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Os aspectos da linguagem de crianças com altas habilidades/superdotação: revisão integrativa da literatura

RESUMO

Objetivo:

analisar informações e características sobre a linguagem de crianças com diagnóstico para altas habilidades e superdotação.

Métodos:

revisão integrativa da literatura realizada a partir da busca de dados em bases eletrônicas do Portal de Pesquisas da Biblioteca Virtual em Saúde, LILACS, MEDLINE, Google Scholar, utilizando combinação das palavras chaves “Fonoaudiologia e altas habilidades”, “superdotação e linguagem infantil”.

Resultados:

foram analisados 45 artigos que preencheram os critérios de inclusão, dentre os quais 29 foram excluídos e 16 selecionados para a revisão. A análise destes artigos permitiu verificar, ainda que superficialmente, os aspectos presentes na linguagem oral e escrita de crianças com altas habilidades e superdotação. O vocabulário e discurso destas crianças geralmente é rico, com excelente habilidade de compreensão. Há um interesse precoce pela leitura, além de notável habilidade de decodificação e compreensão da escrita. Os estudos indicam que, estas capacidades se apresentam de uma maneira atípica, quando comparadas a população tida como normal, cujo discurso tende a ser compatível com crianças 2 anos mais velhas e o desenvolvimento da linguagem ocorrendo de maneira mais acelerada.

Conclusão:

a linguagem das crianças diagnosticadas com altas habilidades e superdotação possui particularidades que devem ser melhor estudadas, pois o seu desenvolvimento se difere das demais crianças.

Descritores:
Fonoaudiologia; Educação Infantil; Criança Superdotada; Linguagem Infantil

ABSTRACT

Purpose:

to analyze information and characteristics of the language of children diagnosed with high abilities and giftedness.

Methods:

an integrative literature review based on a search in LILACS, MEDLINE, and Google Scholar databases, combining the keywords “Speech-Language-Hearing and high abilities”, “giftedness and child language”.

Results:

a total of 45 articles that met the inclusion criteria were analyzed, of which 29 were excluded and 16 selected for the review. The analysis of these articles made it possible to verify, though superficially, the aspects in the oral and written language of children with high abilities and giftedness. These children’s vocabulary and discourse are usually rich, with excellent comprehension skills. There is early interest in reading, besides noteworthy writing comprehension and decoding skills. The studies indicate that these capacities are atypical when compared with those of the population referred to as normal. The discourse of gifted children tends to be compatible with that of children two years older, and their language develops faster.

Conclusion:

the language of children diagnosed with high abilities and giftedness has particularities that must be better studied, as their development differs from that of other children.

Keywords:
Speech, Language and Hearing Sciences; Child Rearing; Child, Gifted; Child Language

Introdução

As nomenclaturas usadas para definir as pessoas com potencial além da média, surgem no cenário brasileiro por volta do ano de 1929, primeiramente sendo designados por “super-normais”, seguindo com bem-dotados, excepcionais, superdotados, até chegar em altas habilidades e/ou superdotação. O termo Superdotado foi usado oficialmente pela primeira vez em 1971 na Lei de Diretrizes e Bases 5.692/71, no artigo 9º, que dizia que os superdotados, deveriam receber tratamento especial, de acordo com as normas fixadas pelos competentes Conselhos de Educação. Contudo, com o maior avanço do Brasil em relação a educação inclusiva, surgiu então, em 1994, com a publicação das Políticas Nacionais de Educação Especial o termo “altas habilidades” 11. Branco APSC. Breve história acerca das altas habilidades/superdotação: políticas e instrumentos para a identificação. Educação, Batatais. 2017;7(2):23-41.,22. Souza VS. Altas habilidades e superdotação: uma reflexão sobre o tema [Monografia]. Medianeira (PR): Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curso de Pós-graduaçao em Educação: Métodos de Técnicas de Ensino; 2013..

Sujeitos diagnosticados com altas habilidades/superdotação (AH/SD) podem apresentar grande facilidade de aprendizagem, com domínio e rápida clareza sobre conceitos, procedimentos e atitudes. Como consequência, apresentam condições de aprofundar e enriquecer em conteúdo 22. Souza VS. Altas habilidades e superdotação: uma reflexão sobre o tema [Monografia]. Medianeira (PR): Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curso de Pós-graduaçao em Educação: Métodos de Técnicas de Ensino; 2013.

3. BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Projeto Escola Viva: alunos com necessidades especiais educacionais especiais. Série 2. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial. 2002. http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/construindo.pdf.
http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/...
-44. Cardoso AOG, Becker MAD. Identificando adolescentes em situação de rua com potencial para altas habilidades/superdotação. Rev. Bras. Educ. Esp. 2014;20(4):605-14..

A portaria de Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, esclarece que os alunos com altas habilidades/superdotação demostram potencial elevado em qualquer uma das seguintes áreas, isoladas ou combinadas: intelectual, acadêmica, liderança, psicomotricidade e artes, além de apresentar grande criatividade, envolvimento na aprendizagem e realização de tarefas em áreas de seu interesse 33. BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Projeto Escola Viva: alunos com necessidades especiais educacionais especiais. Série 2. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial. 2002. http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/construindo.pdf.
http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/...
,44. Cardoso AOG, Becker MAD. Identificando adolescentes em situação de rua com potencial para altas habilidades/superdotação. Rev. Bras. Educ. Esp. 2014;20(4):605-14..

No entanto, as pessoas com AH/SD constituem um grupo que é pouco compreendido e na maioria das vezes negligenciado, desta forma, desenha-se um cenário com profissionais que não são capazes de ter uma real compreensão sobre as verdades e mitos envolvidos e, consequentemente, a falha na assistência a estes sujeitos. Um ponto importante a saber é que raramente as crianças são superdotadas em todos os domínios acadêmicos. Podem apresentar grande desempenho em determinada área ou assunto, mas apresentar dificuldades claramente visíveis em outros segmentos. As pessoas com AH/SD podem demonstrar uma boa performance escolar, mas também podemos encontrar sujeitos que possuem baixo desempenho, necessitando de ajuda especializada 44. Cardoso AOG, Becker MAD. Identificando adolescentes em situação de rua com potencial para altas habilidades/superdotação. Rev. Bras. Educ. Esp. 2014;20(4):605-14.

5. Mettrau MB, Reis HMMS. Políticas públicas: altas habilidades/superdotação e a literatura especializada no contexto da educação especial/inclusiva. Ensaio: aval.pol.públ.Educ. 2007;15(57):489-509.

6. Pérez SGB, Freitas SN. A Mulher com altas habilidades/superdotação: à procura de uma identidade. Rev. Bras. Educ. Esp. 2012;8(4):677-94.
-77. Martins BA, Chancon MCM. Crianças precoces com indicadores de altas habilidades/superdotação: as características que contrariam a imagem de aluno "ideal". Educação Unisinos. 2016;20(1):96-105..

A condução de pesquisas sobre este tema tem indicado a necessidade de um atendimento especializado para as pessoas com AH/SD o mais precocemente possível, com ação dentro das instituições educacionais ao longo da educação básica, porque considera que esse é o lugar e o tempo ideal para o desenvolvimento das suas potencialidades 44. Cardoso AOG, Becker MAD. Identificando adolescentes em situação de rua com potencial para altas habilidades/superdotação. Rev. Bras. Educ. Esp. 2014;20(4):605-14.. Isto é algo que sinaliza para a importância de se entender o desenvolvimento da linguagem destes sujeitos, principalmente por se tratar de pessoas que não constituem um grupo homogêneo, que possuem desenvolvimento de suas habilidades dentro de situações e necessidades especificas.

Em consonância com as informações mencionadas, destaca-se a importância da identificação de estudos que indiquem com clareza e objetividade as características da linguagem de sujeitos com AH/SD, por se tratar de um tema ainda pouco explorado, sobretudo na ciência Fonoaudiológica. Portanto, o presente estudo buscou analisar informações e características sobre a linguagem de crianças com diagnóstico para altas habilidades e superdotação.

Métodos

Trata-se de uma revisão integrativa da literatura que procura analisar os principais artigos que se referem a temática proposta. O tema principal de acesso foi: Linguagem de crianças com altas habilidades e superdotação.

As etapas para realizar esta revisão constaram de definição de tema e problema de pesquisa, elaboração clara de objetivos, escolha de descritores, seleção de critérios de inclusão e exclusão, análise do conhecimento já produzido e categorização dos dados e apresentação dos resultados.

A busca dos artigos foi realizada entre fevereiro e junho de 2020. Para obtenção dos dados, utilizou-se o levantamento bibliográfico realizado nas bases de dados LILACS (Literatura Latino-americana e do Caribe de Ciências da Saúde), MEDLINE (Medical Literature Analysis and Retrieval Sistem) e Google Scholar.

Foram adotados como critérios de inclusão, para a leitura dos resumos e artigos completos: a) estudo em humanos cuja população seja de crianças e adolescentes (menores de 18 anos) b) estudos com sujeitos diagnosticados com AH/SD; c) presença de dislexia e autismo como comorbidade; d) publicações com limite inferior até o ano de 2000; e) publicações em língua portuguesa, inglesa ou espanhola; f) estudos do tipo série de casos, longitudinais, transversais, caso-con trole, coorte e ensaios clínicos.

Para a exclusão dos artigos, foram adotados os seguintes critérios: a) estudos com população adulta ou idosa (maiores de 18 anos de idade); b) crianças ou adolescentes sem diagnóstico definido para AH/SD; c) estudos que não tinham como tema central AH/SD; d) trabalhos que se não se referiam ao conceito de linguagem em AH/SD, seja em sua manifestação oral ou escrita.

Foram encontrados 519 artigos. De acordo com os critérios de inclusão e exclusão, vários artigos foram descartados por terem as seguintes características: população acima de 18 anos (4); sem diagnóstico definido (6); outros temas centrais (382); não abordavam o tema linguagem (108).

Do material obtido, 45 artigos, teve-se à leitura minuciosa de cada artigo, destacando aqueles que responderam ao objetivo proposto por este estudo, a fim de organizar os dados. Seguindo os critérios de inclusão, 16 estudos foram selecionados para análise, os quais são referenciados no presente texto.

Na Figura 1, pode-se verificar em forma de fluxo grama o detalhamento do processo de triagem e seleção dos artigos.

Figura 1:
Demonstrativo de fluxograma da pesquisa bibliográfica

Revisão da Literatura

Ao realizar a busca bibliográfica por este tema, os resultados indicam que há uma limitada proporção de artigos na literatura científica. Este foi sem dúvida o maior obstáculo para a estruturação deste trabalho.

A pesquisa eletrônica resultou em 519 artigos, que foram submetidos à avaliação para verificar a possibilidade de inclusão na presente revisão. Seguindo os critérios de inclusão e exclusão pré-definidos obteve-se um total de 16 artigos que atendiam a proposta do estudo.

Após a análise exploratória das temáticas dos artigos, estes foram agrupados em dois grupos: 1) linguagem oral; 2) linguagem escrita.

Linguagem Oral

As crianças com AH/SD tendem a apresentar ótimos percentuais em tarefas que avaliam as habilidades de linguagem oral, sobretudo em vocabulário, que nestes sujeitos se apresenta amplo para a idade 88. Viersen SV, Evelyn H, Kroesbergen EH, Slot EM, Bree EH. High reading skills mask dyslexia in gifted children.J Learn Disabil. 2016;49(2):189-99..

Corrobora com esta afirmativa, um estudo que investigou a capacidade narrativa de crianças com AH/SD, quando comparadas a um grupo controle de crianças com mesma idade cronológica. As crianças superdotadas organizaram seus discursos de uma maneira típica das crianças dois anos mais velhas. As construções da estrutura básica foram mais ricas e sofisticadas, com histórias mais elaboradas do que as de seus colegas de mesma idade cronológica. As crianças superdotadas também mostraram um avanço considerável em várias habilidades de linguagem 99. Porath M. Narrative performance in verbally gifted children. J for the Educ of the Gifted. 1996;19(3):276-92..

Estas crianças possuem uma alta capacidade cognitiva no que se refere a compreensão; podem manter períodos de concentração e atenção maiores; possuem motivação intrínseca para aprender e explorar; são persistentes. Além disso, apresentam alta capacidade de observação e atenção aos detalhes; são independentes; capacidade bem desenvolvida de abstração, de conceituação e síntese; percebem semelhanças, diferenças e anomalias rapidamente 99. Porath M. Narrative performance in verbally gifted children. J for the Educ of the Gifted. 1996;19(3):276-92.,1010. Winner E. Giftedness: current theory and research. Amer Psych Soc. 2000;9(5):153-6..

As crianças superdotadas não apenas podem desenvolver a linguagem mais rapidamente do que as outras crianças, elas também podem criar formas diferentes de pensar. Há indícios teóricos que acreditam na existência de um grande esforço motivacional, sem a necessidade de estímulos externos, com alta capacidade de gerir a própria aprendizagem sobre novos conceitos 1010. Winner E. Giftedness: current theory and research. Amer Psych Soc. 2000;9(5):153-6.

11. Melogno S, Pinto MA, Levi G. Profile of the linguistic and metalinguistic abilities of a gifted child with autism spectrum disorder: a case study. Child Lang Teach Ther. 2015;31(1):113-26.
-1212. American Psychiatric Association (2013) Diagnostic and statistical manual of mental disorders. 5th edition. Arlington, VA: American Psychiatric Publishing..

No entanto, a capacidade extremamente alta em uma área pode coexistir com o comum, ou mesmo, com uma capacidade anormal em outra área. Essas crianças são frequentemente irregulares, por exemplo, a habilidade matemática pode ser muito superior a capacidade verbal, com pequenas ocorrências fonológicas e discurso reduzido, extremamente objetivo. Em outros casos, a criança pode se apresentar altamente comunicativa, com expressões ricas em seu vocabulário, excelente domínio linguístico e com facilidade para aprender uma segunda língua. Contudo, a sua limitação e desinteresse pode ser claramente percebido em outra área do conhecimento 1010. Winner E. Giftedness: current theory and research. Amer Psych Soc. 2000;9(5):153-6..

Como se sabe, a associação entre o transtorno do espectro autista e AH/SD é uma realidade 1111. Melogno S, Pinto MA, Levi G. Profile of the linguistic and metalinguistic abilities of a gifted child with autism spectrum disorder: a case study. Child Lang Teach Ther. 2015;31(1):113-26.

12. American Psychiatric Association (2013) Diagnostic and statistical manual of mental disorders. 5th edition. Arlington, VA: American Psychiatric Publishing.

13. Melogno S, Pinto MA, Levi G. Metaphor and metonymy in ASD children: a critical review from a developmental perspective. Res. Autism Spectr. Disord. 2012;6(4):1289-96.
-1414. Assouline SG, Foley Nicpon M, Dockery L. Predicting the academic achievement of gifted students with autism spectrum disorder. J Autism Dev Disord. 2012;42(9):1781-9.. Em um estudo realizado na cidade de Roma, uma criança de 9 anos diagnosticada com transtorno do espectro autista e AH/SD, foi avaliada em aspectos linguísticos de sua fala. Os pesquisadores identificaram neste estudo diferentes níveis de consciência metalinguística. A criança apresentou baixo nível para avaliação semântica, porém, boa resposta em fonologia e gramática. Segundo os autores, quando a criança teve que resolver problemas relacionados a domínios linguísticos, como gramática e fonologia, ele aparentemente se comportou como se estivesse lidando com questões, impondo correspondências predefinidas entre forma e significado. No momento em que tinha que trabalhar com questões semânticas, ela parecia perder o controle sobre os significados e suas respostas foram piores. Os mesmos autores chamam a atenção para a necessidade de se investigar o aspecto pragmático da linguagem nestes sujeitos. Uma importante interseção entre linguagem e cognição social 1111. Melogno S, Pinto MA, Levi G. Profile of the linguistic and metalinguistic abilities of a gifted child with autism spectrum disorder: a case study. Child Lang Teach Ther. 2015;31(1):113-26..

Linguagem Escrita

Antes de se referir ao desenvolvimento da linguagem escrita em crianças com AH/SD, é importante ressaltar que estes estão incluídos na Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva, assegurados pelas Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, Resolução de nº 02 de 11 de Setembro de 2001 22. Souza VS. Altas habilidades e superdotação: uma reflexão sobre o tema [Monografia]. Medianeira (PR): Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curso de Pós-graduaçao em Educação: Métodos de Técnicas de Ensino; 2013.,33. BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Projeto Escola Viva: alunos com necessidades especiais educacionais especiais. Série 2. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial. 2002. http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/construindo.pdf.
http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/...
.

Dentro desta perspectiva, é de suma importância no processo de inclusão de alunos AH/SD, a capacitação de docentes para a identificação dos possíveis indicadores à esta condição. É importante que as etapas do neurodesenvolvimento infantil estejam sob o domínio do profissional da educação para que este possa identificar diferentes comportamentos e ações que sejam indicadores de altas habilidades 55. Mettrau MB, Reis HMMS. Políticas públicas: altas habilidades/superdotação e a literatura especializada no contexto da educação especial/inclusiva. Ensaio: aval.pol.públ.Educ. 2007;15(57):489-509..

Alunos com AH/SD são diferentes dos alunos que são ditos normais, ou seja, a maioria. Portanto necessitam de um apoio técnico adequado e, cabe ao educador reconhecer e trabalhar as diferenças 33. BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Projeto Escola Viva: alunos com necessidades especiais educacionais especiais. Série 2. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial. 2002. http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/construindo.pdf.
http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/...
,55. Mettrau MB, Reis HMMS. Políticas públicas: altas habilidades/superdotação e a literatura especializada no contexto da educação especial/inclusiva. Ensaio: aval.pol.públ.Educ. 2007;15(57):489-509.,77. Martins BA, Chancon MCM. Crianças precoces com indicadores de altas habilidades/superdotação: as características que contrariam a imagem de aluno "ideal". Educação Unisinos. 2016;20(1):96-105..

Um programa foi aplicado nos Estados Unidos entre os anos de 1977 e 1988, como forma de enriquecer a capacitação do docente e potencializar o processo de inclusão de crianças em condições de AH/SD. As propostas foram:

  • I: consiste em expor os estudantes a disciplinas, pessoas, lugares e situações diferentes da grade curricular. Para a realização desse processo é necessário uma equipe composta por pais, professores, estudantes que abordam os novos conhecimentos por meio de palestras, workshops, filmes e outros.

  • II: consiste no uso de materiais e métodos para desenvolver habilidades cognitivas e afetivas. Possui duas etapas, a primeira é realizada em sala de aula em que o aluno é exposto a situações que exigem pensamento e resolução criativa de problemas, habilidades específicas para o uso de materiais avançados, habilidades de comunicação visual, oral e escrita e desenvolvimento do processo afetivo. A segunda etapa consiste na instrução metodológica relativo aos assuntos de interesse específico desenvolvidos pelo aluno no tipo I de enriquecimento.

  • III: envolve alunos que estão interessados em aprofundar no assunto escolhido por meio de pesquisas, assumindo o papel de investigadores. Os objetivos desse processo de enriquecimento consistem em: aquisição de um nível avançado de compreensão do conhecimento (conteúdo) e metodologia (processo); oportunidade para relacionar interesses, conhecimentos e ideias; desenvolvimento de habilidades para organização, planejamento, gestão do tempo, tomada de decisão e autoavaliação; aquisição de autoconfiança; desenvolvimento de sentimentos de realização criativa 55. Mettrau MB, Reis HMMS. Políticas públicas: altas habilidades/superdotação e a literatura especializada no contexto da educação especial/inclusiva. Ensaio: aval.pol.públ.Educ. 2007;15(57):489-509..

A escola precisa perceber e identificar as necessidades dos alunos com superdotação na Educação Básica. Este processo só ocorrerá se o professor tiver um olhar minucioso sobre as etapas do desenvolvimento da criança, e sobre a sua participação na construção do conhecimento proposto 55. Mettrau MB, Reis HMMS. Políticas públicas: altas habilidades/superdotação e a literatura especializada no contexto da educação especial/inclusiva. Ensaio: aval.pol.públ.Educ. 2007;15(57):489-509.. Os alunos com AH/SD, de fato, podem demonstrar um bom desempenho escolar, no entanto, igualmente há pessoas com AH/SD que têm baixo rendimento escolar, necessitando, assim, de atendimento especializado, pois, frequentemente, tendem a manifestar falta de interesse e motivação para os estudos acadêmicos e rotina escolar 1515. Francis R, Hawes DJ, Abbott M. Intellectual giftedness and psychopathology in children and adolescents. Exceptional Children. 2015;82(3):279-302..

As crianças com AH/SD começam a ler muito cedo, em um período que pode anteceder a sua entrada no sistema escolar básico. Geralmente apresentam nível avançado de habilidades de decodificação e compreensão na leitura, além de amplo interesse em pelos aspectos linguísticos. Os assuntos, quando despertam o seu interesse, aguçam a curiosidade, e são assimilados com grande facilidade 1616. Gokaydin B, Baglama B, Uzunboylu H. Language learning of gifted individuals: a content analysis study. Teach. Prof. Dev. 2017;19(1):109-18..

De uma maneira surpreendente, Viersen et al. (2016) 88. Viersen SV, Evelyn H, Kroesbergen EH, Slot EM, Bree EH. High reading skills mask dyslexia in gifted children.J Learn Disabil. 2016;49(2):189-99., identificaram em seu estudo que crianças diagnosticadas com AH/SD e dislexia podem mascarar problemas de alfabetização, utilizando possíveis mecanismos compensatórios. A amostra foi composta por 121 crianças da escola primária holandesa, divididas em quatro grupos: 1) crianças em desenvolvimento típico; 2) crianças com dislexia; 3) crianças com AH/SD; 4) crianças com AH/SD e dislexia. As crianças foram submetidas a uma bateria de testes que incluiu medidas da alfabetização (leitura / ortografia) e habilidades cognitivas relacionadas à alfabetização e à linguagem: consciência fonológica, nomeação automática rápida, memória verbal de curto prazo, memória de trabalho, gramática e vocabulário. O resultado identificou que estes sujeitos apresentam índices de respostas parecidas com os sujeitos com desenvolvimento típico, em todas as habilidades cognitivas testadas. Contudo, no que tange a consciência fonológica, foram encontrados sinais claros de dificuldade. Isto indica que fonologia é um fator de risco para crianças com AH/SD e dislexia, mas isso é moderado por outras habilidades, como memória de trabalho, gramática e vocabulário, oferecendo oportunidades para compensar um déficit cognitivo e mascarar as dificuldades de alfabetização.

Conclusão

A revisão apresentada identificou que existem aspectos específicos na linguagem de crianças diagnosticadas com AH/SD. Isto se torna claro quando se observa a linguagem oral e escrita. As crianças com AH/SD parecem ter uma forma atípica ao fazer uso da linguagem. Estes sujeitos apresentam potenciais elevados na maioria das habilidades linguísticas, contudo, isto pode coexistir com uma deficiência em algum componente da linguagem, seja oral ou na escrita, mascarando possíveis dificuldades. O conhecimento sobre estas particularidades pode auxiliar na criação de estratégias para melhor aproveitamento dentro do contexto social e de aprendizagem. Por fim, fica claro, a escassez de estudos que buscam avaliar a linguagem destes sujeitos, sobretudo com o direcionamento fonoaudiológico.

REFERENCES

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Nov 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    20 Jul 2020
  • Aceito
    01 Out 2020
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