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Comunidades, modo de usar: desvendando guias, manuais e relatórios da mineração1 1 A realização deste artigo foi parcialmente subsidiada por Bolsa produtividade do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Taxa de Pesquisa da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes).

Resumo

Nos últimos vinte anos, observou-se um aumento dos conflitos ambientais relacionados às atividades de mineração em diversas partes do mundo. A fim de compreender como os agentes do setor extrativo descrevem estes conflitos e de que forma têm atuado para respondê-los, este artigo analisará dois conjuntos de publicações produzidos na última década. Os relatórios de riscos e tendências do setor extrativo elaborados pelas consultorias Ernst & Young, PricewaterhouseCoopers, Deloitte e KPMG e três manuais de relacionamento com comunidades do Instituto Brasileiro de Mineração, da Confederação Nacional da Indústria e do Conselho Internacional de Mineração e Metais. Identificamos que a produção e a circulação destes materiais integram o conjunto de práticas autoritárias das corporações extrativas em pelo menos três dimensões: i) a compreensão de que atores sociais organizados que atuam na defesa dos territórios são riscos a serem gerenciados; ii) à difusão de técnicas de “diálogo” e “participação social” utilizadas para a identificação e classificação dos atores sociais e iii) a promoção da ideia de que o destino do território está inelutavelmente ligado à corporação.

Palavras-chave:
Setor Extrativo; Conflitos Ambientais; Riscos Sociais; Comunidades Atingidas; Corporações; Neoextrativismo

Abstract

Over the past twenty years, in different parts of the world, there has been an increase in environmental conflicts related to mining activities. In order to understand how agents in the extractive sector have described these conflicts and the way in which they have acted in response to them, this article analyzes two sets of publications produced during the last decade. Risk and trend reports for the extractive sector prepared through consultancies by Ernst & Young, PricewaterhouseCoopers, Deloitte and KPMG and three community relations manuals issued by the Brazilian Mining Institute, the National Confederation of Industry and the International Mining and Metals Council. We identified that the production and circulation of these materials are part of a set of authoritarian practices by extractive corporations set within at least three dimensions: i) an understanding that organized social actors who act in the defense of territories are risks that need to be managed; ii) the dissemination of “dialogue” and “social participation” techniques used to identify and classify social actors and iii) promoting the idea that the destiny of the territory is ineluctably linked to the corporation.

Keywords:
Extractive Sector; Environmental Conflicts; Social Risks; Affected Communities; Corporations; Neo-Extractivism

Introdução

As atividades extrativas têm sido acompanhadas de conflitos ambientais protagonizados por povos, comunidades e movimentos sociais que denunciam as violações de seus direitos e a destruição de seus territórios, e enunciam outras formas de uso e significação do ambiente. Estudos acadêmicos (Coumans, 2011COUMANS, C. Occupying Spaces Created by Conflict: Anthropologists, Development NGOs, Responsible Investment, and Mining. Current Anthropology, v. 52, n. S3, p. S29-S43, 2011.; Franks et al., 2014FRANKS, D.; DAVIS, R.; BEBBINGTON, A.; ALI, S.H.; KEMP, D.; SCURRAH, M. Conflict translates environmental and social risk into business costs. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America - PNAS, v.111, n. 21, p. 7576-7581, 2014.; Kirsch, 2014KIRSCH, S. Mining capitalism: the relationship between corporations and their critics. Oakland: California University Press, 2014.; Gaviria, 2015GAVIRIA, E. M. A “licença social para operar” na indústria da mineração: uma aproximação a suas apropriações e sentidos. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais , v. 17, n. 2, p. 138-154, 2015. ; Acselrad, 2018ACSELRAD, H. Apresentação. In: ACSELRAD, H. (org). Políticas territoriais, empresas e comunidades. O neoextrativismo e a gestão empresarial do social. Garamond, 2018, p. 7-11.; Giffoni Pinto, 2019GIFFONI PINTO, R. Conflitos Ambientais, corporações e políticas do risco. Rio de Janeiro: Garamond, 2019.; Bronz, 2019BRONZ, D. As comunidades não cabem nos modelos: análise de um manual empresarial de relacionamento com comunidade. In: TEIXEIRA, C. et al. (orgs). Etnografias das instituições, práticas de poder e dinâmicas estatais. Brasília: Epapers/ABA, 2019, p. 311-340.; Oliveira; Zucarelli, 2020OLIVEIRA, R.; ZUCARELLI, M. A gestão dos conflitos e seus efeitos políticos: Apontamentos de pesquisa sobre mineração no Espinhaço, Minas Gerais. Revista Antropolítica, n. 49, p.42-71, 2020.) e uma grande quantidade de documentos corporativos apresentam a preocupação do setor extrativo ante a ação de povos, organizações não governamentais e agentes públicos que contestam suas operações. Esta crescente atenção pelos conflitos ambientais, por parte das mineradoras, está relacionada aos ganhos políticos e de mobilização que, em alguma medida, os grupos sociais conseguiram conquistar e que implicam em diversos custos para as corporações, tais como: ações judiciais, dificuldades no licenciamento, paralisação de projetos etc.

A fim de compreender como determinados agentes do setor extrativo descrevem a contestação social e de que forma têm atuado para respondê-la, este artigo analisará dois conjuntos de publicações produzidos na última década. Um deles são os relatórios de riscos do setor extrativo elaborados pelas firmas Ernst & Young (EY), PricewaterhouseCoopers Brasil Ltda (PwC), Deloitte Touche Tohmatsu Limited e KPMG Auditores Independentes Ltda entre os anos de 2012 a 2022. Estas empresas são conhecidas no mundo corporativo como “Big Four”, as quatro maiores do mundo no ramo de auditoria, consultoria, análises fiscais e tributárias. O outro conjunto se refere aos guias e manuais que pretendem auxiliar as corporações a lidar com este ambiente de contestação social.

Foram analisados três documentos produzidos por importantes associações empresariais, são eles: o Guia de Relacionamento Socioinstitucional para o Setor Minerário do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram, 2022IBRAM. INSTITUTO BRASILEIRA DE MINERAÇÃO. Guia de Relacionamento Socioinstitucional para o Setor Minerário. Brasília: Ibram, 2022. Disponível em: https://ibram.org.br/wp-content/uploads/2022/09/IBRAM_Guia-Relacionamento-Socioinstitucional_WEB.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://ibram.org.br/wp-content/uploads/...
), o Manual de Relacionamento com Comunidades em Projetos de Mineração da Confederação Nacional da Indústria (CNI, 2022CNI. CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA. Manual de relacionamento com comunidades em projetos de mineração. Brasília: CNI, 2022. Disponível em: https://www.portaldaindustria.com.br/publicacoes/2022/11/manual-de-relacionamento-com-comunidades-em-projetos-de-mineracao/.
https://www.portaldaindustria.com.br/pub...
) e o Understanding Company-Community Relations Toolkit, de 2015, do Conselho Internacional de Mineração e Metais (International Council on Mining and Metals - ICMMICMM. INTERNATIONAL COUNCIL ON MINING AND METALS. Understanding Company-Community Relations Toolkit. ICMM: London, UK, 2015. https://www.icmm.com/website/publications/pdfs/social-performance/2015/guidance_understanding-company-community-relations.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.icmm.com/website/publication...
). Selecionamos esses documentos por terem sido elaborados por associações que possuem grande relevância no cenário nacional e internacional, como, por exemplo, o Ibram que representa as principais empresas e instituições do setor mineral no Brasil e o ICMM que reúne as maiores corporações de mineração do mundo. Ambas possuem um protagonismo na elaboração e difusão de materiais orientadores para este setor. Embora a CNI não seja uma instituição específica do setor mineral, o documento analisado tem como foco a indústria extrativa.

Buscamos, por meio da análise dos relatórios de riscos do setor, mostrar quais são os diagnósticos de problemas para os quais tais guias e manuais buscam prescrever soluções. Argumentamos que a produção e a circulação destes materiais integram o conjunto de práticas autoritárias das corporações extrativas em pelo menos três dimensões interligadas: a primeira diz respeito a compreensão de que atores sociais organizados, que atuam na defesa dos territórios, são riscos a serem gerenciados; a segunda refere-se à difusão de técnicas de “diálogo” e “participação social” utilizadas para a identificação e classificação dos atores sociais, e a terceira é a promoção da ideia de que o destino do território está inelutavelmente ligado à corporação, que o êxito e o fracasso da empresa são compartilhados com a comunidade.

Além da presente Introdução e as Considerações Finais, o artigo conta com mais duas seções que buscam refletir sobre os dois conjuntos de publicações supracitadas e os seus discursos implícitos. Na seção 1, “Conflitos ambientais como ‘risco corporativo’ no setor mineral”, abordamos a categoria corporativa “risco social” e analisamos os relatórios de riscos e tendências do setor extrativo elaborados pelas consultorias EY, PwC, Deloitte e KPMG, que foram lançados entre os anos de 2012 e 2022. Na seção 2, “Prescrições de técnicas de relacionamento com comunidades”, analisamos três manuais de relacionamento com comunidades na mineração elaborados pelo Ibram, CNI e ICMM, como forma de refletir sobre estes instrumentos e os seus discursos implícitos.

1. Conflitos ambientais como “riscos sociais” para o setor mineral

No denominado boom e pós-boom2 2 No que se refere especificamente ao setor mineral, a constante alta dos preços dos minérios aconteceu no período de 2002 a 2011, e o declínio dos preços, pós-boom, iniciou-se a partir de 2012. das commodities no mercado internacional (Conceição; Marone, 2008CONCEIÇÃO, P.; MARONE, H. Characterizing the 21st century first commodity boom: Drivers and impact. Office of Development Studies, United Nations Development Programme, Nueva York. 2008. (El Trimestre Económico n. 102).; Milanez, 2017MILANEZ, B. Boom ou bolha? A influência do mercado financeiro sobre o preço do minério de ferro no período 2000-2016. Versos-Textos para Discussão PoEMAS, v. 1, n. 2, p. 1-18, 2017.; Milanez; Santos, 2020MILANEZ, B.; SANTOS, R. S. P. Mineração e captura regulatória: a estratégia da Anglo American em Conceição do Mato Dentro (MG), Brasil. Revista Pós Ciências Sociais, v. 16, n. 32, p. 69-91, 2020.), observou-se um aumento dos conflitos ambientais em diversas partes do mundo, seja quando o setor mineral adotou a estratégia de diversificação e expansão do seu parque tecnológico (boom), quanto quando a estratégia se alicerçou na política de corte dos custos de produção, aumento do volume extraído e foco no core business como forma de compensar as perdas diante da retração dos preços (pós-boom) (Santos; Milanez, 2014SANTOS, R.; MILANEZ, B. Neodesenvolvimentismo e neoextrativismo: duas faces da mesma moeda? In: ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS, 37. 2014. Anais (...). Caxambu: Anpocs, 2014.).

A denúncia às graves violações praticadas pelas mineradoras feita por camponeses, povos indígenas, comunidades tradicionais, organizações não governamentais, ambientalistas e demais grupos sociais de diferentes países intensificou-se nesse período. A partir da organização coletiva, estes atores têm se mobilizado para restringir, ou mesmo proibir, novos projetos em determinadas localidades e, simultaneamente, defender as formas já existentes de produção e reprodução social alternativas à extração insustentável de minérios (Malerba, 2014MALERBA, J. (org.). Diferentes formas de dizer não. Experiências internacionais de resistência, restrição e proibição ao extrativismo mineral. Rio de Janeiro: Fase, 2014.). Essas disputas políticas pelo “sentido e destino dos territórios” (Zhouri et al., 2018ZHOURI, A.; OLIVEIRA, R.; ZUCARELLI, M.; VASCONCELOS, M. O desastre do rio doce: entre as políticas de reparação e a gestão das afetações. In: ZHOURI, A. (org.). Mineração, violências e resistências: um campo aberto à produção de conhecimento no Brasil. Marabá: Editorial Iguana, ABA., 2018, p. 28-64., p. 36), expressam a existência de distintas formas de apropriação e significação do ambiente pelos diferentes grupos sociais. De acordo com Acselrad (2010ACSELRAD, H. Ambientalização das lutas sociais: o caso do movimento por justiça ambiental. Estudos Avançados, v. 24, n. 68, p. 103-119, 2010., p. 108-109):

Não há ambiente sem sujeito - ou seja, ele tem distintas significações e lógicas de uso conforme os padrões das distintas sociedades e culturas. Os riscos ambientais, nessa óptica, são diferenciados e desigualmente distribuídos, dada a diferente capacidade de os grupos sociais escaparem aos efeitos das fontes de tais riscos. Ao evidenciar a desigualdade distributiva e os múltiplos sentidos que as sociedades podem atribuir a suas bases materiais, abre-se espaço para a percepção e a denúncia de que o ambiente de certos sujeitos sociais prevaleça sobre o de outros, fazendo surgir o que se veio denominar de “conflitos ambientais”.

Os dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) mostram um aumento vultoso dos conflitos no campo em territórios minerados nos últimos anos. Em 2004 foram registrados quatro casos; enquanto em 2011 temos 55; passando a 103 em 2014; e, finalmente, em 2019, atingiram seu pico, com 288 casos notificados (Wanderley; Leão; Coelho, 2021WANDERLEY, L.J.; LEÃO, P.C.R.; COELHO, T.P. A apropriação da água e a violência do setor mineral no contexto do neoextrativismo brasileiro. In: COMISSÃO PASTORAL DA TERRA (org.). Conflitos no Campo Brasil 2020. Goiânia: Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno, CPT Nacional, 2021. ).

Ao analisar as ações coletivas de contestação dos grupos afetados pelo extrativismo no Brasil e na América Latina, é possível observar um processo complexo e estruturado de mobilização destes atores sociais. Uma das possíveis classificações (Losekann, 2016LOSEKANN, C. A política dos afetados pelo extrativismo na América Latina. Revista Brasileira de Ciência Política, n. 20, p. 121-164, 2016., p. 153) apresenta uma organização de repertórios de ação coletiva que em muitos aspectos dialoga com as preocupações encontradas nos guias de “boas práticas” da mineração, são eles:

i. Visibilização (estratégias de comunicação, visibilização, formação, investigação, campanhas na internet, redes sociais); ii. Produção de conhecimento e informação (pesquisas, criação de bancos de dados e observatórios, uso de leis de acesso à informação, campanhas em redes sociais, hackerativismo, documentários); iii. Mobilização (organização de intercâmbios, visitas em áreas afetadas, audiências públicas); iv. Resistência extrema de sobrevivência (ocupações, ações de desobediência civil); v. intervenção institucional (incidência em políticas públicas, ações judiciais nacionais e internacionais, reuniões com representantes do poder executivo, legislativo e membros do sistema de Justiça).

Observamos é que tais repertórios têm chamado a atenção das corporações extrativas de tal maneira que, ainda nesta quadra histórica, encontramos uma diversidade de estudos realizados por consultorias empresariais e think tanks sobre como agir frente às ações políticas contestatórias das chamadas “partes interessadas” ou “stakeholders”. A denúncia da despossessão ambiental, enunciada pelos sujeitos coletivos, é classificada enquanto um risco, uma vez que as manifestações sociais, bem como algumas de suas conquistas, podem ocasionar dificuldades financeiras, logísticas, operacionais e de livre acesso aos recursos naturais (ICMM et al., 2005; Kytle; Ruggie, 2005KYTLE, B.; RUGGIE, J. G. Corporate social responsibility as risk management: A model for multinationals. Corporate Social Responsibility Initiative. Working paper nº 10. Cambridge, MA: John F. Kennedy School of Government, Harvard University, 2005. Disponível em: https://www.hks.harvard.edu/sites/default/files/centers/mrcbg/programs/cri/files/workingpaper_10_kytle_ruggie.pdf.
https://www.hks.harvard.edu/sites/defaul...
; Davis; Franks, 2014DAVIS, R.; FRANKS, D. Costs of Company-Community Conflict in the Extractive Sector. Corporate Social Responsibility Initiative Report, n. 66. Cambridge, MA: Harvard Kennedy School, 2014.; Franks et al., 2014FRANKS, D.; DAVIS, R.; BEBBINGTON, A.; ALI, S.H.; KEMP, D.; SCURRAH, M. Conflict translates environmental and social risk into business costs. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America - PNAS, v.111, n. 21, p. 7576-7581, 2014.).

De acordo com Beth Kytle e John Ruggie (2005KYTLE, B.; RUGGIE, J. G. Corporate social responsibility as risk management: A model for multinationals. Corporate Social Responsibility Initiative. Working paper nº 10. Cambridge, MA: John F. Kennedy School of Government, Harvard University, 2005. Disponível em: https://www.hks.harvard.edu/sites/default/files/centers/mrcbg/programs/cri/files/workingpaper_10_kytle_ruggie.pdf.
https://www.hks.harvard.edu/sites/defaul...
, p. 6), o risco social corporativo é definido quando um “stakeholder empoderado leva adiante uma questão social e pressiona a corporação, explorando sua vulnerabilidade através da reputação, da imagem corporativa”. Os riscos sociais corporativos podem, nessa acepção, envolver ações diretas dos movimentos sociais, como manifestação de grupos sociais nas linhas férreas ou no canteiro de obras, presença ostensiva de grupos críticos em assembleias anuais dos acionistas, denúncias internacionais, ou embargos impetrados pelos órgãos de justiça, paralisações ou mesmo negação de licenças.

As noções de “risco” e “custo” ultrapassariam, pois, as fronteiras do balanço estritamente comercial, sendo utilizadas para interpretar e explicar os danos que as críticas sociais podem causar à economia corporativa. Antecipação e inovação não mais se restringiriam à concorrência intercapitalista, mas seriam posturas fundamentais para o relacionamento da empresa com os agentes sociais de contestação. (Giffoni Pinto, 2019GIFFONI PINTO, R. Conflitos Ambientais, corporações e políticas do risco. Rio de Janeiro: Garamond, 2019., p.13).

Nos relatórios mais recentes, a sigla ESG (Environmental, Social and Governance), aparece com frequência para tratar de questões envolvendo a reputação da empresa e o acesso a financiamentos de bancos e investidores. Em diferentes publicações que trabalham com a promoção da ideia de riscos ESG existe a justificativa de que traduzir em termos de riscos econômicos o desrespeito aos direitos humanos, às legislações trabalhistas e ambientais é a maneira mais eficaz de convencer os agentes empresariais a serem socialmente responsáveis. As empresas, portanto, seriam as maiores interessadas em respeitar os direitos humanos, uma vez que não fazê-lo implicaria em perdas econômicas e de oportunidades de financiamento. Neste raciocínio, encontramos o conhecido arrazoado neoliberal do mercado autoregulado, agora destinado à proteção dos direitos humanos.

Todavia, a análise empírica sobre as consequências dos desastres para as corporações demonstra a fragilidade deste argumento. Um exemplo emblemático foi a rápida recuperação do valor de mercado da Vale após o rompimento da barragem B1 em Brumadinho, MG, que ocasionou a morte de 272 pessoas e a destruição ambiental da bacia do rio Paraopeba (Mansur, 2022MANSUR, M. Financeirização, uma força irresistível? Um estudo sobre shareholder value e governança corporativa na Vale S.A. e o mercado de commodities minerais. 2022. 331 f. Tese (Doutorado em Sociologia e Antropologia) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2022. ).

1.1 Mensurando a contestação social

Anualmente, grandes firmas de consultoria elaboram relatórios sobre as tendências para o setor de mineração. Nesta seção, vamos analisar os relatórios de quatro das maiores empresas do mundo no ramo de auditoria, consultoria, análises fiscais e tributárias: EY, KPMG, Deloitte e PwC.

A consultoria internacional Ernst & Young (EY) produz relatórios, a partir de entrevistas realizadas com executivos das corporações extrativas,3 3 Para o estudo global de 2020 foram entrevistados mais de 250 executivos do setor, em sua maioria seniores (EY, 2020). em que apresenta os 10 principais “riscos e oportunidades” para o setor. Desde 2021, a EY Brasil, em parceria com o Ibram, elabora uma contextualização deste estudo global com as especificidades do cenário brasileiro.4 4 “O estudo brasileiro não envolveu uma pesquisa quantitativa como a realizada para o global, mas uma análise qualitativa a partir de entrevistas concedidas por executivos seniores do setor, combinadas ao conhecimento dos profissionais da EY e do Ibram sobre a situação e perspectivas da Mineração no país” (EY, 2021, p. 5). Os estudos produzidos pela KPMG5 5 A KPMG é uma rede de firmas independentes que oferecem serviços de consultoria e auditoria para empresas, governos e organizações não-governamentais. Está presente em 146 países. Ver: https://kpmg.com/br/pt/home/sobre-a-kpmg/visao-geral/history.html são elaborados a partir de survey com executivos do setor extrativo sobre as principais tendências do setor e expectativas para as empresas que comandam. A empresa também elabora estudos de âmbito regional. Os relatórios anuais produzidos pela PwC dedicam-se a apresentar as “tendências globais” da indústria a partir da análise do desempenho das 40 maiores mineradoras do mundo através de seus relatórios anuais e financeiros. Até hoje foram publicados 19 relatórios anuais pela PwC sobre o setor mineral, mas nem todos estão disponíveis no site da empresa. A publicação anual da DeloitteDELOITTE. Tracking the trends 2017. The top 10 trends mining companies will face in the coming year. 2017. Disponível em: https://www2.deloitte.com/content/dam/Deloitte/global/Documents/Energy-and-Resources/gx-er-tracking-the-trends-2017.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www2.deloitte.com/content/dam/De...
sobre as tendências do setor existe desde 2009 e elenca os 10 principais desafios globais para o setor mineral.

Cada empresa elabora um relatório com perfis, metodologias e tamanhos variados, e que passam por modificações nos temas e linguagens ao longo dos anos de publicação, mas não será possível traçar um panorama mais detalhado destes documentos no espaço deste artigo. Nosso foco de análise aqui é perceber como a questão social é apresentada e de que forma ela está associada a possíveis riscos ao negócio. Além dos riscos clássicos de crédito, de mercado, os riscos que envolvem “questões regulatórias, públicas, socioeconômicas, governamentais e ambientais que acarretam disfunções nas atividades e lucros” (Deloitte, 2023DELOITTE Riscos não técnicos em exploração e produção de óleo e gás no Brasil. Disponível em: https://www2.deloitte.com/br/pt/pages/energy-and-resources/articles/riscos-nao-tecnicos-exploracao-producao-brasil.html. Acesso em: 1 de fev.2023.
https://www2.deloitte.com/br/pt/pages/en...
) aparecem com destaque nestes documentos. Às vezes sob o nome de riscos sociais, socioambientais, riscos relacionados à “licença social para operar”, riscos ESG, riscos “não-técnicos” e outros que expressam a preocupação quanto às consequências da ação política dos grupos sociais. Vejamos alguns exemplos da descrição dos “riscos sociais” vivenciados pelo setor extrativo:

Protestos, cobertura negativa da mídia, violência, sabotagem e outros ataques diretos à empresa e seus funcionários são sinais de que uma empresa não é aceita como parte da comunidade (...) os conflitos comunitários acarretam danos à reputação da empresa como fornecedora confiável, perda de produtividade, aumento com os custos de segurança, tempo dos gestores seniores etc. (EY, 2014EY. ERNST & YOUNG. Business risks facing mining and metals 2014-2015. 2014. Disponível em: https://miningforzambia.com/wp-content/uploads/2016/11/EY_Business_risks_facing_mining_and_metals_2014_2015.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://miningforzambia.com/wp-content/u...
, p.16-18. tradução nossa).

A indústria enfrentou uma série de desafios de sustentabilidade nos últimos anos, muitas vezes manifestando-se como bloqueios de estradas, protestos sociais contra grandes projetos e dificuldade de acesso a financiamento para projetos considerados ‘sujos’ (PwC, 2017PwC. Mine 2017: Stop. Think... Act. Disponível em: https://www.pwc.com/id/en/pwc-publications/industries-publications/energy--utilities---mining-publications/mine-2017--stop--think---act.html. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.pwc.com/id/en/pwc-publicatio...
, p. 25).

Observamos nesses trechos, as descrições de ações diretas que podem causar transtornos à extração dos minérios e seus fluxos logísticos (bloqueios de estradas e ferrovias), ações de comunicação que repercutem negativamente na reputação da empresa e de ações legais e jurídicas que atrasam os prazos do projeto ou mesmo o inviabilizam.

Nos relatórios de 2019 e 2020, os riscos relativos à concessão de licenças (Permitting risks) ocupavam a segunda posição entre os 10 maiores riscos para o setor. Os riscos referentes às relações comunitárias e licença social para operar (Community relations and social license) ocuparam a terceira posição em 2019 e a quarta posição em 2020 e 2021 (KPMG, 2019KPMG. Risks and opportunities for mining. Outlook. 2019. Disponível em: https://assets.kpmg.com/content/dam/kpmg/xx/pdf/2019/02/global-mining-risk-survey-2019.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://assets.kpmg.com/content/dam/kpmg...
; 2020KPMG. Risks and opportunities for mining. Global Outlook. 2020. Disponível em: https://assets.kpmg.com/content/dam/kpmg/xx/pdf/2020/02/risks-and-opportunities-for-mining.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://assets.kpmg.com/content/dam/kpmg...
).

Vários grupos políticos e organizações não-governamentais preocupados com os impactos da mineração e da produção de metais estão lutando por uma variedade de resultados, desde a proibição de toda mineração até uma maior distribuição de riqueza. Tanto os reclamantes legítimos quanto os ativistas políticos sabem que as margens significativas que as empresas de mineração e metais têm obtido recentemente aumentam sua urgência em resolver disputas a fim de maximizar a produção vendida neste período de preços premium. Proteger a reputação sendo reativo pode, portanto, ser de alto risco e muito caro. Para ficar à frente, as empresas precisam ser proativas em suas relações com comunidades e governos. A velocidade é importante porque evita que uma questão potencial se torne política. (EY, 2012EY. ERNST & YOUNG. Business risks facing mining and metals 2012-2013. 2012. Disponível em: http://www.puertovida.org/docs/Ernst-Young_Business-risk-facing-mining-and-metals-2012-2013.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
http://www.puertovida.org/docs/Ernst-You...
, p. 26, tradução nossa; grifo nosso)

Desde 2019, o Ibram encomenda estudos para avaliar a reputação da mineração na sociedade brasileira. Neste mesmo ano, 2019, o estudo apontou que “dos 450 entrevistados em todo o país, 74% registraram nenhuma ou pouca familiaridade e empatia com a mineração nacional. O nível de medo e desconfiança chega a 70%” (Brasil Mineral, 2023BRASIL MINERAL. Setor tem que reconquistar reputação. Disponível em: https://www.brasilmineral.com.br/noticias/setor-tem-que-reconquistar-reputacao. Acesso em: 1 de fev. 2023.
https://www.brasilmineral.com.br/noticia...
). Este resultado foi atribuído, principalmente, aos rompimentos das barragens de Fundão da Vale/Samarco/BHP em 2015 e B1 da Vale em 2019. Nos últimos três anos, o Ibram tem realizado uma série de seminários para discutir o tema da reputação. Haveria, de acordo com a avaliação do Instituto, um problema em como o setor se comunica com a sociedade e a forte preocupação com a associação entre a mineração e o garimpo em Terras Indígenas.

Associado aos riscos reputacionais, estão os chamados “riscos regulatórios”. De acordo com o relatório da KPMG de 2019, os desastres dos rompimentos da Barragem de Fundão e da B1 da Vale foram apontados como eventos críticos para o setor que “impactarão significativamente as discussões sobre o papel e as responsabilidades do setor de mineração no país, aumentando os riscos relacionados a licenças ambientais e relações com a comunidade e licença social para operar” (KPMG, 2019KPMG. Risks and opportunities for mining. Outlook. 2019. Disponível em: https://assets.kpmg.com/content/dam/kpmg/xx/pdf/2019/02/global-mining-risk-survey-2019.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://assets.kpmg.com/content/dam/kpmg...
, p. 8. tradução nossa). A questão dos desastres-crimes dos rompimentos de barragem no Brasil também aparece no relatório da EY:

Autoridades e grupos organizados seguem gerando instabilidade jurídica em questões como os custos tributários, o licenciamento de novos e a expansão de projetos. Os ecos dos dois rompimentos de barragens de rejeitos ainda fomentam certa resistência popular em relação à mineração (EY, 2022EY. ERNST & YOUNG; IBRAM. INSTITUTO BRASILEIRO DE MINERAÇÃO. Riscos e Oportunidades de Negócios em Mineração e Metais no Brasil. 2021. Disponível em: https://www.ey.com/pt_br/mining-metals/riscos-e-oportunidades-em-mineracao-e-metais-no-brasil. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.ey.com/pt_br/mining-metals/r...
, p. 7).

1.2 Risco jurídico

Embora os relatórios das consultorias não citem diretamente os conflitos judicializados, a análise dos relatórios revela o quanto este é um problema para as mineradoras. O tema da colaboração com a comunidade aparece como um “enigma” e é tratado como antítese da litigância em um item do relatório que trata dos custos reputacionais:

Engajamento precoce de maneira culturalmente apropriada: O engajamento com as comunidades deve começar o mais cedo possível em um projeto e continuar durante todo o ciclo de vida do projeto. O investimento necessário para estabelecer um diálogo bidirecional significativo é muito menor do que o necessário para contestações legais ou para reconstruir um relacionamento após um litígio. Os custos de reputação também devem ser considerados (Deloitte, 2022DELOITTE Tracking the trends 2022. Redefining mining. 2022. Disponível em: https://www.deloitte.com/an/en/Industries/mining-metals/analysis/tracking-the-trends-mining-industry.html. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.deloitte.com/an/en/Industrie...
, p. 34, tradução nossa; grifo nosso.).

As questões legais aparecem intrinsecamente ligadas aos conflitos sociais e aos riscos das atividades e são tratadas como:

  1. Custos com taxas jurídicas, com acordos judiciais e decisões judiciais;

  2. Custos de reputação por desgaste de imagem;

  3. Dificuldade de relacionamento com comunidades após litígios;

  4. Insegurança jurídica com mudanças de marcos normativos;

  5. Custos para adequação das práticas aos quadros legais ambientais, trabalhistas e humanitários.

Para este último item, no “Mine 2022 - A critical transition”, da PwC, é citado o caso da mineração de cobalto na África central: “Na África central, os mineradores de cobalto estão sob pressão para manter as expectativas da comunidade sobre os direitos dos trabalhadores e o trabalho infantil. Esses assuntos sérios são uma prioridade que exige atenção dos mineiros” (2022PwC. Mine 2022: A critical transition. 2022. Disponível em: https://www.pwc.com/gx/en/industries/energy-utilities-resources/publications/mine.html. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.pwc.com/gx/en/industries/ene...
, p. 25. tradução nossa). O tema é comentado no capítulo cujo título é “Confiança é um material crítico” (idem), como se a própria adesão da comunidade fosse uma commodity a ser extraída junto com o minério.

Os relatórios também apontam para tendências de mudanças futuras em questões legais, sobretudo ligadas aos usos da terra e às demandas indígenas, e mencionam os custos com litígios e desgaste de relacionamento com as comunidades em decorrência de conflitos, como evidente no trecho citado anteriormente. Nesse sentido, o relacionamento com povos indígenas aparece como um desafio para o futuro, conforme o relatório da Deloitte a partir do depoimento de um “parceiro do grupo de serviços indígenas” desta empresa na Austrália: “O que estamos vendo agora são os povos indígenas se defendendo e querendo ter mais liberdade para moldar o futuro de suas nações. O que isso significa é que a relação legal, econômica e social entre os povos indígenas e o resto da nação vai mudar drasticamente” (Deloitte, 2022DELOITTE Tracking the trends 2022. Redefining mining. 2022. Disponível em: https://www.deloitte.com/an/en/Industries/mining-metals/analysis/tracking-the-trends-mining-industry.html. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.deloitte.com/an/en/Industrie...
, p. 32).

Além disso, a tendência de estabelecimento de um novo paradigma para as relações com indígenas aparece como uma precaução para o enfrentamento dos novos direitos por eles conquistados e cristalizados em leis:

A consciência dos direitos indígenas, particularmente em relação à licença social, cresceu enormemente na última década. (...) Existem também vários atos legislativos, tanto em nível federal quanto provincial, que incorporam princípios da Declaração das Nações Unidas sobre a Lei dos Direitos dos Povos Indígenas (Deloitte, 2022DELOITTE Tracking the trends 2022. Redefining mining. 2022. Disponível em: https://www.deloitte.com/an/en/Industries/mining-metals/analysis/tracking-the-trends-mining-industry.html. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.deloitte.com/an/en/Industrie...
, p. 32, tradução nossa).

Esperamos ver um aumento da atividade dos governos tentando preencher a lacuna entre as expectativas da comunidade e as práticas das empresas, potencialmente fundindo características da licença informal com outras mais formais (...) Claro, também existe o risco de que, uma vez atendidas essas novas necessidades, as expectativas possam aumentar ainda mais (EY, 2014EY. ERNST & YOUNG. Business risks facing mining and metals 2014-2015. 2014. Disponível em: https://miningforzambia.com/wp-content/uploads/2016/11/EY_Business_risks_facing_mining_and_metals_2014_2015.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://miningforzambia.com/wp-content/u...
, p. 18, tradução nossa).

Os projetos continuam sendo atrasados ou completamente arquivados por causa de interesses conflitantes da comunidade, com governos cada vez mais apoiando essas comunidades (EY, 2015EY. ERNST & YOUNG. Business risks facing mining and metals 2015-2016. 2015. Disponível em: https://www.shinnihon.or.jp/shinnihon-library/publications/research/2015/pdf/2015-09-14-en.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.shinnihon.or.jp/shinnihon-li...
, p. 3).

Além das mobilizações indígenas por direitos, a litigância feita por ambientalistas, também é citada como um risco e é avaliada como um repertório em expansão:

À medida que as comunidades e os advogados se tornam cada vez mais litigiosos, a consulta e negociação precoces são cruciais para evitar batalhas legais caras e potencialmente prejudiciais. As organizações também precisam estar cientes de que as atitudes da comunidade muitas vezes estão à frente da estrutura legal e regulamentar (EY, 2015EY. ERNST & YOUNG. Business risks facing mining and metals 2015-2016. 2015. Disponível em: https://www.shinnihon.or.jp/shinnihon-library/publications/research/2015/pdf/2015-09-14-en.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.shinnihon.or.jp/shinnihon-li...
, p. 22).

Também são citadas as investidas judiciais de grupos ambientalistas em litígios climáticos, onde as mineradoras são acusadas de envolvimento na extração de combustíveis fósseis: “Grupos ambientalistas estão atacando mineradoras envolvidas na extração de combustíveis fósseis por meio de protestos e ações legais” (EY, 2015EY. ERNST & YOUNG. Business risks facing mining and metals 2015-2016. 2015. Disponível em: https://www.shinnihon.or.jp/shinnihon-library/publications/research/2015/pdf/2015-09-14-en.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.shinnihon.or.jp/shinnihon-li...
, p. 47).

Cumpre destacar que a recomendação de mudança de comportamento das mineradoras está relacionada com a percepção dos efeitos ruins advindos das contestações judiciais e com os consequentes desinvestimentos no setor. Em outras palavras, a mudança de comportamento, descrito como um fenômeno de reconfiguração da corporação para o “investimento ético”, nada mais é do que a busca de legitimação da atuação corporativa, onde um dos seus elementos é o estabelecimento de acordos e/ou participação das comunidades no negócio, se antecipando a conflitos que podem tornar-se litigiosos.

2. Prescrições de técnicas de relacionamento com comunidades

As associações empresariais do setor, em articulação com consultorias empresariais, têm elaborado um conjunto de manuais, guias, sourcebooks, toolkits para auxiliar as corporações a lidarem com o cenário conflituoso que envolve as suas operações minerárias. Nesta seção, vamos analisar três manuais destinados ao setor extrativo produzidos pelo Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) pelo Conselho Internacional de Mineração e Metais (ICMM, na sigla em inglês)

O “Manual de relacionamento com comunidades em projetos de mineração”, da entidade sindical patronal CNI em parceria com a consultoria Integratio foi publicado em 2022, ano em que também foi divulgado o Guia de relacionamento socioinstitucional para o setor minerário elaborado pelo Ibram, associação privada sem fins lucrativos, em conjunto com a empresa Falconi Consultoria.

O documento Understanding Company-Community Relations Toolkit, foi lançado em 2015 pelo ICMM, organização internacional composta por 25 empresas de mineração e metais e 33 associações regionais e de commodities. O ICMM, desde o seu surgimento no início dos anos 2000, já elaborou diversos guias destinados a orientar o setor mineral a lidar com conflitos.

Os documentos consultados são extensos e detalhados, com diversos trechos de legislações nacionais e internacionais, infográficos e exemplos de casos de “sucesso”. Apresentam uma discussão atualizada da questão dos direitos humanos, direitos dos povos indígenas e tradicionais e mesmo de noções antropológicas que poderiam surpreender aqueles que não estão familiarizados com a capacidade de atualização dos agentes corporativos.

Os manuais não apenas recomendam condutas, mas eles mesmos se apresentam como um produto desta conduta. São uma forma de revelar um setor esclarecido e atualizado para um público mais amplo: “Além de ser um recurso precioso para as empresas, o Manual também poderá ser de grande valia para grupos da sociedade civil, como Organizações Não-Governamentais (ONGs), entidades, movimentos de classe, associações comerciais e empresas de serviços de mineração” (CNI, 2022CNI. CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA. Manual de relacionamento com comunidades em projetos de mineração. Brasília: CNI, 2022. Disponível em: https://www.portaldaindustria.com.br/publicacoes/2022/11/manual-de-relacionamento-com-comunidades-em-projetos-de-mineracao/.
https://www.portaldaindustria.com.br/pub...
, p.16).

Os manuais analisados operam em uma ordem prescritiva do discurso, criando um compêndio de ideias que refletem pouco sobre como a mineração de fato age. Os manuais são, assim, iniciativas performativas e peças de retórica que buscam apresentar diretrizes discursivas para o setor, sendo instrumentos de construção de narrativas. Os manuais buscam conferir credibilidade a um modelo de negócios que promete entregar valor aos acionistas (Froud et al., 2006FROUD, J.; JOHAL, S.; LEAVER, A.; WILLIAMS, K. Financialization and strategy: Narrative and numbers. Londres: Routledge, 2006.; 2009FROUD, J.; LEAVER, A.; JOHAL, S.; NILSSON, A. et al. Narratives and the financialised firm. Kölner Zeitschrift für Soziologie und Sozialpsychologie, v. 48. p. 288-304, 2009.).

Ao analisar os instrumentos da comunicação empresarial de grandes corporações do setor extrativo, com especial atenção ao material diagramático que os integram, Acselrad e Assis (2022ACSELRAD, H.; ASSIS, W. F. T. Imagética espacial no capitalismo extrativo: forma e força nos diagramas de responsabilidade social empresarial. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, v. 24, n. 1, 2022., p. 4) apontam que tais documentos não são apenas discursos empresariais para construção de uma boa reputação, mas são também discursos sobre uma determinada representação do espaço social:

Esses instrumentos inscrevem-se num conjunto de formas de representação espacial e diagramas pelas quais as corporações ora disseminam o modo benfazejo como esperam ser vistas, ora forjam leituras estratégicas próprias do campo social em que atuam.

De acordo com a retórica das associações empresariais, o manual da CNI tem por objetivo fornecer

orientações práticas para o relacionamento com comunidades, de modo que a empresa se engaje e participe ativamente no entendimento da realidade e das demandas locais, colaborando para o desenvolvimento de soluções em seu território de atuação (CNI, 2022CNI. CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA. Manual de relacionamento com comunidades em projetos de mineração. Brasília: CNI, 2022. Disponível em: https://www.portaldaindustria.com.br/publicacoes/2022/11/manual-de-relacionamento-com-comunidades-em-projetos-de-mineracao/.
https://www.portaldaindustria.com.br/pub...
, p. 13).

O guia publicado pelo Ibram, é descrito como um “marco na evolução da gestão dos mais importantes stakeholders da mineração, que são as comunidades situadas no entorno dos empreendimentos minerários” (Ibram, 2022EY. ERNST & YOUNG; IBRAM. INSTITUTO BRASILEIRO DE MINERAÇÃO. Riscos e Oportunidades de Negócios em Mineração e Metais no Brasil. 2022. Disponível em: https://www.ey.com/pt_br/mining-metals/riscos-e-oportunidades-em-mineracao-e-metais-no-brasil-2022. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.ey.com/pt_br/mining-metals/r...
, p. 6). Enquanto o Understanding Company-Community Relations Toolkit, do ICMM, se apresenta como uma resposta à dificuldade das empresas em alcançar o “apoio da comunidade”.

2.1 Comunidades: modo de usar

No guia da CNI observa-se um jogo que se estabelece entre a afirmada necessidade que as empresas têm de “atuar no engajamento e mobilização social das partes interessadas, visando o estabelecimento de linhas de comunicação permanentes, dialógicas e sobretudo participativas” (CNI, 2022CNI. CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA. Manual de relacionamento com comunidades em projetos de mineração. Brasília: CNI, 2022. Disponível em: https://www.portaldaindustria.com.br/publicacoes/2022/11/manual-de-relacionamento-com-comunidades-em-projetos-de-mineracao/.
https://www.portaldaindustria.com.br/pub...
, p. 11); e o conceito de mobilização social. Segundo o guia:

A mobilização social pode ser entendida como a união de pessoas articuladas de maneira responsável e interdependente, que compartilham conhecimentos e responsabilidades para melhorias e mudanças positivas para a transformação de uma realidade comum. A mobilização social deve ser um processo dinâmico e permanente de envolvimento, comprometimento e mudança de valores e comportamentos, tanto da empresa como da comunidade. Cada processo de mobilização social pode gerar um benefício diferente e único, influenciando em uma ou mais comunidades (CNI, 2022CNI. CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA. Manual de relacionamento com comunidades em projetos de mineração. Brasília: CNI, 2022. Disponível em: https://www.portaldaindustria.com.br/publicacoes/2022/11/manual-de-relacionamento-com-comunidades-em-projetos-de-mineracao/.
https://www.portaldaindustria.com.br/pub...
, p. 12, grifos nossos).

A seguir o guia ainda sugere um gráfico6 6 Ver “Figura 1. Passos para iniciar uma mobilização social” (CNI, 2022, p. 12). de etapas para “iniciar uma mobilização social”. O que se percebe é o uso adaptado de conceitos comuns e caros aos movimentos sociais. “Engajamento”, “mobilização social”, “participação” são todos termos positivados dentro do universo linguístico dos movimentos sociais e comunidade, sobretudo, aqueles que estão engajados em lutas cuja mira está nas mineradoras e suas práticas. Antes de qualquer estranhamento é importante observarmos que há uma apropriação com deslocamentos de sentido importantes em tais termos. Sublinhamos aqui alguns elementos mais marcantes.

Primeiramente, a definição de mobilização social é trazida com uma adjetivação que implicará (caso operacionalizada) em uma avaliação moral, qual seja, a ideia de “pessoas articuladas de maneira responsável”. Ainda no texto destacado, menciona-se “comprometimento e mudança de valores e comportamentos” carregados, mais uma vez, de sentido moral. Mas, além disso, de uma visão de conformidade, concordância, convergência, entre comunidade e empresa. Tal definição opera, assim, com uma função de incorporar e neutralizar o conceito de mobilização social, cujo referente empírico é geralmente contrário às mineradoras e pouco ancorado em perspectivas consensuais e cordatas. Não obstante, tal procedimento cria a possibilidade de diferenciar as mobilizações sociais desejáveis aos negócios daquelas que, ao contrário, minam os negócios, as quais poderiam ser enquadradas como “não responsáveis”.

Indo além, o conceito é reformado para a lógica empresarial dentro da qual faz sentido pensar que “Cada processo de mobilização social pode gerar um benefício diferente e único, influenciando em uma ou mais comunidades”. Seguindo a lógica do “modo de fazer”, expressa no gráfico que segue à definição, a mobilização social é tratada como um produto, com um resultado tal como uma meta. Longe do significado complexo que tem para movimentos sociais e comunidades, aqui a mobilização é esterilizada, gera “um benefício diferente e único” e, mais, é a mobilização que influencia a comunidade e não o oposto. Este último aspecto revela o quão distante tal conteúdo está do termo original, ao colocar as mineradoras, público-alvo do guia, como agentes da mobilização social cujo destino é a comunidade.

Por fim, o guia oferece um organograma onde o termo “interesse comum” é cercado por círculos onde os mais diferentes atores envolvidos são citados e colocados de forma simétrica: “comunidades”, “empresa”, “líderes”, “ONGs” etc. Tal gráfico deixa evidente o objetivo real da mobilização social, gerar o interesse comum, capaz de reduzir os riscos sociais advindos das mobilizações contestatórias e carregadas de conflitos. Em outras palavras, há uma busca pelo consenso ideal e imaginado que reconhece a diferença entre os atores sociais envolvidos, mas apaga as discordâncias no incentivo a um tipo de diálogo e “participação coletiva” que parte do deslocamento dos termos e uma apropriação linguística. Conforme Acselrad e Assis (2022ACSELRAD, H.; ASSIS, W. F. T. Imagética espacial no capitalismo extrativo: forma e força nos diagramas de responsabilidade social empresarial. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, v. 24, n. 1, 2022., p. 17), tais descrições não representam um mundo preexistente, mas produzem uma nova realidade: “trata-se de fazer ver, crer e reconhecer um mundo social sem dissenso, em que os grupos atingidos pelos projetos empresariais se vejam como parceiros, ‘partes interessadas’ e ‘coproprietários psicológicos’ desses projetos”.

O relatório do ICMM aborda a questão da mesma maneira ao reforçar a noção de que

as partes interessadas desenvolvam um caminho a seguir juntos, de modo que o processo de construção (ou fortalecimento) de relacionamento seja um esforço conjunto e as ações tomadas para chegar lá sejam identificadas, apoiadas e realizadas em conjunto. (ICMM, 2015ICMM. INTERNATIONAL COUNCIL ON MINING AND METALS. Understanding Company-Community Relations Toolkit. ICMM: London, UK, 2015. https://www.icmm.com/website/publications/pdfs/social-performance/2015/guidance_understanding-company-community-relations.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.icmm.com/website/publication...
, p. 10).

Há discursivamente o entrelaçamento das vontades como uma só: a da empresa e das comunidades. Apesar do vocabulário utilizado nos relatórios, as entrelinhas nos revelam a permanência da noção antidemocrática referente às concepções de “diálogo” e “participação”.

No relatório do ICMM se observa o sentido moral das categorias ao alicerçar que o “suporte da comunidade” pode ser medido através de quatro fatores que “refletem a qualidade das relações entre uma empresa e sua comunidade anfitriã” (ICMN, 2015ICMM. INTERNATIONAL COUNCIL ON MINING AND METALS. Understanding Company-Community Relations Toolkit. ICMM: London, UK, 2015. https://www.icmm.com/website/publications/pdfs/social-performance/2015/guidance_understanding-company-community-relations.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.icmm.com/website/publication...
, p. 12). São eles: “legitimidade”, “compatibilidade de interesses”, “respeito” e “confiança”. A legitimidade engloba uma combinação de aprovação formal e informal que passa pela “licença social para operar”. A compatibilidade de interesses revela a noção de acomodação dos interesses, onde “a comunidade deve acreditar que o sucesso do empreendimento vai beneficiá-lo, contrabalanceando os custos do projeto para eles” (ICMM, 2015ICMM. INTERNATIONAL COUNCIL ON MINING AND METALS. Understanding Company-Community Relations Toolkit. ICMM: London, UK, 2015. https://www.icmm.com/website/publications/pdfs/social-performance/2015/guidance_understanding-company-community-relations.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.icmm.com/website/publication...
, p. 14).

O respeito versa sobre as diferenças culturais, mas também sobre o compartilhamento de informações, adotando uma abordagem conjunta para a solução dos problemas e na tomada de decisão (ICMM, 2015ICMM. INTERNATIONAL COUNCIL ON MINING AND METALS. Understanding Company-Community Relations Toolkit. ICMM: London, UK, 2015. https://www.icmm.com/website/publications/pdfs/social-performance/2015/guidance_understanding-company-community-relations.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.icmm.com/website/publication...
, p. 14). A confiança passa pela comunicação, compreensão, colaboração e a crença na possibilidade de benefícios mútuos. Contudo, como o próprio relatório esclarece, existe a necessidade de que para “a confiança seja construída e mantida, deve haver alinhamento entre as expectativas e crenças das contrapartes na capacidade de cada um de assumir compromissos e cumpri-los e sua capacidade real de fazê-lo” (ICMM, 2015ICMM. INTERNATIONAL COUNCIL ON MINING AND METALS. Understanding Company-Community Relations Toolkit. ICMM: London, UK, 2015. https://www.icmm.com/website/publications/pdfs/social-performance/2015/guidance_understanding-company-community-relations.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.icmm.com/website/publication...
, p. 15). Uma figura é apresentada7 7 Ver “Figure 2: Indicators of community support and contextual factors” (ICMM, 2015, p. 16). na página 16, evidenciando que no organograma moral das corporações, a “confiança” é o elemento central na busca pelo suporte da comunidade.

Não deixa de chamar a atenção o elemento do controle em todo esse processo, com o designado monitoramento do suporte da comunidade através do tempo. “A comparação dos resultados do monitoramento ao longo do tempo pode então ser usada para identificar indicadores avançados e atrasados de relacionamentos em mudança” (ICMM, 2015ICMM. INTERNATIONAL COUNCIL ON MINING AND METALS. Understanding Company-Community Relations Toolkit. ICMM: London, UK, 2015. https://www.icmm.com/website/publications/pdfs/social-performance/2015/guidance_understanding-company-community-relations.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://www.icmm.com/website/publication...
, p. 28). Ou seja, implicitamente há a busca pelo monitoramento dessa relação, um esforço em tornar gerenciável, manejável e, portanto, previsível, a ação dos atores sociais, atuando em momentos considerados necessários na busca do “caminho conjunto”. “A conquista da empresa é conseguir somar a própria voz à coletividade, é fazer parte do todo” (Ibram, 2022IBRAM. INSTITUTO BRASILEIRA DE MINERAÇÃO. Guia de Relacionamento Socioinstitucional para o Setor Minerário. Brasília: Ibram, 2022. Disponível em: https://ibram.org.br/wp-content/uploads/2022/09/IBRAM_Guia-Relacionamento-Socioinstitucional_WEB.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://ibram.org.br/wp-content/uploads/...
, p. 48).

Além disso, chama a atenção a exposição de metodologias no estilo propositivo: ‘modo de fazer’. A fonte principal de orientações metodológicas está, evidentemente, no campo das ciências humanas, com destaque para métodos qualitativos, tais como entrevistas, questionários, grupos focais etc. Também se observa a indicação de práticas usualmente utilizadas pelos movimentos sociais, tais como “mapeamento participativo”, “etnomapas”, “rodas de diálogo” (CNI, 2022CNI. CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA. Manual de relacionamento com comunidades em projetos de mineração. Brasília: CNI, 2022. Disponível em: https://www.portaldaindustria.com.br/publicacoes/2022/11/manual-de-relacionamento-com-comunidades-em-projetos-de-mineracao/.
https://www.portaldaindustria.com.br/pub...
). Nesse sentido, o Ibram recomenda que as equipes que farão os diagnósticos territoriais “lancem mão de estratégicas (sic) como diálogo social, caminhamentos pelo território, cartografia social, rodas de conversa, oficinas e escutas orientadas” (Ibram, 2022IBRAM. INSTITUTO BRASILEIRA DE MINERAÇÃO. Guia de Relacionamento Socioinstitucional para o Setor Minerário. Brasília: Ibram, 2022. Disponível em: https://ibram.org.br/wp-content/uploads/2022/09/IBRAM_Guia-Relacionamento-Socioinstitucional_WEB.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://ibram.org.br/wp-content/uploads/...
, p. 128). Também são usados elementos do campo da educação, com destaque para a “educação de adultos” e a abordagem da “comunicação não violenta” utilizada sobretudo na área da administração e recursos humanos.

A expertise de profissionais das humanidades, de forma geral, é empregada tanto na elaboração destes documentos quanto na execução de estudos e projetos sociais das mineradoras. Existe a percepção desta expertise como uma engenharia do social que teria a capacidade de promover consensos sobre a operação das empresas (Giffoni Pinto, 2019GIFFONI PINTO, R. Conflitos Ambientais, corporações e políticas do risco. Rio de Janeiro: Garamond, 2019.).

A metodologia é o objetivo central do guia do Ibram e os conceitos servem para construir uma base cognitiva de aproximação entre os atores que precisam ser conquistados no processo (todos os envolvidos nas redes de contestação). É por meio de tais métodos que o objetivo central de domar contestações sociais pode ser cumprido, como é revelado no trecho a seguir: “É notório que a construção da legitimidade social propicia ao empreendimento uma operação com maior tendência à estabilidade em ambiente mais propício à viabilização de planos futuros, reduzindo os riscos sociais do negócio” (Ibram, 2022IBRAM. INSTITUTO BRASILEIRA DE MINERAÇÃO. Guia de Relacionamento Socioinstitucional para o Setor Minerário. Brasília: Ibram, 2022. Disponível em: https://ibram.org.br/wp-content/uploads/2022/09/IBRAM_Guia-Relacionamento-Socioinstitucional_WEB.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://ibram.org.br/wp-content/uploads/...
, p. 25).

É interessante observar os paralelos evidentes entre os indicadores de criticidade, como no guia produzido pelo Ibram e os repertórios de ação coletiva das comunidades. Além disso, as variáveis identificadas no guia relativas à chamada “matriz das comunidades” estão todas mais relacionadas à percepção que as pessoas podem ter do empreendimento do que algum tipo de avaliação do dano em si, o que só aparece implicitamente na classificação feita a priori do risco da comunidade conforme a definição de Área Diretamente Afetada (ADA), Área de Influência Direta (AID) e Área de Influência Indireta (AII).

Vejamos abaixo dois slides (Figura 1) apresentados no seminário interno do Ibram em 2021 pela Falconi Consultoria sobre o trabalho de gerenciamento de comunidades vizinhas à Mosaic Fertilizantes, mineradora de fosfato e potássio em Goiás.

Figura 1
Matriz de criticidade.

A função extrativa das corporações, mesmo na relação com as comunidades, está presente em todos os guias. Isto é evidente a partir do chamado “mapeamento de ativos sociais e econômicos” onde são incluídas diversas dimensões existenciais das comunidades atingidas, conforme a explicação do próprio guia:

É considerado ativo o conjunto de atores, instituições e iniciativas sociais, econômicas, culturais e ambientais existentes nos territórios. Cada um deles possui uma relação própria com a cidade, pautada em projetos, programas, propostas, entre outros marcos, relacionados a diferentes temáticas (educação, cultura, trabalho e renda, meio ambiente, arte, saúde, assistência social etc.) e em uma perspectiva intersetorial (...). (Ibram, 2022IBRAM. INSTITUTO BRASILEIRA DE MINERAÇÃO. Guia de Relacionamento Socioinstitucional para o Setor Minerário. Brasília: Ibram, 2022. Disponível em: https://ibram.org.br/wp-content/uploads/2022/09/IBRAM_Guia-Relacionamento-Socioinstitucional_WEB.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
https://ibram.org.br/wp-content/uploads/...
, p. 67).

Ou seja, tudo o que não é a atividade fim da mineração, mas tem implicações para ela, precisa ser extraído, classificado, monitorado e, se possível, arrumado para que esteja de acordo com a atividade central. Assim, a mineradora se coloca como uma espécie de figura soberana, totalitária, mas de aparência afável e generosa, sobre o território e suas formas de vida pré-existentes. Poderia ser comparada a um Leviatã pela sua pretensão de domínio, mas mais como o príncipe virtuoso de Maquiavel que consegue ser amado e temido.

É nesse sentido que se estabelece uma verdadeira tirania do diálogo social, na qual ao contrário do sentido genuíno, de um diálogo no qual seja possível discordar e agir de forma autônoma, as comunidades são tratadas como ativos a serem desvendados, classificados, conquistados e, na pior das hipóteses, monitorados. Ao analisar um manual de relacionamento com comunidade elaborado para uso interno dos funcionários de uma mineradora brasileira, Bronz afirma que o diálogo social proposto neste documento era importante para a produção de dados sobre as comunidades:

(...) sobre como elas pensam e sobre o que elas querem. Bem como para fazê-las compreender o quanto todos sairão ganhando se empreenderem um bom relacionamento com a empresa ou se cooperarem com as atividades e os projetos por ela propostos. O diálogo social é uma forma de a empresa ajudar a comunidade a ajudá-la. (Bronz, 2019BRONZ, D. As comunidades não cabem nos modelos: análise de um manual empresarial de relacionamento com comunidade. In: TEIXEIRA, C. et al. (orgs). Etnografias das instituições, práticas de poder e dinâmicas estatais. Brasília: Epapers/ABA, 2019, p. 311-340., p. 333)

Por fim, os manuais desempenham um papel ativo na formação de uma visão do lugar das corporações na sociedade. Elas atuariam “em conjunto” e “em diálogo” com as comunidades afetadas pelos seus empreendimentos, onde “corporação” e “comunidade” são atores sociais em ampla convergência. Isto é, o sucesso da corporação é também o sucesso das comunidades. Nesse sentido, o discurso organizacional é um dos mecanismos por meio do qual as organizações criam uma realidade social que fundamenta a percepção ou a projeção de sua identidade (Costa; Carvalho, 2005COSTA, A. M.; CARVALHO, J. L. F. Legitimando papéis ou conciliando interesses? A reprodução discursiva da responsabilidade social empresarial. In: ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM ADMINISTRAÇÃO (Anpad), 2005, Curitiba. Anais (...). Curitiba: Anpad, 2005., p. 4).

Considerações finais

Através da análise dos relatórios de riscos e dos guias e manuais de relacionamento com comunidades na mineração, o presente artigo buscou compreender como determinados agentes do setor extrativo descrevem a contestação social e de que forma têm atuado para respondê-la. Tais documentos podem ser compreendidos como dispositivos de poder (Bronz, 2019BRONZ, D. As comunidades não cabem nos modelos: análise de um manual empresarial de relacionamento com comunidade. In: TEIXEIRA, C. et al. (orgs). Etnografias das instituições, práticas de poder e dinâmicas estatais. Brasília: Epapers/ABA, 2019, p. 311-340.) em que as descrições dos territórios e as prescrições para um bom relacionamento com a “comunidade” pretendem refrear, e mesmo evitar, o potencial político dos conflitos ambientais.

É possível identificar nesses guias a busca pela normatização da realidade e a utilização de técnicas disciplinares que conformem a ação das comunidades. Ao trazer como elemento central a busca pela conjugação de um “interesse comum” ou “caminho conjunto” entre corporação e comunidade há o empenho em expandir a forma “empresa” para os atores sociais, impactando subjetividades e modos de vida e modelando discursos e desejos (Dardot; Laval, 2016DARDOT, P.; LAVAL, C. A nova razão do mundo. São Paulo: Boitempo, 2016.). Os documentos buscam prescrever a relação corporação/comunidade, ao mesmo tempo que busca a homogeneização das relações sociais. Nesse sentido, há um imperativo de conduta (Weber, 2004WEBER, M. A ética protestante e o “espírito” do capitalismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.) que estabelece uma nova relação moral entre os indivíduos e as corporações.

As comunidades são, em geral, adjetivadas para pertencerem à esfera corporativa: “partes interessadas”, “anfitriãs” e “sócias”, caso renunciem sua postura conflituosa. Conforme sintetiza Acselrad (2018ACSELRAD, H. Apresentação. In: ACSELRAD, H. (org). Políticas territoriais, empresas e comunidades. O neoextrativismo e a gestão empresarial do social. Garamond, 2018, p. 7-11., p. 11): “as grandes corporações procuram resolver seus próprios problemas auto atribuindo-se um papel político direto na sociedade, criando seu próprio ‘espaço público’ particular, decidindo unilateralmente quem são as ‘partes interessadas’ e quais não o são.”

A construção dessa moralidade minerária está em todos os guias, com destaque para o guia do Ibram, que apresenta um nível prescritivo ainda maior. Com 142 páginas, este guia apresenta conceitos que vão desde aqueles tradicionalmente utilizados pelo setor corporativo, tal como, “stakeholders”, passando pela incorporação de conceitos típicos de movimentos sociais tal como, “engajamento”, até a incorporação de debates acadêmicos sobre direitos humanos. O conteúdo do guia configura-se como uma resposta articulada aos principais confrontadores da mineração: mobilizações em rede que agregam comunidades atingidas, movimentos sociais, atores da sociedade civil e pesquisadores.

Os guias e manuais corporativos para o “relacionamento com comunidades” são fruto de uma perspectiva autoritária, e, portanto, antidemocrática, sobre os conflitos ambientais, que tenta impedir o debate sobre a grande desigualdade ambiental presente nos territórios minerados, obstruindo a efetivação dos direitos dos grupos sociais afetados.

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  • 1
    A realização deste artigo foi parcialmente subsidiada por Bolsa produtividade do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Taxa de Pesquisa da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes).
  • 2
    No que se refere especificamente ao setor mineral, a constante alta dos preços dos minérios aconteceu no período de 2002 a 2011, e o declínio dos preços, pós-boom, iniciou-se a partir de 2012.
  • 3
    Para o estudo global de 2020 foram entrevistados mais de 250 executivos do setor, em sua maioria seniores (EY, 2020EY. ERNST & YOUNG. Top 10 business risks facing mining and metals in 2019-20. Disponível em: https://assets.ey.com/content/dam/ey-sites/ey-com/en_gl/topics/mining-metals/mining-metals-pdfs/ey-top-10-business-risks-facing-mining-and-metals-in-2019-20_v2.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
    https://assets.ey.com/content/dam/ey-sit...
    ).
  • 4
    “O estudo brasileiro não envolveu uma pesquisa quantitativa como a realizada para o global, mas uma análise qualitativa a partir de entrevistas concedidas por executivos seniores do setor, combinadas ao conhecimento dos profissionais da EY e do Ibram sobre a situação e perspectivas da Mineração no país” (EY, 2021EY. ERNST & YOUNG; IBRAM. INSTITUTO BRASILEIRO DE MINERAÇÃO. Riscos e Oportunidades de Negócios em Mineração e Metais no Brasil. 2021. Disponível em: https://www.ey.com/pt_br/mining-metals/riscos-e-oportunidades-em-mineracao-e-metais-no-brasil. Acesso em: 07 set. 2023.
    https://www.ey.com/pt_br/mining-metals/r...
    , p. 5).
  • 5
    A KPMG é uma rede de firmas independentes que oferecem serviços de consultoria e auditoria para empresas, governos e organizações não-governamentais. Está presente em 146 países. Ver: https://kpmg.com/br/pt/home/sobre-a-kpmg/visao-geral/history.html
  • 6
    Ver “Figura 1. Passos para iniciar uma mobilização social” (CNI, 2022CNI. CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA. Manual de relacionamento com comunidades em projetos de mineração. Brasília: CNI, 2022. Disponível em: https://www.portaldaindustria.com.br/publicacoes/2022/11/manual-de-relacionamento-com-comunidades-em-projetos-de-mineracao/.
    https://www.portaldaindustria.com.br/pub...
    , p. 12).
  • 7
    Ver “Figure 2: Indicators of community support and contextual factors” (ICMM, 2015ICMM. INTERNATIONAL COUNCIL ON MINING AND METALS. Understanding Company-Community Relations Toolkit. ICMM: London, UK, 2015. https://www.icmm.com/website/publications/pdfs/social-performance/2015/guidance_understanding-company-community-relations.pdf. Acesso em: 07 set. 2023.
    https://www.icmm.com/website/publication...
    , p. 16).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Mar 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    15 Maio 2023
  • Aceito
    05 Set 2023
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