O antígeno carboidrato CA 19-9 poderia ser um biomarcador útil no diagnóstico, prognóstico e acompanhamento da obstrução baixa do trato urinário?

RESUMO

Introdução:

a válvula de uretra posterior representa uma importante causa de doença renal crônica na infância. A identificação de biomarcadores que monitorem danos renais precoces e o sucesso da desobstrução do trato urinário podem reduzir o número de pacientes que evoluem para insuficiência renal.

Objetivo:

avaliar o desempenho do biomarcador antígeno carboidrato CA 19-9 nas obstruções parciais do trato urinário.

Método:

46 ratas Wistar foram divididas em 5 grupos: grupo controle; grupo OIV: obstrução infravesical; grupo OIVd: obstrução infravesical com alívio da obstrução após 7 dias; grupo OUu: obstrução ureteral unilateral; grupo OUb: obstrução ureteral bilateral. O desempenho do CA 19-9 foi comparado a outro biomarcador, a Ngal. A dosagem de CA 19-9 e Ngal na urina e no sangue, e os níveis de creatinina sérica foram avaliados nas ratas antes da cirurgia (T0) e após 14 dias (T1). O grupo OIVd foi submetido a uma coleta intermediária (Ti).

Resultados:

a concentração urinária de CA19-9 aumentou nos grupos OIV, OIVd e OUb; a elevação em T1 e Ti alcançou significância estatística em relação ao valor de T0 (p<0,05). As alterações no CA 19-9 urinário foram mais expressivas nos grupos de obstrução infravesical (AUC 0,81). O alívio da obstrução no grupo OIVd promoveu redução do CA 19-9 urinário (p<0,05).

Conclusões:

a concentração urinária de CA19-9 aumentou na obstrução parcial do trato urinário. Seu melhor desempenho foi no grupo de obstrução infravesical, no qual a elevação foi detectada precocemente (6 dias de pós-operatório) com queda após a retirada do fator obstrutivo.

Palavras-chave:
Antígeno CA 19-9; Lipocalina-2; Obstrução do Colo da Bexiga Urinária

ABSTRACT

Introduction:

posterior urethral valves represent an important cause of childhood chronic kidney disease. The identification of biomarkers that indicate early kidney damage and even adequate clearance could reduce how many patients head towards kidney failure.

Objective:

this study evaluated how this easy-analysis biomarker (CA 19-9) could help identifying potential renal damage and adequate clearance in obstructive uropathies.

Methods:

46 female Wistar rats were divided into 5 groups, with different patterns of partial urinary tract obstruction: group control; group OIV: infravesical obstruction; group OIVd: infravesical obstruction with reversion, obstruction relief 7 postoperative days later; group OUu: unilateral ureteral obstruction; group OUb: bilateral ureteral obstruction. The CA 19-9s performance was compared to another biomarker: Ngal. Determination of basal CA 19-9 and Ngal in urine and blood and serum creatinine levels was performed in the rats prior to surgery (T0) and after 14 days (T1). Group OIVd underwent intermediate (Ti) collection before clearance.

Results:

the urinary concentration of CA 19-9 increased in groups OIV, OIVd and OUb; elevation at T1 and Ti, reached statistical significance compared to the T0 value (p<0,05). Changes in urinary CA 19-9 were more expressive in infravesical obstruction groups (AUC 0.81). Obstruction relief in group OIVd promoted significant urinary CA 19-9 reduction (p<0,05) in the final evaluation.

Conclusions:

CA 19-9 urinary concentration increased in partial urinary tract obstruction. Its best performance was in the bladder neck obstruction group, in which the elevation was detected early (6 days after infravesical obstruction) and the CA19-9 urinary concentration declined after clearance.

Keywords:
CA 19-9 Antigen; Lipocalin-2; Urinary Bladder Neck Obstruction

INTRODUÇÃO

As obstruções congênitas do trato urinário inferior (lower urinary tract obstruction - LUTO) e a bexiga neurogênica, resultante de defeitos do tubo neural, são doenças que causam obstrução do fluxo urinário e podem evoluir para nefropatia obstrutiva (NO) e doença renal crônica (DRC)¹. A válvula de uretra posterior (VUP) é a principal etiologia da LUTO².

O primeiro sinal ultrassonográfico de LUTO é a distensão da bexiga fetal (megacistis), diagnosticada a partir de 11 semanas de vida intrauterina, outros achados incluem a uretero-hidronefrose bilateral, bexiga espessada e uretra posterior dilatada, esses últimos dois sinais correlacionam-se fortemente com a VUP, juntos compõem o Sinal do Buraco de Fechadura³. As anormalidades do parênquima renal, identificadas na ultrassonografia, como: aumento da ecogenicidade, presença de estruturas císticas e afilamento, sugerem maior gravidade na LUTO, principalmente quando associadas ao oligoâmnio⁴.

As principais preocupações com a LUTO estão relacionadas ao melhor momento da intervenção cirúrgica, se pré-natal ou pós-natal, e à previsão de progressão para DRC⁵. Nesse sentido, os biomarcadores podem auxiliar na tomada de decisões e melhorar o prognóstico dos pacientes. O antígeno carboidrato CA 19-9 é um marcador de fácil coleta e dosagem laboratorial bem padronizada e, na literatura, tem-se mostrado promissor como marcador de gravidade em obstruções ureterais principalmente relacionados à Estenose da Junção Ureteropiélica (EJUP)⁶, mas ainda pouco estudado nas obstruções infravesicais.

Este estudo de intervenção em modelo experimental foi desenhado para comparar valores urinários e séricos do CA 19-9 em obstruções urinárias parciais altas e baixas, e seu comportamento após desobstrução infravesical. Um segundo marcador, a Lipocalina associada à gelatinase de neutrófilos (Ngal), relacionado à lesão renal e utilizado na monitorização da insuficiência renal aguda⁷, foi utilizado como comparador ao CA 19-9.

MATERIAL E MÉTODOS

Os protocolos experimentais foram aprovados pelo Comitê de Ética Animal (CEUA UNINOVE nº 6575031019) e realizados de acordo com as diretrizes institucionais.

Um total de 46 ratas Wistar adultas (230-270 g) foram divididas em 5 grupos diferentes: grupo controle (9 animais) - abertura e fechamento da parede abdominal; grupo OIV (9 animais) - obstrução infravesical parcial por 14 dias; grupo OIVd (10 animais) - obstrução parcial infravesical por 7 dias e depois desobstrução, com eutanásia 14 dias após a primeira cirurgia; grupo OUu (9 animais) - obstrução ureteral parcial, alta e unilateral à direita por 14 dias; grupo OUb (9 animais) - obstrução ureteral parcial, alta e bilateral por 14 dias.

Os procedimentos cirúrgicos foram os seguintes: após anestesia do animal, a obstrução infravesical (OIV) foi realizada após laparotomia mediana longitudinal inferior e exposição cuidadosa da bexiga até o colo vesical com visualização da junção ureterovesical e uretra. Um fio de náilon 5-0 foi passado posteriormente à bexiga, sobre um cateter intravenoso 20G (1,1×32mm) e amarrado na superfície anterior da região infravesical. Em seguida, o cateter foi retirado e verificamos a oclusão parcial da bexiga com sua compressão e a saída de urina pela uretra.

Para o grupo OIVd a obstrução foi realizada conforme descrito acima, mas uma alça do fio de náilon utilizado para promover a obstrução foi mantida presa ao tecido subcutâneo para facilitar sua identificação. No 7º dia de pós-operatório, esse fio de náilon foi removido, por laparotomia inferior, para promover alívio da obstrução infravesical.

A obstrução ureteral parcial seguiu o modelo proposto por ULM e MILLER (1962) modificado por outros autores^8-11. Após laparotomia mediana, identificamos o rim, ureter e músculo psoas. Em seguida, envolvemos o ureter direito logo abaixo da veia lombar inferior pela sutura simples do músculo psoas com fio de prolene 5-0, sobre um cateter venoso 20G, causando obstrução ureteral parcial. O mesmo procedimento foi adotado no ureter esquerdo em animais submetidos a obstrução bilateral.

Os experimentos foram realizados de acordo com o seguinte protocolo: Dia 0: os animais foram alojados em gaiolas metabólicas para coleta de urina para dosagem de CA 19-9 e Ngal; Dia 1: os animais foram anestesiados, uma amostra de sangue foi coletada para dosagem de CA 19-9, Ngal e creatinina, e os procedimentos cirúrgicos foram realizados de acordo com o grupo de alocação do animal; Dia 13: os animais foram novamente alojados em gaiolas metabólicas para coleta de urina para dosagem de CA 19-9 e Ngal; Dia 14: os animais foram anestesiados para coleta de sangue para dosagem de CA 19-9, Ngal e creatinina; em seguida, foram submetidos à eutanásia e remoção cirúrgica de todo o trato urinário. Após a exérese do trato urinário, os rins foram pesados (gramas) e medidos longitudinalmente (milímetros). A bexiga também foi pesada e medida do colo até a cúpula (milímetros).

Os animais alocados no grupo OIVd tiveram uma etapa extra. Esses animais no Dia 6 foram alojados em gaiolas metabólicas para coleta de urina para dosagem de CA 19-9 e Ngal; no Dia 7, foram anestesiados e submetidos à laparotomia para alívio da obstrução e coleta de sangue para CA 19-9, dosagem de Ngal e creatinina.

As comparações dos marcadores séricos e urinários foram realizadas no tempo inicial ou basal (tempo 0 ou T0) e no dia 14 (tempo 1 ou T1), e um valor intermediário (Ti), antes (urina) e durante (sangue) o alívio da obstrução, foi realizado para o grupo OIVd.

Realizamos um estudo imuno-histoquímico, utilizando o anticorpo primário CA 19-9 (clone: 1116-NS-19-9, Dako Corporation AS, Califórnia, EUA), em 29 rins e 13 bexigas para demonstrar a expressão de CA 19-9 e seu local de produção .

A análise estatística foi realizada utilizando o pacote de software SPSS versão 26.0 (IBM SPSS Inc., Chicago, IL) e GraphPad Prism 9.2.0 (Califórnia, EUA). A distribuição dos dados e a avaliação da normalidade foram realizadas por meio do teste de Shapiro-Wilk. A análise descritiva das variáveis quantitativas com dados paramétricos foi realizada com média e desvio padrão e comparada pelo teste t de Student. Quando foi incluída a avaliação de mais de duas amostras, utilizou-se o teste de variância ANOVA com pós-teste de Bonferroni. Os dados não paramétricos foram descritos como mediana e intervalo interquartil e tratados com o teste de Mann Whitney ao comparar dois grupos ou o teste de Kruskal-Wallis ao analisar mais de dois grupos com pós-teste de Dunnett. O teste de Wilcoxon foi utilizado para determinar a diferença dos parâmetros pré e pós-operatórios. As curvas Características de Operação do Receptor, curvas ROC, foram desenhadas com o objetivo de avaliar as propriedades diagnósticas dos biomarcadores nos grupos estudados nos quais, houve significância na elevação e/ou na queda dos níveis dentro do mesmo grupo. A determinação do valor de corte foi realizada com o índice de Younden¹².

A área sob a curva (AUC) foi considerada satisfatória acima de 0,70. Valores de p menor que 0,05 (p<0,05) foram considerados significativos.

O número de animais necessário para cada grupo foi calculado pelo programa G-power 3.1.9ª (Statistical Power Analyses for Windows and Mac encontrado no site http://www.gpower.hhu.de/) e método estatístico ANOVA, para intervalo de confiança de 80% e erro alfa de 5%.

RESULTADOS

Na avaliação macroscópica do trato urinário foram consideradas as seguintes medidas: tamanho longitudinal do rim, distância entre colo vesical e cúpula vesical, espessura do parênquima renal e detrusor e peso dos rins e bexiga. Os resultados para os grupos são mostrados na Tabela 1.

Tabela 1
Valores médios da anatomia macroscópica dos grupos obstruídos em comparação com as medidas encontradas no grupo controle.

Grupos	Tamanho longitudinal (mm)				Peso (g)		Parênquima (mm)		Detrusor (mm)
	RD	RE	B	RD	RE	B	RD	RE	B
Controle	16,2±1,3	15,5±1,7	9,7±2,1	1,1±0,1	1,1±0,1	1,1±0,1	4,2±1,0	3,8±0,8	0,8±0,3
OIV	17,5±3,2	17,5±2,1	18,1±7,2*	1,2±0,2	1,1±0,1	0,8±0,7*	4,7±1,1	3,2±0,5	1,4±1,6
OIVd	17,8±2,2	17,2±1,8	14,1±3,6*	1,1±0,8	1,1±0,1	0,3±0,2*	4,2±1,1	4,8±1,3	0,9±0,5
OUu	19,3±2,9*	-	-	1,3±0,1*	-	-	5,1±1,5	-	-
OUb	18,5±2,2*	18,6±2,2*	-	1,1±0,1	1,1±0,2*	-	4,3±1,0	4,0±0,6	-

• Legenda: OIV: obstrução infravesical; OIVd: obstrução infravesical seguida por desobstrução; OUu: obstrução ureteral unilateral; OUb: obstrução ureteral bilateral; RD: rim direito; RE: rim esquerdo; B: bexiga; g: gramas; mm: milímetros; *p<0,05.

No grupo OIV, observamos no momento da laparotomia para eutanásia, a dilatação de todo trato urinário, mas as alterações mais evidentes em relação ao grupo controle foram o tamanho (p<0,05) e peso (p<0,05) da bexiga. No grupo OIVd, mesmo com menor tempo de obstrução infravesical (7 dias), seguido por desobstrução, o tamanho e o peso vesical foram significantemente maiores quando comparado ao grupo controle (p<0,05, para ambos, tamanho e peso). No grupo com OUu, o peso e o tamanho do rim direito foram significativamente maiores que do grupo controle (p<0,05). Enquanto na OUb, o tamanho renal foi maior que o controle tanto a direita como a esquerda (p<0,05), e o peso foi significativamente maior à esquerda (p<0,05).

A Figura 1A apresenta a distribuição dos valores urinários de CA 19-9 (uCA 19-9) para todos os grupos. Observamos elevação, após obstrução, dos valores urinários do CA 19-9 em todos os grupos, com significância estatística no aumento do CA 19-9 entre T0 e T1 nos grupos OIV e OUb (p<0,05). As curvas ROC desses grupos são mostradas na Figura 2.

Figura 1
(A) Comparação das concentrações urinárias de CA19-9, iniciais (0) e após o procedimento cirúrgico (1 e i) nos grupos: Controle, Obstrução Infravesical (OIV) e Obstrução Infravesical seguida de desobstrução (OIVd) analisados com teste de Wilcoxon. Os grupos Obstrução Ureteral unilateral (OUu) e Obstrução Ureteral bilateral (OUb) foram avaliados com o teste t para amostras pareadas. (B) comparação das concentrações urinárias de CA 19-9, inicial (0), intermediário (i) e após a desobstrução (1) no grupo OIVd utilizando o teste de Wilcoxon.

Figura 2
Curvas ROC determinadas pela elevação da concentração do CA19-9 urinário após a obstrução nos grupos: OIV [AUC de 0,81 (95% do intervalo de confiança de 0,61 a 1) e valor de corte de 2,67 IU/mL]; OUb [AUC de 0,77 (95% de IC 0,54 a 1) e valor de corte de 3,68 IU/mL]; OIVd [AUC de 0,71 (95% IC 0,47 a 0,94) e valor de corte de 2,79 IU/mL]. No grupo OIVd queda, a curva ROC demonstra a diminuição dos níveis de CA 19-9 urinário após a desobstrução [AUC de 0,73 (95% de IC 0,50 a 0,95) e valor de corte de 2,53 IU/mL].

No grupo OIVd, houve aumento significativo da uCA 19-9 entre T0 e Ti (p<0,05), e após a retirada da obstrução do trato urinário observou-se diminuição, entre Ti e T1 (p<0,05) (Figura 1B). A curva ROC relativa a queda de uCA 19-9 após a desobstrução é mostrada na Figura 2.

Os valores do marcador urinário Ngal (uNgal) foram comparados entre os animais do mesmo grupo nos tempos já descritos. Observamos aumento do valor de uNgal nos grupos OIV, OIVd e OUb, com significância estatística apenas no grupo OIV (p<0,05). Também houve queda desse marcador após a desobstrução no grupo OIVd, mas não foi significativa. (Figura 3).

Figura 3
(A) Comparação das concentrações urinárias de Ngal, inicial (0) e após o procedimento cirúrgico (1 e i), em cada grupo (método estatístico: teste t para amostras pareadas). (B) Curva ROC determinada pela elevação da concentração urinária da Ngal do grupo OIV [AUC de 0,72 (95% intervalo de confiança 0,48 a 0,96) e valor de corte de 1101,68 pg/mL].

Não houve alterações significativas nos níveis séricos de CA 19-9 e Ngal. Também não foi observado aumento significativo da creatinina sérica nos grupos submetidos à obstrução do trato urinário.

A imunoexpressão foi classificada como positiva ou negativa para o CA 19-9; assim, a positividade nos rins variou de 62,5% no grupo OUb, 83,3% no grupo controle, 87,5% no grupo OIV e 100% nos grupos OIVd e OUu. A positividade na bexiga foi de 50% no grupo OIVd, 75% grupo OUb e 100% nos grupos controle e OIV (Figura 4).

Figura 4
Imuno-histoquímica de túbulo renal e bexiga. (A) expressão do CA19-9 (cor amarronzada) nas células tubulares renais (aumento de100X) e (B) na lâmina própria vesical (aumento de 40X).

DISCUSSÃO

Modelos experimentais de obstrução do trato urinário (OTU) têm permitido um melhor entendimento da patogênese da nefropatia obstrutiva, pois permitem o controle do tempo, gravidade das lesões renais e uniformidade nas alterações estruturais sem a interferência de fatores de confusão como comorbidades ou toxinas, além de possibilitar a remoção da causa inicial (obstrução) em diferentes intervalos de tempo¹³.

Encontramos evidências, no trato urinário, de alterações macroscópicas secundárias à obstrução ao fluxo de urina, caracterizadas por distensão vesical e uretero-hidronefrose, além de maior tamanho e peso da bexiga nos animais do grupo OIV e grupo OIVd em relação ao grupo controle. O peso e o tamanho renal das ratas com obstrução ureteral também foram significativamente maiores em relação ao grupo controle. Assim, demonstrou-se a eficácia dos modelos experimentais empregados. Parâmetros semelhantes foram utilizados, na literatura, na descrição da eficiência da obstrução experimental do colo vesical em ratos¹⁴.

Uma melhor compreensão do mecanismo de lesão renal em OTU indica que biomarcadores liberados pelo alongamento epitelial tubular podem fornecer informações valiosas sobre a lesão obstrutiva durante a infância^15,16. Através de uma revisão da literatura sobre marcadores em OTU, evidenciamos a expressão imuno-histoquímica do biomarcador CA 19-9, originalmente um marcador para neoplasias, no citoplasma de células tubulares renais e sua elevação sérica e/ou urinária foi descrita em pacientes com obstrução ureteropélvica (UPO)^17-19 sem doenças malignas associadas.

Poucos estudos investigaram a possível correlação entre CA 19-9 e LUTO. Um estudo mediu os níveis de CA 19-9 urinário em gestantes com fetos com VUP e identificou um aumento significativo em relação às gestantes controle, que foi relacionado a um maior diâmetro anteroposterior da pelve renal fetal²⁰.

Neste trabalho, o aumento dos valores de CA 19-9 urinário nos grupos submetidos à obstrução infravesical foi mais expressivo quando comparado às obstruções ureterais, como pode ser observado no gráfico da Figura 1.

As curvas ROC indicaram eficácia na elevação do uCA 19-9. Nos grupos OIV, OIVd e OUb a AUC foi de 0,81, 0,71 e 0,77, respectivamente, e de 0,73 no grupo OIVd para queda após desobstrução. O valor de uCA 19-9 no grupo OIVd foi capaz de identificar significância e eficácia na elevação inicial, após 6 dias de obstrução, mostrando-se importante como marcador de precocidade. Nesse mesmo grupo, houve declínio da concentração urinária de CA 19-9 após o alívio da obstrução, o que pode ser importante para o acompanhamento clínico e/ou pós-operatório de LUTOs.

A simulação de EJUP unilateral (grupo OUu), apesar do aumento dos valores de CA19-9, não apresentou diferença estatisticamente significante. Assim, pode-se ponderar que a obstrução bilateral, por ser mais grave, provoca maior aumento dos valores urinários de CA 19-9.

Na análise imuno-histoquímica dos tecidos do trato urinário, identificamos a presença de CA 19-9 em bexigas de ratas controle e dos grupos obstruídos. Assim, se considerarmos a bexiga como provável local de produção de CA 19-9, além dos já conhecidos túbulos renais e mucosa da pelve renal, podemos explicar a boa sensibilidade deste marcador nas obstruções vesicais observadas neste estudo.

Na avaliação da uNgal como marcador comparativo, observamos seu aumento após o procedimento de obstrução do trato urinário, com significância apenas no grupo OIV. A diminuição da uNgal após a desobstrução do grupo OIVd também não foi significativa. As concentrações urinárias do CA 19-9 elevaram-se significativamente em 3 dos 4 grupos obstruídos e sua queda também foi expressiva com a desobstrução, demonstrando, neste estudo, um melhor desempenho quando comparado a uNgal.

As dosagens séricas de marcadores apresentam resultados conflitantes na literatura, pois o CA 19-9 sérico tem sido descrito como significativamente elevado na OTU; porém, não foi alterada no sangue de pacientes com hidronefrose em diversos estudos^21,22. Nossos resultados não identificaram diferenças nos valores sanguíneos de CA 19-9 e Ngal, antes e após a obstrução, entre os diferentes grupos e na avaliação com o grupo controle.

CONCLUSÕES

Neste estudo, pode-se concluir que o desempenho do CA 19-9 urinário como marcador foi superior nas obstruções uretrais e ureterais bilaterais. A elevação urinária de CA 19-9 foi evidenciada precocemente, com seis dias de obstrução infravesical. Houve um declínio na concentração urinária de CA 19-9 após a desobstrução, o que pode ser importante para o acompanhamento clínico e/ou pós-operatório de LUTOs.

A facilidade de uso do uCA 19-9 e os resultados observados neste trabalho indicam a importância de estudos prospectivos em humanos na investigação deste biomarcador como ferramenta auxiliar na tomada de decisão para conduta expectante ou para intervenção cirúrgica precoce em OTUs; contribuir para a definição do sucesso ou não do alívio da obstrução ou como critério na indicação de intervenções fetais na presença de OTU congênita.

REFERENCES

• ¹
  Ingraham SE, Mchugh KM. Current perspectives on congenital obstructive nephropathy. Pediatr Nephrol. 2011;26(9):1453-61. doi: 10.1007/s00467-011-1799-8.
  » https://doi.org/10.1007/s00467-011-1799-8
• ²
  Malin G, Tonks AM, Morris RK, Gardosi J, Kilby MD. Congenital lower urinary tract obstruction: a population-based epidemiological study. BJOG. 2012;119(12):1455-64. doi: 10.1111/j.1471-0528.2012.03476.x.
  » https://doi.org/10.1111/j.1471-0528.2012.03476.x
• ³
  Dias T, Sairam S, Kumarasiri S. Ultrasound diagnosis of fetal renal abnormalities. Best Pract Res Clin Obstet Gynaecol. 2014;28(3):403-15. doi: 10.1016/j.bpobgyn.2014.01.009.
  » https://doi.org/10.1016/j.bpobgyn.2014.01.009
• ⁴
  Ruano R, Dunn T, Braun MC, Angelo JR, Safdar A. Lower urinary tract obstruction: fetal intervention based on prenatal staging. Pediatr Nephrol. 2017 Oct;32(10):1871-1878. doi: 10.1007/s00467-017-3593-8.
  » https://doi.org/10.1007/s00467-017-3593-8
• ⁵
  Chevalier RL. Congenital urinary tract obstruction: the long view. Adv Chronic Kidney Dis. 2015;22(4):312-9. doi: 10.1053/j.ackd.2015.01.012.
  » https://doi.org/10.1053/j.ackd.2015.01.012
• ⁶
  Nabavizadeh B, Khorramirouz R, AminI E, Pishgar F, Hojjat A, Kajbafzadeh AM. Value of urinary carbohydrate antigen 19-9 to predict failure of conservative management in children with ureteropelvic junction obstruction. J Pediatr Surg. 2019;54(8):1650-1653. doi: 10.1016/j.jpedsurg.2018.09.007.
  » https://doi.org/10.1016/j.jpedsurg.2018.09.007
• ⁷
  Noyan, A; Parmaksis, G; Dursun, H;Ezer, SS; ANarat, R; Cengiz, N. Urinary NGAL, KIM-1 and L-FABP concentrations in antenatal hydronephrosis. J Pediatr Urol. 2015;11(5):249.e1-6. doi: 10.1016/j.jpurol.2015.02.021.
  » https://doi.org/10.1016/j.jpurol.2015.02.021
• ⁸
  Ulm AH, Miller F. An operation to produce experimental reversible hydronephrosis in dogs. J Urol. 1962;88:337-41. doi: 10.1016/s0022-5347(17)64796-7.
  » https://doi.org/10.1016/s0022-5347(17)64796-7
• ⁹
  Josephson S. Experimental Obstructive Hydronephrosis in Newborn Rats: III. Long-Term Effects on Renal Function. J Urol. 1983;129(2):396-400. doi: 10.1016/s0022-5347(17)52125-4.
  » https://doi.org/10.1016/s0022-5347(17)52125-4
• ¹⁰
  Stenberg A, Olsen L, Engstrand U, Persson AEG. Pressure and flow measurements in the partially obstructed ureter of the rat. Scand J Urol Nephrol. 1988;22(4):279-88. doi: 10.3109/00365598809180800.
  » https://doi.org/10.3109/00365598809180800
• ¹¹
  Thornhill BA, Forbes MS, Marcinko ES, Chevalier RL. Glomerotubular disconnection in neonatal mice after relief of partial ureteral obstruction. Kidney Int. 2007;72(9):1103-12. doi: 10.1038/sj.ki.5002512
  » https://doi.org/10.1038/sj.ki.5002512
• ¹²
  Youden WJ. Index for rating diagnostic tests. Cancer. 1950;3(1):32-5. doi: 10.1002/1097-0142(1950)3:1<32::aid-cncr2820030106>3.0.co;2-3.
  » https://doi.org/10.1002/1097-0142(1950)3:1<32::aid-cncr2820030106>3.0.co;2-3
• ¹³
  Chevalier RL, Peters CA. Obstructive Uropathy. Pediatric Nephrology, Sixth Edition, p 1337-1377, 2009.
• ¹⁴
  Tucci SR, Molina CAF, Cassini MF, Andrade MF, LIMA GJ, Martins ACP. Chronic partial urethral obstruction in female rats: description of an experimental model and initial results. Acta Cir Bras. 2011;26 Suppl 2:111-4. doi: 10.1590/s0102-86502011000800020.
  » https://doi.org/10.1590/s0102-86502011000800020
• ¹⁵
  Washino S, Hosohata K, Miyagawa T. Roles Played by Biomarkers of Kidney Injury in Patients with Upper Urinary Tract Obstruction. Int J Mol Sci. 2020;21(15):5490. doi: 10.3390/ijms21155490.
  » https://doi.org/10.3390/ijms21155490
• ¹⁶
  Mcleod DJ, Sebastião YV, Ching CB, Greenberg JH, Furth SL, Becknell B. Longitudinal kidney injury biomarker trajectories in children with obstructive uropathy. Pediatr Nephrol. 2020;35(10):1907-14. doi: 10.1007/s00467-020-04602-7.
  » https://doi.org/10.1007/s00467-020-04602-7
• ¹⁷
  Lopes RI, Dénes FT, Bartolamei MG, Reis S, Sanches TR, Leite K, et al. Serum and Urinary Values of CA 19-9 and TGFß1 in a Rat Model of Partial or Complete Ureteral Obstruction. Eur J Pediatr Surg. 2015;25(6):513-9. doi: 10.1055/s-0034-1395263
  » https://doi.org/10.1055/s-0034-1395263
• ¹⁸
  Kajbafzadeh, AM, Elmi A, Talab SS, Abdaresfahani S. Fetal Urinary New Biomarker for Prediction of Renal and Pulmonary Function in Posterior Urethral Valves. J Pediatr Urol.2010;6(1):46-7. doi: 10.1016/j.jpurol.2010.02.073.
  » https://doi.org/10.1016/j.jpurol.2010.02.073
• ¹⁹
  Alizadeh F, Taefnia AM, Haghdani S. Urinary carbohydrate antigen 19-9/creatinine ratio: A non-invasive marker for follow-up of unilateral ureteropelvic junction obstruction in children. J Pediatr Urol. 2018;14(1):62.e1-62.e4. doi: 10.1016/j.jpurol.2017.09.012.
  » https://doi.org/10.1016/j.jpurol.2017.09.012
• ²⁰
  Kajbafzadeh AM, Sabetkish,S; Sabetkish N. Prognostic significance of maternal urinary carbohydrate antigen 19-9 for antenatal diagnosis of posterior urethral valve associated with fetal hydronephrosis. Int Urol Nephrol. 2019;51(6):909-15. doi: 10.1007/s11255-019-02138-w.
  » https://doi.org/10.1007/s11255-019-02138-w
• ²¹
  Aybek H, Aybek Z, Sinik Z, Demir S, Sancak B, Tuncay L. Elevation of serum and urinary carbohydrate antigen 19-9 in benign hydronephrosis. Int J Urol. 2006;13(11):1380-4. doi: 10.1111/j.1442-2042.2006.01593.x.
  » https://doi.org/10.1111/j.1442-2042.2006.01593.x
• ²²
  Atar A, Oktar T, Kucukgergin C, Kalelioglu I, Seckin S, Ander H, et al. The roles of serum and urinary carbohydrate antigen 19-9 in the management of patients with antenatal hydronephrosis. J Pediatr Urol. 2015;11(3):133.e1-5. doi: 10.1016/j.jpurol.2014.12.012.
  » https://doi.org/10.1016/j.jpurol.2014.12.012

• Fonte de financiamento:

  nenhuma.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  22 Ago 2022
• Data do Fascículo
  2022

Histórico

• Recebido
  14 Fev 2022
• Aceito
  14 Jun 2022