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As decisões de tratamento com DMARD na artrite reumatoide parecem ser influenciadas pela fibromialgia

Resumo

Objetivo:

Comparar o uso de fármacos antirreumáticos modificadores da doença (DMARD) em pacientes com e sem fibromialgia (FM) ao longo do tempo, incluindo as taxas de tratamento excessivo e subtratamento em ambos os grupos.

Métodos:

Estudo de coorte prospectiva com pacientes atendidos em um ambulatório de artrite reumatoide (AR). Os participantes foram recrutados consecutivamente entre março de 2006 e junho de 2007 e foram seguidos até dezembro de 2013. Compararam-se os dados de uso de DMARD (prevalências, doses e taxas de escalonamento), 28-Joint Disease Activity Score (DAS28), Health Assessment Questionnaire (HAQ) e progressão radiográfica entre pacientes com e sem FM. Os cenários clínicos de tratamento supostamente incorreto foram identificados e comparados entre os grupos.

Resultados:

Seguiram-se 256 pacientes com AR (32 com FM) por 6,2 ± 2,0 (média ± DP) anos, período que abrangeu 2.986 consultas. No início do estudo, a duração da AR era de 11,1 ± 7,4 anos. O DAS28 e o HAQ foram maiores no grupo AR com FM e estavam mais próximos do grupo AR sem FM no fim do estudo. Os pacientes com AR com FM usaram doses mais altas de antidepressivos tricíclicos, leflunomida e prednisona e doses mais baixas de metotrexato. Quando comparados com os pacientes com AR sem FM, os participantes com AR e FM usaram mais frequentemente antidepressivos tricíclicos, leflunomida, prednisona e analgésicos contínuos e menos frequentemente metotrexato. Os grupos apresentaram sobrevida em sete anos sem agentes biológicos e livres de progressão radiográfica semelhantes na regressão Cox. Os pacientes com AR com FM apresentaram uma maior proporção de consultas em cenários de tratamento supostamente incorreto quando comparados com os pacientes com AR sem FM (28,4 vs. 19,8%, p < 0,001).

Conclusões:

Os pacientes com AR e FM usaram mais leflunomida e prednisona e o tratamento supostamente incorreto na AR foi mais frequente em pacientes com FM. Os pacientes com AR com FM certamente se beneficiarão de uma estratégia personalizada de tratamento por metas (T2 T), incluindo ultrassonografia (quando apropriado) e controle da FM.

Palavras-chave
Fibromialgia; Artrite reumatoide; Tratamento farmacológico

Abstract

Objective:

To compare DMARD use in patients with and without FM over time, including overtreatment and undertreatment rates in both groups.

Methods:

A prospective cohort study with patients attending an RA outpatient clinic was conducted. Participants were consecutively recruited between March 2006 and June 2007 and were followed through December 2013. Data on DMARD use (prevalences, doses and escalation rates), DAS28, HAQ and radiographic progression were compared among RA patients with FM and without FM. Mistreatment clinical scenarios were allegedly identified and compared between groups.

Results:

256 RA patients (32 with FM) were followed for 6.2 ± 2.0 (mean ± SD) years comprising 2986 visits. At baseline, RA duration was 11.1 ± 7.4 years. DAS28 and HAQ were greater in RA with FM group, and were closer to RA without FM group towards the end. RA patients with FM used higher doses of tricyclic antidepressants, leflunomide and prednisone, and lower doses of methotrexate. When compared to RA patients without FM, participants with RA and FM used more often tricyclic antidepressants, leflunomide, prednisone, continuous analgesics and less often methotrexate. Groups presented similar 7-year biologic-free survival, and radiographic progression-free survival in Cox regression. RA patients with FM had greater proportions of visits in mistreatment scenarios when compared to RA patients without FM (28.4 vs. 19.8%, p < 0.001).

Conclusions:

RA patients with FM used more leflunomide and prednisone, and RA mistreatment was more frequent in FM patients. Certainly, RA patients with FM will benefit from a personalized T2T strategy, including ultrasound (when suitable) and proper FM treatment.

Keywords:
Fibromyalgia; Rheumatoid arthritis; Drug therapy

Introdução

A artrite reumatoide (AR) é uma doença autoimune sistêmica caracterizada por poliartrite destrutiva crônica que pode causar incapacidade funcional grave e morte.11 Scott DL, Wolfe F, Huizinga TW. Rheumatoid arthritis. Lancet. 2010;376:1094-108. Para deter a destruição articular e evitar desfechos piores, os médicos devem usar fármacos antirreumáticos modificadores da doença (DMARD) em uma estratégia que envolve tratar até alcançar o objetivo (treat-to-target, T2 T). Nessa estratégia, almeja-se alcançar uma menor atividade da doença. Pode-se estimar clinicamente o nível de atividade da doença11 Scott DL, Wolfe F, Huizinga TW. Rheumatoid arthritis. Lancet. 2010;376:1094-108.

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-33 Smolen JS, Aletaha D, Bijlsma JW, Breedveld FC, Boumpas D, Burmester G, et al. Treating rheumatoid arthritis to target: recommendations of an international task force. Ann Rheum Dis. 2010;69:631-7. pelo 28-Joint Disease Activity Score (DAS28), um escore que inclui parâmetros objetivos (número de articulações inchadas e velocidade de hemossedimentação) e subjetivos (número de articulações dolorosas e avaliação global da saúde do paciente com o uso de uma escala visual analógica).44 Salaffi F, Carotti M, Ciapetti A, Gasparini S, Filippucci E, Grassi W. Relationship between time-integrated disease activity estimated by DAS28-CRP and radiographic progression of anatomical damage in patients with early rheumatoid arthritis. BMC Musculoskel Disord. 2011;12:120.,55 Vermeer M, Kuper HH, Moens HJ, Drossaers-Bakker KW, van der Bijl AE, van Riel PL, et al. Sustained beneficial effects of a protocolized treat-to-target strategy in very early rheumatoid arthritis: three-year results of the Dutch Rheumatoid Arthritis Monitoring remission induction cohort. Arthritis Care Res. 2013;65:1219-26.

A fibromialgia (FM) é uma condição dolorosa crônica que afeta até 20% dos pacientes com AR. A FM pode falsamente aumentar a atividade da AR, elevar os componentes subjetivos do DAS28 e, portanto, impor um viés sobre a decisão de tratamento. Tanto o tratamento excessivo (escalonar os DMARD quando o DAS28 mais alto é decorrente da FM) quanto o subtratamento (não escalonar os DMARD quando um DAS28 mais alto é decorrente da AR) são possíveis.66 Ranzolin A, Brenol JC, Bredemeier M, Guarienti J, Rizzatti M, Feldman D, et al. Association of concomitant fibromyalgia with worse disease activity score in 28 joints, health assessment questionnaire, and short form 36 scores in patients with rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum. 2009;61:794-800.

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-1010 Ton E, Bakker MF, Verstappen SM, Ter Borg EJ, van Albada-Kuipers IA, Schenk Y, et al. Look beyond the disease activity score of 28 joints (DAS28): tender points influence the DAS28 in patients with rheumatoid arthritis. J Rheumatol. 2012;39:22-7.

O principal objetivo deste estudo é comparar o uso de DMARD em pacientes com e sem FM ao longo do tempo. Além disso, pretende-se comparar as taxas de sobretratamento e subtratamento em ambos os grupos.

Método

Foi feito um estudo de coorte prospectivo com pacientes atendidos no ambulatório de AR do Hospital de Clínicas de Porto Alegre desde o início de uso dos DMARD biológicos na instituição. Os participantes foram recrutados consecutivamente entre março de 2006 e junho de 2007 e foram seguidos até dezembro de 2013. Para ser incluído no estudo, o paciente precisava atender aos critérios de classificação para AR do American College of Rheumatology (ACR) de 1987.1111 Arnett FC, Edworthy SM, Bloch DA, McShane DJ, Fries JF, Cooper NS, et al. The American Rheumatism Association 1987 revised criteria for the classification of rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum. 1988;31:315-24. Cada participante também era avaliado no início do estudo quanto ao diagnóstico de FM, de acordo com critérios de classificação de 1990 do ACR.1212 Wolfe F, Smythe HA, Yunus MB, Bennett RM, Bombardier C, Goldenberg DL, et al. The American College of Rheumatology 1990 criteria for the classification of fibromyalgia: report of the Multicenter Criteria Committee. Arthritis Rheum. 1990;33:160-72. Formaram-se então dois grupos não pareados: pacientes com AR com FM e pacientes com AR sem FM. Os critérios de exclusão foram a presença concomitante de lúpus eritematoso sistêmico, esclerose sistêmica, miopatias inflamatórias idiopáticas, espondiloartropatias, infecção por vírus da hepatite B ou C ou infecção pelo vírus da imunodeficiência humana na avaliação inicial ou durante o seguimento. Os participantes também foram excluídos se não tivessem FM no início do estudo, mas tivessem subsequentemente desenvolvido dor difusa.

Os dados de cada consulta foram coletados em formulários de pesquisa padronizados. O cálculo do DAS28 (varia de 0,0 a 9,4; valores maiores representam maior atividade da doença) e do Health Assessment Questionnaire (HAQ varia de 0,0 a 3,0; valores maiores representam um pior status funcional) e o diagnóstico de FM foram feitos por examinadores cegos diferentes.1313 Maska L, Anderson J, Michaud K. Measures of functional status and quality of life in rheumatoid arthritis: Health Assessment Questionnaire Disability Index (HAQ), Modified Health Assessment Questionnaire (MHAQ), Multidimensional Health Assessment Questionnaire (MDHAQ), Health Assessment Questionnaire II (HAQ-II), Improved Health Assessment Questionnaire (Improved HAQ), and Rheumatoid Arthritis Quality of Life (RAQoL). Arthritis Care Res. 2011;63(Suppl. 11):S4-13.,1414 Anderson JK, Zimmerman L, Caplan L, Michaud K. Measures of rheumatoid arthritis disease activity: Patient (PtGA) and Provider (PrGA) Global Assessment of Disease Activity, Disease Activity Score (DAS) and Disease Activity Score with 28-Joint Counts (DAS28), Simplified Disease Activity Index (SDAI), Clinical Disease Activity Index (CDAI), Patient Activity Score (PAS) and Patient Activity Score-II (PASII), Routine Assessment of Patient Index Data (RAPID), Rheumatoid Arthritis Disease Activity Index (RADAI) and Rheumatoid Arthritis Disease Activity Index-5 (RADAI-5), Chronic Arthritis Systemic Index (CASI), Patient-Based Disease Activity Score With ESR (PDAS1) and Patient-Based Disease Activity Score without ESR (PDAS2), and Mean Overall Index for Rheumatoid Arthritis (MOI-RA). Arthritis Care Res. 2011;63(Suppl. 11):S14-36. Calculou-se ainda o índice de comorbidade de Charlson (CCI; variação de 0 a 35; valores maiores representam maior comorbidade) no início do estudo.1515 Charlson ME, Pompei P, Ales KL, MacKenzie CR. A new method of classifying prognostic comorbidity in longitudinal studies: development and validation. J Chronic Dis. 1987;40:373-83.

O Hospital de Clínicas de Porto Alegre é uma instituição pública terciária em que os pacientes têm acesso a todos os DMARD como parte de um programa nacional financiado pelo governo. Além disso, o governo fornece analgésicos, anti-inflamatórios não esteroides (AINE), glicocorticoides, amitriptilina, fluoxetina e ciclobenzaprina.

No ambulatório de AR, os pacientes são tratados de acordo com uma abordagem T2 T em etapas progressivas, em que os DMARD são aumentados até a remissão ou baixa atividade da doença.1616 Brenol CV, da Chakr RM, Andrade NP, Toni M, Laurindo IM, Brenol JC, et al. Daily practice feasibility and effectiveness of treating long-standing rheumatoid arthritis to target with synthetic disease-modifying antirheumatic drugs: a prospective cohort study. Clin Rheumatol. 2015;34:1781-5. Para o propósito deste estudo, o escalonamento nos DMARD foi definido como qualquer incremento na dose ou a troca de medicamento destinada a alcançar a meta de tratamento. A falha no tratamento foi definida como uma atividade da doença consistentemente moderada/alta após três meses da dose mais elevada tolerada de um DMARD sintético ou de seis meses em uso de um DMARD biológico. De acordo com a abordagem T2 T, o metotrexato foi o primeiro DMARD prescrito e foi iniciado logo após o diagnóstico. Se a monoterapia com metotrexato falhasse, era iniciado tratamento com um DMARD sintético de segunda linha. Esse segundo passo de DMARD sintético consistiu em monoterapia com leflunomida, associação de metotrexato e leflunomida ou associação de metotrexato, sulfasalazina e hidroxilcloroquina (ou cloroquina). Se o segundo esquema com DMARD falhasse, era iniciado um DMARD biológico, de preferência um agente antifator de necrose tumoral (anti-TNF), em associação a um DMARD sintético, preferencialmente o metotrexato. A falha no tratamento com o primeiro DMARD biológico era a indicação para a troca de agente biológico. Outro anti-TNF, o abatacepte, o rituximabe e o tocilizumabe eram as opções. A escolha do próximo biológico levou em consideração os aspectos clínicos e as preferências dos pacientes à luz das evidências existentes. O adalimumabe, o etanercepte, o infliximabe e o rituximabe estavam disponíveis para uso no centro em que foi feito o estudo desde o seu início, em 2006. O abatacepte e o tocilizumabe tornaram-se disponíveis em 2010 e o certolizumabe e o golimumabe em 2012. Os glicocorticoides poderiam ser usados a qualquer momento na dose mais baixa para controlar a sinovite. Usaram-se fármacos anti-inflamatórios não esteroides (AINE) por curtos períodos para controlar o agravamento dos sintomas inflamatórios. Analgésicos (acetaminofeno, dipirona, tramadol, codeína) foram usados de acordo com a necessidade de controle da dor. A retirada dos DMARD foi recomendada em caso de remissão sustentada sem progressão radiográfica e consistiu em redução gradual da dose ou aumento no intervalo entre as doses ao longo dos meses. Os DMARD biológicos devem ser retirados antes dos DMARD sintéticos.22 da Mota LM, Cruz BA, Brenol CV, Pereira IA, Rezende-Fronza LS, Bertolo MB, et al. 2012 Brazilian Society of Rheumatology Consensus for the treatment of rheumatoid arthritis. Rev Bras Reumatol. 2012;52:152-74.

Durante o estudo, os pacientes foram rotineiramente avaliados quanto à presença de dor generalizada. O tratamento da FM consistiu em tratamento farmacológico, exercícios e psicoterapia. O tratamento farmacológico incluiu analgésicos de acordo com a necessidade e o uso contínuo de amitriptilina, fluoxetina, ciclobenzaprina, pregabalina ou duloxetina. A pregabalina e a duloxetina estão disponíveis para o tratamento da FM no Brasil desde 2011.1717 Heymann RE, Paiva Edos S, Helfenstein M, Pollak DF, Martinez JE, Provenza JR, et al. Brazilian consensus on the treatment of fibromyalgia. Rev Bras Reumatol. 2010;50:56-66. Os pacientes com FM foram encorajados a participar da Clínica Multidisciplinar de Tratamento da Dor.

A cada três meses, os pacientes com AR deveriam fazer exames de sangue e urina para monitoramento da segurança dos medicamentos. Os testes para avaliação da atividade da doença foram feitos a cada três a seis meses. O monitoramento radiográfico dos danos causados pela AR foi feito uma vez por ano. Radiologistas especializados na avaliação musculoesquelética não cientes do nível de atividade da AR nem do diagnóstico de FM interpretaram os exames radiográficos. A progressão radiográfica foi definida pela presença de pioria ou de aparência de estreitamento do espaço articular ou erosões articulares típicas nas mãos ou nos pés. O dano era visualmente considerado pior, já que nenhuma medição era feita. A ausência de progressão radiográfica foi definida como a ausência de agravamento ou aparecimento de estreitamento no espaço articular ou de erosões típicas nas mãos e nos pés em duas radiografias consecutivas. Após 2011, os pacientes poderiam ser encaminhados para fazer um exame de ultrassonografia para avaliação da atividade da AR. A avaliação da atividade da doença por ultrassonografia compreendia sete articulações (punho dominante, segunda e terceira articulações metacarpofalângicas e segunda e quinta articulações metatarsofalângicas), além de quaisquer articulações sintomáticas (sensíveis e inchadas). O encaminhamento para exame de ultrassonografia e a decisão de escalonar os DMARD era baseada no livre julgamento do médico.

Para verificar o potencial papel da FM na indução do tratamento incorreto na AR, foram analisados dois cenários clínicos. O cenário A compreendia consultas com atividade da doença moderada/alta contínua apesar do escalonamento nos DMARD (falha do tratamento) sem progressão radiográfica. Portanto, na ausência de progressão radiográfica apesar da persistência do DAS28 moderado/alto, o escalonamento nos DMARD era considerado supertratamento. O cenário B incluía consultas com atividade da doença moderada/alta persistente sem escalonamento dos DMARD, mas com progressão radiográfica identificada. Em outras palavras, sempre que o tratamento com DMARD não era escalonado (DAS28 moderado/alto) e era observada progressão radiográfica, havia presença de subtratamento. Os cenários A e B presumidamente representam, respectivamente, sobretratamento e subtratamento.

As análises estatísticas foram feitas com o software SPSS (SPSS Inc. Lançado em 2009. PASW Statistics for Windows, Versão 18.0 Chicago: SPSS Inc). Anteriormente, foi relatada uma diferença de 0,29 na proporção de indivíduos com e sem FM com atividade da AR moderada/alta (0,97 e 0,68, respectivamente).66 Ranzolin A, Brenol JC, Bredemeier M, Guarienti J, Rizzatti M, Feldman D, et al. Association of concomitant fibromyalgia with worse disease activity score in 28 joints, health assessment questionnaire, and short form 36 scores in patients with rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum. 2009;61:794-800. A coorte do presente estudo de 32 pacientes com AR e FM e 224 com AR sem FM tinha um poder de 0,88 de detectar essa diferença, com um alfa de 0,050. As medidas de desfecho foram relatadas principalmente como proporções (por paciente-ano) ou frequências (%) e as medidas de tendência central foram a média ± desvio padrão (DP) e a mediana (intervalo interquartil, IIQ). A distribuição de cada variável foi testada quanto à normalidade pelo teste de Shapiro-Wilk. As comparações entre os grupos com e sem FM foram feitas pelos testes t de Student e U de Mann-Whitney para variáveis contínuas e qui-quadrado de Pearson para variáveis categóricas. Para comparar o DAS28 e o HAQ ao longo do tempo entre os grupos, foram usadas equações de estimação generalizadas. A sobrevida livre de DMARD biológicos e a sobrevida livre de progressão radiográfica foram comparadas com as curvas de Kaplan-Meier e testadas com o modelo de riscos proporcionais de Cox. Os resultados das regressões de Cox foram apresentados como razões de risco (HR) e intervalo de confiança (IC) de 95%. Um valor de p inferior a 0,050 foi considerado estatisticamente significativo.

Este estudo foi aprovado pelos Comitês de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas de Porto Alegre e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Todos os pacientes assinaram um consentimento informado por escrito antes de entrar no estudo transversal original, em 2006 e 2007,66 Ranzolin A, Brenol JC, Bredemeier M, Guarienti J, Rizzatti M, Feldman D, et al. Association of concomitant fibromyalgia with worse disease activity score in 28 joints, health assessment questionnaire, and short form 36 scores in patients with rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum. 2009;61:794-800. e os pesquisadores assinaram um termo de uso dos dados em conformidade com a Declaração de Helsinque.

Resultados

Inicialmente, recrutaram-se 270 pacientes, mas 14 deles foram excluídos em razão da presença de dor difusa ou desenvolvimento de síndrome de sobreposição. Seguiram-se 256 pacientes por 6,2 ± 2 (média ± DP) anos (tabela 1). Eles eram em sua maioria de meia-idade (55,4 ± 12,6 anos), brancos (85,2%), casados (50,4%), mulheres (84,4%) e com oito anos ou menos de escolaridade (75,4%). Foram analisados dados de 2.986 consultas. Todos os pacientes fizeram regularmente radiografias de mãos e pés durante o seguimento.

Tabela 1
Características iniciais dos pacientes

No início do estudo, a FM estava presente em 12,5% dos participantes (n = 32), a síndrome de Sjögren em 4,7%, o fator reumatoide em 83,6% e a erosão articular em 83,6%. Os participantes tinham AR por 11,1 ± 7,4 anos e seu CCI foi 1,7 ± 1. Em geral, os escores do DAS28 e HAQ diminuíram significativamente de 4,1 ± 1,9 para 3,5 ± 1,4 (p < 0,001) e de 1,8 ± 0,8 para 0,7 ± 0,7 (p < 0,001), respectivamente.

Inicialmente, os pacientes com AR com FM eram ligeiramente mais velhos, predominantemente do sexo feminino e apresentavam maiores DAS28 e HAQ em comparação àqueles sem FM (tabela 1). Os valores de DAS28 e HAQ foram superiores no grupo AR com FM ao longo do tempo (fig. 1). No fim do estudo, os escores de DAS28 e HAQ eram superiores em pacientes com AR com FM: 4,2 ± 1,3 vs. 3,3 ± 1,3, p = 0,001 e 1,3 ± 0,8 vs. 0,7 ± 0,7, p < 0,001, respectivamente. No entanto, os pacientes com FM apresentaram uma maior diminuição nos valores de DAS28 e HAQ ao longo do estudo (fig. 1). De acordo com a análise das equações de estimação generalizadas, as comparações entre os grupos, comparações intragrupo (baseadas no tempo) e interações grupo-tempo foram estatisticamente significativas (p < 0,001). Em outras palavras, os grupos diferiam entre si, ambos mudaram ao longo do tempo e o fizeram de diferentes maneiras.

Figura 1
Curvas do DAS28 e HAQ de pacientes com AR com e sem FM.DAS28, 28-Joint Disease Activity Score; HAQ, Health Assessment Questionnaire; AR, artrite reumatoide; FM, fibromialgia.Linha contínua: pacientes com AR com FM; linha pontilhada: pacientes com AR sem FM. Equações de estimação generalizadas; alfa = 0,050; barras de erro: intervalo de confiança de 95%; comparações entre os grupos, p < 0,001, comparações intragrupo (de acordo com o tempo), p < 0,001; interações grupo-tempo, p < 0,001.

Considerando a resposta ao tratamento, 37,5% e 39,7% (p = 0,809) dos pacientes com AR com e sem FM, respectivamente, apresentaram atividade da doença moderada/alta no início e evoluíram para remissão/baixa atividade da doença na última consulta. Em termos de taxas de remissão, no início do estudo, 0,0% dos pacientes com FM e 24,6% dos pacientes sem FM estavam em remissão (p = 0,002). No fim do estudo, as taxas de remissão foram de 18,8% e 32,1%, respectivamente (p = 0,124).

Durante o seguimento, a amitriptilina foi usada por 24,2% dos participantes a 25 (25, 50) mg/dia [mediana (IIQ)], o metotrexato por 89,5% a 20 (15, 20) mg/dia, a leflunomida por 50,8% a 20 (20, 20) mg/dia, a prednisona por 79,3% a 7,5 (5, 10) mg/dia e os DMARD biológicos por 21,9% dos indivíduos. Os pacientes com AR com FM usaram doses mais altas de antidepressivos tricíclicos, leflunomida e prednisona e doses menores de metotrexato (tabela 2). As doses de prednisona prescritas pelo médico em cada consulta também foram maiores entre os pacientes com AR com FM: 5 (0, 10) vs. 2,5 (0, 7,5), p < 0,001. Mais pacientes com AR com FM usaram antidepressivos tricíclicos do que aqueles sem FM (tabela 2). A ciclobenzaprina, a fluoxetina, a pregabalina, a duloxetina, a sulfasalazina, a cloroquina e a hidroxicloroquina foram usadas por menos de 50% dos participantes. Nenhum paciente usou certolizumabe ou golimumabe durante o estudo. Quando comparados com os pacientes com AR sem FM, os participantes com AR e FM usaram mais frequentemente antidepressivos tricíclicos, leflunomida, prednisona, analgésicos contínuos e menos frequentemente metotrexato ao longo do estudo (tabela 3). Não foi observada diferença entre os grupos quanto à prevalência de uso de DMARD biológicos e escalonamento nos DMARD (tabela 3).

Tabela 2
Características relacionadas com o tratamento dos pacientes por grupo ao longo do estudo
Tabela 3
Características do tratamento de cada grupo medidas nas consultas ao longo do estudo

Em geral, a taxa de escalonamento dos DMARD foi de 1 (0,7, 1,5) escalonamento de DMARD/paciente-ano. Em termos de uso de agentes biológicos, os pacientes com AR estavam em média sob DMARD biológicos em menos de uma consulta por ano (0,9 ± 0,5 consulta em uso de DMARD biológicos/paciente-ano). O escalonamento de DMARD e o uso de agentes biológicos não diferiram entre os grupos (tabelas 2 e 3). Em relação à frequência de ultrassonografias, a FM esteve mais frequentemente associada à ultrassonografia (6,1% vs. 2,9% das consultas, p = 0,047). Entre os pacientes com AR com FM, o uso de agentes biológicos foi menos frequente quando o exame ultrassonográfico foi feito: 9,1% vs. 66,7% das consultas; p = 0,002.

Não foi encontrada diferença estatisticamente significativa entre os grupos em relação à sobrevida em sete anos livre de agentes biológicos e livre de progressão radiográfica na regressão de Cox ajustada por idade, sexo e ICC (fig. 2). O único fator que influenciou significativamente a sobrevida em sete anos livre de agentes biológicos foi a idade, HR = 0,966 (0,944-0,988). A sobrevida em sete anos livre de progressão radiográfica não foi influenciada por qualquer das variáveis.

Figura 2
Curvas de Kaplan-Meier de pacientes com AR, com e sem FM.Sobrevida em sete anos livre de agentes biológicos e sobrevida em sete anos livre de progressão radiográfica. AR, artrite reumatoide; FM, fibromialgia.Linha contínua: pacientes com AR com FM; linha pontilhada: pacientes com AR sem FM. Modelo de Cox de risco proporcional corrigido por idade, sexo, índice de comorbidade de Charlson e dose de prednisona; HR, taxa de risco (intervalo de confiança de 95%); alfa = 0,050.

O cenário A (sobretratamento) esteve presente em 15,3% de todas as consultas e o cenário B (subtratamento) foi identificado em 5,5% de todas as consultas. Em geral, os pacientes com AR com FM foram mais frequentemente tratados excessivamente e subtratados (cenários A + B) quando comparados com aqueles sem FM (28,4 vs. 19,8%, p < 0,001; tabela 3).

Discussão

Segundo nosso conhecimento, este é o primeiro estudo longitudinal dedicado a quantificar o impacto da FM na decisão de escalonamento da DMARD em uma coorte de pacientes com AR. Recentemente, Lage-Hansen et al. descreveram um aumento no uso de DMARD biológicos entre os pacientes com AR com FM em um estudo transversal.1818 Lage-Hansen PR, Chrysidis S, Lage-Hansen M, Hougaard A, Ejstrup L, Amris K. Concomitant fibromyalgia in rheumatoid arthritis is associated with the more frequent use of biological therapy: a cross-sectional study. Scand J Rheumatol. 2015;:1-4 [Epub ahead of print]. No entanto, em decorrência de seu desenho transversal, não foi possível estabelecer a causalidade. No presente estudo, o escalonamento dos DMARD não foi afetado pela FM, possivelmente em razão de os médicos terem conhecimento da presença da FM. Em 2009, nosso grupo demonstrou o impacto da FM no DAS28 em pacientes atendidos na mesma clínica.66 Ranzolin A, Brenol JC, Bredemeier M, Guarienti J, Rizzatti M, Feldman D, et al. Association of concomitant fibromyalgia with worse disease activity score in 28 joints, health assessment questionnaire, and short form 36 scores in patients with rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum. 2009;61:794-800. Portanto, os reumatologistas tinham conhecimento dessa interferência no início do estudo. Além disso, em comparação com outros escores de atividade da doença, o DAS28 é particularmente propenso à interferência da FM, em razão do maior peso dos componentes subjetivos (contagem de articulações dolorosas e escalas analógicas visuais) em sua fórmula.1414 Anderson JK, Zimmerman L, Caplan L, Michaud K. Measures of rheumatoid arthritis disease activity: Patient (PtGA) and Provider (PrGA) Global Assessment of Disease Activity, Disease Activity Score (DAS) and Disease Activity Score with 28-Joint Counts (DAS28), Simplified Disease Activity Index (SDAI), Clinical Disease Activity Index (CDAI), Patient Activity Score (PAS) and Patient Activity Score-II (PASII), Routine Assessment of Patient Index Data (RAPID), Rheumatoid Arthritis Disease Activity Index (RADAI) and Rheumatoid Arthritis Disease Activity Index-5 (RADAI-5), Chronic Arthritis Systemic Index (CASI), Patient-Based Disease Activity Score With ESR (PDAS1) and Patient-Based Disease Activity Score without ESR (PDAS2), and Mean Overall Index for Rheumatoid Arthritis (MOI-RA). Arthritis Care Res. 2011;63(Suppl. 11):S14-36.,1919 Coury F, Rossat A, Tebib A, Letroublon MC, Gagnard A, Fantino B, et al. Rheumatoid arthritis and fibromyalgia: a frequent unrelated association complicating disease management. J Rheumatol. 2009;36:58-62. Por conhecer as características do DAS28 de antemão, os reumatologistas foram mais cuidadosos no escalonamento dos DMARD em pacientes com AR e FM, enfatizaram medidas objetivas, como a contagem de articulações inchadas, velocidade de hemossedimentação e proteína C-reativa, ao tomar decisões relativas ao tratamento.1010 Ton E, Bakker MF, Verstappen SM, Ter Borg EJ, van Albada-Kuipers IA, Schenk Y, et al. Look beyond the disease activity score of 28 joints (DAS28): tender points influence the DAS28 in patients with rheumatoid arthritis. J Rheumatol. 2012;39:22-7.,2020 Hobbs KF, Cohen MD. Rheumatoid arthritis disease measurement: a new old idea. Rheumatology (United Kingdom). 2012;51(Suppl. 6):vi21-7. Além disso, desde 2010, a ultrassonografia tem sido feita para quantificação da sinovite em nosso centro. Como demonstrado anteriormente, a sinovite ao Doppler pode representar melhor o nível de atividade da AR do que os índices clínicos em pacientes com FM concomitante.2121 Chakr R, Brenol JC, Behar M, Mendonça JA, Kohem C, Monticielo O, et al. Is ultrasound a better target than clinical disease activity scores in rheumatoid arthritis with fibromyalgia? A case-control study. PLOS ONE. 2015;10:e0118620.,2222 Dale J, Purves D, McConnachie A, Porter D, McInnes IB. Tightening up: musculoskeletal ultrasound could further individualise treatment decisions in early rheumatoid arthritis patients treated by a step-up DMARD escalation regimen. Arthritis Rheum. 2012;64:S1129. Além disso, as estimativas exageradas no DAS28 e HAQ induzidas pela FM diminuíram durante o estudo, possivelmente minimizando o tratamento excessivo. Contudo, nenhuma conclusão definitiva pode ser tirada dessa observação.

Os pacientes com AR com FM demostraram um declínio mais profundo nos valores do DAS28 e HAQ durante o seguimento do que aqueles sem FM, provavelmente em razão de vários fatores, como o crescente corpo de evidências sobre o tratamento da FM, a disponibilidade de novos medicamentos para FM financiados pelo governo em 2011, o maior uso de antidepressivos tricíclicos entre os pacientes com FM e o crescente acesso à Clínica Multidisciplinar de Tratamento da Dor em nossa instituição. Infelizmente, não se tem a frequência de atendimento na Clínica de Tratamento de Dor ou a adesão a tratamentos não farmacológicos (exercícios e psicoterapia) entre os pacientes de FM para verificar essa hipótese. Em 2008, Sokka et al. relataram uma taxa de remissão de 19,6% em um cenário da vida real.2323 Sokka T, Hetland ML, Makinen H, Kautiainen H, Horslev-Petersen K, Luukkainen RK, et al. Remission and rheumatoid arthritis: data on patients receiving usual care in twenty-four countries. Arthritis Rheum. 2008;58:2642-51. Em outro estudo com tratamento até alcançar o objetivo na AR de duração prolongada, os escores do DAS28 e HAQ diminuíram após três anos (p = 0,004 e p < 0,001, respectivamente) e as pontuações finais foram comparáveis às obtidas no presente estudo: DAS28 = 3,3 ± 1,4 e HAQ = 1,1 ± 0,4. Nesse mesmo estudo, a remissão foi alcançada por 35,3% dos pacientes inicialmente refratários aos DMARD sintéticos.2424 Mohammed RH, Kewan HH, Bukhari M. Assessment of the treat-to-target strategy in patients with refractory rheumatoid arthritis. A prospective study on efficacy and safety in a Saudi population. Z Rheumatol. 2014;73:746-53. Santos-Moreno et al. estudaram pacientes com AR moderadamente a altamente ativos tratados segundo a estratégia T2T por seis meses e verificaram uma diminuição significativa tanto no DAS28 quanto no HAQ (p < 0,001). Seus valores finais foram: DAS28 = 2,5 (2,3, 3,2), HAQ = 0,1 (0,1, 0,3) e taxa de remissão = 51%.2525 Santos-Moreno PI, de la Hoz-Valle J, Villarreal L, Palomino A, Sanchez G, Castro C. Treatment of rheumatoid arthritis with methotrexate alone and in combination with other conventional DMARDs using the T2T strategy. A cohort study. Clin Rheumatol. 2015;34:215-20. No presente estudo, o período de observação mais longo, as deformidades articulares e sinovite crônica proliferativa vistas na doença de duração prolongada e o menor nível de escolaridade podem ter contribuído para o DAS28 final ligeiramente acima do objetivo.88 Pincus T, Castrejon I, Bergman MJ, Yazici Y. Treat-to-target: not as simple as it appears. Clin Exp Rheumatol. 2012;30(Suppl. 73):S10-20.,2626 Sokka T, Kautiainen H, Pincus T, Toloza S, da Rocha Castelar Pinheiro G, Lazovskis J, et al. Disparities in rheumatoid arthritis disease activity according to gross domestic product in 25 countries in the QUEST-RA database. Ann Rheum Dis. 2009;68:1666-72. Apesar da maior queda no DAS28 ao longo do tempo entre os pacientes com FM, a pontuação final foi maior nesse grupo, mas não a taxa de progressão radiográfica. Isso sugere que a interferência da condição dolorosa no escore de atividade da AR foi atenuada, mas persistiu ao longo do estudo.

Os pacientes com AR com FM usaram mais frequentemente antidepressivos tricíclicos, leflunomida, prednisona e analgésicos contínuos, mas menos frequentemente metotrexato do que aqueles sem FM. A indicação para o uso de antidepressivos tricíclicos não foi estudada e outras condições, como a neuropatia diabética, podem ter influenciado nessa diferença. O maior uso do agente de segunda linha preferido leflunomida (tabela 3) pode indicar uma interferência da condição dolorosa no escalonamento dos DMARD (descontinuação do metotrexato). Além disso, a dose de prednisona foi maior entre os pacientes com FM (tabela 3). Isso sugere que a FM poderia ter impulsionado o tratamento com glicocorticoides. No estudo feito por Anderson et al., os pacientes com dor crônica generalizada foram tratados com prednisona em uma maior extensão do que aqueles com síndrome dolorosa regional crônica, mas a uma taxa semelhante de tratamento com DMARD.99 Andersson ML, Svensson B, Bergman S. Chronic widespread pain in patients with rheumatoid arthritis and the relation between pain and disease activity measures over the first 5 years. J Rheumatol. 2013;40:1977-85.

A progressão radiográfica foi a mesma entre os grupos e comparável com outros estudos em que os pacientes foram tratados segundo a estratégia T2T.2727 Sugihara T, Ishizaki T, Hosoya T, Iga S, Yokoyama W, Hirano F, et al. Structural and functional outcomes of a therapeutic strategy targeting low disease activity in patients with elderly-onset rheumatoid arthritis: a prospective cohort study (CRANE). Rheumatology (Oxford). 2015;54:798-807.,2828 Vermeer M, Kuper HH, Hoekstra M, Haagsma CJ, Posthumus MD, Brus HL, et al. Implementation of a treat-to-target strategy in very early rheumatoid arthritis: results of the Dutch Rheumatoid Arthritis Monitoring remission induction cohort study. Arthritis Rheum. 2011;63:2865-72. Possivelmente não foi observada diferença nas lesões articulares na presença de FM porque o escalonamento dos DMARD foi semelhante ao usado naqueles sem FM. Além disso, a interferência da FM na decisão do tratamento poderia ter sido atenuada pela ultrassonografia. De forma especulativa, a decisão de escalonamento dos DMARD poderia, por fim, ter se tornado menos tendenciosa pela presença de FM.2121 Chakr R, Brenol JC, Behar M, Mendonça JA, Kohem C, Monticielo O, et al. Is ultrasound a better target than clinical disease activity scores in rheumatoid arthritis with fibromyalgia? A case-control study. PLOS ONE. 2015;10:e0118620.,2929 Foltz V, Gandjbakhch F, Etchepare F, Rosenberg C, Tanguy ML, Rozenberg S, et al. Power Doppler ultrasound, but not low-field magnetic resonance imaging, predicts relapse and radiographic disease progression in rheumatoid arthritis patients with low levels of disease activity. Arthritis Rheum. 2012;64:67-76.,3030 Funck-Brentano T, Gandjbakhch F, Etchepare F, Jousse-Joulin S, Miquel A, Cyteval C, et al. Prediction of radiographic damage in early arthritis by sonographic erosions and power Doppler signal: a longitudinal observational study. Arthritis Care Res. 2013;65:896-902.

As curvas de Kaplan-Meier contemplam o tempo decorrido até certo evento e não foram observadas diferenças entre os grupos quanto ao tempo livre de agentes biológicos e livre de progressão radiográfica. Em outras palavras, a FM não parece antecipar o uso de agentes biológicos nem a progressão radiográfica entre pacientes com AR. Esses resultados ainda não foram descritos em estudos equivalentes.

Os achados do presente estudo sugerem que os pacientes com AR com FM poderiam ter sido erroneamente tratados com maior frequência do que os pacientes com AR sem FM, em dois cenários arbitrários. Em teoria, esses cenários pretendem representar tanto as frequências de sobretratamento quanto as de subtratamento. No entanto, não se pode chegar a qualquer conclusão definitiva, uma vez que a progressão radiográfica não foi quantificada em uma pontuação e esses cenários requerem validação adicional como medidas de desfecho verdadeiras. Além disso, a pontuação na ultrassonografia pode ser usada em estudos futuros como um comparador em cada cenário, uma vez que foi validada como uma medida objetiva da sinovite e como preditor da progressão radiográfica.2121 Chakr R, Brenol JC, Behar M, Mendonça JA, Kohem C, Monticielo O, et al. Is ultrasound a better target than clinical disease activity scores in rheumatoid arthritis with fibromyalgia? A case-control study. PLOS ONE. 2015;10:e0118620.,2929 Foltz V, Gandjbakhch F, Etchepare F, Rosenberg C, Tanguy ML, Rozenberg S, et al. Power Doppler ultrasound, but not low-field magnetic resonance imaging, predicts relapse and radiographic disease progression in rheumatoid arthritis patients with low levels of disease activity. Arthritis Rheum. 2012;64:67-76.

A avaliação da sinovite baseada na ultrassonografia poderia ter influenciado na decisão de escalonamento dos DMARD e contribuído para reduzir a suposta influência da FM sobre o tratamento da AR.2121 Chakr R, Brenol JC, Behar M, Mendonça JA, Kohem C, Monticielo O, et al. Is ultrasound a better target than clinical disease activity scores in rheumatoid arthritis with fibromyalgia? A case-control study. PLOS ONE. 2015;10:e0118620. Um estudo longitudinal com pacientes com AR e FM divididos em dois grupos de acordo com a avaliação ultrassonográfica poderia abordar essa questão de maneira mais adequada. Outra imperfeição foi a existência de vários examinadores na avaliação do DAS28 ao longo do estudo, uma vez que foi demonstrado que a confiabilidade clínica da pontuação é altamente dependente do examinador.3131 Marhadour T, Jousse-Joulin S, Chales G, Grange L, Hacquard C, Loeuille D, et al. Reproducibility of joint swelling assessments in long-lasting rheumatoid arthritis: influence on Disease Activity Score-28 values (SEA-Repro study part I). J Rheumatol. 2010;37:932-7. Como o DAS28 de modo geral foi pontuado por um reumatologista treinado e confirmado por um reumatologista especialista, os resultados do presente estudo são semelhantes aos de outros estudos da vida real, de modo que se acredita que a variação dos examinadores não foi um viés importante para os resultados.

Conclusão

Na atual coorte de pacientes com AR, a FM não teve um impacto significativo sobre o escalonamento geral dos DMARD e sobre as estimativas excessivas de DAS28 e HAQ induzidas pela FM no fim do estudo. No entanto, os pacientes com AR com FM usaram mais leflunomida e prednisona e o tratamento incorreto da AR parece ser mais frequente em pacientes com FM. Certamente, os pacientes com AR com FM se beneficiarão de uma estratégia personalizada com tratamento até alcançar o objetivo, inclusive biomarcadores objetivos de sinovite, como a ultrassonografia, paralelamente a um aprimoramento permanente no tratamento da FM. A medicina personalizada na AR é um campo de pesquisa profícuo e mais estudos sobre o impacto da FM no tratamento da AR provavelmente ajudariam a melhorar o processo de tomada de decisão em benefício dos pacientes e da sociedade.

  • Financiamento
    Fundo de Incentivo à Pesquisa e Eventos (Fipe) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA).

Agradecimentos

À estatística Vânia Hirakata, MSc, e aos colegas da Divisão de Reumatologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre Andrese Gasparin, MD, MSc, Nicole Andrade, MD, MSc, e Penélope Palominos, MD, MSc, por seu inestimável apoio durante o estudo. O financiador não esteve envolvido na concepção, coleta, análise e interpretação dos dados nem na redação do estudo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2017

Histórico

  • Recebido
    18 Maio 2016
  • Aceito
    8 Nov 2016
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