Acessibilidade / Reportar erro

HLA-A*31 como marcador de suscetibilidade genética em sepse

Resumos

Objetivo:

Haplótipos do HLA têm sido associados a muitas doenças autoimunes, mas não foi descrita qualquer associação na sepse. O objetivo desse estudo é investigar o sistema HLA como um possível marcador de suscetibilidade genética à sepse.

Métodos:

Estudo prospectivo de coorte, incluindo pacientes admitidos em unidade de terapia intensiva e controles-saudáveis obtidos em lista de doadores de transplante renal. Foram excluídos pacientes abaixo dos 18 anos de idade, gestantes ou HIV positivos, pacientes com doença maligna metastática ou sob quimioterapia, pacientes com hepatopatia avançada, com condições de fim de vida. O DNA foi extraído de sangue total, e a haplotipagem de HLA foi realizada com a tecnologia MiliPlex®.

Resultados:

Foram incluídos 1.121 pacientes (1.078 doadores de rim, 20 pacientes com sepse grave e 23 pacientes admitidos por choque séptico) entre outubro de 2010 e outubro de 2012. Os participantes positivos para HLA-A*31 tiveram risco aumentado de desenvolver sepse (OR: 2,36 IC95%: 1,26-5,35). Não foi identificada outra associação significativa, quando considerado como nível de significância o valor de p<0,01.

Conclusão:

A expressão de HLA-A*31 está associada ao risco de desenvolvimento de sepse.

Sepse; Antígenos HLA-A; Inflamação; Marcadores genéticos


Objective:

The HLA haplotype has been associated with many autoimmune diseases, but no associations have been described in sepsis. This study aims to investigate the HLA system as a possible marker of genetic sepsis susceptibility.

Methods:

This is a prospective cohort study including patients admitted to an intensive care unit and healthy controls from a list of renal transplant donors. Patients with less 18 years of age; pregnant or HIV positive patients; those with metastatic malignancies or receiving chemotherapy; or with advanced liver disease; or with end-of-life conditions were excluded. The DNA was extracted from the whole blood and HLA haplotypes determined using MiliPlex® technology.

Results:

From October 2010 to October 2012, 1,121 patients were included (1,078 kidney donors, 20 patients admitted with severe sepsis and 23 with septic shock). HLA-A*31 positive subjects had increased risk of developing sepsis (OR 2.36, 95%CI 1.26-5.35). Considering a p value <0.01, no other significant association was identified.

Conclusion:

HLA-A*31 expression is associated to risk of developing sepsis.

Sepsis; HLA-A antigens; Inflammation; Genetic markers


INTRODUÇÃO

A proliferação bacteriana na corrente sanguínea desencadeia o processo inflamatório sistêmico imuno-mediado inato que caracteriza a sepse, uma síndrome com taxa de letalidade entre 20 e 50% em pacientes de terapia intensiva,(11. Martin GS, Mannino DM, Eaton S, Moss M. The epidemiology of sepsis in the United States from 1979 through 2000. N Engl J Med. 2003;348(16):1546-54.) e cuja apresentação mais grave, o choque séptico, tem desafiado os profissionais da medicina por décadas. Ironicamente, no caso de sepse, a medicina pode ser uma vítima de seu próprio sucesso, já que um crescimento significativo dos modernos procedimentos invasivos realizados para salvar vidas, expõe o corpo a micro-organismos indutores de sepse. Além disso, os novos e poderosos antibióticos utilizados para combater a infecção aumentam a resistência aos fármacos, o que sustenta a letalidade da sepse.

Os haplótipos do HLA são um dos fenômenos genéticos que se associam mais fortemente com autoimunidade.(22. Cho JH, Gregersen PK. Genomics and the multifactorial nature of human autoimmune disease. N Engl J Med. 2011;365(17):1612-23.) Desde a primeira descrição de forte associação entre HLA-B*27 e espondilite anquilosante,(33. Brewerton DA, Hart FD, Nicholls A, Caffrey M, James DC, Sturrock RD. Ankylosing spondylitis and HL-A 27. Lancet. 1973;1(7809):904-7.) muitas outras associações a doenças imunes foram descritas. Embora essas associações tenham sido amplamente estudadas e documentadas, pouco se tem progredido na compreensão da influência de um haplótipo particular de HLA em cada doença. Alguns exemplos clássicos incluem a esclerose múltipla,(44. Habek M, Brinar VV, Borovecki F. Genes associated with multiple sclerosis: 15 and counting. Expert Rev Mol Diagn. 2010;10(7):857-61.) a psoríase(55. Liu Y, Helms C, Liao W, Zaba LC, Duan S, Gardner J, et al. A genome-wide association study of psoriasis and psoriatic arthritis identifies new disease loci. PLoS Genet. 2008;4(3):e1000041.) e o diabetes tipo 1.(66. Viken MK, Blomhoff A, Olsson M, Akselsen HE, Pociot F, Nerup J, et al. Reproducible association with type 1 diabetes in the extended class I region of the major histocompatibility complex. Genes Immun. 2009;10(4):323-33.) Contudo há algumas exceções, como o processo pelo qual a desaminação peptídica pode levar à doença celíaca,(77. Fallang LE, Bergseng E, Hotta K, Berg-Larsen A, Kim CY, Sollid LM. Differences in the risk of celiac disease associated with HLA-DQ2.5 or HLA-DQ2.2 are related to sustained gluten antigen presentation. Nat Immunol. 2009;10(10):1096-101.) ou o cenário em que o mimetismo molecular, entre moléculas bacterianas e endógenas, pode produzir a doença de Lyme.(88. Gross D, Huber BT, Steere AC. Molecular mimicry and Lyme arthritis. Curr Dir Autoimmun. 2001;3:94-111.) Mais ainda, estudos recentes sugerem que a contribuição do HLA à autoimunidade pode ser poligênica.(99. International MHC and Autoimmunity Genetics Network, Rioux JD, Goyette P, Vyse TJ, Hammarström L, Fernando MM, Green T, et al. Mapping of multiple susceptibility variants within the MHC region for 7 immune-mediated diseases. Proc Natl Acad Sci U S A. 2009;106(44):18680-5.)

Além do mais, a relevância dos HLAs vem crescendo em áreas como imunização,(1010. Depla E, Van der Aa A, Livingston BD, Crimi C, Allosery K, De Brabandere V, et al. Rational design of a multiepitope vaccine encoding T-lymphocyte epitopes for treatment of chronic hepatitis B virus infections. J Virol. 2008;82(1):435-50.,1111. Dangoor A, Lorigan P, Keilholz U, Schadendorf D, Harris A, Ottensmeier C, et al. Clinical and immunological responses in metastatic melanoma patients vaccinated with a high-dose poly-epitope vaccine. Cancer Immunol Immunother. 2010;59(6):863-73.) antropologia(1212. Sanchez-Mazas A, Fernandez-Viña M, Middleton D, Hollenbach JA, Buhler S, Di D, et al. Immunogenetics as a tool in anthropological studies. Immunology. 2011;133(2):143-64.) e farmacogenômica.(1313. Bharadwaj M, Illing P, Theodossis A, Purcell AW, Rossjohn J, McCluskey J. Drug hypersensitivity and human leukocyte antigens of the major histocompatibility complex. Annu Rev Pharmacol Toxicol. 2012;52:401-31.) Na verdade, algumas reações adversas medicamentosas demonstraram forte associação com HLA, como as descritas para abacavir (HLA-B*5701), alopurinol (HLA-B*58) e carbamazepina (HLA-B*1502). Outras condições associadas ao sistema HLA incluem o comportamento tabagista, esquizofrenia, doença de Parkinson, narcolepsia e doença arterial coronária.(1414. Trowsdale J. The MHC, disease and selection. Immunol Lett. 2011;137(1-2):1-8.) O presente artigo investigou os loci de classes I e II de HLA como possíveis marcadores genéticos para suscetibilidade à sepse.

MÉTODOS

O presente estudo teve as características de um estudo prospectivo de coorte, realizado em uma unidade de terapia intensiva (UTI) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e concebido como parte do projeto BRISK (sigla do inglês Brazilian Initiative for Sepsis Knowledge, Iniciativa Brasileira para Conhecimento da sepse), que foi lançado em 2009 para investigar diferentes aspectos moleculares da sepse. Foram incluídos, consecutivamente, todos os pacientes admitidos na unidade de estudo, uma UTI de 14 leitos, após assinatura de termo de consentimento informado. Os pacientes de trauma cirúrgico e síndrome coronária são habitualmente admitidos em UTIs específicas do hospital, não tendo sido triados para este estudo, tornando as populações dessas unidades muito homogêneas. Foram critérios de exclusão deste estudo pacientes abaixo dos 18 anos de idade, gestantes ou HIV positivos, pacientes com doença maligna metastática ou sob quimioterapia, pacientes com hepatopatia avançada, com condições de fim de vida. O grupo controle foi composto por amostras obtidas dos doadores de rim do serviço de HLA do Instituto do Coração da Universidade de São Paulo. As definições utilizadas para sepse grave e choque séptico estiveram de acordo com o Consenso do American College of Chest Physicians/Society of Critical Care Medicine (ACCP/SCCM) proposto em 1992.(1515. Bone RC, Sibbald WJ, Sprung CL. The ACCP-SCCM consensus conference on sepsis and organ failure. Chest. 1992;101(6):1481-3.) O grupo controle foi constituído por doadores de transplante renal avaliados pelo Laboratório de Histocompatibilidade do Departamento de Imunologia do Instituto do Coração da USP em exames rotineiros de triagem antes da doação. O protocolo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital das Clínicas. Além disso, os pacientes (ou seus parentes próximos) receberam explicações detalhadas sobre o estudo e assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido por escrito para inclusão no protocolo do estudo (protocolo número 1.207/09).

O DNA foi extraído de sangue total, e a halotipagem de HLA foi realizada com a tecnologia MiliPlex®.

Todas as análises estatísticas foram realizadas utilizando os programas estatísticos Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 19.0 e R statistical software. Valor de p≤0,01 foi considerado estatisticamente significante. A escolha desse nível de significância visou reduzir o risco de erro do tipo I, dado o pequeno número de pacientes incluídos no grupo de estudo.

RESULTADOS

Este estudo incluiu 1.121 pacientes (1.078 doadores de rim, 20 pacientes com sepse grave e 23 pacientes admitidos por choque séptico) que foram incluídos entre outubro de 2010 e outubro de 2012. Em nosso caso, sepse, acidente vascular cerebral (AVC), alteração dos níveis de consciência, edema pulmonar e asma/doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) foram responsáveis por mais de 90% das condições envolvidas nos pacientes incluídos neste estudo.

Foi identificada uma associação significante entre HLA-A*31 e risco de sepse; os participantes positivos para HLA-A*31 tiveram um risco 2,36 vezes maior de desenvolver sepse do que os negativos para HLA-A*31. Não foi identificada em nossa análise qualquer outra associação significante, quando utilizado o nível de significância de 0,01, embora a comparação da prevalência do HLA-A*30 entre o grupo séptico e os controles tenha tido valor de p limítrofe (Tabelas 1 a 5).

Tabela 1
Prevalência de HLA*A em pacientes sépticos e controles
Tabela 2
Prevalência de HLA*B em pacientes sépticos e controles
Tabela 3
Prevalência de HLA*C em pacientes sépticos e controles
Tabela 4
Prevalência de HLA*DQ em pacientes sépticos e controles
Tabela 5
Prevalência de HLA*DR em pacientes sépticos e controles

DISCUSSÃO

Polimorfismos genéticos classes I e II do HLA são os alelos mais fortes e consistentes para doenças autoimunes. A região do HLA fica localizada no 6p21.3 e envolve mais de 400 genes. Tecnologias de genotipagem de SNP identificaram diversos polimorfismos de nucleotídeo único (SNPs) que conferem um risco muito alto de autoimunidade; entretanto, um forte desequilíbrio da conexão por meio da região HLA(1616. Rai E, Wakeland EK. Genetic predisposition to autoimmunity--what have we learned? Semin Immunol. 2011;23(2):67-83.) complica essa interpretação. Na verdade, os loci de classes DR e DQ demonstraram uma forte associação com uma pletora de doenças autoimunes(1717. Handunnetthi L, Ramagopalan SV, Ebers GC, Knight JC. Regulation of major histocompatibility complex class II gene expression, genetic variation and disease. Genes Immun. 2010;11(2):99-112.) e também comumente se encontra que HLA-A e HLA-b contribuem para risco de doença.

É mais difícil encontrar associações importantes de HLA com doenças infecciosas, pois a maioria dos agentes infecciosos pode dar lugar a múltiplos epítopos, alguns dos quais com maior chance de ativar células T com avidez suficiente. No entanto, algumas associações são bem estabelecidas, como as para HIV, HTLV-1, malária, vírus da hepatite C, tuberculose e lepra. Como ele muito provavelmente direciona a seleção de haplótipo, a infecção pode, em última análise, ser relacionada com a maioria das doenças associadas a HLA.

Neste estudo, encontramos uma associação significante entre HLA-A*31 e sepse. Não é simples identificar as razões pelas quais esse haplótipo específico dita a suscetibilidade genética. São frequentemente identificados novos alelos de A*31,(1818. Zhang WW, Li XF, Zhang X, Li JP, Li ZQ. A novel HLA-A31 allele, A*31:22, was identified by sequence-based typing. Tissue Antigens. 2012;80(4):380-1.

19. Ji Y, Sun Y, Liu Y, Xie J, Du K. Two novel HLA-A alleles: HLA-A*31:01:09 and HLA-A*33:30. Tissue Antigens. 2011;78(3):218-9.
-2020. Lim AH, Song SN, Lee JY, Cho NS, Kwon SY. A novel HLA-A*31 allele, A*31:57, identified by sequence-based typing. Tissue Antigens. 2012;79(5):386-7.) evidenciando que esse haplótipo se encontra sob forte pressão seletiva. Entretanto, a literatura que investiga o sistema HLA na sepse explora quase que exclusivamente a expressão de HLA-DR na membrana. Efetivamente, numerosas publicações implicam baixa expressão de HLA-DR na membrana como um preditor de desenvolvimento de sepse(2121. Gouel-Chéron A, Allaouchiche B, Guignant C, Davin F, Floccard B, Monneret G; AzuRea Group. Early interleukin-6 and slope of monocyte human leukocyte antigen-DR: a powerful association to predict the development of sepsis after major trauma. PloS One. 2012;7(3):e33095.) e desfecho sombrio da sepse,(2222. Genel F, Atlihan F, Ozsu E, Ozbek E. Monocyte HLA-DR expression as predictor of poor outcome in neonates with late onset neonatal sepsis. J Infect. 2010;60(3):224-8.,2323. Wu JF, Ma J, Chen J, Ou-Yang B, Chen MY, Li LF, et al. Changes of monocyte human leukocyte antigen-DR expression as a reliable predictor of mortality in severe sepsis. Crit Care. 2011;15(5):R220.) tendo este se tornado o mais confiável marcador de imunossupressão adquirida na UTI.(2424. Monneret G, Venet F, Pachot A, Lepape A. Monitoring immune dysfunctions in the septic patient: a new skin for the old ceremony. Mol Med. 2008;14(1-2):64-78.,2525. Boomer JS, To K, Chang KC, Takasu O, Osborne DF, Walton AH, et al. Immunosuppression in patients who die of sepsis and multiple organ failure. JAMA. 2011;306(23):2594-605.) Em nosso estudo, contudo, a varredura genética completa do lócus HLA-DR não foi capaz de encontrar qualquer alelo mais prevalente na população séptica. Assim, em nossa opinião, a baixa expressão de HLA-DR na membrana é um marcador de exaustão celular e não um lócus relacionado com suscetibilidade genética.

HLA-A*31 se expressa em 5 a 10% da população mundial, sendo a expressão mais elevada observada em ameríndios brasileiros (65%) e a mais baixa na população esquimó (0%). O HLA-A*31 tem sido fortemente associado com reações adversas farmacológicas induzidas pela carbamazepina na população japonesa e reconhece um antígeno codificado por carcinoma gástrico (signet ring cell carcinoma).(2626. Yasoshima T, Sato N, Hirata K, Kikuchi K. The mechanism of human autologous gastric signet ring cell tumor rejection by cytotoxic T lymphocytes in the possible context of HLA-A31 molecule. Cancer. 1995;75(6 Suppl):1484-9.,2727. Suzuki K, Sahara H, Okada Y, Yasoshima T, Hirohashi Y, Nabeta Y, et al. Identification of natural antigenic peptides of a human gastric signet ring cell carcinoma recognized by HLA-A31-restricted cytotoxic T lymphocytes. J Immunol. 1999;163(5):2783-91.) Na verdade, HLA-A*31 é um alvo para o desenvolvimento de vacina contra câncer.(2828. Takedatsu H, Shichijo S, Azuma K, Takedatsu H, Sata M, Itoh K. Detection of a set of peptide vaccine candidates for use in HLA-A31+ epithelial cancer patients. Int J Oncol. 2004;24(2):337-47.) É interessante que, quando realizamos uma pesquisa BLAST para investigar esse peptídeo, encontramos uma forte similaridade com uma proteína hipotética da Pseudomonas aeruginosa.

Mais de mil alelos de HLA-A e HLA-B foram caracterizados. Tanto a região para encaixe para peptídeo quanto os flancos são altamente variáveis.(2929. Eagle RA, Traherne JA, Ashiru O, Wills MR, Trowsdale J. Regulation of NKG2D ligand gene expression. Hum Immunol. 2006;67(3):159-69.) Seria interessante decifrar os peptídeos que se ligam ao HLA-A*31 e, dessa forma, desencadeariam sepse grave e choque séptico. Esses peptídeos podem ser proteínas autógenas ou não. A importância do cross priming na infecção bacteriana foi estudada em micro-organismos como Listeria monocytogenes e Shigella, que podem levar a um escape de fagossomo. Em contraste, Mycobacterium tuberculosis e Salmonella typhimurium puderam sobreviver com fagossomos e tiveram de sofrer processamento cruzado para iniciar respostas de CD8 dependentes de MHC-I. Células dendríticas adquirem o antígeno após pinocitose de restos de células infectadas.(3030. Kurts C, Robinson BW, Knolle PA. Cross-priming in health and disease. Nat Rev Immunol. 2010;10(6):403-14.) Os pacientes do presente estudo, contudo, não tinham infecção por esses patógenos. Notavelmente, micro-organismos como Staphylococcus aureus, Acinetobacter baumanni e beta-lactamases de espectro ampliado (ESBL) responderam por mais de 90% das infecções hospitalares no presente estudo.

O sequenciamento de ligantes a HLA a partir de uma variedade de célula apresentadora de antígeno (APCs) revelou predominantemente autoantígenos encontrados na superfície dessas células ou em seus endossomos.(3131. Hunt DF, Michel H, Dickinson TA, Shabanowitz J, Cox AL, Sakaguchi K, et al. Peptides presented to the immune system by the murine class II major histocompatibility complex molecule I-Ad. Science. 1992;256(5065):1817-20.,3232. Zhou D, Blum JS. Presentation of cytosolic antigens via MHC class II molecules. Immunol Res. 2004;30(3):279-90.) Além disso, antígenos citoplasmáticos ou nucleares responderam por 10 a 30% desses peptídeos.(3333. Dongre AR, Kovats S, deRoos P, McCormack AL, Nakagawa T, Paharkova-Vatchkova V, et al. In vivo MHC class II presentation of cytosolic proteins revealed by rapid automated tandem mass spectrometry and functional analyses. Eur J Immunol. 2001;31(5):1485-94.,3434. Dengjel J, Schoor O, Fischer R, Reich M, Kraus M, Müller M, et al. Autophagy promotes MHC class II presentation of peptides from intracellular source proteins. Proc Natl Acad Sci U S A. 2005;102(22):7922-7.)

É interessante que uma grande porção de proteínas é imediatamente degradada após a síntese, em função de fatores como transcrição ou translação defeituosa, uso alternativo do padrão de leitura, falha na montagem em complexos maiores ou modificações de ubiquitina.(3535. Schubert U, Antón LC, Gibbs J, Norbury CC, Yewdell JW, Bennink JR. Rapid degradation of a large fraction of newly synthesized proteins by proteasomes. Nature. 2000;404(6779):770-4.)

Muitas células são ligadas por junções que permitem a transferência de pequenas moléculas ou íons citosólicos para o citosol de células vizinhas. Essas moléculas e íons podem entrar na via de apresentação de antígenos das células vizinhas.(3636. Neijssen J, Herberts C, Drijfhout JW, Reits E, Janssen L, Neefjes J. Cross-presentation by intercellular peptide transfer through gap junctions. Nature. 2005;434(7029):83-8.) A maioria dos alelos HLA-B sempre carregada de peptídeos; entretanto, apenas uma parte dos alelos HLA-A e HLA-C é carregada. Foi sugerido que as moléculas de HLA que deixam de apresentar peptídeos autógenos estão mais disponíveis à chegada de peptídeos que surgem durante a infecção ou situações de estresse.(3737. Neefjes J, Jongsma ML, Paul P, Bakke O. Towards a systems understanding of MHC class I and MHC class II antigen presentation. Nat Rev Immunol. 2011;11(12):823-36.) Observou-se que diversas proteínas do mecanismo de HLA-I se associam a fagossomos. Sugeriu-se que isso seja resultado de uma fusão de membranas do retículo endoplasmático com o fagossomo durante a fagocitose.(3838. Guermonprez P, Saveanu L, Kleijmeer M, Davoust J, Van Endert P, Amigorena S. ER-phagosome fusion defines an MHC class I cross-presentation compartment in dendritic cells. Nature. 2003;425(6956):397-402.,3939. Ackerman AL, Kyritsis C, Tampé R, Cresswell P. Early phagosomes in dendritic cells form a cellular compartment sufficient for cross presentation of exogenous antigens. Proc Natl Acad Sci U S A. 2003;100(22):12889-94.)

É interessante que achados recentes demonstram que além da apresentação cruzada, células T CD8+ podem ser ativadas por meio da transferência de complexos de peptídeo classe I de HLA a partir da superfície de células infectadas para APCs não infectados, em um processo que foi denominado "cross-dressing".(4040. Wakim LM, Bevan MJ. Cross-dressed dendritic cells drive memory CD8+ T-cell activation after viral infection. Nature. 2011;471(7340):629-32.) Parece que o mecanismo envolvido nesse processo é a trogocitose. Seja qual for a origem, o HLA-A*31 é um marcador interessante para suscetibilidade à sepse e pode ajudar os médicos a se orientarem no cuidado de pacientes gravemente enfermos.

Esse estudo tem como ponto forte o fato de ser o primeiro a a demonstrar uma associação entre HLA-A*31 e risco de sepse. Além disso, ele incluiu como controles uma população homogênea de pacientes sadios, doadores de rim. Ele tem, entretanto, importantes limitações. O tamanho da amostra de pacientes sépticos foi pequeno; sim, é necessário um estudo maior para confirmar nossos dados. Além disso, não colhemos os dados demográficos dos pacientes.

É necessário que se conduzam mais investigações para investigar os mecanismos que levam a expressão de HLA-A*31 a aumentar a suscetibilidade dos pacientes à sepse. Em um futuro próximo, essa molécula pode ser um marcador útil para ajudar os médicos na identificação de pacientes com maior propensão ao desenvolvimento de infecções graves.

CONCLUSÃO

A expressão de HLA-A*31 está associada ao risco de desenvolvimento de sepse.

Contribuições dos autores

F Pinheiro da Silva e H Rodrigues planejaram a experimentação e redigiram o primeiro manuscrito. G Preuhs Filho realizou os exames. Os demais autores contribuíram para a coleta de dados e revisaram o manuscrito.

AGRADECIMENTOS

O presente estudo é parte de um estudo prospectivo de coorte planejado para armazenar dados clínicos e amostras biológicas para múltiplos projetos e foi concebido por HP Souza e LM Cruz Neto (Brazilian Initiative for Sepsis Knowledge, Projeto BRISK).

F Pinheiro da Silva recebeu apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), bolsa número 2009/17731-2.

Gostaríamos de expressar nossa gratidão aos pacientes e seus familiares por consentirem em participar deste estudo.

Temos um débito de gratidão para com Paulo Starzynski por sua grande ajuda na análise estatística.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Martin GS, Mannino DM, Eaton S, Moss M. The epidemiology of sepsis in the United States from 1979 through 2000. N Engl J Med. 2003;348(16):1546-54.
  • 2
    Cho JH, Gregersen PK. Genomics and the multifactorial nature of human autoimmune disease. N Engl J Med. 2011;365(17):1612-23.
  • 3
    Brewerton DA, Hart FD, Nicholls A, Caffrey M, James DC, Sturrock RD. Ankylosing spondylitis and HL-A 27. Lancet. 1973;1(7809):904-7.
  • 4
    Habek M, Brinar VV, Borovecki F. Genes associated with multiple sclerosis: 15 and counting. Expert Rev Mol Diagn. 2010;10(7):857-61.
  • 5
    Liu Y, Helms C, Liao W, Zaba LC, Duan S, Gardner J, et al. A genome-wide association study of psoriasis and psoriatic arthritis identifies new disease loci. PLoS Genet. 2008;4(3):e1000041.
  • 6
    Viken MK, Blomhoff A, Olsson M, Akselsen HE, Pociot F, Nerup J, et al. Reproducible association with type 1 diabetes in the extended class I region of the major histocompatibility complex. Genes Immun. 2009;10(4):323-33.
  • 7
    Fallang LE, Bergseng E, Hotta K, Berg-Larsen A, Kim CY, Sollid LM. Differences in the risk of celiac disease associated with HLA-DQ2.5 or HLA-DQ2.2 are related to sustained gluten antigen presentation. Nat Immunol. 2009;10(10):1096-101.
  • 8
    Gross D, Huber BT, Steere AC. Molecular mimicry and Lyme arthritis. Curr Dir Autoimmun. 2001;3:94-111.
  • 9
    International MHC and Autoimmunity Genetics Network, Rioux JD, Goyette P, Vyse TJ, Hammarström L, Fernando MM, Green T, et al. Mapping of multiple susceptibility variants within the MHC region for 7 immune-mediated diseases. Proc Natl Acad Sci U S A. 2009;106(44):18680-5.
  • 10
    Depla E, Van der Aa A, Livingston BD, Crimi C, Allosery K, De Brabandere V, et al. Rational design of a multiepitope vaccine encoding T-lymphocyte epitopes for treatment of chronic hepatitis B virus infections. J Virol. 2008;82(1):435-50.
  • 11
    Dangoor A, Lorigan P, Keilholz U, Schadendorf D, Harris A, Ottensmeier C, et al. Clinical and immunological responses in metastatic melanoma patients vaccinated with a high-dose poly-epitope vaccine. Cancer Immunol Immunother. 2010;59(6):863-73.
  • 12
    Sanchez-Mazas A, Fernandez-Viña M, Middleton D, Hollenbach JA, Buhler S, Di D, et al. Immunogenetics as a tool in anthropological studies. Immunology. 2011;133(2):143-64.
  • 13
    Bharadwaj M, Illing P, Theodossis A, Purcell AW, Rossjohn J, McCluskey J. Drug hypersensitivity and human leukocyte antigens of the major histocompatibility complex. Annu Rev Pharmacol Toxicol. 2012;52:401-31.
  • 14
    Trowsdale J. The MHC, disease and selection. Immunol Lett. 2011;137(1-2):1-8.
  • 15
    Bone RC, Sibbald WJ, Sprung CL. The ACCP-SCCM consensus conference on sepsis and organ failure. Chest. 1992;101(6):1481-3.
  • 16
    Rai E, Wakeland EK. Genetic predisposition to autoimmunity--what have we learned? Semin Immunol. 2011;23(2):67-83.
  • 17
    Handunnetthi L, Ramagopalan SV, Ebers GC, Knight JC. Regulation of major histocompatibility complex class II gene expression, genetic variation and disease. Genes Immun. 2010;11(2):99-112.
  • 18
    Zhang WW, Li XF, Zhang X, Li JP, Li ZQ. A novel HLA-A31 allele, A*31:22, was identified by sequence-based typing. Tissue Antigens. 2012;80(4):380-1.
  • 19
    Ji Y, Sun Y, Liu Y, Xie J, Du K. Two novel HLA-A alleles: HLA-A*31:01:09 and HLA-A*33:30. Tissue Antigens. 2011;78(3):218-9.
  • 20
    Lim AH, Song SN, Lee JY, Cho NS, Kwon SY. A novel HLA-A*31 allele, A*31:57, identified by sequence-based typing. Tissue Antigens. 2012;79(5):386-7.
  • 21
    Gouel-Chéron A, Allaouchiche B, Guignant C, Davin F, Floccard B, Monneret G; AzuRea Group. Early interleukin-6 and slope of monocyte human leukocyte antigen-DR: a powerful association to predict the development of sepsis after major trauma. PloS One. 2012;7(3):e33095.
  • 22
    Genel F, Atlihan F, Ozsu E, Ozbek E. Monocyte HLA-DR expression as predictor of poor outcome in neonates with late onset neonatal sepsis. J Infect. 2010;60(3):224-8.
  • 23
    Wu JF, Ma J, Chen J, Ou-Yang B, Chen MY, Li LF, et al. Changes of monocyte human leukocyte antigen-DR expression as a reliable predictor of mortality in severe sepsis. Crit Care. 2011;15(5):R220.
  • 24
    Monneret G, Venet F, Pachot A, Lepape A. Monitoring immune dysfunctions in the septic patient: a new skin for the old ceremony. Mol Med. 2008;14(1-2):64-78.
  • 25
    Boomer JS, To K, Chang KC, Takasu O, Osborne DF, Walton AH, et al. Immunosuppression in patients who die of sepsis and multiple organ failure. JAMA. 2011;306(23):2594-605.
  • 26
    Yasoshima T, Sato N, Hirata K, Kikuchi K. The mechanism of human autologous gastric signet ring cell tumor rejection by cytotoxic T lymphocytes in the possible context of HLA-A31 molecule. Cancer. 1995;75(6 Suppl):1484-9.
  • 27
    Suzuki K, Sahara H, Okada Y, Yasoshima T, Hirohashi Y, Nabeta Y, et al. Identification of natural antigenic peptides of a human gastric signet ring cell carcinoma recognized by HLA-A31-restricted cytotoxic T lymphocytes. J Immunol. 1999;163(5):2783-91.
  • 28
    Takedatsu H, Shichijo S, Azuma K, Takedatsu H, Sata M, Itoh K. Detection of a set of peptide vaccine candidates for use in HLA-A31+ epithelial cancer patients. Int J Oncol. 2004;24(2):337-47.
  • 29
    Eagle RA, Traherne JA, Ashiru O, Wills MR, Trowsdale J. Regulation of NKG2D ligand gene expression. Hum Immunol. 2006;67(3):159-69.
  • 30
    Kurts C, Robinson BW, Knolle PA. Cross-priming in health and disease. Nat Rev Immunol. 2010;10(6):403-14.
  • 31
    Hunt DF, Michel H, Dickinson TA, Shabanowitz J, Cox AL, Sakaguchi K, et al. Peptides presented to the immune system by the murine class II major histocompatibility complex molecule I-Ad. Science. 1992;256(5065):1817-20.
  • 32
    Zhou D, Blum JS. Presentation of cytosolic antigens via MHC class II molecules. Immunol Res. 2004;30(3):279-90.
  • 33
    Dongre AR, Kovats S, deRoos P, McCormack AL, Nakagawa T, Paharkova-Vatchkova V, et al. In vivo MHC class II presentation of cytosolic proteins revealed by rapid automated tandem mass spectrometry and functional analyses. Eur J Immunol. 2001;31(5):1485-94.
  • 34
    Dengjel J, Schoor O, Fischer R, Reich M, Kraus M, Müller M, et al. Autophagy promotes MHC class II presentation of peptides from intracellular source proteins. Proc Natl Acad Sci U S A. 2005;102(22):7922-7.
  • 35
    Schubert U, Antón LC, Gibbs J, Norbury CC, Yewdell JW, Bennink JR. Rapid degradation of a large fraction of newly synthesized proteins by proteasomes. Nature. 2000;404(6779):770-4.
  • 36
    Neijssen J, Herberts C, Drijfhout JW, Reits E, Janssen L, Neefjes J. Cross-presentation by intercellular peptide transfer through gap junctions. Nature. 2005;434(7029):83-8.
  • 37
    Neefjes J, Jongsma ML, Paul P, Bakke O. Towards a systems understanding of MHC class I and MHC class II antigen presentation. Nat Rev Immunol. 2011;11(12):823-36.
  • 38
    Guermonprez P, Saveanu L, Kleijmeer M, Davoust J, Van Endert P, Amigorena S. ER-phagosome fusion defines an MHC class I cross-presentation compartment in dendritic cells. Nature. 2003;425(6956):397-402.
  • 39
    Ackerman AL, Kyritsis C, Tampé R, Cresswell P. Early phagosomes in dendritic cells form a cellular compartment sufficient for cross presentation of exogenous antigens. Proc Natl Acad Sci U S A. 2003;100(22):12889-94.
  • 40
    Wakim LM, Bevan MJ. Cross-dressed dendritic cells drive memory CD8+ T-cell activation after viral infection. Nature. 2011;471(7340):629-32.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2013

Histórico

  • Recebido
    26 Set 2013
  • Aceito
    31 Out 2013
Associação de Medicina Intensiva Brasileira - AMIB Rua Arminda, 93 - Vila Olímpia, CEP 04545-100 - São Paulo - SP - Brasil, Tel.: (11) 5089-2642 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbti.artigos@amib.com.br