Acessibilidade / Reportar erro

Reparo artroscópico da lesão de manguito rotador: Uma análise da função, força muscular e dor entre técnicas de fileira simples e fileira dupla

Resumo

Objetivo

Avaliar os pacientes submetidos ao reparo artroscópico do manguito rotador (MR), comparando-se os resultados funcionais, força muscular e dor obtidos após as técnicas de fileira simples (FS) e de fileira dupla (FD).

Métodos

Foram coletados os dados do seguimento pós-operatório (mínimo de 12 meses) de 128 pacientes submetidos ao reparo artroscópico do MR durante o período de 2011 a 2018. As variáveis clínico-funcionais foram coletadas por meio do exame clínico, e as variáveis demográficas, cirúrgicas e das lesões do MR a partir dos prontuários eletrônicos. Os resultados foram comparados entre os grupos FS e FD. Resultados O grupo FD demonstrou força de elevação anterior maior quando comparado ao grupo FS (FS: 4,72 ± 2,73 kg versus FD:5,90 ± 2,73 kg; p = 0,017). As demais variáveis de força muscular, Constant-Murley Score, University of California at Los Angeles Shoulder Rating Scale (UCLA, na sigla em inglês) e dor foram similares. Realizando-se a estratificação por tamanho, na análise das lesões pequenas e médias, não foram encontradas diferenças entre os grupos. Porém, na análise das lesões grandes e extensas, os pacientes submetidos à FD apresentaram superioridade tanto na força muscular de elevação (FS: 3,98 ± 2,24 kg versus FD: 6,39 ± 2,73 kg) quanto no escore Constant (FS: 81 ± 10 versus FD: 88 ± 7).

Conclusão

A utilização da técnica de FD no reparo artroscópico do MR possibilitou maiores níveis de força muscular para elevação anterior do ombro quando comparada à técnica de FS. A estratificação dos dados em lesões grandes e extensas evidenciou superioridade da força muscular de elevação anterior do ombro e do escore Constant nos pacientes submetidos à FD.

Palavras-chave
manguito rotador; artroscopia; força muscular; avaliação funcional; ombro

Abstract

Objective

To evaluate the patients submitted to arthroscopic repair of the rotator cuff (RC), comparing the functional results, muscle strength, and pain obtained after single row (SR) and double row (DR) techniques.

Methods

Data were collected at the postoperative follow-up (minimum of 12 months) of 128 patients submitted to arthroscopic RC repair from 2011 to 2018. The clinical-functional variables were collected through the clinical examination, and the demographic, surgical and injury variables of the RC were collected from the electronic medical records. The results were compared between the SR and DR groups. Results The DR group showed higher anterior elevation strength when compared with the SR group (SF: 4.72 ± 2.73 kg versus DR: 5.90 ± 2.73 kg; p = 0.017). The other variables of muscle strength, Constant-Murley Score, University of California at Los Angeles Shoulder Rating Scale (UCLA), and pain, were similar. Performing the stratification by size, in the analysis of small and medium injuries, no differences were found between the groups. However, in the analysis of large and extensive injuries, patients submitted to DR presented superiority of both muscle lifting strength (SF: 3.98 ± 2.24 kg versus DR: 6.39 ± 2.73 kg) and Constant score (SF: 81 ± 10 versus DR: 88 ± 7).

Conclusion

The use of the DR technique in arthroscopic RC repair allowed higher levels of muscle strength for anterior shoulder elevation when compared with the SF technique. Data stratification in large and extensive injuries showed superiority of anterior shoulder elevation muscle strength and of the Constant score in patients submitted to DR.

Keywords
rotator cuff; arthroscopy; muscle strength; functional evaluation; shoulder

Introdução

As lesões do manguito rotador (MR) são comuns na prática ortopédica, correspondendo a entre 30 e 70% dos quadros de dor no ombro.11 Sambandam SN, Khanna V, Gul A, Mounasamy V. Rotator cuff tears: An evidence based approach. World J Orthop 2015;6(11): 902-918,22 Carvalho AL, Martinelli F, Tramujas L, Baggio M, Crocetta MS, Martins RO. Rotator cuff injuries and factors associated with reoperation. Rev Bras Ortop 2016;51(03):298-302 O arsenal terapêutico é amplo, englobando tratamentos conservadores e cirúrgicos.33 Dang A, Davies M. Rotator Cuff Disease: Treatment Options and Considerations. Sports Med Arthrosc Rev 2018;26(03):129-133 O método cirúrgico pode ser realizado por meio da técnica aberta com mínima incisão (“mini open”) ou da técnica artroscópica, e, em alguns casos de lesões irreparáveis associadas a artropatia do MR, existe a possibilidade de artroplastia reversa do ombro.33 Dang A, Davies M. Rotator Cuff Disease: Treatment Options and Considerations. Sports Med Arthrosc Rev 2018;26(03):129-133,44 Oliva F, Piccirilli E, Bossa M, et al. I.S.Mu.L.T - Rotator Cuff Tears Guidelines. Muscles Ligaments Tendons J 2016;5(04):227-263 No Brasil, segundo dados do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde SUS (DataSUS) e considerando-se tanto o reparo aberto quanto o artroscó- pico, foram realizadas 50.207 cirurgias de reparo do MR no período de 2003 a 2015.55 Malavolta EA, Assunção JH, Beraldo RA, Pinto GMR, Gracitelli MEC, Ferreira Neto AA. Reparo do manguito rotador no Sistema Único de Saúde: tendência brasileira de 2003 a 2015. Rev Bras Ortop 2017;52(04):501-505 No ano de 2015, a taxa de reparos do MR foi de 2,81 procedimentos para cada 100.000 habitantes.55 Malavolta EA, Assunção JH, Beraldo RA, Pinto GMR, Gracitelli MEC, Ferreira Neto AA. Reparo do manguito rotador no Sistema Único de Saúde: tendência brasileira de 2003 a 2015. Rev Bras Ortop 2017;52(04):501-505 Os dados citados, entretanto, englobam apenas os procedimentos realizados pelo SUS, o que leva a inferir que os números referentes ao reparo do MR em todo o Brasil são ainda maiores, uma vez que os dados referentes à saúde suplementar não são publicamente agregados e divulgados.

Uma vez estabelecido o tratamento por via artroscópica, outro ponto a ser decidido é quanto à técnica de sutura do tendão no úmero, a qual pode ser realizada em fileira simples (FS), fileira dupla (FD), ou equivalente transóssea. No Brasil, a técnica mais difundida é a de FS, utilizada por 50,4% dos ortopedistas, enquanto 26,1% utilizam a configuração em FD.66 Vieira FA, Olawa PJ, Belangero PS, Arliani GG, Figueiredo EA, Ejnisman B. Lesão do manguito rotador: tratamento e reabilitação. Perspectivas e tendências atuais. Rev Bras Ortop 2015;50 (06):647-651 Ao comparar as duas técnicas, a literatura apresenta divergências e os estudos não são conclusivos.77 DeHaan AM, Axelrad TW, Kaye E, Silvestri L, Puskas B, Foster TE. Does double-row rotator cuff repair improve functional outcome of patients compared with single-row technique? A systematic review. Am J Sports Med 2012;40(05):1176-1185

8 Chen M, Xu W, Dong Q, Huang Q, Xie Z, Mao Y. Outcomes of singlerow versus double-row arthroscopic rotator cuff repair: a systematic review and meta-analysis of current evidence. Arthroscopy 2013;29(08):1437-1449

9 Ying ZM, Lin T, Yan SG. Arthroscopic single-row versus doublerow technique for repairing rotator cuff tears: a systematic review and meta-analysis. Orthop Surg 2014;6(04):300-312
-1010 Sobhy MH, Khater AH, Hassan MR, El Shazly O. Do functional outcomes and cuff integrity correlate after singleversus doublerow rotator cuff repair? A systematic review and meta-analysis study. Eur J Orthop Surg Traumatol 2018;28(04):593-605 DeHaann et al.77 DeHaan AM, Axelrad TW, Kaye E, Silvestri L, Puskas B, Foster TE. Does double-row rotator cuff repair improve functional outcome of patients compared with single-row technique? A systematic review. Am J Sports Med 2012;40(05):1176-1185 e Chen et al.88 Chen M, Xu W, Dong Q, Huang Q, Xie Z, Mao Y. Outcomes of singlerow versus double-row arthroscopic rotator cuff repair: a systematic review and meta-analysis of current evidence. Arthroscopy 2013;29(08):1437-1449 não evidenciaram diferenças funcionais entre as técnicas. Ying et al.99 Ying ZM, Lin T, Yan SG. Arthroscopic single-row versus doublerow technique for repairing rotator cuff tears: a systematic review and meta-analysis. Orthop Surg 2014;6(04):300-312 demonstraram melhor força muscular no grupo submetido à FD. Sobhy et al.1010 Sobhy MH, Khater AH, Hassan MR, El Shazly O. Do functional outcomes and cuff integrity correlate after singleversus doublerow rotator cuff repair? A systematic review and meta-analysis study. Eur J Orthop Surg Traumatol 2018;28(04):593-605 determinaram que, a curto e médio prazo, o grupo da FD apresentou escore UCLA significativamente melhor e que, a longo prazo, há uma correlação direta entre a integridade do MR e os resultados funcionais, com superioridade da FD. No cenário nacional, o trabalho publicado por Senna et al.1111 Senna LF, Ramos MRF, Bergamaschi RF. Arthroscopic rotator cuff repair: single-row vs. double-row - clinical results after one to four years. Rev Bras Ortop 2018;53(04):448-453, não evidenciou diferença funcional estatisticamente significativa entre os dois métodos.

Diante de tais evidências, observa-se que as técnicas de fixação em FS e FD no reparo artroscópico do MR ainda apresentam resultados controversos, principalmente no Brasil, posto que há apenas um estudo nacional sobre o tópico.1111 Senna LF, Ramos MRF, Bergamaschi RF. Arthroscopic rotator cuff repair: single-row vs. double-row - clinical results after one to four years. Rev Bras Ortop 2018;53(04):448-453

Tendo em vista que a utilização de mais âncoras torna o procedimento mais oneroso,1212 Huang AL, Thavorn K, van Katwyk S, MacDonald P, Lapner P. Double-Row Arthroscopic Rotator Cuff Repair Is More Cost-Effective Than Single-Row Repair. J Bone Joint Surg Am 2017;99(20): 1730-1736 faz-se necessário demonstrar se há real benefício clínico ao lançar mão dessa técnica. Para isso, deve-se ampliar a base de estudos para comprovar a superioridade de uma das técnicas ou a equivalência de ambas. Desta forma, o objetivo do presente estudo foi avaliar os pacientes submetidos ao reparo artroscópico do MR, comparando-se os resultados de força muscular, funcionais e dor obtidos após as técnicas de FS e de FD. Diante do exposto e baseado na lógica que levou ao desenvolvimento da técnica de FD (maior área de inserção do MR - footprint -, gerando menor chance de rerruptura),1010 Sobhy MH, Khater AH, Hassan MR, El Shazly O. Do functional outcomes and cuff integrity correlate after singleversus doublerow rotator cuff repair? A systematic review and meta-analysis study. Eur J Orthop Surg Traumatol 2018;28(04):593-605,1313 Lo IK, Burkhart SS. Double-row arthroscopic rotator cuff repair: re-establishing the footprint of the rotator cuff. Arthroscopy 2003;19(09):1035-1042 hipotetizamos que os pacientes submetidos à técnica de FD apresentarão superioridade nos desfechos analisados.

Metodologia

Design do Estudo e Participantes

Trata-se de um estudo de coorte retrospectiva. Durante o período de 2011 a 2018, 465 pacientes foram submetidos ao reparo artroscópico do MR. Foram incluídos pacientes > 18 anos submetidos ao reparo artroscópico do MR e com seguimento pós-operatório mínimo de 12 meses. Foram excluídos aqueles que, durante o ato cirúrgico, foram submetidos a outros procedimentos, como reparo do lábio glenoidal, acromioplastia, tenotomia e tenodese do bíceps, assim como aqueles que se recusaram a participar da pesquisa e cujo contato não foi possível, o que caracterizou perda de seguimento. Após a aplicação dos critérios (inclusão e exclusão), 128 pacientes aceitaram participar da pesquisa e comparecer ao hospital para serem reavaliados, totalizando 135 ombros.

Desfechos de Análise

Considerou-se como desfecho primário os escores funcionais pós-operatórios, UCLA e Constant, e como desfechos secundários as variáveis de força, amplitude de movimento (ADM) e dor pós-operatórios.

Métodos e Instrumentos

A coleta de dados durante o seguimento pós-operatório foi realizada em duas etapas: primeira - consulta aos prontuá- rios para coleta de características demográficas, cirúrgicas e das lesões do MR; e segunda - avaliação clínica com coleta de variáveis funcionais, força muscular e dor.

Os dados demográficos e de caracterização da lesão de MR foram obtidos por meio de análise dos prontuários eletrô- nicos. As variáveis coletadas foram: idade, gênero, dominância e lateralidade, tempo de seguimento, tabagismo, diabetes mellitus, tipo de ruptura (total ou parcial), classificação da lesão (pequena, média, grande ou extensas para as lesões completas, e bursal, articular ou intratendinosa para as lesões parciais), mecanismo da lesão (traumático ou degenerativo), tendões abordados, tipo de fixação (FS ou FD) e número de âncoras utilizadas no tratamento cirúrgico. As lesões completas foram classificadas, conforme a medida de seu maior diâmetro, em pequenas (< 1 cm), médias (de 1 a 3 cm), grandes (de 3 a 5 cm) e extensas (≥ 5 cm).1414 Davidson J, Burkhart SS. The geometric classification of rotator cuff tears: a system linking tear pattern to treatment and prognosis. Arthroscopy 2010;26(03):417-424,1515 Andrade RP, Correa Filho MRC, Queiroz BC. Lesões do manguito rotador. Rev Bras Ortop 2004;39(11/12):621-635 As lesões extensas, no entanto, podem ser definidas tanto pelo critério mencionado, ≥ 5 cm, quanto pela ruptura completa de ≥ 2 tendões.1515 Andrade RP, Correa Filho MRC, Queiroz BC. Lesões do manguito rotador. Rev Bras Ortop 2004;39(11/12):621-635 O tamanho e a classificação das lesões foram obtidos a partir das ressonâncias magnéticas (RMs) pré-operatórias e/ou descrições cirúrgicas. Quando houve divergência entre o laudo da RM e a descrição cirúrgica, considerou-se a descrição intraoperatória.

O segundo momento de avaliação foi realizado presencialmente, quando foram aferidas a força (kg) e a amplitude (°) dos movimentos de elevação, rotação lateral e rotação medial do ombro. A força foi aferida por dinamômetro digital e mensurada em Kg, enquanto a amplitude foi aferida por goniometria e mensurada em graus. Além disso, durante esta avaliação, foram aplicados os escores de capacidade funcional reportada University of California at Los Angeles Shoulder Rating Scale (UCLA, na sigla em inglês)1616 Amstutz HC, Sew Hoy AL, Clarke IC. UCLA anatomic total shoulder arthroplasty. Clin Orthop Relat Res 1981;(155):7-20 e Constant-Murley Score (Constant),1717 Constant CR, Murley AH. A clinical method of functional assessment of the shoulder. Clin Orthop Relat Res 1987;(214):160-164 juntamente à coleta dos dados referentes à dor, utilizando-se a escala visual-analógica.1818 Scott J, Huskisson EC. Graphic representation of pain. Pain 1976;2 (02):175-184 As escalas mencionadas acima (UCLA e Constant) foram traduzidas para o português e adaptadas culturalmente para a população brasileira1919 Barreto RP, Barbosa ML, Balbinotti MA, Mothes FC, da Rosa LH, Silva MF. The Brazilian version of the Constant-Murley Score (CMS-BR): convergent and construct validity, internal consistency, and unidimensionality. Rev Bras Ortop 2016;51(05):515-520,2020 Oku EC, Andrade AP, Stadiniky SP, Carrera EF, Tellini GG. Tradução e adaptação cultural do Modified-University of California at Los Angeles Shoulder Rating Scale para a língua portuguesa. Rev Bras Reumatol 2006;46(04):246-252 e são frequentemente utilizadas para avaliação da função de membros superiores em pacientes com lesões de MR.10,11,21-23

Após a tabulação dos dados, os indivíduos foram divididos em dois grupos, com base na técnica de fixação cirúrgica utilizada: FS e FD.

Procedimento Cirúrgico

As cirurgias foram realizadas por cirurgiões especialistas e com ampla experiência no tema. A fixação em FS foi realizada através da técnica na qual o tendão é atado, por meio de pontos simples, às âncoras dispostas em uma única fileira.2424 Gilotra M, O’Brien MJ, Savoie FH 3rd. Arthroscopic Rotator Cuff Repair: Indication and Technique. Instr Course Lect 2016;65:83-92 A técnica de fixação em FD realizada foi a descrita por Lo et al.1313 Lo IK, Burkhart SS. Double-row arthroscopic rotator cuff repair: re-establishing the footprint of the rotator cuff. Arthroscopy 2003;19(09):1035-1042 e consiste em uma fileira medial de âncoras atadas com pontos em “U” e outra fileira lateral de âncoras atadas com pontos simples. Os procedimentos foram realizados na posição de “cadeira de praia”.

SabeSabe-se que, em nosso meio, o custo do material cirúrgico é um fator limitante. A intenção do cirurgião ao solicitar o procedimento ao convênio era sempre realizar a fixação em FD; porém, nem sempre a quantidade de âncoras autorizada era o suficiente para tal. Quando a fixação em FD não era possível, optou-se pela técnica de fileira simples. Portanto, uma vez que todas as lesões selecionadas eram passíveis de tratamento por FD, o fator que direcionou para uma técnica ou outra foi a disponibilidade de materiais.

Todos os pacientes com lesões parciais foram submetidos ao tratamento conservador por, no mínimo, 3 meses. Quando não havia boa resposta a esta terapêutica, indicava-se o tratamento cirúrgico.

Aqueles que apresentaram critérios de irreparabilidade foram submetidos a outras técnicas operatórias que não a artroscópica e, portanto, não foram incluídos no presente estudo.

Reabilitação Pós-operatória

A reabilitação pós-operatória foi realizada através de manutenção em tipoia tipo Velpeau simples por 6 semanas, sendo estimulada a movimentação ativa do cotovelo, do punho e da mão desde o pós-operatório imediato. Após a 6ª semana, foi iniciado o ganho do movimento ativo. Por fim, após a 12ª semana, foi iniciado o fortalecimento muscular.

Aprovações Éticas

Todos os pacientes assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido. O presente estudo foi submetido à avaliação e à aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa com Seres Humanos, com número do parecer 2.444.726, CAAE: 80401317.3.0000.0023.

Estatística

Procedeu-se à análise descritiva, expressa pelas medidas de tendência central e de dispersão adequadas para os dados numéricos e pela frequência e percentual para os dados categóricos. Para as variáveis numéricas, foi realizado inicialmente o teste de normalidade de Shapiro-Wilk. Para as variáveis que não apresentaram distribuição normal, a aná- lise estatística foi realizada por meio do teste não paramé- trico de Mann-Whitney, e para aquelas que apresentaram distribuição normal, utilizou-se o teste t de Student. Para as variáveis categóricas, utilizou-se os testes de qui-quadrado ou exato de Fisher, a depender do número de categorias da variável aleatória.

Posteriormente, a amostra foi estratificada nos seguintes subgrupos: 1-lesões pequenas e médias; e 2-lesões grandes e extensas. A partir disso, foram realizadas novas comparações dos resultados funcionais e de força muscular das técnicas de FS e FD dentro destas estratificações.

Também foi realizada análise de regressão linear múltipla para avaliar se as características dos pacientes ou das lesões apresentaram influência nos resultados clínico-funcionais. As variáveis correlacionadas foram: tempo de seguimento, idade, dominância, tamanho da lesão, etiologia da lesão, diabetes e tabagismo.

O critério de determinação de significância adotado foi ao nível de 5%. A análise estatística foi processada pelo software IBM SPSS Statistics for Windows, versão 20.0 (IBM Corp., Armonk, NY EUA).

Resultados

Características Demográficas e Cirúrgicas Entre os Grupos

No período de 2011 a 2018, 465 pacientes foram submetidos ao reparo artroscópico do MR. Destes, 147 foram excluídos por terem sido submetidos a outros procedimentos durante a cirurgia, 8 foram a óbito e 182 se recusaram a participar ou o contato não foi possível.

A amostra foi composta por 135 ombros (128 pacientes). Destes, 94 (69,6%) correspondem aos casos operados pela técnica de FS e 41 (30,4%) à de FD. O tempo médio de seguimento foi de 46,5 meses, sendo que não houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos FS e FD. Quando comparadas as características demográficas e o perfil cirúrgico entre os grupos, observou-se diferença estatisticamente significativa para a idade (FS: 59 ± 9 versus FD: 55 ± 8), superior no grupo FS (p = 0,010) e para o número de âncoras utilizadas (FS:3 ± 1 versus FD: 4 ± 1), superior no grupo FD (p = 0,012). As demais variáveis foram estatisticamente similares e estão expostas na ►Tabela 1.

Tabela 1
Caracterização da amostra

Características das Lesões de Manguito Rotador Entre os Grupos

Quanto ao tipo de lesão, ambos os grupos apresentaram predominância dos casos de rupturas totais (FS: 83% versus FD: 82,9%). Dentre as rupturas parciais, as bursais foram maioria e não houve nenhum caso intrassubstancial. Em relação ao tamanho das lesões totais, o grupo FS apresentou maior percentual das lesões extensas (34,6%), enquanto o grupo FD, das lesões médias (32,4%). No entanto, estas diferenças entre os grupos quanto ao percentual de cada lesão não apresentaram significância estatística (p = 0,136). A descrição completa dos dados está exposta na ►Tabela 2.

Tabela 2
Caracterização e comparação das lesões de Manguito Rotador (parciais e totais) entre os grupos Fileira Simples (FS) e Fileira Dupla (FD)

Comparação de Variáveis de Força Muscular, Funcionais e Dor entre os Grupos

Foi observada uma diferença estatisticamente significativa na força de elevação anterior do ombro entre os grupos (p = 0,017). O grupo FD demonstrou maiores níveis de força quando comparado com o grupo FS na elevação anterior (FS: 4,72 ± 2,73 kg versus FD: 5,90 ± 2,73 kg). As demais variáveis de força muscular e função (ADM e questionários de capacidade funcional reportada) foram similares (p > 0,05) (►Tabela 3).

Tabela 3
Comparação das variáveis funcionais, força muscular e dor entre os grupos Fileira Simples (FS) e Fileira Dupla (FD)

Quanto à dor no período de seguimento, não houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos (►Tabela 3). Porém, foi possível observar que, em ambos os grupos, > 50% dos pacientes não apresentaram quadro álgico durante a avaliação clínica no seguimento pósoperatório.

A análise de regressão linear múltipla não mostrou relação entre os resultados clínico-funcionais e as variáveis de tempo de seguimento, dominância, tamanho da lesão, etiologia da lesão, diabetes e tabagismo. No entanto, a idade dos pacientes correlacionou-se aos resultados de força de elevação, rotação lateral e rotação medial.

Comparação de Variáveis Funcionais e de Força Muscular Estratificadas Pelo Tamanho das Lesões Totais

Realizando-se a análise de forma estratificada, comparou-se os resultados funcionais e de força muscular entre os grupos (FS e FD), estratificados em lesões pequenas/médias e lesões grandes/extensas.

Na análise por lesões pequenas e médias, não foram encontradas diferenças entre os grupos (►Tabela 4). Porém, na análise das lesões grandes e extensas, os pacientes submetidos à FD apresentaram superioridade tanto na força muscular de elevação (FS: 3,98 ± 2,24 kg versus FD: 6,39 ± 2,73 kg) quanto no escore Constant (FS: 81 ± 10 versus FD: 88 ± 7) (►Tabela 5).

Tabela 4
Comparação das variáveis funcionais e de força muscular entre os grupos Fileira Simples (FS) e Fileira Dupla (FD), estratificados nas lesões pequenas e médias do manguito rotador
Tabela 5
Comparação das variáveis funcionais e de força muscular entre os grupos Fileira Simples (FS) e Fileira Dupla (FD), estratificados nas lesões grandes e extensas do manguito rotador

Discussão

Analisando-se as características da amostra, a única variável que apresentou diferença estatisticamente significativa entre os grupos foi a idade, a qual era maior no grupo de FS. Em ambos, o valor médio foi compatível com a literatura.66 Vieira FA, Olawa PJ, Belangero PS, Arliani GG, Figueiredo EA, Ejnisman B. Lesão do manguito rotador: tratamento e reabilitação. Perspectivas e tendências atuais. Rev Bras Ortop 2015;50 (06):647-651,2222 Godinho GG, França FdeO, Freitas JM, et al. Result from arthroscopic surgical treatment of renewed tearing of the rotator cuff of the shoulder. Rev Bras Ortop 2015;50(01):89-93 Esta diferença de idade é importante porque o perfil das rupturas do MR varia bastante de acordo com a faixa etária2525 Lazarides AL, Alentorn-Geli E, Choi JH, et al. Rotator cuff tears in young patients: a different disease than rotator cuff tears in elderly patients. J Shoulder Elbow Surg 2015;24(11):1834-1843, sendo que as lesões em idosos são geralmente degenerativas.2525 Lazarides AL, Alentorn-Geli E, Choi JH, et al. Rotator cuff tears in young patients: a different disease than rotator cuff tears in elderly patients. J Shoulder Elbow Surg 2015;24(11):1834-1843 Este tipo de lesão, em geral, apresenta maior grau de infiltração gordurosa, variável que se correlaciona com piores desfechos, uma vez que indica má qualidade do tendão e aumenta o risco de rerrupturas.2626 McElvany MD, McGoldrick E, Gee AO, Neradilek MB, Matsen FA 3rd. Rotator cuff repair: published evidence on factors associated with repair integrity and clinical outcome. Am J Sports Med 2015;43(02): 491-500

Quanto ao gênero, ambos os grupos foram compostos por maioria feminina. Este dado vai ao encontro do apresentado pela literatura, que indica que, de forma geral, os pacientes submetidos ao reparo artroscópico do MR são em sua maioria mulheres.22 Carvalho AL, Martinelli F, Tramujas L, Baggio M, Crocetta MS, Martins RO. Rotator cuff injuries and factors associated with reoperation. Rev Bras Ortop 2016;51(03):298-302,1111 Senna LF, Ramos MRF, Bergamaschi RF. Arthroscopic rotator cuff repair: single-row vs. double-row - clinical results after one to four years. Rev Bras Ortop 2018;53(04):448-453,2323 Miyazaki AN, da Silva LA, Santos PD, Checchia SL, Cohen C, Giora TS. Evaluation of the results from arthroscopic surgical treatment of rotator cuff injuries in patients aged 65 years and over. Rev Bras Ortop 2015;50(03):305-311 Em ambos os grupos, o ombro dominante foi o mais operado, maioria também encontrada em outros estudos nacionais.22 Carvalho AL, Martinelli F, Tramujas L, Baggio M, Crocetta MS, Martins RO. Rotator cuff injuries and factors associated with reoperation. Rev Bras Ortop 2016;51(03):298-302,2323 Miyazaki AN, da Silva LA, Santos PD, Checchia SL, Cohen C, Giora TS. Evaluation of the results from arthroscopic surgical treatment of rotator cuff injuries in patients aged 65 years and over. Rev Bras Ortop 2015;50(03):305-311

Estudos biomecânicos enfatizam o potencial aumento da área de contato no footprint e maximização das forças de reparo em FD, o que pode diminuir a taxa de falha anatô- mica.2727 Meier SW, Meier JD. The effect of double-row fixation on initial repair strength in rotator cuff repair: a biomechanical study. Arthroscopy 2006;22(11):1168-1173,2828 Smith CD, Alexander S, Hill AM, et al. A biomechanical comparison of single and double-row fixation in arthroscopic rotator cuff repair. J Bone Joint Surg Am 2006;88(11): 2425-2431 No entanto, em análise de desfechos clínicos, as controvérsias ainda persistem.77 DeHaan AM, Axelrad TW, Kaye E, Silvestri L, Puskas B, Foster TE. Does double-row rotator cuff repair improve functional outcome of patients compared with single-row technique? A systematic review. Am J Sports Med 2012;40(05):1176-1185

8 Chen M, Xu W, Dong Q, Huang Q, Xie Z, Mao Y. Outcomes of singlerow versus double-row arthroscopic rotator cuff repair: a systematic review and meta-analysis of current evidence. Arthroscopy 2013;29(08):1437-1449

9 Ying ZM, Lin T, Yan SG. Arthroscopic single-row versus doublerow technique for repairing rotator cuff tears: a systematic review and meta-analysis. Orthop Surg 2014;6(04):300-312
-1010 Sobhy MH, Khater AH, Hassan MR, El Shazly O. Do functional outcomes and cuff integrity correlate after singleversus doublerow rotator cuff repair? A systematic review and meta-analysis study. Eur J Orthop Surg Traumatol 2018;28(04):593-605 Neste sentido, comparamos os resultados de força muscular, função e dor de pacientes após o reparo artroscópico do MR com FS e FD.

Nossos resultados confirmam, em parte, a hipótese inicial. Evidenciamos maior força muscular de elevação anterior em pacientes submetidos a reparo em FD. Porém, as demais variáveis de força muscular, função e dor foram similares entre as técnicas.

Sobhy et al.1010 Sobhy MH, Khater AH, Hassan MR, El Shazly O. Do functional outcomes and cuff integrity correlate after singleversus doublerow rotator cuff repair? A systematic review and meta-analysis study. Eur J Orthop Surg Traumatol 2018;28(04):593-605 concluíram que, a curto (mínimo de 12 meses de seguimento) e médio prazo (mínimo de 24 meses), pacientes tratados com a técnica de FD apresentaram escore UCLA significativamente maior. Além disso, os autores identificaram que, no longo prazo, há uma correlação direta entre a integridade do MR e os resultados funcionais, com superioridade da técnica de FD. Com isso, ao se analisar os resultados funcionais, verifica-se indiretamente a integridade do tendão submetido ao procedimento, reduzindo, em parte, o impacto da não realização de exames de imagem no presente estudo. De forma semelhante, Ying et al.99 Ying ZM, Lin T, Yan SG. Arthroscopic single-row versus doublerow technique for repairing rotator cuff tears: a systematic review and meta-analysis. Orthop Surg 2014;6(04):300-312 identificaram valores superiores de força muscular nos pacientes submetidos à técnica de FD. No presente estudo, identificamos maior força muscular no movimento de elevação do ombro nos pacientes que foram submetidos à técnica de FD. No entanto, os resultados de função e dor foram semelhantes entre os grupos. A maior área de inserção do tendão no úmero, proporcionado pela técnica de FD, leva a uma maior chance de o tendão reparado manter-se íntegro ao seguimento. Esta integridade está diretamente relacionada ao ganho de força do respectivo músculo.1010 Sobhy MH, Khater AH, Hassan MR, El Shazly O. Do functional outcomes and cuff integrity correlate after singleversus doublerow rotator cuff repair? A systematic review and meta-analysis study. Eur J Orthop Surg Traumatol 2018;28(04):593-605,2222 Godinho GG, França FdeO, Freitas JM, et al. Result from arthroscopic surgical treatment of renewed tearing of the rotator cuff of the shoulder. Rev Bras Ortop 2015;50(01):89-93,2929 Tudisco C, Bisicchia S, Savarese E, et al. Single-row vs. double-row arthroscopic rotator cuff repair: clinical and 3 Tesla MR arthrography results. BMC Musculoskelet Disord 2013;14:43,3030 Shen C, Tang ZH, Hu JZ, Zou GY, Xiao RC. Incidence of retear with double-row versus single-row rotator cuff repair. Orthopedics 2014;37(11):e1006-e1013

Ademais, com o objetivo de identificar maiores benefícios para grupos específicos de pacientes, a estratificação por lesões grandes e extensas permitiu a visualização da maior efetividade da técnica de FD nas variáveis de força muscular (elevação anterior do ombro) e do escore Constant. Contudo, não visualizamos diferença estatística nos desfechos analisados ao compararmos as técnicas em lesões pequenas e médias. Quanto às diferenças entre os dois escores utilizados, apesar de o UCLA incluir a força de elevação,1616 Amstutz HC, Sew Hoy AL, Clarke IC. UCLA anatomic total shoulder arthroplasty. Clin Orthop Relat Res 1981;(155):7-20 o escore Constant apresenta mais variáveis em sua composição, principalmente uma variedade maior de movimentos e de atividades diárias,1717 Constant CR, Murley AH. A clinical method of functional assessment of the shoulder. Clin Orthop Relat Res 1987;(214):160-164 o que pode ter levado aos diferentes resultados entre essas escalas.

Semelhantemente, dois ensaios clínicos randomizados evidenciaram melhores resultados com a técnica de FD em pacientes com lesões > 3 cm.2121 Carbonel I, Martinez AA, Calvo A, Ripalda J, Herrera A. Single-row versus double-row arthroscopic repair in the treatment of rotator cuff tears: a prospective randomized clinical study. Int Orthop 2012;36(09):1877-1883,3131 Ma HL, Chiang ER, Wu HT, et al. Clinical outcome and imaging of arthroscopic single-row and double-row rotator cuff repair: a prospective randomized trial. Arthroscopy 2012;28(01): 16-24 Carbonel et al.2121 Carbonel I, Martinez AA, Calvo A, Ripalda J, Herrera A. Single-row versus double-row arthroscopic repair in the treatment of rotator cuff tears: a prospective randomized clinical study. Int Orthop 2012;36(09):1877-1883 encontraram melhores resultados nos escores UCLA e American Shoulder and Elbow Surgeons (ASES), enquanto Ma et al.3131 Ma HL, Chiang ER, Wu HT, et al. Clinical outcome and imaging of arthroscopic single-row and double-row rotator cuff repair: a prospective randomized trial. Arthroscopy 2012;28(01): 16-24 observaram força significativamente maior nos grupos submetidos à FD. Como exposto anteriormente, a técnica de fixação em FD leva a uma maior integridade do tendão no pós-operatório.1010 Sobhy MH, Khater AH, Hassan MR, El Shazly O. Do functional outcomes and cuff integrity correlate after singleversus doublerow rotator cuff repair? A systematic review and meta-analysis study. Eur J Orthop Surg Traumatol 2018;28(04):593-605,2929 Tudisco C, Bisicchia S, Savarese E, et al. Single-row vs. double-row arthroscopic rotator cuff repair: clinical and 3 Tesla MR arthrography results. BMC Musculoskelet Disord 2013;14:43,3030 Shen C, Tang ZH, Hu JZ, Zou GY, Xiao RC. Incidence of retear with double-row versus single-row rotator cuff repair. Orthopedics 2014;37(11):e1006-e1013 Ao se analisar os fatores que levam a novas rupturas, é bem relatado que o tamanho inicial da lesão é fator significativo de influência sobre a cicatrização do tendão, sendo que o risco relativo de rerruptura aumenta em 2,29 vezes para cada 1 cm a mais no tamanho da lesão.3232 Nho SJ, Brown BS, Lyman S, Adler RS, Altchek DW, MacGillivray JD. Prospective analysis of arthroscopic rotator cuff repair: prognostic factors affecting clinical and ultrasound outcome. J Shoulder Elbow Surg 2009;18(01):13-20,3333 Bedeir YH, Jimenez AE, Grawe BM. Recurrent tears of the rotator cuff: Effect of repair technique and management options. Orthop Rev (Pavia) 2018;10(02):7593 Esta constatação pode explicar o fato de as lesões maiores se beneficiarem mais da técnica de FD. Uma vez que, naturalmente, tais lesões tendem a apresentar maiores chances de novas lesões,3232 Nho SJ, Brown BS, Lyman S, Adler RS, Altchek DW, MacGillivray JD. Prospective analysis of arthroscopic rotator cuff repair: prognostic factors affecting clinical and ultrasound outcome. J Shoulder Elbow Surg 2009;18(01):13-20,3333 Bedeir YH, Jimenez AE, Grawe BM. Recurrent tears of the rotator cuff: Effect of repair technique and management options. Orthop Rev (Pavia) 2018;10(02):7593 uma técnica que ofereça maior integridade pós-operatória pode trazer melhores resultados1010 Sobhy MH, Khater AH, Hassan MR, El Shazly O. Do functional outcomes and cuff integrity correlate after singleversus doublerow rotator cuff repair? A systematic review and meta-analysis study. Eur J Orthop Surg Traumatol 2018;28(04):593-605,2929 Tudisco C, Bisicchia S, Savarese E, et al. Single-row vs. double-row arthroscopic rotator cuff repair: clinical and 3 Tesla MR arthrography results. BMC Musculoskelet Disord 2013;14:43,3030 Shen C, Tang ZH, Hu JZ, Zou GY, Xiao RC. Incidence of retear with double-row versus single-row rotator cuff repair. Orthopedics 2014;37(11):e1006-e1013 Porém, em lesões menores, tal benefício não é tão evidente, uma vez que a fixação simples seria suficiente para garantir bons resultados pós-operatórios.

Diante do exposto, conclui-se que a técnica de FD apresenta superioridade apenas na força de elevação do ombro. No entanto, ao se realizar uma análise estratificada pelo tamanho das lesões, a técnica de fixação em FD apresentou melhores resultados para pacientes com lesões > 3 cm (grandes e extensas). Portanto, parece ser fundamental analisar o tamanho da lesão do paciente ao optar-se por uma técnica de fixação em detrimento da outra.

Quanto aos pontos negativos da FD, além do aumento do custo e do tempo de cirurgia, esta técnica possui complicações específicas, como o local na qual a falha do reparo ocorre.3434 Schmidt CC, Jarrett CD, Brown BT. Management of rotator cuff tears. J Hand Surg Am 2015;40(02):399-408 Enquanto na técnica de FS a falha ocorre no sítio de reparo, na FD ela ocorre na junção musculotendínea, sendo, portanto, uma complicação mais grave, cujo tratamento é desafiador.3434 Schmidt CC, Jarrett CD, Brown BT. Management of rotator cuff tears. J Hand Surg Am 2015;40(02):399-408

Dentre os pontos fortes do presente estudo, destaca-se a análise pós-operatória realizada com diversas variáveis de funcionalidade do ombro, assim como a estratificação dos casos conforme o tamanho da lesão, o que possibilitou identificar um subgrupo de pacientes que apresentaram maior benefício com o uso da técnica de FD.

Dentre as limitações, existe a heterogeneidade quanto à variável idade, o que pode influenciar na análise dos resultados, uma vez que os pacientes submetidos à FS apresentaram média de idade maior. Além disso, cabe destacar a ausência de análise quanto ao custo das técnicas, uma vez que a fixação em FD apresenta maior uso de âncoras. Este é um parâmetro que precisa ser correlacionado com a melhora funcional para se estabelecer o real custo-benefício deste procedimento em estudos futuros.

Ademais, existem limitações quanto ao delineamento do estudo, retrospectivo e observacional, o qual, portanto, não permite concluir quanto à superioridade ou não de uma técnica ou de outra, mas sim levantar hipóteses que devem ser confirmadas por meio de ensaios clínicos. Outra limitação refere-se à não avaliação de fatores prognósticos no pré- operatório, como o trofismo muscular e o grau de infiltração gordurosa, assim como a ausência de avaliação de exames de imagem no pós-operatório.

Conclusão

A utilização da técnica de FD no reparo artroscópico do MR possibilitou melhores resultados funcionais, especialmente nos casos de lesões grandes e extensas, com superioridade na força de elevação anterior e no escore Constant em relação aos pacientes submetidos à técnica de FS.

  • Suporte Financeiro
    Não houve suporte financeiro de fontes públicas, comerciais, ou sem fins lucrativos.

References

  • 1
    Sambandam SN, Khanna V, Gul A, Mounasamy V. Rotator cuff tears: An evidence based approach. World J Orthop 2015;6(11): 902-918
  • 2
    Carvalho AL, Martinelli F, Tramujas L, Baggio M, Crocetta MS, Martins RO. Rotator cuff injuries and factors associated with reoperation. Rev Bras Ortop 2016;51(03):298-302
  • 3
    Dang A, Davies M. Rotator Cuff Disease: Treatment Options and Considerations. Sports Med Arthrosc Rev 2018;26(03):129-133
  • 4
    Oliva F, Piccirilli E, Bossa M, et al. I.S.Mu.L.T - Rotator Cuff Tears Guidelines. Muscles Ligaments Tendons J 2016;5(04):227-263
  • 5
    Malavolta EA, Assunção JH, Beraldo RA, Pinto GMR, Gracitelli MEC, Ferreira Neto AA. Reparo do manguito rotador no Sistema Único de Saúde: tendência brasileira de 2003 a 2015. Rev Bras Ortop 2017;52(04):501-505
  • 6
    Vieira FA, Olawa PJ, Belangero PS, Arliani GG, Figueiredo EA, Ejnisman B. Lesão do manguito rotador: tratamento e reabilitação. Perspectivas e tendências atuais. Rev Bras Ortop 2015;50 (06):647-651
  • 7
    DeHaan AM, Axelrad TW, Kaye E, Silvestri L, Puskas B, Foster TE. Does double-row rotator cuff repair improve functional outcome of patients compared with single-row technique? A systematic review. Am J Sports Med 2012;40(05):1176-1185
  • 8
    Chen M, Xu W, Dong Q, Huang Q, Xie Z, Mao Y. Outcomes of singlerow versus double-row arthroscopic rotator cuff repair: a systematic review and meta-analysis of current evidence. Arthroscopy 2013;29(08):1437-1449
  • 9
    Ying ZM, Lin T, Yan SG. Arthroscopic single-row versus doublerow technique for repairing rotator cuff tears: a systematic review and meta-analysis. Orthop Surg 2014;6(04):300-312
  • 10
    Sobhy MH, Khater AH, Hassan MR, El Shazly O. Do functional outcomes and cuff integrity correlate after singleversus doublerow rotator cuff repair? A systematic review and meta-analysis study. Eur J Orthop Surg Traumatol 2018;28(04):593-605
  • 11
    Senna LF, Ramos MRF, Bergamaschi RF. Arthroscopic rotator cuff repair: single-row vs. double-row - clinical results after one to four years. Rev Bras Ortop 2018;53(04):448-453
  • 12
    Huang AL, Thavorn K, van Katwyk S, MacDonald P, Lapner P. Double-Row Arthroscopic Rotator Cuff Repair Is More Cost-Effective Than Single-Row Repair. J Bone Joint Surg Am 2017;99(20): 1730-1736
  • 13
    Lo IK, Burkhart SS. Double-row arthroscopic rotator cuff repair: re-establishing the footprint of the rotator cuff. Arthroscopy 2003;19(09):1035-1042
  • 14
    Davidson J, Burkhart SS. The geometric classification of rotator cuff tears: a system linking tear pattern to treatment and prognosis. Arthroscopy 2010;26(03):417-424
  • 15
    Andrade RP, Correa Filho MRC, Queiroz BC. Lesões do manguito rotador. Rev Bras Ortop 2004;39(11/12):621-635
  • 16
    Amstutz HC, Sew Hoy AL, Clarke IC. UCLA anatomic total shoulder arthroplasty. Clin Orthop Relat Res 1981;(155):7-20
  • 17
    Constant CR, Murley AH. A clinical method of functional assessment of the shoulder. Clin Orthop Relat Res 1987;(214):160-164
  • 18
    Scott J, Huskisson EC. Graphic representation of pain. Pain 1976;2 (02):175-184
  • 19
    Barreto RP, Barbosa ML, Balbinotti MA, Mothes FC, da Rosa LH, Silva MF. The Brazilian version of the Constant-Murley Score (CMS-BR): convergent and construct validity, internal consistency, and unidimensionality. Rev Bras Ortop 2016;51(05):515-520
  • 20
    Oku EC, Andrade AP, Stadiniky SP, Carrera EF, Tellini GG. Tradução e adaptação cultural do Modified-University of California at Los Angeles Shoulder Rating Scale para a língua portuguesa. Rev Bras Reumatol 2006;46(04):246-252
  • 21
    Carbonel I, Martinez AA, Calvo A, Ripalda J, Herrera A. Single-row versus double-row arthroscopic repair in the treatment of rotator cuff tears: a prospective randomized clinical study. Int Orthop 2012;36(09):1877-1883
  • 22
    Godinho GG, França FdeO, Freitas JM, et al. Result from arthroscopic surgical treatment of renewed tearing of the rotator cuff of the shoulder. Rev Bras Ortop 2015;50(01):89-93
  • 23
    Miyazaki AN, da Silva LA, Santos PD, Checchia SL, Cohen C, Giora TS. Evaluation of the results from arthroscopic surgical treatment of rotator cuff injuries in patients aged 65 years and over. Rev Bras Ortop 2015;50(03):305-311
  • 24
    Gilotra M, O’Brien MJ, Savoie FH 3rd. Arthroscopic Rotator Cuff Repair: Indication and Technique. Instr Course Lect 2016;65:83-92
  • 25
    Lazarides AL, Alentorn-Geli E, Choi JH, et al. Rotator cuff tears in young patients: a different disease than rotator cuff tears in elderly patients. J Shoulder Elbow Surg 2015;24(11):1834-1843
  • 26
    McElvany MD, McGoldrick E, Gee AO, Neradilek MB, Matsen FA 3rd. Rotator cuff repair: published evidence on factors associated with repair integrity and clinical outcome. Am J Sports Med 2015;43(02): 491-500
  • 27
    Meier SW, Meier JD. The effect of double-row fixation on initial repair strength in rotator cuff repair: a biomechanical study. Arthroscopy 2006;22(11):1168-1173
  • 28
    Smith CD, Alexander S, Hill AM, et al. A biomechanical comparison of single and double-row fixation in arthroscopic rotator cuff repair. J Bone Joint Surg Am 2006;88(11): 2425-2431
  • 29
    Tudisco C, Bisicchia S, Savarese E, et al. Single-row vs. double-row arthroscopic rotator cuff repair: clinical and 3 Tesla MR arthrography results. BMC Musculoskelet Disord 2013;14:43
  • 30
    Shen C, Tang ZH, Hu JZ, Zou GY, Xiao RC. Incidence of retear with double-row versus single-row rotator cuff repair. Orthopedics 2014;37(11):e1006-e1013
  • 31
    Ma HL, Chiang ER, Wu HT, et al. Clinical outcome and imaging of arthroscopic single-row and double-row rotator cuff repair: a prospective randomized trial. Arthroscopy 2012;28(01): 16-24
  • 32
    Nho SJ, Brown BS, Lyman S, Adler RS, Altchek DW, MacGillivray JD. Prospective analysis of arthroscopic rotator cuff repair: prognostic factors affecting clinical and ultrasound outcome. J Shoulder Elbow Surg 2009;18(01):13-20
  • 33
    Bedeir YH, Jimenez AE, Grawe BM. Recurrent tears of the rotator cuff: Effect of repair technique and management options. Orthop Rev (Pavia) 2018;10(02):7593
  • 34
    Schmidt CC, Jarrett CD, Brown BT. Management of rotator cuff tears. J Hand Surg Am 2015;40(02):399-408

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    29 Jul 2020
  • Aceito
    23 Abr 2021
  • Publicado
    21 Jan 2022
Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia Al. Lorena, 427 14º andar, 01424-000 São Paulo - SP - Brasil, Tel.: 55 11 2137-5400 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbo@sbot.org.br