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Construção sem urbano: a hipergestão da produção habitacional de empresas de capital aberto no Brasil

Construction without urban: hyper-management in housing production from public companies in Brazil

Resumo

Este artigo procura analisar estratégias de grandes empresas construtoras e incorporadoras de capital aberto na produção de habitação após a recessão econômica de 2014 no Brasil. Os resultados da pesquisa qualitativa multimétodos realizada revelam que essas estratégias se basearam em cálculos e instrumentos financeiros e colaboraram na consolidação de um campo de empresas que controla pontos díspares do setor da construção habitacional, de serviços financeiros à fabricação de componentes de obra. Tal ampliação de controle produtivo se deve ao que se denomina aqui de “hipergestão da produção”, que combina, em diferentes níveis, padronização, tecnologia gerencial, governança corporativa e arranjos políticos sobre formulação de normas técnicas e de programas públicos. A hipergestão se desvinculou não apenas de qualidades do urbano, como também do próprio espaço, e foi impulsionada pelo valor do dinheiro no tempo.

Palavras-chave:
Construção Civil; Habitação; Incorporadoras Imobiliárias; Empresas Construtoras; Gestão da Produção; Produção do Espaço Urbano

Abstract

This article seeks to analyze the strategies of large publicly traded construction and real estate development companies in housing production after the 2014 economic recession in Brazil. The results of a multi-method qualitative research reveal that these strategies were based on financial calculations and metrics and contributed to the consolidation of a field of companies that control disparate points of the housing construction sector, ranging from financial services to the manufacture of building components. This expansion of productive control is due to what we call “hyper-management of production”, which combines, at different levels, standardization, managerial technology, corporate governance, and political arrangements over the formulation of technical norms and public programs. Hyper-management has become detached not only from qualities of the urban but also from space itself and has been driven by the time value of money.

Keywords:
Construction; Housing; Real Estate Developers; Building Companies; Production Management; Production of Urban Space

Introdução

No início do século XXI, uma onda de estudos urbanos no Brasil teve como objeto as alterações nas estruturas de provisão do ambiente construído e identificou que foram estabelecidas relações inéditas entre construção, incorporação imobiliária, mercado financeiro e política habitacional, o que provocou elevação das atividades imobiliárias em todo o território nacional (FIX, 2011FIX, M. Financeirização e transformações recentes no circuito imobiliário no Brasil. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2011. Disponível em: http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/286383. Acesso em: 14 fev. 2020.
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; SHIMBO, 2012SHIMBO, L. Habitação social de mercado: A confluência entre Estado, empresas construtoras e capital financeiro. Belo Horizonte: C/Arte, 2012.; SANFELICI, 2013SANFELICI, D. A metrópole sob o ritmo das finanças: implicações socioespaciais da expansão imobiliária no Brasil. 2013. Tese (Doutorado), Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013. Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8136/tde-07012014-093205/. Acesso em: 14 fev. 2020.
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; RUFINO, 2016RUFINO, B. Incorporação da Metrópole: transformações na produção imobiliária e do espaço na Fortaleza do século XXI. São Paulo: Annablume , 2016.). Essas pesquisas resgataram a centralidade da dimensão da produção do ambiente construído (conhecido internacionalmente pelo termo em inglês supply-side accounts) e sua estreita relação com o espaço urbano. Ermínia Maricato (2009MARICATO, E. Por um novo enfoque teórico na pesquisa sobre habitação. Cadernos metrópole, n. 21, p. 33-52, 2009. ) já destacava que esse enfoque teórico era necessário diante da predominância, no debate brasileiro, das abordagens sobre o consumo, principalmente, da habitação, as quais procuravam dimensionar e qualificar a demanda, privilegiando, por isso, o papel do Estado no atendimento das necessidades habitacionais.

Os processos produtivos da construção foram objeto de uma importante literatura acadêmica brasileira entre 1960 e 1980, que levou para o campo dos estudos urbanos a realidade observada nos programas habitacionais do Banco Nacional da Habitação (BNH). Para esse debate, os temas do subdesenvolvimento e urbanização se cruzavam no canteiro de obras e a observação da atuação das empresas construtoras permitia mapear as relações entre os agentes da produção do espaço nas cidades brasileiras.

Pereira et al. (1991PEREIRA, P. C. X.; OSEKI, J. H.; MAUTNER, Y.; MARICATO, E. Bibliografia sobre a indústria da construção: reflexão crítica. Sinopses, São Paulo, vol. 16, , p. 36-45, 1991.) identificaram duas tendências principais nos estudos que tratavam da indústria da construção no Brasil até os anos 1980. A primeira foi denominada sugestivamente de “o urbano sem construção”, que analisava o processo de urbanização, polarizado entre autoconstrução e incorporação imobiliária, sem mencionar a atividade da construção. A segunda tendência, chamada de “a indústria sem construção”, se referia às pesquisas com enfoque tecnológico que procuravam definir o lugar da construção civil no desenvolvimento econômico e tratar das questões relacionadas à produtividade do setor, sem abordar a construção e o urbano (PEREIRA et al., 1991PEREIRA, P. C. X.; OSEKI, J. H.; MAUTNER, Y.; MARICATO, E. Bibliografia sobre a indústria da construção: reflexão crítica. Sinopses, São Paulo, vol. 16, , p. 36-45, 1991.).

As duas tendências permaneceram presentes quarenta anos depois dessa revisão, com algumas novidades. A crise financeira internacional de 2008 inaugurou um período marcado por grandes oscilações na economia e no setor da construção civil. Num primeiro momento, o caráter anticíclico da capitalização das empresas de construção e do programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV) garantiu variações positivas do PIB da construção. A onda de estudos dos anos 2000 analisou esse momento e procurou, em alguma medida, estabelecer as relações da “construção com o urbano” e, ainda, articular as dinâmicas imobiliárias e habitacionais no país aos processos mais globais de financeirização. Após a recessão econômica de 2014, deflagrou-se um segundo momento em que as variações passaram a ser negativas, causando um declínio das atividades do setor até 2018 (IBGE, 2019)IBGE. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa Anual da Indústria da Construção - 2018. Rio de Janeiro: IBGE, 2019..

Este artigo aborda as novas estratégias e práticas de grandes empresas construtoras e incorporadoras de capital aberto nesse segundo momento, caracterizado inicialmente como de crise no setor da construção. Os resultados de uma pesquisa qualitativa desenvolvida nessas empresas, durante 2017 e 2019, revelam que essas novas estratégias se basearam exclusivamente em critérios e indicadores financeiros, sem considerar aspectos relacionados à questão urbana no que diz respeito à qualidade urbanística e arquitetônica. Trata-se, portanto, da “construção sem urbano”, como está no título do artigo, no sentido dos efeitos imediatos desse tipo de produção no espaço urbano, mas que requisita tanto um olhar analítico que articule a “construção com o urbano” quanto uma produção que considere a inserção urbana de seus edifícios, continuando o jogo de palavras que sintetiza um necessário par teórico-empírico.

Nesse momento pós-2014, grande parte dessas empresas aumentou seu endividamento no mercado de capitais, diminuiu significativamente seus investimentos e perdeu seu valor de mercado (MIOTO; PENHA FILHO, 2019MIOTO, B.; PENHA FILHO, C. Crise econômica e o setor imobiliário no Brasil: um olhar a partir da dinâmica das maiores empresas de capital aberto (Cyrela, PDG, Gafisa e MRV). In: SHIMBO, L.; RUFINO, B. (Orgs.) Financeirização e estudos urbanos na América Latina. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2019, p. 29-59.). Se no primeiro momento foi coproduzida uma convenção centrada no crescimento rápido entre profissionais dos setores imobiliário e financeiro (SANFELICI; HALBERT, 2016SANFELICI, D.; HALBERT, L. Financial markets, developers and the geographies of housing in Brazil: A supply-side account. Urban Studies, v. 53, n. 7, p. 1465-1485, 2016.), no segundo momento, as grandes empresas construtoras e incorporadoras de capital aberto que sobreviveram à crise promoveram estratégias que consolidaram o seu campo, tornando-o ainda mais concentrado.

O argumento deste artigo é que esse campo se consolidou graças à implementação do que se denomina aqui de “hipergestão da produção”. Trata-se de uma ampliação de controle produtivo promovida pelas empresas de construção e incorporadoras de capital aberto sobre pontos díspares do setor da construção no Brasil, atingindo, por exemplo, empresas subcontratadas e o setor de fabricação de componentes de obra e alterando suas próprias estruturas organizacionais e corporativas. Nesse nível interno às empresas, é notável a influência da regulação da governança corporativa das companhias de capital aberto e dos instrumentos de avaliação provenientes do mundo das finanças. A hipergestão da produção combina padronização produtiva, tecnologia gerencial sobre subcontratações, arranjos organizacionais da governança corporativa, oriunda do capital financeiro, e arranjos políticos sobre formulação de normas técnicas e de programas públicos.

Ela abrange, portanto, três diferentes dimensões - tecnológica, regulatória e financeira - em distintos níveis de controle: internamente à empresa (nível corporativo); externamente à empresa, a partir de um gerenciamento vertical de empresas de portes distintos de sua cadeia de serviços e de insumos (nível gerencial) e entre as empresas do próprio campo, numa articulação horizontal entre elas e também com o Estado (nível setorial).

O desenvolvimento deste argumento tem três partes principais, além desta introdução e das considerações finais. Na primeira, são analisadas as abordagens analíticas sobre a construção habitacional no Brasil. Os métodos da pesquisa são descritos na segunda parte, que também apresenta alguns dados sucintos das empresas pesquisadas. Na terceira, são analisados os diferentes níveis de controle da hipergestão da produção na construção da habitação.

2. Três abordagens sobre a construção habitacional brasileira

Desde os anos 2000, as empresas da construção e da incorporação imobiliária são mobilizadas por ao menos três literaturas nacionais, com matrizes teóricas distintas, que usualmente não dialogam entre si: pela crítica à economia política no campo da arquitetura e do urbanismo; pela abordagem da gestão da produção na engenharia civil; pelos estudos urbanos que trataram dos processos de financeirização. O cotejamento entre essas três abordagens é fundamental para a compreensão das relações entre os agentes da produção imobiliária, com seus vínculos com o mercado financeiro e o Estado, e de seus efeitos sobre o espaço urbano. Essa visão ampliada permite discutir o conjunto Construção-Imobiliário-Financeiro-Urbano.

2.1 A construção como manufatura pela crítica da economia política

A referência inicial, e até hoje uma das mais importantes no campo da arquitetura, é a obra de Sérgio Ferro, em especial os estudos desenvolvidos nos anos 1960 e 1970 “A produção da casa no Brasil” (FERRO, 2006FERRO, S. A produção da casa no Brasil. In: FERRO, S. Arquitetura e trabalho livre. São Paulo: Cosac Naify, 2006 [1969], p. 61-104. [1969]) e “O canteiro e o desenho” (FERRO, 2006 [1976]FERRO, S. O canteiro e o desenho. In: FERRO, S. Arquitetura e trabalho livre . São Paulo: Cosac Naify , 2006 [1976], p. 105-202.). Para Sérgio Ferro (2006 [2003]FERRO, S. Sobre o canteiro e o desenho. In: FERRO, S. Arquitetura e trabalho livre . São Paulo: Cosac Naify , 2006 [2003], p. 321-418.), a manufatura é mantida nos canteiros de obras por uma ação deliberada de gestores para aumentar a taxa de lucro ao diminuir o investimento de capital, comprimindo salários e imobilizando o mínimo de valor possível em ferramentas manuais e insumos básicos de construção. Na manufatura da construção, o capital entra sob a forma técnica do trabalho de unificação de tarefas, cuja base é o projeto. Este é ainda mais externo ao trabalhador do que a gerência científica na indústria, por ser realizado fora do ambiente de produção (no caso, o canteiro), e é ainda mais arcaico, por depender de uma sequência lógica de produção que uma suposta gerência não pode controlar de modo preciso: há intercorrências climáticas, grande dependência na força produtiva dos trabalhadores, uma mecanização não abrange todo o processo produtivo etc.

As pesquisas de Nilton Vargas (1983VARGAS, N. Racionalidade e não-racionalização: o caso da construção habitacional. In: FLEURY, A.; VARGAS, N. Organização do trabalho: uma abordagem interdisciplinar, sete casos brasileiros para estudo. São Paulo: Atlas , 1983, p. 195-219. ), iniciadas no fim dos anos 1970, demonstram que, “não obstante a ciência se faça presente na atividade de projeto e os indícios de produtos industrializados marquem os meios de produção, o trabalho é ainda sedimentado sobre uma base estrutural da manufatura” (p. 199). A centralidade da manufatura na construção habitacional persiste no estudo sociológico de Marta Farah (1996FARAH, M. Processo de trabalho na construção habitacional: tradição e mudança. São Paulo: Annablume , 1996.). A autora descreve o anacronismo da manufatura na construção habitacional, em que o uso tolerado e conveniente da habilidade do trabalhador tradicional ocorre mesmo com a introdução de novos sistemas construtivos, a intensificação de produtos industrializados e o aprimoramento dos sistemas de gestão da produção pelas empresas construtoras nos anos 1980-1990.

Com a elevação das atividades imobiliárias no Brasil a partir de 2006, o programa MCMV e a abertura de capital de grandes construtoras e incorporadoras colocaram a construção em um outro patamar produtivo. Houve construção habitacional em escala num intervalo curto de tempo: foram contratadas aproximadamente 5,5 milhões de unidades habitacionais em 10 anos, entre 2009 e 2018, num ritmo de produção muito mais intenso do que no período do BNH.

Essa produção passa a ser objeto de análise privilegiado em duas tendências destacadas aqui. A primeira segue a filiação na arquitetura e se volta às estratégias das construtoras e à base tecnológica dessa produção. A segunda, a ser tratada mais adiante, enfatiza as articulações entre finanças e Estado nos estudos sobre financeirização. Ambas fomentaram a onda de estudos sobre construção, incorporação imobiliária, mercado financeiro e política habitacional nos anos 2000.

Três teses de doutorado defendidas no campo da arquitetura e do urbanismo abordam os processos produtivos que se estabeleceram nos canteiros das grandes empresas no MCMV (SHIMBO, 2012SHIMBO, L. Habitação social de mercado: A confluência entre Estado, empresas construtoras e capital financeiro. Belo Horizonte: C/Arte, 2012.; MOURA, 2011MOURA, A. Novas soluções, velhas contradições: a dinâmica cíclica da industrialização em sua forma canteiro. 2011. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Unversidade de São Paulo, São Paulo, 2011. doi 10.11606/D.16.2011.tde-02022012-104829.
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; BARAVELLI, 2017BARAVELLI, J. Trabalho e tecnologia no programa MCMV. São Paulo: Annablume, 2017. ). Identificam, contudo, que a chave da manufatura, para o caso, não dava mais conta dos processos mobilizados pelas empresas. A exacerbação do controle e da especialização do trabalho, com avanços nos sistemas de gestão da produção, aproximava o setor da construção a uma matriz industrial de organização do trabalho. As respostas das construtoras já observadas nos anos 1990 se tornaram ainda mais intensas e sofisticadas com a difusão do sistema construtivo da alvenaria estrutural no MCMV: racionalização, subcontratação de empresas menores e introdução de componentes industrializados e pré-fabricados.

2.2 Industrialização da construção e gestão da produção na engenharia civil

Em diversos momentos históricos, o debate acadêmico e as políticas públicas apontaram a necessidade de promover a “industrialização da construção”. Esse conceito surgiu no contexto europeu do pós-guerra, seguindo o argumento de que o desenvolvimento da construção deveria acontecer sob o modelo da grande organização fabril, com referência à indústria metal-mecânica, para atender a demanda da produção da habitação em escala. Desde então, diferentes definições de industrialização da construção foram apresentadas, em grande parte, articuladas à introdução de tecnologias de construção que envolviam a mecanização (BLACHÈRE, 1988BLACHÈRE, G. Building principles. Working paper, Report EUR, 11320. EN, Luxembourg, 1988.; SARJA; HANNUS, 1995SARJA, A.; HANNUS, M. Modular systematics for the industrialized building. VTT Technical Research Centre of Finland, 1995.; GANN, 1996GANN, D. Construction as a manufacturing process? Similarities and differences between industrialized housing and car production in Japan. Construction Management & Economics. v. 14, n. 5, p. 437-450, 1996. doi 10.1080/014461996373304.
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; SEBESTEYÈN, 1998SEBESTEYÈN, G. Construction: craft to industry. London, New York: E&FN Spon, 1998.).

Na América Latina, a dificuldade de se implementar a mecanização da produção, como preconizava tal conceito, gerou a necessidade de se adjetivar a industrialização do setor: “inconclusa”, “aberta” ou “sutil” (PANAIA, 2004PANAIA, M. El sector de la construcción: un proceso de industrialización inconcluso. Buenos Aires: Nobuko Sa, 2004.; SALAS, 2008SALAS, J. De los sistemas de prefabricación cerrada a la industrialización sutil de la edificación. Informes de la Construcción, Madrid, v. 60, n. 512, 2008, p. 19-34.). No Brasil, uma tendência dos estudos dos anos 1970 e 1980 partia do pressuposto de que se tratava de um setor atrasado diante de outros setores econômicos, na medida em que sua fonte de ganhos era proveniente de uma dimensão não produtiva (as rendas fundiárias e imobiliárias) e em que desempenhava a importante função de absorvedor de mão de obra excedente e migrante durante as crises cíclicas da economia brasileira (VARGAS, 1983VARGAS, N. Racionalidade e não-racionalização: o caso da construção habitacional. In: FLEURY, A.; VARGAS, N. Organização do trabalho: uma abordagem interdisciplinar, sete casos brasileiros para estudo. São Paulo: Atlas , 1983, p. 195-219. ; BRUNA, 2002BRUNA, P. Arquitetura, Industrialização e Desenvolvimento. 2ª ed. São Paulo: Perspectiva, 2002 [1976]. [1976]). Entretanto, as abordagens da gestão da produção e da engenharia civil no final da década de 1980 não partiam desse pressuposto e apontavam que a industrialização na construção civil não abarcava obrigatoriamente alterações nos processos construtivos com grandes saltos tecnológicos, pois se trata de um processo contínuo de organização da atividade produtiva (SABBATINI, 1998SABBATINI, F. A industrialização e o processo de produção de vedações. In: BARROS, M.; SABBATINI, F.; MEDEIROS, J. (Org.) Seminário de tecnologia e gestão na produção de edifícios. São Paulo: EP/USP, 1998, p. 52-67.). Nessa concepção, a industrialização da construção é um processo evolutivo que busca incrementar a produtividade e aprimorar o desempenho da atividade construtiva por meio de ações organizacionais e da implementação de métodos e técnicas de planejamento e controle (SABBATINI, 1989SABBATINI, F. Desenvolvimento de métodos, processos e sistemas construtivos. 1989. Tese de Doutorado. São Paulo: EP/USP, 1989.).

Uma grande parte desse debate se centrou na “racionalização da construção” e nas inovações tecnológicas na gestão de obras (BARROS, 1996BARROS, M. Metodologia para implantação de tecnologias construtivas racionalizadas na produção de edifícios. 1996. Tese de doutorado. São Paulo: EP/USP, 1996.; SOUZA, 2006SOUZA, U. Como aumentar a eficiência da mão-de-obra. São Paulo: Pini, 2006.), que visava ampliar a produtividade, reduzir custos, garantir qualidade, por meio do domínio dos processos de trabalho da construção, ao invés da “industrialização” (VILLELA, 2007VILLELA, F. Industria da construção civil e reestruturação produtiva: novas tecnologias e modos de socialização construindo o intelecto coletivo. 2007. Tese (Doutorado) - Unicamp, Campinas, 2007.). As construtoras seriam “muito mais gerenciadoras e integradoras de sistemas construtivos do que ‘fazedoras’ de obras” (CEOTTO, 2005CEOTTO, L. A industrialização da construção de edifícios: de passado letárgico para um futuro promissor. In: FARIA, C. (Org.) Inovação na construção civil. São Paulo: Instituto Uniemp, p. 85-106, 2005., p. 100). Portanto, mais do que uma simples organizadora eficiente da produção, as incorporadoras e construtoras passaram a ser grandes “gerenciadoras” e “integradoras de sistemas complexos” (SABBATINI, 1998SABBATINI, F. A industrialização e o processo de produção de vedações. In: BARROS, M.; SABBATINI, F.; MEDEIROS, J. (Org.) Seminário de tecnologia e gestão na produção de edifícios. São Paulo: EP/USP, 1998, p. 52-67.).

A abordagem das atividades da construção como fluxos de processos produtivos integrados está presente nos mais recentes estudos da gestão de produção. Tecnologias gerenciais oriundas do controle ampliado de qualidade na indústria se incorporam em proposições avançadas de organização de processos construtivos, como a lean construction ou construção enxuta, baseada na produção just in time toyotista (KOSKELA, 1992KOSKELA, L. Application of the new production philosophy to construction. Palo Alto: Stanford/CIFE, 1992. ). São marcos internacionais da difusão da gestão de produção que buscam transformar o canteiro de obras, mais do que interpretá-lo.

2.3 A construção/incorporação nos processos de financeirização urbana

Sem dialogar com a discussão sobre construção enxuta, a segunda tendência na onda de estudos urbanos dos anos 2000 se dedicou ao entrelaçamento efetivo dos circuitos de valorização imobiliária com a dinâmica do mercado de capitais (SANFELICI, 2013SANFELICI, D. A metrópole sob o ritmo das finanças: implicações socioespaciais da expansão imobiliária no Brasil. 2013. Tese (Doutorado), Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013. Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8136/tde-07012014-093205/. Acesso em: 14 fev. 2020.
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). Embora a importância do financiamento para a incorporação imobiliária já tivesse sido apontada por Topalov (1974TOPALOV, C. Les promoteurs immobiliers: contribution à l’analyse de la production capitaliste du logement en France. Paris: Éditions de l’École des hautes études en sciences sociales, 1974.) nos anos 1970, as estruturas, os agentes e os instrumentos do financiamento e as formas de propriedade se transformaram apenas a partir dos anos 1990. Os estudos sobre financeirização urbana ou financeirização da cidade, que proliferaram nos anos 2000, procuraram analisar essas alterações, as quais se inseriram no contexto global do alcance das operações das finanças em configurações materiais e sociais particulares (MEZZADRA; NIELSEN, 2015MEZZADRA, S.; NEILSON, B. Operations of Capital. The South Atlantic Quarterly. Durham, v. 114, n. 1, p. 1-9, 2015. doi 10.1215/00382876-2831246.
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) e da disseminação da lógica financeira fora de sua “jaula de ferro” (iron cage, o mercado financeiro em si) para outros tipos de trabalho (BOUSSARD, 2017BOUSSARD, V. Finance at Work. London, New York: Routledge, 2017.). Nesse sentido, a hipótese sociológica da colonização de instituições públicas e privadas por instrumentos financeiros se verifica em diferentes setores e países (CHIAPELLO, 2015CHIAPELLO, E. Financialization of Valuation. Human Studies. 38 (1), p. 13-35. Berlin: Springer, 2015.).

No setor imobiliário brasileiro, a “industrialização dos modelos de negócios de incorporadores” era um dos aspectos que possibilitava a parceria entre atores financeiros e incorporadoras na primeira década dos anos 2000 (SANFELICI; HALBERT, 2016SANFELICI, D.; HALBERT, L. Financial markets, developers and the geographies of housing in Brazil: A supply-side account. Urban Studies, v. 53, n. 7, p. 1465-1485, 2016.). Essa parceria, por sua vez, teve efeitos transformadores na indústria de incorporação, promovendo uma “reestruturação imobiliária” (PEREIRA, 2017PEREIRA, P. C. X. Finanças e imobiliário: o “novo” moinho satânico globalizado. In: II Congreso Latinoamericano de Teoría Social y Teoría Política: Horizontes y dilemas del pensamiento contemporáneo en el sur global, 2017, Buenos Aires. Anais […]. Buenos Aires: UBA, 2017.).

A internacionalização do mercado imobiliário brasileiro ainda foi incipiente e restrita frente à abrangência das políticas de estabilidade monetária, abertura econômica, privatizações e desregulamentações que inseriram o Brasil na mundialização financeira (FIX, 2011FIX, M. Financeirização e transformações recentes no circuito imobiliário no Brasil. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2011. Disponível em: http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/286383. Acesso em: 14 fev. 2020.
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). Uma transformação mais profunda só se consolidou a partir de 2005, quando praticamente todas as grandes empresas imobiliárias passaram a atuar no “segmento econômico” da habitação, que depois passou a corresponder às Faixas 2 e 3 do MCMV (SHIMBO, 2012SHIMBO, L. Habitação social de mercado: A confluência entre Estado, empresas construtoras e capital financeiro. Belo Horizonte: C/Arte, 2012.).

O acesso ao capital financeiro, por meio de fundos de private equity e de Oferta Pública de Ações (OPAs), permitiu a horizontalização entre empresas de incorporação (por meio de aquisições e parcerias no setor) e a centralização de capital em grandes incorporadores, sustentando também a concentração da atividade imobiliária em áreas metropolitanas (RUFINO, 2016RUFINO, B. Incorporação da Metrópole: transformações na produção imobiliária e do espaço na Fortaleza do século XXI. São Paulo: Annablume , 2016.). Tal parceria alterou a governança e a organização dos negócios ao estabelecer uma clara distinção entre proprietários e gerentes, principalmente oriundos do setor financeiro (SANFELICI; HALBERT, 2016SANFELICI, D.; HALBERT, L. Financial markets, developers and the geographies of housing in Brazil: A supply-side account. Urban Studies, v. 53, n. 7, p. 1465-1485, 2016.).

A novidade trazida por grande parte dessas pesquisas é a perspectiva de articular os circuitos de financiamento (finanças), a produção em si e seus efeitos territoriais. Isso alimentou a discussão sobre a financeirização da produção urbana e suas consequências para o agravamento das desigualdades socioespaciais das cidades brasileiras (ROLNIK, 2015ROLNIK, R. Guerra dos lugares: a colonização da terra e da moradia na era das finanças. São Paulo: Boitempo, 2015.).

A recessão econômica que assolou o Brasil a partir de 2014 provocou retração da produção imobiliária, principalmente residencial, e também aumento dos distratos de financiamentos habitacionais. A dependência com os fundos públicos e semipúblicos se mostrou ainda mais pertinente, tendo em vista que as incorporadoras que se especializaram no MCMV apresentaram maior sucesso (MIOTO; PENHA FILHO, 2019MIOTO, B.; PENHA FILHO, C. Crise econômica e o setor imobiliário no Brasil: um olhar a partir da dinâmica das maiores empresas de capital aberto (Cyrela, PDG, Gafisa e MRV). In: SHIMBO, L.; RUFINO, B. (Orgs.) Financeirização e estudos urbanos na América Latina. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2019, p. 29-59.). Além disso, essas empresas passaram a adotar outras estratégias de capitalização, como a securitização de dívidas (MELAZZO et al., 2021MELAZZO, E.; ABREU, M.; BARCELLA, B.; FERREIRA, J. Securitização da habitação e Financeirização da cidade no Brasil. Mercator, Fortaleza, v. 20, ed. 20029, 2021 doi 10.4215/rm2021.e20029, p. 1-15
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).

3. Métodos de pesquisa

No bojo dos estudos pós-2014, este artigo apresenta os resultados de uma pesquisa qualitativa multimétodos realizada com incorporadoras imobiliárias e construtoras cotadas na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Os critérios de seleção das empresas estudadas foram: i) porte; ii) vínculo com o mercado financeiro; iii) articulação política com empresas do setor; iv) atuação geográfica.

Em relação ao primeiro critério, foram escolhidas empresas consideradas como “grandes”, ou seja, empresas com 30 ou mais pessoas ocupadas, que abrangiam no Brasil, em 2018, um universo de 4.626 empresas ativas no grupo econômico “construção de edifícios” (IBGE, 2019IBGE. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa Anual da Indústria da Construção - 2018. Rio de Janeiro: IBGE, 2019.). O segundo critério se refere às incorporadoras que integram o segmento “incorporações” na Bovespa, que totalizavam 20 empresas em 2019. O terceiro se relaciona à inserção dessas empresas no Comitê Técnico da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (ABRAINC), reduzindo-se o número anterior de 20 para 11 empresas - esse critério se justificou tanto pela articulação setorial quanto pela arena privilegiada ali constituída com informantes potenciais para a pesquisa. O quarto e último critério privilegiou a atuação das empresas no estado de São Paulo (capital e interior), para possibilitar a execução da pesquisa de campo.

Entre as empresas que se enquadraram em todos esses critérios, oito permitiram o desenvolvimento da pesquisa de campo, que ocorreu entre 2017 e 2019, envolvendo realização de 12 entrevistas semiestruturadas com seus gestores (majoritariamente, diretores de operações ou diretores de produção) e observação e visitas técnicas a 16 canteiros de obras. Também foi feita uma pesquisa documental, a partir de informações financeiras presentes nos formulários de referência e nos relatórios trimestrais e anuais operacionais e financeiros disponíveis nos sites das incorporadoras (trata-se de documentos obrigatórios para companhias de capital aberto). Em complemento, conduziu-se análise das bases de dados de algumas pesquisas setoriais, por exemplo, a Pesquisa Anual da Indústria da Construção, PAIC (IBGE, 2019IBGE. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa Anual da Indústria da Construção - 2018. Rio de Janeiro: IBGE, 2019.).

Essa abordagem qualitativa permitiu, a princípio, identificar as narrativas dos diretores das incorporadoras imobiliárias. Em seguida, foram visitados os canteiros de obras com observação do trabalho diário e das condições tecnológicas da produção. A junção entre as narrativas dos diretores e a observação das práticas nos canteiros de obras possibilitou, por sua vez, o entendimento de como se operava a hipergestão da produção. Vale destacar que a pesquisa de campo foi realizada nas grandes incorporadoras e construtoras que produziam habitação (para baixa, média e alta renda) e que permitiram as entrevistas e o acesso dos pesquisadores. Nesse sentido, a pesquisa não tentou contabilizar todas as incorporadoras imobiliárias listadas publicamente, tampouco caracterizar o setor de maneira uniforme.

Após a pesquisa de campo, dois grupos foram identificados: i) três empresas que atuam com foco exclusivo em empreendimentos residenciais populares (conforme denominação das próprias empresas); ii) cinco empresas que atuam em empreendimentos residenciais dos segmentos médio, médio-alto e alto, bem como em empreendimentos comerciais, sendo que uma delas também atua no segmento popular por meio de uma filial e de uma joint venture com outra empresa. As Tabelas 1 e 2 apresentam as principais características dos dois grupos.

Tabela 1
Empresas construtoras pesquisadas que atuam no segmento popular (2018)
Tabela 2
Empresas construtoras pesquisadas que atuam no segmento médio/alto (2018)

4. Hipergestão da produção da habitação

Os resultados da pesquisa qualitativa multimétodos permitiram identificar que as alterações na produção das construtoras e incorporadoras de habitação de capital aberto se diferenciam por níveis de controle exercidos sobre suas respectivas atividades produtivas e demais empresas a elas relacionadas. Tais níveis podem ser diferenciados pelo controle que a empresa exerce: 1) sobre si mesma, 2) sobre empresas de suas cadeias de fornecedores de serviços, 3) sobre empresas que compartilham interesses setoriais e de mercado.

Antes de descrever cada um desses níveis, é importante explicar porque dizem respeito ao “controle” sobre produção por parte da empresa construtora. Para além de o termo ser usado por diversos entrevistados (que mencionavam, por exemplo, que alguma atividade produtiva “passou a ser controlada” ou “teve controle ampliado”), ele evidencia uma relação de poder econômico exercido pela direção empresarial tanto no interior quanto no exterior de sua organização.

No interior da organização empresarial, é um controle que se manifesta na capacidade básica de admitir, demitir ou deslocar trabalhadores empregados pela empresa, subjacente a qualquer decisão mais complexa para alterar organogramas ou redirecionar produção. No exterior da organização empresarial, é um controle que se manifesta na capacidade discricionária de comprar insumos e serviços ou na participação ativa em etapas de elaboração de normas técnicas e de regulação de programas governamentais. Enquanto o poder de compra é um controle externo proporcional ao capital de uma empresa específica, a influência sobre normas técnicas e portarias governamentais na área de habitação é um controle externo proporcional ao capital de um conjunto de empresas com atuação setorial coordenada.

O quadro geral dessas relações sociais e de poder no campo da construção habitacional é de um domínio empresarial com base em indicadores financeirizados combinados a tecnologias de gestão de produção. Esse domínio se formou entre as empresas de capital aberto durante ciclos recentes de expansão e retração econômica no Brasil.

Serão apresentadas a seguir as práticas e os instrumentos adotados em cada nível de controle empresarial sobre processos produtivos, aqui denominados como corporativo (controle sobre a organização), gerencial (controle sobre a subcontratação de serviços de outras empresas) e setorial (controle por meio de normatização técnica e regulação de programas habitacionais).

4.1 Controle corporativo - integração entre construção e incorporação

Em entrevista, o diretor de produção de uma construtora que atua na habitação de alto padrão afirmou que a recessão de 2014 “obrigou a empresa a se tornar uma construtora de fato”, transferindo para o plano da produção a equivalência que existe na habilitação jurídica e tributária da empresa para realizar construção e incorporação. A equivalência produtiva indica que o domínio sobre os processos construtivos se integrou ao núcleo de atividades da organização, conforme o modelo da core-competence que orienta uma estratégia competitiva em ambiente de mercado (HAMEL; PRAHALAD, 1994HAMEL, G.; PRAHALAD, C. Competing for the future. Cambridge: Harvard Business School Press, 1994.; CARVALHO; LAURINDO, 2010CARVALHO, M.; LAURINDO, F. Estratégia Competitiva. São Paulo: Atlas, 2010.).

Num aparente paradoxo, o domínio sobre processos construtivos aprofunda a subcontratação de serviços em canteiro de obras, pois o núcleo organizacional se concentra em atividades de projeto, planejamento e gerenciamento de operações de construção que, por sua vez, serão realizadas por empresas especializadas. Essa é uma etapa organizacional da hipergestão que cumpre, assim, um ideal da literatura de gestão de produção, em que as maiores empresas construtoras “poderiam ter poucos profissionais [...] especializados em integração de sistemas, em projeto, em planejamento, na aplicação e gerenciamento de sistemas de qualidade e na administração de contratos” (CEOTTO, 2005CEOTTO, L. A industrialização da construção de edifícios: de passado letárgico para um futuro promissor. In: FARIA, C. (Org.) Inovação na construção civil. São Paulo: Instituto Uniemp, p. 85-106, 2005., p. 100).

A primeira marca do controle corporativo é a centralização, na direção da empresa, dos estudos técnicos e orçamentários que padronizam processos construtivos. Na expressão de gestão de produção, esses processos se tornam “serviços controlados”, a serem codificados por meio de Procedimento de Execução de Serviço (PES). A adoção centralizada de padrões construtivos, que vão da modulação de revestimentos cerâmicos até a implantação de redes de infraestrutura condominial, é um efeito do processo de capitalização do setor da construção brasileira que ocorre desde o início do século, principalmente entre empresas do segmento popular (SHIMBO, 2012SHIMBO, L. Habitação social de mercado: A confluência entre Estado, empresas construtoras e capital financeiro. Belo Horizonte: C/Arte, 2012.).

Um resultado imediato da padronização produtiva é a redução da autonomia dos profissionais responsáveis pela execução dos serviços no canteiro de obras. Um dos diretores entrevistados relata que a reestruturação corporativa, decorrente da sua alteração societária, retirou dos engenheiros-coordenadores de obras as funções de planejamento e controle da produção. Houve, portanto, a diminuição de diretorias (e de executivos) e a eliminação de “coisas que davam muita liberdade na ponta”, o que trouxe as “decisões pro escritório” (Depoimento de diretor de construtora do segmento médio-alto).

O enfrentamento da crise econômica de 2014 aprofundou o vínculo entre padrões de governança de empresas de capital aberto e padronização produtiva. Essa vinculação foi exemplar numa empresa de alto padrão, que montou um “comitê de crise” para “fazer com que a obra fosse de fato uma extensão da corporação e não fosse uma obra” (Depoimento do diretor de uma construtora do segmento médio-alto). O mesmo diretor descreve as operações e os instrumentos adotados para implementar um programa de qualidade e de gestão que viabilizou a extensão da corporação ao canteiro de obras:

Eu tinha vários painéis, eu tinha o Autodoc, que me dava autocontrole de documentos, eu tinha uma tabela em Excel, que me dava alguns outros indicadores técnicos, eu tinha o SAP, que me dava os indicadores financeiros. O que a gente fez? A gente fez um estudo e a gente desenvolveu um Power B, que é o Power Business, e aí a gente conseguiu fazer com que todas as obras tivessem um painel dos indicadores que o comitê técnico define on-line e direto [...]. Então isso fez com que a gente também aumentasse a velocidade da tomada de decisão [...]. Isso aumentou muito a velocidade da empresa em termos de relatório, em termos de ata de produção, em termos de análise de indicador. (Depoimento de diretor de construtora do segmento médio-alto)

Esse conjunto de instrumentos digitais e on-line integrou os processos de certificação de qualidade do produto, planejamento, custos e contratação de fornecedores. O aumento da velocidade da obra e da tomada de decisões passou a predominar entre os instrumentos de avaliação utilizados pelas empresas incorporadoras. A novidade foi que a categoria de custos de obras passou a ser medida pelo Valor Presente Líquido (VPL), ou seja, para além da aferição de custos passados (numa perspectiva da contabilidade convencional), há a projeção dos ganhos futuros (no caso, na relação entre entradas e saídas, contando com o pagamento de fornecedores a longo prazo). A atualização para o presente de ganhos futuros está na base de uma perspectiva financeirizada da avaliação (CHIAPELLO, 2020CHIAPELLO, E. Financialization as a socio-technical process. In: MADER, P.; MERTENS, D.; VAN DER ZWAN, N. The Routledge International Handbook of Financialization. London: Routledge, 2020, p. 1-11.).

Um aspecto fundamental da hipergestão da produção nesse nível de controle corporativo é justamente a adoção de instrumentos financeirizados de avaliação pela organização empresarial, que se integram aos princípios de transparência contábil das empresas de capital aberto. Durante o período de expansão imobiliária, já estavam presentes números que procuravam demonstrar a viabilidade da produção quanto à disponibilidade de terras (landbank), ao crescimento nos lançamentos (Valor Geral de Vendas - VGV) e ao capital acumulado (lucro operacional) (SANFELICI; HALBERT, 2016SANFELICI, D.; HALBERT, L. Financial markets, developers and the geographies of housing in Brazil: A supply-side account. Urban Studies, v. 53, n. 7, p. 1465-1485, 2016.). Depois da crise, passaram a dominar os números que medem um tipo de viabilidade diferente: a viabilidade da empresa e dos empreendimentos calculada a partir da premissa do “valor temporal do dinheiro” (time value of money) (WEBER, 2021WEBER, R. Embedding futurity in urban governance: Redevelopment schemes and the time value of money. Environment and Planning A: Economy and Space. v. 53, n. 3, 2021, p. 503-524. doi 10.1177/0308518X20936686
https://doi.org/10.1177/0308518X20936686...
). Dessa forma, indicadores de rentabilidade futura, como Valor Presente Líquido (VPL), Taxa Interna de Retorno (TIR), Retorno sobre o Patrimônio Líquido (ROE), foram adicionados aos indicadores de produção em canteiro de obras.

4.2 Controle gerencial - integração da subcontratação de serviços

O segundo nível de controle empresarial promove uma integração entre a estrutura corporativa e a construção do edifício por meio do aperfeiçoamento da gestão interna ao canteiro de obras - aperfeiçoamento que apareceu nas empresas estudadas como prioridade de investimento durante a recessão de 2014. Segundo um entrevistado, “na construção civil [...] ferramenta de gestão é sim diferencial competitivo” (Depoimento de gerente técnico de construtora do grupo de empreendimentos populares).

O foco das ferramentas de gestão é o controle da subcontratação de serviços especializados de construção. Com exceção de empreendimentos habitacionais que empregam sistemas construtivos fechados para produção de parede e laje em concreto de alta fluidez, tema que será discutido adiante, a subcontratação de serviços de execução de obras se universalizou em todas as empresas estudadas, principalmente nas atuantes em habitação no segmento de médio e alto padrão. Em obra, elas empregam diretamente apenas um pequeno efetivo de engenheiros, estagiários de engenharia, encarregados administrativos e, quando existentes, mestres de obras.

A subcontratação como estratégia de controle de custos é uma prática antiga na construção habitacional, em muitos casos, combinada com infrações trabalhistas. A recessão econômica iniciada em 2014, no entanto, submeteu a subcontratação a uma estratégia de controle de produção, como aparece no seguinte trecho de uma entrevista:

A crise viabilizou tecnologia para nós e viabilizou a racionalização da produção. Por quê? Porque as empresas subcontratadas têm baixa demanda e precisam girar. [...] Inverti a lógica [anterior à recessão]. Falei: “Pra vocês trabalharem aqui têm que pedir por favor e têm que se submeter à engenharia”. Aí fiz um controle de qualidade, tabelei o preço e fiz uma proposta pro pessoal. Isso começou a pegar mais força em 2014. (Depoimento de diretor de construtora do segmento médio-alto)

Uma vez que “as empresas subcontratadas têm baixa demanda e precisam girar”, o aumento da dependência econômica delas permite que a grande empresa construtora negocie não apenas preço e prazo do fornecimento de serviço, como também a alteração de seu padrão produtivo. A remuneração da empresa subcontratada, de forma análoga, passa a medir uma transformação tecnológica, que será aferida por Ficha de Verificação de Serviço (FVS), instrumento de pagamento que é, ao mesmo tempo, instrumento de verificação de conformidade técnica. A relação contratual impõe, portanto, um controle gerencial que o entrevistado designa como “racionalização da produção”.

A “racionalização da construção” é um ideal empresarial de décadas do setor da construção no Brasil, o qual se faz presente no canteiro de obras como um conjunto amplo de procedimentos de controle e gestão sobre o processo produtivo. Seu objetivo original na construção habitacional é a redução de resíduos e tempos ociosos, mas sua versão mais avançada integra sistemas de gestão de qualidade no planejamento, execução, verificação e correção de procedimentos de construção, garantidos por ciclos de certificação técnica (PICCHI, 1993PICCHI, F. Sistema da qualidade: uso em empresas de construção de edifícios. 1993. Tese de Doutorado. São Paulo: EP/PCC/USP, 1993.). Nesse sentido, ela constitui uma “tecnologia gerencial” que integra técnicas de construção de edifícios com pesquisa científica em economia e administração de empresas, sobretudo do campo da “teoria das organizações”. Diferentemente da tendência disruptiva de tecnologias oriundas da engenharia de materiais e de mecanização da produção, essa tecnologia gerencial é, em essência, incremental e seu sentido último não é revolucionar, mas sim otimizar processos produtivos (SABBATINI, 1989SABBATINI, F. Desenvolvimento de métodos, processos e sistemas construtivos. 1989. Tese de Doutorado. São Paulo: EP/USP, 1989., p. 54).

Entre as empresas do segmento popular, a relação de subcontratação implica a transferência de uma tecnologia que, em muitas entrevistas, é referida como “o DNA da empresa”. Essa transferência de informação tecnológica acontece por meio de programas de treinamento realizados pela empresa contratante de serviços especializados. Em caso extremo, a empresa subcontratada é gerada pela própria empresa contratante a fim de lhe oferecer serviços não apenas especializados, como também exclusivos. Tal prática é adotada pelas construtoras de capital aberto principalmente em serviços de instalação predial, os mais críticos para a fase de assistência técnica no “pós-obra”. É um caso híbrido de verticalização departamental com terceirização de serviços, uma vez que as instalações prediais são executadas por uma empresa juridicamente independente, mas que se especializa em procedimentos de obra padronizados pela empresa contratante e que tem, portanto, restrições para atuar livremente no mercado.

Quando a pequena empresa subcontratada se torna “parte do organismo” da empresa contratante, como destacou o diretor de uma construtora do segmento médio-alto, acontece o acoplamento entre suas produtividades, pois a hipergestão da produção passa a se aplicar ao longo de uma cadeia de serviços especializados de construção.

4.3 Controle setorial - Regulação de norma técnica e programas habitacionais

No nível de controle setorial, a alteração produtiva promovida pelas empresas estudadas ultrapassa cadeias de fornecimento de serviços e é compartilhada entre grandes empresas construtoras que integram organizações representativas do setor econômico da construção habitacional. É um nível de controle da hipergestão da produção presente nas diversas instâncias setoriais que elaboram e atualizam normas técnicas. Ele teve um impulso importante na vinculação do programa federal de habitação MCMV com o Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade do Habitat (PBPQ-H), condicionando, os financiamentos à adesão a programas governamentais de conformidade técnica. Dessa forma, a normatização técnica, que é em essência uma coerção de mercado sobre a produção de bens e serviços, se conecta a uma regulação estatal, que é também coerção de governo sobre o padrão tecnológico do setor da construção habitacional (BARAVELLI, 2017BARAVELLI, J. Trabalho e tecnologia no programa MCMV. São Paulo: Annablume, 2017. ).

Internacionalmente, a padronização de processos construtivos em nível setorial coincide com a normatização de sistemas do edifício e um crescente mercado de serviços especializados de construção (CEOTTO, 2005CEOTTO, L. A industrialização da construção de edifícios: de passado letárgico para um futuro promissor. In: FARIA, C. (Org.) Inovação na construção civil. São Paulo: Instituto Uniemp, p. 85-106, 2005.; SALAS, 2008SALAS, J. De los sistemas de prefabricación cerrada a la industrialización sutil de la edificación. Informes de la Construcción, Madrid, v. 60, n. 512, 2008, p. 19-34.). No Brasil, o foco do controle setorial está na relação entre grandes empresas construtoras e sua base de empresas fornecedoras de materiais e componentes do edifício, cuja produção e comercialização só podem ser afetadas por padronizações produtivas impostas ao conjunto do setor da construção habitacional. Todas as empresas pesquisadas tiveram participação relevante na elaboração de normas técnicas e regulamentos de programas habitacionais, não apenas por meio de comitês técnicos e grupos de trabalho na Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), mas também de atividades de lobby empresarial realizadas por associações como a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) e a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (ABRAINC).

Em particular, a lenta e negociada implantação da norma técnica de desempenho de edifícios habitacionais, a NBR 15575 (ABNT, 2013ABNT. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15.575-1: Edificações habitacionais - Desempenho - Parte 1: Requisitos gerais. Rio de Janeiro: ABNT, 2013.), foi decisiva para a consolidação da hipergestão da produção ao sistematizar, pela primeira vez no país, métodos de avaliação para mais de 200 requisitos de habitabilidade e conforto em edifícios habitacionais (com critérios rebaixados em relação a normas técnicas estrangeiras). Uma entrevistada atribuiu o avanço no controle de qualidade sobre processos produtivos ao início de exigibilidade da norma, em julho de 2013, avanço que, ao invés de abandonado, foi intensificado na posterior crise econômica:

A gente não pensou assim: “Ah, vamos deixar de fazer isso porque estamos em crise”. Pelo contrário, eu acho que a gente implementou controles, ensaios que a gente não fazia. [...] Alguns produtos a gente fez o mercado se adequar melhor, porque desde 2013 a gente cobra muito de fornecedores certificados [de desempenho]. (Depoimento de coordenadora de qualidade de construtora do segmento popular)

Mais que regulação de padrões produtivos, o ambiente normativo proporciona um incremento de colaborações empresariais, frequentemente denominadas nas entrevistas como “parcerias”. A “parceria” empresarial aparece como um campo de atividade comum entre construtor e fabricante, no qual o fornecimento de um insumo ou componente é acrescido na prestação de serviço de logística, estocagem, ensaios de desempenho e, no extremo, em sua própria execução ou instalação em obra. No caso de componentes leves, em particular esquadrias, o fornecimento do componente ocorre acompanhado de projeto e instalação, o que só é possível pela disseminação das normas técnicas e dos sistemas de qualidade e certificação. Algo similar aconteceu na negociação de uma empresa de médio-alto padrão para o fornecimento de chapas de gesso acartonado e perfil de chapa dobrada de aço, que passou a incluir a execução de paredes de vedação interna até o ponto de acabamento. Segundo o diretor de produção da empresa: “Eu não contrato mais a chapa de drywall e o cara que monta o drywall: eu contrato a Gypsum, que vai lá instalar a parede”.

É esclarecedor que, na relação com um fabricante de pequeno porte, um diretor de construtora do grupo médio-alto padrão tenha elevado a “parceria comercial” a uma “sociedade”: “Não quero mais que a fornecedora pequena seja minha parceira. Eu quero que seja minha sócia no negócio; eu quero que ela se responsabilize pelo sistema construtivo”. A “parceria”, com sua eventual intensificação numa “sociedade”, é uma alteração de produção na construção habitacional baseada numa repartição de riscos e de benefícios de sistemas da edificação com grau elevado de industrialização.

O nível setorial do esforço em alterar esses sistemas é exemplar no caso da tecnologia construtiva que se tornou predominante entre empresas construtoras de habitação para baixa renda: a concretagem in loco de parede e laje de edifícios em altura. No âmbito da regulação, o esforço resulta na elaboração de norma específica, publicada no auge de contratações do programa MCMV, em 2012, mas, no âmbito tecnológico, ele se efetiva pela ação conjunta entre empresas construtoras de capital aberto e institutos de pesquisa, usinas de concreto e, principalmente, fabricantes de sistemas de fôrmas de alumínio. Por ser um sistema construtivo de ciclo fechado e de longa permanência em canteiro de obras (correspondendo aos sistemas de estrutura e de vedação), ele torna produtiva a contratação direta da mão de obra para montagem de fôrma, armação e lançamento de concreto, como ocorre em empreendimentos visitados da empresa MRV Engenharia S.A.

Em visitas técnicas a canteiros de obras realizadas durante a pesquisa, o nível de controle em âmbito setorial aparece como condição superposta sobre os outros dois níveis - gerencial e corporativo - que formam, em conjunto, a hipergestão da produção. A Figura 1 ilustra esse conjunto.

Figura 1
Visitas técnicas

5. Considerações finais

A análise sobre os níveis de controle da hipergestão da produção de habitação nas grandes empresas construtoras e incorporadoras de capital aberto procura contribuir com o debate sobre a “construção com o urbano”, a partir de uma articulação necessária entre estudos urbanos, economia política da arquitetura e engenharia. Essa articulação, por sua vez, pode alimentar a discussão sobre políticas habitacionais.

As principais características da hipergestão podem ser agrupadas em três dimensões diferentes (tecnológica, regulatória e financeira) que estão presentes em cada um dos níveis de controle, conforme sintetizado na Tabela 3.

Tabela 3
Síntese das dimensões de controle da hipergestão da produção

O nível corporativo se refere a um controle interno da empresa sobre sua própria atividade e organização empresarial. Esse controle ocorre graças à padronização produtiva e segue os princípios da governança e da transparência corporativa, ancorados na separação entre acionistas e gestores e no domínio do valor do acionista (shareholder value) como traço distintivo dos processos de financeirização de empresas capitalistas (VAN DER ZWAN, 2014VAN DER ZWAN, N. Making sense of Financialization. Socio-Economic Review, v. 12, p. 99-129, 2014.). Ele promove também indicadores de avaliação que medem o valor do dinheiro no tempo, fazendo com que o canteiro se torne parte efetiva da corporação financeirizada. O conjunto dessas dimensões impacta no aumento da rotação de capital das empresas.

O nível gerencial estabelece o controle externo da empresa sobre suas subcontratadas. Ele exacerba os preceitos da gestão da produção por meio da realização de treinamento de trabalhadores e da aplicação dos sistemas de gestão da qualidade, além de condicionar pagamentos de serviços subcontratados à adoção da tecnologia da empresa contratante. Esse controle replica a organização produtiva dos canteiros de obras, a qual, no caso da habitação para baixa renda, aumenta a escala dos empreendimentos, sem permitir variação na arquitetura e no desenho urbano. O efeito desse controle é a homogeneização do espaço na escala das cidades.

O nível setorial diz respeito à natureza política das estratégias relacionadas à difusão de novas tecnologias construtivas, que abrangem sistemas construtivos em sua totalidade. Nele, acontece a parceria entre fabricante de materiais, fornecedores de equipamentos e incorporadora principal. Além disso, há a articulação entre as empresas do setor na definição de normas técnicas e de programas públicos de financiamento habitacional.

Uma vez instalados todos os níveis de controle da hipergestão da produção da habitação, ela se torna uma referência que afeta diretamente a formatação de programas habitacionais que priorizam a escala e a velocidade da produção. Trata-se de uma matriz de produção muito eficiente do ponto de vista do capital, que mobiliza diferentes subsetores da construção, do imobiliário e do financeiro - nela, as construtoras e incorporadoras ocupam lugar central. Essa centralidade impõe um desafio analítico para conectar a construção com o urbano e com a indústria, o que renova a validade da crítica realizada no final dos anos 1980 aos pontos cegos da literatura brasileira do “urbano sem construção” e da “indústria sem construção”. Portanto, pensar a produção e o financiamento da habitação hoje pressupõe enfrentar essa visão ampliada do setor da construção.

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  • Financiamento

    Artigo relacionado com o projeto de pesquisa Tecnologia das empresas de capital aberto na construção de habitação financiado pelo CNPq, na Chamada Universal 01/2016 - Faixa A, e coordenado pelos autores, com participação dos bolsistas de iniciação científica Giovanni Bussaglia (IAU-USP) e Debora Piacente (FAU-USP). Os autores agradecem a importante contribuição de ambos os bolsistas no desenvolvimento da pesquisa
  • 1
    “O MCMV se apresenta formalmente como um único programa habitacional, mas que se estrutura operacionalmente em duas modalidades distintas, de acordo com faixa de renda dos beneficiários, origem dos recursos e instituição proponente. A primeira corresponde à Faixa 1, contemplando as famílias de 0 a 3 salários-mínimos (SM). A segunda modalidade contempla as famílias entre 3 e 10 SMs, que se divide em Faixa 2 (3-6 SM) e Faixa 3 (6-10 SM). Posteriormente, a referência deixou de ser o salário-mínimo e passou a ter um valor fixo, ou seja, a primeira modalidade até R$ 1.600,00 de renda familiar mensal e a segunda, entre R$ 1.600,00 e R$ 5.000,00.” (SHIMBO, L. O concreto do capital: os promotores do valor imobiliário nas cidades brasileiras. 2020. Tese (Livre-Docência), Universidade de São Paulo, São Paulo, 2020. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/livredocencia/102/tde-15012021-130243/pt-br.php. Acesso em: 02 nov. 2022).
  • 2
    De acordo com Chiapello (2020)CHIAPELLO, E. Financialization as a socio-technical process. In: MADER, P.; MERTENS, D.; VAN DER ZWAN, N. The Routledge International Handbook of Financialization. London: Routledge, 2020, p. 1-11., há três abordagens de avaliação financeirizada: a convenção atuarial, na qual se utilizam taxas de desconto para calcular o valor presente; a convenção do valor-médio, que utiliza estimativas probabilísticas para cálculos de retorno e riscos; e a convenção dos preços de mercado.
  • 3
    Vale destacar que a ausência do mestre de obras em alguns canteiros de obras de empresas do segmento médio-alto revela a perda da centralidade do “saber fazer” do trabalhador da construção habitacional, tão emblemática nos estudos da construção dos anos 1980-1990.
  • 4
    Além das justificativas de maior controle sobre a produção, a contratação de mão de obra pela MRV foi incentivada pelo Termo de Ajuste de Conduta (TAC) assinado com o Ministério Público do Trabalho, por condições de trabalho análogas à escravidão em alguns empreendimentos da empresa. Essa relação de trabalho, no entanto, não é inerente à concretagem de parede e laje: os empreendimentos visitados de outra empresa que utiliza a tecnologia, a Direcional Engenharia S.A., subcontratam sua mão de obra na relação de “parceria” com fornecedor de serviço especializado.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Fev 2023
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    28 Maio 2022
  • Aceito
    01 Out 2022
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