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Efeitos da manipulação da sensibilidade plantar sobre o controle da postura ereta em adultos jovens e idosos

RESUMO

Introdução:

Pessoas com perdas sensoriais apresentam déficits de equilíbrio. Embora esse quadro seja comum em idosos, ainda se discute o quanto idosos sem doenças que afetam as vias sensoriais dependem dessa informação para controlar oscilações corporais durante o controle da postura.

Objetivo:

Investigar os efeitos da perturbação da sensibilidade plantar sobre o controle da postura ereta em adultos jovens e idosos independentes (n = 19/grupo).

Métodos:

A sensibilidade plantar foi avaliada com estesiômetro e dados de velocidade e deslocamento do centro de pressão durante a postura de pé foram avaliados para cada pé com um baropodômetro, em condições de olhos abertos e fechados. O grupo de adultos jovens foi avaliado quanto ao centro de pressão nas condições normal e pós-perturbação da sensibilidade plantar, pela imersão dos pés em água e gelo.

Resultados:

Adultos não apresentaram alterações no centro de pressão em resposta à perturbação sensorial e tiveram, mesmo na condição de perturbação sensorial, melhor controle postural do que idosos. Idosos apresentaram menor sensibilidade plantar e maior oscilação do centro de pressão do que os adultos jovens.

Conclusão:

Idosos pareceram depender mais da sensibilidade plantar para manter o controle postural do que adultos jovens. Em idosos, intervenções clínicas que melhorem a sensibilidade plantar podem auxiliar na tarefa de manter a postura de pé.

Palavras-chave:
Controle postural; Equilíbrio; Centro de pressão; Estabilidade; Envelhecimento

ABSTRACT

Introduction:

Subjects with sensorial losses present balance deficits. Although such condition is often observed among elderly, there is discussion concerning the dependence on sensorial information for body sway control in the elderly without sensorial losses.

Purpose:

We investigated the effects of foot sensitivity manipulation on postural control during upright standing in young adults and independent elderly (n = 19/group).

Methods:

Plantar sensitivity was evaluated by esthesiometry, and speed of center of pressure shift data during upright posture were evaluated for each foot using a baropodometer while the subjects were standing with eyes open or closed. The young adult group was evaluated for center of pressure in normal conditions and after plantar sensitivity disturbance, by immersing their feet in water and ice.

Results:

Young adults did not show alterations in their center of pressure after sensorial perturbation and presented, even under sensorial perturbation, better postural control than elderly subjects. The elderly showed lower foot sensitivity and greater center of pressure oscillation than young adults.

Conclusion:

Elderly subjects seem to rely more on foot sensitivity for control of body sway than young adults. In the elderly, a clinical intervention to improve foot sensitivity may help in upright posture maintenance.

Keywords:
Postural control; Balance; Center of pressure; Stability; Aging

Introdução

O controle da postura em pé é uma habilidade requerida diariamente e que depende de ajustes neuromusculares constantes para manter o centro de pressão (CoP) dentro dos limites de estabilidade da base de suporte.11 Winter D. Biomechanics and motor control of human movement. 4ª ed. John Wiley & Sons; 1990. p. 370. Tais ajustes são deteriorados pelo aumento da idade.22 Freitas SM, Wieczorek SA, Marchetti PH, Duarte M. Age-related changes in human postural control of prolonged standing. Gait Posture. 2005;22(4):322-30. Uma das razões para esses déficits pode ser a perda da função sensorial ou da capacidade de uso dessa informação sensorial. Quando submetidos a situações nas quais funções proprioceptivas dos pés e tornozelo são prejudicadas, adultos jovens apresentam menor comprimento e área de deslocamento do CoP do que idosos, o que sugere melhor capacidade de compensar as perdas sensoriais.33 Ueda LS, Carpes FP. Relação entre sensibilidade plantar e controle postural em jovens e idosos. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2013;15(2):215-24.,44 Schlee G, Sterzing T, Milani TL. Foot sole skin temperature affects plantar foot sensitivity. Clin Neurophysiol. 2009;120(8):1548-611.

Billot et al.55 Billot M, Handrigan GA, Simoneau M, Corbeil P, Teasdale N. Short term alteration of balance control after a reduction of plantar mechanoreceptor sensation through cooling. Neurosci Lett. 2013;535:40-4. sugerem que a sensibilidade plantar não é uma função primordial para o controle postural em adultos, visto que essa informação pode ser compensada por outras vias proprioceptivas, como, por exemplo, a visão ou o sistema vestibular. Entretanto, o controle postural parece estar relacionado com a sensibilidade plantar em idosos, na qual outros sistemas também apresentam déficits em resposta ao aumento da idade, como, por exemplo, perdas na função do sistema vestibular, visão e força muscular.33 Ueda LS, Carpes FP. Relação entre sensibilidade plantar e controle postural em jovens e idosos. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2013;15(2):215-24. Ducic et al.66 Ducic I, Short KW, Dellon AL. Relationship between loss of pedal sensibility, balance, and falls in patients with peripheral neuropathy. Ann Plast Surg. 2004;52(6):535-610. mostraram que a sensibilidade plantar reduzida relaciona-se com déficits no controle postural em idosos que apresentam neuropatia periférica. Além disso, a sensibilidade plantar contribui para o controle da pressão plantar durante a postura de pé de idosos.77 Zhang S, Li L. The differential effects of foot sole sensory on plantar pressure distribution between balance and gait. Gait Posture. 2013;37(4):532-7. Isso ajuda a explicar o fato de idosos, por vezes, terem maior dependência da visão, sobretudo para o controle da velocidade do CoP, do que adultos jovens.88 Prieto TE, Myklebust JB, Hoffmann RG, Lovett EG, Myklebust BM. Measures of postural steadiness: differences between healthy young and elderly adults. IEEE Trans Biomed Eng. 1996;43(9):956-966. Contudo, ainda se discute o quanto que esse tipo de informação sensorial proveniente da região plantar contribui para a regulação do controle postural em idosos saudáveis.

Estudos experimentais desenvolveram protocolos que diminuem, temporariamente, a função sensorial de adultos, como, por exemplo, a atividade dos mecanorreceptores, a fim de mimetizar o declínio sensorial do envelhecimento e permitir um comparativo entre esse recurso aferente íntegro com o prejudicado. Uma estratégia que se mostrou válida em alguns estudos é a imersão dos membros inferiores em água e gelo, a fim de reduzir a sensibilidade plantar, a capacidade de discriminação de dois pontos ao toque e a sensibilidade à vibração.99 Stal F, Fransson PA, Magnusson M, Karlberg M. Effects of hypothermic anesthesia of the feet on vibration-induced body sway and adaptation. J Vestib Res. 2003;13(1):39-41.

Neste estudo, nosso objetivo foi verificar alterações na posição do CoP sobre cada um dos pés, considerado como um indicador do controle postural em idosos e em adultos jovens em condição sensorial normal e em resposta a perturbação da sensibilidade. Tendo em vista que o envelhecimento pode promover prejuízos heterogêneos nos diferentes componentes sensoriomotores (cognitivos, processamentos sensoriais e perceptuais),1010 Anguera JA, Gazzaley A. Dissociation of motor and sensory inhibition processes in normal aging. Clin Neurophysiol. 2012;123(4):730-40. nossa hipótese foi que a diminuição de sensibilidade plantar teria impacto diferente para idosos em comparação com os adultos jovens, pois adultos jovens teriam a capacidade de regular satisfatoriamente o CoP, mesmo sob a condição de perturbação nas características sensoriais dos pés.

Material e métodos

Participantes

Trinta e oito participantes convidados da comunidade local foram separados em dois grupos, pareados pela estatura e massa corporal. O grupo de adultos jovens incluiu 19 sujeitos com média (desvio padrão) de 35 (5) anos, estatura de 1,65 (0,08) m e massa corporal de 63 (10) kg. O grupo idoso foi composto por 19 idosos independentes com média (desvio padrão) de 79 (6) anos, estatura de 1,55 (0,05) m e massa corporal de 68 (9) kg. O grupo de adultos jovens foi avaliado em duas condições, uma pré e uma pós- perturbação sensorial, formaram-se três grupos na análise final: adultos sem perturbação sensorial, adultos pós-perturbação sensorial e idosos. Todos os participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido de acordo com a Declaração de Helsinque e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da instituição local (parecer 082011). Todos os participantes deveriam ter condições físicas para deambular e manter-se de pé sem uso de órtese ou prótese e ter disponibilidade para uma visita ao laboratório a fim de fazer as avaliações e concordar com o termo de consentimento livre e esclarecido. Os critérios de exclusão abrangeram presença de doenças cerebelares, lesões cutâneas plantares, história de lesões traumática em membros inferiores, neuropatias ou inabilidade de fazer as tarefas propostas.

Avaliação da sensibilidade plantar

Antes de iniciar a avaliação da sensibilidade plantar, os participantes tiveram 10 minutos de descanso sentados em uma cadeira. A sensibilidade plantar foi avaliada em um protocolo clínico com estesiômetro de pressão de Semmes-Weinstein (Semmes-Weinstein Monofilaments, San Jose, EUA).1111 Perry SD. Evaluation of age-related plantar-surface insensitivity and onset age of advanced insensitivity in older adults using vibratory and touch sensation tests. Neurosci Lett. 2006;392(1–2):62-7.,1212 Patel M. Foam posturography: standing on foam is not equivalent to standing with decreased rapidly adapting mechanoreceptive sensation. Exp Brain Res. 2011;208(4):519-25. O estesiômetro era composto por seis filamentos de nylon de igual comprimento (fig. 1A), com variados diâmetros, que produziam uma pressão padronizada sobre a superfície da pele (considerando seis valores entre 0.05 gf e 300 gf) de acordo com a calibração e recomendação para uso.1313 Holewski JJ, Stess RM, Graf PM, Grunfeld C. Aesthesiometry: quantification of cutaneous pressure sensation in diabetic peripheral neuropathy. J Rehabil Res Dev. 1988;25(2):1-10.

Figura 1
Ilustração dos pontos onde a sensibilidade plantar foi avaliada e do estesiômetro empregado no estudo.

Todos os participantes foram avaliados com os olhos vendados, na posição supina, em um ambiente silencioso e livre de distrações. Todos foram avaliados pelo mesmo avaliador. A sensibilidade plantar foi avaliada em nove locais do pé (fig. 1A) em ordem randomizada, assim como o primeiro pé a ser avaliado foi alternado para cada participante. Os participantes relatavam na palma da mão a região onde percebiam o estímulo tátil nos pés. Todas as avaliações foram feitas no mesmo período do dia. A sensibilidade plantar foi determinada pela aplicação de filamentos mais finos aos mais grossos até que o participante pudesse ser capaz de detectar o toque.1414 Feng Y, Schlosser FJ, Sumpio BE. The Semmes Weinstein monofilament examination as a screening tool for diabetic peripheral neuropathy. J Vasc Surg. 2009;50(3):675-682. Os toques eram feitos durante um segundo e em duas repetições de forma que o filamento tomasse a forma de C.

Cada filamento correspondia a uma classificação baseada em suas cores, na qual verde e azul correspondiam à sensibilidade normal; violeta uma dificuldade de discriminação de forma e temperatura; vermelho denotava discreta perda de sensação protetora, vulnerável a lesões; laranja uma leve perda da sensação protetora; rosa significava perda da sensação protetora e nenhuma resposta.

Para determinar a sensibilidade de todo o pé foi feita a soma dos valores de cada região. Assim, quanto maior o escore, menor a sensibilidade plantar.

Avaliação do controle postural

A aquisição de dados para avaliação do CoP foi feita durante a postura de pé, com apoio bipodal, com os pés posicionados em abdução de 30°,1515 Azzi NM, Coelho DB, Teixeira LA. Efeito da posição dos pés na recuperação do equilíbrio após perturbação. Anais do V SNA. 2014;1:88-93. com calcanhares afastados 5 cm e braços relaxados ao longo do tronco, em duas situações: (a) olhando em direção a um ponto fixo disposto quatro metros à frente e na altura dos olhos; (b) com os olhos fechados.33 Ueda LS, Carpes FP. Relação entre sensibilidade plantar e controle postural em jovens e idosos. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2013;15(2):215-24.

Para cada condição visual foram feitas três tentativas de 30 s cada, a primeira condição foi alternada entre olhos abertos e fechados a cada participante avaliado. Um intervalo de 30 s entre as tentativas foi feito para todos os participantes. Os dados de CoP foram coletados para cada pé com um baropodômetro (Tekscan Inc., Boston, MA), com taxa de amostragem de 100 Hz. Foram determinadas as seguintes variáveis: velocidade média do CoP (CoPvel), amplitude anteroposterior (CoPap) e mediolateral (CoPml) e considerou-se a área de contato de cada pé com a superfície.

Perturbação da sensibilidade plantar

O protocolo de perturbação da sensibilidade plantar foi aplicado apenas aos participantes adultos jovens e teve o objetivo de simular a diminuição sensorial na região dos pés comum em idosos. O protocolo de perturbação foi conduzido por meio de hipotermia, similar ao usado previamente.99 Stal F, Fransson PA, Magnusson M, Karlberg M. Effects of hypothermic anesthesia of the feet on vibration-induced body sway and adaptation. J Vestib Res. 2003;13(1):39-41.,1616 Kunzler MR, Lopes LM, Ueda LS, de Britto MA, Carpes FP. Does skin stimulation compensate impairments in postural control after ankle plantar flexors fatigue? Gait Posture. 2013;37(4):611-615. Para a geração da perturbação quanto às informações sensoriais na planta dos pés os participantes fizeram o protocolo confortavelmente sentados e mantiveram os pés em imersão em um reservatório com água e gelo, em uma temperatura controlada entre 5 °C e 8 °C, durante 15 minutos.33 Ueda LS, Carpes FP. Relação entre sensibilidade plantar e controle postural em jovens e idosos. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2013;15(2):215-24. Para a avaliação do CoP após a imersão em gelo, os participantes se moveram da posição descrita imediatamente para a posição em pé sobre o baropodômetro.

Análise dos dados

Os dados foram agrupados em média e desvio-padrão para cada grupo. Foi verificada a normalidade dos dados com o teste de Shapiro-Wilk. A sensibilidade plantar foi comparada entre o pé direito e esquerdo de adultos por meio do teste t pareado e em idosos com o teste de Wilcoxon. O teste t independente foi usado para comparação entre os grupos. Para análise de assimetrias e efeito da visão nos dados de CoP, foi usado o teste de Wilcoxon para todos os grupos e condições. A partir das medidas do CoP, os grupos de adultos jovens, adultos jovens pós-perturbação sensorial e idosos foram comparados por meio de análise de variância com post hoc de Bonferroni. Todos os testes consideraram um nível de significância de 0,05.

Resultados

O teste de normalidade para sensibilidade evidenciou distribuição paramétrica em adultos para perna direita (p = 0,064) e esquerda (p = 0,177). Já em idosos foi observada uma distribuição paramétrica para a perna direita (p = 0,175) e não paramétrica para a perna esquerda (p = 0,018). Os dados de sensibilidade foram analisados apenas para o pé direito, visto que não foram encontradas assimetrias nessas observações em adultos jovens [t(18) = -0,529; p = 0,603] e idosos [Z = -0,393; p = 0,694]. Os resultados de sensibilidade plantar demonstraram que adultos apresentaram melhor sensibilidade que idosos, para ambos os pés (tabela 1). Quanto à análise do CoP (fig. 2), foi verificado que as condições com olhos abertos e com olhos fechados não alteraram nenhuma variável do CoP, bem como não houve assimetrias (fig. 3). Assim, as comparações posteriores foram feitas com os dados das análises das tentativas com olhos abertos e dados do pé direito.

Tabela 1
Escores de sensibilidade plantar (dados expressos em média e desvio-padrão) em cada pé. O somatório de todos os pontos de cada pé representa a sensibilidade do pé inteiro. Maiores valores representam pior sensibilidade

Figura 2
Valores de amplitude do CoP nos sentidos anteroposterior (COPap) e mediolateral (COPml), em centímetros, no eixo vertical esquerdo, e a velocidade do COP (COPvel) em milímetros por segundo (mm/s) no eixo vertical direito para cada grupo (n-19 por grupo). * Indica diferença estatisticamente significativa entre os grupos confirmada por análise de variância com post hoc de Bonferroni (p < 0,05).
Figura 3
Média e desvio padrão da amplitude anteroposterior do centro de pressão (COPap), amplitude mediolateral do centro de pressão (COPml) em centímetros e velocidade de deslocamento do centro de pressão (COPvel) para cada grupo (n = 19 por grupo) em milímetros por segundo (mm/s). A coluna da esquerda (coluna A) apresenta valores para ambos os pés, D indica pé direito e E indica pé esquerdo. Na coluna da direita (coluna B) são apresentados valores para condições visuais de olhos abertos (OA) e olhos fechados (OF). Para ambas as análises de comparac¸ão entre pé direito e esquerdo foi empregado o teste de Wilcoxon considerando nível de significância de 0,05.

Na análise da amplitude de deslocamento do CoP não foi observado um efeito de grupo na direção anteroposterior [F(2) = 2,348; p = 0,105]. Já nas avaliações do deslocamento do CoP na direção mediolateral, um efeito de grupo foi observado [F(2) = 5,622; p = 0,006]. As análises de post-hoc indicaram similaridade entre adultos jovens e adultos jovens após perturbação sensorial (p = 1.000). No entanto, idosos apresentaram maior deslocamento mediolateral do CoP do que adultos jovens (p = 0,017) e adultos jovens após perturbação sensorial (p = 0,015).

Da mesma forma, observamos um efeito do grupo para a velocidade do CoP [F(2) = 7,587; p = 0,001]. A análise de post-hoc indicou que o grupo de adultos jovens após perturbação sensorial não diferiu da condição sem perturbação sensorial (p = 1,00). Entretanto, adultos jovens antes da perturbação (p = 0,006) e após perturbação da sensibilidade plantar (p = 0,003) apresentaram valores menores do que idosos.

Discussão

Ao procurar simular em adultos jovens a diminuição da sensibilidade plantar que idosos experimentam, fizemos um protocolo de perturbação da sensibilidade plantar em adultos jovens. Embora esse mesmo protocolo de perturbação sensorial tenha gerado alterações na sensibilidade plantar de adultos em um estudo prévio,33 Ueda LS, Carpes FP. Relação entre sensibilidade plantar e controle postural em jovens e idosos. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2013;15(2):215-24.,99 Stal F, Fransson PA, Magnusson M, Karlberg M. Effects of hypothermic anesthesia of the feet on vibration-induced body sway and adaptation. J Vestib Res. 2003;13(1):39-41. o impacto dessa perturbação aguda não pode ser considerado igual ao que é experimentado pelos idosos, nos quais esses déficits estão presentes de maneira contínua e progressiva.1111 Perry SD. Evaluation of age-related plantar-surface insensitivity and onset age of advanced insensitivity in older adults using vibratory and touch sensation tests. Neurosci Lett. 2006;392(1–2):62-7. Contudo, essa não é uma limitação particular de nosso estudo, mas de todos que buscam investigar esse tipo de questão. Adicionalmente, as diferenças podem depender também da capacidade dos adultos de usar informações advindas de outras vias aferentes, possivelmente o sistema vestibular, para controle do CoP.1717 Yasuda T, Nakagawa T, Inoue H, Iwamoto M, Inokuchi A. The role of the labyrinth, proprioception and plantar mechanosensors in the maintenance of an upright posture. Eur Arch Otorhinolaryngol. 1999;256(1):27-32.

Não foram encontradas assimetrias entre os pés na sensibilidade e nem na oscilação do CoP, o que indica que os participantes avaliados não demonstraram influência de lateralização funcional em uma tarefa simples como é o protocolo proposto. A privação da informação visual e a alteração na sensibilidade plantar não acarretaram mudanças nos padrões de controle postural mensurados em adultos jovens. Apesar disso, alguns achados da literatura indicam que sujeitos de todas as idades dependem da sensibilidade plantar para manter o equilíbrio na postura em pé e o avançar da idade leva ao aumento da oscilação corporal.1818 Lord SR, Ward JA. Age-associated differences in sensori-motor function and balance in community dwelling women. Age Ageing. 1994;23(6):452-60. Ueda et al.33 Ueda LS, Carpes FP. Relação entre sensibilidade plantar e controle postural em jovens e idosos. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2013;15(2):215-24. encontraram aumento no deslocamento do CoP anteroposterior de todo o corpo em idosos em comparação com adultos jovens e nossa avaliação do CoP para cada pé mostrou que a amplitude mediolateral do CoP é maior em idosos do que em adultos, com ou sem perturbação sensorial. Esse resultado é pertinente, uma vez que a medida da amplitude mediolateral é importante para predizer o risco de quedas em idosos.1919 Brauer S, Burns Y, Galley P. Lateral reach: a clinical measure of medio-lateral postural stability. Physiother Res Int. 1999;4(2):81-8. Nosso resultado é um indicador de vulnerabilidade a quedas em idosos com sensibilidade plantar comprometida. O mesmo aconteceu com a velocidade do CoP, que se manteve maior em idosos do que em adultos jovens antes e depois da perturbação sensorial. Isso significa pior desempenho no controle da postura de pé. Essa variável é descrita por Hewson et al.2020 Hewson DJ, Singh NK, Snoussi H, Duchene J. Classification of elderly as fallers and non-fallers using Centre of Pressure velocity. IEEE Trans Biomed Eng. 2010;2010:3678-81. como útil na classificação de idosos com e sem risco de quedas. Mais uma vez, encontramos uma variável que pode indicar a influência negativa da redução da sensibilidade sobre a estabilidade de idosos.

Nossos resultados corroboram os achados de um estudo recente2121 Billot M, Handrigan GA, Simoneau M, Teasdale N. Reduced plantar sole sensitivity induces balance control modifications to compensate ankle tendon vibration and vision deprivation. Physiother Res Int. 2014;25(1):155-60. que também não encontrou aumento nos deslocamentos do CoP quando a informação visual não estava disponível ou perturbação da sensibilidade dos pés de adultos.2222 Hafstrom A, Fransson PA, Karlberg M, Ledin T, Magnusson M. Visual influence on postural control, with and without visual motion feedback. Acta Otolaryngol. 2002;122(4):392-9. Esse estudo recente demonstrou que o resfriamento da planta do pé não altera o controle do equilíbrio mesmo quando a visão está ou não disponível. Em nosso estudo, mesmo quando a informação visual estava indisponível e perturbamos a informação sensorial da planta do pé, os adultos jovens continuaram tendo melhor controle postural do que idosos. Isso pode ser explicado pela possibilidade de em adultos a diminuição da temperatura da região plantar induzir um reajuste no uso da informação sensorial na busca da preservação do controle postural frente aos déficits experimentados e dar especial atenção a outras vias aferentes, como a informação vestibular.2121 Billot M, Handrigan GA, Simoneau M, Teasdale N. Reduced plantar sole sensitivity induces balance control modifications to compensate ankle tendon vibration and vision deprivation. Physiother Res Int. 2014;25(1):155-60.

Yasuda et al.1717 Yasuda T, Nakagawa T, Inoue H, Iwamoto M, Inokuchi A. The role of the labyrinth, proprioception and plantar mechanosensors in the maintenance of an upright posture. Eur Arch Otorhinolaryngol. 1999;256(1):27-32. destacam que o principal mecanismo que contribui para o controle da postura ortostática é o sistema labiríntico. Sabendo que esse sistema apresenta-se prejudicado com o avanço da idade,2323 Matheson AJ, Darlington CL, Smith PF. Dizziness in the elderly and age-related degeneration of the vestibular system. NZ J Psychol. 1999;28(1):10-16. pode-se inferir que adultos obtenham melhores valores de controle postural do que idosos porque, mesmo com a privação da visão e com perturbação da sensibilidade plantar, mantinham um sistema de ajuste corporal em melhores condições. Por outro lado, sabendo que problemas vestibulares são uma das mais frequentes causas de tonturas e desequilíbrios em idosos2424 Iwasaki S, Yamasoba T. Dizziness and imbalance in the elderly: age-related decline in the vestibular system. Aging Disease. 2015;6(1):38-47. e considerando que a perda da sensibilidade plantar de idosos tem relação com a maior oscilação do CoP, pode-se sugerir que intervenções que busquem manter ou reduzir perdas na sensibilidade plantar podem auxiliar na manutenção do equilíbrio postural ao compensar distúrbios no CoP sob o efeito agudo da perturbação. Não avaliamos a sensibilidade pós-hipotermia, pois estudos demonstram que o efeito da imersão dos pés em água e gelo sobre o controle postural pode ser compensado pouco tempo após o fim da imersão.99 Stal F, Fransson PA, Magnusson M, Karlberg M. Effects of hypothermic anesthesia of the feet on vibration-induced body sway and adaptation. J Vestib Res. 2003;13(1):39-41. Avaliar a sensibilidade após a imersão em água e gelo poderia requerer um tempo que anularia os efeitos de alteração sensorial que buscávamos. Por outro lado, existem outros estudos que indicam que esse tipo de protocolo é eficaz na perturbação da sensibilidade plantar.1212 Patel M. Foam posturography: standing on foam is not equivalent to standing with decreased rapidly adapting mechanoreceptive sensation. Exp Brain Res. 2011;208(4):519-25.,2525 Douglas M, Bivens S, Pesterfield J, Clemson N, Castle W, Sole G, et al. Immediate effects of cryotherapy on static and dynamic balance. Int J Sports Phys Ther. 2013;8(1):9-14. Consideramos em nosso estudo a medida do CoP em cada um dos pés, pois a medida da sensibilidade plantar é feita em cada um dos pés. Embora essa não possa ser uma limitação em nossa discussão, nosso procedimento ainda deixa espaço para uma investigação que também monitore o deslocamento do centro de gravidade e permita uma visão mais geral da estabilidade postural em resposta a perturbações na sensibilidade plantar.

Conclusão

Idosos e adultos jovens diferem em relação à dependência da sensibilidade plantar para a manutenção da postura de pé com base em medidas do CoP. A informação sensorial da planta dos pés parece mais importante para idosos. É possível que intervenções clínicas que melhorem a sensibilidade plantar de idosos possam contribuir para melhorar o controle da postura ortostática.

  • Financiamento
    Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (Fapergs), processo 1013100.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2017

Histórico

  • Recebido
    25 Ago 2015
  • Aceito
    24 Nov 2015
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