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Avaliação da capacidade cirúrgica do estado do Amazonas utilizando uma ferramenta de avaliação cirúrgica. Estudo transversal

RESUMO

Objetivo:

o Brasil é um país com cobertura universal de saúde, mas o acesso à cirurgia entre populações remotas permanece pouco estudado. Este estudo avalia a capacidade cirúrgica em hospitais que servem populações rurais no estado do Amazonas, Brasil, por meio de avaliações aprofundadas das instalações.

Métodos:

foi realizada avaliação estratificada randomizada transversal de hospitais que relataram prestar assistência cirúrgica de julho de 2016 a março de 2017. A Ferramenta de Avaliação Cirúrgica desenvolvida pela Organização Mundial da Saúde e o Programa de Cirurgia Global e Mudança Social da Harvard Medical School foi administrada em hospitais remotos, incluindo uma revisão retrospectiva de registros médicos e livros cirúrgicos.

Resultados:

18 hospitais foram pesquisados. Três hospitais (16,6%) não tinham salas cirúrgicas e 12 (66%) tinham 1-2. 14 hospitais (77,8%) relataram que a oximetria de pulso estava “sempre presente” e seis hospitais (33%) nunca têm um anestesiologista disponível. A anestesia inalatória estava disponível em 12 hospitais (66,7%), 77,8% não possuíam dispositivo de ventilação mecânica. Em média, 257 procedimentos por 100.000 foram realizados. 10 hospitais (55,6%) não possuem unidade de recuperação anestésica. Para as regiões de abrangência dos 18 hospitais, com população de 497.492 habitantes, a densidade média de força de trabalho cirúrgica, anestesista e obstétrica foi de 6,4.

Conclusão:

as populações que vivem em áreas rurais no Brasil enfrentam disparidades significativas no acesso à assistência cirúrgica, apesar da presença de cobertura universal de saúde. O desenvolvimento de um plano estadual de cirurgia é necessário para garantir acesso à assistência cirúrgica às populações rurais.

Palavras-chave:
Salas Cirúrgicas; Segurança; Indicadores de Qualidade em Assistência à Saúde; Indicadores Básicos de Saúde; Qualidade da Assistência à Saúde

ABSTRACT

Objective:

Brazil is a country with universal health coverage, yet access to surgery among remote rural populations remains understudied. This study assesses surgical care capacity among hospitals providing care for the rural populations in the Amazonas state of Brazil through in-depth facility assessments.

Methods:

a stratified randomized cross-sectional evaluation of hospitals that self-report providing surgical care in Amazonas was conducted from July 2016 to March 2017. The Surgical Assessment Tool (SAT) developed by the World Health Organization and the Program in Global Surgery and Social Change at Harvard Medical School was administered at remote hospitals, including a retrospective review of medical records and operative logbooks.

Results:

18 hospitals were surveyed. Three hospitals (16.6%) had no operating rooms and 12 (66%) had 1-2 operating rooms. 14 hospitals (77.8%) reported monitoring by pulse oximetry was always present and six hospitals (33%) never have a professional anesthesiologist available. Inhaled general anesthesia was available in 12 hospitals (66.7%), but 77.8% did not have any mechanical ventilation device. An average of 257 procedures per 100,000 were performed. 10 hospitals (55.6%) do not have a specific post-anesthesia care unit. For the regions covered by the 18 hospitals, with a population of 497,492 inhabitants, the average surgeon, anesthetist, obstetric workforce density was 6.4.

Conclusion:

populations living in rural areas in Brazil face significant disparities in access to surgical care, despite the presence of universal health coverage. Development of a state plan for the implementation of surgery is necessary to ensure access to surgical care for rural populations.

Keywords:
Surgery; Safety; Quality Indicators, Health Care; Quality of Health Care; Health Care Quality, Access and Evaluation

INTRODUÇÃO

Em 2015, a Organização Mundial da Saúde adotou a resolução 68.15, declarando a cirurgia uma parte essencial da cobertura universal de saúde e fundamental para melhorias equitativas na saúde e bem-estar globais11 Price R, Makasa E, Hollands M. World Health Assembly Resolution WHA68.15: "Strengthening Emergency and Essential Surgical Care and Anesthesia as a Component of Universal Health Coverage"-Addressing the Public Health Gaps Arising from Lack of Safe, Affordable and Accessible Surgical and Anesthetic Services. World J Surg. 2015;39(9):2115-25. doi: 10.1007/s00268-015-3153-y.
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. Isso reforçou a necessidade de acesso a cuidados cirúrgicos, anestésicos e obstétricos seguros Um passo crítico para melhorar o acesso aos cuidados cirúrgicos é a avaliação da capacidade do sistema cirúrgico em áreas rurais remotas, que apresentam desafios únicos em relação à prestação de cuidados cirúrgicos em todo o mundo para mais de cinco bilhões de pessoas22 Meara JG, Leather AJM, Hagander L, Alkire BC, Alonso N, Ameh EA, et al. Global Surgery 2030: evidence and solutions for achieving health, welfare, and economic development. Lancet. 2015;386(9993):569-624. doi: 10.1016/S0140-6736(15)60160-X.
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.

O Brasil é um país de renda média-alta, com uma população estimada de 205 milhões. Essa população está espalhada por regiões geograficamente diversas, mas concentrada no Centro-Oeste, Sul e Sudeste33 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. IBGE | Cidades@ | Amazonas | Panorama. Available from: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/am/panorama
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. Essa discrepância se reflete na distribuição de prestadores de serviços médicos, que se concentram nas principais cidades urbanas e capitais estaduais44 Scheffer M, Cassenote A, Guilloux AGA, Miotto BA, Mainardi GM. Demografia Médica no Brasil 2018. 2018. 286 p. Available from: www.portalmedico.org.br
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. Aproximadamente 66% dos médicos no Brasil atuam nas capitais dos estados5. O sistema de saúde brasileiro possui três setores. O setor público (Sistema Único de Saúde - SUS) é financiado pelo governo federal e administrado pelos governos estaduais. Todos os cidadãos brasileiros têm acesso gratuito a hospitais e serviços de saúde administrados pelo SUS. O setor privado é composto por hospitais que não são administrados pelo governo, nos quais os serviços são pagos diretamente pelo paciente ou cobertos por planos de seguro privado66 Paim J, Travassos C, Almeida C, Bahia L, MacInko J. The Brazilian health system: History, advances, and challenges. Lancet. 2011;377(9779):1778-97. doi: 10.1016/S0140-6736(11)60054-8.
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. O SUS brasileiro tem sido amplamente reconhecido como um exemplo de sucesso na reforma da saúde na América Latina e contribuiu para grandes melhorias no acesso aos serviços de saúde em todo o Brasil77 Atun R, de Andrade LOM, Almeida G, Cotlear D, Dmytraczenko T, Frenz P, et al. Health-system reform and universal health coverage in Latin America. Lancet. 2015;385(9974):1230-47. doi: 10.1016/S0140-6736(14)61646-9.
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,88 Barreto ML, Rasella D, Machado DB, Aquino R, Lima D, Garcia LP, et al. Monitoring and Evaluating Progress towards Universal Health Coverage in Brazil. PLoS Med. 2014;11(9):e1001692. doi: 10.1371/journal.pmed.1001692.
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. Apesar dessas melhorias, existem disparidades no acesso à saúde para as populações rurais no Brasil99 dos Santos NR. The Brazilian Unified Health System (SUS), State Public Policy: Its institutionalized and future development and the search for solutions. Cien Saude Colet. 2013;18(1):273-80. doi: 10.1590/s1413-81232013000100028.
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,1010 Gragnolati M, Lindelow M, Couttolenc B. Twenty Years of Health System Reform in Brazil. 2013. http://elibrary.worldbank.org/doi/book/10.1596/978-0-8213-9843-2. [cited Julho 2020].
http://elibrary.worldbank.org/doi/book/1...
.

A prestação de serviços de saúde no estado do Amazonas é complexa devido à geografia remota, onde cidades longínquas geralmente não têm acesso rodoviário à capital ou a outras cidades. Existe uma rede de hospitais primários em todo o estado para atendimento de urgência e emergência, mas todos os grandes centros de referência terciária estão localizados na capital Manaus. A prestação de cuidados cirúrgicos nesses hospitais primários remotos nunca foi avaliada.

Este estudo tem como objetivo fornecer uma avaliação transversal da capacidade de atendimento cirúrgico em hospitais que atendem populações remotas no estado do Amazonas, utilizando um instrumento de avaliação cirúrgica previamente validado.

MÉTODO

Tipo de estudo e identificação da amostra

Este estudo foi um estudo epidemiológico prospectivo, randomizado, transversal, de hospitais de todo o estado do Amazonas, Brasil, realizado de julho de 2016 a março de 2017.

Os dados do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS) foram revisados para identificar os hospitais do estado do Amazonas que relataram realizar procedimentos cirúrgicos. Foram incluídos neste estudo os hospitais que relataram realizar algum procedimento cirúrgico em 2015 no DATASUS. Qualquer hospital que não relatou um único procedimento cirúrgico em 2015 e todos os hospitais localizados na capital Manaus foram excluídos, pois nos detivemos apenas na capacidade entre as regiões rurais do estado do Amazonas e não a capital.

Ao todo, 53 hospitais preencheram os critérios de inclusão para este estudo e foram estratificados em quartis com base em sua população de abrangência. O primeiro quartil incluiu hospitais de 14 municípios e os demais quartis incluíram hospitais de 13 municípios cada. Cinco hospitais foram selecionados aleatoriamente de cada quartil. Foram selecionados 20 hospitais (Figura 1).

Figura 1
Distribuição dos municípios selecionados por quartis populacionais.

Medidas de resultado

Utilizamos a Ferramenta de Avaliação Cirúrgica (Surgical Assessment Tool - SAT)1111 IMPLEMENTATION TOOLS | lcogs. 2015. https://www.lancetglobalsurgery.org/implementation-tools. [cited Julho 2019].
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para realizar avaliações detalhadas das instalações. A SAT é uma versão modificada da Ferramenta de Avaliação Hospitalar, desenvolvida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como parte do kit de ferramentas de Gestão Integrada para Cuidados Cirúrgicos de Emergência e Essenciais (IMEESC). A ferramenta SAT inicial foi testada em Cabo Verde, Etiópia e Índia. Foi então ajustada e validada por 18 especialistas (consenso Delphi) e testada no Hospital Regional de Referência de Mbarara, no oeste de Uganda1212 Anderson GA, Ilcisin L, Abesiga L, Mayanja R, Portal Benetiz N, Ngonzi J, et al. Surgical volume and postoperative mortality rate at a referral hospital in Western Uganda: Measuring the Lancet Commission on Global Surgery indicators in low-resource settings. Surgery. 2017;161(6):1710-9. doi: 10.1016/j.surg.2017.01.009.
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. A SAT pode ser usada para avaliar a qualidade de um sistema cirúrgico em cinco domínios: infraestrutura, prestação de serviços, força de trabalho, gerenciamento de informações e financiamento. Ressalta-se que não avaliamos o domínio de financiamento, pois os cuidados prestados em todos os hospitais pesquisados eram cobertos pelo sistema nacional de saúde, sem custos de atendimento aos pacientes.

A maioria das questões da ferramenta apresentam-se em uma escala de Likert de seis pontos (sempre (100% das vezes), quase sempre (76-99% das vezes), na maioria das vezes (51-75% das vezes), às vezes (26-50% das vezes), raramente (1-25% das vezes) e nunca (nenhuma vez). As perguntas também quantificam o número de procedimentos cirúrgicos, fornecedores e recursos.

Coleta de dados

A SAT foi usada para realizar entrevistas com administradores hospitalares e provedores da linha de frente. Além disso, uma revisão retrospectiva de 30 dias dos prontuários médicos foi concluída. Todos os entrevistados eram adultos com mais de 18 anos de idade que assinaram um consentimento informado. Todas as entrevistas ocorreram no próprio hospital do entrevistado e foram conduzidas em português por um dos autores. Foram entrevistados administrador do hospital, cirurgiões, anestesiologistas, obstetras e enfermeiros da unidade cirúrgica. A coleta de dados foi realizada por meio de visitas in loco a cada hospital por pesquisadores do local da Universidade do Amazonas (JE, RVF, PHG, JC).

Avaliamos a validade interna do instrumento realizando uma revisita de dois hospitais selecionados aleatoriamente 30 dias depois e comparando os dados coletados para cada hospital. Dois hospitais (Manacapuru e Iranduba) foram selecionados aleatoriamente e revisitados 30 dias após o período inicial de coleta de dados para avaliar a validade interna do estudo. Realizamos também a avaliação das instalações. O segundo tempo e os dados entre as duas avaliações foram comparados para determinar se houve mudanças significativas nos dados relatados nos dois intervalos de tempo diferentes.

Considerações éticas

Este projeto foi realizado em parceria com o Boston Children’s Hospital, Universidade de São Paulo (USP) e Universidade do Estado do Amazonas (UEA). Aprovações de Comitês de Ética em Pesquisa foram obtidas na UEA (1.5225.514) e na USP (1.904.101). Este estudo foi determinado como isento de IRB pelo Boston Children’s Hospital.

Análise estatística

Realizamos estatísticas descritivas. As comparações foram feitas usando os testes exato de Fisher, qui-quadrado e a soma de postos de Wilcoxon, conforme apropriado. A análise foi realizada usando o programa estatístico IBM SPSS Statistics, Versão 21.

RESULTADOS

Dezoito dos 20 hospitais selecionados passaram por avaliação de instalações. Dois hospitais (Itamarati e Barcelos) foram selecionados para inclusão, mas acessíveis apenas por helicóptero particular e impossibilitados de realizar avaliação. Os demais hospitais eram acessíveis por estrada ou barco. Todos os 18 foram apontados como o único hospital público que atende a população daquela cidade e município circunvizinho e não foram identificados hospitais privados em nenhum dos municípios atendidos por esses hospitais. Os 18 hospitais visitados representavam municípios com uma população total de 497.492 habitantes, ou 25,71% da população amazonense (Tabela 1).

Tabela 1
População das cidades.

Infraestrutura

Em relação à disponibilidade de energia elétrica, seis (33,3%) hospitais relataram “quase sempre” ter energia elétrica e seis (33,3%) relataram “sempre” ter energia elétrica. Um hospital (5,6%) relatou apenas “às vezes” ter energia elétrica e um relatou não ter acesso a gerador. Cinco (27,8%) hospitais nunca precisaram usar gerador e seis (33,3%) raramente o utilizavam. O abastecimento de água estava sempre disponível em 14 (77,8%) hospitais e “quase sempre” em três (16,7%). O acesso à Internet esteve severamente limitado em municípios do interior do estado, sendo “sempre presente” em apenas três (16,7%) hospitais e “nunca presente” em nove (50%). Todos os hospitais relataram ter oxigênio fornecido por cilindros, exceto um hospital que recebe oxigênio por meio de encanamento (Figura 2).

Figura 2
Infraestrutura básica.

Um total combinado de 620 leitos estava disponível entre os 18 hospitais pesquisados, com uma média de 34 leitos por hospital (intervalo 4-102). Nenhum dos hospitais estudados possuía unidade de terapia intensiva (UTI). A maioria dos hospitais tinha 1-2 salas de cirurgia (Figura 3). Em três hospitais (16,7%), não foram encontradas salas cirúrgicas.

Figura 3
Disponibilidade de leitos e salas cirúrgicas.

Mais da metade dos hospitais (55,6%) não possuía unidade de recuperação pós-anestésica específica (URPA). Apenas um (5,6%) hospital possuía quatro leitos para cuidados pós-anestésicos e três (16,7%) possuíam dois leitos. Seis hospitais (33,3%) nunca tiveram um profissional anestesiologista disponível e apenas quatro (22,2%) relatam disponibilidade universal. Em 14 hospitais (77,8%), não havia enfermeiro na URPA. Sedativos, bloqueadores neuromusculares e antibióticos estavam “sempre disponíveis” na maioria dos hospitais (Figura 4).

Figura 4
Disponibilidade de Medicamentos.

Prestação de Serviço

Foram realizados 1.281 procedimentos nos 18 hospitais ao longo de seis meses. Isso incluiu 603 cesarianas, 49 laparotomias, 12 fraturas expostas e 617 cirurgias menores (por exemplo, excisão de lipomas ou cistos sebáceos, circuncisão). Nenhuma unidade utilizou a lista de verificação de segurança cirúrgica da OMS. Todos os hospitais relataram uma taxa de mortalidade perioperatória de zero. O monitoramento da oximetria de pulso esteve “sempre presente” em 13 (77,8%) dos hospitais. A anestesia geral inalatória esteve disponível em 12 (66,7%) instituições, mas a grande maioria dos hospitais não possuía dispositivos de ventilação mecânica (14, 77,8%). O acesso à raquianestesia esteve “sempre” presente em 14 (77,8%) dos hospitais.

Força de trabalho cirúrgica

Trinta e dois cirurgiões, anestesiologistas e obstetras (CAO), prestadores estiveram presentes na sede do hospital pelo menos uma vez por semana, resultando em uma força de trabalho cirúrgica de 6,4 CAO para cada 100.000 habitantes. No entanto, esses provedores não estavam disponíveis 24 horas por dia, sete dias por semana. Dezoito (56%) eram cirurgiões gerais, nove eram ginecologistas/obstetras (28%) e cinco eram anestesiologistas. Devido à falta de anestesiologistas, alguns cirurgiões realizavam anestesia para seus próprios procedimentos. Além disso, como alguns provedores não estavam disponíveis 24 horas por dia, sete dias por semana, profissionais médicos generalistas com diploma de bacharel em medicina às vezes realizavam procedimentos cirúrgicos quando nenhum cirurgião estava disponível. Provedores que estavam disponíveis pelo menos um dia por semana por hospital são mostrados na Figura 5. Provedores disponíveis 24 horas por dia são mostrados na Figura 6.

Figura 5
Médicos disponíveis pelo menos 1 dia da semana.

Figura 6
Médicos disponíveis 24h/dia.

Gerenciamento de informações

Cada instalação tinha uma pessoa designada responsável por armazenar e organizar os dados médicos; 14 (77,8%) ainda usavam prontuários em papel e seis (33,3%) sempre coletavam dados pós-operatórios, como infecções de sítio cirúrgico, complicações e mortalidade. Uma unidade (5,6%) enviava os dados semanalmente para o Ministério da Saúde, enquanto as demais enviavam seus dados mensalmente.

DISCUSSÃO

Apesar da presença de atenção universal à saúde, existem lacunas significativas no acesso à assistência cirúrgica para as populações rurais que estudamos devido a limitações significativas na capacidade cirúrgica e na força de trabalho no Amazonas. Embora hospitais remotos em toda a região ofereçam cirurgias de emergência e essenciais, nossos resultados mostram que poucos hospitais estão totalmente equipados para realizarem operações e são significativamente limitados pela falta de força de trabalho cirúrgica, obstétrica e anestésica.

A falta de força de trabalho CAO nos hospitais rurais é uma grande barreira ao acesso a cirurgias seguras e de alta qualidade 24 horas por dia, sete dias por semana. O número limitado da força de trabalho CAO reflete a distribuição de médicos no Amazonas, onde 4.844 médicos, 93%, trabalham apenas na capital. Isso significa que apenas 23 cirurgiões, 16 anestesiologistas e 22 obstetras cobrem os 18 municípios restantes do estado do Amazonas44 Scheffer M, Cassenote A, Guilloux AGA, Miotto BA, Mainardi GM. Demografia Médica no Brasil 2018. 2018. 286 p. Available from: www.portalmedico.org.br
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. A densidade de CAO nos hospitais estudados em nosso estudo é de 6,4 por 100.000, o que está bem abaixo da meta mínima recomendada, de 20-40 CAO, delineada na Lancet Commission on Global Surgery (LCoGS), e menor que a densidade nacional de CAO, de 34,7, e que a do estado do Amazonas, de 18,4222 Meara JG, Leather AJM, Hagander L, Alkire BC, Alonso N, Ameh EA, et al. Global Surgery 2030: evidence and solutions for achieving health, welfare, and economic development. Lancet. 2015;386(9993):569-624. doi: 10.1016/S0140-6736(15)60160-X.
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,1313 DATASUS - Informac¸o~es de Sau´de [Internet]. Ministério da Saúde. 2019. Available from: http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=02
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. Grande parte da força de trabalho CAO que trabalha em hospitais rurais presta serviços apenas em regime de meio período. No Brasil, mais de 70% dos médicos do setor público também atuam no setor privado1414 Scheffer M, et al. Demografia médica no Brasil 2015. Departamento de Medicina Preventiva, Faculdade de Medicina da USP. Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo. Conselho Federal de Medicina. 2015.. Nas áreas rurais, não é possível que os médicos trabalhem no setor privado para complementar sua renda e, portanto, os hospitais remotos contam com médicos que trabalham em períodos curtos de 10 a 15 dias.

Para o estado do Amazonas, encontramos baixos volumes de procedimentos cirúrgicos realizados em hospitais rurais com capacidade cirúrgica. Entre os hospitais que estudamos, apenas 1.281 cirurgias foram realizadas em 18 hospitais ao longo de seis meses. Isso equivale a uma média de 257 procedimentos por 100.000, o que é muito inferior à meta do indicador da LCoGS, de 5.000 operações por 100.000 pessoas22 Meara JG, Leather AJM, Hagander L, Alkire BC, Alonso N, Ameh EA, et al. Global Surgery 2030: evidence and solutions for achieving health, welfare, and economic development. Lancet. 2015;386(9993):569-624. doi: 10.1016/S0140-6736(15)60160-X.
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. As cesarianas, muitas vezes realizadas sob raquianestesia, foram o procedimento mais comumente realizado, provavelmente refletindo a falta de anestesistas para fornecer anestesia geral. O volume cirúrgico observado contrasta com a capital Manaus, onde foram realizados 84.795 procedimentos cirúrgicos no mesmo período, resultando em um volume de 4.037/100.000 pessoas1313 DATASUS - Informac¸o~es de Sau´de [Internet]. Ministério da Saúde. 2019. Available from: http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=02
http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index...
. Isso demonstra a dependência quase total da capital para o atendimento cirúrgico no estado.

No que diz respeito à infraestrutura básica, nossos resultados são melhores do que os encontrados em outros países de baixa e média renda (PBMRs), onde os hospitais distritais rotineiramente enfrentam falta de água, oxigênio e eletricidade1515 Hsia RY, Mbembati NA, MacFarlane S, Kruk ME. Access to emergency and surgical care in sub-Saharan Africa: The infrastructure gap. Health Policy Plan. 2012;27(3):234-44. doi: 10.1093/heapol/czr023.
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16 Lebrun DG, Chackungal S, Chao TE, Knowlton LM, Linden AF, Notrica MR, et al. Prioritizing essential surgery and safe anesthesia for the Post-2015 Development Agenda: Operative capacities of 78 district hospitals in 7 low- and middle-income countries. Surgery. 2014;155(3):365-73. doi: 10.1016/j.surg.2013.10.008.
https://doi.org/10.1016/j.surg.2013.10.0...
-1717 Albutt K, Punchak M, Kayima P, Namanya DB, Anderson GA, Shrime MG. Access to Safe, Timely, and Affordable Surgical Care in Uganda: A Stratified Randomized Evaluation of Nationwide Public Sector Surgical Capacity and Core Surgical Indicators. World J Surg. 2018;42(8):2303-13. doi: 10.1007/s00268-018-4485-1.
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. As limitações da infraestrutura primária resultam do baixo número de salas de cirurgia e da falta de unidades de terapia intensiva, que limitam a capacidade de realizar operações complexas de emergência1818 MacLeod JBA, Kirton OC, Maerz LL. Surgical intensivist and global critical care: Is there a role? Trauma Surg Acute Care Open. 2016;1(1):e000058. doi: 10.1136/tsaco-2016-000058.
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.

O Brasil oferece cobertura universal de saúde (CUS) por meio de mandato federal, que visa fornecer assistência gratuita e de alta qualidade a todos os brasileiros, independentemente da capacidade de pagamento, o que tem sido reconhecido como uma forma de alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas1919 Wu H, Clark H. The sustainable development goals: 17 goals to transform our world. In: Furthering the Work of the United Nations. 2016.. As populações rurais no Brasil dependem do sistema público para atendimento cirúrgico, pois apenas 13% da população do Amazonas é coberta por planos de saúde privados e 97,7% dessa população reside na capital Manaus2020 Dados e Indicadores do setor - ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar. 2020. Available from: http://www.ans.gov.br/perfil-do-setor/dados-e-indicadores-do-setor
http://www.ans.gov.br/perfil-do-setor/da...
. Apesar da presença da cobertura universal de saúde para populações rurais no Brasil, ainda existem barreiras significativas para o acesso ao atendimento cirúrgico, especialmente para pacientes do interior que não têm o luxo de serem transportados para a capital.

A otimização da prestação de cuidados cirúrgicos para o estado do Amazonas exigirá investimentos em infraestrutura e planejamento de políticas para melhorar os mecanismos de triagem e transferência. Os Planos Nacionais de Cirurgia Obstétrica e Anestesia (PNCOAS) foram desenvolvidos na África com o objetivo de fornecer cuidados cirúrgicos universais para todos. Os países adotaram diferentes modelos de formulação de PNCOA, como o modelo centralizado adotado pela Zâmbia e Tanzânia e o modelo descentralizado adotado pelo Paquistão2121 Saluja S, Silverstein A, Mukhopadhyay S, Lin Y, Raykar N, Keshavjee S, et al. Using the consolidated framework for implementation research to implement and evaluate national surgical planning. BMJ Glob Health. 2017;2(2):e000269. doi: 10.1136/bmjgh-2016-000269.
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. Até o momento, os PNCOAS não foram adotados na América Latina2222 Peck G, Roa L, Barthélemy E, South S, Foianini J, Ferreira R, et al. Improving global emergency and essential surgical care in Latin America and the Caribbean: A collaborative approach. The Bulletin. 2019;104(3):24-39.. Planos cirúrgicos regionais seguindo a estrutura do PNCOA podem ser um caminho para melhorar a assistência cirúrgica subnacional em regiões que têm planos nacionais de saúde fortes, mas carecem de esforços coordenados focados na melhoria da assistência cirúrgica. Isso poderia ser modelado de forma semelhante à abordagem do Paquistão, onde cada estado está desenvolvendo um Plano Estadual de Cirurgia, Obstetrícia e Anestesia2323 Truché P, Shoman H, Reddy CL, Jumbam DT, Ashby J, Mazhiqi A, et al. Globalization of national surgical, obstetric and anesthesia plans: The critical link between health policy and action in global surgery. Global Health. 2020;16(1):1. doi: 10.1186/s12992-019-0531-5.
https://doi.org/10.1186/s12992-019-0531-...
.

Limitações

O estudo é limitado ao setor público de hospitais do Amazonas, porém não identificamos hospitais privados em nenhum município do entorno dos hospitais selecionados aleatoriamente pesquisados. Devido ao desenho do nosso estudo, não foi possível avaliar onde pode haver sobreposições de populações ou situações em que os pacientes podem desconsiderar instalações locais e procurar atendimento diretamente na capital. Devido a limitações logísticas e financeiras, dois dos hospitais aleatoriamente identificados não puderam ser avaliados. Embora tenhamos implementado avaliações detalhadas das instalações, muitas respostas são baseadas em informações administrativas ou do cirurgião-chefe e estão sujeitas a possíveis vieses desses entrevistados.

CONCLUSÃO

Embora o Brasil tenha um sistema nacional de saúde forte e financiado pelo governo federal, o acesso a cuidados cirúrgicos em áreas remotas continua limitado. A prestação de cuidados cirúrgicos em hospitais do interior com capacidade cirúrgica não reflete a capacidade cirúrgica do estado como um todo, que depende dos hospitais da capital para fornecer a maioria dos cuidados cirúrgicos. O aumento do investimento em infraestrutura para atendimento cirúrgico nesses hospitais rurais, aliado ao desenvolvimento de um plano estadual para a implementação de cirurgia e triagem cirúrgica, é necessário para garantir assistência cirúrgica segura, oportuna e acessível para a população do Amazonas fora de Manaus.

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  • Fonte de financiamento:

    nenhuma.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Set 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    17 Maio 2022
  • Aceito
    14 Jun 2022
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