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O papel da consciência fonológica na compreensão leitora

RESUMO

Objetivo:

caracterizar o desempenho de escolares de 4º ano do Ensino Fundamental, com e sem indicativos de alterações de leitura e escrita, em consciência fonológica e compreensão de leitura e verificar possíveis correlações entre tais habilidades.

Métodos:

participaram deste estudo 60 crianças do quarto ano do Ensino Fundamental I de duas escolas públicas, cujos pais assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Os escolares foram selecionados e organizados em grupos com e sem indicativos de alterações de leitura e escrita. Todos foram avaliados individualmente em relação à consciência fonológica e compreensão de leitura de orações e textos por meio de testes padronizados. Os dados passaram por análise estatística.

Resultados:

os escolares com indicativos de alterações de leitura e escrita tiveram pior desempenho em consciência fonológica e compreensão de leitura de orações e textos. Houve correlação entre a consciência fonológica e compreensão de leitura de textos nos dois grupos.

Conclusão:

os escolares sem indicativos de alterações apresentaram melhor desempenho nas habilidades avaliadas. A presença de correlação entre a consciência fonológica e a compreensão de leitura de orações e de textos, evidencia a importância das habilidades metafonológicas, não apenas para consolidação de uma leitura proficiente, mas também para a compreensão leitora.

Descritores:
Avaliação; Leitura; Compreensão; Educação; Aprendizagem

ABSTRACT

Purpose:

to characterize the performance of 4th grade-Elementary School students with and without signs of reading and writing disorders as for phonological awareness and reading comprehension, and also verify possible correlations between them.

Methods:

60 children enrolled in the 4th grade of Elementary School from two public schools, whose parents signed the Informed Consent Form, participated in the present study. They were selected and organized in groups, with and without signs of reading and writing disorders. All students were individually assessed regarding their phonological awareness and reading comprehension of sentences and texts through standardized tests. The data underwent statistical analysis.

Results:

those with signs of reading and writing disorders showed the lowest performance in the reading comprehension of sentences and texts. A correlation was found between phonological awareness and reading comprehension of sentences and texts in both groups.

Conclusion:

students with no signs of reading and writing disorders had a higher performance in the skills assessed. The correlation found between phonological awareness and reading comprehension of sentences and texts shows not only the importance of metaphonological skills for a proficient reading, but also for a comprehensive one.

Keywords:
Evaluation; Reading; Comprehension; Education; Learning

Introdução

A consciência fonológica (CF) é uma habilidade metalinguística caracterizada pela capacidade de perceber que a fala pode ser segmentada em palavras, sílabas e fonemas, e que estes podem ser manipulados conscientemente pelo indivíduo11. Erdogana T, Erdogana O. The determination of primary school first year students' phonological awareness skills. Procedia Soc Behav Sci. 2010;1(1):532-6.

2. Guedes MCR, Gomes CA. Consciência fonológica em períodos pré e pós-alfabetização. Cadernos de Letras da UFF - Dossiê Letras e Cognição 2010;41: 263-81.

3. Mousinho R, Correa J. Inter-relação entre processamento fonológico e compreensão leitora do 2° ao 4° ano do ensino fundamental: um estudo longitudinal. Rev. Psicopedag. 2010;27(82):27-35.

4. Campos AMG, Pinheiro LR, Guimaraes SRK. A consciência fonológica, a consciência lexical e o padrão de leitura de alunos com dislexia do desenvolvimento. Rev. Psicopedag. 2012;29(89):194-207.
-55. Novaes CB, Mishima F, Santos PL. Treinamento breve de consciência fonológica: impacto sobre a alfabetização. Rev. Psicopedag. 2013;30(93):189-200.. Faz parte do Processamento Fonológico, sendo que há inúmeras evidências de que as habilidades que compõem este último são necessárias para o aprendizado da leitura e escrita33. Mousinho R, Correa J. Inter-relação entre processamento fonológico e compreensão leitora do 2° ao 4° ano do ensino fundamental: um estudo longitudinal. Rev. Psicopedag. 2010;27(82):27-35.,66. Capellini AS, Oliveira AM, Pinheiro FH. Effectiveness of a metaphonological and reading remediation program for students with learning difficulties. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(2):189-97.

7. Tenório SMPCP, Ávila CRB. Phonological processing and school performance in early grades of elementary school. Rev. CEFAC. 2012;14(1):30-8.
-88. Santos MTM, Befi-Lopes DM. Vocabulary, phonological awareness and rapid naming: contributions for spelling and written production. J. Soc. Bras. Fonoaudiol. 2012;24(3):269-75..

A CF envolve habilidades silábicas e fonêmicas. Sabe-se que as habilidades silábicas precedem e se desenvolvem mais facilmente do que as fonêmicas, pois se trata de um estágio inicial de reconhecimento e manipulação da estrutura sonora da língua44. Campos AMG, Pinheiro LR, Guimaraes SRK. A consciência fonológica, a consciência lexical e o padrão de leitura de alunos com dislexia do desenvolvimento. Rev. Psicopedag. 2012;29(89):194-207.,99. Capellini AS, Ciasca SM. Avaliação da consciência fonológica em crianças com distúrbio específico de leitura e escrita e distúrbio de aprendizagem. Temas Desenvolv. 2000;8(48):17-23.

10. Cavalheiro LG, Santos MS, Martinez PC. The influence of phonological awareness in reading acquisition. Rev. CEFAC. 2010;12(6):1009-16.
-1111. Ukrainetz TA, Nuspl JJ, Wilkerson K, Beddes SR. The effects of syllable instruction on phonemic awareness in preschoolers. Early Child Res Q. 2011;26(1):50-60.. Portanto, habilidades silábicas são fundamentais para o desenvolvimento das fonêmicas, o que propicia uma aprendizagem mais eficiente da leitura e escrita1212. Soares AJC, Cárnio MS. Phonemic awareness in students before and after language workshops. J. Soc. Bras. Fonoaudiol. 2012;24(1):69-75..

Por sua vez, a compreensão leitora (CL) é um processo cognitivo, que engloba desde a decodificação até a extração do significado do material lido, e é considerada por alguns autores o propósito básico da aprendizagem da leitura1010. Cavalheiro LG, Santos MS, Martinez PC. The influence of phonological awareness in reading acquisition. Rev. CEFAC. 2010;12(6):1009-16.,1313. Andrade MWCL, Dias MGBB. Processos que levam à compreensão de textos. Psicol. estud. 2006;11(1):147-54.. Dessa forma, a compreensão leitora envolve além da decodificação, a participação de diversos processos cognitivos: memória, vocabulário adquirido, fluência e inferência, que possibilitam a construção de significados resultando na compreensão do material lido1414. Nalom AFO, Soares AJC, Cárnio MS. The relevance of receptive vocabulary in reading comprehension. CoDAS. 2015;27(4):333-8.

15. Brandão S, Ribeiro I. Promoção da compreensão leitora: avaliação dos resultados de um programa. In: X Congresso Internacional Galego Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009. p. 3376-90.
-1616. Oliveira AM, Capellini SA. Compreensão leitora de palavras e frases: elaboração de procedimento avaliativo. Psicol. estud. 2013;18(2):293-301..

A relação entre CF e leitura vem sendo amplamente investigada na literatura, porém grande parte dos estudos são voltados para o entendimento da relação entre consciência fonológica e decodificação, acurácia e fluência de leitura de palavras e pseudopalavras22. Guedes MCR, Gomes CA. Consciência fonológica em períodos pré e pós-alfabetização. Cadernos de Letras da UFF - Dossiê Letras e Cognição 2010;41: 263-81.,1010. Cavalheiro LG, Santos MS, Martinez PC. The influence of phonological awareness in reading acquisition. Rev. CEFAC. 2010;12(6):1009-16.,1111. Ukrainetz TA, Nuspl JJ, Wilkerson K, Beddes SR. The effects of syllable instruction on phonemic awareness in preschoolers. Early Child Res Q. 2011;26(1):50-60.,1717. Rothou KM, Pedeliadu S, Sideridis GD. Predicting early reading in greek: the contribution of phonological awareness and non-phonological language skills. Procedia Soc Behav Sci. 2013;98(2013):1504-19.. Dessa maneira, faz-se necessário aprofundar o conhecimento acerca da CF, investigando se sua influência abrange não apenas os aspectos relacionados à eficiência e qualidade da decodificação, mas também a compreensão leitora. Os resultados advindos do presente estudo poderão propiciar uma contribuição relevante para área de leitura escrita, ao investigar as possíveis correlações entre consciência fonológica e compreensão leitora de orações (CLO) e textos (CLT).

Sendo assim, este estudo teve por objetivo caracterizar o desempenho de crianças do 4º do Ensino Fundamental (EF), com e sem indicativos de alterações de leitura e escrita, em CF e CLO e CLT, e verificar possíveis correlações entre tais habilidades.

Métodos

Esta pesquisa foi aprovada pela Comissão de Ética da Universidade de São Paulo - USP sob o número 097/13. Os dados foram coletados em duas escolas estaduais de São Paulo. Participaram deste estudo 60 crianças do quarto ano do Ensino Fundamental com média de idade de 9,6 anos, cujos pais e professores assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Seleção dos Participantes

Para a seleção dos sujeitos e integrar o grupo sem indicativos de alteração de leitura e escrita foram adotados os seguintes critérios de inclusão: estar regularmente matriculado no 4º Ano do Ensino Fundamental; anuência dos pais e/ou responsáveis por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido; ausência de queixas relacionadas ou de indicadores de alterações de audição, visão, distúrbios neurológicos, comportamentais ou cognitivos, verificados por meio da indicação dos professores atestando a ausência de queixas próprias ou apontadas pelos pais em prontuário escolar ; apresentar desempenho na média ou acima dela no Teste de Desempenho Escolar (TDE)1818. Stein LM. Teste de Desempenho Escolar (TDE). São Paulo: Casa do Psicólogo, 1994.. Para compor o grupo com indicativos de alterações de leitura e escrita, todos os critérios acima listados foram aplicados, com exceção da pontuação no TDE que, neste caso, deveria ser inferior a esperada para a escolaridade da criança. Cabe ressaltar que a escolha do quarto ano escolar como grupo alvo deste estudo se deve ao fato de que, nesta faixa escolar, grande parte das crianças já dominam habilidades básicas de decodificação e, conforme apontado por diversos estudos, as habilidades cognitivas e metacognitivas encontram-se mais disponíveis para o processo complexo da compreensão leitora, uma das variáveis aqui investigadas.

Em decorrência das dificuldades encontradas para a devolução dos Termos de Consentimento Livre e Esclarecido-Pais/responsáveis (TCLE) em relação à escola onde o estudo foi realizado (a partir daqui será denominada escola A), a pesquisa também foi realizada em outra escola, aqui denominada escola B. Na escola A um total de 38 sujeitos preencheram todos os critérios de inclusão. Em relação à escola B, 22 escolares atenderam aos critérios de inclusão e compuseram a amostra da pesquisa, totalizando 60 sujeitos. Ambas as escolas pertenciam à mesma região na qual o estudo foi conduzido e utilizam o método socioconstrutivista como concepção de alfabetização.

Todas as crianças passaram por avaliação da leitura e escrita por meio do TDE o qual é dividido em três partes: ditado de palavras (pontuação máxima = 34), aritmética (pontuação máxima = 38) e leitura de palavras isoladas (pontuação máxima = 70). Para cada acerto a criança recebe um ponto, sendo que o escore total é de 142 pontos, e a pontuação média estabelecida para o 4º ano é de 102 a 112 pontos.

Sendo assim, os sujeitos com desempenho inferior compuseram o grupo com indicativos de alterações de leitura e escrita (GCI) e aqueles com pontuação média e superior integraram o grupo sem indicativos de alterações de leitura e escrita (GSI). A amostra foi dividida em quatro grupos:

  1. Grupo sem indicativos de alterações de leitura e escrita (GSI) da Escola A - 17 crianças do 4º ano do Ensino Fundamental, sendo nove do gênero masculino (52,9%) e oito do feminino (47%), com média de idade de 9 anos e 4 meses;

  2. Grupo com indicativos de alterações de leitura e escrita (GCI) da Escola A - 21 crianças do 4º ano do Ensino Fundamental, sendo 10 do gênero masculino (47,6%) e 11 do feminino (52,3%), com média de idade de 9 anos e 2 meses;

  3. Grupo sem indicativos de alterações de leitura e escrita (GSI) da Escola B - 13 crianças do 4º ano do Ensino Fundamental, sendo seis do gênero masculino (46%) e sete do feminino (53,8%), com média de idade de 9 anos e 9 meses;

  4. Grupo com indicativos de alterações de leitura e escrita (GCI) da Escola B - 9 crianças do 4º ano do Ensino Fundamental, sendo seis do gênero masculino (66,6%) e três do feminino (33,3%), com média de idade de 10 anos.

Provas Experimentais

Os sujeitos foram avaliados, individualmente, quanto à CLO, CLT e CF, seguindo as instruções de aplicação e pontuação descritas nos testes utilizados.

Os sujeitos realizaram a prova de CLO e CLT, números 9 e 10 do item IV do Teste PROLEC1919. Moojen S (coord). Consciência Fonológica - Instrumento de Avaliação Sequencial (CONFIAS). Casa do Psicólogo, 2003.. O PROLEC Orações (PROLEC-O) é formado por 12 orações que expressam ordens simples a serem executadas. A média de pontuação estabelecida para a 3ª série (4ºano) do EF é ≥11,80 pontos. O PROLEC Textos (PROLEC-T) é formado por quatro pequenos textos (dois do tipo narrativo e dois expositivos) cujos significados devem ser extraídos para responder às quatro perguntas orais de cada texto. A média de pontuação estabelecida para a 3ª série (4ºano) do EF é ≥13,78 pontos.

Para avaliação da CF foi utilizado o teste CONFIAS - Consciência Fonológica: Instrumento de Avaliação Sequencial2020. Capellini SA, Oliveira AM, Cuetos F. Prolec - Provas dos Processos de Leitura: manual. Cuetos F, Rodrigues B, Ruano E. Adaptação para o português Capellini SA, Oliveira AM, Cuetos F. 1.ed.São Paulo: Casa do Psicólogo, 2010. que contém o total de 70 itens que e a criança deve responder em relação à síntese, segmentação, rima, aliteração, identificação de sílaba inicial e final e transposição silábica e fonêmica. A média estabelecida pelos autores para cada criança é dada a partir da hipótese de escrita.

Procedimentos para Análise Estatística dos Resultados

O teste Quiquadrado foi utilizado para comparar as porcentagens de crianças provenientes das duas escolas.

O teste de Kruskal-Wallis foi aplicado para comparar as distribuições das pontuações do questionário dos professores; do PROLEC-O e PROLEC-T e do CONFIAS nos GSI e GCI.

O Coeficiente de Correlação de Spearman foi calculado para medir a correlação entre o PROLEC-T e PROLEC-O; e a correlação entre o PROLEC (Orações e Textos) e o CONFIAS.

Foi construída uma curva ROC, para análise do CONFIAS considerando o PROLEC-T como padrão ouro.

Nos testes de hipótese foi fixado o nível de significância de 0,05.

Resultados

A análise descritiva referente ao desempenho no PROLEC-O mostrou que na Escola B, a maioria dos indivíduos do GSI e GCI foi classificada como acima da média, enquanto que na Escola A isto só aconteceu no GSI (Tabela 1).

Tabela 1:
Distribuições de frequências e porcentagens da Classificação do PROLEC orações nos grupos com e sem indicativos de alterações de leitura e escrita

Quanto aos resultados obtidos no PROLEC-T, não foi considerada a escola de origem, uma vez que não houve diferença significante (GCI- p=0,464; GSI- p=0,108) entre as distribuições das pontuações nas duas escolas, portanto, as análises desta prova serão consideradas apenas por grupos (GSI e GCI). Foi possível observar que a maioria das crianças do GCI foi classificada como “abaixo da média”, enquanto que no GSI a maioria ficou na categoria “acima da média” (Tabela 2).

Tabela 2:
Resumo descritivo da pontuação do PROLEC texto nos grupos com e sem indicativos de alteração de leitura e escrita por escola

Tabela 3:
Distribuições de frequências e porcentagens da Classificação do PROLEC textos nos grupos com e sem indicativos de alterações de leitura e escrita

Em relação ao CONFIAS também não foi encontrada diferença significante (p>0,999) entre as escolas e as crianças foram analisadas apenas considerando-se as divisões dos grupos (GCI e GSI). Os resultados do GSI foram melhores do que aqueles apresentados pelo GCI em sílaba, fonema e total com diferença estatística (p<0,001) (Figura 1).

Figura 1:
Box-plots do CONFIAS Sílaba, Fonema e Total nos grupos com e sem indicativos de alterações de leitura e escrita por escolas

O diagrama de dispersão mostrou que a correlação entre CLO e CLT no GCI foi significante (Figura 2). O valor observado do coeficiente de correlação de Spearman das pontuações no PROLEC- T e PROLEC-O foi o seguinte: r= 0,67 (p<0,001). No grupo sem indicativos, o valor do coeficiente foi r=0,25 (p=0,118).

Figura 2:
Diagramas de dispersão do PROLEC orações e PROLEC textos nos grupos com e sem indicativos de alterações de leitura e escrita

Quanto à correlação entre CLO e CONFIAS (sílaba, fonema e total), o diagrama de dispersão indica que houve correlação significante somente entre PROLEC-O e CONFIAS (sílaba e total) no GCI (Figura 3).

Figura 3:
Diagramas de dispersão do PROLEC Orações e CONFIAS (Sílaba, Fonema e Total), para crianças, com e sem indicativos de alterações de leitura e escrita

No que diz respeito à correlação entre o CLT e o CONFIAS (sílaba, fonema e total), o diagrama de dispersão mostra correlação significante apenas no GCI, embora os valores obtidos no GSI estivessem muito próximos de significância (Figura 4).

Figura 4:
Diagramas de dispersão do PROLEC textos e CONFIAS Sílaba, Fonema e Total, para crianças, com e sem indicativos de alterações de leitura e escrita

Com o objetivo de obter um valor de corte para a pontuação em CF, tal que o resultado de uma criança pudesse indicar ou não a ocorrência de alterações na compreensão leitora, foi construída uma curva ROC (Figura 5), considerando a CLT como padrão ouro.

Figura 5:
Curva ROC para o CONFIAS total considerando o PROLEC textos como padrão ouro

O ponto mais próximo do canto superior esquerdo da curva ROC corresponde ao valor máximo de sensibilidade (0,79) e especificidade (0,96) alcançado. O valor de corte do CONFIAS correspondente a esse ponto é 58,6. Assim, crianças com 59 pontos ou mais no CONFIAS podem ser classificadas com desempenho adequado em CLT.

Discussão

Em relação aos dados referentes ao desempenho em CLO, é importante ressaltar a proximidade entre as médias do GCI da escola B com aquela observada no GSI da escola A, fato que não era esperado, uma vez que as crianças eram de grupos diferentes e em quantidade menor em um dos grupos (Tabela 1). Estes dados indicam melhor desempenho das crianças da escola B, o que pode estar relacionado ao Índice de Desenvolvimento de Educação Básica (IDEB) da escola A e escola B no ano de 2011 que diferem em 1,2, sendo que na escola A esse índice é de 4,7 e na escola B de 5,9, evidenciando a melhor qualidade de ensino nesta última.

Salienta-se ainda que não houve diferença significante entre as pontuações das escolas A e B no GSI, ou seja, as crianças de ambas as escolas obtiveram médias superiores ao GCI, o que já vem sendo exposto pela literatura, uma vez que escolares com bom rendimento escolar tendem a ter resultados superiores em leitura e escrita33. Mousinho R, Correa J. Inter-relação entre processamento fonológico e compreensão leitora do 2° ao 4° ano do ensino fundamental: um estudo longitudinal. Rev. Psicopedag. 2010;27(82):27-35.,1414. Nalom AFO, Soares AJC, Cárnio MS. The relevance of receptive vocabulary in reading comprehension. CoDAS. 2015;27(4):333-8.,1616. Oliveira AM, Capellini SA. Compreensão leitora de palavras e frases: elaboração de procedimento avaliativo. Psicol. estud. 2013;18(2):293-301..

A análise estatística mostrou também que a maioria dos escolares do GCI da escola B foi classificada com desempenho “acima da média”, ao passo que na escola A apenas um indivíduo obteve resultado “acima da média”. Isto sugere que o PROLEC-O não diferenciou escolares com indicativos de alterações de leitura e escrita da escola B. Uma possível explicação para estes resultados pode estar relacionada à ênfase no trabalho em compreensão de leitura de orações realizado pelos professores das classes envolvidas.

Por outro lado, foi possível observar que, na escola A, a porcentagem de indivíduos classificados como “abaixo da média” foi maior no GCI, sendo que no GSI apenas um escolar ficou “abaixo da média”. Neste último, a prova de compreensão de orações foi um indicador eficiente para diferenciar crianças com ou sem indicativos de alterações de leitura e escrita. Dessa forma pode-se especular que para crianças com melhores práticas de letramento escolar e apoio familiar (escola B) a prova de compreensão de orações pode não ser um instrumento discriminador de crianças com alterações. Entretanto, para crianças com práticas de letramento reduzidas e/ou prejudicadas, ou seja, escolares com indicativos, o PROLEC-O se mostrou uma importante ferramenta na diferenciação de desempenho.

Em relação aos resultados obtidos na prova de CLT, a análise estatística evidenciou que as médias e medianas do GSI foram maiores do que as do GCI em ambas as escolas, o que já foi citado anteriormente no que diz respeito à CLO, na qual os escolares sem indicativos de alterações tendem a ter resultados superiores33. Mousinho R, Correa J. Inter-relação entre processamento fonológico e compreensão leitora do 2° ao 4° ano do ensino fundamental: um estudo longitudinal. Rev. Psicopedag. 2010;27(82):27-35.,1414. Nalom AFO, Soares AJC, Cárnio MS. The relevance of receptive vocabulary in reading comprehension. CoDAS. 2015;27(4):333-8.,1616. Oliveira AM, Capellini SA. Compreensão leitora de palavras e frases: elaboração de procedimento avaliativo. Psicol. estud. 2013;18(2):293-301. (Tabela 2). O fato de a mediana das crianças da escola B no GCI estar mais próxima daquela observada no GSI da escola A, indica que estes escolares (escola A) têm desempenho variável, o que já foi discutido anteriormente, pois a escola A esta localizada em um bairro de nível socioeconômico inferior, e este fato pode ter contribuído para pior desempenho das crianças 22. Guedes MCR, Gomes CA. Consciência fonológica em períodos pré e pós-alfabetização. Cadernos de Letras da UFF - Dossiê Letras e Cognição 2010;41: 263-81.,2121. Ávila CRB. Consciência Fonológica. In: Tratado de Fonoaudiologia. Ferreira LP, Befi-Lopes DM, Limongi SCO (orgs). - 1.ed. - São Paulo: Roca, 2004. p.815-24..

Ao comparar o desempenho do GCI e GSI de ambas as escolas foi encontrada diferença significante entre as distribuições da pontuação no PROLEC-T. Os resultados indicaram ainda que as pontuações no GCI tendem a ser menores do que no GSI, ou seja, o PROLEC-T foi um bom indicador dos escolares com e sem indicativos de alterações de leitura e escrita, independente da qualidade da escola a que pertenciam, diferentemente do que ocorreu com a compreensão de orações.

As distribuições de frequências e porcentagens do PROLEC-T nos grupos mostraram que a maioria dos escolares com indicativos foram classificados como “abaixo da média”, enquanto que no grupo sem indicativos a maioria teve desempenho na categoria “acima da média”, evidenciando mais uma vez que tal prova foi efetiva ao separar crianças com e sem indicativos, independente da escola que frequentam (Tabela 3). Dessa forma a prova de compreensão de textos do PROLEC-T pode ser utilizada como um importante indicador de possíveis alterações de leitura e escrita, fato já evidenciado em um estudo anterior1414. Nalom AFO, Soares AJC, Cárnio MS. The relevance of receptive vocabulary in reading comprehension. CoDAS. 2015;27(4):333-8..

É válido lembrar que, em estudantes do 4º ano do ensino fundamental, esperava-se que as habilidades de compreensão leitora já estivessem consolidadas, pois esta evolui rapidamente durante os anos de escolaridade, conforme observado nas crianças deste estudo sem indicativos de alteração de leitura e escrita33. Mousinho R, Correa J. Inter-relação entre processamento fonológico e compreensão leitora do 2° ao 4° ano do ensino fundamental: um estudo longitudinal. Rev. Psicopedag. 2010;27(82):27-35.,1414. Nalom AFO, Soares AJC, Cárnio MS. The relevance of receptive vocabulary in reading comprehension. CoDAS. 2015;27(4):333-8.,1616. Oliveira AM, Capellini SA. Compreensão leitora de palavras e frases: elaboração de procedimento avaliativo. Psicol. estud. 2013;18(2):293-301.,2222. Reynolds MR, Turek JJ. A dynamic development link between verbal comprehension - knowledge (GC) and reading comprehension: verbal comprehension-knowledge drives positive change in reading comprehension. J. Sch. Psychol. 2012;(50):841-63.,2323. Williams GJ, Larkin RF. Narrative writing, reading and cognitive processes in middle childhood: What are the links? Learn Individ Differ. 2013;28:142-50..

Os dados estatísticos apontaram correlação significante entre as pontuações no PROLEC-T e PROLEC-O apenas no GCI (Figura 4). Isto significa que neste grupo os escolares com pontuação abaixo da média em compreensão de leitura de orações, permaneceram também abaixo da média em compreensão de leitura de textos, resultado esperado, uma vez que a compreensão leitora envolve conceitos como cognição e metacognição1717. Rothou KM, Pedeliadu S, Sideridis GD. Predicting early reading in greek: the contribution of phonological awareness and non-phonological language skills. Procedia Soc Behav Sci. 2013;98(2013):1504-19.,2424. Askan N, Kisac B. A descriptive study: Reading comprehension and cognitive awareness skills. Procedia Soc Behav Sci. 2009;1(1):834-7.. Contudo, a leitura de orações demanda menos habilidades metacognitivas, ao contrário da leitura de textos, que envolve um número maior destas habilidades1414. Nalom AFO, Soares AJC, Cárnio MS. The relevance of receptive vocabulary in reading comprehension. CoDAS. 2015;27(4):333-8.,1717. Rothou KM, Pedeliadu S, Sideridis GD. Predicting early reading in greek: the contribution of phonological awareness and non-phonological language skills. Procedia Soc Behav Sci. 2013;98(2013):1504-19.,2222. Reynolds MR, Turek JJ. A dynamic development link between verbal comprehension - knowledge (GC) and reading comprehension: verbal comprehension-knowledge drives positive change in reading comprehension. J. Sch. Psychol. 2012;(50):841-63.,2424. Askan N, Kisac B. A descriptive study: Reading comprehension and cognitive awareness skills. Procedia Soc Behav Sci. 2009;1(1):834-7.. Assim, para as crianças deste estudo dificuldades em tarefas mais simples, necessariamente levaram a dificuldades em tarefas mais complexas.

É fato que, no desenvolvimento dos processos de leitura, o escolar passa do nível de palavra, para o nível da frase, e em seguida para o nível textual. Um estudo2525. Oliveira AM, Cardoso MH, Capellini SA. Characterization of reading processes in students with dyslexia and learning disabilities. Rev. soc. bras. fonoaudiol. 2012;17(2):201-7. apontou que à medida que aumenta o desempenho na compreensão de palavra escrita, aumenta também o desempenho na compreensão de frase escrita. Isso se deve ao fato de que há uma relação entre a leitura de palavras isoladas e a compreensão da leitura. Resultados semelhantes foram descritos em outros estudos2626. Navas ALGP, Pinto JCBR, Dellisa PRR. Avanços no conhecimento do processamento da fluência em leitura: da palavra ao texto. Rev. Soc. Bras. Fonoaudiol. 2009;14(4):553-9.

27. Capovilla AGS, Dias NM. Desenvolvimento de estratégias de leitura no ensino fundamental e correlação com nota escolar. Psicol Rev. 2007;13(2):363-82.
-2828. Berninger WV, Abbott RD, Lee Swanson H, Lovitt D, Trivedi P, Lin SJ et al. Relationship of word- and sentence-level working memory to reading and writing in second, fourth, and sixth grade. Lang Speech Hear Serv Sch. 2010;41(2):179-93..

A análise estatística mostrou ainda que não houve correlação significante entre as pontuações no PROLEC-O e PROLEC-T no GSI (Figura 4). Isto significa que em crianças sem indicativos de alterações de leitura e escrita, o bom desempenho em compreensão de orações não pode ser considerado um preditor de adequada compreensão de textos. Tal fato pode ter ocorrido devido à grande facilidade que as crianças sem alterações de leitura e escrita apresentaram na prova de CLO e a possibilidade de esta não ser uma prova diferenciadora de crianças com desenvolvimento típico, uma vez que diversos estudos nacionais e internacionais destacam que o desenvolvimento da leitura ocorre de maneira progressiva, da palavra ao texto1414. Nalom AFO, Soares AJC, Cárnio MS. The relevance of receptive vocabulary in reading comprehension. CoDAS. 2015;27(4):333-8.,2424. Askan N, Kisac B. A descriptive study: Reading comprehension and cognitive awareness skills. Procedia Soc Behav Sci. 2009;1(1):834-7.,2525. Oliveira AM, Cardoso MH, Capellini SA. Characterization of reading processes in students with dyslexia and learning disabilities. Rev. soc. bras. fonoaudiol. 2012;17(2):201-7.,2727. Capovilla AGS, Dias NM. Desenvolvimento de estratégias de leitura no ensino fundamental e correlação com nota escolar. Psicol Rev. 2007;13(2):363-82. (Figura 3).

No que diz respeito à CF, observou-se que a pontuação do GSI foi maior que a do GCI em sílaba, fonema e total, dado que corrobora achados na literatura, mostrando médias de acertos mais elevadas em crianças sem indicativos em todas as variáveis de CF2828. Berninger WV, Abbott RD, Lee Swanson H, Lovitt D, Trivedi P, Lin SJ et al. Relationship of word- and sentence-level working memory to reading and writing in second, fourth, and sixth grade. Lang Speech Hear Serv Sch. 2010;41(2):179-93.,2929. Silva MC, Ávila CRB. Influence of phonological disorders on reading and writing disabilities. Audiol. Commun. Res. 2013;18(3):203-12. (Figura 3).

Ao analisar o desempenho dos grupos em sílaba, fonema, e pontuação total do CONFIAS, observou-se que GSI e GCI de ambas as escolas (A e B) apresentaram médias semelhantes, ou seja, não houve diferença significante. Esses dados indicam que independentemente da escola, os grupos com e sem indicativos apresentaram resultados homogêneos. Sendo assim, a partir desse momento os grupos serão referidos apenas como GSI e GCI sem necessariamente mencionar as escolas a que pertenciam (Figura 3).

Os GSI apresentou desempenho em consciência fonológica superior em sílaba, fonema e pontuação total quando comparado ao GCI. Especificamente quanto ao desempenho em consciência silábica o GSI obteve média superior, e essa diferença foi significante. Esses resultados indicam que a consciência silábica pode ser um aspecto importante na determinação de crianças com e sem indicativos de alteração de leitura e escrita (Figura 3).

Quanto ao desempenho em consciência fonêmica a diferença entre GSI e GCI também foi significante. Tal fato indica que a consciência fonêmica diferenciou adequadamente crianças com e sem indicativos de alteração de leitura e escrita. A consciência fonêmica se desenvolve com o decorrer da aprendizagem da leitura e escrita, e pesquisas demonstram que ela está mais relacionada ao processo de alfabetização do que a consciência silábica. Ainda assim, para que ocorra o desenvolvimento da consciência fonêmica, é necessário o desenvolvimento da consciência silábica, e dessa forma a criança avança de forma mais fácil e eficiente na leitura e escrita1010. Cavalheiro LG, Santos MS, Martinez PC. The influence of phonological awareness in reading acquisition. Rev. CEFAC. 2010;12(6):1009-16.

11. Ukrainetz TA, Nuspl JJ, Wilkerson K, Beddes SR. The effects of syllable instruction on phonemic awareness in preschoolers. Early Child Res Q. 2011;26(1):50-60.
-1212. Soares AJC, Cárnio MS. Phonemic awareness in students before and after language workshops. J. Soc. Bras. Fonoaudiol. 2012;24(1):69-75..

É importante ressaltar que, para os escolares deste estudo, não foi verificada diferença entre o desempenho em consciência silábica e fonêmica, indicando que em crianças com escolaridade mais avançada o desempenho em consciência fonêmica tende a se equiparar com aquele observado em consciência silábica. Estes dados demonstram a importância da presente pesquisa no que diz respeito ao conhecimento do padrão de aquisição da CF por escolares de escola pública. Assim, espera-se que o conhecimento dos sons da língua se amplie e evolua para o reconhecimento e manipulação dos fonemas, ao contrário do que acontece no inicio da alfabetização, em que o desempenho da consciência silábica é superior ao da consciência fonêmica22. Guedes MCR, Gomes CA. Consciência fonológica em períodos pré e pós-alfabetização. Cadernos de Letras da UFF - Dossiê Letras e Cognição 2010;41: 263-81.,77. Tenório SMPCP, Ávila CRB. Phonological processing and school performance in early grades of elementary school. Rev. CEFAC. 2012;14(1):30-8.,1111. Ukrainetz TA, Nuspl JJ, Wilkerson K, Beddes SR. The effects of syllable instruction on phonemic awareness in preschoolers. Early Child Res Q. 2011;26(1):50-60.,1212. Soares AJC, Cárnio MS. Phonemic awareness in students before and after language workshops. J. Soc. Bras. Fonoaudiol. 2012;24(1):69-75.,2020. Capellini SA, Oliveira AM, Cuetos F. Prolec - Provas dos Processos de Leitura: manual. Cuetos F, Rodrigues B, Ruano E. Adaptação para o português Capellini SA, Oliveira AM, Cuetos F. 1.ed.São Paulo: Casa do Psicólogo, 2010.,2121. Ávila CRB. Consciência Fonológica. In: Tratado de Fonoaudiologia. Ferreira LP, Befi-Lopes DM, Limongi SCO (orgs). - 1.ed. - São Paulo: Roca, 2004. p.815-24.,2424. Askan N, Kisac B. A descriptive study: Reading comprehension and cognitive awareness skills. Procedia Soc Behav Sci. 2009;1(1):834-7..

Em relação à pontuação total em CF, a diferença significante observada no GSI corrobora outras pesquisas 1111. Ukrainetz TA, Nuspl JJ, Wilkerson K, Beddes SR. The effects of syllable instruction on phonemic awareness in preschoolers. Early Child Res Q. 2011;26(1):50-60.,2121. Ávila CRB. Consciência Fonológica. In: Tratado de Fonoaudiologia. Ferreira LP, Befi-Lopes DM, Limongi SCO (orgs). - 1.ed. - São Paulo: Roca, 2004. p.815-24.,2424. Askan N, Kisac B. A descriptive study: Reading comprehension and cognitive awareness skills. Procedia Soc Behav Sci. 2009;1(1):834-7. que encontraram relação recíproca entre CF e o aprendizado da leitura e escrita. Este, por sua vez, pode ser influenciado por condições extrínsecas à cada criança, o que pode também interferir no desenvolvimento da CF1212. Soares AJC, Cárnio MS. Phonemic awareness in students before and after language workshops. J. Soc. Bras. Fonoaudiol. 2012;24(1):69-75.. Isto significa que a CF pode ser afetada pelas experiências vivenciadas pelas crianças, sendo comum que aquelas menos favorecidas social e culturalmente apresentem oportunidades reduzidas de reflexão linguística22. Guedes MCR, Gomes CA. Consciência fonológica em períodos pré e pós-alfabetização. Cadernos de Letras da UFF - Dossiê Letras e Cognição 2010;41: 263-81.,1212. Soares AJC, Cárnio MS. Phonemic awareness in students before and after language workshops. J. Soc. Bras. Fonoaudiol. 2012;24(1):69-75.,2121. Ávila CRB. Consciência Fonológica. In: Tratado de Fonoaudiologia. Ferreira LP, Befi-Lopes DM, Limongi SCO (orgs). - 1.ed. - São Paulo: Roca, 2004. p.815-24.. Tal hipótese foi confirmada ao se constatar o pior desempenho do GCI da escola A, a qual está localizada em uma região de famílias de nível socioeconômico inferior e baixa instrução.

A análise inferencial mostrou correlação significante entre CLT e o desempenho em CF em sílaba, fonema e total apenas no GCI (Figura 4). Esse dado sugere que escolares com desempenho inferior em CF apresentarão maior prejuízo na compreensão de textos. Contrariamente, a CF não foi o principal fator para que as crianças sem alterações tivessem bom desempenho em CLT. Levando-se em consideração que são crianças do quarto ano do Ensino Fundamental e que os textos desta prova são de curta extensão, o tempo de escolarização pode ter sido uma variável importante para o desempenho destas crianças em compreensão de leitura 33. Mousinho R, Correa J. Inter-relação entre processamento fonológico e compreensão leitora do 2° ao 4° ano do ensino fundamental: um estudo longitudinal. Rev. Psicopedag. 2010;27(82):27-35.,1313. Andrade MWCL, Dias MGBB. Processos que levam à compreensão de textos. Psicol. estud. 2006;11(1):147-54.,1616. Oliveira AM, Capellini SA. Compreensão leitora de palavras e frases: elaboração de procedimento avaliativo. Psicol. estud. 2013;18(2):293-301.,1717. Rothou KM, Pedeliadu S, Sideridis GD. Predicting early reading in greek: the contribution of phonological awareness and non-phonological language skills. Procedia Soc Behav Sci. 2013;98(2013):1504-19.,2626. Navas ALGP, Pinto JCBR, Dellisa PRR. Avanços no conhecimento do processamento da fluência em leitura: da palavra ao texto. Rev. Soc. Bras. Fonoaudiol. 2009;14(4):553-9..

Ao analisar os dados da curva ROC, verificou-se que o desempenho em CF pode ser considerado um preditor para a CLT, uma vez que crianças que obtiveram 59 pontos ou mais no CONFIAS, foram classificadas como “normais” na compreensão de texto, ou seja, crianças com desenvolvimento típico para o nível de escolaridade (Figura 5). Contudo, aquelas com 58 pontos ou menos foram classificadas como possuindo dificuldades de compreensão de leitura. Os achados da presente pesquisa corroboram outros estudos33. Mousinho R, Correa J. Inter-relação entre processamento fonológico e compreensão leitora do 2° ao 4° ano do ensino fundamental: um estudo longitudinal. Rev. Psicopedag. 2010;27(82):27-35.,1717. Rothou KM, Pedeliadu S, Sideridis GD. Predicting early reading in greek: the contribution of phonological awareness and non-phonological language skills. Procedia Soc Behav Sci. 2013;98(2013):1504-19.,2626. Navas ALGP, Pinto JCBR, Dellisa PRR. Avanços no conhecimento do processamento da fluência em leitura: da palavra ao texto. Rev. Soc. Bras. Fonoaudiol. 2009;14(4):553-9.,2727. Capovilla AGS, Dias NM. Desenvolvimento de estratégias de leitura no ensino fundamental e correlação com nota escolar. Psicol Rev. 2007;13(2):363-82., constatando-se que as habilidades silábicas e fonêmicas correlacionam-se de maneira direta e positiva com o desempenho dos escolares em compreensão de leitura.

É importante ressaltar que os dados da presente pesquisa expandem o conhecimento na área, ao mostrar evidências consistentes de que a CF pode ser considerada um fator predisponente para a adequada compreensão de leitura. Além disso, os resultados indicam uma pontuação mínima no teste CONFIAS a partir da qual haverá maior probabilidade de uma criança apresentar desempenho considerado adequado na prova de compreensão de textos, o que contribui significantemente com a área de leitura e escrita no Brasil.

Conclusão

Os dados permitem concluir que os escolares do 4º ano do Ensino Fundamental sem indicativos de alterações de leitura e escrita têm melhor desempenho em consciência fonológica e em compreensão de leitura de orações e textos, quando comparado a escolares com indicativos de alterações de leitura e escrita.

Além disso, a presença de correlação entre a consciência fonológica e a compreensão de leitura de orações e de textos, evidencia a importância das habilidades metafonológicas não apenas para consolidação de uma leitura proficiente, mas também para a compreensão leitora.

Por fim, os resultados evidenciam que as habilidades silábicas e fonêmicas da consciência fonológica são fundamentais para o bom desempenho em compreensão de leitura de orações e textos, uma vez que a Curva ROC diferenciou com precisão os escolares com e sem dificuldade na compreensão leitura de textos. Portanto, a presente pesquisa contribui para a literatura ao expandir o conhecimento da correlação entre CF e compreensão de leitura em crianças com maior tempo de escolarização (4º ano do Ensino Fundamental).

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  • Fonte de Auxílio: Fundação de Amparo à Pesquisa e Ensino do Estado de São Paulo (FAPESP).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2017

Histórico

  • Recebido
    15 Dez 2016
  • Aceito
    20 Jul 2017
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