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Escoamento atmosférico no Centro de Lançamento de Alcântara (CLA): parte I - aspectos observacionais

Flow at the Alcantara Launching Center: part I - observational aspects

Resumos

O escoamento atmosférico no Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) foi investigado através de análises de perfis de vento, sendo os dados coletados através de sensores de direção e velocidade do vento, instalados em uma torre anemométrica (TA) (com 6 níveis de medidas em 6, 10, 16,3, 28,5, 43 e 70 m), no período de 1995-1999. Esta TA situa-se a 200 m da costa litorânea, que se apresenta na forma de uma falésia e está posicionada próximo à rampa de lançamento de foguetes. Um conjunto de dados adicional (anos de 2004-2005) foi também utilizado para as análises de validação. Os resultados mostraram que a velocidade de fricção (u*) foi igual a 0,32 ± 0,13 m/s (0,46 ± 0,11) para os meses de chuva (seco), enquanto que o parâmetro de rugosidade (z0) foi igual a 0,19 ± 0,32 (0,06 ± 0,05 m) para os meses de chuva (seco), mostrando a sazonalidade destes parâmetros. O expoente ± da velocidade potencial variou de 0,19 (julho) a 0,27 (março), decrescendo este valor com a altura tanto no período de chuvas, quanto no período seco. A validação dos valores de α, com dados de vento dos anos de 2004 e 2005, mostraram que, para o mês representativo da estação chuvosa (março), os valores estimados foram superiores aos observados na TA, devido à fraca condição de neutralidade. Para o mês seco, as velocidades calculadas e observadas foram muito próximas, uma vez que a velocidade do vento é forte (valor médio superior a 10 m/s), produzindo muita mistura turbulenta na forma mecânica e implicando em uma atmosfera neutra.

Torre Anemométrica; estabilidade neutra; perfil logarítmico do vento; Lei de Potência


The atmospheric flow at the Alcantara Launching Center (CLA) was studied through analysis of the wind profile data measured during the period from 1995 to 1999 (considered as a control) at six levels (6, 10, 16.3, 28.5, 43 and 70 m) on an anemometric tower (TA), which is placed 200 m from the sea coast (50 m height cliff), near the rocket launching platform. Two additional years (2004-2005) data set were used for validation analysis. The results showed that the friction velocity (u*) was equal to 0.32 ± 0.13 m/s (0.46 ± 0.11 m/s) during the rainy (dry) period, while the roughness length (z0) was equal to 0.19 ± 0.32 m (0.06 ± 0.05 m) for the rainy (dry) period, thus showing the seasonality of these turbulence parameters. The exponent ± of the wind velocity Power Law varied from 0.19 (July) to 0.27 (March), presenting a decrease on the coefficient (α) with altitude. Using the data set from 2004-2005, for a typical rainy month (March), it was showed that the estimated velocities are greater than the measured ones, which was due to the weaker atmospheric neutrality conditions. However, for a dry month, the estimated and computed velocities were about the same, as the mechanical turbulence (wind speed) is higher than 10 m/s and thus implying a neutral atmosphere condition.

anemometric tower; neutral atmosphere; Wind profile logarithmic; Power Law


ARTIGOS

Escoamento atmosférico no Centro de Lançamento de Alcântara (CLA): parte I - aspectos observacionais

Flow at the Alcantara Launching Center: part I - observational aspects

Suelen Trindade RoballoI; Gilberto FischII

IInstituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), suelen@cptec.inpe.br

IIInstituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), gfisch@iae.cta.br

RESUMO

O escoamento atmosférico no Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) foi investigado através de análises de perfis de vento, sendo os dados coletados através de sensores de direção e velocidade do vento, instalados em uma torre anemométrica (TA) (com 6 níveis de medidas em 6, 10, 16,3, 28,5, 43 e 70 m), no período de 1995-1999. Esta TA situa-se a 200 m da costa litorânea, que se apresenta na forma de uma falésia e está posicionada próximo à rampa de lançamento de foguetes. Um conjunto de dados adicional (anos de 2004-2005) foi também utilizado para as análises de validação. Os resultados mostraram que a velocidade de fricção (u*) foi igual a 0,32 ± 0,13 m/s (0,46 ± 0,11) para os meses de chuva (seco), enquanto que o parâmetro de rugosidade (z0) foi igual a 0,19 ± 0,32 (0,06 ± 0,05 m) para os meses de chuva (seco), mostrando a sazonalidade destes parâmetros. O expoente ± da velocidade potencial variou de 0,19 (julho) a 0,27 (março), decrescendo este valor com a altura tanto no período de chuvas, quanto no período seco. A validação dos valores de α, com dados de vento dos anos de 2004 e 2005, mostraram que, para o mês representativo da estação chuvosa (março), os valores estimados foram superiores aos observados na TA, devido à fraca condição de neutralidade. Para o mês seco, as velocidades calculadas e observadas foram muito próximas, uma vez que a velocidade do vento é forte (valor médio superior a 10 m/s), produzindo muita mistura turbulenta na forma mecânica e implicando em uma atmosfera neutra.

Palavras chaves: Torre Anemométrica, estabilidade neutra, perfil logarítmico do vento, Lei de Potência

ABSTRACT

The atmospheric flow at the Alcantara Launching Center (CLA) was studied through analysis of the wind profile data measured during the period from 1995 to 1999 (considered as a control) at six levels (6, 10, 16.3, 28.5, 43 and 70 m) on an anemometric tower (TA), which is placed 200 m from the sea coast (50 m height cliff), near the rocket launching platform. Two additional years (2004-2005) data set were used for validation analysis. The results showed that the friction velocity (u*) was equal to 0.32 ± 0.13 m/s (0.46 ± 0.11 m/s) during the rainy (dry) period, while the roughness length (z0) was equal to 0.19 ± 0.32 m (0.06 ± 0.05 m) for the rainy (dry) period, thus showing the seasonality of these turbulence parameters. The exponent ± of the wind velocity Power Law varied from 0.19 (July) to 0.27 (March), presenting a decrease on the coefficient (α) with altitude. Using the data set from 2004-2005, for a typical rainy month (March), it was showed that the estimated velocities are greater than the measured ones, which was due to the weaker atmospheric neutrality conditions. However, for a dry month, the estimated and computed velocities were about the same, as the mechanical turbulence (wind speed) is higher than 10 m/s and thus implying a neutral atmosphere condition.

Keywords: anemometric tower, neutral atmosphere, Wind profile logarithmic, Power Law

1. INTRODUÇÃO

A região de estudo abrange o Centro de Lançamento Alcântara (CLA), que é uma base para lançamentos de foguetes ou veículos espaciais localizada no município de Alcântara, no litoral norte do Estado do Maranhão. Essa região possui características típicas, com uma região de superfície lisa (oceano) próximo a uma superfície rugosa (continente). O relevo local lembra um degrau, pois o continente encontra uma relativa variação topográfica (falésia) com grande inclinação e altura de aproximadamente 50 m, sendo o topo uma região relativamente plana, conforme pode ser observado na Figura 1. Próximo a esta falésia, a uma distância da borda de 150 m, encontra-se a rampa de lançamento de foguetes do CLA.


A parte inferior da Camada Limite Planetária (CLP), conhecida como Camada Limite Superficial (CLS), estende-se desde o solo até aproximadamente 100 a 120 m. Nesta camada ocorrem grandes variações da temperatura, umidade e do vento com a altura, fazendo com que as trocas turbulentas mais intensas de momentum, calor e umidade ocorram na mesma. Uma compreensão do regime de ventos e da turbulência atmosférica na CLS é de grande importância nos estudos da Meteorologia Aeroespacial, pois de suas características são extraídas informações básicas para o projeto e desenvolvimento de foguetes e veículos espaciais. Os foguetes são projetados e construídos para suportarem uma determinada carga pela ação do vento, além do fato de que a sua trajetória, controle e guiagem são determinados pelo perfil do vento próximo à superfície. Até uma altitude de 1000 m, 88 % das correções nas trajetórias dos foguetes, ao ascenderem verticalmente, são devidas ao vento, enquanto que, acima de 5000 m, a influência do vento na trajetória é de apenas 3% (Fisch, 1999).

No caso do CLA, o vento é proveniente do oceano e seu perfil está inicialmente em equilíbrio com a superfície lisa. Ao ocorrer uma mudança brusca de rugosidade superficial (escoamento atingir a falésia) ocorre uma modificação do perfil do vento e um novo equilíbrio é obtido de forma gradual. Nesta interação ocorre o deslocamento vertical do nível zero da superfície devido à falésia e a vegetação arbustiva do local. Como a rampa de lançamento está numa localização próxima a costa litorânea, os foguetes sofrem a influência de intensa turbulência ao ascenderem verticalmente.

Na região de estudo, o regime de vento é muito intenso, independente da hora do dia (Fisch, 1999). De acordo com Loredo-Souza et al. (2004), para ventos com médias horárias acima de 10 m/s, o escoamento é turbulento o suficiente para suprimir os efeitos térmicos, podendo a atmosfera ser considerada neutra. Para esta situação, a descrição adequada do escoamento geralmente é realizada através de perfis de velocidades médias instantâneas locais. Várias leis experimentais permitem efetuar o ajuste de velocidades médias do vento; no presente trabalho foram aplicadas a Lei Logarítmica e a Lei de Potência.

A variação de velocidade média U com a altura z até aproximadamente 100 m acima de uma superfície rugosa pode ser representada pela relação logarítmica, através da expressão:

em que u* (m/s) é a velocidade de atrito, k é a constante de Von Karman cujo valor adotado é geralmente de 0,40 (Stull, 1988) e z0 é o comprimento de rugosidade aerodinâmica (m).

A estimativa de z0 é realizada através de dados de perfis verticais do vento e extrapolada para a altura em que o vento é nulo. De acordo com Arya (1988), o valor de z0 para regiões de mar aberto e calmo é da ordem de 10-4 m, para regiões litorâneas é da ordem de 10-3 m, em regiões com muitas árvores e poucas construções ao redor situam-se entre 0,1 a 0,3 m e para locais de subúrbios e centros urbanos (cidades pequenas) situam-se entre 0,4 e 0,6 m. Os mesmos valores foram encontrados em Hsu et al. (1994) para as categorias de mar aberto e regiões litorâneas. Para superfícies consideradas lisas, como lagos e campos abertos, este parâmetro apresentou-se na ordem de 0,03 m nos trabalhos de Blessmann (1995) e Alvarez y Alvarez e Wittwer (2006). Considerando terrenos urbanos, o valor de z0 situou-se em torno de 0,3 m (Alvarez y Alvarez e Wittwer, 2006).

No caso de existir vegetação ou construções, há a necessidade de se fazer uma correção da altura em que o vento é nulo. Portanto, define-se para perfis de velocidade local do vento sobre superfícies rugosas, um deslocamento do plano zero (d) que está associado ao comprimento de rugosidade z0. Conceitualmente, d é uma altura acima da superfície em que a velocidade do vento é nula, conseqüência do escoamento sobre obstáculos tais como árvores ou construções. Considerando este deslocamento, a Eq.(1) transforma-se em:

A Lei de Potência, muito utilizada em estudos de engenharia, pode ser definida pela Eq. (3), em que U(zn) e U(zr) são valores de velocidades médias correspondentes uma altura zn e uma altura de referência zr:

A altura de referência geralmente é considerada no valor de 10 m, que é a altura preconizada pela Organização Mundial de Meteorologia (OMM). O valor do expoente α (adimensional) depende da estabilidade atmosférica, da velocidade do vento e da rugosidade aerodinâmica. Vários estudos têm mostrado que o expoente α possui valor de aproximadamente 1/7 (0,14) e descreve os perfis de vento nos primeiros 100 m em condições de estabilidade próximas à neutralidade (Farrugia, 2003). Segundo Arya (1988) este expoente alcança valores de 0,10 para superfícies lisas tais como mar, neve e gelo e em torno de 0,40 para superfícies de área urbana bem desenvolvida. Alguns trabalhos encontraram valores de α de 0,15 (Blessmann, 1973) e 0,11 (Hsu et al., 1994; Loredo-Souza et al., 2004) para a superfície oceânica. Para campos abertos este valor situa-se em torno de 0,17 (Alvarez y Alvarez e Wittwer, 2006), já para superfícies mais rugosas, como florestas ou regiões com obstáculos, os valores de α são da ordem de 0,31 (Hsu et al., 1994), 0,34 (Loredo-Souza et al., 2004) e 0,25 (Alvarez y Alvarez e Wittwer, 2006).

Os objetivos deste trabalho são o de determinar e analisar parâmetros meteorológicos que caracterizam o escoamento atmosférico na região próxima ao CLA e estudar perfis de velocidades locais. Isto será feito analisando as variáveis (u* e z0) que compõem a equação do perfil logarítmico do vento e o expoente (α) da Lei de Potência.

2. MATERIAL E MÉTODOS

2.1. Localização da região de estudo

O CLA está localizado no município de Alcântara no litoral norte do Estado do Maranhão, com coordenadas geográficas de 2°19' S de latitude e 44°22' W de longitude distante 30 km em linha reta da cidade de São Luiz. A Figura 2 a) mostra uma visão detalhada do CLA, sendo possível observar a Torre Móvel de Integração (TMI), que é a torre de lançamento dos foguetes, e mais ao lado a Torre Anemométrica (TA). A vegetação deste local é característica de região de restinga, com altura média em torno de 2,0 - 3,0 m, sendo bem fechada do ponto de vista da arquitetura das plantas e o dossel homogêneo em termos de altura. O clima apresenta um regime de precipitação dividido em dois períodos: chuvas intensas durante os meses de janeiro a junho, sendo os meses de março e abril os mais chuvosos, com total mensal superior a 300 mm; e período seco, de julho a dezembro, com precipitação inferior a 15 mm por mês (Fisch, 1999). Os meses de agosto e setembro são os mais secos.


Os ventos possuem comportamento distinto entre a época chuvosa e a seca. Durante a estação chuvosa (mês característico: março) o vento superficial é mais fraco, pois é basicamente devido aos ventos alísios. O vento predominante é de leste até aproximadamente 5.000 m de altitude, com velocidades em torno de 7,0 - 8,0 m/s nos níveis entre 1.000 e 3.000 m. Na estação seca (mês de setembro) há uma superposição dos ventos alísios com o fenômeno de brisa marítima, provocando uma intensificação dos ventos (Fisch, 2005). O vento é predominantemente de leste até aproximadamente 8.000 m de altitude, com velocidades em torno de 7,0 - 9,0 m/s. O vento é bem intenso na camada mais baixa (até 2000 m), com velocidades máximas entre 10,0 e 15 m/s, apresentando uma pequena rotação para sudeste. Isto se deve à intensificação do fenômeno de brisa marítima, que possui sua influência máxima (contraste térmico oceano-continente) durante esta época, em particular nos meses de setembro a novembro. A temperatura do ar e a umidade relativa não apresentam variações sazonais, e seus valores são típicos da atmosfera tropical (Fisch et al., 1998).

2.2. Coleta de dados

A coleta dos dados foi realizada por sensores de velocidade (tipo propeller) e direção do vento (do tipo aerovane) da R.M Young (Traverse City, USA) instalados em seis níveis, nas alturas de 6,0 m (nível n = 1), 10,0 m (n = 2), 16,3 m (n = 3), 28,5 m (n = 4), 43,0 m (n = 5) e 70,0 m (n = 6). A direção predominante do vento na TA nos níveis mais baixos é de NE (aproximadamente 45 graus), pois é uma superposição dos ventos alísios com a circulação de brisa marítima. Considerando a direção preferencial do vento, a distância da TA até a falésia é de aproximadamente 200 m. A Figura 2b) mostra uma visão geral do CLA, onde é possível observar a localização da TA com relação à costa litorânea.

2.3. Metodologia

O período de dados considerados foi de 1995 a 1999. Posteriormente, usaram-se os anos de 2004 a 2005 para comprovar e validar alguns dos resultados obtidos. Para obtenção do d, utilizou-se a técnica apresentada por Stull (1988):

em que U2, U3 e U4 são velocidades nos níveis 2, 3 e 4, respectivamente. Estimou-se o valor do d de forma iterativa pelo método da bisseção, obtendo-se o valor de 3,3 m, com o uso de 135.366 perfis de velocidade do vento.

Os parâmetros u* e z0 foram determinados plotando-se graficamente os valores de ln z versus U para cada perfil de velocidade e realizando o ajuste dos pontos de observação por uma regressão linear. A interseção da reta resultante com o eixo das abscissas (U = 0) determinou o valor de ln z0, enquanto a inclinação desta reta foi equivalente a k/u*. Assim, para cada perfil obteve-se u* e z0, conforme mostra esquematicamente a Figura 3. Inicialmente obtiveram-se os valores de u* e z0 sem o d, utilizando a Eq. 1. Em seguida, incluiu-se o valor de 3,3 m na Eq. 2, recalculando-se os parâmetros u* e z0.


Durante as análises, considerou-se o período integral (24horas), período diurno (06:00 às 18:00 h) e noturno (18:00 às 06:00 h). Realizaram-se estas abordagens visando identificar ciclos diários nos dados.

Explicitando a na Eq. 3, tem-se:

Assim, mantendo-se a altura de 10 m (nível n = 2) da TA e respectiva velocidade como referência, computou-se a utilizando as alturas zn (e velocidades correspondentes) iguais a 16,3 m (nível n = 3), 28,5 m (n = 4), 43 m (n = 5) e 70 m (n = 6), respectivamente. A divisão dos períodos (integral, diurno, noturno) seguiu o mesmo critério realizado para obtenção de u* e z0.

Procurou-se validar os valores médios encontrados de α, com dados de perfil de vento para o período de 2004 e 2005, mantendo-se os valores de velocidade média coletados para os níveis 3 a 6, como desconhecidos. Os valores do nível 2 (10 m) foram utilizados para se estimar o restante do perfil vertical e comparar com os observados. Na Eq. 5 substituíram-se os valores médios de α encontrados anteriormente e obtiveram-se novos valores de velocidades médias para cada perfil nos níveis 3 a 6 do período de dados de 2004 e 2005.

3. RESULTADOS

Os perfis de velocidades do vento na TA, considerando dois meses característicos e horários selecionados do dia (00, 03, 06, 09, 12, 15, 18, 21 Hora Local - HL), são apresentados na Figuras 4. Para a estação chuvosa (seca) considerou-se como característico o mês de março (setembro). Na adimensionalização das velocidades locais utilizou-se a velocidade local do nível 6 (70 m) denominada U(z70) da TA. Como é possível observar, praticamente não houve diferença entre os perfis para os diferentes horários do dia; não obstante, para março, observaram-se velocidades locais um pouco maiores no período do meio-dia (12 HL). Este fato pode estar associado com uma maior influência da convecção térmica, conforme será descrito posteriormente. Este resultado é um indício de que a estrutura do vento é similar para as épocas chuvosa e seca.


A Tabela 1 apresenta a distribuição mensal de u*, obtida para o período de 1995 a 1999, desconsiderando inicialmente o d. Seus valores médios, medianas e modas são mais elevados durante o período seco (julho a dezembro). Com a inclusão de d (3,3 m) na equação do perfil logarítmico do vento (Eq. 1), observou-se uma significativa diminuição de u*, continuando os maiores valores no período seco, época em que os ventos de superfície são mais intensos (Fisch, 1999). Na Tabela 2 mostra-se a distribuição mensal de z0. Excluindo o d da Lei Logarítmica (Eq. 1) têm-se valores mais elevados nos meses do período chuvoso. Com a consideração do d (Eq.2), seus valores diminuíram de forma significativa, situando-se a maior freqüência de ocorrência (moda) no intervalo de 0,0 - 0,1 m, para ambos os períodos. Este intervalo é coerente com os resultados encontrados na literatura para o tipo de superfície do CLA (Arya, 1988), o que demonstra a necessidade da consideração de d para expressar o perfil de velocidade local. As distribuições dos parâmetros u* e z0 apresentadas nas Figuras 5 a 8 ilustram, para meses típicos chuvoso (março) e seco (setembro), as diferenças descritas nas Tabelas 1 e 2.





A Figura 5 mostra a diminuição da freqüência de maior ocorrência de u* para o mês de março. Ao se considerar as distribuições sem o parâmetro d, os valores situaram-se no intervalo de classe de 0,4 - 0,5 m/s, reduzindo-se para a classe interior (de 0,3 - 0,4 m/s) para o caso da inclusão de d. Ainda para o mês de março, tem-se a distribuição de z0 na Figura 6. Observa-se uma elevada freqüência de ocorrência (60%) no intervalo entre 0,0-0,1 m ao considerar o deslocamento vertical do nível zero, fato não observado com a sua desconsideração.

Para a estação seca, têm-se as distribuições correspondentes ao mês de setembro para u* (Figura 7) e z0 (Figura 8). Como na estação chuvosa, verificou-se um decréscimo no intervalo de maior ocorrência de valores ao se considerar o d. Para setembro, a maior freqüência de ocorrência dos valores de u* (40%) com o d, permaneceu no intervalo de 0,4-0,5 m/s e de z0 decaiu para o intervalo de 0,0-0,1 m (acima de 80%).

Realizou-se uma análise estatística da distribuição mensal do expoente α, obtido através da Eq. (3), considerando o período de 1995 a 1999, apresentada na Tabela 3. Foi possível notar que os valores médios do expoente ± apresentaram pouca variação entre os meses e com a altura, situando-se no intervalo de 0,20 - 0,25 (adimensional). Uma ligeira diminuição dos valores médios, medianas e modas com a altura pôde ser observada. Os valores obtidos foram coerentes com os encontrados na literatura para o tipo de terreno do CLA (Alvarez y Alvarez e Wittwer, 2006).

Tendo em vista que os resultados obtidos na Tabela acima pudessem estar associados com a direção do vento e possíveis problemas associados à pista ("fetch") do local, analisou-se a influência da direção do vento na obtenção dos valores de ±. Para isto, consideraram-se os seguintes intervalos da direção do vento com relação ao norte, no sentido horário:

a) 337,5º < ângulos 22,5º (N),

b) 22,5º < ângulos 67,5° (NE),

c) 67,5º < ângulos 112,5º (E),

d) 112,5° < ângulos 157,5º (SE),

e) 157,5º < ângulos 202,5º (S),

f) 202,5º < ângulos 247,5º (SO),

g) 247,5º < ângulos 292,5º (O),

h) 292,5º < ângulos 337,5º (NO)

A direção predominante do vento no CLA correspondeu ao intervalo entre 22,6° - 67,5° (NE), conforme mostra a Figura 9, que relaciona os intervalos dos ângulos da direção do vento com os números de perfis utilizados para obtenção de α, para os meses característicos de março (chuvoso) e setembro (seco). Este comportamento já era esperado, em vista da direção preferencial do vento ser muito persistente no CLA (Fisch, 1999).


Considerando o mês de março, a Tabela 4 mostra que os valores noturnos apresentaram-se mais elevados que os diurnos. Para o mês de setembro notou-se o mesmo comportamento, porém com diferenças menores.

A fim de validar os resultados obtidos na determinação de α (Tabela 3), utilizou-se um conjunto de dados independente (um ano completo de dados da TA nos anos de 2004 e 2005), sendo os principais resultados apresentados na Figura 10 a) e b) para o mês de março/ período chuvoso e mês de setembro/ período seco, respectivamente. Para o mês chuvoso, verificou-se que a velocidade estimada do vento foi sempre maior que a observada, indicando que a hipótese de neutralidade não seja tão forte e válida para este período no CLA. Ainda para este mês, os coeficientes de correlação foram próximos a 1,0, nos níveis mais baixos, o que demonstra boa correlação entre as duas velocidades do vento. Entretanto, seus valores diminuem com a altura, como pode ser visto na Tabela 5, a qual além dos coeficientes de correlação apresenta os valores dos coeficientes angular e linear para cada nível. Portanto, o ajuste da lei de potência é melhor nos níveis mais baixos e próximos ao nível 2 (10 m), diminuindo sua capacidade de representar as observações com a altura.


Para o mês seco, nota-se que os valores foram próximos à curva 1:1, comprovando que as velocidades intensas do vento, nesta época do ano, misturam bem a estrutura da CLS, não havendo variação vertical da estabilidade atmosférica e prevalecendo a hipótese de neutralidade na região proposta por Fisch (2005).

4. CONCLUSÕES

Neste trabalho investigou-se o comportamento do escoamento atmosférico na região do CLA. A análise consistiu de dados de vento coletados nos períodos 1995 - 1999 e 2004 - 2005, através de sensores de direção e velocidade do vento, instalados em seis níveis de uma TA de 70 m. Os parâmetros determinados foram a velocidade de atrito (u*) e o comprimento de rugosidade (z0) - que compõem o perfil logarítmico do vento - e o expoente α da Lei de Potência do vento, que caracterizam o escoamento atmosférico. Para as análises dos resultados de u* e z0 observou-se a importância de se considerar o deslocamento vertical do nível zero (d) no cálculo destes parâmetros, devido à maior aproximação dos valores encontrados na literatura para o tipo de superfície do local de estudo. A velocidade de atrito u* para o período chuvoso (seco) foi determinada como sendo de 0,32 ± 0,13 m/s (0,46 ± 0,11 m/s); enquanto z0 obteve o valor de 0,19 ± 0,32 m (0,06 ± 0,05 ) no período chuvoso (seco). Portanto, o perfil logarítmico do vento apresenta parâmetros sazonais, que dependem das condições de tempo (seco ou chuvoso) e que estão associadas a uma intensificação da velocidade do vento. O valor médio mensal do expoente α da Lei de Potência variou de 0,19 a 0,27 ao longo dos meses do ano, sendo maiores no período chuvoso e menores na época seca. Ambos os períodos apresentam um decréscimo com a altura zn, porém este fato é mais acentuado durante o período chuvoso. Este decréscimo nos valores do expoente α é esperado pelo fato do escoamento, em níveis mais altos, não sofrer tanto os efeitos do atrito na superfície. Além disso, a maior velocidade do vento no período de seca homogeneíza, através da mistura turbulenta, a atmosfera, induzindo variações menores de α. A validação de α com dados de vento de 2004 a 2005 mostrou, para mês chuvoso, velocidades locais estimadas maiores que as observadas, indicando ser a hipótese da neutralidade atmosférica menos aplicável. Entretanto, para mês seco, as velocidades do vento estimadas e observadas foram equivalentes, o que corrobora a hipótese da neutralidade.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Recebido Agosto 2007

Aceito Junho 2008

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Abr 2009
  • Data do Fascículo
    Dez 2008

Histórico

  • Aceito
    Jun 2008
  • Recebido
    Ago 2007
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