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Os múltiplos aspectos da linguagem em processo demencial: um comparativo entre contexto doméstico e institucional

Resumos

Analisar a expressão e interpretação/compreensão verbal e seus mecanismos subjacentes (audição, equilíbrio corporal, voz e motricidade orofacial) de duas idosas com quadro clínico de demência - uma vivendo em ambiente familiar e outra em uma Instituição de Longa Permanência para Idosos. São apresentados os casos de duas idosas: uma mulher de 85 anos, com diagnóstico de Demência de Alzheimer, que reside com o marido e uma de suas filhas; e uma mulher de 90 anos, com diagnóstico de Demência Vascular, que reside em uma Instituição de Longa Permanência para Idosos. Realizou-se uma avaliação fonoaudiológica integrada, considerando a linguagem em seus múltiplos aspectos (audição, equilíbrio corporal, voz e motricidade orofacial), na qual foram observadas manifestações linguísticas que retratam menor produção verbal por parte da idosa institucionalizada. Os resultados obtidos por meio das avaliações de audição (acuidade e processamento), equilíbrio corporal, voz e motricidade orofacial revelaram características esperadas no processo de envelhecimento saudável. As condições orgânico-fisiológicas das idosas foram compatíveis com o processo natural de envelhecimento, enquanto que as linguístico-cognitivas se apresentaram mais comprometidas. O funcionamento da linguagem apresentou características similares - esperadas para o envelhecimento em processo demencial - em ambas as idosas, porém, a idosa institucionalizada apresentou manifestações linguístico-cognitivas mais comprometidas. Este estudo evidencia a conveniência da atuação fonoaudiológica no envelhecimento, sobretudo, com demência, tanto no contexto familiar quanto institucional.

Fonoaudiologia; Linguagem; Audição; Envelhecimento; Demência


Analyzing the expression and interpretation/verbal comprehension and its underlying mechanisms (hearing, body balance, voice and orofacial motricity) of two elderly women with clinical picture of dementia - one living in the family environment and another on a home for the aged. Are presented the cases of two elderly: an 85-year-old woman, with diagnosis of Alzheimer's Dementia, which resides with her husband and one of their daughters, and a 90-year-old woman diagnosed with Vascular Dementia residing in a home for the aged. Considering the language on its multiple aspects (hearing, body balance, voice and orofacial motricity) was held a complete speech evaluation, on which were observed linguistic manifestations that depict less verbal production on the part of the institutionalized elderly. The results obtained by the hearing assessments (accuracy and processing), body balance, voice and orofacial motricity revealed expected features in healthy ageing process. The organic-physiological conditions of the elderly were compatible with the natural process of ageing, while the linguistic-cognitive ones presented themselves more committed. The functioning of the language presented similar features - expected on the ageing in dementia process - in both elderly, but, the institutionalized one presented linguistic-cognitive manifestations more committed. This study demonstrates the convenience of the action of the Speech, Language and Hearing Sciences in the ageing, especially with dementia, not only in a family context but also in an institutional one.

Speech, Language and Hearing Sciences; Language; Hearing; Aging; Dementia


Introdução

A demência acomete principalmente pessoas idosas e é a principal causa de dependência e incapacidade na velhice.

A Demência de Alzheimer (DA) é o tipo mais comum das demências e é caracterizada pelo processo degenerativo que acomete a formação hipocampal, com posterior comprometimento de áreas corticais associativas, e também está relacionada à lesão e à morte neuronal difusa, com achados patológicos caracterizados por placas senis e enovelados neurofibrilares11. Chaves MLF. Demência. In: Chaves MLF, Finkelsztejn A, Stefani MA. Rotinas em Neurologia e Neurocirurgia. Ed. Artmed, Porto Alegre, RS, 2008; P. 157-83., havendo também atrofia cortical e dilatação ventricular, atribuídas à perda neural22. Caramelli P, Barbosa MT. Como diagnosticar as quatro causas mais frequentes de demência? Rev. Bras. Psiquiatr. 2002;24(1):7-10..

O segundo tipo mais comum de demência é a Demência Vascular33. Herrera E, Caramelli P, Nitrini R. Estudo epidemiológico populacional de demência na cidade de Catanduva, Estado de São Paulo, Brasil. Rev. Psiq. Clin. 1998;25(2):70-3. (DV), que se caracteriza por diversas síndromes demenciais secundárias a comprometimentos vasculares do Sistema Nervoso Central, englobando quadros causados por múltiplas lesões tromboencefálicas, lesões únicas em territórios estratégicos (lesão em tálamo, núcleo caudados, giros angulares e hipocampo); estados lacunares, alterações crônicas da circulação cerebral (múltiplos infartos), lesões extensas da substância branca (sub-cortical), angiopatia amilóide, e quadros decorrentes de Acidente Vascular Encefálico hemorrágico - (AVEh), principalmente ruptura de aneurismas dos lobos frontais44. Bertolucci PHF, Okamoto IHO. Manual de consulta: doença de Alzheimer e outras demências. Ed. Lemos, São Paulo, SP. 2003..

Na concepção adotada nesse estudo, a família é considerada um sistema vivo, em constante transformação, buscando assegurar a continuidade e o crescimento psicossocial de seus membros. Pode-se ver que as mudanças nos aspectos econômicos, políticos, sociais, culturais, entre outros, podem trazer repercussões para os sujeitos também na família. Porém, o crescimento da população idosa traz consequências que afetam diretamente os serviços de assistência social e de saúde da população geriátrica, agravado com a precariedade dos convênios médicos e do baixo salário da aposentadoria e somado a isso, observa-se que os familiares têm dificuldades para cuidar dos seus idosos, encaminhando-os às Instituições de Longa Permanência para idosos (ILPI), casas de repouso ou instituições geriátricas. Diante disso, considera-se importante realizar estudos que analisam as condições de idosos em ambas as situações citadas (no ambiente domiciliar e na ILPI).

Para alcançar o intento de uma avaliação fonoaudiológica integral parte-se de um conjunto de conhecimentos advindos de diferentes áreas/disciplinas; adota-se, no que se refere à linguagem, a perspectiva da Neurolinguística Discursiva (ND), desenvolvida por Coudry55. Coudry MIH. Diário de narciso - Discurso e afasia: análise discursiva de interlocuções com afásicos. Martins Fontes, São Paulo, SP, 1988., que defende a participação direta ou indireta da linguagem verbal em todos os processos cognitivos (atenção, percepções, gnosias, memórias, praxias, linguagens, etc.) considerando-os em seus aspectos biológicos, mas também em seus aspectos sócio-interativos e histórico-culturais.

Diante do exposto, o objetivo deste estudo é analisar a expressão e interpretação/compreensão verbal e seus mecanismos subjacentes (audição, equilíbrio corporal, voz e motricidade orofacial) de duas idosas com quadro clínico de demência - uma vivendo em ambiente familiar e outra em uma Instituição de Longa Permanência para Idosos.

Apresentação dos casos

Este estudo pode ser caracterizado como uma investigação de campo, transversal, de caráter qualitativo, na modalidade estudo de caso, aprovado pelo CEP da Universidade Federal de Santa Maria (0324.0.243.000-11).

Os casos estudados são de EV, uma idosa que reside com o marido e uma de suas filhas, e de IC, uma idosa que reside em uma ILPI.

EV, mulher com 85 anos, é casada, tem oito filhas e nunca trabalhou fora de casa. Faz acompanhamento médico no ambulatório de geriatria de um Hospital Universitário e tem o diagnóstico de DA. EV tem ensino fundamental completo e sempre foi dona de casa, casou-se uma única vez e vive com o marido até os dias atuais, com quem teve 12 filhos, sendo que quatro deles faleceram. EV reside com o marido e uma das filhas.

Como histórico clínico, tem-se que EV iniciou o atendimento no ambulatório citado há oito anos, referindo esquecimentos, quando foram realizados exames laboratoriais e tomografia computadorizada do crânio e EV foi diagnosticada com "processo demencial leve". A partir de então, foram marcadas novas consultas, sendo que a idosa ficou cinco anos sem comparecer, buscando novamente atendimento há três anos, com a mesma queixa, mais agravada. Durante os últimos anos têm sido realizadas consultas mensais, sendo que o diagnóstico de DA veio há dois anos.

IC, mulher com 90 anos, é residente em Santa Maria (RS), em uma ILPI há três anos, solteira e sem filhos. IC possui ensino fundamental completo, trabalhou por curtos períodos de tempo como secretária em escritórios de familiares e nunca casou, porém, foi noiva de um rapaz com quem o seu pai não aprovava o casamento, pois era mais velho e costumava consumir bebidas alcoólicas. Assim que o pai de IC faleceu, a mãe dela permitiu o casamento e, então, IC ficou noiva, mas o seu noivo faleceu antes de haver o casamento. Segundo a irmã de IC, seu sonho era casar, ter filhos e trabalhar como professora, o que acabou não acontecendo. A mesma irmã ainda relata que IC sempre foi muito brava e costumava brigar com toda a família. IC sempre morou com a mãe e quando a mesma faleceu, seguiu morando com uma irmã e depois com outra, até que decidiram (ela e a família) que iria morar em uma ILPI.

As informações referentes à história de vida das idosas foram colhidas em uma conversa com familiares das idosas, realizada no intuito de conhecer melhor a história de ambas, no que se refere à vida pessoal, profissional e familiar.

Ressalta-se que para diagnosticar a demência, a médica geriatra do ambulatório onde as idosas pesquisadas realizam acompanhamento solicita os seguintes exames: tomografia computadorizada de crânio e exames laboratoriais (de sangue e dos hormônios da tireoide), estando em concordância com o que a literatura44. Bertolucci PHF, Okamoto IHO. Manual de consulta: doença de Alzheimer e outras demências. Ed. Lemos, São Paulo, SP. 2003. traz como exames suficientes para o diagnóstico de demência.

Depois de realizadas as assinaturas do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) por parte da familiar responsável pela idosa residente em ambiente domiciliar e do responsável pela ILPI, no caso da idosa institucionalizada, ambas as idosas foram avaliadas com base em um roteiro de avaliação fonoaudiológica que contempla todas as áreas da Fonoaudiologia. Este roteiro foi elaborado pela pesquisadora e permite conhecer as condições do sujeito em todos os âmbitos da competência fonoaudiológica (linguagem, audição, equilíbrio corporal, voz e motricidade orofacial).

A avaliação da linguagem oral, conforme dito anteriormente, baseou-se na perspectiva da ND55. Coudry MIH. Diário de narciso - Discurso e afasia: análise discursiva de interlocuções com afásicos. Martins Fontes, São Paulo, SP, 1988., realçando-se o trabalho linguístico-cognitivo dos sujeitos, ou seja, a linguagem foi avaliada em seu funcionamento, a partir de uma entrevista semi-estruturada que abordou dados: de identificação pessoal e da família, da rotina atual, das preferências (o que gosta e o que não gosta de fazer) e condições de saúde; narrativa de um fato relevante de sua vida e de um fato atual; produção de comentários; interpretação de um provérbio ("Filho de peixe, peixinho é."), resolução de um silogismo ("Minha mãe tem uma blusa azul e eu tenho uma blusa da mesma cor que a dela. Qual a cor da minha blusa?) e de um problema do cotidiano ("Se a senhora estivesse na rua e começasse a chover, o que a senhora faria?"); identificação de espaço e de tempo. Considera-se que tais expedientes linguísticos possibilitam a análise dos seguintes aspectos: atenção/concentração, gnosias (propriocepção corporal e percepção das coordenadas espaciais e temporais), praxias (gestos faciais e fonoarticulatórios), memórias (memória retrógrada e memória atual) e raciocínio lógico.

O encontro foi filmado e, posteriormente, os dados foram transcritos ortograficamente e analisados discursivamente, considerando-se o contexto de sua produção e interpretação de sentido, destacando-se a compreensão e expressão verbal em seus diferentes níveis de organização (fonologia, sintaxe, semântica e pragmática) e a expressão não verbal.

No que se refere à audição, realizou-se avaliação auditiva incluindo: inspeção visual do meato acústico externo; Audiometria Tonal Liminar (ATL) e logoaudiometria, em cabine acusticamente tratada, utilizando um audiômetro digital de dois canais, marca Fonix Hearing Evaluator, modelo FA 12 tipo I e fones auriculares tipo TDH-39P, marca Telephonics.

Para avaliar o processamento auditivo, foi realizada a avaliação comportamental, para a qual foram selecionados testes diferentes a serem realizados com cada idosa, devido à diferença nos resultados da avaliação audiológica. Em comum às duas idosas, foram realizados os seguintes testes66. Pereira LD, Schochat E. Testes auditivos comportamentais para avaliação do processamento auditivo central. Pró Fono, São Paulo, SP, 2011.: Teste de Localização Sonora em Cinco Direções, Teste de Memória Sequencial para Sons Verbais (MSV), Teste de Memória Sequencial para Sons Não Verbais (MSNV), teste de Fala Comprimida, Teste de Padrão de Frequência (TPF) e Teste de Padrão de Duração (TPD). Também foram realizados os Testes de Inteligibilidade de Fala Pediátrica (Pediatric Speech Intelligility - PSI) e de Fala no Ruído somente com a idosa que reside com a família e os testes Dicótico de Dígitos (TDD) e Teste de Identificações de Sentenças com Mensagem Competitiva (Synthetic Sentence Identification - SSI) somente com a idosa institucionalizada. Com relação à idosa residente em ambiente familiar, foram realizados apenas testes dióticos e monóticos devido à perda auditiva assimétrica.

Os testes realizados fazem parte do livro Processamento Auditivo Central - Manual de Avaliação, CD 1 e CD 2, com exceção do teste de localização sonora em cinco direções e dos testes MSV e MSNV, os quais são realizados com instrumentos musicais em campo livre66. Pereira LD, Schochat E. Testes auditivos comportamentais para avaliação do processamento auditivo central. Pró Fono, São Paulo, SP, 2011.. O equipamento utilizado para a avaliação do processamento auditivo foi o audiômetro de dois canais Itera II acoplado ao CD player portátil Toshiba CDP 4147.

Ainda no que se refere ao processamento auditivo, recorreu-se também ao Potencial Evocado Auditivo de Longa Latência (PEALL), que foi realizado com o equipamento "SmartEP" da marca Intelligent Hearing Systems(IHS) de dois canais. O exame foi realizado em uma sala silenciosa em ambiente semi-escuro. Os estímulos foram apresentados por meio de fones de inserção ER-3A e a intensidade de apresentação dos estímulos teve variação de 70 a 90 dBNA, de acordo com o limiar de audibilidade, sendo 80dB no caso de EV e 90dB no caso de IC.

A avaliação do equilíbrio corporal se deu por meio de provas de equilíbrio estático e dinâmico e de coordenação dos movimentos77. Mangabeira Albernaz PL, Ganança MM. Vertigem. 2. ed. Moderna, São Paulo, SP, 1976., além do Teste de Organização Sensorial (TOS), realizado por meio da Posturografia Dinâmica Foam-Laser (FLP) 88. Castagno LA. A new method for sensory organization tests: the foam-laser dynamic posturography. Rev. Bras de Otorrinolaringol. 1994;60(4):287-96..

A avaliação perceptivo-auditiva da voz se deu em situação de diálogo, ou seja, no uso produtivo da voz, e também foi medido o Tempo Máximo de Fonação (TMF) da vogal /a/.

Em relação à motricidade orofacial, foi realizada a avaliação estrutural e funcional do sistema estomatognático, ocupando-se dos aspectos de sensibilidade extra e intra-oral, mobilidade, tensão e postura dos órgãos fonoarticulatórios, da mastigação, deglutição, bem como tipo e modo respiratórios. Foram avaliadas a mastigação e a deglutição nas consistências sólida (pão francês) e líquida (água). Foi realizada também a avaliação da dinâmica da deglutição, incluindo a detecção do risco para disfagia. A avaliação iniciou-se com a deglutição da saliva, seguido da consistência pastosa, sólida e líquida.

Resultados

Com relação aos resultados referentes à avaliação da linguagem oral, serão expostos em quadros excertos dos diálogos entre a pesquisadora e as idosas.

Figura 1:
Identidade

Figura 2:
Preferências

Figura 3:
Narrativa

Figura 4:
Saúde

Figura 5:
Ocupação

Ambas as idosas apresentam perda auditiva neurossensorial em ambas as orelhas. A ATL realizada em EV revelou perda auditiva assimétrica, sendo de grau leve na Orelha Direita (OD) e de grau moderado na Orelha Esquerda (OE). A configuração da curva audiométrica encontrada foi descendente em ambas as orelhas. A logoaudiometria de EV revelou Índice Percentual de Reconhecimento de Fala (IPRF) de 88% de reconhecimento na OD e 80% na OE. IC apresenta perda auditiva simétrica de grau moderadamente severo e também curva audiométrica com configuração descendente em ambas as orelhas. O IPRF revelou 24% de reconhecimento na OD e 36% na OE.

Com relação ao processamento auditivo, ambas as idosas apresentaram habilidade de localização sonora dentro da normalidade, porém a ordenação temporal tanto para sons verbais quanto para sons não verbais, encontra-se alterada em ambos os casos. A habilidade temporal se encontra bastante prejudicada em ambas as idosas e no que se refere à resolução de frequência, IC apresenta dentro da normalidade enquanto EV apresenta alterada.

EV apresentou as habilidades auditivas de figura-fundo para sons verbais e de fechamento para sons verbais prejudicadas.

IC apresentou resultados que referem funcionamento adequado das conexões inter-hemisféricas e corpo caloso, entretanto, apresentou alteração na habilidade de figura fundo para sons verbais e associação de estímulos auditivos e visuais, reiterando a alteração encontrada anteriormente na habilidade de figura fundo para sons verbais.

No P300, ambas as idosas apresentaram N1, P2 com latências dentro do esperado para a faixa etária (N1 = 105 e P2 = 180 no caso de EV; 106 e P2 = 172 no caso de IC), evidenciando funcionamento da via auditiva em nível de córtex auditivo primário, área de associação e lobo temporal. Em relação ao P300, não apresentaram o potencial, indicando ausência de funcionamento da via auditiva hipocampal.

Nas provas do equilíbrio estático e dinâmico EV apresentou alteração apenas na prova da marcha, apresentando desvio para a direita com os olhos fechados. As demais provas EV realizou sem particularidades, assim como IC, em todas as provas, sem exceção. Na Posturografia Dinâmica Foam Laser, EV apresentou desempenho abaixo do esperado em todas as posições do teste, destacando-se a posição VI (olhos abertos, cabine em movimento e base instável), na qual EV apresentou queda, demonstrando dificuldades na integração dos sistemas vestibular, visual e proprioceptivo no teste de organização sensorial.

As vozes de EV e IC apresentam características semelhantes, sendo elas soprosidade e rouquidão discretas, loudness reduzida e pitchagravado. Quanto aos TMF, ambas as idosas apresentaram valores abaixo da normalidade (6,83 segundos no caso de EV e 7,05 segundos no caso de IC). Todas as características vocais foram analisadas tanto na avaliação vocal como durante toda a interação verbal.

EV e IC apresentaram poucas alterações no que se refere à motricidade orofacial. Ambas possuem tensão diminuída de bochechas, lábios e língua e falhas dentárias. EV realiza mastigação assimétrica à esquerda e IC apresentou tosse durante a avaliação da dinâmica da deglutição na consistência sólida. Os resultados foram confirmados mediante observação de uma refeição cotidiana realizada por cada idosa, a fim de observar os achados nas situações do dia a dia.

Discussão

A Figura 1 revela dados relativos à identidade das idosas estudadas. O trecho da entrevista com EV, que faz parte deste quadro, aborda a questão referente ao seu nome. Para garantir a identidade do sujeito, substituiu-se o primeiro nome por outro, que apresenta características semelhantes, tendo em vista que ambos os nomes (o nome verdadeiro de EV e o fictício apresentado neste estudo) apresentam duas possíveis pronúncias: a primeira, igual à sua grafia, proveniente de outro idioma; e a segunda, trazida para a língua portuguesa, transformando-o em um nome mais conhecido neste idioma. Ressalta-se que EV, quando questionada sobre o seu nome, respondeu imediatamente "Gisela", mesmo que seu nome, nos documentos, seja "Guísela". Este dado demonstra que EV possui autonomia e autenticidade ao explicitar seu desejo de ser chamada pelo nome que prefere, mesmo não sendo com a pronúncia referente ao idioma de origem, o que faz com que EV apareça como um sujeito com identidade, pois se impõe com autenticidade, possui desejos e valores próprios, marcados pela particularidade de seu contexto histórico.

Ainda se tratando da Figura 1, IC relata que não quer dizer a idade nem a data de nascimento, o que pode ser explicado, possivelmente, por não saber relatar esse dado, visto que IC não apresenta, em seu discurso, vaidades que justifiquem esse desejo (de que ninguém saiba a sua idade). Esta hipótese de falta de memória constitui uma lacuna na identidade do sujeito e ganha força por ser característica comum no envelhecimento e, principalmente, nas demências. Além disso, a perda de memória pode também ser relacionada com o processo de institucionalização, que pouco possibilita o ambiente e os interlocutores para o uso efetivo da linguagem e de demais funções cognitivas, como a memória. Também se pode associar esse comprometimento com as alterações encontradas na avaliação do processamento auditivo, já que a memória auditiva e as demais habilidades auditivas estão comumente alterada nos idosos99. Buss LH, Rossi AG, Buss CH, Oliveira RC. Desempenho nas habilidades auditivas de atenção seletiva e memória auditiva em um grupo de idosos protetizados: influência de perda auditiva, idade e gênero. Rev CEFAC. 2013;15(5):1065-72., bem como em IC.

Na Figura 2, quando questionadas sobre o que gostam de fazer, as idosas respondem de maneira muito diferente, sendo que EV dialoga de forma mais expressiva do que IC. Quando EV se posiciona como alguém ativo, que gosta de cuidar da casa, nota-se coerência com a sua história pregressa, tendo em vista que a mesma sempre foi dona de casa e sempre assumiu como sua responsabilidade manter a casa em ordem.

Quando relata que não gosta de sair porque está velha, EV sugere que o lazer e o divertimento são exclusivos dos sujeitos mais jovens, característica que pode agravar o processo de isolamento social visto no envelhecimento, já que a mesma prefere ficar em casa a socializar com outras pessoas em outros ambientes. Ainda assim, EV se expressa de maneira coerente com sua história e seu modo de vida, ao contrário de IC, que se mantém em silêncio quando questionada, mesmo após diversas tentativas. O silêncio de IC se repete em vários momentos da entrevista, sendo acompanhados por olhares perdidos. Pode-se destacar que quando requerida, IC se mostra mais retraída do que quando busca a interação. Este silêncio pode ser interpretado como um obstáculo na comunicação colaborando para o isolamento social, e ele pode ser interpretado como uma característica da sua condição linguístico-cognitiva, decorrente do processo demencial na qual se encontra, visto que esta degeneração progressiva traz como características a redução da iniciativa de comunicação, a limitação do vocabulário e a dificuldade de encadear ideias e de fornecer informações precisas, o que justifica o seu silêncio em diversos momentos do diálogo.

Na Figura 3, EV se coloca como "esquecida", o que sugere que ela esteja assumindo o papel que lhe é dado pela família, o de alguém sem memória. EV reproduz o discurso comumente empregado pelos familiares, que a caracterizam como tal, o que demonstra o sentimento de inferioridade, por estar velha, e a afetividade e confiança no que é dito pela família, sobretudo, por membros mais jovens.

A partir dos questionamentos realizados, EV não inicia uma narrativa, mas introduz apenas tópicos e comentários. Ainda assim, EV faz uma rememoração do passado ao lembrar do quão importante foram os nascimentos de suas filhas, o que concorda com a literatura1010. Preti D. A Linguagem dos Idosos. Contexto, São Paulo, SP, 1991., que salienta que os idosos têm mais recordações antigas do que recentes e, por isso, o discurso de pessoas mais velhas geralmente está relacionado com o passado, período sobre o qual o idoso ainda têm domínio de memória e no qual o mesmo se vê com maior prestígio.

Um sujeito doente influencia os demais membros da família e, assim, a família constitui um sistema vivo que se desenvolve e se transforma com o tempo. Isto pode ser observado no caso de EV, já que os familiares (marido e filhas) se envolvem com o diagnóstico de EV, demonstrando cuidado e preocupação, mas também a caracterizam como "esquecida" e, por vezes, incapaz de responder aos questionamentos da pesquisadora, o que faz com que ocupem o seu turno na interação.

Ao contrário de EV, IC se mantém em silêncio e não corresponde às negociações realizadas pela interlocutora, que faz uso de estratégias como o estranhamento (a partir de que IC diz não ter nada para contar) e a introdução de possíveis temas para dar início à narrativa. Como IC silencia mesmo após as tentativas de negociação, a pesquisadora opta por respeitar a opção da idosa e introduzir outro assunto no diálogo.

Na Figura 4 foram incluídos trechos nos quais as idosas falam sobre sua saúde. Nota-se a diferença entre os discursos de EV e IC, já que a primeira relaciona o seu mal estar físico com questões afetivas e emocionais presentes no momento da entrevista (a entrevista foi realizada poucos dias após ter acontecido uma tragédia na cidade - referente a um incêndio), ao contrário de IC, que demonstra saber que não está bem de saúde apenas por tomar uma grande quantidade de remédios, mas demonstra desconhecer os problemas de saúde que apresenta. Na primeira parte do quadro, referente ao diálogo travado entre EV e a pesquisadora, pode-se destacar a dificuldade de ambas para tratar sobre o assunto trazido por EV - a tragédia citada anteriormente - principalmente pelo fato ser muito recente na data da entrevista, dificuldade esta marcada pela repetição da expressão "né", expressa pelas duas interlocutoras. Já no que se refere ao diálogo travado entre IC e a pesquisadora, quando esta questiona a IC "do quê" ela está se tratando, a mesma não responde à pergunta e dá outra informação ainda fazendo parte do tema - responde o "porquê" de referir estar em tratamento (porque toma remédios). Supõe-se que IC não sabe as questões de saúde que a levam a tomar os medicamentos, já que a mesma se encontra institucionalizada e costuma apenas obedecer às ordens dos profissionais de saúde que, por serem muito ocupados, geralmente não explicam os tratamentos realizados e, além disso, a sua condição cognitiva traz possíveis limitações para memorizar os medicamentos tomados, bem como desencadear essas informações solicitadas.

No que se refere à atenção e concentração, é importante destacar que IC demonstrou cansaço e dificuldade de se manter atenta ao diálogo, durante todas as avaliações, sobretudo a de linguagem. Em diversos momentos, IC referiu estar cansada, não querer mais conversar, perguntando quanto tempo demoraria, demonstrando uma certa desatenção durante a interação. Durante as demais avaliações esta característica também foi notada, tendo em vista que na avaliação do processamento auditivo, IC relatou mais de uma vez que estava cansada e foi necessário dar intervalos para que a mesma tomasse água e descansasse um pouco, para retornar aos testes comportamentais, considerando que, enquanto estava cansada e desatenta, os resultados não seriam fidedignos. Esta característica pode estar relacionada ao próprio envelhecimento agravado pelo processo demencial ou a características pessoais da idosa, já que, segundo relato da sua irmã, IC sempre foi vista como uma pessoa impaciente, brava e desatenta.

Já, EV, mostrou-se sempre atenta à interação e participativa. Não demonstrou cansaço durante as avaliações e não apresentou dificuldade de atenção ou concentração para realizar as tarefas solicitadas.

Com relação ao raciocínio lógico, ambas as idosas interpretaram e solucionaram corretamente o silogismo e o problema do cotidiano utilizados na pesquisa, embora IC tenha apresentado maior tempo para responder e pedido para repetir a pergunta, no caso do silogismo.

Sabe-se que o envelhecimento é responsável pela degeneração dos órgãos do corpo humano, que a audição também é afetada por isso e que ela, como dito anteriormente, está intrinsecamente ligada à produção e interpretação da linguagem oral.

Caracteriza-se a presbiacusia, perda auditiva causada pelo envelhecimento, como uma perda auditiva neurossensorial bilateral, simétrica e com maior prejuízo nas frequências agudas, conforme afirma a literatura clássica1111. Jerger S, Jerger J. Presbiacusia. In: Jerger S, Jerger J. Alterações auditivas: um manual para avaliação clínica. São Paulo: Atheneu, 1989. P.165-71.. O presente estudo vai ao encontro do que a literatura afirma no que se refere ao envelhecimento (com ou sem patologia), visto que tanto EV quanto IC apresentam perda auditiva neurossensorial bilateral com curva audiométrica descendente e no caso de IC, perda auditiva simétrica. Entretanto, EV apresenta perda auditiva assimétrica, o que discorda da caracterização de presbiacusia, mas concorda relativamente com um estudo1212. Sousa MGC, Russo I. Audição e percepção da perda auditiva em idosos. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2009;14(2):241-6. que encontrou perda auditiva em aproximadamente 67% dos idosos avaliados e quase metade deles apresentaram perda assimétrica.

Com relação à logoaudiometria, a literatura1111. Jerger S, Jerger J. Presbiacusia. In: Jerger S, Jerger J. Alterações auditivas: um manual para avaliação clínica. São Paulo: Atheneu, 1989. P.165-71.refere que a inteligibilidade de fala varia a depender da localização e severidade da alteração auditiva, sabe-se que em sujeitos com comprometimento coclear, os valores de inteligibilidade máxima de fala geralmente são compatíveis com o grau da perda de sensitividade. Entretanto, em sujeitos com comprometimento retrococlear, a performance de inteligibilidade máxima de fala pode ser incomumente pobre em relação ao grau da perda auditiva. Os resultados do IPRF no caso de EV sugerem um comprometimento coclear, já os resultados de IC sugerem um comprometimento retrococlear.

É importante salientar que as características encontradas nas avaliações citadas acima revelam alterações auditivas relativas ao processo natural de envelhecimento, conforme dito anteriormente, referentes à presbiacusia, independente da condição cognitiva.

As idosas avaliadas não apresentaram nenhuma alteração na produção verbal no que se refere ao nível fonético-fonológico, o que corrobora a literatura1313. Mansur LL, Carhery MT, Caramelli P, Nitrini R. Linguagem e cognição na Doença de Alzhemer. Psicologia: Reflexão e Crítica. 2005;18(3):300-7. que afirma que as dificuldades de linguagem decorrentes da demência (sobretudo de Alzheimer) geralmente não incluem os aspectos fonético-fonológicos na produção da linguagem. Porém, os mesmos autores relatam, ainda sobre os aspectos fonético-fonológicos - agora sobre a compreensão - que os sujeitos com demência podem apresentar inabilidade de sintetizar e processar a informação fornecida pela fala, o que vai ao encontro deste estudo, no qual as idosas apresentaram dificuldades nos testes de processamento auditivo, que avaliam estas habilidades, conforme será discutido a seguir.

A literatura1414. Pinheiro ML, Musiek FE. Sequencing and temporal ordering in the auditory system. In: Pinheiro ML, Musiek FE eds. Assement of central auditory dysfuncion - foundation and clinical correlates. Baltimore: Willians & Wilkins; 1985. P. 219-38. coloca a ordenação temporal, por exemplo, como função básica para a discriminação e interpretação da fala, e ainda ressalta o papel da integração hemisférica e da participação de outras áreas do SNC para a realização desta tarefa. Sendo assim, a linguagem está, certamente, intimamente relacionada com o processamento auditivo e vice-versa.

O processamento auditivo é um conjunto de habilidades que somadas são: detecção do som, localização sonora, ordenação temporal, atenção auditiva, figura-fundo auditiva, síntese binaural, separação binaural, fechamento auditivo, associação auditiva, memória auditiva, reconhecimento, discriminação e resolução temporal. Com relação a estas habilidades, pode-se observar que EV e IC apresentam a habilidade auditiva de localização sonora dentro da normalidade, o que concorda com um estudo1515. Pinheiro MMC, Pereira LD. Processamento auditivo em idosos: estudo da interação por meio de testes com estímulos verbais e não verbais. Rev. Bras. Otorrinolaringol. 2004;70(2):209-14. que também encontrou normalidade nesta habilidade avaliada em idosos.

Entretanto, encontram-se alteradas em ambas as idosas avaliadas as habilidades de: ordenação temporal (tanto para sons verbais quanto para sons não verbais), resolução temporal, fechamento auditivo e figura fundo para sons verbais.

No que se refere ao processamento auditivo temporal, o presente estudo vai ao encontro à literatura1616. Liporaci FD, Frota SMMC. Resolução temporal auditiva em idosos. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010;15(4):533-9. que refere déficit no desempenho em resolução temporal de idosos.

Tratando-se das habilidades de fechamento e figura fundo para sons verbais, um estudo1717. Caporali SA, Silva JA. Reconhecimento de fala no ruído em jovens e idosos com perda auditiva. Rev Bras Otorrinolaringol. 2004;70(4):525-32. que avaliou o reconhecimento de fala no ruído em idosos revelou que estes, sobretudo com perda auditiva, como são os casos das idosas estudadas no presente estudo, apresentam desempenho pior com relação à percepção da fala na presença de ruído. Outro estudo99. Buss LH, Rossi AG, Buss CH, Oliveira RC. Desempenho nas habilidades auditivas de atenção seletiva e memória auditiva em um grupo de idosos protetizados: influência de perda auditiva, idade e gênero. Rev CEFAC. 2013;15(5):1065-72., realizado com idosos de 60 a 84 anos, revelou que a idade e o grau de perda auditiva influenciaram significantemente (principalmente nos idosos com mais de 80 anos) nos resultados obtidos na avaliação do processamento auditivo, sobretudo nas habilidades de fechamento e figura fundo para sons verbais, o que pode ser observado nesse estudo, já que tanto EV quanto IC possuem mais de 80 anos e perda auditiva em ambas as orelhas.

Quanto à habilidade de resolução de frequência, IC apresentou resultados dentro da normalidade, enquanto EV apresentou resultados com alteração. Um estudo1818. Parra VM, Iório MCM, Mizahi MM, Baraldi GS. Testes de padrão de freqüência e de duração em idosos com sensibilidade auditiva normal. Rev. Bras. Otorrinolaringol. 2004;70(4):517-23. caracterizou o desempenho de idosos nos testes TPF e TPD e revelou que quanto maior a idade pior o desempenho dos sujeitos, sendo encontrada maior correlação no TPD. Pode-se dizer que a presente pesquisa vai ao encontro ao estudo citado, pois observa-se que EV apresentou alteração no TPF, enquanto ambas apresentaram alteração no TPD, o que sugere que a idade avançada pode estar relacionada com estas alterações. Porém, ocorreu o que não era esperado com IC, que apresentou resultados dentro da normalidade no TPF e, inclusive, resultados melhores que os de EV. Esperavam-se resultados diferentes tanto por ela ter idade mais avançada (90 anos) e, como dito anteriormente, este ser um fator determinante para piora dos resultados nestes testes, quanto pelo comprometimento cognitivo e pela institucionalização. Sabe-se que a falta de interlocutores e de ambientes que favoreçam o uso contínuo da linguagem e das habilidades auditivas propiciaria um pior resultado nas habilidades auditivas no caso de IC, sobretudo na resolução temporal, pela grande relação com a interpretação da linguagem. Trata-se, pois, de uma particularidade do sujeito IC, que contraria os estudos até então disponíveis.

O PEALL revelou alteração em ambos os casos estudados, já que tanto IC e EV não apresentaram P300. A literatura afirma que, no PEALL, há relação da latência das ondas com o avanço da idade e com a DA1919. Pedroso RV, Fraga FJ, Corazza DI, Andreatto CA, Coelho FG, Costa JL et al. P300 latency and amplitude in Alzheimer's disease: a systematic review. Braz J Otorhinolrayngol. 2012;78(4):126-32., o que não foi percebido neste estudo, já que as duas idosas apresentaram N1, P2 com latências dentro da normalidade, mesmo com idades avançadas. Entretanto, estes resultados vão ao encontro a outro estudo2020. Cóser MJS, Cioquetta E, Pedroso FS, Cóser PL. Cortical Auditory Evoked Potentials in Elderly with Difficulty in Speech Understanding Complaint. Arq. Int. Otorrinolaringol. 2007;11(4):396-401. realizado com 19 idosos com queixa de dificuldade para entender a fala, os sujeitos também apresentaram N1 e P2 com latências dentro da normalidade. No que se refere à relação com o comprometimento cognitivo, há um estudo2121. Gonçales AS. Desempenho de idosos com e sem doença de Alzheimer em testes auditivos centrais: estudo comparativo [dissertação]. Ribeirão Preto (SP): Universidade de São Paulo, Faculdade de Medicina; 2010. realizado com idosos com e sem DA, na qual os resultados mostraram diferença significante entre os dois grupos nos testes comportamentais (TDD e SSW), porém encontraram latências do P300 dentro da normalidade em ambos os grupos, discordando do presente estudo, no qual as idosas avaliadas não apresentaram P300.

O discurso de IC aparece mais comprometido, possivelmente porque o processo demencial, que por si só, já traz manifestações linguísticas que tendem ao isolamento social, neste caso pode estar agravado pela institucionalização, que também pode proporcionar um maior isolamento social e possui a tendência de cuidar da saúde física, sem dedicar os cuidados também à interação social. As dificuldades de comunicação demonstradas por ela, como o silêncio frequente na conversação, são, então, resultantes do processo demencial na qual se encontra, e podem ser também relacionadas com os resultados obtidos nas avaliações auditivas, já que IC apresenta perda auditiva e alterações nas habilidades auditivas, o que influencia na recepção e no processamento das informações e, consequentemente, potencializa o isolamento social e influencia negativamente na qualidade de vida1212. Sousa MGC, Russo I. Audição e percepção da perda auditiva em idosos. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2009;14(2):241-6.. Além disso, quando o papel do idoso se transforma, as características de sua linguagem passam a ser consideradas, por muitos, como alteradas. Isso justificaria, sobretudo diante da institucionalização, a condenação a uma vida silenciosa, isolada e introspectiva, o que demonstra que a falta de interlocução na instituição afeta a comunicação, provavelmente pelo cuidado institucional estar mais voltado aos aspectos físicos que interacionais. Porém, salienta-se que estas duas características (alterações auditivas e institucionalização) são apenas hipóteses para um agravamento às condições linguístico-cognitivas de IC que são, sobretudo, desencadeadas pelo processo demencial, que, como dito anteriormente, implica em limitações na expressão verbal (como limitação de vocabulário e dificuldade de desencadear ideias e dar determinadas informações).

No que se refere aos aspectos semânticos, não foram observadas muitas dificuldades na conversação, exceto o surgimento de uma parafasia na fala de IC (quando fala "atendentes" se referindo a "clientes", na Figura 5). Segundo a literatura1313. Mansur LL, Carhery MT, Caramelli P, Nitrini R. Linguagem e cognição na Doença de Alzhemer. Psicologia: Reflexão e Crítica. 2005;18(3):300-7. as dificuldades nos aspectos semânticos podem ser explicadas tanto por déficits atencionais quanto de acesso lexical. Porém é importante salientar que, na perspectiva da ND, a parafasia é um fenômeno também presente no discurso de sujeitos saudáveis (idosos ou não), mesmo que com menos ocorrência do que nos casos patológicos.

Quanto à sintaxe, não se observaram dados relevantes que pudessem ser caracterizados como alterações, pois as idosas não apresentaram omissão de morfemas gramaticais e mantiveram corretos o emprego de classes gramaticais e a ordenação sintática, por exemplo, o que corrobora a afirmação de que o componente sintático da linguagem pode se encontrar preservado em casos de demência, principalmente no estágio inicial, pois esse nível da linguagem tende a apresentar alterações em estágios mais avançados da demência. Um dado relevante de ser considerado é quando IC inicia a fala com alterações sintáticas e, em seguida, realiza uma autocorreção. Ao ser questionada sobre o que significa o provérbio "filho de peixe, peixinho é", IC responde "filho de pai... o pai sai parecido com o filho", ou seja, IC percebe que a frase não estava bem organizada sintaticamente e realiza uma correção.

No que se refere ao equilíbrio corporal, considera-se a relação do mesmo com as funções cognitivas, principalmente o que se refere à percepção espacial. Destaca-se que as avaliações realizadas (provas de equilíbrio estático, dinâmico e de coordenação dos movimentos e o TOS) podem ser consideradas adequadas para avaliar idosos, tendo em vista que o envelhecimento provoca alterações que vão além do sistema vestibular, compreendendo também os sistemas visuais e proprioceptivos2222. Konrad HR, Girardi M, Helfert R. Balance and aging. Laryngoscope. 1999;109:1454-60.. Nas provas de equilíbrio estático e dinâmico, as idosas estudadas, em geral, não apresentaram alterações exceto EV na prova da Marcha com os olhos fechados, o que sugere que o apoio visual é de suma importância para manter o equilíbrio da mesma, confirmando-se esta afirmação pelo TOS, no qual EV apresentou queda na posição em que havia conflito visual. Os resultados encontrados no presente estudo concordam com uma pesquisa recente2323. Scherer S, Lisboa HRK, Pasqualotti A. Tontura em idosos: diagnóstico otoneurológico e interferência na qualidade de vida. Rev.Soc Bras. Fonoaudiol. 2012;17(2):42-50., que não encontrou alteração na maioria dos idosos avaliados por meio das mesmas provas, porém discordam de outro estudo2424. Gorski LP, Andrade MS, De Conto J. Proposta de triagem do equilíbrio corporal aplicada a um grupo da terceira idade. Revista Salus-Guarapuava-PR. 2008;2(1):37-45. que encontrou alterações na maioria dos idosos avaliados, mesmo que sem comprometimento cognitivo.

As alterações encontradas no TOS evidenciam que o envelhecimento traz maiores comprometimentos no equilíbrio corporal de idosos, associando-se à demência ou não. Os resultados encontrados nas avaliações de EV e IC corroboram os estudos que encontraram prejuízo no equilíbrio corporal de idosos avaliados por meio da posturografia dinâmica Foam-Laser, como também refere a literatura recente2525. Müjdeci B, Aksoy S, Atas A. Evaluation of balance in fallers and non-fallers elderly. Braz J Otorhinolaryngol. 2012;78(5):104-9.. O presente estudo ainda evidencia o maior comprometimento na preferência visual e no sistema visual, o que pode ser explicado pela grande ocorrência de déficit visual na velhice, confirmando que este prejuízo relaciona-se diretamente com o equilíbrio corporal2626. Simonceli L, Bittar RMS, Bottino MA, Bento RF. Perfil diagnóstico dos idosos portador de desequilíbrio corporal. Rev Bras Otorrinolaringol. 2007;68(6):772-7..

Além disso, as alterações de equilíbrio corporal podem estar relacionadas às dificuldades de orientação espacial, que são frequentes nos casos de demência2727. Hort J, Laczó J, Vyhnálek M, Bojar M, Bures J, Vicek K. Spatial navigation déficit in amnestic mild cognitive impairment. Proc Natl Acad Sci USA. 2007;104(10):4042-7., já que é comum ouvir relatos de familiares ou cuidadores referindo que o idoso em processo demencial costuma se perder em locais com os quais estava acostumado, inclusive em sua própria casa. Com relação a isso, tanto EV quanto IC conseguiram responder corretamente a data, o horário e o local em que se encontravam no momento, sendo que EV respondeu correta e instantaneamente, enquanto IC respondeu com facilidade os questionamentos sobre dia da semana, horário e local, mas pediu ajuda à pesquisadora quando questionada sobre o dia do mês, o mês e o ano. Este fato pode ser relacionado tanto ao processo demencial quanto ao processo de institucionalização (já que na ILPI o dia da semana é mais importante - tendo em vista as atividades semanais - do que o dia do mês, por exemplo).

As vozes de EV e IC, avaliadas perceptivo-auditivamente, carregam características que são comuns à presbifonia, termo utilizado para caracterizar o envelhecimento da voz, que acontece já que a voz depende do equilíbrio respiratório, laríngeo, articulatório e ressonantal e algumas alterações fisiológicas decorrentes da idade podem alterar este processo. Estas alterações podem mudar a frequência fundamental da voz dos idosos, o que pode levar à perda da identidade quanto ao sexo do falante2828. Soares LT. Comparação do padrão vocal de idosos com e sem doença pulmonar obstrutiva crônica [dissertação]. São Paulo (SP): Universidade Federal de São Paulo, Curso de Distúrbios da Comunicação Humana; 2001., o que pode-se observar na voz de ambas as idosas estudadas, que apresentam pitch agravado.

Outras características vocais atribuídas à população idosa são: aumento da rouquidão, aumento da soprosidade e loudness reduzida2929. Souza LBR. Atuação Fonoaudiológica em Voz. Rio de Janeiro: Revinter, 2010.. Os resultados encontrados no presente estudo corroboram os estudos citados acima e também uma pesquisa realizada com idosos institucionalizados (como é o caso de IC) que encontrou qualidade vocal prejudicada por características como rouquidão, soprosidade, loudness reduzida, pitchagravado e TMF reduzidos, mesmas características observadas na voz de IC e EV. A loudness reduzida pode ser explicada pela perda do controle fino das pregas vocais, pela perda auditiva, presente na maioria dos idosos, inclusive nas idosas avaliadas neste estudo, e também pela relação com as características comuns à linguagem do idoso, a qual muitas vezes é vista como pouco interessante pelos interlocutores mais jovens, o que faz com que o idoso se sinta um falante pouco atrativo1010. Preti D. A Linguagem dos Idosos. Contexto, São Paulo, SP, 1991., confirmando o argumento citado anteriormente, de que a interação modifica a voz e, portanto, é importante relacioná-las3030. Chun YSR. A voz na interação verbal: como a interação transforma a voz [tese]. São Paulo (SP): Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Curso de Linguística Aplicada e Estruturas da Linguagem; 2000.. Já no que se refere aos TMF, comparando-os com os valores esperados para os adultos, percebe-se a clara redução que o processo de envelhecimento promove nessa medida.

No que se refere à motricidade orofacial, a perda dentária é o aspecto mais relevante. Ambas as idosas, usam próteses dentárias (EV parcial e IC total), sendo que EV apresenta mastigação assimétrica, o que pode estar relacionado às falhas dentárias, que são comuns em idosos. Falhas dentárias tendem a gerar dificuldades na articulação, que é um dos níveis (respiração, fonação e articulação/ressonância) da produção vocal, o que interfere diretamente na maneira como o sujeito se coloca no discurso, tendo em vista que o movimento (fonoarticulatório) segue propósitos de significação. Sendo assim, os aspectos da motricidade orofacial interferem na maneira como é produzida a linguagem oral e por isso também é importante relacioná-los. A tensão diminuída de bochechas, lábios e língua, encontrada nas duas idosas estudadas, também está relacionadas com a produção da linguagem oral, e também são características comumente encontradas no processo de envelhecimento.

Ainda no que diz respeito à motricidade orofacial, especificamente na área de disfagia, pode-se observar que EV não apresentou nenhum sinal clínico de penetração laríngea e/ou aspiração laríngo-traqueal na avaliação da dinâmica da deglutição. Já IC apresentou tosse na avaliação da deglutição na consistência sólida, o que pode ser considerado um sinal do processo normal de envelhecimento do mecanismo da deglutição, já que algumas características (tosse, deglutições múltiplas, diminuição da elevação laríngea, trânsito oral lentificado, etc.) podem aparecer devido às modificações anatomofisiológicas decorrentes da própria senescência (chamada presbifagia), não havendo, necessariamente, uma relação com a demência e/ou outra patologia.

Considerações Finais

Conforme visto anteriormente, considera-se, neste estudo, que para aprimorar a comunicação e a alimentação de sujeitos idosos em processo demencial, deve-se considerar a linguagem associada aos seus múltiplos aspectos - audição, do equilíbrio corporal, da voz e da motricidade orofacial -, já que estão todos correlacionados.

As condições orgânico-fisiológicas das idosas foram compatíveis com o processo natural de envelhecimento, enquanto que as linguístico-cognitivas se apresentaram mais comprometidas.

O funcionamento da linguagem apresentou características similares - esperadas para o envelhecimento em processo demencial - em ambas as idosas. No entanto, a idosa em contexto familiar/doméstico (EV), ao invés de silenciar como faz IC (institucionalizada), se apoia no outro (família), mesmo que este ocupe seu espaço no diálogo antes mesmo da idosa se colocar como sujeito.

Este estudo ressalta que, no processo de institucionalização, a preocupação deve ir além da saúde física, mas englobar também a interação social, pois, se não houver cuidado em manter a interação, as consequências para os sujeitos em processo demencial serão consideravelmente negativas.

Diante do exposto, o estudo esclarece tanto para os profissionais da saúde quanto para os familiares de idosos, o quão importante é a atuação fonoaudiológica no envelhecimento e nos processos demenciais, já que a linguagem mantém o sujeito vivo na sua interação. Salienta-se, assim, a necessidade da Fonoaudiologia intervindo em processos terapêuticos em situação de domicilio e em ILPI, tendo em vista o aprimoramento das condições orgânico-fisiológicas e das manifestações linguísticas de sujeitos em envelhecimento, sobretudo, em processo demencial.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2015

Histórico

  • Recebido
    29 Maio 2014
  • Aceito
    22 Ago 2014
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