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Processos grupais com familiares: percepção de graduandos de fonoaudiologia

Resumo:

OBJETIVOS:

verificar a percepção de graduandos de fonoaudiologia quanto à condução de grupos de familiares e analisar o processo de escolha, condução das atividades e a repercussão do grupo no processo terapêutico.

MÉTODOS:

trata-se de estudo de corte transversal e abordagem qualitativa, cuja amostra se constituiu de 19 alunos do quarto ano de graduação. Para a coleta de dados, foram realizados três grupos focais com participantes distintos, utilizando-se questões norteadoras. Os grupos foram gravados para posterior transcrição e análise segundo critérios de repetição e relevância e criação de categorias conforme objetivos da pesquisa.

RESULTADOS:

os achados evidenciam que diversos aspectos emergiram durante a condução dos grupos na percepção dos graduandos, os quais envolvem a mudança de sentimentos, o desenvolvimento do olhar analítico, o conhecimento do setting terapêutico como espaço de reconstrução de sentidos e subjetividades, o significado das atividades como recursos necessários para o alcance dos objetivos, a supervisão como um espaço esclarecedor de dúvidas, a autoavaliação da atuação na dinâmica grupal, e a contribuição de informações compartilhadas em grupo no processo terapêutico do sujeito em atendimento.

CONCLUSÃO:

a escolha, desenvolvimento e condução das atividades com familiares, discutidas na interface entre a Fonoaudiologia e a Terapia Ocupacional, agregam valores durante a formação e evidenciam a importância do processo para os alunos. Considerar os familiares, por meio dos grupos, no processo de aprendizagem ainda na graduação pode contribuir para uma formação em uma perspectiva de atenção integral e humanizada.

Descritores:
Atividades Humanas; Relações Profissional-Família; Saúde de Grupos Específicos; Linguagem

Abstract:

PURPOSE:

to verify the perception of undergraduates in Speech and Language Pathology regarding the management of family groups and to analyze the selection process, the management of activities and the impact of groups in the therapeutic process.

METHODS:

we design a qualitative cross-sectional study. The sample consisted of 19 fourth-year students. In relation to data collection, we performed three focus groups with different participants, by using guiding questions. The groups were recorded for subsequent transcription and analysis, according to the criteria of repetition and relevance. Categories were established following the objectives of the research.

RESULTS:

different issues emerged during the group discussions from the undergraduates' perception. The discussions led to: the change of feelings; the development of an analytical view; knowledge about the therapeutic setting as a space to reconstruct meanings and subjectivities; the meaning of activities as resources to achieve objectives; the supervision as a space to clarify questions; the self-assessment of the individual performance in the context of group dynamics; and the contribution of information shared in the group during the therapeutic process of the subject.

CONCLUSION:

understood on the interface between Speech and Language Pathology and Occupational Therapy, the selection, development and management of the activities with family members aggregate values during undergraduate training, and also corroborate the importance of this process for undergraduate students. By using groups, including family members early in the learning process during undergraduation may contribute to a professional training focused on integral and humane care.

Keywords:
Human Activities; Professional-Family Relations; Health of Specific Groups; Language

Introdução

A utilização de atividades com grupos foi sistematicamente empregada nos Estados Unidos, após a década de 1930, primeiramente com o intuito de socialização de doentes mentais. Essa abordagem está presente em algumas áreas da Saúde tais como na Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional (TO). Na história da TO os processos grupais se intensificaram como forma de tratamento, considerando-se que as vivências em grupo ganharam maior sentido e significado, como efeito terapêutico1. Ballarin MLGS. Abordagens Grupais. In: Cavalcanti A, Galvão C, organizadores. Terapia ocupacional: fundamentação e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2007. P. 38-43.. No Brasil, as intervenções fonoaudiológicas com grupos começaram a ser implantadas nos anos de 1980, consideradas inicialmente, como forma de absorver a grande demanda de usuários e de diminuir as listas de espera, particularmente, nos serviços públicos de saúde. Contudo, a partir dos anos de 1990 com a ampliação de estudos em relação às práticas grupais, a constituição de grupos ganha maior força como possibilidade de intervenções terapêuticas e de caráter preventivo e educativo, tendo em vista o favorecimento da linguagem e a promoção da saúde2. Machado MLCA, Berberian AG. A terapêutica grupal na clínica fonoaudiológica voltada à linguagem escrita. In: Santana AP; Berberian AP, Guarinello AC, Massi, G, organizadores. Abordagens grupais em fonoaudiologia: contextos e aplicações. São Paulo: Plexus; 2007. P. 58-79..

O grupo se constitui em um espaço em que possam emergir dificuldades, necessidades e expectativas e o compartilhar de sentimentos de modo a favorecer maior autonomia e enfrentamento dos problemas pelos sujeitos2. Machado MLCA, Berberian AG. A terapêutica grupal na clínica fonoaudiológica voltada à linguagem escrita. In: Santana AP; Berberian AP, Guarinello AC, Massi, G, organizadores. Abordagens grupais em fonoaudiologia: contextos e aplicações. São Paulo: Plexus; 2007. P. 58-79..

Nesse sentido, uma das possibilidades de atuação grupal volta-se às famílias de pessoas em acompanhamento terapêutico. A atuação com a família tem merecido destaque no trabalho terapêutico, pois um grupo formado por familiares constitui-se em uma rede de suporte social que favorece o diálogo, a reflexão e a discussão acerca das necessidades daqueles em processo terapêutico, ao mesmo tempo em que possibilita a participação e contribuição da família no enriquecimento da qualidade do trabalho, no caso, fonoaudiológico e potencialização dos seus resultados3. Penteado RZ, Panhoca I, Siqueira D, Romano FF, Lopes P. Grupalidade e família na clínica fonoaudiológica: deixando emergir a subjetividade. Distúrb Comun. 2005;17(2):161-71..

O grupo terapêutico fonoaudiológico trata-se, ainda de prática com pouca descrição na literatura da área, observando-se um número restrito de publicações, principalmente, envolvendo grupos de familiares4. Ribeiro VV, Panhoca I, Dassie-Leite AP, Bagarollo MF. Grupo terapêutico em fonoaudiologia: revisão de literatura. Rev CEFAC. 2012;14(3):544-52..

Este fazer terapêutico possibilita conhecer as singularidades dos sujeitos em acompanhamento grupal, bem como as necessidades comuns aos participantes. O conhecimento do outro é importante para o desenvolvimento de estratégias de intervenção como aborda o artigo 43 da Lei de Diretrizes e Bases (LDB). Este estabelece que a Educação Superior deve ter entre suas finalidades, o estímulo ao conhecimento dos problemas do mundo atual, prestando serviço especializado à população e estabelecendo com a mesma uma relação de reciprocidade5. Ceccim RB, Feuerwerker LCM. Mudança na graduação das profissões de saúde sob o eixo da integralidade. Cad Saúde Pública. 2004;20(5):1400-10..

A atuação de graduandos da Saúde com grupos poderá contribuir no desenvolvimento analítico da capacidade de compreender o sujeito e suas demandas e de estabelecer um espaço de troca com o usuário6. Lima EMFA. A análise de atividade e a construção do olhar do terapeuta ocupacional. Rev Ter. Ocup. Univ. 2004;15(2):42-8.. Como pontua esse autor "o olhar não se limita a ver o visível. Ele interroga, pesquisa, penetra e interfere nas coisas e em seus movimentos. O olhar cria sentido para aquilo sobre o qual se debruça e devolve este sentido".

Para que um grupo possa fluir e se desenvolver como tal, é fundamental que o terapeuta esteja apto a desenvolver um setting terapêutico que atenda às peculiaridades do grupo em si. É um espaço que sofre influência das características intrínsicas do profissional que o coordena, o qual, portanto, deve estar apto a manejar o grupo, e a desenvolver atividades pertinentes, além de junto com o grupo construir novas possibilidades, para que assim esse espaço possa se constituir efetivamente em uma ferramenta terapêutica1. Ballarin MLGS. Abordagens Grupais. In: Cavalcanti A, Galvão C, organizadores. Terapia ocupacional: fundamentação e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2007. P. 38-43. 7. Caldeira VA, Montilha RCI, Nobre MIRS. Grupo de espera no processo de reabilitação de pessoas com deficiência visual: contribuições da terapia ocupacional. Cad de Ter. Ocup. da UFSCar. 2003;11(2):95-105..

É importante considerar ainda no manejo com o grupo, as diferenças entre os processos grupais e individuais, pois no grupo há possibilidade do jogo interacional entre os participantes e não apenas, entre terapeuta e paciente. Nesse sentido, é importante o terapeuta promover o estabelecimento de um enquadre que viabilize a construção de relações entre seus membros e a possibilidade de uma escuta significativa8. Machado MLCA, Berberian AP, Santana AP. Linguagem escrita e subjetividade: implicações do trabalho grupal. Rev CEFAC. 2009;11(4):713-9.. Essa temática merece ser enfatizada na formação do graduando, o que justifica a interface entre a Terapia Ocupacional e a Fonoaudiologia no que se refere à discussão da análise de atividades desenvolvidas no espaço grupal com vistas a uma formação norteada pela integralidade.

Integralidade supõe, dentre outros aspectos, a ampliação e o desenvolvimento da dimensão cuidadora na atuação dos profissionais da Saúde, o que irá contribuir para a formação de agentes mais responsáveis, acolhedores e capazes de construir vínculo com a população alvo e ações de serviços de saúde5. Ceccim RB, Feuerwerker LCM. Mudança na graduação das profissões de saúde sob o eixo da integralidade. Cad Saúde Pública. 2004;20(5):1400-10..

Diante do exposto, os objetivos desta pesquisa são verificar a percepção de graduandos de fonoaudiologia quanto à condução de grupos de familiares e analisar o processo de escolha, condução das atividades e a repercussão do grupo no processo terapêutico.

Métodos

Desenho do estudo e composição da amostra

O presente estudo está vinculado à pesquisa "Intervenção Fonoaudiológica em grupo de familiares de crianças com alterações de linguagem" aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da FCM/UNICAMP, sob número 179/2009. A pesquisa foi explicada aos sujeitos e solicitada anuência e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Trata-se de estudo de corte transversal e abordagem qualitativa, cuja amostra se constituiu de 19 graduandos de Fonoaudiologia FCM/UNICAMP.

Os critérios de inclusão foram: ser aluno regular do quarto ano de graduação em Fonoaudiologia e ter conduzido grupos de familiares de crianças com alterações de linguagem. Os critérios de exclusão abrangeram alunos de outros anos do Curso de Graduação de Fonoaudiologia na época da coleta de dados e alunos com experiência de condução de grupos de usuários adultos em acompanhamento fonoaudiológico.

Para identificação dos participantes, utilizou-se a sigla P (Participante) seguida da numeração de 1 a 19 (ex: participante 1 - P1), garantindo-se, desta forma, os aspectos éticos de sigilo da identidade dos sujeitos nos termos da Resolução 196/96 do CONEP.

Procedimentos de coleta de dados

Para a coleta de dados, foram realizados três grupos focais com graduandos distintos, respeitando-se a formação dos grupos de estágios em que faziam parte. Foram constituídos dois grupos de seis graduandos cada e um grupo com sete alunos, conduzidos por duas supervisoras/docentes, uma terapeuta ocupacional e uma fonoaudióloga, tendo como observadora, outra pesquisadora, a época aluna da graduação, signatária deste trabalho. Foi realizado um encontro com cada grupo, com duração média de 60 minutos.

A essência do grupo focal consiste na interação entre os participantes e o coordenador, com o objetivo de colher dados a partir da discussão focada em tópicos específicos, conforme entendimento das diferentes percepções e atitudes acerca de um fato ou prática9. Lervolino AS, Pelicioni MCF. A utilização do grupo focal como metodologia qualitativa na promoção da saúde. Rev. esc. enferm USP. 2001;35(2):115-21..

Nos grupos focais foram utilizadas questões norteadoras para conhecer como os alunos avaliam o processo de escolha, desenvolvimento e condução de atividade nos grupos de familiares bem como o papel dos grupos e desse processo durante sua formação profissional. Seguem as questões norteadoras:

  1. Como vocês avaliam a escolha das atividades desenvolvidas nos grupos de pais/familiares que vocês conduziram?

  2. Como vocês avaliam este processo na formação como fonoaudiólogos?

  3. Fale um pouco sobre o papel de condução do grupo de cuidadores/familiares.

  4. Fale um pouco sobre o processo de escolha das atividades desenvolvidas no grupo de cuidadores/familiares.

As atividades desenvolvidas nos grupos de familiares

As atividades mencionadas neste estudo referem-se aos recursos terapêuticos utilizados pelos graduandos, elaboradas com os objetivos de proporcionar maior envolvimento e entendimento das questões das crianças que os familiares acompanhavam na clínica fonoaudiológica bem como proporcionar um ambiente favorável ao estabelecimento de diálogos e reflexões.

As atividades propostas se constituíram em ferramentas de intervenção mediadas pelos facilitadores do grupo a fim de sanar dúvidas dos familiares. Tais propostas foram elaboradas pelos estagiários de Fonoaudiologia e orientadas pelas supervisoras das áreas de Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional. Os grupos, ocorridos mensalmente, eram conduzidos a cada encontro por uma dupla de estagiários.

Inicialmente, a escolha da atividade era planejada a partir das metas do atendimento fonoaudiológico das crianças, e posteriormente, passaram a ser escolhidas e desenvolvidas de acordo com as demandas que os familiares compartilhavam em cada encontro grupal, ou seja, aquelas percebidas como significativas pelos facilitadores durante os grupos. Estas eram discutidas em supervisão, quando se planejava o encontro seguinte, buscando-se propor atividades que fossem de interesse dos familiares para que desta forma os objetivos fossem mais facilmente alcançados.

Alguns dos temas das atividades trabalhadas nesses grupos, aqui exemplificados foram: formas de lidar com os filhos diante das dificuldades de comunicação, funções orais e o papel do brincar no desenvolvimento da linguagem. Todos os temas eram discutidos a partir da elaboração de atividades em que os familiares eram responsáveis pela construção das respostas por meio da mediação dos terapeutas.

Forma de análise dos dados

Os grupos focais foram gravados em vídeo e transcritos. Foram estabelecidas categorias conforme objetivos da pesquisa, analisadas segundo os critérios de repetição e relevância. Pelo critério de repetição agrupa-se o que é comum entre os sujeitos, isto é, destacam-se as colocações reincidentes. Pelo critério de relevância selecionam-se os dados que para o pesquisador constituem-se como significativos em conteúdo para os objetivos da pesquisa1010 . Turato ER. Tratado da metodologia da pesquisa clínico-qualitativa: construção teórico-epistemológica, discussão comparada e aplicação nas áreas da saúde e humanas. 2ª ed.Petrópolis: Vozes, 2003..

Foram realizadas várias leituras do material transcrito que possibilitaram destacar diversos aspectos para visualização e entendimento da produtividade e contribuição dos grupos no presente estudo, que, por sua vez, levaram ao estabelecimento das categorias de análise, como se seguem:

  1. Sentimentos dos graduandos ao conduzirem um grupo de familiares

  2. Processo de escolha e condução das atividades

  3. Contribuição da escolha, desenvolvimento e condução de atividades na formação como fonoaudiólogos

  4. O papel do estagiário na condução do grupo

  5. A repercussão do grupo no processo terapêutico

Resultados

Seguem resultados por categoria de análise.

a) Sentimentos dos graduandos ao conduzirem um grupo de familiares

Nesta categoria, oito dos 19 graduandos colocaram seus sentimentos ao conduzirem o grupo de familiares, ainda que esta não tenha sido uma questão mencionada pelas mediadoras. Observou-se que os graduandos demonstraram necessidade de abordar esta questão frente à temática.

Os sentimentos compartilhados entre os alunos foram semelhantes, indicando não ser uma tarefa fácil, conduzir grupos de familiares, nem escolherem as atividades a serem desenvolvidas. Seguem na Tabela 1, os principais sentimentos explicitados pelos sujeitos.

Tabela 1:
Sentimentos dos graduandos no início da condução de grupos de familiares

Constata-se que os participantes, mesmo tendo recebido aporte teórico em aula como subsídio à intervenção grupal, sentimentos como o medo de falhar e de não conseguir atingir os objetivos estão presentes em suas falas. É significativo observar que tais sentimentos somente são amenizados com o passar do tempo, a partir da experiência adquirida na vivência com grupos. Tais achados indicam que começar esta experiência na graduação é relevante para uma formação mais sólida na intervenção com grupos.

A mudança dos sentimentos durante o processo de condução dos grupos, a partir das experiências vividas, é referida por vários participantes. Seguem dois exemplos que ilustram essa trajetória, percorrida pelos graduandos.

"Eu achei assim muito interessante como os pais trazem, como a gente se comporta no grupo... no começo eu não sabia muito o que falar, o que expressar, eu me senti assim no primeiro grupo." (P4).

"No começo foi muito difícil, porque são vários pais e você ali, aí tem que pensar em tudo, se eles me perguntarem tal coisa, o que eu falo? E assim, o mais importante que eu aprendi é que não adianta ficar programando, você tem que programar a atividade, o conteúdo geral, e deixar fluir, porque muito depende do que os pais vão trazer..."(P9)

Os achados evidenciam além da ansiedade inicial, as mudanças de atitudes e o desenvolvimento do olhar analítico a partir da experiência com os grupos, como mostra o depoimento de um dos sujeitos:

"Quando a gente começa a participar de um grupo de pais, a gente tá muito preocupada com o que nós mesmas vamos fazer, né? O que eu vou falar, aí se fica um silêncio o que eu falo, né? Como eu vou conduzir? Que assunto eu vou colocar? E a gente acaba focando muito na nossa atitude ali durante o grupo, e isso é uma coisa que a gente vai percebendo com o tempo, conforme você vai participando do grupo, você vai percebendo que não precisa falar toda hora, conforme você vai participando vai tendo mais sensibilidade de que hora falar, o que você precisa falar e o que não precisa..."(P5)

b) O processo de escolha e condução das atividades

Os graduandos, de modo geral, caracterizam as atividades como um recurso para mediar o desenvolvimento do grupo. O depoimento do sujeito P16, de certo modo, resume as colocações dos demais alunos em relação ao papel da atividade:

"Então, acho que a atividade ela tem esse propósito de favorecer mesmo a reflexão, ela ajuda, ela fomenta, é a base da discussão". (P16)

Uma das questões que mereceu destaque por estar presente em vários depoimentos, foi a compreensão do papel das escolhas das atividades, além do objetivo de introduzir assuntos considerados necessários ao grupo, fosse por questões observadas pelas estagiárias de Fonoaudiologia ou por colocações dos familiares, como também o significado do preparar as atividades em si. Seguem alguns exemplos dos graduandos em relação, que representam as falas reincidentes no grupo, relevantes para a compreensão dessa temática.

"A gente sempre pensava em uma atividade que privilegiasse alguma discussão que a gente quisesse propor ali..." (P16)

"Você vai deixar passar um pouco daquilo que você pensa na própria atividade..." (P19)

"Eu acho que na hora de preparar as atividades a gente buscou trazer o que os pais tinham trazido como dúvida ou como alguma curiosidade que eles tenham... às vezes, eles vão agir de forma inesperada e a gente tem que aprender saber, estar

preparada pra lidar com isso no momento né?... " (P11)

"É legal que o preparar já abre nossos olhos para outra coisa, você vai lembrar de preparar alguma coisa que tenha a ver, se a família é quieta, se já ouviu falar, se é impulsiva. Acho que até o preparar já é um aprendizado pra gente analisar essa família..."(P14)

Os achados evidenciam o processo de escolha das atividades pelos graduandos tendo em vista favorecer e privilegiar a discussão entre os membros do grupo de familiares. Mostram que os sujeitos consideram a atividade importante para o início da discussão como também pontuam que ao ser escolhida, já demonstra o que o terapeuta quer trabalhar e alcançar. Além disso, os graduandos expressam que nem sempre os objetivos e os resultados esperados ocorrem, uma vez que os familiares podem trazer outras necessidades no momento do grupo, que promovem um novo rumo no desenvolvimento das atividades.

Tais percepções dos sujeitos permite-nos destacar que no período de formação, os graduandos estão sendo preparados para elaborar assuntos pertinentes às demandas das famílias, visto que estas fazem parte do processo terapêutico de qualquer sujeito na clínica fonoaudiológica, e que as frustrações de em alguns momentos o preparo das atividades não ocorrerem como previsto, são importantes para a constituição de terapeutas que sabem lidar com os vieses, que devem ser tomados como relevantes e significativos e assim, reelaborarem suas condutas.

c) Contribuição da escolha, desenvolvimento e condução de atividades na formação como fonoaudiólogos

Os graduandos expressam a contribuição da atuação com os grupos, destacando o valor dessa experiência:

"Eu acho que a importância para nossa formação é de como formar um grupo, por que fazer um grupo, em que momento fazer, como conduzir esse grupo, que atividades preparar e porque preparar essas atividades." (P9)

"A oportunidade de ter participado desses grupos nesse ano foi uma experiência muito rica e com certeza contribui pra gente se sentir mais segura na nossa vida profissional na realização de grupos, conduzir grupos. "(P11)

Ainda na fala desse mesmo sujeito, verifica-se a importância da atuação com a família no processo terapêutico:

"Eu acho que a gente sai com uma formação de que muito além do conteúdo teórico que a gente tem para aplicar, a gente tem que pensar que esse sujeito está em um meio e que este meio vai influenciar, no caso a família vai influenciar muito. Então a gente precisa tá junto, participar, orientar pra poder trazer eles pra trabalhar junto com a gente." (P11)

Além disso, os resultados mostram que a prática contribui para a formação no sentido dos graduandos conseguirem por meio das experiências adquiridas um olhar diferenciado, mais atento ao outro, como exemplificam os depoimentos a seguir:

"Eu acho que em todos os estágios é aquela coisa da prática, vai pegando o jeito... deixa de ser mecânico, passa a ser uma coisa que você ta pensando mais no outro, mais no paciente, mais nos pais no caso do grupo do que nas suas atitudes..." (P1)

"A importância do grupo foi fundamental mesmo e a gente não ia ter essa noção se fosse só em terapia, porque é muito natural como eles se colocam... as informações que o grupo traz é fundamental pra gente pensar, as vezes repensar e planejar algumas coisas na nossa terapia e por isso, eu acho que foi fundamental na nossa formação, a gente vai aprendendo a lidar com os pais, a ver eles de outras formas, ouvir eles de outra forma também..."(P7)

Outro aspecto abordado por um dos sujeitos diz respeito à contribuição do processo de autoavaliação que o conduzir o grupo proporciona:

"Eu me avalio toda vez que eu saio do grupo, eu sei quando eu fiz a coisa certa e quando não deu certo, a gente se avalia." (P4)

Observa-se que a autoavaliação está intimamente relacionada com o quanto o graduando conseguiu contribuir para a produção do grupo, o que envolve reflexão acerca das atitudes desenvolvidas e da atividade escolhida. O participante P4 complementa da seguinte forma:

"Tudo isso que a gente teve, a gente aprende aqui para aprender como fonoaudiólogo profissional e na vida, porque a gente percebe muito como o falar tem sentido, tem muito impacto no paciente, a gente aprende que tem certas coisas que não é para falar perto do paciente ou que tem certas coisas que é preciso falar, esta sensibilidade de ter a hora certa para falar." (P4)

Outra questão bastante abordada pelos graduandos como agente de contribuição na escolha, desenvolvimento e condução das atividades, assim como na formação profissional foi em relação à supervisão. Para eles, a supervisão contribuiu para esclarecer dúvidas e propiciar reflexão, como se pode observar nos depoimentos que se seguem:

"Eu acho que o que ajudou muito eram as supervisões, quando a gente trabalha os sentimentos que a gente teve e as atitudes, ajuda bastante..."(P3)

"Estar no grupo, conduzir um grupo, pra mim pelo menos, foi um aprendizado de aprender a ouvir, porque a gente tem a impressão que coordenador de grupo é a pessoa que fala...e acho que isso ajuda na supervisão, de falar menos e ouvir mais, as vezes é o que interessa."(P13)

d) O papel do estagiário na condução do grupo

Juntamente com a exposição dos sentimentos vividos ao conduzirem grupo de familiares, e do processo de escolha, desenvolvimento e condução de atividades como apresentado, os graduandos também refletiram sobre o papel vivido como responsáveis pelo grupo.

A partir das vivencias em estágio, os graduandos puderam abordar nos grupos focais seu papel diante da condução dos grupos de familiares, o que remete a importância para a formação de profissionais capazes de acolher e conhecer o contexto de uma dinâmica grupal, conscientes do papel que devem assumir e da importância da elaboração de atividades, para que respostas não sejam dadas de modo preestabelecido, mas sim, construídas junto aos sujeitos. Os depoimentos, a seguir, resumem, de modo geral, as colocações reincidentes pelo conjunto dos alunos:

"Não é porque você é um profissional, que você ta lá, você sabe a teoria que você tem que falar mais ou mostrar que tá sabendo. Às vezes, o saber ouvir já é o suficiente, foi o que esse grupo mostrou pra gente... acho que ouvir envolve tudo, é ouvir, observar os pequenos gestos, os pequenos detalhes, porque às vezes até um sinal de não falar nada já é um sinal que diz algumacoisa..."(P13)

"O papel nosso, é uma construção conjunta... você não vai trazer algo pronto para mostrar, você vai construir junto com eles. Então, o nosso papel não é trazer a solução ou entregar alguma coisa pronta, é instigar uma construção de alguma coisa..." (P15)

A seguir são ilustradas as expressões utilizadas no discurso dos participantes que representam o papel do Fonoaudiólogo frente a um grupo (Tabela 2):

Tabela 2:
Papel do fonoaudiólogo na condução de grupos segundo a percepção dos graduandos

Como se pode observar, os graduandos colocam-se como agentes de mediação, ou seja, como facilitadores da discussão entre seus membros, levantada a partir de observação e escuta, atentos a linguagem do grupo, expressa tanto de forma oral como não verbal, na realização das atividades no contexto grupal.

e) A repercussão do grupo no processo terapêutico

Os depoimentos, a seguir, ilustram as colocações dos graduandos quanto à importância do grupo na terapia fonoaudiológica como espaço de troca de experiências e colocação dos anseios e angústias:

"É de fundamental importância você ter esse momento para os pais falarem o que eles acham e o que eles sentem, colocar dúvidas e descobrir o nosso trabalho e o trabalho deles em casa. Acho que este espaço aberto permite essa troca, pra você conhecer mais a família, conhecer mais a criança, seu paciente."(P8)

"O próprio momento de se encontrar com outros pais que vivenciam a mesma situação podem ajudar aquele que não aderiu tanto ao processo terapêutico do filho a olhar com outros olhos o processo terapêutico... alguns pais mudaram a opinião ao longo do ano, mudaram o jeito de agir, acho que isso foi fundamental para o individuo que está sendo atendido." (P11)

Além disso, os sujeitos abordam a contribuição e a participação dos pais e cuidadores no Grupo de Familiares no processo terapêutico de seus filhos ou crianças:

"Eles trazem coisas no grupo que eles não trazem pra gente quando a gente conversa individualmente...as informações que o grupo traz é fundamental pra gente pensar, as vezes repensar e planejar algumas coisas na nossa terapia..."(P7)

"Este grupo de pais é um trabalho que ajuda muito no ambiente terapêutico, porque só as terapias individuais não vão dar conta da complexidade do sujeito." (P19)

Os depoimentos mostram também que o grupo além de favorecer as crianças em terapia, favorece os próprios familiares e, desta forma, a construção de uma relação de parceria entre estagiários e cuidadores. Os depoimentos, a seguir, ilustram essa questão:

"O relato de um pai, que ele colocou a importância do grupo como um momento acolhedor pra eles, que eles se sentiram importantes também, assim não ter só um espaço terapêutico pros filhos, mas um espaço pros pais poderem falar deles." (P9)

"Um trabalho mais específico com a família é fundamental, não tem como você separar o filho da família, o idoso do cuidador, é sempre um conjunto, e não adianta você trabalhar aqui e daí a família nadar contra tudo o que você fez, ou não ser seu aliado...é fundamental você ter aliado, e aí quem vai se beneficiar sempre é o paciente. E pra gente foi muito bom, é outra visão, não é só você ir lá e cuidar, não, tem uma família que também precisa ser cuidada."(P13)

Discussão

Verifica-se que ao compartilharem seus sentimentos em relação às expectativas de conduzirem Grupos de Familiares, os graduandos expressam que não é uma tarefa vivenciada com tranquilidade e que, a partir das experiências adquiridas em sua formação com o manejo dos grupos, as mudanças internas ocorrem. Sentimentos de medo e receio também foram encontrados em relatos de estudantes de Enfermagem que vivenciaram em sua formação o atendimento de familiares1111 . Fernandes CNS, Andraus LMS, Munari DB. O aprendizado do cuidar da família das crianças hospitalizadas por meio de atividades grupais. Rev eletr. Enferm. 2006;8(1):1-17.. Os acadêmicos trouxeram a dificuldade em lidar com o excesso de exposição dos sentimentos dos familiares que surgiam na dinâmica grupal, citando como exemplo, o choro, que os deixavam sensibilizados e receosos quanto à postura a assumir diante dessas reações e questões compartilhadas.

Os sentimentos se transformam à medida que os graduandos vão descobrindo suas potencialidades e papel no grupo além do próprio objetivo do mesmo, como evidenciado pelos resultados. Os graduandos passam a deixar de se preocupar com o seu desempenho, com a necessidade de falar e esclarecer as dúvidas e passam a olhar mais para o outro.

Os sujeitos pontuam como sendo seu papel, atuar como facilitadores e agentes de mediação. Sendo, portanto, importante exercer escuta, observação, captar e valorizar a linguagem pertinente ao grupo. Tais achados evidenciam desta forma, o amadurecimento dos graduandos, como expresso pelos seus depoimentos em relação à condução de grupo.

O objetivo de trabalhar com familiares, assumido pelos graduandos, corrobora outros estudos, que reiteram a importância da atuação grupal com familiares, além da mera transmissão de orientações, sendo importante a reconstrução de sentidos e subjetividades que, muitas vezes, estão ocultos nos familiares1212 . Domingues AR. Família e serviços de reabilitação: ressignificando essa relação. In: Rocha EF, organizadora. Reabilitação de pessoas com deficiência: a intervenção em discussão. São Paulo:Roca; 2006. P. 230-7..

Este amadurecimento proporcionado na formação contribui para que os graduandos adquiram o verdadeiro sentido de um grupo de familiares como um espaço em que eles podem acompanhar o processo terapêutico das crianças em atendimento. Deste modo, por meio do diálogo e das reflexões formam uma rede de suporte social que repercutirá nas possibilidades de participação da família no cotidiano, enriquecendo o trabalho fonoaudiológico e potencializando seus resultados3. Penteado RZ, Panhoca I, Siqueira D, Romano FF, Lopes P. Grupalidade e família na clínica fonoaudiológica: deixando emergir a subjetividade. Distúrb Comun. 2005;17(2):161-71..

No que se refere ao processo de escolha e condução das atividades, os achados mostram que são levados em consideração as características dos familiares e as necessidades que trazem, ou seja, os graduandos desenvolvem habilidades de observação, ficam mais sensíveis ao conhecimento do outro e ao desenvolvimento de ações que atendam as necessidades do grupo.

A partir do conhecimento do outro, conduzem o grupo por meio de atividades, definidas como recurso para mediar os assuntos, sendo a atividade a base para fomentar a discussão, o ponto de partida para que ocorram reflexões. Os sujeitos estudados expõem em seus depoimentos que as atividades escolhidas passam o que eles próprios estão pensando em relação ao grupo. Esta colocação também está presente na literatura, em que as características do profissional que coordena o grupo irão refletir no setting grupal1. Ballarin MLGS. Abordagens Grupais. In: Cavalcanti A, Galvão C, organizadores. Terapia ocupacional: fundamentação e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2007. P. 38-43..

Outro ponto importante colocado pelos graduandos está no fato de que ao conduzirem uma atividade, o percurso por eles previsto nem sempre pode ocorrer, direcionando de forma diferente de acordo com as necessidades intrínsecas ao grupo.

A contribuição da escolha, desenvolvimento e condução de atividades na formação como fonoaudiólogos é percebida como uma construção que se inicia já nas disciplinas teóricas e na supervisão de estágio. Segundo os graduandos, trata-se de um espaço em que podem esclarecer suas dúvidas e refletirem junto aos colegas e docentes, como formar um grupo, como conduzi-lo, quais atividades devem ser desenvolvidas, que possam atender os objetivos do grupo de familiares, visto que, como apontado na literatura1313 . Molina PD. La Actividad como herramienta en Terapia Ocupacional. In: Lopes BP, Molina PD, Arnaiz BN, organizadores. Conceptos Fundamentales de Terapia Ocupacional. Madri: Panamericana; 2001. P.153-8., não é fácil a seleção de atividades apropriadas e significativas, sendo necessária uma cuidadosa análise da atividade para adaptá-la a cada caso em particular, atuando com uma visão integral de sujeito.

Além destes aspectos, os achados mostram que ao vivenciarem o grupo, os alunos sentem que o desenvolver de um grupo perpassa o conteúdo teórico apreendido, além de que somente com a vivência é possível desenvolver uma postura de terapeuta junto aos familiares, a vê-los de maneira diferente e principalmente a se autoavaliarem. A ação de autoavaliação deve ser utilizada como contribuição para uma formação humanizada, com repercussões positivas no desenvolvimento profissional e pessoal1414 . Damas KCA, Munari DB, Siqueira KM. Cuidando do cuidador: reflexões sobre o aprendizado dessa habilidade. Rev Eletrônica Enferm. 2004;6(2):272-8..

Este achado corrobora com outro descrito na literatura1111 . Fernandes CNS, Andraus LMS, Munari DB. O aprendizado do cuidar da família das crianças hospitalizadas por meio de atividades grupais. Rev eletr. Enferm. 2006;8(1):1-17., em que alunos que coordenaram atividade grupal demonstraram mudanças nos sentimentos e posturas diante do grupo, como responsabilidade, evolução da insegurança para a segurança, sensibilidade, afetividade, autoconhecimento, além de maiores condições de entender a complexidade que envolve o cuidado com a família.

Os achados evidenciam a importância do acolhimento grupal na vida dos familiares, a vivência de condução dos grupos na formação dos graduandos, assim como a repercussão no processo terapêutico da criança em acompanhamento fonoaudiológico. Tais reflexos reiteram a colocação de que se a família não for considerada como parte integrante do processo, a terapêutica pode fracassar, visto que tanto ela quanto a pessoa sob seus cuidados necessitam de atendimento, constituindo-se, assim, em um núcleo de afetividade e de inclusão1212 . Domingues AR. Família e serviços de reabilitação: ressignificando essa relação. In: Rocha EF, organizadora. Reabilitação de pessoas com deficiência: a intervenção em discussão. São Paulo:Roca; 2006. P. 230-7..

Na percepção dos graduandos acerca da constituição do setting grupal, os familiares puderam conhecer melhor o trabalho desenvolvido com as crianças em terapia, refletir sobre as atividades em casa, de modo que as ações transpassem o espaço da clínica.

Os familiares trazem informações no grupo que leva o graduando a repensar sua prática terapêutica. Esta troca na atividade grupal gera reflexos positivos no processo terapêutico da criança, visto que na vivência do sujeito na sociedade e com os familiares, os aspectos de sua subjetividade estão intimamente relacionados com sua linguagem3. Penteado RZ, Panhoca I, Siqueira D, Romano FF, Lopes P. Grupalidade e família na clínica fonoaudiológica: deixando emergir a subjetividade. Distúrb Comun. 2005;17(2):161-71..

A importância em conduzir grupos, tendo em vista favorecer uma formação humanizada é abordada por vários autores, que discutem que o processo de formação profissional ainda é centrado no aprendizado técnico e individualizado, devendo existir uma reflexão quanto a este processo, com vistas a propostas de humanização em saúde, do favorecimento de profissionais críticos, criativos, sensiveis à construção de uma prática eficiente aos usuários e seus familiares1111 . Fernandes CNS, Andraus LMS, Munari DB. O aprendizado do cuidar da família das crianças hospitalizadas por meio de atividades grupais. Rev eletr. Enferm. 2006;8(1):1-17..

Os achados remetem a outro estudo acerca da vivência da grupalidade em estágio, que compartilham que os conhecimentos decorrentes das vivências com grupos repercutem na formação do profissional, pois os discentes desenvolvem melhores condições para lidarem mais atentamente com as necessidades e demandas coletivas dos diversos grupos sociais, fortalecendo- os como sujeitos sociais e cidadãos1515 . Penteado RZ, Fedosse E. Formação em Fonoaudiologia: organização de grupos de Estágios. Saúde Rev. 2007;9(21):49-56..

Os resultados corroboram ainda, outro trabalho com grupo de familiares. Segundo a autora, no atendimento grupal, o tempo do familiar antes dedicado à espera, possibilitou seu resgate como sujeito que tem projetos pessoais, sendo o papel assumido pelo terapeuta o de ouvir, olhar, facilitar aos participantes ocuparem um lugar ativo, sendo as atividades desenvolvidas importantes na sustentação do grupo1616 . Takatori M. Atenção às famílias de crianças com deficiência: A experiência do grupo de atividades. In: Rocha EF. Reabilitação de pessoas com deficiência. São Paulo: Roca; 2006. P.238-50.. Também foi observado o surgimento no grupo de aspectos das relações dos participantes com seus filhos, indicando modificações no processo de reabilitação, questões estas também discutidas no presente estudo.

Recentes estudos sobre grupos na Fonoaudiologia apontam que, a partir das experiências vivenciadas em diversos contextos e áreas de atuação (voz, aleitamento materno, linguagem escrita), o grupo se mostrou como importante instrumento terapêutico, resolvendo e/ou amenizando o impacto social dos distúrbios da comunicação1717 . Souza APR, Crestani AH, Vieira CR, Machado FCM, Pereira LL. O grupo na fonoaudiologia: Origens clínicas e na saúde coletiva. Rev CEFAC. 2011;13(1):140-51. 1818 . Santana MCCP, Goulart BNG, Chiari BM, Melo AM, Silva EHAA. Aleitamento materno em prematuros: atuação fonoaudiológica baseada nos pressupostos da educação para promoção da saúde. Ciênc. saúde coletiva. 2010;15(2):411-7. 1919 . Schneider ACB, Souza APR, Deuschle VP. Intervenção fonoaudiológica com gêneros textuais em um grupo de escolares. Rev CEFAC. 2010;12(2):337-445. 2020 . Penteado RZ, Stenico E, Ferrador FA, Anselmo NC, Silva PC, Pereira PFA et al. Vivência de voz com profissionais de um hospital: relato de experiência. Rev CEFAC. 2009;11(3):449-56. .

Do mesmo modo, os resultados aqui encontrados evidenciam que as atividades desenvolvidas no Grupo de Familiares, de acordo com as suas necessidades exibidas em cada encontro, constituíram-se em importante recurso no próprio grupo como também no processo terapêutico de seus filhos/crianças, além de favorecer a formação dos futuros fonoaudiólogos, preparados para desenvolver um setting terapêutico adequado à condução de grupos.

Neste estudo, a escolha, desenvolvimento e condução das atividades em grupo de familiares, discutido na interfaceentre a Fonoaudiologia e a Terapia Ocupacional, agregarm valores durante a formação, evidenciando que os graduandos demonstraram-se confiantes e preparados para conduzir grupos. Consequentemente, há favorecimento na formação de profissionais mais humanizados, conscientes ao escolherem atividades que atendam as necessidades de cada formação grupal, dando especial importância ao conhecimento de cada família na clinica fonoaudiológica. Os graduandos também ressaltaram a importância dos grupos nos processos terapêuticos das crianças em acompanhamento.

A abordagem de uma educação em saúde que considere os familiares, no processo de aprendizagem ainda na graduação é necessária para uma adequada formação em saúde, que inclui políticas públicas, ambientes apropriados e reorientação dos serviços de saúde para além dos tratamentos clínicos e curativos, assim como propostas pedagógicas libertadoras comprometidas com o desenvolvimento da solidariedade e da cidadania, abandonando estratégias comunicacionais informativas e a adoção de uma comunicação dialógica1818 . Santana MCCP, Goulart BNG, Chiari BM, Melo AM, Silva EHAA. Aleitamento materno em prematuros: atuação fonoaudiológica baseada nos pressupostos da educação para promoção da saúde. Ciênc. saúde coletiva. 2010;15(2):411-7..

Os resultados apresentados neste estudo reiteram a importância de que os Cursos de Graduação em Fonoaudiologia propiciem aos graduandos a formação em processos grupais, visto que a participação da família e o vínculo estabelecido são ferramentas fundamentais para o sucesso terapêutico em uma perspectiva de atenção integral e humanizada.

Conclusão

Os resultados mostram que na percepção dos alunos durante a condução dos grupos de familiares houve mudança de sentimentos frente à condução desses grupos, o desenvolvimento do olhar analítico, o conhecimento do setting terapêutico como espaço de reconstrução de sentidos e subjetividades, o significado das atividades escolhidas como recursos necessários para o alcance dos objetivos, a supervisão como um espaço esclarecedor de dúvidas, a autoavaliação da atuação na dinâmica grupal, e a contribuição de informações compartilhadas em grupo no processo terapêutico do sujeito em atendimento.

A escolha, desenvolvimento e condução das atividades em grupo de familiares, discutido na interface entre a Fonoaudiologia e a Terapia Ocupacional, agregam valores durante a formação e evidenciam a importância do processo grupal para o grupo estudado.

Considerar os familiares, por meio dos grupos, no processo de aprendizagem ainda na graduação pode contribuir para uma formação em uma perspectiva de atenção integral e humanizada.

Agradecimentos

Agradecemos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq - pelo financiamento desta pesquisa.

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  • Trabalho realizado no Curso de Graduação em Fonoaudiologia da FCM/UNICAMP, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, São Paulo, Brasil, com auxílio do Programa de Iniciação Científica - PIBIC, concedido pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2015
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