Comportamentos relacionados à saúde e fatores associados de pessoas idosas em atividade laboral no contexto de uma universidade pública brasileira

Resumo

Objetivo

Analisar comportamentos relacionados à saúde e fatores associados em pessoas idosas em atividade laboral de uma Universidade pública brasileira.

Método

Estudo seccional, descritivo e inferencial, com abordagem quantitativa. Amostra composta por 113 indivíduos e, dados coletados entre os meses de maio/2021 a setembro/2022, em ambiente virtual, por chamadas telefônicas e/ou vídeo, e/ou de forma presencial. Foram realizadas análises descritiva e de cluster, além do teste qui-quadrado ou teste Exato de Fisher para o nível de significância de 95%.

Resultados

A maioria dos entrevistados foi do gênero masculino (n=70, 61,9%), a idade média foi 65 anos (±3,20), a cor/raça predominante foi branca (n=39, 34,5%) e parda (n=38, 33,6%). Foram identificados dois clusters, o cluster01-regular composto por 31 (27,4%) indivíduos e o cluster02-ótimo por 82 (72,6%), a partir das variáveis de comportamentos relacionados à saúde. Encontrou-se associação significativa entre gênero e os clusters (p<0,04). O gênero masculino compôs mais o cluster02-ótimo, cluster esse que apresentou indivíduos com melhores comportamentos relacionados à saúde.

Conclusão

Apesar do estudo mostrar que, em geral, os indivíduos que participaram da pesquisa apresentaram bons/ótimos comportamentos, ainda se observou uma parcela que relatou comportamentos de risco à saúde, o que evidencia os desafios sobre o autocuidado na população idosa em atividade laboral. É importante a sensibilização dos idosos sobre os comportamentos de risco à saúde, seus impactos na saúde e qualidade de vida, porquanto muitos idosos serem os provedores das suas famílias e a atividade laboral ser um ponto que influencia na saúde da pessoa idosa.

Palavras-Chave:
Idoso; Comportamento relacionado com à saúde; Emprego

Abstract

Objective

To analyze health-related behaviors and associated factors in older people working at a Brazilian public university.

Method

A cross-sectional, descriptive, inferential study adopting a quantitative approach was conducted. The sample comprised 113 individuals and data were collected between May/2021 and September/2022 either remotely by telephone and/or video calls, and/or in person. Descriptive and cluster analysis were performed and the Chi-square or Fisher's Exact Tests were applied for a significance level of 95%.

Results

Respondents were predominantly male (n=70, 61.9%), had a mean age of 65 (±3.20) years, and were of white (n=39, 34.5%) or brown (n=38, 33.6%) ethnicity. Two clusters were identified: Cluster01-fair, comprising 31 (27.4%) individuals; and Cluster02-excellent, comprising 82 (72.6%) participants, based on health-related behavior variables. A significant association was found between gender and clusters (p<0.04). Cluster02 contained more males and individuals with better health-related behaviors.

Conclusion

Although the results revealed that, overall, study participants had good/excellent behaviors, there was a contingent that reported health risk behaviors, highlighting the challenges surrounding self-care in the working older population. It is important to raise awareness of older individuals about health risk behaviors and their impact on health and quality of life, especially given that many older people are providers for the family and that working influences the health of older individuals.

Keywords
Elderly; Health-related behavior; Employment

INTRODUÇÃO

O estudo dos comportamentos relacionados à saúde na pessoa idosa tem apresentado grande importância para a saúde pública, pois o conhecimento e a compreensão desses comportamentos, concomitantemente às especificidades regionais e culturais, contribuem para a construção de marcadores importantes para o envelhecimento saudável e com qualidade de vida¹,².

O número de pessoas idosas tem crescido significativamente em todo o mundo, sendo observado através das quedas nas taxas de fertilidade e o crescimento na longevidade da população mundial³. Com esse crescimento tem-se o consequente aumento de pessoas idosas na População Economicamente Ativa (PEA). A partir dessa situação, surge a necessidade mudanças nas organizações para a permanência de trabalhadores idosos, visto o mercado de trabalho brasileiro ainda não está preparado para abraçar de maneira efetiva a população idosa economicamente ativa⁴.

Apesar da população idosa trabalhadora apresentar menor proporção em relação população de trabalhadores jovens e adultos, aquela tem crescido significativamente. Essa continuação de pessoas idosas brasileiras em atividades de trabalho não está associada apenas a questões financeiras, mas também na manutenção de atividade e socialização através do trabalho. Além do mais, as recentes mudanças na previdência pública brasileira trouxeram modificações que aumentou a idade mínima de aposentadoria do trabalhador, sendo também essa uma motivação para a permanência da pessoa idosa em atividade laboral⁵.

Dessa forma, é real a necessidade de considerar a realidade do envelhecimento da força de trabalho brasileira e a necessidade de adequações dos espaços laborais de acordo com as especificidades dos trabalhadores idosos, permitindo a pessoa idosa protagonismo nesse processo, focando na sua saúde física e mental, a fim de possibilitar o planejamento e o desenvolvimento de planos de ações e a complementação e/ou formulação de novas políticas públicas para a contribuição de uma velhice que assegure as necessidades das pessoas idosas e seu bem-estar no ambiente de trabalho, objetivando o envelhecimento ativo e com qualidade⁵,⁶.

Em face disso, este estudo tem como objetivo analisar os comportamentos relacionados à saúde e fatores associados em pessoas idosas em atividade laboral no contexto de uma Universidade pública brasileira para assim poder subsidiar políticas de atenção à saúde da pessoa idosa que se encontra economicamente ativa, de maneira a propor que o local da pesquisa se organize e planeje suas ações para atender às demandas surgidas, principalmente depois da nova previdência pública brasileira, que em muitos casos ampliou o tempo de trabalho até a aposentadoria. É função das políticas de saúde colaborar para que mais pessoas alcancem idades avançadas com o melhor estado de saúde possível.

MÉTODO

Trata-se de um estudo seccional, descritivo e inferencial com abordagem quantitativa, com pessoas idosas sob atividade laboral no contexto de uma universidade pública brasileira. O universo de servidores idosos do local da pesquisa em dezembro de 2020 era de 845, sendo 504 servidores técnicos administrativos e 341 docentes. Seguindo o desenho metodológico do estudo, foi feito um cálculo amostral com nível de confiança de 95%, proporção estimada de 50% e erro amostral de 5%. A amostra final foi de 265 indivíduos, composta por servidores técnicos administrativos e docentes e foi estratificada por sexo e categoria profissional. Como critérios de inclusão, a pessoa idosa deveria ser servidor técnico administrativo ou docente efetivo do local de realização do estudo. Foram excluídos aqueles hospitalizados, afastados, aposentados no momento da coleta, em férias.

O estudo utilizou como instrumento de coleta o inquérito sobre saúde, bem-estar e envelhecimento (SABE)⁷ – versão Fortaleza. Esse questionário apresenta as seguintes seções: informações pessoais, avaliação cognitiva, estado de saúde, estado funcional, medicamentos, uso e acesso a serviços, história de trabalho e fontes de receita, característica da moradia e maus tratos.

As variáveis dependentes foram referentes aos comportamentos relacionados à saúde: relação sexual no último ano, procura de atendimento de saúde no último ano, atendimento odontológico pela última vez, consumo de carne, peixe ou frango pelo menos três vezes por semana, consumo de frutas ou legumes pelo menos duas vezes por dia, deixar de tomar algum remédio receitado no último ano, atividade física diária, consumo de álcool nos últimos três meses, hábito de fumar, vacina atualizada contra influenza, vacina atualizada contra covid-19 e razão pela qual continua trabalhando. As variáveis independentes foram características sociodemográficas (sexo, faixa etária, cor/raça, estado civil, coabitação, religião, renda, nível de escolaridade e cargo).

O recrutamento e a coleta de dados foram realizados por 12 estudantes,10 de graduação e dois de pós-graduação, selecionados por processo seletivo e devidamente treinados, com revisão do instrumento de coleta antes do início das entrevistas, no qual foi discutido questão a questão, após esse primeiro momento, ocorreram entrevistas-teste e retorno para revisão do instrumento de coleta para calibração dos entrevistadores. A coleta de dados iniciou em maio de 2021 e finalizou em setembro de 2022. A mesma foi realizada em ambiente virtual (chamada telefônica e de vídeo) e no formato presencial. Antes de iniciar a entrevista, os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Foram realizadas análises descritivas para as variáveis de caracterização da amostra. Adicionalmente, realizou-se a Análise Multivariada de (interdependência) Cluster no sentido de buscar agrupamentos por similaridades ou dissimilaridades entre as pessoas idosas em relação às variáveis dependentes do estudo. Para isso, utilizou-se da técnica hierárquica e, como medida de aglomeração, a ligação média entre as observações. Sobre a qualidade de cluster, a medição de silhueta de coesão e separação ficou dentro do razoável, com uma silhueta media igual a 0,4, sendo construído dois clusters, nomeados por cluster01-regular e cluster02-ótimo.

Com os clusters produzidos se buscou associações significativas entre as variáveis independentes para o nível de significância de 95%. Para a estatística inferencial, foram realizados o teste qui-quadrado ou teste Exato de Fisher para o nível de significância de 95%.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte na data de quatro de março de 2020, mediante o parecer número 3.898.077, e cadastrados na Plataforma Brasil/ Ministério da Saúde sob o C.A.A.E. 27248619.1.0000.5292.

Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo está disponível mediante solicitação aos autores correspondentes.

RESULTADOS

A amostra calculada foi de 265 indivíduos. Foram contactados via telefone ou pessoalmente 201 (75,8%) indivíduos. Dos 201 contactados, 123 (61,2%) foram técnicos administrativos e 78 (38,8%) docentes; 52 (25,8%) se recusaram a participar da pesquisa, sendo 28 (53,8%) técnicos administrativos e 24 (46,2%) docentes. Com relação aos critérios de exclusão houve 36 (17,9%) exclusões, das quais 21 (58,3%) eram técnicos administrativos e 15 (41,7%) docentes. Sendo 32 (88,9%) por aposentadorias, três (8,30%) por óbito e uma (2,80%) devido o servidor está cedido.

Não foi possível contactar 64 (24,2%) indivíduos em razão de várias situações que surgiram ao longo do estudo como a pandemia da covid-19 e o isolamento social que se uniu com a falta de dados para contato atualizados dos servidores e docentes no serviço que foi realizado o estudo e o descrédito das pessoas idosas na veracidade do estudo.

Os dados apresentados a seguir se referem a 113 indivíduos entrevistados, o que equivale a 42,6%, os não contactados equivale a 24,2%, as recusas totalizaram 19,6% e as saídas devido aos critérios de exclusão 13,6%, em relação à amostra.

As Tabelas 1 e 2 trazem a análise descritiva com frequências absolutas e percentuais das variáveis categóricas.

Na Tabela 1, é possível observar que houve predominância do sexo masculino e, no que se refere à idade, predominaram indivíduos com média de idade de 65 anos (±3,20). Predominam na amostra pessoas brancas e pardas. Chama-se atenção para dois indivíduos que não conseguiram definir sua cor/raça.

Tabela 1
Caracterização da amostra segundo as variáveis sociodemográficas. Natal/RN - Brasil, 2022.

Variáveis sociodemográficas	n(%)
Sexo
Masculino	70(61,9)
Feminino	43(38,1)
Faixa etária (anos)
60-64	55(48,7)
65-69	46(40,7)
≥70	12(10,6)
Cor/raça
Branco	39(34,5)
Pardo	38(33,6)
Preta	22(19,5)
Indígena	04(3,50)
Amarelo	03(2,70)
Outra	03(2,70)
Não respondeu	04(3,50)
Estado civil
Divorciado	15(13,3)
Separado	05(4,40)
Viúvo	06(5,30)
Casado	64(56,6)
União estável	12(10,6)
Solteiro	10(8,80)
Não respondeu	01(0,90)
Religião
Católica	74(65,5)
Não católica	28(24,8)
Nenhuma	10(8,80)
Não respondeu	01(0,90)
Renda*
1 a 3 salários mínimos	05(4,40)
3,1 a 6 salários mínimos	25(22,1)
6,1 ou mais salários mínimos	34(30,1)
Não respondeu	49(43,4)
Nível de escolaridade
Primeiro grau (fundamental)	10(8,80)
Segundo grau (médio)	14(15,9)
Graduação	18(15,9)
Pós-graduação	70(61,9)
Não respondeu	01(0,90)
Coabitação
Sozinho	16(14,2)
Acompanhado	97(85,8)
Cargo
Docente	39(34,5)
Servidor técnico administrativo	74(65,5)

• *Valor de referência do salário mínimo do ano de 2021.

No que se refere ao estado civil, a maioria é casada e, quanto à religião, a grande maioria se declarou católica. Sobre a renda dos servidores, observamos uma média de nove salários mínimos (±6,3). Um quantitativo significativo optou por não responder à questão relacionada à renda.

Na Tabela 2, destacamos 1/4 dos indivíduos que relataram não terem tido nenhuma relação sexual. O hábito de fumar foi pouco frequente, com a grande maioria nunca tendo fumado. A maioria pratica atividade física semanal, mais de 70% foram vacinados contra influenza e a maioria se vacinou contra a covid-19.

Tabela 2
Caracterização da amostra segundo as variáveis de comportamentos relacionados à saúde, Natal/RN - Brasil, 2022.

Variáveis comportamentos relacionados à saúde	n(%)
Consumo de álcool nos últimos 3 meses
Nenhum	46(40,7)
Menos de um dia por semana	17(15,0)
1 dia por semana	13(11,5)
2-3 dias por semana	15(13,3)
4-6 dias por semana	01(0,90)
Todos os dias	04(3,50)
Não respondeu	17(15,0)
Hábito de fumar
Fuma atualmente	07(6,20)
Já fumou, não fuma mais	29(25,7)
Nunca fumou	48(42,5)
Não respondeu	29(25,7)
Atividade física diária
Sim	79(69,9)
Não	27(23,9)
Não respondeu	07(6,20)
Vacina atualizada contra influenza
Sim	89(78,8)
Não	16(14,2)
Não respondeu	08(7,10)
Vacina atualizada contra covid-19
Sim	101(89,4)
Não	04(3,50)
Não respondeu	08(7,10)
Relação sexual no último ano
Sim	71(62,8)
Não	28(24,8)
Não respondeu	14(12,4)
Atendimento odontológico pela última vez
Menos de 1 ano	36(31,9)
Entre 1 a 2 anos	25(22,1)
3 anos ou mais	20(17,7)
Não sabe	32(28,3)
Outro atendimento de saúde no último ano
Sim	58(51,3)
Não	46(40,7)
Não respondeu	09(8,00)
Deixar de tomar algum remédio receitado no último ano
Sim	15(14,2)
Não	87(77,0)
Não respondeu	10(8,80)
Consumo de frutas, legumes ou verduras (duas vezes/dia)
Sim	75(66,4)
Não	38(33,6)
Consumo de carne, peixe ou frango (três vezes/semana)
Sim	106(93,8)
Não	07(6,20)
Razão pela qual trabalha
Necessita do dinheiro	35(31,0)
Quer ajudar a família	04(3,50)
Quer manter-se ocupado	08(7,10)
Necessita se sentir útil	09(8,00)
Gosta do trabalho	45(39,8)
Outro	03(2,70)
Não respondeu	09(8,00)

Quando indagados sobre quanto tempo faz que procuraram atendimento odontológico pela última vez, predominou aqueles que relataram ter procurado há menos de um ano, com destaque também para o expressivo número dos que não se lembraram.

Com relação a deixar de tomar algum remédio receitado por médico no último ano, a maioria disse que não tinha deixado. No que diz respeito à razão pela qual ainda trabalha, predominaram os que relataram gostar do seu trabalho.

Para a busca por associações significativas entre as variáveis, agruparam-se os indivíduos por similaridades nas suas respostas em relação às variáveis de comportamentos relacionados à saúde por meio da técnica de análise de cluster. Foram identificados, portanto, dois clusters, o cluster01-regular com 31 (27,4%) indivíduos e o cluster02-ótimo com 82 (72,6%). Foi ainda realizado um processo de dicotomização em algumas variáveis, tanto dos comportamentos relacionados à saúde (dependentes) como das socioeconômicas (independentes) para a realização de associação bivariada.

Na Tabela 3, evidencia-se a caracterização dos clusters a partir das variáveis hábito de fumar, atendimento odontológico pela última vez e consumo de frutas, legumes ou verduras (duas vezes/dia), as quais foram as únicas que discriminaram esses clusters.

Tabela 3
Associação bivariada de clusters com comportamentos relacionados à saúde. Natal/RN - Brasil, 2022.

Variáveis comportamentos relacionados à saúde	cluster01-regular n(%)	cluster02-ótimo n(%)	p
Consumo de álcool nos último 3 meses
Nenhum ou menos de 1 dia por semana	06(13,0)	40(87,0)	0,68¹
1 dia ou mais	08(16,0)	42(84,0)
Hábito de fumar
Fuma atualmente	04(57,1)	03(42,9)	<0,001¹
Nunca fumou / Já fumou, não fuma mais	00(0,00)	77(100,0)
Atividade física diária
Sim	21(26,6)	58(73,4)	0,08¹
Não	03(11,1)	24(88,9)
Vacina atualizada contra influenza
Sim	23(25,8)	66(74,2)	0,35²
Não	02(12,5)	14(87,5)
Vacina atualizada contra covid-19
Sim	22(21,8)	79(78,2)	1,00²
Não	01(25,0)	03(75,0)
Atendimento odontológico pela última vez
Menos de 1 ano	04(11,1)	32(88,9)	<0,001¹
Mais de 1 ano	26(57,8)	19(42,2)
Outro atendimento de saúde no último ano	09(15,5)	49(84,5)	0,11¹
Sim	13(28,3)	33(71,7)
Não
Consumo de frutas, legumes ou verduras (duas vezes/dia)
Sim	00(0,00)	75(100,0)	<0,001¹
Não	31(81,6)	07(18,4)
Consumo de carne, peixe ou frango (três vezes/semana)
Sim	27(25,5)	79(74,5)	0,09²
Não	04(57,1)	03(42,9)
Relação sexual no último ano
Sim	12(16,9)	59(83,1)	0,60²
Não	06(21,4)	22(78,6)
Deixar de tomar algum remédio receitado no último ano
Sim	06(37,5)	10(62,5)	0,20²
Não	18(20,7)	69(79,3)
Razão pela qual trabalha
Necessita do dinheiro/ Quer ajudar a família	26(32,5)	54(67,5)	0,06¹
Quer manter-se ocupado/ Necessita se sentir útil/ Gosta do trabalho	03(12,5)	21(87,5)

• ¹Qui-quadrado ²Exato de Fisher

No cluster01-regular, a totalidade de indivíduos fuma atualmente, não consomem frutas, legumes ou verduras pelo menos duas vezes ao dia, e a maioria relatou atendimento odontológico há mais de um ano, resultando em comportamentos ruins/regulares relacionados à saúde. Já no cluster02-ótimo, a grande maioria nunca fumou ou já fumou, mas não fuma mais, tiveram atendimento odontológico há menos de um ano e consomem frutas, legumes ou verduras pelo menos duas vezes ao dia, resultando com bons/ótimos comportamentos relacionados à saúde.

Na Tabela 4, observa-se associação significativa entre sexo e os clusters, na qual os homens compõem mais o cluster02-ótimo (razão de prevalência (RP): 0,79; intervalo de confiança (IC) 0,69-0,97). Essa é uma associação inversa, de proteção, que mostra que os homens do cluster02-ótimo, que é o cluster com comportamentos relacionados a saúde bons/ótimos, tem uma menor probabilidade em desenvolver comportamentos relacionados a saúde ruins/regulares.

Tabela 4
Associação bivariada de clusters com as variáveis independentes (sociodemográficas). Natal/RN - Brasil, 2022.

Variáveis independentes	cluster01-regular	cluster02-ótimo	p
Sexo	n(%)	n(%)
Masculino	24(34,3)	46(65,7)	<0,04¹
Feminino	07(16,3)	36(83,7)
Faixa etária
60-65	20(29,0)	49(71,0)	<0,64¹
≥66	11(25,0)	33(75,0)
Cor/raça
Branco	07(17,9)	32(82,1)	<0,08¹
Pardo/Preta	24(33,8)	47(66,2)
Estado civil
Solteiro/ divorciado/separado/viúvo	09(25,0)	27(75,0)	<0,63¹
Casado/união estável	22(28,9)	54(71,1)
Religião
Católica	21(28,4)	53(71,6)	<0,60¹
Não católica	09(23,7)	29(76,3)
Renda
Até 6 salários-mínimos	07(23,3)	23(76,7)	<0,79¹
Mais de 6,1 salários-mínimos	07(20,6)	27(79,4)
Nível de escolaridade
Fundamental/médio	07(30,4)	16(69,6)	<0,72¹
Graduação/pós-graduação	24(26,7)	66(73,3)
Coabitação
Sozinho	04(25,0)	12(75,0)	<1,00²
Acompanhado	27(27,8)	70(72,2)
Cargo
Docente	23(31,1)	51(68,9)	<0,23¹
Servidor Técnico	08(20,5)	31(79,5)

• ¹Qui-quadrado ²Exato de Fisher

DISCUSSÃO

Estudar os comportamentos relacionados à saúde de pessoas idosas em atividade laboral em uma universidade pública brasileira fornece subsídios para planejamento de políticas que que podem melhorar a qualidade de vida dessas pessoas e servem de base para uma aposentadoria sem grandes perdas, como por exemplo as relacionadas ao avanço da idade que traz alterações físicas atreladas a fisiologia e biologia humana que são inevitáveis e acontecem naturalmente, podendo ocorrer também de forma patológica com o surgimento de doenças, além de mudanças nos comportamentos relacionados à saúde e na adaptação para lidar com o excesso de tempo livre⁸.

Nesse sentido, cabe destacar o perfil das pessoas idosas entrevistas: trata-se de um contingente dominado por homens. A maioria dos servidores técnicos administrativos e docentes são do sexo masculino⁹, sendo a maioria de homens na amostra algo já esperado.

É público o conhecimento de que as mulheres sempre estiveram mais restritas ao espaço doméstico, sendo a mulher, cuidadora, e o homem, provedor. Com as mudanças nos arranjos familiares e as lutas femininas, a mulher ganhou espaço e compõe grande parte da força de trabalho remunerada externa ao domicílio, apesar de ainda não equalizar a divisão sexual do trabalho no Brasil¹⁰,¹¹.

Com relação à idade, apesar de o local da pesquisa ter um número significativo de servidores idosos, observa-se que são pessoas idosas jovens e, em países desenvolvidos, muitos nem seriam considerados pessoas idosas, visto não terem ainda 65 anos. Idade semelhante foi encontrada no estudo de Amorim et al.¹².

Apesar do estudo apresentar em sua maioria pessoas idosas jovens, com as recentes mudanças no mercado de trabalho e nas regras para aposentadoria atrelado ao aumento da expectativa de vida, há maior necessidade de promoção da saúde entre esses trabalhadores idosos que permanecem ativos no mercado de trabalho após os 60 anos¹².

Houve predomínio da cor/raça branco e pardo. Observamos ser uma população que apresenta uma estabilidade financeira e conjugal com nível de escolaridade com pós-graduação, algo já esperado devido o estudo ser realizado em uma instituição de ensino superior, que incentiva os servidores e docentes a se qualificarem, inclusive com melhoria salarial de acordo com seu nível de escolaridade. A maioria dos participantes foi de servidores técnicos administrativos.

Sobre o perfil dos comportamentos relacionados à saúde, a maioria faz atividade física. A instituição de realização do estudo instituiu uma política de qualidade de vida no trabalho em 2017 que proporciona práticas individuais e coletivas de trabalho, gestão organizacional e promoção à saúde dos seus servidores e docentes¹³.

Com relação à vacinação contra influenza e covid-19, a maior parte se vacinou contra ambas as doenças. Apesar das fakes news e dos movimentos antivacinas, principalmente no atual momento político que o país enfrentou/enfrenta, o número de pessoas idosas vacinadas foi bastante satisfatório. O estudo de Santos¹⁴ mostra que 96,5% das pessoas idosas entrevistadas em seu estudo tomam vacinas e 100,0% acreditam que a vacina é eficaz.

A população adulta foi a mais atingida pela covid-19 e, no início da pandemia, com uma letalidade maior na população idosa¹⁵. No estudo de Araújo et al.¹⁶, mostra que mais da metade das pessoas idosas entrevistas demonstraram interesse em receber a vacina contra a covid-19. Com a vulnerabilidade desse grupo, a grande aceitação da vacinação contra a covid-19 pode ter relação com o medo de ser acometido pela doença como também devido ao maior conhecimento e crença na ciência, visto uma parcela ser de pessoas que trabalham diretamente no meio científico.

Sobre quando teve o último atendimento odontológico, algo que chamou atenção foi o quantitativo de respostas sobre não saber quando foi a última vez que teve esse tipo de atendimento. Isso possibilitou considerar que fazia um pouco mais de tempo da ida pela última vez ao dentista e refletiu a importância da educação em saúde acerca do cuidado com a saúde bucal.

Sobre o consumo de frutas, legumes ou verduras (duas vezes/semana) e o consumo de carne, peixe ou frango (três vezes/semana), em ambos, a maioria relatou consumir. De acordo com o estudo pesquisa de orçamentos familiares 2017-2018¹⁷, pessoas idosas consomem mais frutas, legumes e verduras em comparação a adolescentes e adultos, apesar desse consumo ter reduzido comparado ao estudo pesquisa de orçamentos familiares 2008-2009¹⁸.

E no que concerne a razão pela qual ainda trabalha, a maior parte relatou que gosta do trabalho, mas destacamos também aqueles que relataram necessitarem do dinheiro. É notório o crescimento do contingente de pessoas idosas que decidem continuar em atividade laboral mesmo atingindo o tempo e a idade para adquirir a aposentadoria, e isso ocorre devido a diversos fatores, como, por exemplo, o fato de se manterem ativos no mercado de trabalho e se sentirem úteis e valorizados além da própria questão financeira.

O estudo de Pazos e Ferreira¹⁹ mostra que o desejo de muitos continuarem em atividade laboral é devido à questão financeira, por serem os provedores principais da família, pelos papéis sociais e ainda questões previdenciárias, e com concorda com o estudo de Mocelin et al.²⁰ que existem ainda as decorrências das transformações biológicas do corpo, diminuição da saúde que fazem com que muitas pessoas idosas sejam obrigadas a abandonar seus espaços laborais.

No caso dos indivíduos deste estudo, quando se aposentam eles perdem parte do valor que recebem enquanto ainda são ativos. Isso faz com que muitos servidores e docentes ainda se mantenham no serviço para não perder o atual padrão de vida, mesmo com as transformações biológicas advindas da idade.

O envelhecimento ativo e sua relação com o trabalho ainda são um espaço rico de investigação e necessitam de estudos mais aprofundados e contínuos, a fim de que os resultados desses sirvam como subsídios para o planejamento de novas proposições sociais que sigam, inclusive, a legislação, e que culminem em maior qualidade de vida na velhice²¹.

Na realização da análise de clusters, os entrevistados foram caracterizados pelas variáveis hábito de fumar, atendimento odontológico pela última vez e consumo de frutas, legumes ou verduras (duas vezes/dia).

Diante dos resultados, os indivíduos que compõem o cluster01-regular podem ser considerados com comportamentos ruins/regulares relacionados à saúde, visto apresentarem comportamentos de fumar atualmente, o último atendimento odontológico foi há mais de um ano e não consomem frutas, legumes ou verduras (duas vezes/dia); os do cluster02-ótimo podem ser considerados indivíduos que apresentam bons/ótimos comportamentos relacionados à saúde, visto terem comportamentos de nunca ter fumado ou não fumar mais, o último atendimento odontológico foi há menos de um ano e consomem frutas, legumes ou verduras (duas vezes/dia).

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística²² se evidenciou que no hábito de fumar, 11,9% de pessoas idosas fumam, e 42,2% já fumaram, mas não fumam mais. O hábito de fumar está entre as principais causas de DCNT. Sobre atendimentos odontológicos, foram procurados em setores privados, sem caracterização por idade e a quanto tempo fazia do último atendimento odontológico. O consumo de frutas, legumes ou verduras (duas vezes/dia) se mostrou aumentar com o aumento da idade e da escolaridade e as pessoas de 60 anos ou mais apresentaram um percentual de 17,9% para o consumo recomendado.

Com relação a associações significativas entre os clusters e as variáveis independentes, encontrou-se associação significativa entre sexo e os clusters. O sexo masculino se associou com o cluster02-ótimo, que é o que apresenta comportamentos relacionados à saúde bons/ótimos. Esse resultado é contrário aos resultados dos estudos de Assumpção et al.²³, Magalhães et al.²⁴, e Rocha et al.²⁵, que trazem a feminilização na velhice e apresentam as mulheres com melhores comportamentos relacionados à saúde.

Diante desse paradoxo, o estudo de Fernandes e Burnay²⁶ apresenta que as mulheres têm mais probabilidade de ter uma pior condição de saúde percebida, por apresentar uma saúde pior em relação aos homens, e isso independe das diferenças socioeconômicas

Esse resultado pode estar relacionado ao fato da mulher historicamente e socialmente apresentar uma sobrecarga de tarefas por ser criada para atividades do lar, cuidado dos filhos e do marido, além da sua inserção no mercado de trabalho, e assim com uma jornada dupla de trabalho²⁴,²⁷. Devido a essa sobrecarga, a mesma não consegue desenvolver comportamentos relacionados à saúde constantes que busquem a prevenção de doenças e promoção da saúde.

Como fortalezas do estudo aponta-se o fato de ser um estudo epidemiológico voltado para pessoas idosas em atividade laboral que realizou análise de comportamentos relacionados à saúde nessa população, visto se ter ainda poucos estudos com essa temática e que foquem nessa população.

Como limitações cita-se a quantidade de entrevistados que não atingiu a amostra adequada. Isso está atrelado a diversos fatores, desde o não recebimento dos dados atualizados desses servidores, a entrevista ser em ambiente virtual e diante de tantos casos de golpes via telefone, muitas pessoas idosas se recusaram ou não atenderem as ligações. A escassa quantidade de estudos que retratem a temática específica consoante a população idosa.

Outra limitação que se pode mencionar foi que com a pandemia da covid-19 a coleta de dados da pesquisa necessitou ser alterada do formato presencial para o virtual, o que dificultou o contato com a pessoa idosa. O fato de a pesquisa ter sido realizada virtualmente pode ter gerado algum viés de informações. Cabe também ressaltar que o desenho do estudo é transversal, não permitindo inferências de causalidade.

CONCLUSÃO

Conforme as discussões realizadas ao longo deste trabalho, a atenção à saúde da pessoa idosa se faz muito mais necessária do que vem sendo realizada, tendo em vista as mudanças epidemiológicas e demográficas que o país vem sofrendo ao longo dos anos, e que mudam os perfis sociodemográficos, de trabalho, comportamental e de saúde.

Conclui-se que apesar do estudo mostrar que, em geral, os indivíduos que participaram da pesquisa apresentaram bons comportamentos relacionados à saúde, ainda se observou uma parcela que relatou comportamentos de risco à saúde, o que evidencia os desafios sobre o autocuidado na população idosa.

Com isso, é possível perceber a importância da sensibilização dessas pessoas idosas para com os comportamentos de risco à saúde e os seus impactos na saúde e qualidade de vida, devido principalmente a muitas pessoas idosas serem os provedores das suas famílias e a atividade laboral após os 60 anos ser por necessidade e não opção nessa fase da vida.

A pessoa idosa tem se mantido por mais tempo em atividade laboral, e é importante ressaltar que a continuidade dessa atividade seja por escolha ou por necessidade deve ser apoiada e com promoção da saúde da pessoa idosa. Por isso a importância de ações e politicas públicas que contribuam com o envelhecimento saudável, mas que também assegurem o bem-estar da pessoa idosa nos ambientes laborais.

Os resultados desta pesquisa contribuem não apenas para o embasamento científico acerca da temática, mas, também, para o aperfeiçoamento e criação de novas políticas e ações de promoção à saúde e prevenção de doenças direcionadas ao público idoso e, ainda, para colocar em prática estratégias coletivas voltadas para as reais necessidades das pessoas idosas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte que, junto aos serviços existentes sobre a saúde do trabalhador, possam estruturar o acompanhamento da saúde e a atividade laboral dos servidores.

• Não houve financiamento para a execução deste trabalho.

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Editado por

Editado por: Yan Nogueira Leite de Freitas

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  01 Dez 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  04 Abr 2023
• Aceito
  18 Set 2023