Características morfológicas das artérias gástricas esquerda, hepática comum e esplênica. Um estudo descritivo em espécimes cadavéricos humanos

RESUMO

Objetivo:

avaliar a morfologia dos ramos das artérias do tronco celíaco (CT), gástrica esquerda (LGA), hepática comum (HC) e esplênica (SA) em espécimes cadavéricos de uma amostra de uma população colombiana.

Métodos:

estudo transversal descritivo de 26 blocos do segmento superior abdominal de cadáveres humanos submetidos a necropsias forenses no Instituto de Medicina Legal de Bucaramanga, Colômbia. Os leitos vasculares do tronco celíaco foram, posteriormente, perfundidos com resina semissintética.

Resultados:

os diâmetros de LGA, CHA e SA foram 3,6±0,8mm, 5,2±1,2mm e 5,9±1,0mm, respectivamente. Estatisticamente, LGA e SA foram diferentes (p=<0,001). A SA seguiu uma trajetória linear em 8 (31%) amostras, levemente tortuosa em 4 (15%) e tortuosa em 14 (54%). O índice de tortuosidade foi de 1,25±0,18. Dos ramos do ACS, a artéria hepática própria (APH) tinha 4,8±1,2mm de diâmetro e 18,8±9,1mm de comprimento, enquanto a artéria gastroduodenal (GDdA) tinha 4,1±0,8mm. Em 2 casos (7,7%), uma artéria hepática acessória do GIG foi encontrada para fornecer perfusão ao lobo hepático esquerdo. Finalmente, em 2 casos (7,7%) a SA veio independentemente da aorta abdominal.

Conclusão:

a incidência observada de emergência dos ramos de TC do mesmo nível relatado na literatura é menor. A caracterização, juntamente com suas variantes, de LGA, CHA e SA deve ser considerada em procedimentos cirúrgicos no segmento abdominal superior, para evitar complicações iatrogênicas.

Palavras-chave:
Variação Anatômica; Artéria Hepática; Artéria Esplênica; Artéria Gástrica

ABSTRACT

Objective:

to evaluate the morphology of the branches of celiac trunk (CT), left gastric (LGA), common hepatic (CHA), and splenic (SA) arteries in cadaveric specimens from a sample of a Colombian population.

Methods:

descriptive cross-sectional study of 26 blocks from the abdominal upper segment of human cadavers who underwent forensic autopsies at the Instituto de Medicina Legal at Bucaramanga, Colombia. The vascular beds of the celiac trunk were, subsequently, perfused with a semi-synthetic resin.

Results:

the diameters of LGA, CHA, and SA were 3.6±0.8mm, 5,2±1.2mm, and 5.9±1.0mm, respectively. Statistically, LGA and SA were different (p=<0.001). SA followed a linear trajectory in 8 (31%) samples, slightly tortuous in 4 (15%), and tortuous in 14 (54%). The tortuosity index was 1.25±0.18. Of the branches of CHA, the proper hepatic artery (PHA) had 4.8±1.2mm in diameter and 18.8±9.1mm in length, whereas the gastroduodenal artery (GDdA) had 4.1±0.8mm. In 2 cases (7.7%), an accessory hepatic artery from the LGA was found to supply perfusion to the left hepatic lobe. Finally, in 2 cases (7.7%) the SA came independently from the abdominal aorta.

Conclusion:

the observed emergence incidence of the CT branches from the same level as reported in the literature is lower. The characterization, along with their variants, of LGA, CHA, and SA must be considered in surgical procedures in the upper abdominal segment, to avoid iatrogenic complications.

Keywords:
Anatomic Variations; Hepatic Artery; Splenic Artery; Gastric Artery

INTRODUÇÃO

Normalmente, o tronco celíaco (TC), principal ramo da aorta abdominal (AA), ramifica-se na artéria gástrica esquerda (AGE), artéria esplênica (AE) e artéria hepática comum (AHC), com diversas variantes descritas na literatura, especialmente a verdadeira trifurcação (“tripus Halleri”) em 22-30% dos casos^1-3 e a apresentação bifurcada, denominada hepatogástrica, gastroesplênica, hepatoesplênica^4,5. A AGE se ramifica a partir do AA⁶ em 2,5-13,1%^3,7, é o primeiro ramo do TC8 em 68% dos casos, com diâmetro usual de 3,8-5mm^1,2,9. Em 0,5-11%^8,10, a artéria hepática acessória (AHAc) é um ramo da AGE⁸ , tendo a mesma origem da artéria hepática esquerda (AHE) em 0,16%-15% dos casos^10,11.

Geralmente, a AHC origina-se do TC (94-96,3% dos casos)^11,12, enquanto outras variantes de origem da AHC têm sido relatadas, como a artéria mesentérica superior (AMS) (0,6-13,1%)^10,11,13, AA (0,3-0,6%)^11,15, AGE¹⁶ em 1,1%, e mesmo ausência de AHC, com origem independente da artéria gastroduodenal (AGD) e a artéria hepática própria (AHP) ramificando-se a partir do TC, enquanto em 10% a AHC divide-se em AGD e AHP, onde o ramo esquerdo é substituído por um ramo da AGE¹⁵. O comprimento da AHC é de 24,2mm e seu diâmetro é de 6,2mm¹². O conhecimento da origem, trajetos e ramos das artérias hepáticas é importante para procedimentos cirúrgicos hepáticos e biliares, como transplante hepático e abordagem de aneurismas^12,14,17.

A Artéria Esplênica (AE) tem o maior diâmetro (6,1mm) e seu comprimento é de 173mm. É o primeiro ramo do TC em 8,1%¹. Seu segmento distal, geralmente no hilo esplênico, bifurca-se em 80% dos casos e trifurca-se em 20%¹¹. Uma de suas características morfológicas particulares é sua tortuosidade, que aumenta com o envelhecimento e condições patológicas, como aterosclerose e hipertensão arterial^18,19.

Considerando a variabilidade dos ramos do TC, sua complexidade radiológica e cirúrgica e a escassez de informações anatômicas sobre esses vasos, com descrições populacionais limitadas de dissecção, perfusão ou estudos de imagem, com clara orientação clínico-básica^12,15,18, este estudo fornece informações anatômicas relevantes e de referência sobre a morfologia das AGE, AHC e AE em uma amostra de indivíduos colombianos, que podem ser usadas em áreas médicas, como procedimentos cirúrgicos.

MÉTODO

Este estudo transversal descritivo e não probabilístico determinou as características anatômicas dos ramos do tronco celíaco em 26 blocos do andar supramesocólico (fígado, estômago, pâncreas, baço, aorta abdominal) de cadáveres adultos mestiços masculinos não reclamados (20 a 65 anos), de autópsias no Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses, Regional Nordeste, em Bucaramanga, Colômbia. Os critérios de exclusão foram traumas e doenças ou abordagens cirúrgicas próximas ao óbito que comprometessem os órgãos e suas estruturas vasculares do abdome superior. Este estudo foi revisado e aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Autônoma de Bucaramanga (UNAB).

Um cateter de calibre 14 foi colocado no coto proximal da aorta abdominal (AA) e fixado com uma sutura de seda, enquanto o coto aórtico distal e a origem de seus ramos emergentes lombares foram fixados (AA ligada proximal à sua bifurcação) com uma sutura de seda 2/0; seguida da limpeza dos leitos vasculares com soro fisiológico para eliminação de coágulos e detritos hemáticos. Em seguida, a AA e os ramos do TC foram perfundidos com resina semi-sintética de poliéster tingida de vermelho (mistura de GP40L 83%, cobalto 1%, metiletilcetona 1% e estireno 15%, em ambiente controlado de 25°C).

A injeção de resina (250cc, com seringa calibre 14) foi interrompida assim que verificada a pressão positiva no nível do êmbolo da seringa, significando que todas as estruturas estudadas foram preenchidas. Consecutivamente, os blocos abdominais foram fixados por 15 dias com formol 10%.

Após a fixação, os ramos do TC foram dissecados desde sua origem até seus segmentos distais. Em seguida, com um paquímetro digital (Mitutoyo^®), mediu-se seu diâmetro externo a 0,5mm de cada origem. Finalmente, foram registradas as características qualitativas das diferentes expressões morfológicas de cada ramo. Trajetória reta linear foi registrada quando havia qualquer curvatura acima da borda superior do pâncreas; uma trajetória levemente tortuosa, se encontradas ondulações superiores e inferiores suaves e tortuosas. Além disso, o índice de tortuosidade (IT)¹⁹ foi calculado, além de um registro fotográfico das amostras.

Análise estatística

Usando o Microsoft Excel^® (Microsoft Corporation, 2019), os dados foram registrados e as variáveis contínuas são expressas como média e desvio padrão (DP) ou mediana e intervalos interquartílicos (IIQ). As variáveis categóricas foram expressas como frequências. Para a análise estatística, utilizando o SigmaPlot 14.5, foi utilizado o teste t de Student para distribuição paramétrica e o teste de Mann-Whitney para não paramétrica, com significância estatística se p<0,05. Finalmente, foi realizado um teste de correlações múltiplas para variáveis independentes usando o método de Spearman para calcular o coeficiente de correlação (Rho) para associações com p<0,05.

RESULTADOS

Em 16 (61,5%) casos o TC apresentava-se bifurcado (hepatoesplênica) com a artéria gástrica esquerda (AGE) emergindo junto à artéria hepática comum (AHC) e artéria esplênica (AE) (Figura 1); em 7 amostras (26,9%) a AHC, AE e AGE ramificaram-se no mesmo nível, enquanto os TCs hepatoesplênico (AGE origina-se do AA) (Figura 2) e gastroesplênico (AHC ramifica-se do AA) (Figura 3) foram observados em 3,8% das amostras. O comprimento da AE (Figuras 4 e 5) foi de 92,5±16,9mm, sem diferenças significativas em relação aos demais ramos, enquanto seu diâmetro (5,9±1,0) foi significativamente (p<0,001) distinto do da AGE (Tabela 1).

Tabela 1
Comprimento e diâmetro dos ramos do Tronco Celíaco.

	MÉDIA	DP	MAX	MIN	MEDIANA
C-AE	92,5	16.9	130,7	68,0	88,5
D-AE	5.9	1,0	8.6	4.2	5,6*
C-AHC	26,7	11,0	53,6	8,0	24,8
D-AHC	5.2	1.2	7.6	3.1	5.4
C-AGE	30.1	8.8	46,7	12.7	28,7
D-AGE	3.6	0,8	5.2	2.3	3.5

• C-AHC: comprimento da artéria hepática comum; D-AHC: diâmetro da artéria hepática comum; C-AGE: comprimento da artéria gástrica esquerda; D-AGE: diâmetro da artéria gástrica esquerda; D-AE: diâmetro da artéria esplênica; C-AE: comprimento da artéria esplênica. As medidas são dadas em mm. * significância estatística p<0,001 (t de Student).

Figura 1
Tronco celíaco hepatoesplênico. Artéria esplênica sinuosa. CHA: Artéria hepática comum; *Artéria gástrica esquerda; P: Pâncreas; IBSA: Ramo inferior da artéria esplênica; SBSA: Ramo superior da artéria esplênica; S: Estômago; Sp: Baço.

Figura 2
Artéria gástrica esquerda originando-se diretamente da artéria aorta abdominal. CHA: Artéria Hepática Comum; GDdA: Artéria gastroduodenal; LGA: Artéria Gástrica Esquerda; P: Pâncreas; PHA: Artéria Hepática Própria; S: Estômago; Sp: Baço; *artéria hepática acessória originando-se da artéria gástrica esquerda.

Figura 3
Artéria hepática comum originando-se da artéria aorta abdominal. CHA: Artéria Hepática Comum; GDdA: Artéria Gastroduodenal; LGE: Artéria Gástrica Esquerda; P: Pâncreas; PHA: Artéria Hepática Própria; SA: Artéria Esplênica; S: Estômago; Sp: Baço.

Figura 4
Artéria esplênica de trajeto tortuoso. CT: Tronco Celíaco; P: Pâncreas; SA: Artéria Esplênica; IBSA: Ramo Inferior da Artéria Esplênica; SBSA: Ramo Superior da Artéria Esplênica; Sp: Baço; S: Estômago.

Figura 5
Artéria esplênica de trajeto retilíneo. IBSA: Ramo Inferior da Artéria Esplênica; SA: Artéria Esplênica; SBSA: Ramo Superior da Artéria Esplênica; S: Estômago; Sp: Baço.

Dos ramos da AHC, o diâmetro da artéria hepática própria (AHP) foi de 4,8±1,2mm, enquanto o diâmetro da artéria gastroduodenal (AGD) foi de 4,1±0,8. A Tabela 2 mostra os dados morfométricos dos vasos colaterais AHC, AE e AGE. Em dois casos, a artéria hepática acessória (AHAc) foi ramificada da AGE (AHAc-AGE), dando irrigação ao lobo hepático esquerdo. Em um caso (3,8%) a artéria hepática direita originava-se da artéria mesentérica superior, em posição retropancreática (Figura 6).

Tabela 2
Comprimento e diâmetro das ramificações dos ramos do Tronco Celíaco.

	MÉDIA	DP	MAX	MIN	MEDIANA
D-RSAE	4.2	0,9	5.5	2.3	4.5
D-RIAE	3.6	1.1	5.1	2.0	3.6
C-AHP	18.8	9.1	33.3	7.5	19.1
D-AHP	4.8	1.2	7.7	3.1	4.4
D-AHD	4.1	1.2	6.6	2.0	4.1
C-AHD	43,5	13.1	60,6	24,5	41.4
D-AHE	3.2	0,8	4.7	1.7	3.1
C-AHE	31.7	10.8	49.1	16.9	31.8
AHAc-D-AGE	2.1	0,2	2.2	2.0	2.1
D-AGD	4.1	0,8	5.7	2.6	4.1
C-AGD	25.7	10.1	32.3	10.8	29.9
D-AGDi	3.2	1,0	4.1	2.2	3.2

• AHAc-D-AGE: diâmetro da artéria hepática acessória da artéria gástrica esquerdas; D-AGD: diâmetro da artéria gastroduodenal; C-AGD: comprimento da artéria gastroduodenal; D-AHE: diâmetro da artéria hepática esquerda; C-AHE: comprimento da artéria hepática esquerda; C-AHP: comprimento artéria hepática própria; D-AHP: diâmetro artéria hepática própria; D-AHD: diâmetro da artéria hepática direita; L-AHD: comprimento da artéria hepática direita; D-AGDi: diâmetro da artéria gástrica direita; D-RSAE: diâmetro do ramo superior da artéria esplênica; D-RIAE: diâmetro do ramo inferior da artéria esplênica; dados em mm.

Figura 6
Artéria hepática direita com origem na artéria mesentérica superior. CBD: Ducto biliar comum (Ductus choledochus); G: Vesícula Biliar; LGA: Artéria gástrica esquerda; P: Pâncreas; R: Artéria hepática direita; SA: Artéria esplênica; SMA: Artéria mesentérica superior; S: Estômago. Nota: O pâncreas foi deslocado para baixo e a veia porta para a esquerda.

A AE apresentou trajetória linear reta (Figura 5) em oito amostras (31%), levemente tortuosa (Figura 3) em quatro (15%) e francamente tortuosa (Figuras 1 e 4) em 14 (54%). O IT calculado foi de 1,25±0,18, sem diferenças significativas entre trajetórias retas e tortuosas. A hipótese estatística para o IT com n ramos terminais (no hilo esplênico) pelo teste de Mann-Whitney apresentou diferenças estatisticamente significativas na variável “número de ramos do ramo superior da AE” (p<0,001), na variável “número de ramos do ramo inferior da AE” (p=0,009) e “total de ramos” (p<0,001); e pelo teste de correlação de Spearman, o IT se correlacionou negativamente apenas com o número de ramos do ramo superior da AE (Rho=-0,57; p=0,032). Além disso, houve correlação positiva entre o índice de tortuosidade e o diâmetro do TC (D-TC) (Rho=0,55; p=0,029).

A AE, entrando no hilo esplênico, bifurcava-se em ramos superiores e inferiores (Figuras 4 e 5), cada um dividindo-se também em dois ou três ramos. Para a variável número de ramos do ramo superior da AE, 29% dos simples tinham três ramos, e 71%, dois ramos, enquanto para o ramo inferior da AE, 14% das amostras tinham três ramos, 64% tinham dois ramos, e em 21%, apenas um.

A partir da análise de correlação, houve associações positivas entre o comprimento da artéria esplênica (C-AE) e “Número de ramos do ramo superior da AE”, “comprimento da artéria hepática comum (C-AHC)”, “comprimento da artéria gástrica esquerda (C-AGE)”, e “diâmetro da artéria hepática esquerda (D-AHE)”, bem como para “diâmetro da artéria hepática comum (D-AHC)” com “diâmetro do tronco celíaco”, “diâmetro da artéria esplênica (D-AE)”, “diâmetro do ramo inferior da artéria esplênica (D-RIAE)” e “número de ramos do ramo superior da AE”. Além disso, houve correlações mais positivas entre “diâmetro da artéria gastroduodenal (D-AGD)” com “diâmetro do tronco celíaco (D-TC)”, “diâmetro do ramo inferior da artéria esplênica”, “comprimento da artéria hepática comum (C-AHC)”, “diâmetro da artéria hepática comum (D-AHC)”, “diâmetro da artéria gástrica esquerda (D-AGE)” e “diâmetro da artéria hepática direita (D-AHD)”. Por outro lado, foi encontrada uma correlação negativa entre “comprimento da artéria hepática própria (C-AHP)” e “diâmetro da artéria hepática própria (D-AHP)”, entre “diâmetro da artéria hepática direita (D-AHD)” e “diâmetro da artéria hepática esquerda (D-AHE)” e entre “diâmetro da artéria hepática esquerda (D-AHE)” e “comprimento da artéria hepática esquerda (C-AHE)”. A descrição qualitativa das variantes morfológicas dos ramos emergentes do TC, como a artéria frênica inferior originada da parte proximal do TC, a artéria gástrica esquerda dando origem à artéria hepática esquerda, a artéria hepática direita emergindo da AHE. A artéria hepática comum emite a artéria hepática esquerda e a artéria gastroduodenal.

DISCUSSÃO

O padrão hepatoesplênico foi o padrão mais frequente neste estudo, utilizando-se a perfusão dos leitos vasculares e a emergência proximal da artéria gástrica esquerda (AGE) do tronco celíaco (TC) (61,5%), coincidindo com os achados de Marco-Clemente20 e com frequência um pouco menor do que em outros estudos^1,2,21. A frequência do surgimento no mesmo nível dos três ramos do TC (26,9%) é maior do que em relatos anteriores^22,23, enquanto a faixa de expressão dessa característica morfológica é de 32,1-89,5%^20,24. A incidência da origem independente da AGE e da AHC a partir da AA^4,6 é relatado em 1,4-2,3% e 0,4-0,6%, respectivamente^11,21,24, ao passo que, neste relato, a incidência de origem da AA é discretamente maior (3,8% para cada ramo). Por outro lado, a origem da AHC é altamente variável, de acordo com múltiplos estudos. Da artéria mesentérica superior (AMS) (incidência, 6,7-13,1%)^15,25, da AGE16, ou ausente (incidência 1,1-6,6%)^15,24. Neste estudo, 3,8% da artéria hepática direita (AHD) originaram-se da AMS, em posição retropancreática; essa variante anatômica pode aumentar o risco de lesão no transplante hepático¹⁴.

Com relação aos diâmetros dos ramos do TC, este estudo encontrou a AE como o maior ramo (5,9mm), seguido da AHC (5,2mm) e da AGE (3,6mm), resultados que estão de acordo com o relato de Silveira⁹. Informações sobre o comprimento dos ramos do TC são escassas, mas nossos achados de 26,7mm para a AHC concordam com os de Silveira⁹.

Indivíduos com ramos de TC de pequeno calibre, quando somados a outras variáveis como a presença de placas de ateroma, terão como característica fisiopatológica a hipoperfusão de órgãos como fígado e pâncreas, o que pode explicar o aparecimento de patologias metabólicas que neles são geradas.

A alta variabilidade de informações sobre a origem, comprimento e diâmetros dos ramos usuais derivados do TC depende do tamanho da amostra, critérios de medição, métodos de avaliação (dissecção direta ou avaliação por imagem) e expressões biológicas das estruturas anatômicas entre diferentes grupos populacionais.

Algumas das variantes de origens dos ramos do TC têm implicações claras e importantes para os procedimentos cirúrgicos do segmento abdominal superior. Por exemplo, durante a gastrectomia total por câncer gástrico que requer a ligadura da AGE após a emergência do ramo hepático para evitar a hipoperfusão do lobo hepático esquerdo; uma ligadura proximal do ramo hepático esquerdo da artéria gástrica esquerda pioraria o estado do paciente, podendo causar até mesmo a morte^10,11,16,26.

A artéria esplênica (AE) é descrita como o primeiro ramo do TC (2,5%)⁷, mas essas características morfológicas não foram observadas em nosso estudo. O comprimento da AE foi de 92,5 mm, enquanto em outros estudos este varia de 76,5 a 94,1mm^1,27. Em relação à tortuosidade da AE, os resultados de Fataftah e cols. 2020²⁷ apontam 94,1mm para a AE retilínea e 155mm para a AE tortuosa, com índice de tortuosidade (IT) de 1,63, superior ao nosso IT de 1,25. Silvestre e cols.¹⁹ encontraram em cadáveres e por meio de angiografia, uma faixa de IT para cadáveres de 1,01-3,58, e maior na análise de imagem (5,25 IT), sem correlação entre o IT da AE e sexo feminino, índice de massa corporal, cavidade abdominal diâmetro, ou idade. A AE tortuosa aumenta a dificuldade durante a esplenectomia devido ao trajeto sinuoso, que afeta tanto o tronco arterial esplênico quanto seus ramos terminais. Se estes forem numerosos, durante o procedimento cirúrgico é necessário identificá-los e ligá-los, aumentando o risco de pancreatite aguda como complicação pós-operatória, pela manipulação excessiva da cauda do pâncreas. Além disso, o IT da AE poderia ser útil para o planejamento da embolização cirúrgica para prevenir coágulos durante a esplenectomia²⁴; a caracterização morfológica da AE é importante devido à alta frequência de aneurismas e sua alta mortalidade em caso de ruptura²⁸.

Em nosso estudo, não encontramos ramificação proximal da AE, mas Pandey²⁹ relatou que esta variante está presente em 1,6% dos casos, com grande variação do número de ramos terminais da AE, bem como sem ramificação em 2,8% dos casos, com dois ramos terminais em 63,1%, quatro ramos em 18,8%, seis ramos em 9,7% e mais de seis ramos em 5,6% dos casos²⁹. Sahni¹ reportou a ramificação da AE em dois e três ramos lobares em 80% e 20% dos casos, respectivamente, enquanto este estudo encontrou a bifurcação (ramo superior e ramo inferior) da AE em sua extremidade terminal. Os 63,1% dos casos relatados por Pandey em 2004²⁹, com ramos terminais dos ramos superior e inferior da AE, não concordam com nossos achados de bifurcação e trifurcação desses ramos.

Houve associação positiva entre o comprimento da AE com o comprimento da AHC e AGE, assim como com o diâmetro da AHE e o número de ramos do ramo superior da AE. A mesma correlação positiva foi observada entre o diâmetro da AHC e os diâmetros do TC, AE, e o número de ramos do ramo superior da AE. Por outro lado, houve uma correlação negativa entre o comprimento da artéria hepática própria (AHP) e os diâmetros da AHE e AHD. Essa avaliação de correlação, até onde sabemos, não foi relatada em outros estudos. Essas avaliações enriquecem o quadro conceitual da distribuição e comportamento das artérias que irrigam os órgãos do abdome supra-mesocólico. Na amostra estudada, variantes morfológicas foram encontradas em apenas um dos casos, como a artéria frênica inferior com origem no TC e a AHE com origem na AGE, concordando com o que é relatado na literatura^7,13,26.

CONCLUSÃO

Em adultos mestiços colombianos do sexo masculino, a incidência de tronco celíaco hepatoesplênico e tríade de Haller é ligeiramente menor do que a relatada na maioria dos estudos anteriores. A artéria esplênica foi a de maior calibre, com diferença estatisticamente significativa em relação aos demais ramos emergindo do TC. Como em estudos anteriores, observou-se agenesia ou baixa incidência de outros ramos do TC (frênico inferior, hepático acessório, mesentérico superior). Foi encontrada correlação negativa entre o índice de tortuosidade e o número de ramos do ramo superior da AE, achado não relatado na literatura.

Para as áreas médica e cirúrgica, o conhecimento das variantes anatômicas de AE, AHC, AGE e seus ramos é de grande importância em cirurgia geral, cirurgia laparoscópica e procedimentos de imagem, especialmente os que envolvem fígado, pâncreas, estômago e baço. Por exemplo, a angiotomografia computadorizada (ATC) permite delinear claramente a anatomia vascular antes do procedimento cirúrgico agendado. Durante o planejamento cirúrgico, o cirurgião anteciparia uma variante vascular e poderia prevenir complicações iatrogênicas, principalmente aquelas relacionadas à hipoperfusão dos órgãos supridos por essas variantes. Parte do sucesso dos procedimentos emergenciais que comprometem o TC e seus ramos se deve à expertise do cirurgião, baseada no profundo conhecimento da variabilidade de origem, calibre e trajetória desses vasos.

AGRADECIMENTOS

Os autores gostariam de agradecer ao Instituto Nacional de Medicina Legal, Regional Nororiente, por fornecer os espécimes anatômicos para o estudo à Diretoria de Investigações da Universidade Autônoma de Bucaramanga pelo financiamento a Projeto de Pesquisa: Características Morfológicas do Tronco Celíaco. Um estudo em uma amostra de indivíduos mestiços de Bucaramanga, código E46 do anúncio interno de 2019. Este artigo é um dos produtos deste projeto. À Dra. Sandra Milena Convers pela tradução do manuscrito para o Inglês.

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• Fonte de financiamento:

  nenhuma.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  06 Fev 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  22 Jun 2022
• Aceito
  16 Ago 2022