Acessibilidade / Reportar erro

Repensando necessidades e especificidades no ensino de português como língua adicional para grupos asiáticos1 1 O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (Capes) - Código de Financiamento 001.

Rethinking Needs and Specificities in the Teaching of Portuguese as an Additional Language to Asian Groups

RESUMO

A migração recente de chineses, sul-coreanos e japoneses para o Brasil provocou o aumento da demanda de ensino de português nos últimos anos. Cientes da escassez de materiais didáticos de português para asiáticos e da não consolidação de um campo de pesquisa, buscamos levantar subsídios para a formação de professores de português como língua adicional (PLA) que atuam nesse contexto. Neste artigo, ampliamos a noção de distância linguística e discutimos os estereótipos associados a estudantes asiáticos (KUMARAVADIVELU, 2003KUMARAVADIVELU, B. Problematizing cultural stereotypes in TESOL. TESOL Quarterly, v. 37, n. 4, p. 709-719, 2003.). Propomos, como contribuições teórico-metodológicas para o ensino-aprendizagem de PLA voltado a grupos asiáticos, preceitos da abordagem biográfica (BUSCH, 2006BUSCH, B. Language biographies - approaches to multilingualism in education and linguistic research. In: BUSCH, B.; JARDINE, A.; TJOUTUKU, A. (Org.). Language biographies for multilingual learning. Cape Town: Praesa, 2006. p. 5-19. ; 2016BUSCH, B. Biographical approaches to research in multilingual settings: exploring linguistic repertoires. In: MARTIN-JONES, M.; MARTIN, D. (Ed.). Researching Multilingualism. Abingdon: Routledge, 2016. p. 60-73.), da educação linguística ampliada (CAVALCANTI, 2013CAVALCANTI, M. C. Educação linguística na formação de professores de línguas: intercompreensão e práticas translíngues. In: MOITA LOPES, L. P. (Org.). Linguística Aplicada na modernidade recente. São Paulo: Parábola, 2013. p. 211-226.) e da pedagogia translíngue (GARCÍA, 2017GARCÍA, O. Problematizing linguistic integration of migrants: the role of translanguaging and language teachers. In: BEACCO, J.; KRUMM, H. J.; LITTLE, D; THALGOTT, P. (Ed.). The Linguistic Integration of Adult Migrants. Berlin: De Gruyter Mouton, 2017. p. 11-26.), que auxiliam na revisão do papel do(a) professor(a) nesse processo.

PALAVRAS-CHAVE:
formação de professor; português como língua adicional; distância linguística; português para asiáticos

ABSTRACT

The demand for Portuguese classes has grown in the past years resulting from the recent migration of Chinese, South Koreans, and Japanese to Brazil. Given the scarcity of Brazilian Portuguese textbooks to teach Asian learners and the lack of research to consolidate that field, this study aims to contribute with directions for teaching education of Portuguese as an additional language for Asian learners. We expand the linguistic distance concept and discuss stereotypes associated with Asian students (KUMARAVADIVELU, 2003KUMARAVADIVELU, B. Problematizing cultural stereotypes in TESOL. TESOL Quarterly, v. 37, n. 4, p. 709-719, 2003.). To fill some of the theoretical and methodological gaps concerning such context, we rethink the role the teacher plays in this context by interlacing the following concepts: biographical approach (BUSCH, 2006BUSCH, B. Language biographies - approaches to multilingualism in education and linguistic research. In: BUSCH, B.; JARDINE, A.; TJOUTUKU, A. (Org.). Language biographies for multilingual learning. Cape Town: Praesa, 2006. p. 5-19. ; 2016BUSCH, B. Biographical approaches to research in multilingual settings: exploring linguistic repertoires. In: MARTIN-JONES, M.; MARTIN, D. (Ed.). Researching Multilingualism. Abingdon: Routledge, 2016. p. 60-73.), broadened linguistic education (CAVALCANTI, 2013CAVALCANTI, M. C. Educação linguística na formação de professores de línguas: intercompreensão e práticas translíngues. In: MOITA LOPES, L. P. (Org.). Linguística Aplicada na modernidade recente. São Paulo: Parábola, 2013. p. 211-226.) and translanguaging pedagogy (GARCÍA, 2017GARCÍA, O. Problematizing linguistic integration of migrants: the role of translanguaging and language teachers. In: BEACCO, J.; KRUMM, H. J.; LITTLE, D; THALGOTT, P. (Ed.). The Linguistic Integration of Adult Migrants. Berlin: De Gruyter Mouton, 2017. p. 11-26.).

KEYWORDS:
teacher education; Portuguese as an additional language; linguistic distance; Portuguese for Asians learners

1 Introdução

Na condição de professoras de português como língua adicional (PLA) para alunos(as) japoneses(as), chineses(as) e coreanos(as), diversas vezes precisamos lidar com a curiosidade de interlocutores que, ao saberem da nacionalidade de nossos(as) aprendizes, nos fazem perguntas como “Nossa, mas eles(as) conseguem aprender de verdade?” ou ainda “A parte oral deve ser difícil, porque eles(as) são muito tímidos(as), né?”. Narrando nossas experiências com estudantes asiáticos(as) dos mais diferentes perfis (faixa etária, gênero, objetivos) e observando falas de outros(as) professores(as) de PLA sobre esse grupo, reconhecemos que não é incomum que - mesmo nas nossas narrativas - diversos estereótipos culturais emerjam, calcados num discurso dominante que reforçaria o West/Rest2 2 Resumidamente, pode-se dizer que o West (Ocidente) é um construto histórico (e não geográfico). Qualquer sociedade “desenvolvida, industrializada, urbanizada, capitalista, secular e moderna” (HALL, 1993, p. 186) se caracterizaria como ocidental. Em oposição a esse conjunto de imagens que pode compor o West, haveria o Rest (Resto), marcadamente inferior (menos desenvolvido, menos moderno etc). Segundo Hall, na base do discurso dessa produção de sentidos estaria o conceito de diferença. (HALL, 1993HALL, S. The West and the Rest: discourse and power. In: HALL, S.; GIEBEN, B. (Ed.). Formations of modernity. Cambridge: Polity Press, 1993. p. 275-331.) também em nossas práticas.

No anseio de refletir sobre esses estereótipos que permeiam o ensino de português para asiáticos(as), buscamos, no presente artigo, levantar subsídios para a formação de professores(as) de PLA, considerando especialmente os que atuam ou pretendem atuar no contexto de ensino-aprendizagem para falantes de línguas distantes, em específico, de coreano, japonês e mandarim.

Houve, por certo tempo, um relevante aumento na demanda de ensino de português para asiáticos(as), que acompanhou o crescimento do português no mundo. Nas últimas três décadas, a língua portuguesa alcançou um status de língua transnacional (ZOPPI-FONTANA, 2009ZOPPI-FONTANA, M. G. Introdução. In: ZOPPI-FONTANA, M. G. O português do Brasil como língua transnacional. Campinas: RG, 2009. p. 13-41.), em um momento marcado por iniciativas, tanto do Estado brasileiro quanto da sociedade, para promover a língua nacionalmente e para além das fronteiras. Neste transbordamento, também a área de PLA adquiriu espaço e o interesse pelo ensino-aprendizagem do português cresceu gradativamente, marcado pelas relações econômicas entre países, pela internacionalização das universidades e pela vinda ao Brasil de migrantes de crise.

A despeito das relações comerciais firmadas entre o Brasil e os países asiáticos que compõem nosso recorte (Japão, Coreia do Sul e China), não se identificam ações suficientes por parte do governo brasileiro relacionadas à promoção de ensino de português para esses grupos. Na prática pedagógica, constatamos uma baixa produção de materiais didáticos para asiáticos(as)3 3 Até onde pudemos constatar, há apenas o Bem-Vindo! A Língua Portuguesa no mundo da comunicação: Caderno de exercícios para estudantes de origem asiática (PONCE; MATSUBARA, 2009) publicado pela Editora SBS, e o Português para tailandeses (FERREIRA, 2012), elaborado pela autora com apoio da Embaixada do Brasil em Bangkok e publicado pela Rede Brasil Cultural do Ministério das Relações Exteriores. no Brasil, bem como um campo de pesquisa ainda não fortalecido que se debruça sobre a questão. Há, por isso, uma expectativa de que este artigo possa se somar às poucas produções existentes.

Advogamos pela importância de nós, como acadêmicos(as) e professores(as) de língua, desnaturalizarmos e desconstruirmos o exoticismo referente ao que se chama de Ásia-calcado em relações e jogos de poder que transparecem nos mais diferentes campos: nas artes, na educação, nas ciências, na política, na economia.

Assim, a discussão que aqui propomos tem dupla motivação. A primeira está relacionada a nossa atuação enquanto professoras de PLA e, de forma complementar, a nossas inquietações com relação ao ensino de português no contexto migratório recente para o Brasil. A segunda diz respeito a nossa atuação acadêmica, com o desenvolvimento de nossas pesquisas de doutorado: de um lado, políticas linguísticas de PLA e de inserção no contexto de internacionalização de uma universidade pública, com o olhar voltado especificamente para alunos(as) chineses(as), coreanos(as) e japoneses(as) (FRAZATTO, em desenvolvimentoFRAZATTO, B. E. “Ainda não entendo nada e por isso é muito difícil, mas vale a pena, eu acho”: internacionalização e políticas de inserção em narrativas de estudantes chineses, japoneses e sul-coreanos em uma universidade brasileira. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, em desenvolvimento.), e, de outro, trajetórias linguísticas de adolescentes migrantes sul-coreanos(as) residentes na região de Campinas (GABAS, em desenvolvimentoGABAS, T. M. Cartografias de linguagem: narrativas sobre trajetória linguística e migratória de adolescentes sul-coreanos. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, em desenvolvimento. ).4 4 Ambas as pesquisas estão sendo realizadas sob orientação da Profa. Dra. Ana Cecília Cossi Bizon (PPGLA/IEL/Unicamp).

O artigo está organizado de forma a apresentar, na seção 2, um panorama do movimento migratório asiático para o Brasil, concentrando-se, principalmente, por conta dos nossos cenários de pesquisas e de atuação, na relevância da migração recente para a Região Metropolitana e Administrativa de Campinas (São Paulo). Na seção 3, explicitamos nossa filiação à Linguística Aplicada Indisciplinar e à área de PLA, trazendo alguns conceitos que embasam as discussões realizadas nas seções subsequentes. Na seção 4, exploramos a noção de distância linguística e como ela poderia ser expandida. Em seguida, na seção 5, discutimos alguns estereótipos associados a asiáticos(as), bem como o impacto que esses podem vir a ter na sala de aula e em sua extensão. Na seção 6, guiamo-nos por alguns aspectos da educação linguística ampliada, da abordagem biográfica e da pedagogia translíngue como subsídios para a prática pedagógica no contexto aqui apresentado e, por fim, apresentamos as considerações finais na seção 7.

Ressaltamos que implicações na utilização de alguns termos utilizados durante o artigo não passam despercebidas. Apenas por questão de praticidade na leitura, optamos pelo uso de “asiático(a)” considerando o recorte específico dos países que focalizamos, mas não ignoramos as diversas representações estereotipadas e totalizadoras associadas ao termo, como abordaremos ao longo da discussão.

2 O Brasil na rota das migrações do Leste Asiático

Nesta seção, apresentamos brevemente um panorama da migração de japoneses, chineses e coreanos para o Brasil. Dividimos o grande movimento migratório em dois fluxos distintos: do final do século XIX até 1980, caracterizado por uma migração histórica, e de 1980 até o momento atual, atravessado por relações resultantes de novos arranjos econômicos, culturais, políticos e educacionais.

Tecer considerações sobre as características diferentes entre esses dois grandes movimentos migratórios importa para a discussão que propomos no presente artigo porque entendemos que o papel do português nessa nova dinâmica de mobilidade difere do papel que tal língua desempenhava na migração histórica dos grupos asiáticos. Afirmamos isso pois há diferenças no que se refere à integração dos grupos na sociedade, às práticas linguísticas e às ideologias que subsidiaram o ensino em outros períodos.

O tema da migração de japoneses, coreanos e chineses para o Brasil quase sempre reside no imaginário nacional associado à migração histórica desses grupos. A nosso ver, há nesse imaginário dois problemas de compreensão: o primeiro, da homogeneização desses movimentos migratórios; o segundo, da exotização associada a essas populações e a suas práticas culturais. São diásporas distintas, cujas motivações se deram sobretudo por diversos contextos de instabilidades intensificados por conflitos sociopolíticos vivenciados pelos três países principalmente durante o século XX. Com o intuito de mapear sucintamente os deslocamentos da migração asiática histórica para o Brasil e diferenciá-los da recente onda asiática para o Brasil, recuperamos agora discussões realizadas por alguns autores que se ocupam de tais temas.

A diáspora chinesa pode ser dividida em quatro fases (WEINONG, 2012 apud FREIRE DA SILVA, 2018FREIRE DA SILVA, C. Conexões Brasil-China: a migração chinesa no centro de São Paulo. Cadernos Metrópole , São Paulo, v. 20, n. 41, p. 223-243, 2018. ). O primeiro ciclo se inicia em 1812 com a vinda de agricultores para o cultivo de chá no Rio de Janeiro, atividade que não se mostrou produtiva em solo brasileiro. O segundo ciclo, mais tímido, está relacionado a uma pontual migração de chineses da região de Qingtian para o Rio de Janeiro em 1910. São chineses que se dedicavam à indústria têxtil e compunham uma já estabelecida dinâmica migratória para a Europa. Entre 1949 e 1979, terceira fase da diáspora para o Brasil, a saída de chineses da parte continental era muito restrita, de forma que, nesse período, principalmente taiwaneses5 5 Ao apresentar o ciclo da migração chinesa, Weinong considera Taiwan também como parte do ciclo (WEINONG, 2012 apud FREIRE DA SILVA, 2018). comerciantes conseguiram fixar residência em São Paulo. Na quarta fase, o massivo estabelecimento de chineses decorre tanto da abertura político-econômica do Brasil quanto da viabilidade legal concedida pelo governo chinês. A partir de 1979, são fortalecidas as trocas comerciais entre China e outros centros atacadistas voltados para o comércio popular, entre eles, o Brasil, em especial São Paulo, o que fez circular produtos e pessoas, conforme descreve Freire da Silva (2018FREIRE DA SILVA, C. Conexões Brasil-China: a migração chinesa no centro de São Paulo. Cadernos Metrópole , São Paulo, v. 20, n. 41, p. 223-243, 2018. ).

Já o ano de 1908 marca o início da diáspora japonesa para o Brasil, dividida em três grandes ondas (MORALES; AKAMINE; SUZUKI, 2018MORALES, L. M.; AKAMINE, A.; SUZUKI, M. E. The ongoing mobilities of Japanese-Brazilians: language ideology, identities and language education. In: CAVALCANTI, M. C.; MAHER, T. M. (Ed.). Multilingual Brazil: language resources, identities and ideologies in a globalized world. New York: Routledge , 2018. p. 129-140.). De acordo com as autoras, a primeira onda foi impulsionada por problemas sociais vivenciados no Japão em função da alta densidade demográfica do país. Os primeiros grupos de japoneses foram enviados para as áreas de cultivo de café no interior de São Paulo e norte do Paraná e, devido à pouca familiaridade com o setor rural, enfrentaram dificuldades para se estabelecerem. Após esse período inicial, os japoneses conseguiram cumprir seus contratos e conquistaram independência dos empregadores, organizando-se posteriormente em colônias dedicadas às atividades agrícolas. As colônias eram organizadas a partir de associações que administravam assuntos gerais da comunidade e da educação das crianças. O ímpeto nacionalista que acometeu o Brasil a partir de 1930 impôs enormes desafios às comunidades japonesas, que passaram a ser monitoradas e tiveram suas práticas linguísticas e culturais censuradas pela polícia de Getúlio Vargas.6 6 Ainda assim, conforme discutido em Frazatto (2012), associações culturais tiveram e ainda têm papel para os descendentes de japoneses no que se refere ao ensino da língua japonesa e à construção de identidades. Com o fim da 2ª Guerra Mundial e a derrota do Japão, muitas famílias viram a permanência no Brasil como única opção. É nesse contexto que se inicia o segundo período da vinda de japoneses fugindo dos conflitos do pós-guerra. Entre 1980 e 1990, as autoras comentam que o Brasil atravessou uma época de recessão econômica que impulsionou a ida expressiva de dekasseguis - brasileiros descendentes de japoneses que vão ao Japão em busca de trabalho - para fábricas e empresas japonesas. Após a crise asiática de 1997, o Japão igualmente vivenciou um estágio de crise econômica, período que marca a terceira fase da migração japonesa, a partir dos anos 2000, com o retorno de dekasseguis e suas famílias para o Brasil.

A diáspora coreana é a mais recente das três e está relacionada a uma abertura tardia para o Ocidente (CHOI, 1996CHOI, K. J. Imigração coreana na cidade de São Paulo. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, São Paulo, n. 40, p. 233-238, 1996.). Segundo o autor, o processo migratório coreano pode ser classificado por diferentes fases, brevemente descritas a seguir. A primeira, inexpressiva, contou com a vinda de coreanos naturalizados japoneses entre 1910 e 1956. A segunda fase, de pré-migração oficial, aconteceu com o estabelecimento de 14 famílias da Primeira Delegação de Cooperação. A terceira e oficial se caracterizou pelo efetivo deslocamento de coreanos para o Brasil, de 1963 a 1971, com a vinda de famílias de refugiados que escapavam de uma situação de conflito social e político decorrente da Guerra da Coreia (1950-1953). No período de grande instabilidade que se seguiu à divisão do país, o governo da Coreia do Sul promulgou a Lei de Emigração do Governo Coreano e firmou acordo com alguns países nas Américas, a saber, Estados Unidos, Canadá e Brasil. Havia uma exigência por parte do governo brasileiro de que os coreanos se estabelecessem em áreas rurais. Essa exigência resultou em insucesso, pois eram grupos de migrantes escolarizados e oriundos de áreas urbanas. Rapidamente, aconteceu uma migração interna e consequente realocamento de coreanos no bairro do Bom Retiro em São Paulo, um bairro que historicamente recebeu diferentes grupos de migrantes desde o século XIX. A ausência de capital em um contexto urbano ocasionou o investimento por parte das famílias no setor têxtil. A atividade, anteriormente conduzida por judeus, tornou-se vantajosa para a comunidade coreana porque dependia de pouco investimento inicial e garantia rápido retorno financeiro. A cidade de São Paulo passou a ser o destino majoritário de sul-coreanos e consolidou-se o papel da comunidade coreana no polo atacadista de moda feminina (CHI, 2016CHI, J. Y. Imigrantes coreanos na formação do polo atacadista de moda feminina de pronta-entrega no bairro do Bom Retiro, São Paulo. Pós. Revista do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da FAU-USP, São Paulo, v. 23, n. 41, p. 90-107, 2016.). Em um quarto momento do processo, coreanos migraram para o Brasil de forma clandestina entre os anos de 1972 e 1980, por meio de rotas alternativas via Paraguai e Argentina. Por fim, desde 1980 até hoje, sul-coreanos migram para o Brasil a convite de familiares que aqui residiam, configurando o que passou a ser denominado “migração em cadeia”. Sobretudo no fim da década de 1980, há o enfraquecimento da migração em função do contexto econômico brasileiro.

Uma nova onda migratória asiática distinta desses processos históricos brevemente levantados se inicia em um período recente, a partir do final do século XX, principalmente para o estado de São Paulo.7 7 Conforme dados apresentados por Baeninger, Demétrio e Domeniconi (2020), há um número considerável de asiáticos entre os imigrantes internacionais registrados via Registro Nacional de Estrangeiro (RNE) de 2000 a 2017, nas cinco regiões metropolitanas do estado de São Paulo e em duas aglomerações urbanas (Jundiaí e Piracicaba). Especificamente na cidade de Campinas, Baeninger et al. (2018) apontam um crescimento expressivo no volume de vínculos de trabalho de asiáticos entre os anos de 2000 e 2016. Em ambos os trabalhos, o número de migrantes de origem chinesa, japonesa e coreana é superior ao das outras nacionalidades. Salienta-se que o comportamento da economia brasileira e a posição do Brasil no cenário geopolítico mundial ao longo dos anos foram determinantes para a reinserção do Brasil na rota das migrações internacionais (BAENINGER, 2012BAENINGER, R. A. (Org.). Fases e faces da migração em São Paulo. Campinas: Nepo/Unicamp, 2012. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/2WmC4Oy . Acesso em: 29 set. 2019.
https://bit.ly/2WmC4Oy...
).

Neste artigo, tomamos como recorte migrantes que compõem os fluxos migratórios recentes para o país, especificamente para o interior do estado de São Paulo, resultantes de relações econômicas e acadêmicas entre Brasil-Japão, Brasil-Coreia e Brasil-China. Portanto, um fluxo migratório composto por dois grupos principais: trabalhadores, e famílias acompanhantes, transferidos para o país para conduzir o funcionamento das fábricas aqui instaladas, 8 8 Observamos que, entre os funcionários das empresas, a maioria é de homens, casados, acompanhados de esposas e, em média, com dois filhos. Para uma discussão sobre o papel da família no projeto migratório específico de sul-coreanos, cf. Gabas (2016; 2018). e estudantes em modalidade de intercâmbio universitário. Ambas as modalidades são contextualizadas a seguir.

A busca pelo Brasil por parte de corporações japonesas, coreanas e chinesas como mercado consumidor e como destino para instalação de empresas acompanha um movimento global em que novos modos de acúmulo de capital pós-fordistas diversificaram a produção, a circulação e o consumo de bens e de trabalhadores (SASSEN, 1988SASSEN, S. The mobility of labor and capital: a study in international investment and labor flow. Cambridge: Cambridge University Press, 1988.). Nessa direção, desde a década de 1990 até o presente momento, foram realizados investimentos diretos no Brasil, motivados principalmente por aspectos do mercado brasileiro, particularmente tamanho e crescimento (cf. OGASAVARA; MASIERO, 2013OGASAVARA, M. H.; MASIERO, G. Internationalization of Asian companies in Brazil: Factors and motivations. International Journal of Management, Hoboken, v. 30, n. 3, p. 149-165, 2013.).

Como descrito em Oliveira e Masiero (2005OLIVEIRA, H. A.; MASIERO, G. Estudos asiáticos no Brasil: contexto e desafios. Revista Brasileira de Política Internacional, Brasília, DF, v. 48, n. 2, p. 5-28, 2005.), a ampliação de relações econômicas entre o Brasil e os países do Leste Asiático se intensificou, primeiramente, com a instalação de empresas do setor de eletroeletrônico a partir dos anos 1990, como Samsung e LG, além da Huawei, que abastecia o mercado brasileiro com equipamentos de telecomunicações. Grupos de outros setores, como Shandong Energy Group, da área de geração de energia termoelétrica, Shangai Baosteel, de mineração de aço e ferro, e CJ Corps, de produção de ração animal, despontaram como protagonistas no mercado nacional entre 1990 e 2000. É ainda relevante apontar que a China se destaca como a maior parceira comercial do Brasil desde 2009, sendo o Brasil grande exportador de matéria-prima, e a China, grande investidora no setor de energia (CÂMARA, 2020CÂMARA, M. E. B. Relações bilaterais Brasil-China: uma análise e mensuração dos fluxos comerciais e de investimento no século XXI. In: SEMINÁRIO PESQUISAR A CHINA CONTEMPORÂNEA, 3., 2019, Campinas. Anais […]. Campinas: Unicamp, 2020.).

Além disso, o setor de automotivos se tornou bastante robusto com a presença expressiva de fábricas no interior de São Paulo. A opção pelo interior acompanha a desconcentração industrial da Região Metropolitana do Estado de São Paulo iniciada na década de 1970.9 9 Embora haja outras empresas chinesas, coreanas e japonesas em outras regiões e estados brasileiros, há uma concentração expressivamente maior no interior de São Paulo, em termos de investimentos, geração de empregos e produção. Com uma série de políticas de incentivos fiscais (OGASAVARA; MASIERO, 2013OGASAVARA, M. H.; MASIERO, G. Internationalization of Asian companies in Brazil: Factors and motivations. International Journal of Management, Hoboken, v. 30, n. 3, p. 149-165, 2013.; TAKAMI, 2017TAKAMI, S. T. A importância dos linkages e dos serviços para as indústrias automotivas no corredor asiático no estado de São Paulo. 2017. Tese (Doutorado em Geografia) - Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2017.), cidades do interior do estado atraíram as empresas asiáticas e garantiram a instalação dos parques industriais principalmente em municípios das Regiões Administrativas de Campinas e Sorocaba, constituindo o que Takami (2017TAKAMI, S. T. A importância dos linkages e dos serviços para as indústrias automotivas no corredor asiático no estado de São Paulo. 2017. Tese (Doutorado em Geografia) - Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2017.) nomeia por Corredor Asiático das Indústrias Automotivas (CAIA). Pode-se citar, nessa região, a Honda, instalada em Sumaré em 1997; a Toyota, instalada em Indaiatuba em 1998 e em Sorocaba em 2012, e a Hyundai, instalada em Piracicaba em 2012. As fábricas, na análise de Takami, usam o território de forma corporativa a partir de círculos de cooperação, utilizando mão de obra local e nacional, bem como importando mão de obra qualificada dos países de origem.

Paralelamente à transferência de funcionários de empresas transnacionais asiáticas, estudantes de universidades japonesas, coreanas e chinesas integram uma modalidade migratória que hoje está fortemente vinculada a acordos de cooperação entre universidades brasileiras e universidades dos países mencionados, e a ações que compõem o cenário de internacionalização das universidades, como uma das autoras do presente artigo vem estudando (FRAZATTO, em desenvolvimentoFRAZATTO, B. E. “Ainda não entendo nada e por isso é muito difícil, mas vale a pena, eu acho”: internacionalização e políticas de inserção em narrativas de estudantes chineses, japoneses e sul-coreanos em uma universidade brasileira. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, em desenvolvimento.).

A Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), principal instituição da região e de expressão nacional e internacional, tem recebido, nos últimos anos, um contingente significativo de alunos(as) provenientes de universidades asiáticas que costumam residir de seis meses a um ano no Brasil. Nota-se que um grande contingente desses(as) alunos(as) está interessado especificamente no português e realiza a maior parte da graduação em português já no país de origem.

Além de programas de mobilidade estudantil, especificamente na Unicamp, outras ações reforçam a presença chinesa e sul-coreana e apontam para políticas linguísticas externas dos respectivos países. É o caso do Instituto Confúcio, inaugurado em 2014, para a promoção da cultura e língua chinesa, e do Instituto King Sejong, inaugurado em 2015, para promoção da cultura e língua coreana.10 10 Há diversas unidades do Instituto Confúcio distribuídas em diferentes estados brasileiros e algumas unidades do Institutos King Sejong nos estados de SP, RS e no DF. O Instituto Confúcio na Unicamp foi fruto de um convênio entre a universidade brasileira e a sede do Instituto Confúcio na China (Hanban), em parceria com a Beijing Jiaotong University (BJTU). Igualmente, o Instituto King Sejong na Unicamp foi resultado de convênio realizado pela universidade com a sede do Instituto King Sejong na Coreia do Sul e a Universidade de Ulsan.

Juntamente com os esforços das universidades brasileiras na área de português, os deslocamentos de ambas as modalidades apresentadas acima têm contribuído, segundo Schlatter e Garcez (2018SCHLATTER, M.; GARCEZ, P. M. Portuguese as an Additional Language: global trends in local actions. In: CAVALCANTI, M. C.; MAHER, T. M. (Ed.). Multilingual Brazil: language resources, identities and ideologies in a globalized world. New York: Routledge , 2018. p. 211-224., p. 211), para que “a proficiência em português e o conhecimento sobre culturas brasileiras venham a ser valorizados nos contextos educacionais e nos setores econômicos”. Tem sido possível notar, no caso da região que destacamos, um crescimento na demanda pelo ensino de português: aulas particulares em empresas para seus funcionários, aulas particulares para esposas acompanhantes, aulas de português em escolas regulares privadas onde estão matriculados os filhos dessas famílias, aulas e projetos de ensino de português para estudantes universitários e pesquisadores.

Por isso, faz-se necessário pensar em como a área de PLA tem respondido a essas novas demandas, bem como explicitar como nos posicionamos teoricamente.

3 Implicações da LA Indisciplinar para o PLA

As últimas décadas foram de inúmeras mudanças no mundo em que vivemos, com destaque especial para alguns dos fatores intensificados pela globalização, tais como os contínuos fluxos de pessoas, informações e produtos que nos dão a sensação de um espaço-tempo comprimido, com instabilidades e transformações em escalas local e global, como pode ser inferido pelas ondas migratórias mencionadas acima.

Na tentativa de melhor investigar esse cenário, encontramos na Linguística Aplicada (LA) Indisciplinar (MOITA LOPES, 2006MOITA LOPES, L. P. (Org.). Por uma Linguística Aplicada Indisciplinar. São Paulo: Parábola , 2006. ) um possível caminho para pensar e problematizar as relações entre língua e sociedade que surgem do contexto de ensino de PLA em que estamos inseridas. Ao nos engajarmos nesse propósito, sabemos que

Só podemos contribuir se considerarmos as visões de significado, inclusive aqueles relativos à pesquisa, como lugares de poder e conflito, que refletem os preconceitos, valores, projetos políticos e interesses daqueles que se comprometem com a construção do significado e do conhecimento. Não há lugar fora da ideologia e não há conhecimento desinteressado. (MOITA LOPES, 2006MOITA LOPES, L. P. (Org.). Por uma Linguística Aplicada Indisciplinar. São Paulo: Parábola , 2006. , p. 102).

Dessa forma, a LA Indisciplinar, como a entendemos, transgride na medida em que vê a necessidade de outro fazer epistemológico e metodológico: atenta-se a problemas sociais e ao papel da linguagem no nosso agir - rompendo com noções de fixidez das línguas e dos sujeitos -, reforça a não neutralidade dos saberes e a urgente necessidade de diálogos co-construídos com diferentes áreas de conhecimento. Para tanto, o ensino-aprendizagem de línguas e a formação de professores(as) precisa ir além da língua a ser ensinada, sendo aliados de uma perspectiva de educação linguística ampliada (CAVALCANTI, 2013CAVALCANTI, M. C. Educação linguística na formação de professores de línguas: intercompreensão e práticas translíngues. In: MOITA LOPES, L. P. (Org.). Linguística Aplicada na modernidade recente. São Paulo: Parábola, 2013. p. 211-226.), como discutiremos com maior profundidade posteriormente.

Apoiadas na noção de repertório linguístico e comunicativo (BUSCH, 2012BUSCH, B. The linguistic repertoire revisited. Applied Linguistics, Oxônia, v. 33, n. 5, p. 503-523, 2012.; CANAGARAJAH, 2013CANAGARAJAH, A. S. Translingual practices: Global Englishes and cosmopolitan relations. New York: Routledge, 2013.; RYMES, 2014RYMES, B. Communicative repertoire. In: LEUNG, C.; STREET, B. V. (Ed.). The Routledge Companion to English Studies. Abingdon: Routledge , 2014. p. 287-301.), entendemos as línguas11 11 Entendemos línguas aqui não só como o que é reconhecidamente instituído como língua, mas também dialetos, variedades e registros. Como lembra Rajagopalan (2003), uma língua seria, nada mais, nada menos, do que um dialeto que teria um exército e uma marinha, o que reforça as relações de poder entre o que se considera ou não uma língua. como entidades fluidas e móveis, ao contrário de muitas teorias que, como criticam García (2017GARCÍA, O. Problematizing linguistic integration of migrants: the role of translanguaging and language teachers. In: BEACCO, J.; KRUMM, H. J.; LITTLE, D; THALGOTT, P. (Ed.). The Linguistic Integration of Adult Migrants. Berlin: De Gruyter Mouton, 2017. p. 11-26.) e Maher (2007MAHER, T. M. Do casulo ao movimento: a suspensão das certezas na educação bilíngue e intercultural. In: CAVALCANTI, M. C.; BORTONI-RICARDO, S. M. (Org.). Transculturalidade, Linguagem e Educação. Campinas: Mercado de Letras, 2007. p. 67-96.), ainda continuam a enxergar as línguas como caixinhas que poderiam ser acopladas umas às outras e cujos limites estão claramente postos. As línguas, assim, compõem o repertório de um falante que, situacionalmente, as utiliza como recursos altamente produtivos na interação. Além disso, é importante ressaltar que os repertórios não são construídos somente por línguas, incluindo também:

gestos, vestimentas, posturas e até o conhecimento de rotinas comunicativas, familiaridade com tipos de comida ou bebida e referências da comunicação de massa, como frases, passos de dança e padrões de entonação familiares que circulam via atores, músicos e outras estrelas (Rymes, 2012). Então, o repertório de um indivíduo pode ser visto como algo similar a uma acumulação de camadas arqueológicas.12 12 No original, “gesture, dress, posture, and even knowledge of communicative routines, familiarity with types of food or drink, and mass media references including phrases, dance moves, and recognizable intonation patterns that circulate via actors, musicians, and other superstars (Rymes, 2012). So, an individual’s repertoire can be seen as something like an accumulation of archeological layers.” (RYMES, 2014RYMES, B. Communicative repertoire. In: LEUNG, C.; STREET, B. V. (Ed.). The Routledge Companion to English Studies. Abingdon: Routledge , 2014. p. 287-301., p. 4).

Portanto, o repertório de um falante não é algo estático, mas sim “algo conquistado na situacionalidade da interação comunicativa com o outro” (BUSCH, 2012BUSCH, B. The linguistic repertoire revisited. Applied Linguistics, Oxônia, v. 33, n. 5, p. 503-523, 2012., p. 16). Nesse sentido, mesmo que, ao longo deste artigo, nos refiramos às línguas “portuguesa”, “japonesa”, “coreana” e “chinesa”, estamos cientes de que essas construções sociais não são utilizadas isoladamente, isto é, compreendemos que são práticas geradas pelos falantes no seio de suas histórias particulares e de suas trajetórias de migração.

Embora o uso do termo língua adicional seja polissêmico, podendo carregar a ideia de algo que se adiciona, na perspectiva assumida aqui, adicional não significa justaposição. Entendemos que, politicamente, esse seria o termo com maior efeito no fazer pesquisa em LA no Brasil nos últimos anos13 13 Uma publicação que marca o uso desse termo e sua importância no momento que vivemos seria Schoffen et al. (2012) e, mais recentemente, Bizon e Diniz (2019). e o consideramos bastante relacionado à noção de repertório. Em primeiro lugar, usar “língua adicional” invoca um distanciamento de outros termos, como língua estrangeira ou segunda língua, noções essas que acabam criando hierarquizações entre falantes e línguas e perpetuam ideologias linguísticas de superioridade, como as do falante nativo; como consequência da primeira situação, usar o termo adicional remete ao conjunto heterogêneo de possibilidades linguísticas dos falantes, na direção de elucidar a própria agência dos falantes. Além disso, como destaca Diniz (2019DINIZ, L. R. A. Para além das fronteiras: a política linguística brasileira de promoção internacional do português. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2019.), o termo permite visibilizar as diferentes línguas existentes no Brasil (e na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), as quais têm sido historicamente silenciadas, como as línguas indígenas, línguas de migração e da língua brasileira de sinais (LIBRAS).

A área, inicialmente denominada de ensino de português para estrangeiros, tem seu início nos anos 1960. A pesquisa neste campo tem aumentado significativamente, atravessada e acompanhada por diferentes políticas de línguas, sejam elas pensadas pelo Estado brasileiro, pelas universidades ou por empresas (SCARAMUCCI; BIZON, 2020SCARAMUCCI, M. V. R.; BIZON, A. C. C. (Org.). Formação inicial e continuada de professores de português língua estrangeira/segunda língua no Brasil. Araraquara: Letraria, 2020.). Além disso, destacam-se períodos de projeção econômica e política do Brasil no mundo, o que promoveu tanto a imagem do país quanto o ensino de português (SCARAMUCCI; BIZON, 2020SCARAMUCCI, M. V. R.; BIZON, A. C. C. (Org.). Formação inicial e continuada de professores de português língua estrangeira/segunda língua no Brasil. Araraquara: Letraria, 2020.; SCHLATTER; GARCEZ; 2018SCHLATTER, M.; GARCEZ, P. M. Portuguese as an Additional Language: global trends in local actions. In: CAVALCANTI, M. C.; MAHER, T. M. (Ed.). Multilingual Brazil: language resources, identities and ideologies in a globalized world. New York: Routledge , 2018. p. 211-224.).

No caso das universidades, destaca-se a criação das licenciaturas específicas na Universidade de Brasília (UnB), Universidade Federal da Bahia (Ufba), Universidade de Integração Latino-Americana (Unila) e na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), entre outras ações.14 14 Cf. Scaramucci e Bizon (2020) para um amplo histórico da área em diferentes universidades.

Já no âmbito do Estado brasileiro, podemos citar a Rede Brasil Cultural, “instrumento do Ministério das Relações Exteriores para a promoção da língua portuguesa e da cultura brasileira no exterior”,15 15 Disponível em: https://bit.ly/3AW9Itv. Acesso em: 20 maio 2020. composta por Centros Culturais Brasileiros, Leitorados e Núcleos de Estudos Brasileiros, além do extinto programa Idiomas sem Fronteiras16 16 O Idiomas sem Fronteiras foi um programa criado pelo governo federal e originado de outro programa, chamado Inglês sem Fronteiras. Foi uma política linguística voltada para a internacionalização das instituições de ensino superior, na qual se ofertava cursos de diversos idiomas, inclusive PLA. Embora tenha sido uma política de muita importância, especialmente para a implementação de políticas linguísticas locais (FRAZATTO, 2020), o Ministério da Educação e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) não manifestaram interesse em subsidiar o programa a partir de junho de 2019, o que dificultou manutenção pelas universidades. Atualmente o programa se tornou Rede Andifes - Idiomas sem Fronteiras. e das recentemente publicadas propostas curriculares para o ensino de português no exterior.17 17 A série de propostas curriculares para o ensino de português como língua adicional para contextos específicos foi publicada pelo Ministério das Relações Exteriores e pela Fundação Alexandre de Gusmão (Funag) e elaborada por diversos pesquisadores brasileiros (BRASIL, 2020a; 2020b, 2020c, 2020d, 2020e). Trata-se de uma importante contribuição para a área de PLA orientando e subsidiando o ensino de português em diferentes cenários; são eles: ensino nas unidades do Itamaraty em países de língua oficial espanhola; ensino nas unidades do Itamaraty em países de língua oficial portuguesa; ensino de literatura brasileira nas unidades do Itamaraty no exterior; ensino para praticantes de capoeira; ensino de português como língua de herança.

Por fim, ainda com relação ao ensino de português para falantes de línguas asiáticas, é possível conceber o papel transnacional do português, principalmente por publicações e/ou eventos de destaque nos últimos anos, como Estudos brasileiros na Ásia (VANZELLI; CHAVES; TEIXEIRA, 2017VANZELLI, J. C.; CHAVES, I. O.; TEIXEIRA, H. G. (Ed.). Estudos brasileiros na Ásia. Viçosa: Editora UFV, 2017.) - uma compilação sobre o ensino de português nos seguintes países: Coreia do Sul, China, Taiwan, Japão, Tailândia e Timor Leste -, O ensino de português na China: Parâmetros e perspectivas (QIAORONG; ALBUQUERQUE, 2019QIAORONG, Y.; ALBUQUERQUE, F. D. (Org.). O ensino do português na China: parâmetros e perspectivas. Natal: EDUFRN, 2019.) e o Simpósio Internacional de Português Língua Estrangeira na Coreia (Siplerc), realizado de forma online em 2019. Além disso, vale destacar a presença de postos aplicadores do Certificado de Proficiência em Língua Portuguesa para Estrangeiros (Celpe-Bras) nesses países, sendo dois postos na China, um na Coreia do Sul18 18 A Coreia do Sul já contou com dois postos aplicadores do Celpe-Bras: o posto aplicador ainda credenciado, na Hankuk University of Foreign Studies (HUFS), e outro na Pusan University of Foreign Studies (BUFS). e um no Japão.

Ainda que haja alguns esforços para o fortalecimento da área de português para asiáticos, são produções e ações muito pontuais. Entendemos que é uma modalidade de ensino composta por particularidades que necessitam de mais reflexão, como é o caso da questão da distância linguística que discutimos a seguir.

4 Desencaixotando a distância linguística

A discussão sobre distância linguística não costuma ser amplamente explorada em pesquisas e artigos na área de LA, estando, em geral, vinculada a modelos quantitativos que objetivam medir a distância entre línguas (CHISWICK; MILLER, 2005CHISWICK, B. R.; MILLER, P. W. Linguistic distance: a quantitative measure of the distance between English and other languages. Journal of Multilingual and Multicultural Development, London, v. 26, n. 1, p. 1-11, 2005.; ISPHORDING; OTTEN, 2011ISPHORDING, I. E.; OTTEN, S. Linguistic distance and the language fluency of immigrants. Ruhr Economic Papers, Essen, n. 274, p. 1-37, 2011.). Embora pesquisas como as mencionadas demonstrem preocupação com fenômenos contemporâneos - ambas focalizando questões migratórias -, a nosso ver, partem de conceptualizações teóricas das quais divergimos, a saber, noções estanques de língua (L1/L2) e fluência (nativo/não-nativo, fluente/não-fluente).

Quando falamos do ensino-aprendizagem em PLA, levamos em consideração que a maior parte dos(as) aprendizes está aprendendo português após experiências de aprendizagem com outras línguas (sejam tais experiências formais ou informais), algo que, em geral, não costuma ser acionado nem em sala de aula, nem em pesquisas sobre distância linguística, como aponta Gessica De Angelis (2007). Da mesma forma, a autora comenta que não é raro que o background do(a) estudante só seja levado em conta quando ele(a) demonstra conhecimento avançado de quaisquer línguas nas quais tenha tido experiência (DE ANGELIS, 2007DE ANGELIS, G. Third or additional language acquisition. Clevedon: Multilingual Matters, 2007.).

Partimos da noção de distância linguística apresentada por De Angelis para, então, ampliarmos esse conceito de modo a contemplar as necessidades aqui apuradas por nós:

Distância linguística se refere à distância que um linguista consegue definir e identificar, objetivamente, formalmente, entre línguas e famílias linguísticas. Por vezes, o termo similaridade formal também é usado para se referir à relação de similaridade entre características ou componentes de duas ou mais línguas, sem necessariamente implicar uma relação genética entre elas. Uma outra distinção está relacionada à noção de distância linguística percebida. É a distância intuída pelos aprendizes entre línguas que pode, ou não, corresponder à distância que realmente existe entre elas.19 19 No original: “Language distance refers to the distance that a linguist can objectively and formally define and identify between languages and language families. Sometimes the term formal similarity is also used to refer to a relationship of similarity between the features or components of two or more languages without necessarily implying a genetic relationship between them. A further distinction relates to the notion of perceived language distance. This is the distance that learners perceive to exist between languages that may, or may not, correspond to the distance that actually exists between them”. (DE ANGELIS, 2007DE ANGELIS, G. Third or additional language acquisition. Clevedon: Multilingual Matters, 2007., p. 22).

De acordo com De Angelis, haveria, de um lado, a distância linguística objetiva e, de outro, a subjetiva. Ela define a primeira como uma ocupação dos linguistas, relacionando-a a aspectos formais, como fonética e sintaxe, e a famílias linguísticas. No caso do nosso recorte, temos coreano, japonês e mandarim, línguas dos(as) nossos(as) aprendizes, cada uma das quais pertencentes a diferentes famílias linguísticas, além da língua a ser ensinada, o português, língua do tronco indo-europeu (especificamente, da família das línguas românicas). A partir somente das famílias linguísticas, a primeira impressão seria a de que essas línguas não teriam elementos em comum, mas há ainda, é claro, outros elementos objetivos que os linguistas levariam em conta na tentativa de traçar a distância entre as línguas, entre eles, por exemplo, a estrutura sintática, que poderia ser discutida extensiva e comparativamente - no caso do japonês e do coreano, uma ordem sujeito-objeto-verbo (SOV), enquanto o português e o mandariam, compartilhariam uma estrutura sujeito-verbo-objeto (SVO).20 20 Importante salientar que nem mesmo essa questão é resolvida de forma simples, pois poderia ser apontado que, embora o mandarim tenha a mesma ordem do português (SVO), no que diz respeito à unidade sintagmática, o mandarim tende a ser uma língua de núcleo final, isto é, o núcleo do sintagma geralmente se localiza no final do sintagma, o que costuma ser mais comum em línguas SOV.

Quanto à distância subjetiva, embora a autora retome aspectos linguísticos que seriam percebidos pelos(as) aprendizes, focalizando, principalmente, a presença (e ausência) de diferentes línguas do repertório do falante durante a aprendizagem de uma língua adicional, isto é, concebendo aprendizes multilíngues, não há nenhuma referência a elementos que não sejam linguísticos e que poderiam caracterizar, ao falante, uma distância que extrapole aspectos formais da língua.

Assim como muitos linguistas frequentemente ainda se detêm em um pensamento restrito à língua enquanto um sistema, sem vinculação à vida social, há ainda muitos professores, diante de uma sala de aula multilíngue, que vêm equipados com um arsenal de conceitos tradicionais de língua, bilinguismo e pedagogia (GARCÍA, 2017GARCÍA, O. Problematizing linguistic integration of migrants: the role of translanguaging and language teachers. In: BEACCO, J.; KRUMM, H. J.; LITTLE, D; THALGOTT, P. (Ed.). The Linguistic Integration of Adult Migrants. Berlin: De Gruyter Mouton, 2017. p. 11-26.).

Portanto, partindo do nosso lugar teórico de uma LA Indisciplinar, à qual nos filiamos, propomos que a noção de distância percebida (ou subjetiva) seja ampliada de forma a considerar “a consciência linguística e discursiva das pessoas” (MOITA LOPES, 2013, p. 24), levando em conta aspectos situados de diferentes ordens - política, econômica, cultural - que podem vir a ser significados tanto individualmente, no repertório do falante, quanto nas vidas sociais. Ora, em outras palavras, pode-se dizer que a distância linguística subjetiva é fortemente atravessada por ideologias linguísticas, definidas por Kroskrity como:

crenças, sentimentos e concepções sobre a estrutura e o uso da língua que, com frequência, sinalizam interesses econômico-políticos de falantes individuais, grupos étnicos e outros grupos de interesses, e de estados-nações.21 21 No original: “beliefs, feelings, and conceptions about language structure and use, which often index the political economic interests of individual speakers, ethnic and other interest groups, and nation-states”. (KROSKRITY, 2010 apud KROSKRITY, 2015KROSKRITY, P. V. Language ideologies: emergence, elaboration, and application In: BONVILLAIN, N. (Ed.). The Routledge handbook of linguistic anthropology. Abingdon: Routledge , 2015. p. 95-108., p. 95, grifos nossos)

Sendo assim, a distância que um falante observa entre uma língua e outra, construída nessa complexa relação entre forças individuais, sociais e institucionais, nem sempre se dá de forma consciente, já que há um conjunto de práticas e atores envolvidos. A título de exemplo, pode-se pensar na relação entre o inglês, o português e o japonês, no Japão, e sustentar que a primeira língua estaria mais próxima do japonês do que a segunda para grande parte dos japoneses, mesmo considerando fatores que não se restrinjam ao uso do inglês como uma “língua franca”. Embora haja empréstimos - sempre representados com um silabário específico, o katakana22 22 Os empréstimos são sempre transpostos à língua escrita incorporando a pronúncia do inglês japonês; por exemplo, a embalagem de uma bala de goma de morango conteria, com frequência, os seguintes dizeres: ストロベリーガム (lido como sutoroberii gamu, strawberry gum). - tanto do português quanto do inglês na língua japonesa, o inglês tem aparecido, por exemplo, na cultura pop japonesa e tem sido analisado como um elemento de construção de identidade étnica e de gênero nessas manifestações (CONDRY, 2006CONDRY, I. Hip-Hop Japan: rap and the paths of cultural globalization. Durham: Duke University Press, 2006.; STANLAW, 2004STANLAW, J. Japanese English: language and culture contact. Hong Kong: Hong Kong University Press, 2004.). Também aparece frequentemente na indústria alimentícia (em rótulos, nomes de produtos e informações nas embalagens) e em cardápios, em propagandas e em documentos do governo (GOTTLIEB, 2011GOTTLIEB, N. The cultures and politics of language in Japan today. In: BESTOR, V. L.; BESTOR, T. C.; YAMAGATA, A. (Ed.). Routledge Handbook of Japanese Culture and Society. Oxon: Routledge, 2011. p. 42-51.), além de ser a língua adicional predominantemente ensinada nas escolas japonesas. Dessa forma, há uma configuração de fatores que tornaria o inglês mais próximo de grande parte da sociedade japonesa do que o português. Entretanto, deve-se levar em conta se isso se manteria caso considerássemos as experiências de um(a) morador(a) da província de Aichi, onde residem mais de 50 mil brasileiros23 23 Disponível em: https://bit.ly/3kQ1FZC . Acesso em: 1 set. 2020. e há diversas escolas e comércios brasileiros.24 24 Como pode ser observado no relato Como é viver em uma cidade japonesa dominada por brasileiros, disponível em: https://bit.ly/39T943W. Acesso em: 1 jun. 2020.

Parece ficar evidente que há uma conjunção de elementos que repercutem na distância linguística percebida pelos falantes, e isso é muito influenciado por quem seria esse falante, em consonância com o que mencionam Leone-Pizzighella e Rymes (2018LEONE-PIZZIGHELLA, A.; RYMES, B. Gathering everyday metacommentary: A methodology to counteract institutional erasure. Language & Communication, Amsterdam, v. 59, p. 53-65, 2018., p. 55): “As autobiografias linguísticas dos indivíduos compreendem muito mais do que proficiência naquilo que se chama de línguas, ou ainda, de variedades. Diversidade linguística e comunicativa se desenvolve ao longo da vida e nos vários contextos sociais”.25 25 No original: “Individuals’ linguistic autobiographies comprise much more than proficiency in named languages or even named ‘varieties’. Linguistic and communicative diversity develop over a lifetime and across various social contexts”.

Na próxima seção, problematizamos os recorrentes estereótipos culturais asiáticos que, com frequência, acabam assolando as aulas de PLA, e assim, ofuscando as diferenças e subjetividades presentes em sala.

5 Estereótipos culturais associados a estudantes asiáticos(as)

Não é exagero afirmar que um dos maiores entraves no contexto de ensino para asiáticos(as) é a dificuldade de se desvencilhar de uma visão totalizadora do sujeito aprendiz. Essa visão está alicerçada em estereótipos culturais que colaboram para representações recorrentes que professores(as) fazem de estudantes asiáticos(as). Para Kumaravadivelu (2003KUMARAVADIVELU, B. Problematizing cultural stereotypes in TESOL. TESOL Quarterly, v. 37, n. 4, p. 709-719, 2003.), esses estereótipos estão assentados em representações presentes no imaginário ocidental, que insiste, principalmente no contexto de sala de aula, em fazer conexões apressadas entre alguns comportamentos de estudantes e rotulações. O autor elenca três representações que habitualmente são reproduzidas nos discursos de professores(as): obediência à figura de autoridade; passividade ou baixa participação em sala de aula; e falta de pensamento crítico.

De fato, são rotulações que eventualmente poderiam corresponder ao comportamento de determinados estudantes asiáticos(as), porém não de todos - afinal, não há uma cultura asiática homogênea, mas sim culturas asiáticas. Outro aspecto reducionista desse exercício de essencialização reside no fato de que são rotulações, em geral, feitas no Ocidente e quase nunca associadas a estudantes ocidentais, o que colabora para o estigma.

Pesquisas citadas por Kumaravadivelu (2003KUMARAVADIVELU, B. Problematizing cultural stereotypes in TESOL. TESOL Quarterly, v. 37, n. 4, p. 709-719, 2003.) demonstram que, além de soluções simplistas, os estereótipos nem sempre condizem com a realidade de sala de aula. No que se refere à obediência, o autor aponta que a submissão incondicional tradicionalmente atribuída aos asiáticos(as), destoa, por exemplo, de linhas de pensamentos das filosofias indiana e chinesa que subsidiam pedagogias ou, ainda, dos não raros problemas de indisciplina em escolas chinesas.

A baixa participação ou passividade de alunos(as) asiáticos(as) tradicionalmente é associada a traços da dinâmica cultural e, nesse caso, também embute simultaneamente processos de estigmatização e de inferiorização. Como coloca Kumaradivelu (2003, p. 717): “se nossos alunos falham em interagir na sala do modo como esperamos que o façam, ou se falham em nos mostrar que prestam atenção do modo como queremos, nós rapidamente explicamos seu comportamento em termos de cultura ou estereótipos culturais.”26 26 No original, “if our students fail to interact in class the way we expect them to, or if they fail to show that they engage their minds the way we want them to, we readily explain their behavior in terms of culture or cultural stereotypes”. Em outras palavras, a possível falta de familiaridade do(a) professor(a) com aspectos do ensino para asiáticos(as) frequentemente resulta em um processo de culpabilização do comportamento do(a) aluno(a) em que o(a) professor(a), a partir de uma interpretação enviesada, responsabiliza o(a) aprendiz por não ter se alinhado a suas estratégias de ensino. Essa responsabilização automática é problemática porque, além de hierarquizar a relação professor-aluno - ainda que de forma sutil -, não leva em consideração questões de outra ordem que poderiam subsidiar a prática pedagógica, por exemplo, o reconhecimento de questões culturais e educacionais como experiências e perspectivas de aprendizagem.

Na sala de aula de língua adicional, a avaliação da participação do(a) estudante nas práticas, sobretudo orais, aponta, nesse sentido, muito mais para convergências e divergências entre as crenças sobre ensino-aprendizagem de professores(as) e estudantes (MENEZES, 2015MENEZES, E. R. Crenças de professores de PLE e alunos asiáticos do CELIN-UFPR. Dissertação (Mestrado em Letras) - Faculdade de Letras, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2015.). Além de uma interpretação culturalmente estigmatizada sobre o comportamento dos(as) aprendizes, a atitude reconhecidamente passiva associada a estudantes asiáticos(as) também tem relação com a experiência escolar e as práticas de letramentos escolares, estando conectada ao sistema educacional, em termos de currículo, de padrões de testes, de metodologias, estratégias didáticas, entre outros.27 27 Não é demais chamar a atenção para o perigo de, ao reconhecermos as diferenças nos modelos e sistemas educacionais, as avaliarmos de forma a subalternizar os modelos que são mais recorrentes em alguns países asiáticos, operando novamente com lógicas coloniais.

Nesse sentido, há de fato uma preferência por metodologias de ensino de língua estrangeira consideradas estruturalistas em função de experiências escolares, mas concordamos com Santos e Albuquerque (2016SANTOS; J. M. P.; ALBUQUERQUE, M. L. Curso Especial para alunos asiáticos (CEA): práticas de ensino visando ponte entre culturas. In: RUANO, B. P.; SANTOS, J. M. P.; SALTINI, L. M. L. (Org.). Cursos de português como língua estrangeira no CELIN-UFPR: práticas docentes e experiências em sala de aula. Curitiba: Editora UFPR, 2016. p. 229-246., p. 237) que a expectativa pelo aprendizado de gramática ou léxico de tal forma não pode ser exclusivamente atribuída a estudantes asiáticos ou ao “Oriente”, sendo notada também em alunos(as) de diferentes nacionalidades:

Ao iniciarem os cursos de língua no Celin-UFPR muitos alunos expressam o desejo de aprender explicitamente as regras gramaticais da língua portuguesa, demonstrando uma visão de língua como um conjunto de normas rígidas a seguir. Essa visão é descrita por Jordão (2006) como perspectiva de língua como código. (SANTOS; ALBUQUERQUE, 2016SANTOS; J. M. P.; ALBUQUERQUE, M. L. Curso Especial para alunos asiáticos (CEA): práticas de ensino visando ponte entre culturas. In: RUANO, B. P.; SANTOS, J. M. P.; SALTINI, L. M. L. (Org.). Cursos de português como língua estrangeira no CELIN-UFPR: práticas docentes e experiências em sala de aula. Curitiba: Editora UFPR, 2016. p. 229-246., p. 237)

Colada à avaliação sobre engajamento em sala de aula, está a alegada falta de pensamento crítico vinculada a alunos(as) orientais. A constatação da ausência de criticidade desses “é, com frequência, direta ou indiretamente contrastada a como os estudantes ocidentais são bons em pensar criticamente e que há algo inerente na cultura ocidental que promove o pensamento crítico”28 28 No original, “is often directly or indirectly contrasted with how good Western students are in their critical thinking and that there is something inherent in the Western culture that promotes critical thinking”. (KUMARAVADIVELU, 2003KUMARAVADIVELU, B. Problematizing cultural stereotypes in TESOL. TESOL Quarterly, v. 37, n. 4, p. 709-719, 2003., p. 712). A essencialização do pensamento crítico, isto é, do que conta ou não como criticidade a partir de determinados critérios (leia-se critérios ocidentais), envolve relações de poder assimétricas via processos de racialização e homogeneização de subjetividades. Situação semelhante é discutida por Song e McCarthy (2018SONG, X.; MCCARTHY, G. Governing Asian international students: the policy and practice of essentialising ‘critical thinking’. Globalisation, Societies and Education, London, v. 16, n. 3, p. 353-365, 2018.). As autoras discorrem sobre o não reconhecimento da diversidade de pensamento, o que acarretaria, consequentemente, uma suposta ausência de pensamento crítico da parte dos(as) alunos(as) asiáticos(as) no contexto universitário australiano. Defendem ainda que o estímulo ao pensamento crítico é utilizado como uma ferramenta essencializadora, isto é, o professor ocidental, orientado por uma abordagem crítica, fomenta o desenvolvimento do pensamento crítico porque avalia a produção do(a) estudante não ocidental como insuficiente. Nesse sentido, o pensamento crítico se torna “tanto um símbolo de superioridade do pensamento ocidental quanto uma régua para medir os déficits dos estudantes internacionais”29 29 No original: “both a totem pole of Western superior thinking and a yardstick to measure international students’ deficiency”. (SONG; MCCARTHY, 2018SONG, X.; MCCARTHY, G. Governing Asian international students: the policy and practice of essentialising ‘critical thinking’. Globalisation, Societies and Education, London, v. 16, n. 3, p. 353-365, 2018., p. 354).

A nosso ver, igualmente, as(os) professoras(es) de PLA correm o risco de reproduzir uma interpretação estigmatizada sobre a Ásia/os(as) asiáticos(as). Esse modo de interpretar comportamentos de estudantes asiáticos(as) pode revelar o alinhamento de professores(as) brasileiros(as) a ideologias e práticas coloniais, sobretudo por serem representações que centros hegemônicos costumam ter sobre estudantes asiáticos(as), colaborando frequentemente para avaliar de forma negativa a produção oral e escrita, a participação em sala e o engajamento de tais alunos(as) nas aulas de português.

A representação que frequentemente fazemos de estudantes asiáticos(as) tem, na sua base, o que Leone-Pizzighella e Rymes (2018LEONE-PIZZIGHELLA, A.; RYMES, B. Gathering everyday metacommentary: A methodology to counteract institutional erasure. Language & Communication, Amsterdam, v. 59, p. 53-65, 2018.) conceituam como lumping, ou amontoamento, um fenômeno de agrupar indivíduos de acordo com certas características salientes. Esses rótulos e estereótipos não emergem nos discursos institucionais ou dos professores de forma isolada, mas compõem uma espécie de bloco. Há uma eleição do que os membros de um grupo social compartilham em termos de experiência, comportamento e padrões. Além disso,

sua diversidade linguística, nacional e cultural - sem mencionar a distinção individual - são quase sempre negligenciadas. Os estudantes são agrupados em grupo por determinado objetivo, ofuscando conhecimento sociocultural e linguístico específico que compartilham (mas também que não compartilham).30 30 No original: “their linguistic, national, and cultural diversity - not to mention each individual’s distinctiveness - are often overlooked. Students are often lumped into one group for some purpose or another, obfuscating the detailed sociocultural and linguistic knowledge that they share (but also that they don’t share)”. (LEONE-PIZZIGHELA; RYMES, 2018LEONE-PIZZIGHELLA, A.; RYMES, B. Gathering everyday metacommentary: A methodology to counteract institutional erasure. Language & Communication, Amsterdam, v. 59, p. 53-65, 2018., p. 56)

No contexto de ensino para migrantes asiáticos(as) que focalizamos neste artigo, há que se ter muito cuidado com categorias abrangentes como “estudante internacional”, “funcionário de multinacional” e “aluno de escola internacional”, porque não colaboram para superar estereótipos e representações fixadas; pelo contrário, insistem em uma afiliação forçada.

Sabemos que agrupamentos são formas de categorizações comuns, mas é preciso considerar a necessidade de deixar o(a) estudante se decidir por, ou negociar, suas próprias filiações, ao invés de o(a) professor(a) atribuí-las. A abordagem biográfica (BUSCH, 2006BUSCH, B. Language biographies - approaches to multilingualism in education and linguistic research. In: BUSCH, B.; JARDINE, A.; TJOUTUKU, A. (Org.). Language biographies for multilingual learning. Cape Town: Praesa, 2006. p. 5-19. ; 2016) parece dar conta de, pelo menos em partes, dissolver as consequências desse exercício de agrupar - e, consequentemente, de apagar vozes e perspectivas (GAL, 1998 apud LEONE-PIZZIGHELLA; RYMES, 2018LEONE-PIZZIGHELLA, A.; RYMES, B. Gathering everyday metacommentary: A methodology to counteract institutional erasure. Language & Communication, Amsterdam, v. 59, p. 53-65, 2018.) - principalmente porque oferece ferramentas para, a partir de narrativas dos sujeitos, desmontar uma série de representações histórica e socialmente construídas sobre a Ásia e os(as) aprendizes asiáticos(as), por exemplo.

Então, a fim de suscitar reflexões sobre as práticas, as crenças e o papel do(a) professor(a) em meio a essas categorizações que podem parecer “naturais”, exploramos adiante essa abordagem proposta por Busch, aliando-a a outras visões.

6 Miradas para o papel do professor

Até o momento, abordamos diferentes problemáticas acionadas regularmente no ensino de PLA, relacionadas tanto às línguas asiáticas e aos(às) asiáticos(as), como à noção de distância linguística entre línguas e de estereótipos culturais colados a esses(as) estudantes. Ora, diante desse cenário, é necessário ter em mente que, assim como os(as) aprendizes, também os(as) professores(as) de PLA têm crenças sobre ensinar e aprender, que se refletem em suas aulas:

Erickson (1987) defende que grande parte de nosso conhecimento cultural é implícito, constituído de formas adquiridas de pensar e de agir, e que, uma vez incorporadas, são mantidas fora do nível consciente. Tanto professores quanto alunos possuem seus hábitos, costumes e expectativas sobre a aprendizagem de uma língua estrangeira que são sustentados e legitimamente aceitos na sociedade em que estão inseridos. Consequentemente, todas as ações manifestadas dentro de um ambiente de ensino são determinadas por alguma forma de conhecimento construído a partir de nossas experiências e de nossa formação como alunos ou professores (MENEZES, 2015MENEZES, E. R. Crenças de professores de PLE e alunos asiáticos do CELIN-UFPR. Dissertação (Mestrado em Letras) - Faculdade de Letras, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2015., p. 28-29).

Iniciar a discussão a respeito da tomada de consciência sobre tais crenças de ensinar e aprender é, a nosso ver, importante porque o(a) professor(a) terá de lidar, constantemente, durante suas aulas, com essas crenças e expectativas - em geral, tão bem definidas e culturalmente reproduzidas ao longo de sua vida e sua formação. É claro que, considerando o que destacamos até aqui, a tomada de consciência não pode se resumir somente a crenças sobre aprendizagem, pois é imprescindível pensarmos e promovermos o debate sobre ferramentas que nos auxiliem a lidar com um conjunto de fatores no ensino para falantes de línguas distantes. Embora constitutivos das aulas de português, tais fatores são anteriores às aulas em si. Assim, ao refletir sobre formas de conduzir sua própria prática, o(a) professor(a) acaba voltando o olhar ao redor, desfocando muitas de suas certezas e mirando seus(suas) alunos(as).

Originalmente uma abordagem de pesquisa em educação linguística e multilinguismo,31 31 A abordagem tem orientado pesquisas no campo da sociolinguística e da linguística aplicada, como os já mencionados trabalhos de Busch (2006; 2016) e de Farmer (2012). propomos a utilização da abordagem biográfica enquanto ferramenta de ensino capaz de lidar com diferentes fatores no contexto de ensino de português para asiáticos. Essa abordagem pode trazer contribuições significativas porque possibilita que o(a) professor(a) mobilize diferentes vozes e narrativas dos(as) estudantes e, ciente dos diferentes papéis que ele(a) assume, reflita sobre práticas que efetivamente centralizem seu(sua) aluno(a).

A abordagem de base etnometodológica pode ser muito produtiva, a nosso ver, porque “oferece insights sobre como um indivíduo experiencia o contexto social amplo e os regimes linguísticos nos quais desenvolve suas práticas linguísticas, suas ambições e desejos em termos de se imaginar enquanto falante de determinada língua ou código”32 32 No original, “[…] offer insights into how an individual experiences the broader social context and the language regimes in which she develops her language practices, her ambitions and desires in terms of imagining herself as a speaker of a certain language or code.” (BUSCH, 2006BUSCH, B. Language biographies - approaches to multilingualism in education and linguistic research. In: BUSCH, B.; JARDINE, A.; TJOUTUKU, A. (Org.). Language biographies for multilingual learning. Cape Town: Praesa, 2006. p. 5-19. , p. 9). Além disso, está comprometida em reconhecer o tecido linguisticamente diverso do mundo contemporâneo:

[…] abordagens biográficas enfatizam a perspectiva do sujeito que fala e experiencia. São abordagens que contribuem para um entendimento do repertório linguístico como reflexo das trajetórias de vida individuais, das vivências heterogêneas e dos discursos sobre línguas e práticas linguísticas relativas a tempo-espaço específicos.33 33 No original, “[…] biographical approaches emphasise the perspective of the experiencing and speaking subject. They contribute to an understanding of the linguistic repertoire as reflecting individual life trajectories, heterogenous life worlds and discourses about language and linguistic practices referring to specific time-spaces.” (BUSCH, 2016BUSCH, B. Biographical approaches to research in multilingual settings: exploring linguistic repertoires. In: MARTIN-JONES, M.; MARTIN, D. (Ed.). Researching Multilingualism. Abingdon: Routledge, 2016. p. 60-73., p. 47).

Nesse sentido, instrumentos da abordagem biográfica, como entrevistas, textos narrativos biográficos, recuperação de eventos do passado e retomada de experiências, podem (e devem) ser utilizados de forma direta ou indireta para administrar a complexidade da sala de aula, pois dessa forma torna-se possível realizar não apenas o levantamento de necessidades presentes e futuras do(a) aluno(a), residente no Brasil, mas também de trajetórias prévias.

Parece bastante oportuno que, como estratégia de ensino, sejam suscitados e compartilhados diferentes percursos de migração, práticas de letramento com as quais os(as) estudantes têm familiaridade, repertórios e trajetórias de aprendizado de línguas. Consideramos importante lembrar que a trajetória de deslocamento dos migrantes da onda asiática recente que focalizamos neste artigo está marcada por (alta) rotatividade e mobilidade para outras regiões e países. Portanto, são migrantes que têm experiências outras de aprendizado de línguas, sobretudo, da língua inglesa.

Igualmente, a abordagem possibilita resolver duas dificuldades do contexto de ensino para asiáticos, conforme buscamos levantar nas seções anteriores. A primeira, a partir de uma consciência da diversidade linguística entre e em comunidades (BUSCH, 2006BUSCH, B. Language biographies - approaches to multilingualism in education and linguistic research. In: BUSCH, B.; JARDINE, A.; TJOUTUKU, A. (Org.). Language biographies for multilingual learning. Cape Town: Praesa, 2006. p. 5-19. ), seria desestabilizar o processo de amontoamento usualmente presente na sala de aula de língua para grupos asiáticos, quer seja no modo como o(a) professor(a) conduz a interação em sala de aula, quer seja no modo como ele(a) elege e gerencia as ferramentas empregadas para a especificidade desse contexto de ensino. A segunda, com base no reconhecimento de que o multilinguismo é sempre situacional (BUSCH, 2006BUSCH, B. Language biographies - approaches to multilingualism in education and linguistic research. In: BUSCH, B.; JARDINE, A.; TJOUTUKU, A. (Org.). Language biographies for multilingual learning. Cape Town: Praesa, 2006. p. 5-19. ), oportuniza práticas de ensino que colocam no jogo da negociação entre professor e aluno traços do repertório comunicativo, das trajetórias e crenças de aprendizado, das construções culturais e das diferentes extensões de distância linguística. No que se refere às negociações de sentido, a abordagem biográfica tem nos auxiliado a compreender os enunciados dos(as) alunos(as), sobretudo no emprego de vocabulários ligados a temas e situações que tenham sido vivenciadas pelos(as) aprendizes e que sejam pouco familiares ao(à) professor(a). Igualmente, observamos que auxilia na produção de enunciados referentes a explicações e instruções negociadas durante a interação em sala de aula. Consideramos que a utilização da abordagem como subsídio para práticas de negociação de sentido utilizadas na compreensão e produção de enunciados não só traz para a interação traços do repertório comunicativo de professores(as) e aprendizes, como possibilita empregar mais significativamente o português nas reflexões sobre a língua e seus usos.

Assim, propomos que a prática docente do(a) professor(a) de PLA para grupos asiáticos esteja metodologicamente amparada na abordagem biográfica com base nos trabalhos de Busch (2006BUSCH, B. Language biographies - approaches to multilingualism in education and linguistic research. In: BUSCH, B.; JARDINE, A.; TJOUTUKU, A. (Org.). Language biographies for multilingual learning. Cape Town: Praesa, 2006. p. 5-19. ; 2016BUSCH, B. Biographical approaches to research in multilingual settings: exploring linguistic repertoires. In: MARTIN-JONES, M.; MARTIN, D. (Ed.). Researching Multilingualism. Abingdon: Routledge, 2016. p. 60-73.) e teoricamente orientada por discussões que vêm de uma visão de educação linguística ampliada (CAVALCANTI, 2013CAVALCANTI, M. C. Educação linguística na formação de professores de línguas: intercompreensão e práticas translíngues. In: MOITA LOPES, L. P. (Org.). Linguística Aplicada na modernidade recente. São Paulo: Parábola, 2013. p. 211-226.) e da pedagogia translíngue (GARCÍA, 2017GARCÍA, O. Problematizing linguistic integration of migrants: the role of translanguaging and language teachers. In: BEACCO, J.; KRUMM, H. J.; LITTLE, D; THALGOTT, P. (Ed.). The Linguistic Integration of Adult Migrants. Berlin: De Gruyter Mouton, 2017. p. 11-26.).34 34 Ainda que reconheçamos que a abordagem biográfica nos trabalhos de Busch parta de uma reflexão teórico-metodológica, as discussões de Cavalcanti e García se debruçam profundamente sobre ensino. ,35 35 García traz em seus trabalhos o conceito de translanguaging e, no artigo referenciado aqui, de 2017, traz a noção de translanguaging pedagogy. Decidimos traduzir esse termo como pedagogia translíngue, por entendermos que esse é o termo que vem sendo usado, no Brasil, em outros trabalhos que se engajam nessa questão e que também se apoiam nessa autora. Cf. Zolin-Vesz (2014) e Leroy e Santos (2017). Enquanto o trabalho de Cavalcanti foi proposto pensando a formação de professores(as) de português como língua materna,36 36 Cavalcanti explicita, partindo da vertente da LA Indisciplinar, que está interessada em seu texto justamente nos diferentes portugueses existentes no Brasil, tomando o que se costuma denominar “variedades” como línguas. o de García trata explicitamente do ensino para migrantes. É claro que o que propomos aqui pode ser pensado para outros contextos de PLA (e de ensino de línguas), entretanto, nossas experiências com aprendizes asiáticos(as) corroboram essas estratégias, principalmente no caso de línguas cuja distância linguística, compreendida conforme apresentado na seção 4, seja percebida extensamente.

Um dos pontos mais importantes dessa visão apresentada por Cavalcanti, em pleno diálogo com a LA Indisciplinar, é justamente uma visão de uma formação de professoras(es) que não se restrinja ao conhecimento sobre a língua alvo, mas que promova o “desenvolvimento da sensibilidade do(a) professor(a) […] em relação à diversidade e à pluralidade cultural, social e linguística” (CAVALCANTI, 2013CAVALCANTI, M. C. Educação linguística na formação de professores de línguas: intercompreensão e práticas translíngues. In: MOITA LOPES, L. P. (Org.). Linguística Aplicada na modernidade recente. São Paulo: Parábola, 2013. p. 211-226., p. 213).

Ao descrever o papel do(a) professor(a), a autora comenta que o trabalho dele(a), pensado via educação linguística ampliada, não se torna mais fácil. É exatamente o contrário, quando se considera suas atribuições e uma prática questionadora e engajada:

Demanda uma sofisticação que depende de estudo e dedicação para poder ser sensível aos alunos e a sua produção linguística. E essa sofisticação inclui também a predisposição para aprender com as novas gerações, o estar pronto para a observação constante do que acontece ao redor, seja em relação ao modo de falar das pessoas, seja em relação às atitudes preconceituosas que precisam ser apontadas/problematizadas e/ou trabalhadas. Isso inclui ainda observar o próprio discurso para pinçar seus próprios preconceitos e atitudes condescendentes. Para isso, o(a) professor(a) precisa saber muito mais do que aquilo que vai ensinar e precisa vivenciar o que ensina. (CAVALCANTI, 2013CAVALCANTI, M. C. Educação linguística na formação de professores de línguas: intercompreensão e práticas translíngues. In: MOITA LOPES, L. P. (Org.). Linguística Aplicada na modernidade recente. São Paulo: Parábola, 2013. p. 211-226., p. 215)

Assim, em seu papel, os(as) professores(as) se deparam com a emergência de seu conhecimento limitado - embora seu estudo seja constante - e com a imprescindibilidade de se deslocarem de uma posição de saber que hierarquiza e totaliza, principalmente no nosso contexto, dicotomias como: saber ocidental versus saber oriental, aluno ocidental versus aluno oriental, modos de aprender considerados modernos versus modos de aprender não modernos, língua estrangeira versus língua adicional, cultura nacional versus cultura estrangeira.37 37 Muitas vezes restringe-se culturas àquilo que é “nacional”, sem levar em conta as diversas construções e trajetórias dos alunos.

Ao se dispor a essa empreitada, o(a) professor(a) pode se tornar não só mais sensível a seus(suas) alunos(as), mas também a si próprio(a), o que resultaria, por exemplo, em uma reflexão sobre seu próprio repertório comunicativo e sobre práticas translíngues que viria a utilizar em sala para incentivar o diálogo e criar espaços de troca, deixando as vozes de seus(suas) estudantes reverberar e afetar - também com afeto - a prática de ensino-aprendizagem. Ao se propor a uma prática mais sensível, através da escuta e da valorização de diferentes trajetórias e repertórios, o(a) professor(a) pode (re)conhecer o emaranhado de “worlds e words” dos(as) migrantes (GARCÍA, 2017GARCÍA, O. Problematizing linguistic integration of migrants: the role of translanguaging and language teachers. In: BEACCO, J.; KRUMM, H. J.; LITTLE, D; THALGOTT, P. (Ed.). The Linguistic Integration of Adult Migrants. Berlin: De Gruyter Mouton, 2017. p. 11-26.). Com base na defesa que a autora faz de um posicionamento translíngue (translanguaging stance), entendemos que um conjunto de recursos podem ser acionados em sala, por exemplo, uso de dicionários nas línguas dos(as) estudantes, investimentos em recursos semióticos (fotografias, vídeos e memes) e co-construção de um dicionário comum para as aulas com explicações e exemplos em português e em mandarim, coreano, japonês, inglês e eventuais outras línguas dos repertórios dos(as) aprendizes.

O esforço colaborativo entre professor e aluno deve visar a expansão do repertório e, nesse sentido:

o trabalho de professores de línguas assim consiste em não adicionar um sistema linguístico separado daquele que o falante já tem, mas em tornar novas possibilidades linguísticas disponíveis as quais o falante integra e apropria ao seu próprio repertório linguístico.38 38 No original: “the work of language teachers then consists not in adding a whole language system separate from that which the speaker already holds, but in making new linguistic features available which the speaker then integrates and appropriates into their own language repertoire”. (GARCÍA, 2017GARCÍA, O. Problematizing linguistic integration of migrants: the role of translanguaging and language teachers. In: BEACCO, J.; KRUMM, H. J.; LITTLE, D; THALGOTT, P. (Ed.). The Linguistic Integration of Adult Migrants. Berlin: De Gruyter Mouton, 2017. p. 11-26., p. 17)

Para tanto, García (2017GARCÍA, O. Problematizing linguistic integration of migrants: the role of translanguaging and language teachers. In: BEACCO, J.; KRUMM, H. J.; LITTLE, D; THALGOTT, P. (Ed.). The Linguistic Integration of Adult Migrants. Berlin: De Gruyter Mouton, 2017. p. 11-26., p. 11) clama pela necessidade de que os(as) professores(as) assumam diferentes papéis dos do passado, ou seja, além de uma revisão das compreensões de língua e falante, a autora defende uma revisão também do papel do(a) professor(a) no contexto da migração, fazendo um apelo para “uma renovada visão de educação linguística para migrantes.”39 39 No original: “a renewed vision of language education for migrants”.

Vislumbramos que a reorientação das práticas e das ferramentas, com base nas autoras mobilizadas durante a seção, acabe refletindo na forma como os(as) alunos(as) experienciam a aula. Podem impactar em suas motivações, expectativas e na forma como veem e valorizam seus repertórios, muitas vezes estigmatizados ou não legitimados - influenciados por ideologias de “competência perfeita” (RAJAGOPALAN, 2003RAJAGOPALAN, K. Por uma linguística crítica: linguagem, identidade e a questão ética. São Paulo: Parábola , 2003.) e de fixidez da língua. Dessa forma, argumentamos que a negociação de sentido não deve se dar somente na língua ensinada, português, mas sim por meio de diferentes repertórios comunicativos acionados em sala. Visamos, com essas ferramentas, ao fortalecimento do que poderíamos chamar de conforto linguístico, isto é, de práticas que subsidiem ações efetivas de compreensão e produção oral e escrita no ensino de PLA para falantes de línguas distantes.

Insistimos em um conjunto de papéis ampliados do(a) professor(a), capaz de reverter diferentes estereótipos que reforçam assimetrias na produção de conhecimento ainda presentes na sala de aula de línguas para estudantes asiáticos(as). Para isso, no contexto de ensino que aqui focalizamos, chamamos a atenção para a figura que o(a) professor(a) desempenha. Não se trata de reforçar seu papel hierárquico, mas sim de explorar diferentes papéis que lhe possibilitem investigar, acomodar, mediar, reinterpretar as práticas em sala de aula tendo o(a) estudante como ponto de partida, e não a língua ensinada. Por isso, concordamos com Cavalcanti (2013CAVALCANTI, M. C. Educação linguística na formação de professores de línguas: intercompreensão e práticas translíngues. In: MOITA LOPES, L. P. (Org.). Linguística Aplicada na modernidade recente. São Paulo: Parábola, 2013. p. 211-226., p. 226):

A educação linguística do professor de línguas não pode ser somente linguística, ela precisa ser sofisticadamente engajada, antropologicamente antenada, plural em seu foco, para incluir os estudos de letramento, os estudos sobre multilinguismo com as questões de intercompreensão e de práticas translíngues, os estudos sobre transculturalismo.

Contudo, ao se apoiar em aspectos não linguísticos para seu trabalho, o(a) professor(a) de línguas não pode perder de vista a materialidade linguística que deve orientar os elementos que compõem sua prática docente: suas decisões pedagógicas, a preparação das aulas, a elaboração de materiais didáticos, o gerenciamento de atividades e a escolha de estratégias.

É em função da experiência com aprendizado de outras línguas que entendemos como produtiva a adoção da análise contrastiva, amplamente discutida no ensino de português para falantes de espanhol (cf. GRANNIER, 2002GRANNIER, D. Uma proposta heterodoxa para o ensino de português a falantes de espanhol. In: JÚDICE, N. (Org.). Português para estrangeiros: perspectivas de quem ensina. Niteroi: Intertexto, 2002. p. 57-80.). Coerentemente com a visão de distância linguística ampliada que propomos no artigo, o emprego desse tipo de análise não deve ser levado em conta apenas em contexto com alta intercompreensão linguística; também pode, no ensino para asiáticos(as), colaborar para o reconhecimento sistemático de diferenças e semelhanças entre as línguas e práticas dos(das) alunos(as), de modo a desenvolver consciência linguística e discursiva.

Assim como deve acontecer com o PLA para outros contextos, o PLA para asiáticos(as) também precisa ser entendido como um processo mutuamente informado por aspectos linguísticos e não linguísticos. Em razão disso, concordamos com argumento de Bizon e Diniz (2019DINIZ, L. R. A. Para além das fronteiras: a política linguística brasileira de promoção internacional do português. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2019., p. 181) de que não podemos “prescindir de um investimento pedagógico na materialidade linguística, que leve os estudantes a reconhecerem o funcionamento sempre ideológico da(s) língua(s) aprendida(s)”.

7 Considerações finais

Como mostramos, o diálogo Brasil-Leste Asiático acentuado por relações transnacionais, impulsionadas por interesses acadêmicos e econômicos, promove encontros linguístico-culturais e reconfigura distâncias de diversas ordens. Vinha reconfigurando também, até o início de 2020, o papel da área de PLA no cenário das migrações recentes e tem transformado, ainda que lentamente, a discussão sobre o ensino de português para falantes de línguas distantes.

Aliadas à Linguística Aplicada Indisciplinar, ao longo do trabalho, buscamos desfazer a fixidez de alguns conceitos imprecisos acerca de distância entre línguas e de estereótipos sobre as(os) aprendizes asiáticos(as) que ainda persistem no ensino-aprendizado. Para tanto, propomos algumas contribuições metodológicas e teóricas como subsídios para a prática docente, vendo-as, é importante ressaltar, como complementares e entrelaçadas umas às outras. São elas:

  • (1) A abordagem biográfica, como ferramenta para promover a metarreflexão sobre ensinar e aprender - centralizando o(a) aluno(a) -, bem como para orientar a produção de material didático, a metodologia de ensino e a interação em sala de aula, principalmente quanto à compreensão de referenciais diversos e, possivelmente, não familiares para professor(a) e aluno(a);

  • (2) A educação linguística ampliada, que propõe uma to­ma­da de consciência e maior sensibilidade, por parte do(a) pro­fes­sor(a), em relação à necessidade de desfocar certezas e de abertura para novas construções culturais e linguísticas que não se limitem a ideias de Ocidente e Oriente;

  • (3) A pedagogia translíngue, que, assim como a educação linguística ampliada, reforça o imperativo de que o(a) professor(a) assuma novos papéis com o intuito de valorizar as experiências de mundo e o repertório comunicativo dos(as) alunos(as).

Por fim, ainda que paire alguma incerteza na continuidade tanto de trocas comerciais com o mercado brasileiro quanto de acordos de cooperação e intercâmbio, em decorrência da instabilidade político-econômica brasileira e dos ruídos nas relações diplomáticas por parte de personagens do governo brasileiro atual - principalmente com a China -, frisamos a necessidade de suprir lacunas de produção de material didático, de composição de currículos, de formação de professores, entre outras ações, que atendam às demandas advindas com esse fluxo migratório recente.

É em razão dessas lacunas que tencionamos, neste artigo, discutir possibilidades outras na tentativa de nos distanciarmos de um ensino de português que, ao investir em reduzidos aspectos culturais, continua orientado por discursos que insistem em exoticismos relacionados à cultura e língua, que, mais do que atender às necessidades e especificidades desse contexto, acabam criando barreiras no ensino.

Referências

  • BAENINGER, R. A. (Org.). Fases e faces da migração em São Paulo. Campinas: Nepo/Unicamp, 2012. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/2WmC4Oy Acesso em: 29 set. 2019.
    » https://bit.ly/2WmC4Oy
  • BAENINGER, R. A.; DEMÉTRIO, N. B.; DOMENICONI, J. O. S.; FOIADELLI, L. F. F. Novos espaços das migrações internacionais no estado de São Paulo: uma análise do período recente a partir do município de Campinas. In: ENCONTRO NACIONAL DE ESTUDOS POPULACIONAIS, 21., 2018, Poços de Caldas. Anais […]. Poços de Caldas: Abep, 2018, p. 1-21.
  • BAENINGER, R. A.; DEMÉTRIO, N. B.; DOMENICONI, J. O. S. Imigração internacional na macrometrópole paulista: Novas e velhas questões. Cadernos Metrópole, São Paulo, v. 22, n. 47, p. 17-50, 2020.
  • BIZON, A. C. C.; DINIZ, L. R. A. Uma proposta poscolonial para a produção de materiais didáticos de português como língua adicional. Línguas e Instrumentos Linguísticos, Campinas, n. 43, p. 155-191, 2019.
  • BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Proposta curricular para cursos de literatura brasileira nas unidades da rede de ensino do Itamaraty no exterior. Brasília, DF: Funag, 2020a.
  • BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Proposta curricular para o ensino de português como língua de herança. Brasília, DF: Funag , 2020b.
  • BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Proposta curricular para o ensino de português nas unidades da rede de ensino do Itamaraty em países de língua oficial espanhola. Brasília, DF: Funag , 2020c.
  • BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Proposta curricular para o ensino de português nas unidades da rede de ensino do Itamaraty em países de língua oficial portuguesa. Brasília, DF: Funag , 2020d.
  • BRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Proposta curricular para o ensino de português para praticantes de capoeira. Brasília, DF: Funag , 2020e.
  • BUSCH, B. Language biographies - approaches to multilingualism in education and linguistic research. In: BUSCH, B.; JARDINE, A.; TJOUTUKU, A. (Org.). Language biographies for multilingual learning. Cape Town: Praesa, 2006. p. 5-19.
  • BUSCH, B. The linguistic repertoire revisited. Applied Linguistics, Oxônia, v. 33, n. 5, p. 503-523, 2012.
  • BUSCH, B. Biographical approaches to research in multilingual settings: exploring linguistic repertoires. In: MARTIN-JONES, M.; MARTIN, D. (Ed.). Researching Multilingualism. Abingdon: Routledge, 2016. p. 60-73.
  • CÂMARA, M. E. B. Relações bilaterais Brasil-China: uma análise e mensuração dos fluxos comerciais e de investimento no século XXI. In: SEMINÁRIO PESQUISAR A CHINA CONTEMPORÂNEA, 3., 2019, Campinas. Anais […]. Campinas: Unicamp, 2020.
  • CANAGARAJAH, A. S. Translingual practices: Global Englishes and cosmopolitan relations. New York: Routledge, 2013.
  • CAVALCANTI, M. C. Educação linguística na formação de professores de línguas: intercompreensão e práticas translíngues. In: MOITA LOPES, L. P. (Org.). Linguística Aplicada na modernidade recente. São Paulo: Parábola, 2013. p. 211-226.
  • CHI, J. Y. Imigrantes coreanos na formação do polo atacadista de moda feminina de pronta-entrega no bairro do Bom Retiro, São Paulo. Pós. Revista do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da FAU-USP, São Paulo, v. 23, n. 41, p. 90-107, 2016.
  • CHISWICK, B. R.; MILLER, P. W. Linguistic distance: a quantitative measure of the distance between English and other languages. Journal of Multilingual and Multicultural Development, London, v. 26, n. 1, p. 1-11, 2005.
  • CHOI, K. J. Imigração coreana na cidade de São Paulo. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, São Paulo, n. 40, p. 233-238, 1996.
  • CONDRY, I. Hip-Hop Japan: rap and the paths of cultural globalization. Durham: Duke University Press, 2006.
  • DE ANGELIS, G. Third or additional language acquisition. Clevedon: Multilingual Matters, 2007.
  • DINIZ, L. R. A. Para além das fronteiras: a política linguística brasileira de promoção internacional do português. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2019.
  • FARMER, D. Portraits de jeunes migrants dans une école internationale au Canada. La revue internationale de l’éducation familiale, Paris, n. 1, p. 73-94, 2012.
  • FERREIRA, L. M. L. Português para tailandeses. [S. l.]: Rede Brasil Cultural, 2012. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/39KJXAs Acesso em: 16 jun. 2020.
    » https://bit.ly/39KJXAs
  • FRAZATTO, B. E. “Legal um japonês que tá no Brasil saber falar japonês mesmo”: a construção de identidades numa escola de língua japonesa. 2012. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em Letras) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2012.
  • FRAZATTO, B. E. Português como Língua Adicional no Programa Idiomas sem Fronteiras na Unicamp: Internacionalização e Políticas Linguísticas em Foco. Revista X, Curitiba, v. 15, n. 5, p. 288-310, 2020.
  • FRAZATTO, B. E. “Ainda não entendo nada e por isso é muito difícil, mas vale a pena, eu acho”: internacionalização e políticas de inserção em narrativas de estudantes chineses, japoneses e sul-coreanos em uma universidade brasileira. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, em desenvolvimento.
  • FREIRE DA SILVA, C. Conexões Brasil-China: a migração chinesa no centro de São Paulo. Cadernos Metrópole , São Paulo, v. 20, n. 41, p. 223-243, 2018.
  • GABAS, T. M. O valor das línguas no mercado linguístico familiar: políticas e ideologias linguísticas em famílias sul-coreanas transplantadas. 2016. Dissertação (Mestrado em Linguística Aplicada) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2016.
  • GABAS, T. M. Micropolíticas de expansão do português: mães gerenciadoras e difusoras de línguas. Linguagem em (Dis)curso, Tubarão, v. 18, n. 3, p. 785-803, 2018.
  • GABAS, T. M. Cartografias de linguagem: narrativas sobre trajetória linguística e migratória de adolescentes sul-coreanos. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, em desenvolvimento.
  • GARCÍA, O. Problematizing linguistic integration of migrants: the role of translanguaging and language teachers. In: BEACCO, J.; KRUMM, H. J.; LITTLE, D; THALGOTT, P. (Ed.). The Linguistic Integration of Adult Migrants. Berlin: De Gruyter Mouton, 2017. p. 11-26.
  • GOTTLIEB, N. The cultures and politics of language in Japan today. In: BESTOR, V. L.; BESTOR, T. C.; YAMAGATA, A. (Ed.). Routledge Handbook of Japanese Culture and Society. Oxon: Routledge, 2011. p. 42-51.
  • GRANNIER, D. Uma proposta heterodoxa para o ensino de português a falantes de espanhol. In: JÚDICE, N. (Org.). Português para estrangeiros: perspectivas de quem ensina. Niteroi: Intertexto, 2002. p. 57-80.
  • HALL, S. The West and the Rest: discourse and power. In: HALL, S.; GIEBEN, B. (Ed.). Formations of modernity. Cambridge: Polity Press, 1993. p. 275-331.
  • ISPHORDING, I. E.; OTTEN, S. Linguistic distance and the language fluency of immigrants. Ruhr Economic Papers, Essen, n. 274, p. 1-37, 2011.
  • KROSKRITY, P. V. Language ideologies: emergence, elaboration, and application In: BONVILLAIN, N. (Ed.). The Routledge handbook of linguistic anthropology. Abingdon: Routledge , 2015. p. 95-108.
  • KUMARAVADIVELU, B. Problematizing cultural stereotypes in TESOL. TESOL Quarterly, v. 37, n. 4, p. 709-719, 2003.
  • LEONE-PIZZIGHELLA, A.; RYMES, B. Gathering everyday metacommentary: A methodology to counteract institutional erasure. Language & Communication, Amsterdam, v. 59, p. 53-65, 2018.
  • LEROY, H. R.; SANTOS, M. E. P. Percorrendo as veredas das práticas translinguajeiras em contexto transfronteiriço: possíveis travessias no ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa Adicional. Revista Latino-Americana de Estudos em Cultura e Sociedade, Foz do Iguaçu, v. 3, p. 1-24, 2017.
  • MOITA LOPES, L. P. (Org.). Por uma Linguística Aplicada Indisciplinar. São Paulo: Parábola , 2006.
  • MAHER, T. M. Do casulo ao movimento: a suspensão das certezas na educação bilíngue e intercultural. In: CAVALCANTI, M. C.; BORTONI-RICARDO, S. M. (Org.). Transculturalidade, Linguagem e Educação. Campinas: Mercado de Letras, 2007. p. 67-96.
  • MENEZES, E. R. Crenças de professores de PLE e alunos asiáticos do CELIN-UFPR. Dissertação (Mestrado em Letras) - Faculdade de Letras, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2015.
  • MORALES, L. M.; AKAMINE, A.; SUZUKI, M. E. The ongoing mobilities of Japanese-Brazilians: language ideology, identities and language education. In: CAVALCANTI, M. C.; MAHER, T. M. (Ed.). Multilingual Brazil: language resources, identities and ideologies in a globalized world. New York: Routledge , 2018. p. 129-140.
  • OGASAVARA, M. H.; MASIERO, G. Internationalization of Asian companies in Brazil: Factors and motivations. International Journal of Management, Hoboken, v. 30, n. 3, p. 149-165, 2013.
  • OLIVEIRA, H. A.; MASIERO, G. Estudos asiáticos no Brasil: contexto e desafios. Revista Brasileira de Política Internacional, Brasília, DF, v. 48, n. 2, p. 5-28, 2005.
  • PONCE, H; MATSUBARA, M. N. Bem-Vindo! A língua portuguesa no mundo da comunicação: caderno de exercícios para estudantes de origem asiática. 4. ed. São Paulo: SBS, 2009.
  • QIAORONG, Y.; ALBUQUERQUE, F. D. (Org.). O ensino do português na China: parâmetros e perspectivas. Natal: EDUFRN, 2019.
  • RAJAGOPALAN, K. Por uma linguística crítica: linguagem, identidade e a questão ética. São Paulo: Parábola , 2003.
  • RYMES, B. Communicative repertoire. In: LEUNG, C.; STREET, B. V. (Ed.). The Routledge Companion to English Studies. Abingdon: Routledge , 2014. p. 287-301.
  • SANTOS; J. M. P.; ALBUQUERQUE, M. L. Curso Especial para alunos asiáticos (CEA): práticas de ensino visando ponte entre culturas. In: RUANO, B. P.; SANTOS, J. M. P.; SALTINI, L. M. L. (Org.). Cursos de português como língua estrangeira no CELIN-UFPR: práticas docentes e experiências em sala de aula. Curitiba: Editora UFPR, 2016. p. 229-246.
  • SASSEN, S. The mobility of labor and capital: a study in international investment and labor flow. Cambridge: Cambridge University Press, 1988.
  • SCARAMUCCI, M. V. R.; BIZON, A. C. C. (Org.). Formação inicial e continuada de professores de português língua estrangeira/segunda língua no Brasil. Araraquara: Letraria, 2020.
  • SCHLATTER, M.; GARCEZ, P. M. Portuguese as an Additional Language: global trends in local actions. In: CAVALCANTI, M. C.; MAHER, T. M. (Ed.). Multilingual Brazil: language resources, identities and ideologies in a globalized world. New York: Routledge , 2018. p. 211-224.
  • SCHOFFEN, J. R.; KUNRATH, S. P.; ANDRIGUETTI, G. H.; SANTOS, L. G. (Org.). Português como língua adicional: reflexões para a prática docente. Porto Alegre: Bem Brasil, 2012.
  • SONG, X.; MCCARTHY, G. Governing Asian international students: the policy and practice of essentialising ‘critical thinking’. Globalisation, Societies and Education, London, v. 16, n. 3, p. 353-365, 2018.
  • STANLAW, J. Japanese English: language and culture contact. Hong Kong: Hong Kong University Press, 2004.
  • TAKAMI, S. T. A importância dos linkages e dos serviços para as indústrias automotivas no corredor asiático no estado de São Paulo. 2017. Tese (Doutorado em Geografia) - Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2017.
  • VANZELLI, J. C.; CHAVES, I. O.; TEIXEIRA, H. G. (Ed.). Estudos brasileiros na Ásia. Viçosa: Editora UFV, 2017.
  • ZOLIN-VESZ, F. Como ser feliz em meio ao portunhol que se produz na sala de aula de espanhol: por uma pedagogia translíngue. Trabalhos em Linguística Aplicada, Campinas, v. 53, n. 2, p. 321-332, 2014.
  • ZOPPI-FONTANA, M. G. Introdução. In: ZOPPI-FONTANA, M. G. O português do Brasil como língua transnacional. Campinas: RG, 2009. p. 13-41.
  • 1
    O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (Capes) - Código de Financiamento 001.
  • 2
    Resumidamente, pode-se dizer que o West (Ocidente) é um construto histórico (e não geográfico). Qualquer sociedade “desenvolvida, industrializada, urbanizada, capitalista, secular e moderna” (HALL, 1993HALL, S. The West and the Rest: discourse and power. In: HALL, S.; GIEBEN, B. (Ed.). Formations of modernity. Cambridge: Polity Press, 1993. p. 275-331., p. 186) se caracterizaria como ocidental. Em oposição a esse conjunto de imagens que pode compor o West, haveria o Rest (Resto), marcadamente inferior (menos desenvolvido, menos moderno etc). Segundo Hall, na base do discurso dessa produção de sentidos estaria o conceito de diferença.
  • 3
    Até onde pudemos constatar, há apenas o Bem-Vindo! A Língua Portuguesa no mundo da comunicação: Caderno de exercícios para estudantes de origem asiática (PONCE; MATSUBARA, 2009PONCE, H; MATSUBARA, M. N. Bem-Vindo! A língua portuguesa no mundo da comunicação: caderno de exercícios para estudantes de origem asiática. 4. ed. São Paulo: SBS, 2009.) publicado pela Editora SBS, e o Português para tailandeses (FERREIRA, 2012FERREIRA, L. M. L. Português para tailandeses. [S. l.]: Rede Brasil Cultural, 2012. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/39KJXAs . Acesso em: 16 jun. 2020.
    https://bit.ly/39KJXAs...
    ), elaborado pela autora com apoio da Embaixada do Brasil em Bangkok e publicado pela Rede Brasil Cultural do Ministério das Relações Exteriores.
  • 4
    Ambas as pesquisas estão sendo realizadas sob orientação da Profa. Dra. Ana Cecília Cossi Bizon (PPGLA/IEL/Unicamp).
  • 5
    Ao apresentar o ciclo da migração chinesa, Weinong considera Taiwan também como parte do ciclo (WEINONG, 2012 apud FREIRE DA SILVA, 2018FREIRE DA SILVA, C. Conexões Brasil-China: a migração chinesa no centro de São Paulo. Cadernos Metrópole , São Paulo, v. 20, n. 41, p. 223-243, 2018. ).
  • 6
    Ainda assim, conforme discutido em Frazatto (2012FRAZATTO, B. E. “Legal um japonês que tá no Brasil saber falar japonês mesmo”: a construção de identidades numa escola de língua japonesa. 2012. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em Letras) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2012.), associações culturais tiveram e ainda têm papel para os descendentes de japoneses no que se refere ao ensino da língua japonesa e à construção de identidades.
  • 7
    Conforme dados apresentados por Baeninger, Demétrio e Domeniconi (2020BAENINGER, R. A.; DEMÉTRIO, N. B.; DOMENICONI, J. O. S. Imigração internacional na macrometrópole paulista: Novas e velhas questões. Cadernos Metrópole, São Paulo, v. 22, n. 47, p. 17-50, 2020.), há um número considerável de asiáticos entre os imigrantes internacionais registrados via Registro Nacional de Estrangeiro (RNE) de 2000 a 2017, nas cinco regiões metropolitanas do estado de São Paulo e em duas aglomerações urbanas (Jundiaí e Piracicaba). Especificamente na cidade de Campinas, Baeninger et al. (2018BAENINGER, R. A.; DEMÉTRIO, N. B.; DOMENICONI, J. O. S.; FOIADELLI, L. F. F. Novos espaços das migrações internacionais no estado de São Paulo: uma análise do período recente a partir do município de Campinas. In: ENCONTRO NACIONAL DE ESTUDOS POPULACIONAIS, 21., 2018, Poços de Caldas. Anais […]. Poços de Caldas: Abep, 2018, p. 1-21.) apontam um crescimento expressivo no volume de vínculos de trabalho de asiáticos entre os anos de 2000 e 2016. Em ambos os trabalhos, o número de migrantes de origem chinesa, japonesa e coreana é superior ao das outras nacionalidades.
  • 8
    Observamos que, entre os funcionários das empresas, a maioria é de homens, casados, acompanhados de esposas e, em média, com dois filhos. Para uma discussão sobre o papel da família no projeto migratório específico de sul-coreanos, cf. Gabas (2016GABAS, T. M. O valor das línguas no mercado linguístico familiar: políticas e ideologias linguísticas em famílias sul-coreanas transplantadas. 2016. Dissertação (Mestrado em Linguística Aplicada) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2016. ; 2018GABAS, T. M. Micropolíticas de expansão do português: mães gerenciadoras e difusoras de línguas. Linguagem em (Dis)curso, Tubarão, v. 18, n. 3, p. 785-803, 2018.).
  • 9
    Embora haja outras empresas chinesas, coreanas e japonesas em outras regiões e estados brasileiros, há uma concentração expressivamente maior no interior de São Paulo, em termos de investimentos, geração de empregos e produção.
  • 10
    Há diversas unidades do Instituto Confúcio distribuídas em diferentes estados brasileiros e algumas unidades do Institutos King Sejong nos estados de SP, RS e no DF.
  • 11
    Entendemos línguas aqui não só como o que é reconhecidamente instituído como língua, mas também dialetos, variedades e registros. Como lembra Rajagopalan (2003RAJAGOPALAN, K. Por uma linguística crítica: linguagem, identidade e a questão ética. São Paulo: Parábola , 2003.), uma língua seria, nada mais, nada menos, do que um dialeto que teria um exército e uma marinha, o que reforça as relações de poder entre o que se considera ou não uma língua.
  • 12
    No original, “gesture, dress, posture, and even knowledge of communicative routines, familiarity with types of food or drink, and mass media references including phrases, dance moves, and recognizable intonation patterns that circulate via actors, musicians, and other superstars (Rymes, 2012RYMES, B. Communicative repertoire. In: LEUNG, C.; STREET, B. V. (Ed.). The Routledge Companion to English Studies. Abingdon: Routledge , 2014. p. 287-301.). So, an individual’s repertoire can be seen as something like an accumulation of archeological layers.”
  • 13
    Uma publicação que marca o uso desse termo e sua importância no momento que vivemos seria Schoffen et al. (2012SCHOFFEN, J. R.; KUNRATH, S. P.; ANDRIGUETTI, G. H.; SANTOS, L. G. (Org.). Português como língua adicional: reflexões para a prática docente. Porto Alegre: Bem Brasil, 2012.) e, mais recentemente, Bizon e Diniz (2019BIZON, A. C. C.; DINIZ, L. R. A. Uma proposta poscolonial para a produção de materiais didáticos de português como língua adicional. Línguas e Instrumentos Linguísticos, Campinas, n. 43, p. 155-191, 2019.).
  • 14
    Cf. Scaramucci e Bizon (2020SCARAMUCCI, M. V. R.; BIZON, A. C. C. (Org.). Formação inicial e continuada de professores de português língua estrangeira/segunda língua no Brasil. Araraquara: Letraria, 2020.) para um amplo histórico da área em diferentes universidades.
  • 15
    Disponível em: https://bit.ly/3AW9Itv. Acesso em: 20 maio 2020.
  • 16
    O Idiomas sem Fronteiras foi um programa criado pelo governo federal e originado de outro programa, chamado Inglês sem Fronteiras. Foi uma política linguística voltada para a internacionalização das instituições de ensino superior, na qual se ofertava cursos de diversos idiomas, inclusive PLA. Embora tenha sido uma política de muita importância, especialmente para a implementação de políticas linguísticas locais (FRAZATTO, 2020FRAZATTO, B. E. Português como Língua Adicional no Programa Idiomas sem Fronteiras na Unicamp: Internacionalização e Políticas Linguísticas em Foco. Revista X, Curitiba, v. 15, n. 5, p. 288-310, 2020.), o Ministério da Educação e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) não manifestaram interesse em subsidiar o programa a partir de junho de 2019, o que dificultou manutenção pelas universidades. Atualmente o programa se tornou Rede Andifes - Idiomas sem Fronteiras.
  • 17
    A série de propostas curriculares para o ensino de português como língua adicional para contextos específicos foi publicada pelo Ministério das Relações Exteriores e pela Fundação Alexandre de Gusmão (Funag) e elaborada por diversos pesquisadores brasileiros (BRASIL, 2020aBRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Proposta curricular para cursos de literatura brasileira nas unidades da rede de ensino do Itamaraty no exterior. Brasília, DF: Funag, 2020a.; 2020bBRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Proposta curricular para o ensino de português como língua de herança. Brasília, DF: Funag , 2020b., 2020cBRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Proposta curricular para o ensino de português nas unidades da rede de ensino do Itamaraty em países de língua oficial espanhola. Brasília, DF: Funag , 2020c., 2020dBRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Proposta curricular para o ensino de português nas unidades da rede de ensino do Itamaraty em países de língua oficial portuguesa. Brasília, DF: Funag , 2020d., 2020eBRASIL. Ministério das Relações Exteriores. Proposta curricular para o ensino de português para praticantes de capoeira. Brasília, DF: Funag , 2020e.). Trata-se de uma importante contribuição para a área de PLA orientando e subsidiando o ensino de português em diferentes cenários; são eles: ensino nas unidades do Itamaraty em países de língua oficial espanhola; ensino nas unidades do Itamaraty em países de língua oficial portuguesa; ensino de literatura brasileira nas unidades do Itamaraty no exterior; ensino para praticantes de capoeira; ensino de português como língua de herança.
  • 18
    A Coreia do Sul já contou com dois postos aplicadores do Celpe-Bras: o posto aplicador ainda credenciado, na Hankuk University of Foreign Studies (HUFS), e outro na Pusan University of Foreign Studies (BUFS).
  • 19
    No original: “Language distance refers to the distance that a linguist can objectively and formally define and identify between languages and language families. Sometimes the term formal similarity is also used to refer to a relationship of similarity between the features or components of two or more languages without necessarily implying a genetic relationship between them. A further distinction relates to the notion of perceived language distance. This is the distance that learners perceive to exist between languages that may, or may not, correspond to the distance that actually exists between them”.
  • 20
    Importante salientar que nem mesmo essa questão é resolvida de forma simples, pois poderia ser apontado que, embora o mandarim tenha a mesma ordem do português (SVO), no que diz respeito à unidade sintagmática, o mandarim tende a ser uma língua de núcleo final, isto é, o núcleo do sintagma geralmente se localiza no final do sintagma, o que costuma ser mais comum em línguas SOV.
  • 21
    No original: “beliefs, feelings, and conceptions about language structure and use, which often index the political economic interests of individual speakers, ethnic and other interest groups, and nation-states”.
  • 22
    Os empréstimos são sempre transpostos à língua escrita incorporando a pronúncia do inglês japonês; por exemplo, a embalagem de uma bala de goma de morango conteria, com frequência, os seguintes dizeres: ストロベリーガム (lido como sutoroberii gamu, strawberry gum).
  • 23
    Disponível em: https://bit.ly/3kQ1FZC . Acesso em: 1 set. 2020.
  • 24
    Como pode ser observado no relato Como é viver em uma cidade japonesa dominada por brasileiros, disponível em: https://bit.ly/39T943W. Acesso em: 1 jun. 2020.
  • 25
    No original: “Individuals’ linguistic autobiographies comprise much more than proficiency in named languages or even named ‘varieties’. Linguistic and communicative diversity develop over a lifetime and across various social contexts”.
  • 26
    No original, “if our students fail to interact in class the way we expect them to, or if they fail to show that they engage their minds the way we want them to, we readily explain their behavior in terms of culture or cultural stereotypes”.
  • 27
    Não é demais chamar a atenção para o perigo de, ao reconhecermos as diferenças nos modelos e sistemas educacionais, as avaliarmos de forma a subalternizar os modelos que são mais recorrentes em alguns países asiáticos, operando novamente com lógicas coloniais.
  • 28
    No original, “is often directly or indirectly contrasted with how good Western students are in their critical thinking and that there is something inherent in the Western culture that promotes critical thinking”.
  • 29
    No original: “both a totem pole of Western superior thinking and a yardstick to measure international students’ deficiency”.
  • 30
    No original: “their linguistic, national, and cultural diversity - not to mention each individual’s distinctiveness - are often overlooked. Students are often lumped into one group for some purpose or another, obfuscating the detailed sociocultural and linguistic knowledge that they share (but also that they don’t share)”.
  • 31
    A abordagem tem orientado pesquisas no campo da sociolinguística e da linguística aplicada, como os já mencionados trabalhos de Busch (2006BUSCH, B. Language biographies - approaches to multilingualism in education and linguistic research. In: BUSCH, B.; JARDINE, A.; TJOUTUKU, A. (Org.). Language biographies for multilingual learning. Cape Town: Praesa, 2006. p. 5-19. ; 2016BUSCH, B. Biographical approaches to research in multilingual settings: exploring linguistic repertoires. In: MARTIN-JONES, M.; MARTIN, D. (Ed.). Researching Multilingualism. Abingdon: Routledge, 2016. p. 60-73.) e de Farmer (2012FARMER, D. Portraits de jeunes migrants dans une école internationale au Canada. La revue internationale de l’éducation familiale, Paris, n. 1, p. 73-94, 2012.).
  • 32
    No original, “[…] offer insights into how an individual experiences the broader social context and the language regimes in which she develops her language practices, her ambitions and desires in terms of imagining herself as a speaker of a certain language or code.”
  • 33
    No original, “[…] biographical approaches emphasise the perspective of the experiencing and speaking subject. They contribute to an understanding of the linguistic repertoire as reflecting individual life trajectories, heterogenous life worlds and discourses about language and linguistic practices referring to specific time-spaces.”
  • 34
    Ainda que reconheçamos que a abordagem biográfica nos trabalhos de Busch parta de uma reflexão teórico-metodológica, as discussões de Cavalcanti e García se debruçam profundamente sobre ensino.
  • 35
    García traz em seus trabalhos o conceito de translanguaging e, no artigo referenciado aqui, de 2017, traz a noção de translanguaging pedagogy. Decidimos traduzir esse termo como pedagogia translíngue, por entendermos que esse é o termo que vem sendo usado, no Brasil, em outros trabalhos que se engajam nessa questão e que também se apoiam nessa autora. Cf. Zolin-Vesz (2014ZOLIN-VESZ, F. Como ser feliz em meio ao portunhol que se produz na sala de aula de espanhol: por uma pedagogia translíngue. Trabalhos em Linguística Aplicada, Campinas, v. 53, n. 2, p. 321-332, 2014.) e Leroy e Santos (2017LEROY, H. R.; SANTOS, M. E. P. Percorrendo as veredas das práticas translinguajeiras em contexto transfronteiriço: possíveis travessias no ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa Adicional. Revista Latino-Americana de Estudos em Cultura e Sociedade, Foz do Iguaçu, v. 3, p. 1-24, 2017.).
  • 36
    Cavalcanti explicita, partindo da vertente da LA Indisciplinar, que está interessada em seu texto justamente nos diferentes portugueses existentes no Brasil, tomando o que se costuma denominar “variedades” como línguas.
  • 37
    Muitas vezes restringe-se culturas àquilo que é “nacional”, sem levar em conta as diversas construções e trajetórias dos alunos.
  • 38
    No original: “the work of language teachers then consists not in adding a whole language system separate from that which the speaker already holds, but in making new linguistic features available which the speaker then integrates and appropriates into their own language repertoire”.
  • 39
    No original: “a renewed vision of language education for migrants”.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    11 Set 2020
  • Aceito
    27 Maio 2021
Faculdade de Letras - Universidade Federal de Minas Gerais Universidade Federal de Minas Gerais - Faculdade de Letras, Av. Antônio Carlos, 6627 4º. Andar/4036, 31270-901 Belo Horizonte/ MG/ Brasil, Tel.: (55 31) 3409-6044, Fax: (55 31) 3409-5120 - Belo Horizonte - MG - Brazil
E-mail: rblasecretaria@gmail.com