Acessibilidade / Reportar erro

Mercados imobiliários: universalidades, particularidades e singularidades

Resumo

Partindo da ideia de que mercado imobiliário é uma abstração, posto que se refere a um largo espectro de modalidades de mercados, pergunta-se: quais as determinações comuns a todos os mercados imobiliários? Quais são semelhantes e definidoras de cada grupo ou tipo de mercado e quais são específicas de cada mercado local, histórica e espacialmente determinado? Diante dessas indagações, o presente ensaio, com base no método dialético, explora e aplica os conceitos de singular, particular e universal em análises de mercados imobiliários, explicitando correlações e interdependências entre essas dimensões. Além disso, aplica a tríade singular-particular-universal para a análise do mercado imobiliário da área central do Recife.

Palavras-chave:
Mercado Imobiliário; Método Dialético; Universalidade; Particularidade; Singularidade

Abstract

Based on the idea that the real estate market is an abstraction, since it refers to a wide spectrum of market modalities, the question posed in this paper is: Which determinations are common to all real estate markets? Which are similar and defining for each group or market type and which are specific to each locally-, historically- and spatially-determined market? In view of these questions, this essay, based on the dialectical method, explores and applies the concepts of singularity, particularity and universality in the analyses of real estate markets, thereby explaining correlations and interdependencies between these dimensions. In addition, it also applies the singular-particular-universal triad to an analysis of the real estate market in the central area of Recife.

Keywords:
Real Estate Market; Dialectical Method; Universality; Particularity; Singularity

Introdução

As dinâmicas espaciais das cidades brasileiras são regidas, em grande parte, por mercados imobiliários, analisados e classificados por diversos autores. Lacerda e Bernardino (2020LACERDA, N.; BERNARDINO, I. L. Ressemantização das áreas centrais das cidades brasileiras e mercado imobiliário habitacional: o caso recifense (Brasil). Caderno Metrópoles, São Paulo, v. 22, n. 49, p. 913-934, set./dez. 2020., p. 916), por exemplo, os tipificam com base nos ciclos produtivos de procedência (imóveis novos ou secundários); nas funcionalidades, como os tipos de uso do solo (industrial, residencial, comercial e de serviços); nas atribuições na divisão econômica e social do espaço (centros históricos, áreas pobres etc.); e nas modalidades das transações (locação, compra-venda etc.). Ademais, é também de praxe a classificação segundo as escalas espaciais (planetária, nacional, metropolitana, urbana, de bairros ou outras porções territoriais), ou segundo abordagens temporais multi ou transescalares.

Na realidade concreta, cada mercado imobiliário é único e irreprodutível e funciona em certa época, em dado contexto socioeconômico e espacial, transacionando produtos diferenciados, por meio de mecanismos distintos, resultantes da ação de agentes específicos. Dito de outra maneira, por ser fruto de uma formação socioeconômica histórica e espacialmente determinada, cada segmento do mercado é exclusivo em suas singularidades e cada cidade exibe largo espectro de submercados imobiliários específicos. Assim, a categoria mercado imobiliário resulta de uma abstração1 1 Abstração aqui é entendida como o procedimento que extrai um objeto de seu contexto (da totalidade em que se insere), isola-o para examiná-lo e, depois, o devolve para o todo, integrando-o às múltiplas determinações desse todo. e se reporta a uma diversidade de fenômenos.

Nessa perspectiva, dado mercado imobiliário se converte em uma totalidade sujeita a múltiplas determinações,2 2 Determinações “são traços pertinentes aos elementos constitutivos da realidade; nas palavras de um analista, para Marx, a determinação é um ‘momento essencial constitutivo do objeto’” (DUSSEL, 1985, p. 32 apud NETTO, 2011, p. 45). desde as mais amplas, decorrentes do mercado imobiliário capitalista em geral, até as que o distinguem de outros mercados imobiliários, manifestando-se mediante as singularidades dos submercados de cada lugar.

Antes de precisar o entendimento aqui adotado sobre mercado imobiliário, convém tecer alguns esclarecimentos. Um equívoco recorrente consiste em reduzir análises do mercado imobiliário à discussão da renda fundiária. Embora a terra ainda constitua condição sine qua non para a existência do produto imobiliário, este não se limita a ela, já que, não raras vezes envolve, também, o objeto edificado.

Outro lapso diz respeito à associação desse mercado à ideia de produção e comercialização de novas unidades imobiliárias, sobretudo as habitacionais. Com isso, confundem-se os conceitos de mercado imobiliário, vinculado à alçada da circulação (distribuição e troca), e o de circuito imobiliário, que envolve as esferas da produção e da circulação. Conquanto se considere que, em geral, a circulação das mercadorias consiste em instância de mediação entre produção e consumo de qualquer mercadoria (MARX, 2011MARX, K. Gundrisses. manuscritos econômicos de 1857-1858: esboços da economia política. São Paulo: Boitempo ; Rio de Janeiro: Ed. da UFRJ , 2011.), a circulação da mercadoria imobiliária apresenta características peculiares decorrentes da própria natureza desse produto, como se discutirá posteriormente.

Isso posto, entende-se mercado imobiliário como o espaço geográfico e/ou de relações em que se operam negociações relacionadas a terrenos e/ou edificações, tanto novas quanto usadas. Para além disso, o conceito compreende o conjunto integrado por vários agentes (indivíduos, empresas, governos, instituições), lógicas, princípios e normas que regulam a atuação, os comportamentos e as relações entre os agentes. Assim, constitui-se em totalidade complexa, composta de múltiplas determinações de natureza econômica, social etc.

Tal perspectiva levanta, do ponto de vista teórico e metodológico, diversas questões, quais sejam: como operacionalizar, no âmbito da dialética, estudos sobre o mercado imobiliário que captem essa complexa totalidade? Como identificar, classificar e enunciar as características do mercado imobiliário? Quais regras/características/determinações são comuns a todos os mercados imobiliários? Quais são semelhantes e definidoras de cada grupo ou tipo de mercado? E quais são específicas dos mercados locais, histórica e espacialmente estabelecidos?

Para responder a essas indagações, com base no método dialético, este ensaio explora a aplicação dos conceitos singular, particular e universal, explicitando correlações e interdependências entre mercados/submercados imobiliários nessas dimensões. Além disso, aplica a tríade para a análise do mercado imobiliário da área central do Recife. Por essa via, busca contribuir para a superação de abordagens e metodologias que focam, de forma isolada ou desarticulada, ora as singularidades, ora as particularidades e/ou as universalidades desse mercado.

A argumentação se encontra condensada em dois grandes blocos. No primeiro, retoma-se, teoricamente, o conceito de totalidade e debate sobre a tríade de categorias analisadas, mostrando a relação entre o singular, o particular e o universal do ponto de vista epistemológico e os modos segundo os quais ela pode ser utilizada, metodologicamente, na análise do mercado imobiliário de uma totalidade dada. No segundo, trabalha-se a operacionalização dessas categorias analíticas para descortinar o caso do mercado imobiliário da área central do Recife, aqui considerada totalidade de referência.

1. As categorias totalidade, universalidade, particularidade e singularidade e o mercado imobiliário

1.1 A totalidade como o todo estruturado e hierarquizado

Segundo Lukács (1967LUKÁCS, G. Existencialismo ou marxismo. São Paulo: Senzala, 1967., p. 240), para conceber algo como totalidade é preciso admitir, de um lado, que:

[...] a realidade objetiva é um todo coerente em que cada elemento está, de uma maneira ou de outra, em relação com cada elemento e, de outro lado, que essas relações formam, na própria realidade objetiva, correlações concretas, conjuntos, unidades, ligados entre si de maneiras completamente diversas, mas sempre determinadas.

Sendo o todo composto de partes, leis e relações conectadas entre si e em movimento, sua fragmentação e/ou desarticulação eliminaria a possibilidade de conhecê-lo. Desta forma, Carvalho (2007CARVALHO, E. A totalidade como categoria central na dialética marxista. Outubro. Revista de Estudos Socialistas, n. 15, 1º sem. 2007.) alerta para o risco de a procura pelo “todo” se tornar um obstáculo intransponível ao alcance do conhecimento. Como, então, apreender a transversalidade conectiva de um todo integrado por uma quantidade imensurável de partes e relações mutáveis, como é o caso do mercado imobiliário? Seria uma operação possível?

A resposta a essa questão demanda a retomada da análise da categoria totalidade. De acordo com Carvalho (2007CARVALHO, E. A totalidade como categoria central na dialética marxista. Outubro. Revista de Estudos Socialistas, n. 15, 1º sem. 2007.), no método dialético, a totalidade só pode ser compreendida, construída e empregada se adotados certos procedimentos filosóficos. Dentre eles, inclui-se o de considerar o “todo” como algo estruturado e hierarquizado.

Isso implica admitir que a totalidade é formada por uma série de categorias e relações organizadas, e, mais, que algumas delas são estruturais para a constituição do todo, razão pela qual precisam ser, prioritariamente, descortinadas no processo de reconstituição abstrata do todo. Para Carvalho (2007CARVALHO, E. A totalidade como categoria central na dialética marxista. Outubro. Revista de Estudos Socialistas, n. 15, 1º sem. 2007.), é ao percorrer a estrutura e a hierarquia do todo no ato da sua constituição, a partir do que possui de essencial, que a categoria totalidade se determina e se define. Assim, compreende-se que conhecer a transversalidade conectiva do todo não pressupõe dominar todas as suas partes e relações, mas sim apreender a lógica que preside suas conexões, as contradições e os antagonismos fundamentais para o entendimento da eclosão dos momentos de unidade e para a ruptura das totalidades sociais (CARVALHO, 2007CARVALHO, E. A totalidade como categoria central na dialética marxista. Outubro. Revista de Estudos Socialistas, n. 15, 1º sem. 2007.).

Ressalte-se que assumir tal postura não significa negar que a realidade empírica pode estar situada em um contexto histórico (por exemplo, capitalista) cujo entorno (por exemplo, o não capitalista) pode conter partes, atores, relações distintas daquelas abstrações gerais (a exemplo do modo de produção capitalista). Aliás, de acordo com Lukács (2009LUKÁCS, G. O jovem Marx e outros escritos de filosofia. Rio de Janeiro: Ed. da UFRJ, 2009., p. 59), cada totalidade “é relativa e mutável, mesmo historicamente: ela pode esgotar-se e destruir-se - seu caráter de totalidade subsiste apenas no marco das circunstâncias históricas determinadas e concretas”.

Rosdolsky (2001ROSDOLSKY, R. Gênese estrutura de O Capital de Karl Marx. Rio de Janeiro: Eduerj; Contraponto, 2001.), respondendo à crítica de Rosa Luxemburgo ao método usado por Marx, argumenta que não partir do mundo sensível não significa dizer que ele tenha desistido de analisar a realidade empiricamente considerada, nem que o filósofo alemão confundiu o “capital em geral” (abstração geral) com a “realidade do capitalismo”. Para Marx, a investigação das leis em que se baseia o modo de produção capitalista deveria buscar, primeiramente, o devir do capital em condições ideais, como “tipo geral”. Na transição da análise do “capital em geral” para os “capitais particulares”, os “capitais reais” evidenciam o surgimento de novas determinações que não eliminam as formas mais abstratas, as quais seguem recorrentes e contidas nas mais concretas.

Daí decorre que, na análise de realidades empíricas de mercados/submercados imobiliários, muitos fatores, relações, condições e possibilidades podem ser levados em conta. Mas a apreensão da totalidade de mercados/submercados específicos e de suas conexões dialéticas essenciais deve ser captada teoricamente, antes mesmo de desvelada sua concretude em nível detalhado.

Para construir sua teoria da sociedade burguesa, ou seja, para reproduzir no plano teórico3 3 Para Marx, a teoria não se resume ao exame sistemático, à descrição das formas de manifestação de um objeto ou à construção de modelos de causa-efeito explicativos de fenômenos pelo pesquisador. Para ele, o conhecimento teórico é o conhecimento que o pesquisador constrói, em sua mente, da estrutura e da dinâmica do objeto da pesquisa, tal como ele é na sua existência real (NETTO, 2011). (do pensamento), o movimento real da sociedade burguesa, no modo de produção capitalista, Marx procurou suas leis gerais, ou seja, suas regularidades universais (NETTO, 2011NETTO, J. P. Introdução ao estudo do método de Marx. São Paulo: Expressão Popular, 2011.). Para ele, a sociedade burguesa é uma totalidade de complexidade máxima, composta de totalidades também complexas de menor complexidade. Em razão disso, “cabe à análise de cada um dos complexos constitutivos das totalidades esclarecer as tendências que operam especificamente em cada uma delas” (NETTO, 2011NETTO, J. P. Introdução ao estudo do método de Marx. São Paulo: Expressão Popular, 2011., p. 56).

No caso da reconstrução, no plano do pensamento, do movimento real do mercado imobiliário no capitalismo contemporâneo, as questões que emergem são: de que categorias4 4 Conforme Netto (2011, p. 46), para Marx, categorias “exprimem [...] formas de modo de ser, determinações de existência, frequentemente aspectos isolados de [uma] sociedade determinada” - ou seja: elas são objetivas, reais (pertencem à ordem do ser, são categorias ontológicas). mais simples, fundantes e amplas se deve partir para analisar essa totalidade? Como cindir o objeto de estudo até chegar às suas partes, relações e leis essenciais e estruturantes? Como estabelecer uma hierarquia de determinações em processo, entre as partes e relações e destas com o todo?

Neste artigo, admite-se que o mercado imobiliário se manifesta como uma unidade em uma rede mais ampla de relações fundadoras, na qual assume a centralidade. Nessa rede, inserem-se inúmeras conexões e relações contraditórias, as quais se estendem desde os processos de apropriação da terra, passando por processos intermediários de produção da mercadoria imobiliária propriamente dita, até chegar ao funcionamento de mecanismos de circulação, troca e consumo do bem imobiliário.

Como se articula aos movimentos de ascensão, valorização e crise do capital, o mercado imobiliário se integra a outras totalidades hierarquicamente superiores, vinculadas ao modo de produção capitalista, aos processos de globalização e financeirização da economia mundial. Além disso, ele contém e subordina outras totalidades internas e hierarquicamente inferiores e apresenta um caráter sistêmico, histórico, mutante, e, portanto, transitório.

1.2 Explorando a tríade singular-particular-universal

Nesta pesquisa, não é intenção apresentar um contributo inédito a respeito da dialética singular-particular-universal enquanto princípio orientador da análise dos fenômenos da realidade. Pretende-se, em vez disso, apontar algumas de suas implicações no estudo do mercado imobiliário em qualquer das suas manifestações, particulares e/ou singulares.

A questão central a ser debatida é: tendo como mediação o particular, como a singularidade se articula com a universalidade e, ao inverso, como a universalidade se manifesta na singularidade no caso do mercado imobiliário? Para desvendá-la, recorre-se à concepção histórico-social do homem, cujos fundamentos foram elaborados por Marx, com base no posicionamento crítico às formulações de Hegel.

Hegel foi o primeiro a trabalhar com a dialética, numa lógica em que a contradição é a categoria explicativa do movimento e da transformação de tudo o que existe. Mais ainda, para ele, polos opostos - universalidade e singularidade - não são excludentes, fazem parte de um mesmo movimento. Marx reconheceu o mérito desse filósofo, por isso captou e conservou o núcleo da dialética hegeliana, subtraindo o que considerava falso e distorcido: a visão idealista, que concebia o real como o resultado de um pensamento que partia de si mesmo (intuição, por exemplo), ia para o concreto e a si retornava. Nessa formulação, o todo consiste em operação do pensamento, em produto da mente que pensa e se apropria do mundo (MARX, 2011MARX, K. Gundrisses. manuscritos econômicos de 1857-1858: esboços da economia política. São Paulo: Boitempo ; Rio de Janeiro: Ed. da UFRJ , 2011.).

Ainda segundo Marx (2011MARX, K. Gundrisses. manuscritos econômicos de 1857-1858: esboços da economia política. São Paulo: Boitempo ; Rio de Janeiro: Ed. da UFRJ , 2011.), a dialética hegeliana estava invertida. Dela deveria ser retirada a “carapaça mística”, pois, para ele, os indivíduos produzem seus meios de vida e desencadeiam a história como obra deles mesmos, apoiados em sua relação com a realidade material concreta. Isso significa que os seres humanos produzem seguindo o processo histórico de desenvolvimento em distintas fases, em que a produção burguesa é apenas uma delas.

Marx retomou e condensou suas reflexões teóricas sobre o método dialético nos Grundrisse, propondo que, pautando-se na representação caótica do conjunto do concreto, se caminhe, progressivamente, para abstrações mais sutis até alcançar as determinações mais simples desse concreto, que são descortinadas mediante a identificação de relações gerais presentes em distintos momentos históricos. Ao se chegar aqui, retorna-se até o concreto analisado, que passa a ser visto, não mais segundo a perspectiva inicial caótica do seu todo, mas sim como uma totalidade pensada, portadora de múltiplas determinações e relações. A representação da realidade emerge, então, como síntese de determinações e relações, tornando o concreto não apenas o ponto de partida (concreto caótico), como, também, o ponto de chegada (concreto pensado).

É um equívoco, portanto, confundir o concreto com o empírico (PASQUALINI; MARTINS, 2015PASQUALINI, J. C.; MARTINS, L. M. Dialética singular-particular-universal: implicações do método materialista dialético para a psicologia. Psicologia & Sociedade, 2015 27(2), 362-371.). Uma das críticas mais contundentes de Marx ao método da economia política burguesa é de que “ela toma as suas categorias diretamente da empiria e as emprega como conceitos descritivos das formas econômicas em sua aparência imediata [...] ela permanece exterior ao seu objeto e é incapaz de desenvolver as suas determinações categoriais a partir do seu movimento essencial” (MULLER, 1982MULLER, M. L. Exposição e método dialético em O Capital. Boletim SEAF, Belo Horizonte, 2, 1982. Disponível em: https://eleuterioprado.files.wordpress.com/2015/09/muller-exposic3a7c3a3o-e-mc3a9todo-dialc3a9tico-em-marx.pdf. Acesso em: 26 jan. 2021.
https://eleuterioprado.files.wordpress.c...
, p. 8).

Netto (2011NETTO, J. P. Introdução ao estudo do método de Marx. São Paulo: Expressão Popular, 2011., p. 45) esclarece que as determinações mais simples e gerais “estão postas no nível da universalidade; na imediaticidade do real, elas se mostram como singularidades - mas o conhecimento do concreto opera-se envolvendo universalidade, singularidade e particularidade”. Para Lukács (1967LUKÁCS, G. Existencialismo ou marxismo. São Paulo: Senzala, 1967.), a particularidade exerce a função de mediação, pois tem a capacidade de explicar mecanismos com implicações no modo de ser da singularidade e da universalidade.

Em linhas gerais, pode-se inferir que Marx fornece instrumental metodológico importante para analisar um modo, um objeto ou um fenômeno singular como o mercado imobiliário, e Lukács o acompanha explicitando a dialética universal-particular-singular. Como essas três categoriais não se sustentam em si mesmas, mas apenas na articulação dialética entre elas, para desvendar a totalidade de dado mercado/submercado imobiliário, deve-se navegar da representação caótica do todo, passar por abstrações particularizantes, até alcançar a síntese. Afinal, “o concreto é concreto porque é a síntese de múltiplas determinações” (MARX, 2011MARX, K. Gundrisses. manuscritos econômicos de 1857-1858: esboços da economia política. São Paulo: Boitempo ; Rio de Janeiro: Ed. da UFRJ , 2011., p. 54).

Na tradição marxista, a realidade concreta também existe abstratamente (concreto pensado). Por isso, Kosik (1976KOSIK, K. Dialética do concreto. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.) defende o imperativo de superar a pseudoconcreticidade para se chegar à verdadeira concreticidade dos fenômenos estudados. No caso do mercado imobiliário, suplantar o pseudoconcreto exige apreender as leis gerais (universais) que determinam e regulam a existência dele no mundo objetivo. Também se requer ultrapassar a exterioridade do fenômeno empírico (pseudoconcreto) para desvendar as relações dinâmico-causais e as contradições a ele subjacentes, apreendendo as múltiplas mediações que o produzem. Isso tudo sem deixar de considerar que, se, de um lado, as leis gerais que regem o mercado imobiliário não se apresentam de imediato, por outro, elas se expressam e se concretizam na diversidade de determinações particulares e singulares do fenômeno.

Do exposto, infere-se que a dialética de Marx fornece instrumental metodológico para analisar o mercado imobiliário. O desafio consiste em identificar as universalidades, as particularidades e as singularidades de tais mercados/submercados e como se operam as articulações, que são dialéticas, entre as múltiplas determinações oriundas dessas três instâncias na totalidade estudada.

Antes de aplicar a dialética marxista no exercício de apreensão de universalidades, particularidades e singularidades do mercado imobiliário da área central recifense, cabe diferenciar “método de apreensão” de “método de exposição” do concreto pensado. Conforme Netto (2011NETTO, J. P. Introdução ao estudo do método de Marx. São Paulo: Expressão Popular, 2011., p. 27), para Marx, “na investigação, o pesquisador parte de perguntas, questões; na exposição, ele já parte dos resultados que obteve na investigação”, o que representa uma inversão. Muller (1982MULLER, M. L. Exposição e método dialético em O Capital. Boletim SEAF, Belo Horizonte, 2, 1982. Disponível em: https://eleuterioprado.files.wordpress.com/2015/09/muller-exposic3a7c3a3o-e-mc3a9todo-dialc3a9tico-em-marx.pdf. Acesso em: 26 jan. 2021.
https://eleuterioprado.files.wordpress.c...
) destaca que o método de investigação utilizado por Marx em O Capital reconstrói essa categoria com o aporte de um trabalho prévio de investigação empírica e maturação histórica do objeto, para “então expor a sua lógica interna de acordo com os nexos que a análise apreendeu entre suas determinações” (MULLER, 1982MULLER, M. L. Exposição e método dialético em O Capital. Boletim SEAF, Belo Horizonte, 2, 1982. Disponível em: https://eleuterioprado.files.wordpress.com/2015/09/muller-exposic3a7c3a3o-e-mc3a9todo-dialc3a9tico-em-marx.pdf. Acesso em: 26 jan. 2021.
https://eleuterioprado.files.wordpress.c...
, p. 15).

O método de exposição, portanto, diz respeito à maneira de organização do discurso metódico; “designa o modo como o objeto, suficientemente apreendido e analisado, se desdobra em suas articulações próprias e como o pensamento as desenvolve em suas determinações conceituais correspondentes” (MULLER, 1982MULLER, M. L. Exposição e método dialético em O Capital. Boletim SEAF, Belo Horizonte, 2, 1982. Disponível em: https://eleuterioprado.files.wordpress.com/2015/09/muller-exposic3a7c3a3o-e-mc3a9todo-dialc3a9tico-em-marx.pdf. Acesso em: 26 jan. 2021.
https://eleuterioprado.files.wordpress.c...
, p. 4). O mesmo autor (id., p. 18) questiona a legitimidade dialética do método de exposição:

Como se mantém, se é que se mantém, o elemento especificamente dialético da exposição em face desta transformação da dialética em método no sentido “subjetivo”, enquanto procedimento reconstrutivo de um expositor?

O enfretamento dessa questão não é fácil e situa-se além da ambição deste artigo. Por ora, assumem-se os riscos imanentes de, no discurso a seguir, ter interferido o subjetivismo das autoras. Todavia, por entender-se que não é a descrição da realidade recifense que a legitima, e sim o método que foi usado para apreendê-la, apresenta-se, à guisa de exemplificação, o exercício de aplicação da tríade singular-particular-universal à análise de uma totalidade concreta.

2. Mercado imobiliário: a tríade no estudo da área central do Recife

Adota-se como totalidade empírica de referência o mercado imobiliário na contemporaneidade (pós-fordismo), no Brasil e, mais especificamente, na área central do Recife. As análises a seguir fundamentam-se em informações da realidade empírica, coletadas em diversos estudos,5 5 Vale realçar que, por trabalhar com informações secundárias e procedentes de outros estudos, não foi possível, no presente artigo, aprofundar a análise e apresentar dados relacionados à participação do capital financeiro no mercado imobiliário da área de estudo no momento atual, embora se reconheçam a necessidade e a emergência de proceder a estudos nesse sentido. e é possível identificar regularidades e reconstruir, no âmbito do pensamento, o movimento de categorias teóricas relacionadas ao mercado imobiliário, em suas universalidades, particularidades e singularidades, para, posteriormente, retornar à realidade empírica.

A exposição dos resultados inverte essa lógica, começando do ponto de chegada. Inicia-se apresentando as determinações gerais dos mercados imobiliários - decorrentes das leis gerais e do movimento atual do capital e suas relações sociais. Tais universalidades emergiram como fundamentais para explicar as singularidades do mercado imobiliário da área central do Recife. Na sequência, apontam-se e discutem-se as determinações que decorrem das mediações necessárias ao funcionamento do mercado imobiliário na área de estudo, no contexto do movimento do capital, identificando as particularidades que se mostraram essenciais na articulação entre o universal e o singular. Por fim, apresentam-se as características do “mercado imobiliário na área do centro da capital pernambucana” como o concreto pensado, num esforço de síntese das categorias universalidade-particularidade-singularidade.

2.1 Universalidades do mercado imobiliário

Com base nos autores que estudaram o mercado imobiliário - Topalov (1984)TOPALOV, C. Le Profit, la rente et la ville: éléments de théorie. Paris: Economica , 1984 ., Granelle (1998GRANELLE, J-J. Économie immobilière. Analyses et applications. Paris: Economica, 1998. ), Harvey (2013HARVEY, D. Os limites do capital. São Paulo: Boitempo, 2013.), dentre outros -, é possível reconhecer cinco universalidades presentes em qualquer mercado imobiliário contemporâneo, pois são imprescindíveis para a compreensão da realidade da área central do Recife.

Primeira: o bem imobiliário posto em circulação, dada sua longa vida econômica, é um ativo real. Por isso, distinguem-se comportamentos diversos, às vezes não excludentes, por parte dos agentes que atuam nesse mercado, com repercussões nos níveis da oferta e da demanda por esse bem. Ora os imóveis são adquiridos ou alugados para a instalação de atividades (bens de consumo), ora para a obtenção de ganhos de valorização futura (especulação), ora, ainda, como ativo imobiliário passível de se transformar em ativo financeiro, ora como mera reserva de valor.

Segunda: o bem imobiliário possui feições simbólicas ao autorizar seu proprietário a participar de determinado segmento social, o que, historicamente, o tem relacionado ao poder. E mais: a construção de um patrimônio, mesmo modesto, e sua transmissão representam “a solução mais accessível, a mais ‘democrática’ [...] reduzido ao ter, o ser com isso ganha em troca a crença de uma perpetuação profana da sua pessoa” (CAPDEVIELLE, 1986CAPDEVIELLE, J. Le Fétichisme du patrimoine. Paris: Presses de la Fondation Nationale des Sciences Politiques, 1986., p. 20). Desse modo o indivíduo, diante da angústia da sua finitude, procura uma sobrevivência material por meio da durabilidade de seu patrimônio nas mãos dos descendentes.

Essas duas universalidades fundamentaram a emergência de uma das maiores novidades do século XX, que, segundo Piketty (2014PIKETTY, T. O capital no século XXI. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2014.), é o desenvolvimento de uma “classe média patrimonial”, cuja identidade econômica e simbólica está relacionada à detenção de patrimônio, notadamente imobiliário. Isso tem ampliado demasiadamente a importância dos bens imobiliários ao longo do processo de desenvolvimento capitalista. Tal realidade, estudada por ele em países como Inglaterra, França e Estados Unidos, ocorreu/ocorre em países subdesenvolvidos, como é o caso do Brasil.

Terceira: a dinâmica do mercado imobiliário depende de um capital circulante (crédito). Segundo Topalov (1984)TOPALOV, C. Le Profit, la rente et la ville: éléments de théorie. Paris: Economica , 1984 ., essa subordinação ocorre por conta das características do ciclo de reprodução do capital imobiliário. Cada ciclo exige o acesso à propriedade do solo urbano. O custo e o período de produção do bem imóvel são superiores aos da maioria das demais mercadorias, por causa do alto valor agregado (trabalho incorporado). O tempo de circulação da mercadoria edificada também é longo. Raramente esse bem depara com demanda solvável imediata.

As características mencionadas tornam imperativa a disponibilidade de capital circulante para garantir retorno ao capital investido antes do fechamento do ciclo produtivo. Como consequência, tem-se a sujeição do mercado imobiliário a subsídios e incentivos oriundos de políticas públicas. Mais recentemente, com vistas a garantir, e até mesmo a aumentar, o volume de recursos financeiros disponibilizados, surgiram sofisticados produtos (ações e títulos imobiliários) destinados à captação junto ao público via mercado. Tratando-se de captação ampla, esta deve ser regulada pelo Estado, como ocorre em vários países do mundo, inclusive no Brasil.

Quarta: é imprescindível que o investimento imobiliário gere sobrelucro, a ser distribuído entre o proprietário do terreno, o promotor imobiliário e o detentor do capital financeiro. Rufino (2017RUFINO, M. B. C. Financeirização do imobiliário e transformações na produção do espaço urbano. In: FERREIRA, A.; RUA, J.; MATTOS, R. C. (org.). O espaço e a metropolização: cotidiano e ação. Rio de Janeiro: Consequência, 2017. ) destaca que a necessidade de acesso ao crédito coloca em relevância o papel do capital financeiro no setor imobiliário, ao ponto de este se transformar em condição para o avanço das relações capitalistas no setor. Como proprietário de ações e de títulos imobiliários, o capital financeiro procura capturar parte do sobrelucro (id., ibid.), daí a tendência dos exacerbados ganhos decorrentes da renda fundiária.

Para Harvey (2013HARVEY, D. Os limites do capital. São Paulo: Boitempo, 2013.), embora o capital financeiro não produza valor, sua circulação em busca da apropriação de parcela da renda da terra (sobrelucro), o autoriza a exercer papel estratégico na coordenação dos investimentos imobiliários. E essa coordenação molda uma organização espacial das atividades ajustadas ao mercado imobiliário.

Quinta: tal coordenação é reforçada pela atuação do Estado, que - além de disponibilizar recursos por meio de políticas públicas e regular o mercado de crédito imobiliário, ao estabelecer o aparato institucional que lhe confere operacionalidade e segurança - cria condições de valorização imobiliária mediante a implantação de infraestruturas, serviços urbanos e normativas urbanísticas delineadoras dos parâmetros de uso e ocupação do solo.

As cinco universalidades explicitadas impuseram, e seguem ditando, particularidades no desenho de políticas nacionais direcionadas, principalmente, para impulsionar o mercado de novas unidades imobiliárias.

2.2 Particularidades do mercado imobiliário

Para que se compreenda como as universalidades do mercado imobiliário capitalista atual se articulam com as singularidades da área central do Recife, é necessário examinar particularidades do Estado brasileiro que, historicamente, têm criado condições e mecanismos para garantir a produção e a circulação imobiliária no país. Além disso, é preciso compreender como tais condições e mecanismos dialogam, dialeticamente, com as circunstâncias materiais concretas da área de estudo.

No Brasil do início da década de 1960, os efeitos expansivos dos investimentos públicos e privados que caracterizavam a fase de substituição de importações se esgotaram. A possibilidade de realização do potencial produtivo era dificultada pelo reduzido poder de compra das camadas sociais médias e pela crescente impossibilidade de o governo e as empresas financiarem ou utilizarem novas fontes de recursos externos (TAVARES, 1981TAVARES, M. da C. Da substituição de importações ao capital financeiro. Ensaios sobre a economia brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, 1981.). Nesse contexto, foi redefinida a política salarial, com a distribuição de renda extremamente desigual, centrada no aumento de renda real dos extratos populacionais superiores. Ademais, foram realizadas reformas, como a bancária, que originou um novo mercado de capitais, para facilitar as transferências entre setores da economia.

A reforma bancária incluiu a criação do Banco Nacional da Habitação (BNH), que passou a integrar o Sistema Financeiro Nacional (SFH). O BNH mobilizava recursos do SFH oriundos, notadamente, do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e da Sociedade Brasileira de Poupança e Empréstimo (SBPE), e, dessa maneira, garantia o capital circulante necessário à produção e à comercialização de imóveis habitacionais. A crise econômica do início dos anos 1980 abalou substancialmente os dois principais pilares financeiros do SFH (FGTG e SBPE), e isso contribuiu para sua extinção do BNH em 1986.

No início dos anos 1990, o Brasil aprofundou o processo de inserção na economia globalizada por meio de uma série de desregulamentações, e uma das principais foi a do seu sistema financeiro, incorporado ao sistema financeiro internacional.

No desenho atual, o sistema em questão ancora-se na securitização das dívidas públicas e privadas, nos derivados financeiros e na expansão dos investidores institucionais (fundos de pensão, fundos mútuos e companhias de seguro). Com isso, consolida-se a conexão entre capitais internacionais, capitais nacionais e locais. Tal articulação/convergência abriu possibilidades de as instituições financeiras identificarem novas fronteiras para a acumulação de capital, o que, no Brasil, resultou no fortalecimento da aliança entre o capital financeiro e o imobiliário.

Nesse processo, novos mecanismos surgiram destinados ao financiamento imobiliário vinculado ao mercado de capitais, como os Fundos de Investimentos Imobiliários (FIIs), instituídos em 1993, e as Carteiras Hipotecárias, criadas em 1994. Em 1997, emerge o Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), atuando, segundo Rufino (2017RUFINO, M. B. C. Financeirização do imobiliário e transformações na produção do espaço urbano. In: FERREIRA, A.; RUA, J.; MATTOS, R. C. (org.). O espaço e a metropolização: cotidiano e ação. Rio de Janeiro: Consequência, 2017. ), de maneira complementar ao SFH. Para conferir maior robustez ao volume de recursos destinados à produção imobiliária, foi dinamizada a emissão de debêntures, ou seja, de títulos de crédito emitidos por empresas e negociados no mercado de capitais.

É necessário frisar que foram criados instrumentos de capitalização de recursos, como os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), uma alternativa para quem quer ter liquidez e segurança ao acessar o mercado imobiliário. É igualmente oportuno comentar a interdependência planetária dos mercados imobiliários. O caso brasileiro é paradigmático.

Em 2008, a economia mundial mergulhou numa severa crise, originada no setor imobiliário dos Estados Unidos, o que interrompeu o mais longo ciclo de crescimento econômico do Brasil (2004-2013). A resposta do país ao enfrentamento dessa crise consistiu em expandir o gasto público, sustentando-se em um conjunto de medidas, dentre as quais a redução da taxa de juros dos financiamentos habitacionais e a flexibilização das regras de concessão desses financiamentos, providências importantes para a ampliação da procura por imóveis residenciais. Como resultado, o mercado imobiliário experimentou forte expansão e valorização dos preços praticados.

A crise mundial motivou a realização de levantamento inédito sobre os preços do mercado imobiliário residencial em mais de cinquenta países, sob a coordenação do Banco de Compensações Internacionais (BIS), espécie de banco central dos bancos centrais nacionais. No Brasil, o levantamento foi feito pelo Banco Central e mostrou que, no período de 2008 até o terceiro semestre de 2013, o valor médio por metro quadrado dos imóveis residenciais mais do que dobrou (121,6%). A forte alta ocorreu entre 2008 e o início de 2011, quando a valorização anual dos imóveis habitacionais permaneceu, sistematicamente, acima de 20%. Nos trimestres seguintes, o ritmo desacelerou, ficando perto de 15% e reduzindo-se, em 2013, ao patamar dos 9% (NAKAGAWA, 2014NAKAGAWA, F. Valorização de imóvel no Brasil foi a maior do mundo nos últimos 5 anos. O Estadão, São Paulo, 17 jan. 2014. Disponível em Disponível em http://economia.estadao.com.br/noticias/economia-geral,valorizacao-de-imovel-no-brasil-foi-a-maior-do-mundo-nos-ultimos-5-anos,175663,0.htm . Acesso em: 2 abr. 2014.
http://economia.estadao.com.br/noticias/...
).

Acrescentem-se, ainda, a emergência de novos centros do capitalismo e o deslocamento do eixo territorial planetário da acumulação do capital imobiliário em direção a países produtores de petróleo, no Mediterrâneo árabe e em regiões da Ásia, tendo como principal polo a China, acompanhada por Coreia do Sul, Malásia, Tailândia e outros países. O referido mercado, consoante Nunes, Nunes e Lacerda (2017NUNES, B. F.; NUNES, C. G. F.; LACERDA, N. Planejamento urbano, arquitetura e urbanismo: a serviços de uma outra geografia? Revista Sociedade e Estado, v. 31, n. esp., p. 989-1001, 2017. ), assumiu novas feições a partir do segundo quartel do século passado, com a eclosão de grandes projetos urbanos, articulados aos três processos (globalização, desregulamentação e flexibilização) que comandam os movimentos de reestruturação e de busca de resolução da crise do capitalismo fordista, iniciada nos anos 1970.

Isso significou a derrubada de muralhas protecionistas e a instalação do edílico modelo de concorrência mundial (ABRAMO, 1995ABRAMO, P. A regulação urbana e o regime urbano: a estrutura urbana, sua reprodutibilidade e o capital. Ensaios FEE, Porto Alegre, v. 16, n. 2, p. 510-555, 1995.), com destaque para a concorrência entre cidades, impulsionada pelos processos de financeirização e seus impactos na reestruturação imobiliária. Tais projetos configuram o que Harvey (1990HARVEY, D. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. São Paulo: Loyola, 1990.) chama de forma urbana pós-moderna, caracterizada pelo retorno da “arte urbana” monumentalista, com o “mecenato” da promoção imobiliária, regresso sustentado, inclusive, pela já comentada novidade apontada por Piketty (2014PIKETTY, T. O capital no século XXI. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2014.): a expansão da “classe média patrimonial”.

Insiste-se, mais uma vez, em que identificar particularidades do caso brasileiro significa permanecer ainda no domínio do abstrato. São comuns estudos que buscam identificar a evolução do mercado imobiliário, nacional ou local, baseando-se em análises relativas à participação da produção imobiliária no Produto Interno Bruto (PIB); aos efeitos da financeirização sobre o setor e suas implicações na estruturação e expansão das cidades; à existência ou não da concentração da produção etc. Trata-se, sobretudo, de análises parciais, pois estão atreladas à produção e à comercialização de unidades novas direcionadas à venda.

Por focarem certas particularidades do mercado imobiliário nacional que privilegiam a produção imobiliária, não raras vezes os estudos sobre o mercado imobiliário omitem ou encobrem aspectos muito relevantes, como o estoque imobiliário ocioso, as características e o papel das transações (locação ou compra-venda) de imóveis usados; a não solvibilidade de fração importante da demanda; o processo de desvalorização fictícia de imóveis para incrementar a venda dos imóveis novos; a expansão do mercado informal como resultado da incapacidade das populações de baixa renda de acessar os chamados mercados formais etc. Enfim, eles negligenciam em que medida a “máquina de crescimento urbano” (LOGAN; MOLOTCH, 1996LOGAN, J. R.; MOLOTCH, H. L. The city as a growth machine. In: FAINSTEIN, S.; CAMPBELL, S. (ed.). Urban Theory. Oxford: Blackwell. p. 291-337, 1996.), comandada pelo setor imobiliário, provoca excessiva valorização do solo urbano, alijando parte considerável da população do acesso ao bem imobiliário, afinal, no capitalismo contemporâneo, a cidade, quando estagnada, desvaloriza-se e, com ela, os ativos imobilizados.

Todos esses encobrimentos assumem características diferenciadas a depender de como as universalidades, particularidades e singularidades se desenham, se articulam e se unificam dialeticamente, conformando totalidades concretas reais. Isso será notado com clareza no caso da área do centro do Recife.

2.3 Singularidades do mercado imobiliário da área central do Recife: do pseudoconcreto ao concreto pensado

Diante da impossibilidade de revelar todas as singularidades presentes no mercado imobiliário metropolitano recifense, escolheu-se o mercado imobiliário da área central da cidade, que abrange o centro histórico e o entorno imediato. Tal mercado foi dinamizado, nos últimos trinta anos, tanto pelas políticas nacionais e demais particularidades anteriormente referidas como em decorrência de transformações socioeconômicas estaduais e locais que culminaram: (i) no crescente interesse de empresas se instalarem no centro, o que vem ocasionando uma transformação na divisão econômica e social desse espaço (mercado secundário de imóveis); (ii) no aumento progressivo do entusiasmo do mercado imobiliário pelo entorno (mercado primário de imóveis); e (iii) na pressão que esse mercado tem exercido sobre o de imóveis usados (mercado secundário de imóveis), principalmente os habitacionais.

A década de 1990 testemunhou a continuação da estagnação da economia brasileira. As baixas taxas de incremento da economia não foram suficientemente alteradas com a inserção do país na lógica de acumulação globalizada, mantendo elevados níveis de desemprego. Isso motivou a adesão de governos locais ao chamado modelo de planejamento estratégico de cidades, com o propósito de atrair empresas. A expectativa de criação de novos postos de trabalho justificaria a concentração dos investimentos públicos em poucas e seletivas áreas da cidade, superando-se, de vez, o planejamento compreensivo (FERNANDES, 2001FERNANDES, A. C. Da reestruturação corporativa à competição entre cidades: lições urbanas sobre os ajustes de interesses globais e locais no capitalismo contemporâneo. Espaço e Debates, n. 41, p. 26-45, 2001.).

Foi nesse contexto que o governo do estado de Pernambuco, em parceria com a Prefeitura do Recife, elegeu o bairro do Recife, nascedouro da cidade, como um dos territórios de atração de investidores. Em 1992, foi elaborado o Plano de Revitalização do Bairro do Recife, com o objetivo de torná-lo centro regional de serviços modernos, comércio, lazer e cultura para os recifenses, além de polo turístico nacional e internacional. Os esforços iniciais foram concentrados na implantação de atividades como bares e restaurantes, mas, a partir do final dos anos 1990, várias dessas atividades fecharam suas portas, em razão da inexistência de uma demanda que deveria ter sido gerada por outras atividades, no próprio bairro.

As estratégias do Plano de Revitalização foram revistas apoiando-se nas oportunidades proporcionadas pela atuação conjunta de acadêmicos, gestores públicos e iniciativa privada, reunidos em torno da implantação de um parque tecnológico em um contexto de abertura nacional do mercado de informática: o Porto Digital (PD).

Com a finalidade de recepcionar empresas, foram realizados investimentos pelo governo estadual na dotação/melhoramento de infraestruturas. Para gerir o projeto, foi criado o Núcleo de Gestão do Porto Digital, uma organização social sem fins lucrativos. Em 2006, a título de incentivo, foi concedida às empresas de tecnologia da informação e comunicação abrigadas no bairro do Recife redução no ISS de 60%, atratividade não desprezível.

Entre 2013 e 2016, foram expandidos a abrangência territorial do PD (Figura 1) e os setores contemplados pela redução do ISS, incluindo os de economia criativa e educacional. Em 2020, o PD abrigava 340 empresas, 151 delas parcialmente isentas do ISS; haviam sido gerados 11.400 empregos, estimulando a recuperação de 100 mil m2 de área construída e com faturamento de R$ 2,86 bilhões (21,7% maior do que o registrado em 2019 (BELFORT, 2021BELFORT, A. F. Porto Digital registra crescimento de 22% do faturamento em 2020. Jornal do Commercio, Recife, 4 mar. 2021. Disponível em: https://jc.ne10.uol.com.br/economia/2021/03/12036845-porto-digital-registra-crescimento-de-22--do-faturamento-em-2020.html. Acesso: 24 set. 2021.
https://jc.ne10.uol.com.br/economia/2021...
).

Figura 1
Área de abrangência territorial do Projeto Porto Digital (PD)

No início dos anos 2000, em decorrência de novos mecanismos regulatórios e da captação de recursos para investimentos imobiliários e da expectativa de continuidade do processo de reabilitação, começaram a emergir investimentos habitacionais no entorno do Centro Histórico recifense, o qual se conformou como “nova fronteira” para investimentos imobiliários, notadamente habitacionais (as chamadas “Torres Gêmeas” foram o marco simbólico inicial desse processo).

Concomitantemente, a política federal de educação superior, com o Programa Universidade para Todos e o Fundo de Financiamento Estudantil, favoreceu a redescoberta, pelo setor privado educacional, do bairro de Santo Antônio, situado no Centro Histórico do Recife (Figura 1). Antigas edificações degradadas foram recuperadas para abrigar cursos e universidades.

Tudo isso aconteceu em um ambiente em que a economia estadual apresentava indicadores positivos. Pernambuco cresceu a uma taxa média de 4,1% a.a., no período de 2007 a 2014, quando o Brasil acusava 3,5% a.a. A construção civil teve incremento médio de 5,9% a.a. no mesmo período, contando, inclusive, com o Programa Minha Casa Minha Vida, inaugurado em 2009 (ARAÚJO; SANTOS, 2018ARAÚJO, T. B.; SANTOS, V. M. dos. A economia pernambucana: dinâmica econômica, mudanças recentes e perspectivas. 2018. Disponível em: https://bityli.com/iMClZcASk. Acesso em: 23 set. 2021.
https://bityli.com/iMClZcASk...
).

Ainda no começo dos anos 2010, começou a ser implantado o Projeto Novo Porto, no Cais do Porto, com o objetivo de recuperar antigos armazéns para abrigar bares, restaurantes, museu, terminal marítimo e outros estabelecimentos. Mais recentemente, assiste-se ao surgimento dos seguintes empreendimentos imobiliários: Projeto Novo Recife (1.042 moradias); Projeto Moinho Recife (ambientes corporativo e residencial - 251 habitações); Hotel Marinas (240 quartos); Hilton Hotel (132 quartos), Centro de Convenções, além de outros empreendimentos habitacionais no bairro de Santo Amaro (Figura 2).

Figura 2
Empreendimentos imobiliários em implantação na área central do Recife (2022)

A articulação dialética entre universalidades-particularidades e singularidades configura um mercado imobiliário bastante diversificado na área de estudo e, como resultado da rígida normativa urbanística protecionista, no Centro Histórico recifense, a oferta de bens imóveis é relativamente inelástica na área. Os proprietários dos imóveis devem, por força da lei, manter suas qualidades arquitetônicas sem promover ampliações de áreas construídas. Existem, assim, duas opções para eles: abandono ou reforma (LACERDA; BERNARDINO, 2020LACERDA, N.; BERNARDINO, I. L. Ressemantização das áreas centrais das cidades brasileiras e mercado imobiliário habitacional: o caso recifense (Brasil). Caderno Metrópoles, São Paulo, v. 22, n. 49, p. 913-934, set./dez. 2020., p. 927).

Em contrapartida, a legislação urbanística, ao permitir no entorno do Centro Histórico remembramentos de terrenos e elevados coeficientes de utilização do solo, confere à oferta forte elasticidade. Assim, está diante de um mercado pautado na negação desse espaço enquanto lugar de moradia (BERNARDINO; LACERDA, 2015BERNARDINO, I.; LACERDA, N. Centros históricos brasileiros: tensões entre a obsolescência imobiliária e a construção de novas espacialidades. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, v. 17, n. 1, p. 61-74, abr. 2015. ) e na implantação de projetos no entorno desse centro, embora o momento atual seja de crise.

Diante do exposto, pode-se afirmar que as determinações gerais (universalidades) inerentes ao mercado imobiliário - com destaque nos últimos anos para a função estratégica do capital financeiro - impulsionaram a formulação e a implementação de políticas nacionais habitacionais que, aliadas a outras políticas públicas, como as direcionadas aos setores de informática e de educação superior, repercutiram no mercado imobiliário da área central do Recife. No entanto, encontraram singularidades locais com as quais se articularam dialeticamente.

Nos bairros do Recife e de Santo Antônio, em um contexto social e economicamente favorável do estado de Pernambuco e da cidade do Recife, nota-se o dinamismo do mercado de compra e venda e de aluguel. Nos bairros de São José e da Boa Vista, a insuficiência de incentivos governamentais e as características socioeconômicas e espaciais herdadas - de bairros comercial e habitacional populares, respectivamente - têm resultado no desinteresse pela realização de investimentos de monta por parte do capital imobiliário e de empresas privadas. Nesses bairros, predomina o mercado de aluguel e assiste-se a processos de arruinamento de bens patrimoniais.

No entorno do Centro Histórico, a expansão do capital imobiliário, especialmente o financeirizado, está sendo realizada desde o início do presente século, o que faz desse entorno uma fronteira de acumulação de capital, em processo de exploração.

Conclusões

Fundamentado no método dialético de base marxista, o presente artigo objetivou mostrar que o entendimento do mercado imobiliário envolve a permanente e sistemática análise relacional entre universalidades-particularidades-singularidades. Esse não é um debate exclusivo nem totalmente inovador. Situa-se no âmbito de um processo amplo de produção social do conhecimento sobre o mercado imobiliário, do qual participam diversos autores com variadas contribuições, muitas das quais foram aqui incorporadas, explícita ou implicitamente.

O trabalho evidencia que o acesso ao conhecimento sobre dado mercado imobiliário e suas singularidades, enquanto concreto pensado, é impossível sem a apreensão das universalidades e a mediação das particularidades, mesmo que esse conhecimento permaneça no domínio do abstrato. Entende-se ser possível tratar o “mercado imobiliário” como uma categoria pensada, histórica e transitória, resultante de processos de abstração que destacam elementos comuns presentes em distintas realidades concretas e os articulam com múltiplas e diferentes determinações, muitas delas tributárias de épocas diferenciadas.

De modo mais preciso, a pretensão deste texto foi mostrar, à luz do materialismo histórico-dialético, que estudos sobre o mercado imobiliário devem - para além de explicitar, claramente, os recortes temporais, espaciais, territoriais e analíticos da totalidade a que se referem, como reza qualquer manual de metodologia científica - considerar os nexos dialéticos existentes entre o singular, o particular e o universal, presentes na totalidade analisada.

Ocupar-se, de maneira isolada, apenas de uma dessas dimensões traz, como consequência, respostas limitadas e incapazes de apreender a realidade como totalidade integrada por múltiplas determinações. O exemplo apresentado do mercado imobiliário da área central do Recife, embora incompleto e inconcluso, é elucidativo nesse sentido.

  • ABRAMO, P. A regulação urbana e o regime urbano: a estrutura urbana, sua reprodutibilidade e o capital. Ensaios FEE, Porto Alegre, v. 16, n. 2, p. 510-555, 1995.
  • ARAÚJO, T. B.; SANTOS, V. M. dos. A economia pernambucana: dinâmica econômica, mudanças recentes e perspectivas. 2018. Disponível em: https://bityli.com/iMClZcASk Acesso em: 23 set. 2021.
    » https://bityli.com/iMClZcASk
  • BELFORT, A. F. Porto Digital registra crescimento de 22% do faturamento em 2020. Jornal do Commercio, Recife, 4 mar. 2021. Disponível em: https://jc.ne10.uol.com.br/economia/2021/03/12036845-porto-digital-registra-crescimento-de-22--do-faturamento-em-2020.html Acesso: 24 set. 2021.
    » https://jc.ne10.uol.com.br/economia/2021/03/12036845-porto-digital-registra-crescimento-de-22--do-faturamento-em-2020.html
  • BERNARDINO, I.; LACERDA, N. Centros históricos brasileiros: tensões entre a obsolescência imobiliária e a construção de novas espacialidades. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, v. 17, n. 1, p. 61-74, abr. 2015.
  • CAPDEVIELLE, J. Le Fétichisme du patrimoine Paris: Presses de la Fondation Nationale des Sciences Politiques, 1986.
  • CARVALHO, E. A totalidade como categoria central na dialética marxista. Outubro. Revista de Estudos Socialistas, n. 15, 1º sem. 2007.
  • FERNANDES, A. C. Da reestruturação corporativa à competição entre cidades: lições urbanas sobre os ajustes de interesses globais e locais no capitalismo contemporâneo. Espaço e Debates, n. 41, p. 26-45, 2001.
  • GOOGLE. Google Earth website Disponível em: http://earth.google.com/. Acesso em: 12 dez. 2021.
    » http://earth.google.com
  • GRANELLE, J-J. Économie immobilière. Analyses et applications Paris: Economica, 1998.
  • HARVEY, D. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. São Paulo: Loyola, 1990.
  • HARVEY, D. Os limites do capital São Paulo: Boitempo, 2013.
  • KOSIK, K. Dialética do concreto Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.
  • LACERDA, N.; BERNARDINO, I. L. Ressemantização das áreas centrais das cidades brasileiras e mercado imobiliário habitacional: o caso recifense (Brasil). Caderno Metrópoles, São Paulo, v. 22, n. 49, p. 913-934, set./dez. 2020.
  • LOGAN, J. R.; MOLOTCH, H. L. The city as a growth machine. In: FAINSTEIN, S.; CAMPBELL, S. (ed.). Urban Theory Oxford: Blackwell. p. 291-337, 1996.
  • LUKÁCS, G. Existencialismo ou marxismo São Paulo: Senzala, 1967.
  • LUKÁCS, G. O jovem Marx e outros escritos de filosofia Rio de Janeiro: Ed. da UFRJ, 2009.
  • MARX, K. Gundrisses. manuscritos econômicos de 1857-1858: esboços da economia política. São Paulo: Boitempo ; Rio de Janeiro: Ed. da UFRJ , 2011.
  • MULLER, M. L. Exposição e método dialético em O Capital. Boletim SEAF, Belo Horizonte, 2, 1982. Disponível em: https://eleuterioprado.files.wordpress.com/2015/09/muller-exposic3a7c3a3o-e-mc3a9todo-dialc3a9tico-em-marx.pdf Acesso em: 26 jan. 2021.
    » https://eleuterioprado.files.wordpress.com/2015/09/muller-exposic3a7c3a3o-e-mc3a9todo-dialc3a9tico-em-marx.pdf
  • NAKAGAWA, F. Valorização de imóvel no Brasil foi a maior do mundo nos últimos 5 anos. O Estadão, São Paulo, 17 jan. 2014. Disponível em Disponível em http://economia.estadao.com.br/noticias/economia-geral,valorizacao-de-imovel-no-brasil-foi-a-maior-do-mundo-nos-ultimos-5-anos,175663,0.htm Acesso em: 2 abr. 2014.
    » http://economia.estadao.com.br/noticias/economia-geral,valorizacao-de-imovel-no-brasil-foi-a-maior-do-mundo-nos-ultimos-5-anos,175663,0.htm
  • NETTO, J. P. Introdução ao estudo do método de Marx São Paulo: Expressão Popular, 2011.
  • NUNES, B. F.; NUNES, C. G. F.; LACERDA, N. Planejamento urbano, arquitetura e urbanismo: a serviços de uma outra geografia? Revista Sociedade e Estado, v. 31, n. esp., p. 989-1001, 2017.
  • PASQUALINI, J. C.; MARTINS, L. M. Dialética singular-particular-universal: implicações do método materialista dialético para a psicologia. Psicologia & Sociedade, 2015 27(2), 362-371.
  • PIKETTY, T. O capital no século XXI Rio de Janeiro: Intrínseca, 2014.
  • RECIFE. Lei Municipal no 18.168/2015. Altera a Lei nº 17.244/2006, que institui o programa de incentivo ao Porto Digital, quanto às áreas contempladas e à aplicação dos benefícios aos serviços de educação à distância. Diário Oficial do Recife, Recife, 9 out. 2015.
  • ROSDOLSKY, R. Gênese estrutura de O Capital de Karl Marx Rio de Janeiro: Eduerj; Contraponto, 2001.
  • RUFINO, M. B. C. Financeirização do imobiliário e transformações na produção do espaço urbano. In: FERREIRA, A.; RUA, J.; MATTOS, R. C. (org.). O espaço e a metropolização: cotidiano e ação. Rio de Janeiro: Consequência, 2017.
  • TAVARES, M. da C. Da substituição de importações ao capital financeiro. Ensaios sobre a economia brasileira Rio de Janeiro: Zahar, 1981.
  • TOPALOV, C. Le Profit, la rente et la ville: éléments de théorie. Paris: Economica , 1984 .
  • 1
    Abstração aqui é entendida como o procedimento que extrai um objeto de seu contexto (da totalidade em que se insere), isola-o para examiná-lo e, depois, o devolve para o todo, integrando-o às múltiplas determinações desse todo.
  • 2
    Determinações “são traços pertinentes aos elementos constitutivos da realidade; nas palavras de um analista, para Marx, a determinação é um ‘momento essencial constitutivo do objeto’” (DUSSEL, 1985, p. 32 apud NETTO, 2011NETTO, J. P. Introdução ao estudo do método de Marx. São Paulo: Expressão Popular, 2011., p. 45).
  • 3
    Para Marx, a teoria não se resume ao exame sistemático, à descrição das formas de manifestação de um objeto ou à construção de modelos de causa-efeito explicativos de fenômenos pelo pesquisador. Para ele, o conhecimento teórico é o conhecimento que o pesquisador constrói, em sua mente, da estrutura e da dinâmica do objeto da pesquisa, tal como ele é na sua existência real (NETTO, 2011NETTO, J. P. Introdução ao estudo do método de Marx. São Paulo: Expressão Popular, 2011.).
  • 4
    Conforme Netto (2011NETTO, J. P. Introdução ao estudo do método de Marx. São Paulo: Expressão Popular, 2011., p. 46), para Marx, categorias “exprimem [...] formas de modo de ser, determinações de existência, frequentemente aspectos isolados de [uma] sociedade determinada” - ou seja: elas são objetivas, reais (pertencem à ordem do ser, são categorias ontológicas).
  • 5
    Vale realçar que, por trabalhar com informações secundárias e procedentes de outros estudos, não foi possível, no presente artigo, aprofundar a análise e apresentar dados relacionados à participação do capital financeiro no mercado imobiliário da área de estudo no momento atual, embora se reconheçam a necessidade e a emergência de proceder a estudos nesse sentido.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    02 Fev 2022
  • Aceito
    26 Jun 2022
Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional - ANPUR FAU Cidade Universitária, Rua do Lago, 876, CEP: 05508-080, São Paulo, SP - Brasil, Tel: (31) 3409-7157 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@anpur.org.br