamentares eleitos, o Tribunal considerou o Congresso em desacato (contempt) e declarou inconstitucionais todas as leis e atos que praticava. Em 2017, o Tribunal validou a convocação de uma Assembleia Constituinte, que não produziu Constituição alguma, mas concentrou em si os principais poderes da República, inclusive antecipando uma eleição presidencial de cartas marcadas, da qual foram excluídos os principais partidos de oposição. Em suma: na Venezuela, o Tribunal Supremo de Justiça foi um ator proativo na desconstrução do Estado democrático.

Outro país latino-americano que tomou o rumo desvirtuado da ditadura foi a Nicarágua. Também aqui tendo a Corte Suprema de Justiça como aliada. Daniel Ortega, líder dos sandinistas, já havia sido Presidente no período revolucionário, iniciado em 1979, vindo a ser eleito pelo voto popular em 1984. Em 1990 foi derrotado, não se reelegendo. Em 1995, a Assembleia Nacional aprovou emenda constitucional à Constituição de 1987, proibindo reeleições sucessivas. Em 2007, Ortega voltou a ser eleito Presidente. Foi então que, em 2009, obteve de uma Corte Suprema altamente partidarizada a eliminação sem limite da restrição à reeleição, num procedimento considerado ardiloso, quando não desonesto: juízes que não apoiavam a medida não foram convocados adequadamente para a sessão de julgamento e foram substituídos ad hoc por aliados do Presidente (NICARAGUA…, 2009). Com a manobra e inúmeras medidas de perseguição a adversários, foi reeleito em 2011, em 2016 e em 2021. Organismos internacionais denunciaram as eleições na Nicarágua como sendo uma farsa antidemocrática (THE ELECTION..., 2021).

A onda de banimento à vedação de reeleições sucessivas, que já atingira anteriormente a Venezuela, estendeu-se à Bolívia, onde a Corte Suprema de Justiça, em decisão de 2017, aboliu a proibição, abrindo caminho para a candidatura de Evo Morales a um quarto mandato. Isso a despeito de texto expresso da Constituição vedando a possibilidade de mais de dois mandatos e da expressa rejeição da proposta em consulta popular (RAMOS, 2019RAMOS, Daniel. Bolivia Morales’ defies term limits, launches bid for fourth term. Reuters, 18 mai. 2019. Disponível em: https://www.reuters.com/article/us-bolivia-election-idUSKCN1SO0R3. Acesso em: 28 fev. 2022.
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). Ao final, Morales foi levado a afastar-se do cargo em novembro de 2019 e novas eleições foram convocadas.

Também em Honduras, a Constituição de 1982 somente permitia um mandato presidencial, previsão contida em cláusula pétrea e, consequentemente, insuscetível de emenda44 44 Constituição de Honduras: “Art. 374. No podrán reformarse, en ningun caso, el articulo anterior, el presente articulo, los articulos constitucionales que se refieren a la forma de gobierno, al territorio nacional, al periodo presidencial, a la prohibicion para ser nuevamente Presidente de la Republica, el ciudadano que lo haya desempenado bajo cualquier titulo y el referente a quienes no pueden ser Presidentes de la Republica por el periodo subsiguiente”. . Nada obstante, em decisão de 2015, a Corte Suprema de Justiça derrubou, por inconstitucional, a cláusula constante do texto original da Constituição, o que, naturalmente, refoge à hipótese que ganhou curso mais recentemente de se considerar determinadas emendas constitucionais inconstitucionais (LANDAU, 2015_______. Honduras: Term limits drama 2.0 - how the Supreme court declared the Constitution unconstitutional. Constitutionet, 27 mai. 2015. Disponível em: https://constitutionnet.org/news/honduras-term-limits-drama-20-how-supreme-court-declared-constitution-unconstitutional. Acesso em: 28 fev. 2022.
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). A decisão abriu caminho para a reeleição de Juan Orlando Hernandez no controvertido pleito de 2017. Ironicamente, na eleição presidencial de 2021, foi eleita a candidata de oposição, Xiomara Castro, esposa do ex-Presidente Manuel Zelaya, que havia sido deposto por um golpe de Estado, em 2009, sob a acusação de procurar, pela via transversa de uma emenda à Constituição, burlar a proibição de reeleição.

Finalmente, no Equador, Rafael Correa permaneceu no poder de 2007 a 2017. Em um referendo validado pela Corte Constitucional em 2011, ele adquiriu amplos poderes no processo de nomeação de juízes, o que permitiu que substituísse integralmente os membros do Tribunal (CASTRO-MONTERO; VAN DIJCK, 2017CASTRO-MONTERO, José Luis; VAN DIJCK, Gijs. Judicial politics in unconsolidated democracies: an empirical analysis of the Ecuadorian Constitutional Court. Justice System Journal, vol. 38, n. 4, p. 380-398, 2017., p. 384, DIXON; LANDAU, 2021DIXON, Rosalind; LANDAU, David. Abusive constitutional borrowing: legal globalization and the subversion of liberal democracy. Oxford: Oxford University Press, 2021., p. 95). Em 2015, Correa conseguiu aprovar, por um questionável procedimento simplificado, que veio a ser validado pela Corte, emenda constitucional permitindo a reeleição sem limites do Presidente (ECUADOR..., 2015). Após uma onda de protestos, foi incluída na emenda uma cláusula pela qual a regra não valeria para a eleição imediatamente subsequente, de 2017. Na sequência histórica, no governo do novo Presidente eleito, Lenín Moreno, um plebiscito voltou a limitar a dois mandatos a permanência no poder (ECUADOR..., 2018).

3. As cortes constitucionais no jogo do poder

Como se constata da narrativa acima, não é fácil para as cortes supremas cumprirem bem o papel de resistência democrática. De um lado, uma atitude passiva ou omissiva de cautela, para evitar o embate com líderes populistas, frustra a sua missão. De outra parte, o confronto aberto e solitário não costuma ter final feliz para os tribunais. É exemplar o que se passou na Rússia. Em 1989, após a queda do Muro de Berlim e já próximo do final da União Soviética, a Corte Constitucional ascendeu como um ator importante na transição democrática. Proferiu, assim, decisões de alto relevo, inclusive quanto à dissolução do Partido Comunista e a reorganização partidária. Em 1993, contudo, a Corte entrou em confronto com Boris Yeltzin a propósito de decretos que suspendiam o Parlamento, entendendo que o Presidente excedera os seus poderes. Yeltzin convocou, então, um referendo popular e conseguiu apoio para dissolver tanto o Parlamento quando a própria Corte. Ao final de 1993, a Rússia tinha uma nova Constituição, mas não mais uma Corte Constitucional. Ela só veio a ser restabelecida em 1995, com um papel bem menor, e já submissa ao novo Presidente, Vladimir Putin (ISSACHAROFF, 2015ISSACHAROFF, Samuel. Fragile democracies: contested power in the era of Constitutional Courts. Cambridge: Cambridge University Press, 2015., p. 273).

Quando existe um partido hegemônico, que controle o Legislativo, tenha apoio amplo nas instituições da sociedade civil e da população, impedir movimentos majoritários autoritários se torna muito mais difícil. Quando, por outro lado, haja maior equilíbrio e competição política entre partidos e segmentos diversos, o papel de contenção dos processos antidemocráticos é mais viável. Na verdade, a conjuntura específica e a cultura constitucional do povo fazem toda a diferença. E, também, o grau de independência e credibilidade da própria corte constitucional. Nos Estados Unidos, a tentativa de golpe pela invasão do Capitólio gerou reação imediata do Congresso e da imprensa. Embora, surpreendentemente, um número bastante relevante de eleitores do Partido Republicano, insuflados pelo Presidente derrotado, acredite que houve fraude, a despeito da falta de provas (CUTHBERT; THEODORIDIS, 2022CUTHBERT, Lane; THEODORIDIS, Alexander. Do republicans really believe Trump won the 2020 election? Our research suggest that they do. Washington Post, 7 jan. 2022. Disponível em: https://www.washingtonpost.com/politics/2022/01/07/republicans-big-lie-trump/. Acesso em 28 fev. 2022.
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)45 45 “[A]mong a nationally representative sample of the U.S. voting-age population, only 21 percent of Republicans say Joe Biden’s victory was legitimate” (CUTHBERT; THEODORIDIS, 2022). . No Brasil, embora uma democracia bem mais jovem - o regime militar expirou em 1985 e a Constituição em vigor é de 1988 -, também houve reação maciça das instituições, da imprensa e da sociedade, contendo as veleidades de golpe.

Portanto, a capacidade de cortes supremas e cortes constitucionais impedirem a escalada autoritária de líderes populistas depende de múltiplos fatores: pluralismo político efetivo na sociedade, com partidos fortes de situação e de oposição; eleições livres e competitivas; cortes com tradição de independência e reconhecimento da sociedade; apoio das demais instituições à democracia e à própria corte; e sociedade que tenha uma cultura constitucional capaz de repudiar aventuras ditatoriais. Vale dizer: tribunais são importantes, mas não são capazes de fazer o trabalho sozinhos. E, por evidente, devem escapar da armadilha de se tornarem eles próprios atores movidos por preferências ou sentimentos intrinsecamente políticos, quando não partidarizados, deixando de fundamentar suas decisões, genuinamente, em valores e princípios constitucionais.

V. Conclusão

A democracia contemporânea vem enfrentando inúmeras adversidades. Algumas decorrem de sua própria incapacidade de solucionar problemas graves, que vêm de longe e a enfraquecem. Embora o cenário possa variar substancialmente de país para país, alguns desses problemas incluem: (i) a pobreza extrema, as desigualdades injustas e outros fatores que levam à exclusão ou à estagnação sociais; (ii) a apropriação privada do Estado por elites políticas e econômicas extrativistas, que o colocam a serviço dos seus interesses, alienando a maioria da população; e (iii) o sentimento de não-pertencimento de muitos, seja pela exclusão social, seja porque os sistemas de representação política já não conseguem mais dar suficiente voz e relevância aos cidadãos. Num mundo marcado por inovações e destruição criativa, a democracia precisa encontrar novos desenhos institucionais que a preservem e reavivem os valores que a tornaram a ideologia vitoriosa do século XX.

Ao mesmo tempo que enfrenta velhos fantasmas, a democracia constitucional se depara com as novas ameaças trazidas pelo populismo extremista e autoritário. Tudo isso num mundo em que boa parte da comunicação social e política migraram dos meios de comunicação tradicionais - imprensa, televisão e rádio - para mídias sociais que operam com poucos filtros, abrindo espaço para a desinformação, as teorias conspiratórias ou o ódio puro e simples. Alguns países têm conseguido resistir, embora não sem sequelas, a esse processo de deterioração democrática. Em outros, no entanto, as instituições sucumbiram à hegemonia de líderes e partidos populistas, de viés antidemocrático. Nesse ambiente, as cortes supremas e as cortes constitucionais têm protagonizado histórias de sucesso e histórias de fracasso. Em alguns casos, elas foram pilares de resistência. Em outros, foram incapazes de reação. E em situações mais dramáticas, foram parte do problema. Não se deve ter a ingenuidade de crer que tribunais, por si sós, consigam manter de pé o edifício constitucional. Como um projeto coletivo, a democracia precisa de povo participante e leal a ela, governantes idôneos e um conjunto de instituições inclusivas.

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  • TROTMAN, Andrew. Angela Merkel: ‘Austerity makes it sound evil, I call it balancing the budget’. The Telegraph, 23 abr. 2013. Disponível em: https://www.telegraph.co.uk/finance/financialcrisis/10013814/Angela-MerkelAusterity-makes-it-sound-evil-I-call-it-balancing-the-budget.html Acesso em: 20 ago. 2019.
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  • URRIBARRI, Raul A. Sanchez. Courts between Democracy and Hybrid Authoritarianism: Evidence from the Venezuelan Supreme Court. Law & Social Inquiry, vol. 36, n. 4, p. 854-884, 2011.
  • VALENTE, Jonas. WhatsApp é principal fonte de informação do brasileiro, diz pesquisa. Agência Brasil, 10 dez. 2019. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2019-12/whatsapp-e-principal-fonte-de-informacao-do-brasileiro-diz-pesquisa Acesso em: 28 fev. 2022.
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  • VENEZUELA: Chávez allies pack Supreme Court. Human Rights Watch, 13 dez. 2004. Disponível em: https://www.hrw.org/news/2004/12/13/venezuela-chavez-allies-pack-supreme-court Acesso em: 28 fev. 2022.
    » https://www.hrw.org/news/2004/12/13/venezuela-chavez-allies-pack-supreme-court
  • VERSTEEG, Mila et al. The law and politics of presidential term limit evasion. Columbia Law Review, vol. 120, n. 1, p. 173-248, 2020.
  • ZAKARIA, Fareed. The rise of illiberal democracies. Foreign Affairs, n. 76, p. 22, 1997.
  • 1
    Algumas ideias e passagens dos capítulos II e III deste texto foram publicadas na Revista do Cebri - Brazilian Journal of International Affairs 1/33, 2022.
  • 2
    Para deixar claro, a corte suprema dá a última palavra, mas não é a “dona” da Constituição: sua interpretação deve levar em conta os demais atores institucionais e o sentimento social. V. Barroso (2018_______. Contramajoritário, representativo e iluminista: os papeis das cortes constitucionais nas democracias. Revista Direito e Práxis, vol. 9, n. 4, p. 2171-2228, 2018., p. 2219): “A jurisdição constitucional deve funcionar como uma etapa da interlocução mais ampla com o legislador e com a esfera pública, sem suprimir ou oprimir a voz das ruas, o movimento social e os canais de expressão da sociedade. Nunca é demais lembrar que o poder emana do povo, não dos juízes”.
  • 3
    V. tb. Mounk (2020MOUNK, Yascha. The end of history revisited. Journal of Democracy, vol. 31, n. 1, p. 22-35, 2020.).
  • 4
    Huntington (1991HUNTINGTON, Samuel P. The third wave: democratization in the late twentieth century. Journal of Democracy, vol. 2, n. 2, 1991.) foi o primeiro a utilizar a ideia de “ondas de democratização”: a primeira onda teria ocorrido na primeira metade do século XIX, quando os países crescentemente foram adotando a ideia de sufrágio universal; a segunda se deu após o fim da Segunda Guerra Mundial; e a terceira a partir dos anos 70. O texto é anterior ao florescimento de democracias após o fim do modelo comunista.
  • 5
    Em 1900, nenhum país do mundo tinha seus governantes eleitos por sufrágio universal. Em dezembro de 1999, 119 países poderiam ser identificados como democráticos. V. Freedom House (1999) e Barroso (2019aBARROSO, Luís Roberto. Constitucionalismo democrático: a ideologia vitoriosa do século XX. Ribeirão Preto: Migalhas, 2019a.).
  • 6
    Sobre o tema, v. o amplo levantamento feito por Versteeg et al. (2020VERSTEEG, Mila et al. The law and politics of presidential term limit evasion. Columbia Law Review, vol. 120, n. 1, p. 173-248, 2020.), onde registrou: “Globally, no fewer than one-third of the incumbents who reached the end of their prescribed term pursued some strategy to remain in office”.
  • 7
    Aparentemente, o termo foi utilizado pela primeira vez por Zakaria (1997ZAKARIA, Fareed. The rise of illiberal democracies. Foreign Affairs, n. 76, p. 22, 1997.). Na prática política contemporânea, foi encampado pelo líder autoritário húngaro Viktor Orbán.
  • 8
    A esse propósito, escreveu Issacharoff (2020_______. The corruption of popular sovereignty. International Journal of Constitutional Law, vol. 18, n. 4, p. 1109-1135, 2020., p. 1135): “Populism tends to pitch itself to base impulses, to desires for immediate reward, to disregard for the future, whether it be the destruction of the rainforest, the prorogation of Parliament, or the momentary inflation of the currency”.
  • 9
    Sobre a definição e caracterização do populismo, v. Moffitt (2020MOFFITT, Benjamin. Populism. Cambridge: Polity, 2020., p. 10 e s.), Mudde (2004_______. The populist zeitgeist. Government and Opposition, vol. 39, n. 4, p. 541-563, 2004., p. 543) e Muller (2016MULLER, Jan-Werner. What is populism?. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 2016. E-book.).
  • 10
    O extremismo pode se manifestar em diferentes domínios da vida, inclusive no plano religioso, como documentam inúmeros eventos históricos, da Inquisição ao Jihadismo.
  • 11
    À esquerda, por exemplo, com Stalin e Pol Pot, e à direita, com Mussolini e Hitler.
  • 12
    Conservadorismo, no sentido de preservação dos valores tradicionais, prudência nos processos de transformação social e ênfase no individual sobre o coletivo é uma das opções legítimas do mainstream político, estando ou tendo estado no poder em democracias consolidadas, como Alemanha, Reino Unido, França e Estados Unidos.
  • 13
    Sobre o apelo emocional das teorias conspiratórias e sobre a degeneração do conservadorismo em extremismo, v. Applebaum (2020APPLEBAUM, Anne. Twilight of democracy: the seductive lure of authoritarianism. New York: Doubleday, 2020., p. 45 e s).
  • 14
    Sobre o tema e as ideias deste parágrafo, v. Mudde (2019MUDDE, Cas. The far right today. Cambridge: Polity, 2019., p. 2, 3, 18, 20, 168 e 172).
  • 15
    V. Dixon e Landau (2021DIXON, Rosalind; LANDAU, David. Abusive constitutional borrowing: legal globalization and the subversion of liberal democracy. Oxford: Oxford University Press, 2021., p. 3 e 176): “[A]busive constitutional borrowing is a significant phenomenon, serving as a dark side of liberal democratic discourse and of comparative constitutional law”.
  • 16
    O fascismo se caracteriza por líderes que dividem em vez de unir, pela supressão de direitos dos não-alinhados, pela exaltação exacerbada da grandeza da nação e pela disposição de utilizar da violência e quaisquer outros meios para atingir seus objetivos. Sobre o tema, v. Albright (2018ALBRIGHT, Madeleine. Fascism: a warning. New York: HarpersCollins, 2018., p. 11, 118 e 245).
  • 17
    No Brasil, de acordo com pesquisa realizada pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal em 2019, 79% da população tem como principal fonte de informação o Whatsapp. Em segundo lugar vem a televisão (50%), seguido do Youtube (49%), Facebook (44%) e portais de notícias (38%). Jornais impressos, apenas 8%. https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2019-12/whatsapp-e-principal-fonte-de-informacao-do-brasileiro-diz-pesquisa.
  • 18
    Sobre mídias sociais e seu impacto sobre a vida e as democracias contemporâneas, v. Barroso (2022BARROSO, Luna van Brussel. Liberdade de expressão e democracia na era digital. Belo Horizonte: Fórum, 2022 (no prelo).) e Fukuyama (2021FUKUYAMA, Francis. Making the internet safe for democracy. Journal of Democracy, vol. 32, n. 2, p. 37-44, 2021.).
  • 19
    Sobre o tema, v. Barroso (2019b_______. Revolução tecnológica, crise da democracia e mudança climática: limites do Direito num mundo em transformação. Revista Estudos Institucionais, v. 5, n. 3, p. 1262-1313, set./dez. 2019b.).
  • 20
    V. Castells (2018CASTELLS, Manuel. Ruptura: a crise da democracia liberal. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.).
  • 21
    Em final de 2018, quando se realizaram as eleições presidenciais no Brasil, por exemplo, a taxa de desemprego estava em torno de 12%, alcançando mais de 13 milhões de pessoas (POLITO; CONCEIÇÃO, 2019POLITO, Rodrigo; CONCEIÇÃO, Ana. Desemprego no Brasil atinge mais de 12 milhões no fim de 2018. Valor Econômico, 31 jan. 2019. Disponível em: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2019/01/31/desemprego-no-brasil-atinge-mais-de-12-milhoes-no-fim-de-2018.ghtml. Acesso em: 28 fev. 2022.
    https://valor.globo.com/brasil/noticia/2...
    ).
  • 22
    “A combinação da desaceleração econômica depois de 2008 e o impacto do comércio globalizado nos salários nos países industrializados avançados manchou a legitimidade dos regimes democráticos como um jogo interno, um meio de institucionalizar as prerrogativas da elite” (ISSACHAROFF, 2018_______. Populism versus democratic governance. In: GRABER, Mark A.; LEVINSON, Sanford; TUSHNET, Mark. Constitutional democracy in crisis?. Oxford: Oxford University Press, 2018., p. 447). V. tb. Canzian (2019CANZIAN, Fernando. Em 40 anos, metade dos EUA ganhou só US$ 200 a mais. Folha de São Paulo, 29 jul. 2019. Disponível em: https://temas.folha.uol.com.br/desigualdade-global/estados-unidos/em-40-anos-metade-dos-eua-ganhou-so-us-200-a-mais.shtml. Acesso em: 28 fev. 2022.
    https://temas.folha.uol.com.br/desiguald...
    ).
  • 23
    V. Harari (2018HARARI, Yuval Noah. 21 lessons for the 21st century. New York: Spiegel & Grau, 2018., p. 34 e s).
  • 24
    V. Castells (2018CASTELLS, Manuel. Ruptura: a crise da democracia liberal. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.).
  • 25
    Sobre o tema, v. Nunes (2022NUNES, Daniel Capecchi. Promessa constitucional e crise democrática: o populismo autoritário na Constituição de 1988. Tese (doutorado). Faculdade de Direito, Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro. Mimeografada, 2022.).
  • 26
    “Populist claims are misconceived to begin with in presupposing a definitive unitary people” (PRENDERGAST, 2019PRENDERGAST, David. The judicial role in protecting democracy from populism. German Law Journal, vol. 20, n. 2, p. 245-262, 2019., p. 246).
  • 27
    Troll, na linguagem da internet, identifica o usuário que veicula mensagens inflamatórias, agressivas e frequentemente falsas para produzir engajamento pela raiva, indignação, ódio e radicalismo.
  • 28
    Segundo o ex-Ministro da Defesa e da Segurança Pública, Raul Jungmann, o Presidente da República teria determinado que jatos da Força Aérea Brasileira sobrevoassem o prédio do Supremo Tribunal Federal acima da velocidade do som para estourar os vidros do prédio, em ameaça aos juízes da Corte. A recusa teria motivado a demissão. Jungmann: Bolsonaro determinou que jatos sobrevoassem STF para quebrar vidros (JUNGMANN..., 2021).
  • 29
    Também o Tribunal Superior Eleitoral, integrado por três Ministros do STF, enfrentou os comportamentos antidemocráticos instaurando procedimentos para apurar falsas alegações de fraude contra o sistema eletrônico de votação, bem como determinando a “desmonetização” de sites e canais que difundiam desinformação contra o processo eleitoral e contra a democracia.
  • 30
    Foi o que ocorreu, por exemplo, em países como Camboja e Tailândia, onde as cortes superiores se valeram da doutrina “da democracia militante para suprimir a competição eleitoral” (militant democracy to suppress electoral competition), e na Venezuela, país no qual a suprema corte atuou para neutralizar e paralisar o Congresso de oposição. V. Dixon e Landau (2021DIXON, Rosalind; LANDAU, David. Abusive constitutional borrowing: legal globalization and the subversion of liberal democracy. Oxford: Oxford University Press, 2021., p. 178).
  • 31
    Sobre o tema, v. Pulido (2013PULIDO, Carlos Bernal. Unconstitutional Constitutional Amendments in the case study of Colombia: an analysis of the justification and meaning of the constitutional replacement doctrine. International Journal of Constitutional Law, vol. 11, n. 2, p. 339-357, 2013.).
  • 32
    Um dos pioneiros na discussão doutrinária desse tema Albert (2009ALBERT, Richard. Nonconstitutional amendments. Canadian Journal of Law & Jurisprudence, vol. 22, n. 1, p. 5-47, 2009., p. 21-31).
  • 33
    Sobre o tema, v. Barroso (2019c_______. The life and death of Constitutions in Latin America: constitutional amendments, the role of courts and democracy. Apresentação (Foreword). In: ALBERT, Richard; PULIDO, Carlos Bernal; BENVINDO, Juliano Zaiden (eds.), Constitutional Change and Transformation in Latin America, Oxford: Hart Publishing, 2019c.).
  • 34
    V. Roznai (2019ROZNAI, Yaniv. Constitutional Unamendability in Latin America gone wrong?. In: ALBERT, Richard; PULIDO, Carlos Bernal; BENVINDO, Juliano Zaiden (eds.), Constitutional Change and Transformation in Latin America, Oxford: Hart Publishing, 2019, p. 93-116., p. 93-116).
  • 35
    “Admittedly, no current populist government has gone as far as Peron’s in 1947 when he has initiated the impeachment and trial of 4 out of 5 Supreme Court justices, with one of them resigning before impeachment succeeded” (ARATO, 2017ARATO, Andrew. Populism, the Courts and Civil Society. 4 dez. 2017. Disponível em:https://ssrn.com/abstract=3082596. Acesso em: 28 fev. 2022.
    https://ssrn.com/abstract=3082596...
    , p. 1).
  • 36
    O Tribunal de Justiça da União Europeia considerou que a lei que reduzia a idade de aposentadoria de juízes, procuradores e notários públicos de 70 para 62 anos incompatível com as normas que regeu a União Europeia (COMISSÃO EUROPEIA, 2012).
  • 37
    Sobre a deterioração institucional da Hungria, v. Scheppele (2018SCHEPPELE, Kim Lane. Autocratic legalism. The University of Chicago Law Review, n. 85, p. 545, 2018., p. 549 e s); Dixon e Landau (2021DIXON, Rosalind; LANDAU, David. Abusive constitutional borrowing: legal globalization and the subversion of liberal democracy. Oxford: Oxford University Press, 2021., p. 89 e 92); e Mounk (2020MOUNK, Yascha. The end of history revisited. Journal of Democracy, vol. 31, n. 1, p. 22-35, 2020., p. 31).
  • 38
    A manobra do Partido Civic Platform era de fato questionável, uma vez que três dos cinco juízes substituídos somente concluiriam seus mandatos após as eleições. V. Arato (2017ARATO, Andrew. Populism, the Courts and Civil Society. 4 dez. 2017. Disponível em:https://ssrn.com/abstract=3082596. Acesso em: 28 fev. 2022.
    https://ssrn.com/abstract=3082596...
    , p. 6).
  • 39
    Tal como se passou com procedimento análogo na Hungria, a O Tribunal de Justiça da União Europeia, considerou que tal legislação violava princípios da União Europeia, com destaque para a inamovibilidade de juízes (UNIÃO EUROPEIA, 2019).
  • 40
    A Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 31 jan. 2001, condenou o Peru por violação às garantias da magistratura (the right to judicial protection) e ao pagamento de indenização aos três juízes afastados (ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS, 2001).
  • 41
    V. Corrales (2015CORRALES, Javier. Autocratic legalism in Venezuela. Journal of Democracy, vol. 26, n. 2, p. 37-51, 2015., p. 44).
  • 42
    Nesse período, o Tribunal validou inúmeras leis que transformavam a Venezuela em um regime ditatorial, por cercearem a liberdade de expressão, perseguirem adversários, mudarem regras eleitorais em favor do governo e retirarem a concessão de veículos de mídia de oposição. V. Urribarri (2011URRIBARRI, Raul A. Sanchez. Courts between Democracy and Hybrid Authoritarianism: Evidence from the Venezuelan Supreme Court. Law & Social Inquiry, vol. 36, n. 4, p. 854-884, 2011., p. 876.)
  • 43
    V. Constituição da Venezuela, art. 264 e Lei Orgânica do Tribunal Supremo de Justiça, art. 38.
  • 44
    Constituição de Honduras: “Art. 374. No podrán reformarse, en ningun caso, el articulo anterior, el presente articulo, los articulos constitucionales que se refieren a la forma de gobierno, al territorio nacional, al periodo presidencial, a la prohibicion para ser nuevamente Presidente de la Republica, el ciudadano que lo haya desempenado bajo cualquier titulo y el referente a quienes no pueden ser Presidentes de la Republica por el periodo subsiguiente”.
  • 45
    “[A]mong a nationally representative sample of the U.S. voting-age population, only 21 percent of Republicans say Joe Biden’s victory was legitimate” (CUTHBERT; THEODORIDIS, 2022CUTHBERT, Lane; THEODORIDIS, Alexander. Do republicans really believe Trump won the 2020 election? Our research suggest that they do. Washington Post, 7 jan. 2022. Disponível em: https://www.washingtonpost.com/politics/2022/01/07/republicans-big-lie-trump/. Acesso em 28 fev. 2022.
    https://www.washingtonpost.com/politics/...
    ).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Out 2023
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2023

Histórico

  • Recebido
    24 Mar 2022
  • Aceito
    30 Mar 2022
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