Avaliação neuropsicomotora de crianças de 0 a 5 anos em centros de educação infantil do ensino público

RESUMO

Objetivo:

investigar o desenvolvimento neuropsicomotor, bem como aspectos nutricionais e cognitivos/emocionais de crianças de 0 a 5 anos de centros de educação infantil, visando a prevenção e identificação precoce de riscos e atrasos no desenvolvimento infantil.

Métodos:

a população estudada foi composta por 85 crianças frequentadoras de dois centros de educação infantil. A abordagem do desenvolvimento infantil foi contextual, por meio da avaliação fisioterapêutica lúdica com escala DENVER II; também foram realizadas avaliações complementares do estado nutricional a partir das medidas antropométricas de peso e altura, e dos aspectos do desenvolvimento cognitivo/emocional a partir do Desenho Livre e Desenho da Figura Humana.

Resultados:

o desenvolvimento neuropsicomotor encontrou-se dentro dos parâmetros de normalidade em 69,41% e questionável em 30,58% das crianças. Constatou-se que a variável significante sobre o resultado foi a turma em que algumas crianças se encontravam. Na escala utilizada, a área de melhor desempenho foi a motora-grosseira (7,69%) e a mais questionável foi da linguagem (58,85%). Quanto aos dados nutricionais foi acurado que 27,06% das crianças apresentaram algum risco nutricional, sendo que 22,35% tiveram risco à obesidade e 4,71% risco à desnutrição. Na análise cognitiva/emocional o resultado apontou que 34,37% das crianças avaliadas apresentaram indicações de dificuldades em relação à adaptação e socialização ou auto-estima.

Conclusões:

na presente pesquisa, cerca de um terço das crianças participantes apresentaram desenvolvimento neuropsicomotor questionável, especialmente na área da linguagem, sendo que a turma em que a criança está inserida pode configurar uma barreira ao desenvolvimento. Essas crianças apresentaram riscos nutricionais, com tendência à obesidade, bem como indicações de dificuldades em relação à adaptação e socialização ou auto-estima.

Descritores:
Serviços de Saúde da Criança; Educação Infantil; Desenvolvimento Infantil; Prevenção Primária

ABSTRACT

Purpose:

to investigate the neuropsychomotor development, as well as nutritional and cognitive/emotional aspects of children aged 0 to 5, attending early childhood education centers, aiming at early identification and prevention of risks and delays in children’s development.

Methods:

the population studied was composed of 85 children attending two early childhood education centers. The children’s development approach was contextual, by means of ludic physical therapy assessment, by using the DENVER II scale; complementary assessments of their nutritional status were also performed, based on anthropometric measurements of weight and height, as well as evaluations of the cognitive/emotional development aspects through the Free Hand Drawing and Human Figure Drawing Tests.

Results:

neuropsychomotor development was found to be within normal range in 69.41% of the children and questionable in 30.58% of them. The significant variable affecting the result was found to be the class in which some children were inserted. In the scale utilized, the best performance was considered to be the gross motor skills (7.69%) and the most questionable performance occurred in the language skills (58.85%). As for nutritional data, it was discovered that 27.06% of the children had some nutritional risk, 22.35% had obesity risk and 4.71%, malnutrition risk. In the cognitive/emotional analysis, the result was that 34.37% of the children presented signs of difficulties related to adaptation and socialization or self-esteem.

Conclusion:

in the present study, about one-third of the children participating presented questionable neuropsychomotor development, especially in the field of language; in this regard, the class to which the children belong may constitute a barrier to their development. These children presented nutritional risks, with a tendency towards obesity, as well as the possible difficulties regarding adaptation and socialization or self-esteem.

Keywords:
Child Health Services; Early Childhood Education; Child Development; Primary Prevention

Introdução

O desenvolvimento motor é considerado como um processo sequencial, contínuo e relacionado à idade cronológica, pelo qual o ser humano adquire uma enorme quantidade de habilidades motoras, as quais progridem de movimentos simples e desorganizados para a execução de habilidades motoras altamente organizadas e complexas¹.

Dessa forma, o desenvolvimento humano deve ser entendido de maneira ampla e contextualizada, contemplando a interação dinâmica das interações das pessoas com seus diferentes contextos^2,3.

Os primeiros anos de vida do ser humano são essenciais para a aquisição de conhecimentos e habilidades, caracterizando, assim, mudanças marcantes nas dimensões cognitivas, motoras, sociais e afetivas⁴. Atualmente, devido às transformações socioeconômicas da sociedade⁵, as instituições de educação infantil são os locais onde a criança passa a maior parte do dia e durante uma fase fundamental do seu desenvolvimento e crescimento, de modo especial dos zero aos cinco anos, motivo pelo qual a observação do desenvolvimento infantil nessa fase pode fornecer indicadores dos marcos motores e suas associações para promoção de saúde e prevenção de riscos e atrasos do DNPM.

Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN, lei 9.394/96)⁶, creches são instituições que atendem a crianças de zero a três anos e pré-escolares de quatro a seis anos. As duas faixas etárias compreendem a educação infantil, que é a primeira etapa da educação básica e tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança. Porém, com a Lei nº. 11.274/2006⁷ o ensino fundamental passou a ter duração de nove anos, com a inclusão das crianças de 6 anos de idade. Dessa forma, as crianças com 6 anos completos até o início do ano letivo não fazem mais parte da educação infantil.

Sabe-se que, além do desenvolvimento biológico da criança e das tarefas propostas a ela, as condições do ambiente em que a criança vive influencia aspectos do seu comportamento motor. Um ambiente que possibilita a exploração e interação com o meio age como facilitador do desenvolvimento. No entanto, o ambiente em condições desfavoráveis pode lentificar o ritmo de desenvolvimento e restringir as possibilidades de aprendizado da criança⁸.

Dessa forma, os estudiosos Amaral, Tabaquim e Lamônica⁹ e Barros et al.¹⁰, afirmam que identificar precocemente a criança de risco permite evitar prejuízos no seu desenvolvimento e minimizar os danos de um ambiente menos favorável sobre o desenvolvimento infantil. Assim, conforme Souza et al.¹¹, é pertinente o acompanhamento do desenvolvimento da criança em instituições de educação infantil, o que possibilita a análise da trajetória do desenvolvimento infantil, a identificação de crianças com maior risco de atraso e o estabelecimento de estratégias de intervenção e promoção do desenvolvimento.

O estudo de Formiga, Silva e Linhares¹² reforça a necessidade da equipe multidisciplinar para ao atendimento integral a crianças e suas famílias, especialmente àquelas com risco estabelecido ao desenvolvimento.

As condições de saúde e educação no município de Matinhos/PR estão em expansão e para que haja uma sintonia com o conceito de integralidade em saúde é fundamental conhecer como está o desenvolvimento das crianças dessa cidade desde a primeira infância. Frente ao exposto, este trabalho tem como objetivo investigar o desenvolvimento de crianças de 0 a 5 anos frequentadoras de dois centros de educação infantil (CEI), na cidade de Matinhos/PR, visando a prevenção e identificação precoce de riscos e atrasos no desenvolvimento infantil.

Métodos

Trata-se de uma pesquisa de campo, exploratória, prospectiva, do tipo clínico qualitativa¹³ de um grupo de crianças frequentadoras de centros de educação infantil (CEI) da cidade de Matinhos/PR, a serem denominados de CEI 1 e CEI 2. Esse projeto teve parceria com Secretarias de Educação e Saúde do Município de Matinhos/PR, pois envolveu Centros de Educação Infantil do Município e, nos casos identificados como de riscos, encaminhamentos à Secretaria de Saúde Municipal pela fisioterapeuta do município para devidas providências e investigações cabíveis. As atividades lúdicas¹⁴ utilizadas por meio da escala DENVER II foram contextualizadas como tarefas na rotina escolar da criança, com apoio da professora de sala de aula, sob a supervisão direta da fisioterapeuta da Secretaria Municipal de Educação e orientação dos professores da Universidade envolvidos no projeto. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Paraná - setor Ciências da Saúde, com Protocolo número 1212.0.000.091-8.

Como toda a pesquisa realizada com seres humanos, foi respeitada a Resolução 466/12 de pesquisa com seres humanos, do Conselho Nacional de Saúde (CNS- BRASIL), minimizando os riscos para as crianças participantes. Também teve sigilo das informações e da identificação dos sujeitos; o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) respondido por escrito pelo responsável, após as devidas explicações sobre a pesquisa; os responsáveis tiveram total liberdade para recusa ou desistência da participação do estudo em qualquer momento da pesquisa, sem penalização alguma para os mesmos.

Para seleção dos participantes foram considerados os seguintes critérios de inclusão: crianças de 0 a 5 anos, matriculadas em algum dos Centros de Educação Infantil selecionados. Os critérios de exclusão foram: crianças com diagnóstico de deficiência; falta do TCLE respondido pelo responsável; o não comparecimento da criança nos dias da avaliação; fatores de saúde limitantes para a realização do estudo e ainda a escolha da criança em querer ou não participar das atividades.

Primeiramente, foi realizado o projeto piloto para o treinamento das habilidades das pesquisadoras. O Estudo piloto foi realizado em um terceiro CEI para não interferir nos dados da pesquisa, com a autorização dos pais e/ou responsáveis pelo TCLE. O procedimento adotado envolveu um período de familiarização com as crianças, posterior a aplicação da escala motora de DENVER II¹⁵, e da avaliação complementar cognitiva/emocional e nutricional em uma criança de cada idade, encerrando assim o estudo piloto.

Tal procedimento foi revisado e então aplicado nos CEIs 1 e 2 da pesquisa. A metodologia teve uma abordagem contextual do desenvolvimento motor humano por meio da avaliação lúdica na Fisioterapia neuroinfantil.

Nos CEIs 1 e 2, após autorização da direção da escola, foi realizada uma reunião com os pais e/ou responsáveis das crianças que estudavam nesses centros, para explicação sobre o projeto, e esclarecimento das dúvidas existentes. Os pais foram convidados a responder o TCLE e um questionário informativo de caracterização com algumas perguntas sobre seus filhos. A partir desse documento, as pesquisadoras iniciaram a aplicação do projeto. Como já realizado no projeto piloto, foi feita a familiarização com as crianças, o reconhecimento dos centros, bem como a aproximação com seus funcionários. Depois, uma das pesquisadoras aplicou a escala motora, outra a cognitiva/emocional e uma terceira a avaliação nutricional, para maior fidedignidade dos dados, totalizando 85 crianças avaliadas. No final da avaliação, bem como da análise dos dados, foram realizadas intervenções com a família e com a escola, como forma de agradecimento, resposta do projeto ali realizado, feedback dos resultados encontrados e orientações necessárias. Essas intervenções contemplaram orientações em saúde e a importância da estimulação das áreas identificadas como questionáveis. Não foram considerados os detalhes da avaliação individual de cada criança, pois nos casos identificados de risco a fisioterapeuta da Secretaria Municipal de Educação foi solicitada para conversar com os pais e realizar devidos encaminhamentos.

O instrumento de avaliação do estado neuropsicomotor utilizado foi o Teste de DENVER II¹⁵, um instrumento de rastreamento do desenvolvimento infantil, permitindo ao profissional da saúde obter parâmetros para julgar em que etapa do desenvolvimento a criança encontra-se na data de aplicação do teste. Esse teste é utilizado em crianças de 0 a 6 anos de idade. O desempenho da criança é avaliado por meio de 125 itens, agrupados em quatro áreas do desenvolvimento, sendo elas: Pessoal - Social (aspectos da socialização da criança dentro e fora do ambiente familiar), Motora Fina - Adaptativa (coordenação olho/mão, manipulação de pequenos objetos), Linguagem (produção de som, capacidade de reconhecer, entender e usar a linguagem) e Motora - Grosseira (controle motor corporal como sentar e andar). O registro da resposta da criança é: “passou”, quando realizou o item com sucesso; “falhou”, quando não realizou o item com sucesso; “não - observado”, quando a criança não teve a chance de realizar o item; e “recusa”, quando a criança recusa-se a realizar o item. Em seguida, é classificada com desenvolvimento motor típico ou questionável: “típico”, quando não há nenhum tipo de atraso e no máximo um item de risco; e “questionável” quando há dois ou mais itens de risco e/ou um ou mais itens de atraso. “Atraso” é quando a criança não executa ou recusa-se a realizar uma atividade que já é executada por mais de 90% dos que têm sua idade e “risco” quando a criança não executa ou recusa-se a realizar duas atividades que já são feitas por 75 a 90% das crianças daquela idade¹⁵.

A avaliação nutricional foi realizada por meio das medidas antropométricas (peso e altura), obedecendo às técnicas preconizadas pela Organização Mundial da Saúde e utilizadas pelo Ministério da Saúde¹⁶ e supervisionada por um nutricionista. Para avaliação dos aspectos evolutivos do desenvolvimento cognitivo/emocional foram utilizados o Desenho Livre e do Desenho da Figura Humana¹⁷, aplicados nas crianças de 3 a 5 anos, e sob a orientação, acompanhamento e supervisão de uma psicóloga.

Para a análise estatística utilizaram-se os programas Statistica 7.0 e o software Epi Info (Versão 6.0)¹⁸. Foi realizado o teste de modelo linear generalizado com função de ligação logit e distribuição binomial. Adotou-se o nível de significância 0,05 para os testes estatísticos realizados.

Resultados

Participaram dessa pesquisa 85 crianças de 0 a 5 anos de idade, sendo 34 participantes de 0 a 2 anos e 51 de 2 a 5 anos, que estavam matriculadas na rede municipal de ensino na cidade de Matinhos/Paraná e que frequentavam os CEIs 1 ou 2.

Nessa amostra, o desenvolvimento neuropsicomotor encontrou-se dentro dos parâmetros de normalidade em 69,41% (n= 59) das crianças avaliadas e questionável em 30,59% (n= 26) (Figura 1). Destas, 13 (50%) apresentaram alteração em apenas uma área do desenvolvimento, 11 (42,31%) em duas áreas, 2 (7,69%) em três e nenhuma das crianças apresentou alteração em todas as áreas (Figura 2).

Figura 1:
Percentual de crianças com desenvolvimento típico e questionável

Figura 2:
Percentual de crianças com desenvolvimento questionável em uma, duas ou três áreas

Constatou-se que a variável “turma” foi significante (p<0,05) sobre o resultado, ou seja, uma turma específica apresentou associação com o DNPM questionável. Dessa forma, as crianças dessa turma apresentaram maior chance de ter risco de atraso no desenvolvimento. Analisando a amostra questionável, e considerando tanto os riscos como os atrasos, foi encontrada a área da linguagem como a mais questionável (53,85%), depois a área motora fina - adaptativa, com 21,54%, logo após a área pessoal - social (16,92%), e a menos afetada a área motora - grosseira, com 7,69% (Figura 3).

Figura 3:
Percentual de riscos e atrasos em cada área

Na avaliação nutricional, foi acurado que 27,06% das crianças apresentaram algum risco nutricional, sendo que 22,35% tiveram risco à obesidade e 4,71% risco à desnutrição. Considerando as crianças que apresentaram algum risco nutricional, 34,78% também tiveram o desenvolvimento neuropsicomotor questionável.

Na análise cognitiva/emocional, foi verificado que 34,37% das crianças observadas apresentaram aspectos que podem indicar dificuldades em relação ao desenvolvimento cognitivo/emocional, que podem estar associadas à adaptação e socialização ou auto-estima, dentre essas crianças consideradas de risco, 74,8% tiveram o desenvolvimento neuropsicomotor, avaliado pela escala de DENVER II, como questionável.

Discussão

Na análise do desenvolvimento neuropsicomotor, por meio do Teste de DENVER II, uma parcela significante da amostra (30,59%) apresentou resultado questionável. Dentre as dimensões avaliadas, a linguagem foi a área mais afetada no presente estudo. Estudos brasileiros, também realizados em instituições de educação infantil, apresentaram resultados parecidos, tanto no percentual de crianças com risco de desenvolvimento, quanto na área mais afetada^19,20.

Rezende, Costa e Pontes¹⁹ triaram o desenvolvimento de 66 crianças de 4 instituições públicas de educação infantil na cidade de São Paulo. Por meio do Teste de DENVER II, os autores verificaram que 22,7 % das crianças apresentaram resultados suspeitos e que a área de linguagem foi a mais prejudicada das quatro áreas abordadas pelo teste, o que também foi verificado no presente estudo.

Esse estudo corroborou com o estudo de Biscegli et al.²⁰, o qual avaliou 113 crianças que frequentavam uma creche em Catanduva, São Paulo. Na avaliação do desenvolvimento neuropsicomotor pelo Teste de DENVER II, verificou-se que 37% das crianças da amostra estavam com suspeita de atraso no desenvolvimento, e que a linguagem foi a dimensão mais afetada.

A pesquisa de Costa, Cavalcante e Dell’Aglio²¹ verificou que a suspeita de atraso da linguagem está relacionada com a baixa escolaridade paterna, menor idade materna e com o maior nível de pobreza. Esses fatores contextuais tem impactos no DNPM e são, especialmente desfavoráveis ao desenvolvimento linguístico, uma vez que podem ocasionar privação de oportunidades em um período peculiar ao desenvolvimento. Apesar desses fatores não terem sido considerados no presente estudo, sabe-se que condições socioeconômicas precárias, baixa escolaridades dos pais e gestação na adolescência fazem parte da realidade local.

Pesquisadores²² avaliaram 197 crianças residentes no município de Canoas/RS. Encontraram 27% das crianças avaliadas com suspeita de atraso no desenvolvimento neuropsicomotor, também avaliadas pelo teste de DENVER II. Porém os autores não relataram qual a área que apresentou maior comprometimento. Nesse estudo foi verificado que a baixa renda familiar, a gestação materna com intervalo inter-partal inferior a 18 meses e mães sem o apoio do pai da criança foram fatores associados à suspeita de atraso no desenvolvimento. Esses itens não foram abordados no estudo em questão, apesar de saber que essa é uma realidade do litoral do Paraná. O que ressalta a necessidade de desenvolver estudos futuros para verificar a real influência desses fatores no desenvolvimento das crianças avaliadas.

No presente estudo, constatou-se que a variável que esteve associada ao desenvolvimento questionável foi uma turma em que algumas crianças estavam matriculadas, porém não foram encontrados estudos que verificaram a associação da turma da criança com o risco no seu desenvolvimento. Sabe-se que a escolaridade das educadoras e o número de crianças por sala podem ser fatores que influenciam no desenvolvimento infantil¹⁹, porém necessita uma maior observação da rotina da turma em questão para poder avaliar quais fatores que influenciaram no desenvolvimento dessas crianças.

Na literatura²¹ há relações de atrasos no DNPM, especificamente na linguagem de crianças inseridas em instituições de educação com menor grau de escolaridade, pior nível socioeconômico e estilos linguísticos mais simples e empobrecidos das educadoras, além da inadequada proporção educadora-criança e falta de capacitação e formação permanente das profissionais. Essas variáveis podem estar relacionadas com a turma em questão, porém merecem ser investigadas e averiguadas em pesquisas futuras.

Na avaliação do estado nutricional do presente estudo houve maior prevalência de obesidade (22,35%) do que desnutrição (4,71%), resultado semelhante foi observado no estudo de Biscegli et al.²⁰. Esse resultado corrobora com o processo de transição nutricional que vem ocorrendo, em que há uma redução nas prevalências dos déficits nutricionais e ocorrência mais expressiva de obesidade²³.

O controle nutricional faz-se necessário devido à alta prevalência de alterações nutricionais como a desnutrição e, mais recentemente, a obesidade; principalmente no período do nascimento até os cinco anos de idade, em que novos alimentos estão sendo introduzidos na alimentação da criança²⁰. Esses primeiros anos de vida fazem parte de uma fase fundamental e vulnerável para o desenvolvimento e crescimento da criança²⁴, portanto, o estado nutricional está relacionado ao desenvolvimento neuropsicomotor, como observado nesse estudo, que mesmo sem resultado significante, considerando as crianças que apresentaram algum risco nutricional (34,78%) também tiveram o desenvolvimento neuropsicomotor questionável.

Os resultados presentes no artigo de Andrade et al.²⁵, indicaram que quanto melhor a qualidade da estimulação ambiental disponível para a criança, melhor o seu desempenho cognitivo. Essa relação entre desenvolvimento neuropsicomotor e desempenho cognitivo, também encontrada no trabalho em questão, mostra a necessidade da estimulação dos aspectos encontrados como risco, como a socialização e integração social.

O estudo de Lordelo et al.²⁶ avaliou os efeitos da creche no desenvolvimento cognitivo de crianças. Comparou as crianças que permaneciam em casa com as que frequentavam a creche e verificou que frequentar a creche não influenciou no desempenho cognitivo, porém mostrou associação com a renda familiar e a escolaridade materna. O presente estudo não investigou a renda familiar e a escolaridade materna, portanto necessita de maior investigação do ambiente familiar das crianças avaliadas para verificar a influência de fatores familiares no desenvolvimento cognitivo.

Os resultados gerais dessa pesquisa corroboram com outros estudos^9,10,27 que destacam a necessidade de ações de prevenção e intervenção sobre o desenvolvimento neuropsicomotor, com olhar ampliado de saúde, inclusive no ambiente escolar, com o intuito de proporcionar um desenvolvimento global às crianças que passam grande parte do dia nas instituições de Educação Infantil. Bem como com a necessidade de um olhar para a linguagem e fatores de risco biológicos e ambientais associados a esse domínio²⁸ de forma a implementar programas de estimulação e acompanhamento²¹ com utilização de instrumentos complementares²⁹.

Após analisar o desenvolvimento neuropsicomotor das crianças é necessário aprofundar a investigação destes resultados questionáveis para minimizar o risco de atraso no desenvolvimento motor e psicomotor destas crianças participantes. Sabe-se também que é necessário o acompanhamento dessas crianças durante um maior período de tempo, com avaliações repetidas.

Outra questão é a criação de programas de atenção e intervenção de modo precoce, afim de que se tenha uma estimulação adequada no desenvolvimento infantil desde o nível primário de prevenção. A intervenção neuropsicomotora nos primeiros meses de vida não deve se restringir ao oferecimento de estímulos e realização de atividades voltadas ao desenvolvimento de apenas uma área, e sim para o desenvolvimento global da criança, com maior ênfase nas áreas e habilidades que se encontram mais prejudicadas.

Deve-se considerar que diferenças culturais podem afetar o resultado obtido, bem como a situação sócio-econômica da família. Além disso, ressalta-se que os testes de triagem alertam para um risco potencial que pode ser confirmado ou não por meio de um acompanhamento sistemático e com avaliações repetidas e complementados com testes diagnósticos. De qualquer forma, o estudo sugere que crianças sujeitas a potenciais atrasos de desenvolvimento devem ser identificadas precocemente, para o estabelecimento de programas de intervenção que visem à prevenção de alterações no desenvolvimento e ofereçam às crianças de risco um conjunto de ações que facilitem a adequada maturação em todos os âmbitos e que permitam à criança alcançar um nível máximo de desenvolvimento pessoal e integração social.

Sugerem-se estudos futuros que possam definir a proporção de influências da família e da instituição no desenvolvimento infantil. De qualquer modo, a supervisão do desenvolvimento é uma ação de saúde importante e deve ocorrer seja qual for o ambiente em que a criança vive. Sabe-se que são pouquíssimas as instituições de educação infantil que fazem acompanhamento sistematizado do desenvolvimento infantil, porém, este estudo ressalta que esta ação de saúde com equipe multidisciplinar é necessária.

Conclusão

Na presente pesquisa, 30,58% das crianças participantes apresentaram DNPM questionável, especialmente na área da linguagem, sendo que a turma em que a criança está inserida pode configurar uma barreira ao desenvolvimento. Essas crianças apresentaram riscos nutricionais, com tendência à obesidade, bem como indicações de dificuldades em relação à adaptação e socialização ou auto-estima.

Tais achados justificam ações de identificação e intervenções precoces com equipe multidisciplinar nas instituições de educação infantil, demonstrando ser necessário um olhar integral para o desenvolvimento da criança, com uma equipe multidisciplinar atuando sobre o desenvolvimento infantil, uma vez que a avaliação do desenvolvimento deve ter um olhar amplo sobre a criança, englobando os aspectos cognitivos, emocionais, nutricionais e fonoaudiológicos associados com o desenvolvimento neuropsicomotor.

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• 4
  Trabalho desenvolvido na Universidade Federal do Paraná, Setor Litoral, Matinhos, Paraná, Brasil.
• Fonte de auxílio: o presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  15 Ago 2019
• Data do Fascículo
  2019

Histórico

• Recebido
  26 Set 2018
• Aceito
  27 Jun 2019