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Um evento e alguns cabos de guerra: o Seminário Internacional Criação de Novas Cidades, 1958 1 1 Parte deste texto tem origem na tese de doutorado Arquitetura e engajamento: o IAB, o debate profissional e suas arenas transnacionais (1920-1970). A autora agradece à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) pelo auxílio financeiro, bem como à Amália Cristóvão dos Santos, Glória Kok e Pedro Lopes pela oportunidade de debate de seu conteúdo em versão preliminar.

Resumo

O artigo analisa o Seminário Internacional “Criação de Novas Cidades”, promovido no Rio de Janeiro, em 1958, pelo Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura, com a colaboração da União Internacional dos Arquitetos, do Instituto de Arquitetos do Brasil e da Companhia Urbanizadora da Nova Capital. A partir desse evento transnacional, multidisciplinar e interinstitucional, busca-se apreender algumas tensões disciplinares na disputa por legitimidade de modos de pensar e fazer as cidades novas, com foco nas estratégias mobilizadas pelos arquitetos e urbanistas. A análise ancora-se, sobretudo, em registros oficiais do evento e em notícias veiculadas no jornalismo cotidiano carioca, que nos fornecem versões múltiplas sobre os acontecimentos.

Palavras-chave:
Urbanismo; Instituições; Cidades Novas; Brasília; Ibecc; UIA; IAB

Abstract

This article discusses the International Seminar on the “Creation of New Towns”, held in Rio de Janeiro, in 1958, promoted by the Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura [Brazilian Institute of Education, Science and Culture], with the collaboration of the International Union of Architects, the Instituto de Arquitetos do Brasil [Brazilian Institute of Architects] and the Companhia Urbanizadora da Nova Capital [Urbanization Company of the New Capital]. Through this transnational, multidisciplinary and interinstitutional event, this article seeks to understand some of the disciplinary tensions in the dispute to legitimize the ways of thinking about and creating new cities, focusing on the strategies mobilized by architects and urban planners. The analysis is mainly based on official records of the seminar and on news items published by the daily press in Rio de Janeiro, which provide us with multiple versions of what took place.

Keywords:
Urbanism; Institutions; New Towns; Brasília; Ibecc; UIA; IAB

Em outubro de 1958, o Seminário Internacional “Criação de Novas Cidades” foi realizado no Rio de Janeiro, a então capital do país, e em Brasília, naquele momento em processo avançado de construção. Na perspectiva de seus organizadores, o tema era proposto por sua urgência: a “trágica situação” das cidades existentes e o drama de suas populações escancaravam a necessidade de formas urbanas e regionais mais adequadas aos seus anseios. Segundo o temário, sem fazer citações específicas, esforços de todo o mundo se voltavam ao enfrentamento da “decadência, da incapacidade das cidades atuais, do drama das populações dispersas, ou, então, amontoadas sem a mínima atenção às suas necessidades” (IAB-RJ, 1958aIAB-RJ. Instituto de Arquitetos do Brasil-RJ. Boletim Mensal, Rio de Janeiro, n. 10, out. 1958a., p. 97). Promovido pelo Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura (Ibecc), com a colaboração da União Internacional dos Arquitetos (UIA), do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) e da Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap), o evento pretendia amparar o debate amplo e livre sobre o tema - intenção que, aos poucos, foi redesenhada com intuitos mais pragmáticos (id., Ib.).

Apesar de seu pequeno porte, o seminário foi extensamente noticiado pela imprensa diária, sobretudo carioca, que veiculou preparativos, expectativas, debates, conclusões e impressões pessoais - um interesse intenso que contrasta com a menor atenção dedicada ao evento pelos periódicos especializados voltados aos profissionais da arquitetura e do urbanismo. Este artigo, amparado em registros oficiais do encontro e nessa miríade difusa de notícias, que expressa versões múltiplas sobre os acontecimentos, pretende situar relacionalmente atuações, agentes, discursos e estratégias em disputa por voz acerca das cidades novas planejadas.

Não era tema novo, mas estava na ordem do dia, em âmbito brasileiro e internacional, visto que, ao final da década de 1950, tratava-se de uma produção urbanística nacional expressiva que ia muito além de Brasília: das novas capitais estaduais às cidades balneárias, das cidades para ocupação do território às diretamente associadas aos empreendimentos agrícolas ou imobiliários, das vilas operárias às cidades-companhia (TREVISAN, 2020TREVISAN, R. Cidades novas. Brasília: Editora da UnB, 2020.).2 2 São muitos os casos que aqui poderiam ser citados para ilustrar essa variedade, tais como Belo Horizonte, como capital do estado de Minas Gerais; a cidade balneária de Águas de Lindoia (SP); Nova Veneza (GO) como assentamento de colonização; a cidade de Paulo Afonso (BA) construída em razão da barragem e da usina hidrelétrica; de Caraíba (BA) e Serra do Navio (AP) como vilas operárias e cidades-companhia (TREVISAN, 2020). Considerando a profusão e a qualidade dos trabalhos recentes produzidos sobre as cidades novas do ponto de vista da história intelectual, o objetivo aqui é, sobretudo, apreender algumas das tensões intra e interdisciplinares na disputa por legitimidade de modos de pensar e fazer as cidades novas, com base em um olhar para um evento transnacional, multidisciplinar e interinstitucional.3 3 A este artigo interessa, sobretudo, contribuir com a reflexão sobre a história das profissões, pensando os embates pela delimitação de atribuições e fronteiras em uma perspectiva de campo tal como proposta por Pierre Bourdieu, mas também as disputas internas acerca da validação de modos de atuação. Para o mergulho na historiografia sobre as cidades novas, são muitos os escritos relevantes sobre o tema, de pesquisadores como Carlos Roberto Monteiro de Andrade, Ricardo Trevisan, Rogério Quintanilha, Telma de Barros Correia, Maria Cristina Leme, entre outros, no cenário nacional, ou como Donatella Calabi, Françoise Choay, Jean-Louis Huot, Pierre Merlin, Rassem Khamaisi, entre outros, em âmbito internacional.

Se são anos nos quais os arquitetos legitimam-se socialmente como um grupo profissional capaz de assumir as grandes tarefas do urbanismo, ocupando em parte o lugar que antes cabia aos engenheiros e ao saber Beaux-Arts, eles terão que, por um lado, conciliar seu modo habitual de operação - muito associado à identidade liberal, generalista e ao gênio individual - com uma perspectiva de especialização e de multidisciplinaridade na elaboração de planos urbanos, e, por outro, negociar o seu lugar com profissionais de outras disciplinas, que também buscavam voz no debate (DURAND, 1972DURAND, J. C. G. A profissão de arquiteto. São Paulo: Crea-Pini, 1972.).

1. Entre o encontro livre e o seminário pragmático

Em primeiro lugar, é interessante perceber a oscilação dos objetivos atribuídos ao seminário. Em janeiro de 1958, quando ainda era prevista a sua realização em São Paulo, o boletim do departamento paulista do IAB anunciava o evento como um encontro de intelectuais reunidos ao redor de questões que “renovariam o estudo das comunidades tradicionais, do ponto de vista do habitat, da demografia, da psicologia, dos efeitos da industrialização”, dentre outras abordagens possíveis. A aposta era que tal variedade de problemas, “de ordem cultural, artística, filosófica, sociológica, econômica e jurídica”, afastaria a discussão de um caráter técnico ao considerar os “vários aspectos humanos” (IAB-SP, 1958aIAB-SP. Instituto de Arquitetos do Brasil-SP. Encontro de Intelectuais em São Paulo. Boletim IAB-SP, São Paulo, n. 47, p. 2, jan. 1958a., p. 2).

Já de início, ao se afastar dos técnicos e se aproximar dos intelectuais, o seminário excluía parte dos profissionais que até então assumiram uma fatia considerável da tarefa de pensar os novos assentamentos: os engenheiros. Vale lembrar que, desde 1933, com a regulamentação profissional estabelecida pelo Decreto nº 23.569 (BRASIL, 1933BRASIL. Decreto nº 23.569 de 11 de dezembro de 1933. Regula o exercício das profissões de engenheiro, de arquiteto e de agrimensor. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, 15 dez. 1933.), dentre outras sobreposições, eram atribuições comuns ao arquiteto e ao engenheiro o projeto, a direção e a fiscalização dos serviços de urbanismo. As insatisfações com essa coincidência legal e o embate pelo estabelecimento de uma visão social e legal da especificidade da profissão eram, no final dos anos 1950, pauta central da luta dos arquitetos, de modo que não podemos ignorar a ausência, aparentemente intencional, dos engenheiros no evento (OLIVEIRA, 2011OLIVEIRA, A. F. de. A regulamentação do exercício profissional da arquitetura no Brasil. 2011. Tese (Doutorado) - Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2011.).

Após algumas notícias que indicavam contratempos na organização do encontro, a coluna do crítico de arte Jayme Maurício no Correio da Manhã de 5 de agosto de 1958 anunciava os novos planos, acordados em reunião no Itamaraty, com representantes das instituições envolvidas - dentre eles estava Oscar Niemeyer, provavelmente representando a Novacap, e que, segundo Maurício, parecia ter tomado as rédeas da discussão. Com a retirada do apoio financeiro da Fundação Matarazzo e o subsídio quase integral assumido pelo Governo Federal, o evento seria transferido para o Rio de Janeiro e sua organização passaria das mãos do IAB-SP para as do IAB-RJ. Mais do que isso, antes chamado de encontro ou simpósio e pensado de modo mais ambicioso, seria relegado ao estatuto mais simples de “mesa-redonda de arquitetos e urbanistas” (MAURÍCIO, 1958aMAURICIO, J. O Ibecc promoverá mesa-redonda de arquitetos. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, ano 58, n. 20.048, 5 ago. 1958a, 1º Caderno, p. 18.).

Se a intenção era de que os arquitetos e urbanistas fossem maioria, o tom que justificava a reunião também assumia outra conotação. Sociólogos, economistas e sanitaristas seriam convidados apenas como observadores, já que a “dispersão excessiva”, para além das questões do plano urbanístico e arquitetônico, resultaria em um debate “demasiado vago” (MAURÍCIO, 1958aMAURICIO, J. O Ibecc promoverá mesa-redonda de arquitetos. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, ano 58, n. 20.048, 5 ago. 1958a, 1º Caderno, p. 18.). Segundo Ary Garcia Roza, então presidente nacional do IAB, não se tratava de iniciar um debate, já abordado em inúmeros outros momentos, mas de assumir uma série de conclusões como ponto de partida para uma discussão pragmática sobre as cidades novas e para o delineamento de planos objetivos, “necessários à ação prática” (SEMINÁRIO..., 1958aSEMINÁRIO, Habitat, São Paulo, n. 50, p. 94, set./out. 1958a.).

É verdade que, só naquele ano de 1958, foram alguns os eventos que, de algum modo, abordaram os novos assentamentos. Podemos citar o IV Congresso da UIA, realizado em Moscou, com o tema “Construção e reconstrução de cidades” (cujos anais foram distribuídos aos participantes do seminário); o 24º Congresso da International Federation of Housing and Town Planning (IFHTP), em Liége, na Bélgica, com o tema “Planejamento e problemas urbanos na região”; ou o Seminário de Técnicos e Funcionários em Planejamento Urbano, em Bogotá, Colômbia, organizado pelo Centro Interamericano de Habitação e Planejamento da Organização dos Estados Americanos (CINVA/OEA). A eles poderíamos somar a última e conflituosa edição do Congresso Internacional de Arquitetura Moderna (Ciam), realizada no ano seguinte (MUMFORD, 2002MUMFORD, E. P. The CIAM Discourse on Urbanism, 1928-1960. Cambridge, London: MIT Press, 2002.; OUTTES, 2015OUTTES, J. A internacional urbana e o desenvolvimento regional: a Questão Regional na IFHP - International Federation for Housing and Planning (Federação Internacional de Habitação e Urbanismo) e na UCLG - United Cities and Local Governments (União de Cidades e Governos Locais) em uma perspectiva comparada (1913-2014). In: Encontros Nacionais da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional, 16., 2015, Belo Horizonte. Anais [...]. Belo Horizonte: Enanpur, 2015. Tema: Espaço, planejamento e insurgências: alternativas contemporâneas para o desenvolvimento urbano e regional.; VAGO, 1998VAGO, P. (org.). UIA 1948-1998. Paris: Les Editions de l’Epure, 1998.).

Justamente, com base em tais encontros, é interessante problematizar a expectativa de pragmatismo e consenso proposta por Garcia Roza: se neles as abordagens da questão do planejamento do território eram múltiplas, a ausência de pontos pacíficos sobre os caminhos a serem seguidos era certa, sobretudo no que dizia respeito à criação de novas cidades. Os assentamentos humanos intencionalmente criados, ainda que muito anteriores à constituição da disciplina da arquitetura e do urbanismo, são um tema caro a tais profissionais desde o final do século XIX, especialmente a partir de meados do século XX no contexto da reconstrução europeia e da explosão demográfica das cidades americanas, africanas e asiáticas. Se em termos geográficos se trata de um fenômeno que extrapola o âmbito norte-europeu, no campo da teoria urbanística o debate das new towns na Inglaterra e das cités nouvelles na França são fundantes de um entendimento, associado à perspectiva de controlar a expansão das grandes cidades pela criação de novos núcleos, que terá grande circulação global como resultado da criação de redes intelectuais, com agentes e espaços diversos de interlocução (TREVISAN, 2020TREVISAN, R. Cidades novas. Brasília: Editora da UnB, 2020.). Nesse sentido, é relevante que o seminário transcorra justamente nos idiomas inglês e francês.

Dentre os vários fóruns especializados que adensaram de modo complexo a perspectiva crítica profissional sobre o tema, as muitas posturas assumidas ao longo da trajetória dos Ciams em relação às cidades novas - da Carta de Atenas à Carta do Habitat - tiveram grande ressonância no campo profissional do ponto de vista da apropriação das ideias defendidas pela entidade, inclusive no Brasil (MUMFORD, 2002MUMFORD, E. P. The CIAM Discourse on Urbanism, 1928-1960. Cambridge, London: MIT Press, 2002.). Ainda que essa correspondência estreita possa hoje ser questionada, para muitos, à época, Brasília era um dos poucos exemplos concretizados da ideia da cidade funcionalista, construída justamente quando o ideário em questão passava a ser fortemente questionado.

Com efeito, à pretensão de racionalidade e funcionalidade somavam-se propostas de mistura e diversidade; à normatividade e generalidade, propunha-se a busca de identidades e individualidades, contrapondo a perspectiva da tábula rasa à consideração das preexistências; da idealização moderna da verdade, da simplicidade e da homogeneidade, emergia a aposta na complexidade e na heterogeneidade da vida cotidiana; diante da aposta na técnica, na tecnocracia, na autoridade do Estado, na intervenção de grande escala, retomavam-se a escala humana, o pequeno recorte e a participação; à centralidade do arquiteto individual, opunham-se o trabalho coletivo, a multidisciplinaridade e a convocação de saberes múltiplos para o pensamento acerca da cidade.

2. Brasília: um desconforto latente

Assim, realizado em solo brasileiro e às vésperas de sua inauguração, era de esperar que o seminário, ainda que não pretendesse versar unicamente sobre a nova capital, se tornasse quase um referendo sobre sua validade. Brasília era um tema fresco e controverso. Ao mesmo tempo que se tornava uma “vedete” na Europa e importante instrumento da diplomacia cultural brasileira, discutida intensamente pelo grande público brasileiro, os arquitetos nacionais haviam assumido certo silêncio em torno do tema, após a ampla polêmica que decorreu do anúncio da transferência da capital, das negociações para sua materialização e do tumultuado e apressado concurso para a escolha do plano - no qual é importante destacar a oposição solitária de Paulo Antunes Ribeiro, representante do IAB, ao julgamento (DEDECCA, 2018DEDECCA, P. Arquitetura e engajamento: o IAB, o debate profissional e suas arenas transnacionais (1920-1970). 2018. Tese (Doutorado) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. ; TAVARES, 2004TAVARES, J. Projetos para Brasília e a cultura urbanística nacional. 2004. Dissertação (Mestrado) - Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo, São Carlos, 2004.).

Pode-se dizer que a repercussão do resultado na imprensa foi em boa medida negativa, colocando em questão a validade e a competência do concurso, bem como a qualidade do projeto ganhador. Mas, apesar do posicionamento de seu representante, o IAB não deu vazão a esses descontentamentos, marcando um ponto de inflexão na tensão crescente, que extrapolava o assunto da nova capital e opunha profissionais brasileiros quanto às suas opções estéticas e políticas. Muito rapidamente, em 1957, a instituição aderiu ao discurso pacificador, encabeçado pelos arquitetos paulistas, em prol do encerramento das polêmicas e do restabelecimento da união entre os profissionais brasileiros, em sintonia com as novas coordenadas, que conduziam a uma aliança em torno do plano de desenvolvimento nacional e ao embate pela autonomia e pelo protagonismo da profissão. Afinal, era necessário manter a coesão para garantir força no debate público (DEDECCA, 2018DEDECCA, P. Arquitetura e engajamento: o IAB, o debate profissional e suas arenas transnacionais (1920-1970). 2018. Tese (Doutorado) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. ).

Entretanto, o desconforto ainda estava latente: voltemos à reunião no Itamaraty e a um alerta de Niemeyer, reproduzido por Jayme Maurício, sobre a decisão de transferir para o IAB-RJ a responsabilidade da organização do seminário. Revelando a instabilidade da trégua, sobretudo entre seus pares cariocas, Niemeyer declarava, em tom pouco conciliatório, que era preciso esclarecer que Lúcio Costa e ele já não pertenciam ao Instituto, portanto, não poderiam se submeter às decisões ali tomadas (MAURÍCIO, 1958aMAURICIO, J. O Ibecc promoverá mesa-redonda de arquitetos. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, ano 58, n. 20.048, 5 ago. 1958a, 1º Caderno, p. 18.). Não é irrelevante que os dois autores da Nova Capital fizessem questão de anunciar, na grande imprensa, que não estavam mais associados ao IAB, justamente quando a entidade ampliava sua representatividade, abrangência e aderência territorial em âmbito nacional e internacional.

Ao final, ainda que anunciados, Costa e Niemeyer não participaram do seminário. No entanto, embora em sua composição de participantes de relevo figurassem diversos arquitetos que haviam submetido propostas para a nova capital, como Roberto e Henrique Mindlin, Vilanova Artigas e Milton Ghirardi, por exemplo, o evento não parece ter sido intencionalmente organizado para uma retomada da polêmica sobre o concurso, fosse por seu laço de origem com a Unesco, fosse pela postura assumida pelos arquitetos no encontro, como veremos. Não há dúvidas, porém, de que seus debates desempenharão o papel de pensar o debate teórico sobre as novas cidades para muito além do que fora proposto por Lúcio Costa para Brasília, notadamente no que diz respeito à crença no desenho como instrumento supremo de controle do ambiente urbano, reposicionando a discussão em termos de planejamento do processo e gestão.

Ao alerta feito por Niemeyer, o jurista Themístocles Cavalcanti, então presidente do Ibecc, ex-procurador-geral da República e futuro ministro do Tribunal Superior Federal, imediatamente esclareceu: “Aceitei o Instituto de Arquitetos por ser uma entidade organizada, como poderia aceitar outra, sem preferências”. E acrescentou: “A reunião que vamos promover é da Unesco, do Ibecc e do Itamaraty e de todos aqueles que desejarem estudar os problemas arquitetônicos e urbanísticos das novas cidades” (MAURÍCIO, 1958aMAURICIO, J. O Ibecc promoverá mesa-redonda de arquitetos. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, ano 58, n. 20.048, 5 ago. 1958a, 1º Caderno, p. 18., p.18). Trata-se de uma resposta igualmente reveladora de outra disputa em curso: a quais profissões competiam o planejamento de uma nova cidade ou a discussão sobre as condições e eleições dessa empreitada?

Certamente Kubitschek procurou amparar a transferência da capital em opiniões profissionais diversas, cujos argumentos passaram pela necessária interiorização, pela perspectiva de modernização nacional de infraestrutura e de industrialização, sempre permeadas pelas ideologias nacional-desenvolvimentistas. Outros tantos intelectuais levantaram argumentos contrários. Mas, o fato é que, apesar dessa diversidade de saberes, segundo o edital do concurso para a escolha do Plano Piloto, poderiam participar unicamente as equipes dirigidas por profissionais habilitados para o exercício da engenharia, da arquitetura e do urbanismo - essa prerrogativa, afinal, era uma luta histórica do IAB (DEDECCA, 2018DEDECCA, P. Arquitetura e engajamento: o IAB, o debate profissional e suas arenas transnacionais (1920-1970). 2018. Tese (Doutorado) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. ; TAVARES, 2004TAVARES, J. Projetos para Brasília e a cultura urbanística nacional. 2004. Dissertação (Mestrado) - Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo, São Carlos, 2004.).

Caberia aos arquitetos, portanto, convocar ou não outros saberes, e muitos o fizeram ao comporem equipes multidisciplinares. Lúcio Costa não convocou nem ao menos seus pares. Um único arquiteto, um relatório justificativo significativamente menor do que o das demais submissões (“sumário”, nas próprias palavras do autor), um projeto que, sem entrarmos no mérito de sua qualidade, sobressaía também pela valorização, em solo brasileiro, naquele momento, da ideia do gênio e do discurso genial - quando justamente outros modos de atuação, em rede, multidisciplinares, mais coletivos e especializados, ganhavam relevância (BRAGA, 2010BRAGA, M. O concurso de Brasília: sete projetos para uma capital. São PauloCosac Naify; Imprensa Oficial do Estado Museu da Casa Brasileira, 2010.; LIERNUR, 2004LIERNUR, J. Vanguardistas versus expertos. Block, n. 6, p. 18-39, 2004.). “Não pretendia competir e, na verdade não concorro, apenas me desvencilho de uma solução possível, que não foi procurada, mas surgiu, por assim dizer, já pronta”, diria Lúcio Costa, ao se afastar intencionalmente da posição de “técnico devidamente aparelhado” (BRAGA, 2010BRAGA, M. O concurso de Brasília: sete projetos para uma capital. São PauloCosac Naify; Imprensa Oficial do Estado Museu da Casa Brasileira, 2010., p. 164).

No caso do seminário sobre a criação de novas cidades, o equilíbrio de forças era outro. O IAB e a UIA indicariam os convidados, e estes seriam aceitos ou não pelo Ibecc. Poucas notícias temos sobre os meandros do processo de composição das mesas, mas conhecemos os indicados que ficaram de fora, quer por descarte do Ibecc, quer por indisponibilidade pessoal - Lewis Mumford, Sigfried Giedion, Clarence Stein, Josep Lluís Sert, Le Corbusier e Walter Gropius. Sabemos também, como se verá adiante, que novas figuras, de outros campos profissionais, entraram na composição, quebrando o plano inicial de restringir o debate a arquitetos e urbanistas (ENCONTRO..., 1958aENCONTRO Intelectual sobre Planejamento. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, ano 28, n.10.845, p. 8, 23 mar. 1958a.; IAB-SP, 1958bIAB-SP. Instituto de Arquitetos do Brasil-SP. Encontro Internacional de Arquitetos. Boletim IAB-SP, São Paulo, n. 55, p. 1, set. 1958b.).

3. Redes institucionais tensionadas

É interessante repassarmos, rapidamente, o leque considerável de instituições envolvidas na organização do evento, se considerado seu porte relativamente pequeno. O Ibecc, fundado em 1946 e vinculado ao Ministério das Relações Exteriores (MRE), constituía-se como a comissão nacional da Unesco no Brasil e tinha o intuito de gerenciar seus projetos na esfera local, nos quais se envolviam profissionais de disciplinas diversas, como cientistas naturais, matemáticos, folcloristas, educadores e sociólogos. Amparado majoritariamente pela subvenção do Governo Federal, objetivava apoiar a produção e o intercâmbio de conhecimento, sobretudo em âmbito internacional, estimular a educação básica e a cultura e salvaguardar o patrimônio, em seu entendimento alargado, assumindo a ciência como eixo de desenvolvimento das nações e mobilizando noções como as de “construção do homem livre” e de “conhecimento puro e desinteressado” (ABRANTES, 2008 ABRANTES, A. Ciência, educação e sociedade: o caso do Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura (Ibecc) e da Fundação Brasileira de Ensino de Ciências (Funbec). 2008. Tese (Doutorado) - Casa de Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2008.).

Vale lembrar que foi somente após 1945 que a política cultural do Brasil no exterior se estruturou de forma mais organizada, ganhando importância nas diferentes instâncias governamentais, ampliando seu conceito de cultura nacional, diversificando seus destinatários, modificando o conteúdo de suas ações e os valores eleitos para a promoção externa do país (DUMONT; FLÉTCHET, 2014DUMONT, J.; FLÉTCHET, A. “Pelo que é nosso!”: a diplomacia cultural brasileira no século XX. Revista Brasileira de História, v. 34, n. 67, p. 203-221, 2014.). Em um contexto marcado pela Guerra Fria, pela descolonização e pela diversificação dos intercâmbios econômicos e culturais, a Divisão Cultural do Itamaraty, criada em 1946, ampliaria suas atribuições, incorporando acordos de cooperação técnica e científica, de difusão da língua, das artes, das letras, da música e da arquitetura brasileira, dentro do entendimento da diplomacia cultural de uma potência secundária como ferramenta política (SUPPO; LESSA, 2012SUPPO, H. R.; LESSA, M. L. (org.). A quarta dimensão das relações internacionais: a dimensão cultural. Rio de Janeiro: Contracapa; Faperj, 2012.).

Ainda que o papel exercido pelo MRE nas movimentações do campo da arquitetura e do urbanismo no Brasil permaneça pouco avaliado, sabemos que, no caso das interações com o IAB, seu apoio logístico e financeiro está atrelado a uma efervescência de acontecimentos, sobretudo nos anos 1950 e meados de 1960 - dentre os quais podemos incluir o presente seminário. Considerando o trânsito intenso da produção arquitetônica brasileira no exterior no período, é improvável que seja mera coincidência a irradiação complexa de críticas positivas e esse esforço governamental sistemático, que substitui uma rede ainda precária de interlocução (DEDECCA, 2018DEDECCA, P. Arquitetura e engajamento: o IAB, o debate profissional e suas arenas transnacionais (1920-1970). 2018. Tese (Doutorado) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. ).

Talvez em razão de seu vínculo governamental, o Ibecc, ao nascer, já contasse com ampla inserção no meio intelectual e institucional brasileiro. Nesse momento, UIA e IAB também eram nós importantes das redes nacionais e internacionais de interlocução institucional dos arquitetos. Fundada em 1948, a UIA já naquele momento se firmava como instituição de referência para solicitações, privadas e estatais, de grande escala, em assuntos de arquitetura e urbanismo. Embora se mantendo como uma pequena organização do ponto de vista de sua estrutura administrativa, a entidade explorava as polarizações da Guerra Fria e conquistava um lugar influente de mediação (GLENDINNING, 2009 GLENDINNING, M. Cold-War conciliation: international architectural congresses in the late 1950s and early 1960s. The Journal of Architecture, v. 14, n. 2, p. 197-217, 2009.).

Não é estranho o envolvimento da Novacap, uma vez que a visita às suas obras era parte da programação do seminário. Ao IAB e à UIA caberiam a preparação do encontro, a sugestão de convidados e a produção de documentos para subsidiar o debate. O Ibecc cuidaria da eleição dos membros de cada mesa.

Entender as instituições envolvidas na preparação do seminário não é algo de menor importância. Cada uma, naquele momento, estabelecia estratégias de legitimação nos respectivos campos de atuação e tinha interesses específicos no modo como o tema seria tratado e por quem. Nesse sentido, trata-se também de discutir como o debate acerca das novas cidades operava dentro dessa rede política de relações institucionais de validação e valoração de ideias e ideais.

A impressão é de que, em tal encontro, se travavam alguns jogos de cabo de guerra: entre arquitetos e não arquitetos; entre arquitetos que pretendiam tensionar o frágil consenso ao redor de Brasília e os que buscavam mobilizar o evento como instrumento de legitimação; e mesmo entre gerações. Instalado o Congresso, imperou a diplomacia, não sem o crítico Jayme Maurício, que acompanhava de perto os acontecimentos, perceber a latência de descontentamentos:

Um clima de cordialidade presidiu a sessão de abertura e aos drinks. As mais diversas correntes, as mais antagônicas posições, mágoas, ressentimentos, tudo desapareceu na preocupação de tornar eficiente a reunião. O alto padrão intelectual e a consciência aguda dos arquitetos conduz[em], mais que em nenhuma outra classe, a um nível elevado de discussões e relações. Entretanto, perduram algumas dúvidas. Há certas sensibilidades em constante alerta: há inúmeras reivindicações aguardando o momento oportuno; há também um aparente ceticismo; e há um grupo de jovens terrivelmente atentos às falas dos seus majores, achando, inclusive, que a “velha guarda” está meio borocochô e é chegada a vez de sangue novo entrar em cena. Um número considerável de jovens arquitetos espera repetir as façanhas dos pioneiros - mas eles não saem da frente, dizem. (MAURÍCIO, 1958c MAURICIO, J Instalada ontem no MAM. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, ano 58, n. 20.102, p. 18, 7 out. 1958c., p. 18).

Figura 1
Notícia sobre o seminário (1958)

O seminário estruturou-se em dois momentos: os debates no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, entre os dias 6 e 9 de outubro de 1958, e a visita a Brasília, entre os dias 10 e 12 do mesmo mês. Em solo carioca, três mesas foram organizadas ancoradas nos temas “Programa”, “Plano” e “Realização”, propostos “tout court” por Niemeyer, já que “maiores minúcias não caberiam em face do tempo” (MAURÍCIO, 1958aMAURICIO, J. O Ibecc promoverá mesa-redonda de arquitetos. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, ano 58, n. 20.048, 5 ago. 1958a, 1º Caderno, p. 18.). Tais mesas foram organizadas de modo não simultâneo, a fim de viabilizar a participação integral de todos no evento, e eram intercaladas com momentos cerimoniais e de sociabilidade. Mesmo assim, sobraram críticas ao tempo exíguo diante do temário amplo. Ao final, uma sessão plenária foi realizada apoiada na relatoria de cada um dos temas (IAB-RJ, 1958aIAB-RJ. Instituto de Arquitetos do Brasil-RJ. Boletim Mensal, Rio de Janeiro, n. 10, out. 1958a.).

Ao lado dos convidados, eram 76 participantes, segundo lista transcrita no Boletim do IAB-RJ.4 4 Vale dizer que a análise da lista de participantes é uma frente interessante de desenvolvimento, que foge das possibilidades do artigo aqui apresentadas. O seminário transcorreu em inglês e em francês - o que em si era um impedimento para alguns ouvintes. A presença massiva era de arquitetos brasileiros, 80% cariocas, mas contava também com estudantes, ecologistas, engenheiros, urbanistas (sem o prefixo de arquitetos) e representantes das instituições envolvidas (IAB-RJ, 1958aIAB-RJ. Instituto de Arquitetos do Brasil-RJ. Boletim Mensal, Rio de Janeiro, n. 10, out. 1958a.). Para Garcia Roza, era lamentável a ausência de jovens e das instituições de engenharia. Para Jayme Maurício, eram poucos, porém seletos (MAURÍCIO, 1958d MAURICIO, JEm torno dos trabalhos do Seminário de Urbanismo. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, ano 58, n. 20.106, 11 out. 1958d, 1º Caderno, p. 16.).

Figura 2
Henrique Mindlin na fala de abertura do seminário (1958)

Os desejos de boas-vindas ficaram sob a responsabilidade de Henrique Mindlin, arquiteto com grande inserção no ambiente diplomático brasileiro e membro da recém-criada comissão do IAB encarregada de dialogar permanentemente com o MRE (DEDECCA, 2018DEDECCA, P. Arquitetura e engajamento: o IAB, o debate profissional e suas arenas transnacionais (1920-1970). 2018. Tese (Doutorado) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. ). Ao inaugurar o evento, o arquiteto, mais uma vez, reafirmou a intenção de que se fugisse das “longas e indefinidas resoluções, ou vagas e pretensiosas declarações” (IAB-RJ, 1958aIAB-RJ. Instituto de Arquitetos do Brasil-RJ. Boletim Mensal, Rio de Janeiro, n. 10, out. 1958a., p. 96). Mais do que isso, ao discutir a crescente legitimidade da profissão de arquiteto no Brasil e do ideário modernista em sua relação intrínseca com o Estado, ele apontou a vontade dos profissionais de “refazer o caminho e tentar penetrar o âmago dos problemas básicos que afetavam a população” (id., Ib.).

3.1 Mesa I: Programa

Na mesa dedicada ao primeiro tema - Programa -, seriam discutidas as razões para a criação de novas cidades; os elementos para a análise das condições que envolviam o empreendimento; e a política de aglomeração urbana e de organização regional. Algumas questões foram sugeridas de antemão e deveriam ser pensadas tendo em vista as diferentes realidades econômico-sociais: Quais os fatores para a formação de novas cidades? Qual seria a política de urbanização adequada? Qual o partido a ser adotado na reorganização das cidades existentes - alargamento ou descentralização? Quais os elementos a serem considerados na avaliação de criação de uma cidade? Pode-se estabelecer uma norma mínima? Seria viável ter um programa não enquadrado em um plano regional ou nacional? (IAB-RJ, 1958aIAB-RJ. Instituto de Arquitetos do Brasil-RJ. Boletim Mensal, Rio de Janeiro, n. 10, out. 1958a.).

Como é possível notar, a pauta era ampla e as questões, dificilmente consensuais, sobretudo se considerarmos a composição da mesa, com membros com formações e perspectivas diversas no tocante à abordagem da questão central proposta. Eram três não arquitetos: o geógrafo brasileiro Hilgard Sternberg, o sociólogo holandês Sjoerd Groenman e o historiador inglês Ronald Syme. Os demais membros eram James Maude Richard e Max Lock, arquitetos ingleses, e Hélio Modesto, Harry James Cole e Fernando Menezes, arquitetos brasileiros (IAB-RJ, 1958aIAB-RJ. Instituto de Arquitetos do Brasil-RJ. Boletim Mensal, Rio de Janeiro, n. 10, out. 1958a.).

Sternberg, moderador da mesa, era, naquele momento, professor catedrático do Departamento de Geografia na Faculdade de Filosofia da Universidade do Brasil, primeiro vice-presidente da União Internacional de Geógrafos e, até 1956, havia lecionado Geografia para diplomatas no Instituto Rio Branco. Tinha o desenvolvimento regional, sobretudo da Amazônia, como sua área de pesquisa, defendendo a função integradora da geografia e a possibilidade de um pensamento holístico para analisar a região e enfocar a interface entre as sociedades humanas e o meio ambiente (KOHLHEPP, 2015KOHLHEPP, G. Pioneiros brasileiros nas pesquisas geográficas de desenvolvimento regional. Revista Brasileira de Desenvolvimento Regional, n. 3, v. 1, p. 27-54, 2015.). Já Groenman, sociólogo atuante no aconselhamento de políticas públicas da reconstrução europeia, empenhava-se, então, em uma atitude ambivalente no tocante ao processo de urbanização: construir comunidades camponesas orgânicas, criadas artificialmente por métodos científicos e com a ajuda de especialistas (COUPERUS; KAAL, 2016COUPERUS, S.; KAAL, H. (ed.). (Re) constructing communities in Europe, 1918-1968: Senses of belonging below, beyond and within the Nation-state. London: Routledge, 2016.). O que Ronald Syme, pesquisador de história antiga, fazia na mesa é uma incógnita para a autora deste artigo. No entanto, vale considerar que ele era, naquele momento, secretário do Conselho Internacional de Filosofia e Ciências Humanas (CIPSH) e havia publicado no mesmo ano Colonial elites: Rome, Spain and the Americas.

Como se sabe, James Maude Richards, editor da Architectural Review, vinha arrefecendo seu embate ferrenho pela arquitetura moderna, abrindo-se para a consideração do vernacular e da paisagem urbana preexistente, sobretudo ao redor do debate do Townscape (AITCHISON, 2012 AITCHISON, M. Townscape: scope, scale and extent. The Journal of Architecture, v. 17, n. 5, p. 621-642, 2012.). Sua “fisionomia concentrada”, pouco afeita aos “trópicos”, contrastava com a de seu conterrâneo Max Lock, “um desses ingleses bem-humorados” e que não escondia o seu “encantamento por haver finalmente transposto o Equador” (MAURÍCIO, 1958d MAURICIO, JEm torno dos trabalhos do Seminário de Urbanismo. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, ano 58, n. 20.106, 11 out. 1958d, 1º Caderno, p. 16.). Planejador urbano responsável pela new town de Middlesbrough, Lock era defensor da incorporação de pesquisas sociológicas no processo de planejamento, do trabalho multidisciplinar, da combinação de aspectos físicos e sociais no projeto e, principalmente, do envolvimento da comunidade mediante um processo amplo de consulta (MOTOUCHI; TIRATSOO, 2004MOTOUCHI, N.; TIRATSOO, N. Max Lock, Middlesbrough, and a forgotten tradition in British post-war planning. Planning history, v. 26, p. 17-20, 2004.).

Os outros arquitetos da mesa não estavam totalmente desvinculados do debate inglês acerca do planejamento urbano e regional e já mantinham relação estreita entre si. Eram também muito mais próximos da ideia de um especialista do que da de um arquiteto generalista. Hélio Modesto, autor do plano de Volta Redonda (1955), fez pós-graduação em planejamento urbano em Londres entre 1949 e 1951, aproximando-se do debate do Town Planning. Harry James Cole, antigo estagiário de Modesto, tinha acabado de voltar ao Brasil, depois de também cursar pós-graduação na capital inglesa, por recomendação de Modesto, e trabalhar no London County Council (LUCCHESE, 2014LUCCHESE, M. C. Em defesa do planejamento urbano: ressonâncias britânicas e a trajetória de Harry James Cole. 2014. Tese (Doutorado) - Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014.). O pernambucano Fernando Menezes, que fora o primeiro presidente do IAB-PE, era funcionário da Prefeitura do Recife e professor do curso de Arquitetura da Escola de Belas Artes.

Para a mesa, ao resumir suas conclusões, era importante ressaltar que a falta de tempo não deveria justificar a falta de planejamento; que a execução do plano era o início de um longo processo; e que o planejador, “a princípio um tanto doutrinário”, aos poucos deveria reconhecer, “com humildade, a primazia da dignidade da pessoa humana”, plena e livre, sem se pautar pela normatização inflexível. Assim, o planejamento, para aqueles profissionais, era algo orgânico, de modo que as cidades não deveriam ser pensadas isoladamente. Criticavam-se também a especulação imobiliária, a burocracia do Estado e a excessiva intervenção estatal. Apontavam-se como urgentes o trabalho interdisciplinar e a reforma do currículo universitário, defasado em relação à diversidade e à dinâmica do planejamento. Por fim, se era fundamental a consideração das “comunidades pioneiras” nos planos regionais, fazia-se um apelo pela reforma agrária e pela mudança radical dos padrões de propriedade - conclusão que, sem dúvida, foi a que mais espaço ganhou na imprensa diária (IAB-RJ, 1958bIAB-RJ. Instituto de Arquitetos do Brasil-RJ. Boletim Mensal, Rio de Janeiro, n. 11, nov. 1958b., p. 104-105).

3.2 Mesa II: Plano

O segundo tema - Plano - deveria ser pensado como objetivo e como norma de ação fundamentando-se em considerações sobre seus elementos básicos, sua abrangência, sua relação com a região, bem como nas atribuições de responsabilidade para sua formulação. Eram muitas e complexas as questões sugeridas: Seria necessário distinguir partes dinâmicas e estáticas do plano? Seria conveniente abandonar as concepções estruturais de longo prazo ou concentrar o plano em definições mais precisas e duradouras da composição de seus elementos? Qual era a importância da definição de prazos de realização? A concepção parcial de uma comunidade urbana seria válida ou o plano teria que abranger sua totalidade? Seria viável planejar sem incluir os elementos complementares da vida urbana? Nesse sentido, até onde iria a interferência do plano? Deveria limitar-se às quatro funções da Carta de Atenas? Com que precisão os fatores naturais e humanos no plano deveriam aparecer? Seria necessária uma norma mínima para sua aceitação? Se sim, orientada por quais entidades? Deveria ser exigida uma escala regional mínima de abrangência? Até que ponto confiar decisões posteriores às autoridades, aos interesses privados e a deliberações legislativas? Se o plano afeta a comunidade, seria possível conceder-lhe autoridade sem passar pelos processos democráticos de apreciação pública? (IAB-RJ, 1958aIAB-RJ. Instituto de Arquitetos do Brasil-RJ. Boletim Mensal, Rio de Janeiro, n. 10, out. 1958a.).

A segunda mesa era consideravelmente mais uniforme do que a primeira, do ponto de vista da composição de disciplinas. Presidida por Ary Garcia Roza e moderada por Rino Levi, a conversa era entre arquitetos e um simpatizante. Era como se, depois de estabelecido o programa, as definições do plano coubessem unicamente a tais profissionais. Quase todos eram mais dedicados ao projeto de edificações, mesmo que em larga escala, do que à prática do planejamento urbano e se aproximavam ao pensarem espaços que experimentavam a liberdade formal, tal como Niemeyer então rabiscava Brasília: o venezuelano Carlos Raúl Villanueva, cujas obras da Cidade Universitária de Caracas e do Conjunto Habitacional 2 de Dezembro estavam recém-finalizadas; o ucraniano Arieh El-Hanani, arquiteto da municipalidade de Tel Aviv e responsável por muitas das novas edificações públicas na cidade; o japonês Takamasa Yoshizaka, premiado naquela década duas vezes na Bienal de São Paulo, autor do Pavilhão Japonês na Bienal de Veneza, em 1956, e colaborador de Le Corbusier nos projetos da Unidade de Habitação de Marselha e de algumas das obras de Chandigarh, na Índia. Ao lado desses três, estavam Marcelo Roberto, Affonso Eduardo Reidy, o engenheiro Augusto Guimarães Filho, chefe da divisão de urbanismo da Novacap durante o desenvolvimento do Plano Piloto e figura muito próxima de Lúcio Costa, e o italiano Luigi Piccinato - este, sim, responsável por diversos planos reguladores de cidades italianas (IAB-RJ, 1958aIAB-RJ. Instituto de Arquitetos do Brasil-RJ. Boletim Mensal, Rio de Janeiro, n. 10, out. 1958a.).

Figura 3
Maquete construída para o seminário por estudantes brasileiros e estrangeiros (1958)

É interessante perceber, por meio do exemplo de Luigi Piccinato, e de Van Eesteren, que participa da última mesa, um traço comum a muitos desses profissionais que se qualificavam como especialistas em planejamento urbano: suas intensas atividades associativas, sobretudo em defesa da figura do urbanista e da construção de espaços especializados de debate, que os transformavam em uma espécie de nó entre várias instâncias de interlocução profissional de âmbito nacional e internacional. Piccinato, formado no começo dos anos 1920, fora membro ativo do Ciam e da IFHTP e, em 1958, ocupava o posto de vice-presidente do INU (Istituto Nazionale di Urbanistica). Antes plenamente alinhado à perspectiva da cidade funcionalista, desde o fim da Segunda Guerra Mundial afiliara-se à Associazione per l’Architettura Organica, apostando na pauta do organicismo. Ao longo dos anos 1950, assim como muitos outros membros do Ciam, que naquele momento era corroído por visões conflitantes sobre qual deveria ser a agenda teórico-projetual para a arquitetura e o urbanismo, tornou-se participante das atividades promovidas pela UIA, com grande interesse pelo estabelecimento de conexões com a América Latina, em especial com a Argentina (BASILE, 2020BASILE, S. D. Luigi Piccinato: La trayectoria austral del “padre” del urbanismo moderno italiano (1948-50). Anales del Instituto de Arte Americano e Investigaciones Estéticas. Universidad de Buenos Aires, 2020. p. 81-99.; MUMFORD, 2002MUMFORD, E. P. The CIAM Discourse on Urbanism, 1928-1960. Cambridge, London: MIT Press, 2002.).

Nesse sentido, é importante destacar que a UIA, uma das instituições organizadoras do evento, se configurava como um novo tipo de organização internacional de arquitetura, moldada mais pelas convenções da diplomacia cultural e da boa vontade internacional do que pelo debate intelectual, concentrando-se em objetivos mais consensuais da profissão (GLENDINNING, 2009 GLENDINNING, M. Cold-War conciliation: international architectural congresses in the late 1950s and early 1960s. The Journal of Architecture, v. 14, n. 2, p. 197-217, 2009.). Portanto, é interessante, mas não surpreendente, que esse intenso e tenso debate em relação ao projeto das novas cidades que então despontava nacional e internacionalmente tivesse aparecido de modo sútil nas conclusões daquela mesa em específico, que eram significativamente mais objetivas e generalistas, ainda que nem tanto consensuais.

Concluía-se ser indispensável que ao planejamento urbano correspondesse “um planejamento econômico de todos os fatores que intervêm na vida das cidades”, incluindo, portanto, o planejamento do processo e a gestão como questões primordiais de controle urbano. Todo plano deveria prever sua realização em etapas, que subsistissem em si sem almejar alcançar uma unidade. Desse modo, a mesa se posicionava contrariamente aos planos rígidos e favoravelmente à possibilidade de uma expansão orgânica - algo que não era novo, mas que se distanciava do plano da capital então em construção. Por fim, nenhum plano local deveria prescindir de um plano de maior abrangência, fosse ele regional, nacional ou continental (IAB-RJ, 1958bIAB-RJ. Instituto de Arquitetos do Brasil-RJ. Boletim Mensal, Rio de Janeiro, n. 11, nov. 1958b., p. 107-108). Talvez, a fala de Marcelo Roberto, membro da mesa, tenha definido o intuito e a temperatura da conversa. Após discorrer sobre os problemas das cidades brasileiras, ele declarou:

Sabemos que a ambição do temário dessa reunião não pode ser esgotada nos poucos encontros estabelecidos. Mas, sinceramente, o que nos interessa - falamos entre amigos, podemos empregar toda a franqueza - são declarações que possamos utilizar como arma, tanto para comover as autoridades como para precipitar a formação de uma consciência urbanística na população. Declarações semelhantes já foram estabelecidas em outras reuniões. As que agora solicitamos, entretanto, terão força de terem sido firmadas em nosso país. Convém ser encarecida, por profissionais representativos de várias partes do mundo, a necessidade de planejamento total: que tendo por objetivo a satisfação das necessidades elementares e superiores do homem, o planejamento será, necessariamente, obra de arquitetura, cabendo, evidentemente ao arquiteto a chefia da elaboração; contudo, para ser válido, o plano terá que se basear no trabalho minucioso e amplo de uma série de especialistas. [...]. Não poderíamos, já que o tempo é inexoravelmente curto, procurar convencer uns aos outros. Concentremo-nos no que estamos de acordo. (ROBERTO, 1958ROBERTO, M. Falemos no que estamos de acordo. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, ano 58, n. 20.103, 8 out. 1958, 1º Caderno, p. 12.).

A fala de Marcelo Roberto demonstra que, para além do contato com novas ideias a respeito do tema, o interesse na interlocução com os estrangeiros também passava pela necessidade de validar pautas em discussão localmente, reforçando a competência do seu próprio discurso. Era uma espécie de estratégia de transformar ambições institucionais em desejos universais. Assim, parecia que a intenção era igualmente instrumentalizar o evento para atestar suas posições e procedimentos, legitimar e potencializar as posições defendidas pelos arquitetos nacionais em momentos de debate público, sobretudo com o meio político e o público amplo. A constatação do arquiteto de “estar entre amigos” deve ser vista muito mais como um recurso retórico do que como fruto da realidade. De fato, a segunda mesa era relativamente coesa, com o predomínio de arquitetos. Mas, se relembrarmos as idas e vindas preparatórias do evento e a composição das demais mesas, perceberemos que ele estava entre alguns que não pretendiam selar consensos em prol da afirmação da profissão do arquiteto e de suas tarefas, como veremos.

3.3 Mesa III: Realização

Por fim, a terceira mesa - Realização - concentrava-se na execução do plano. O debate deveria incidir sobre os pontos da programação, do entrosamento com o planejamento econômico, das operações financeiras e da obtenção dos recursos necessários, dos problemas institucionais, das novas políticas e dos efeitos sobre a propriedade, da ação governamental direta e da iniciativa privada e do preparo de pessoal especializado. As seguintes indagações foram sugeridas: Até que ponto a fundação de novas cidades está relacionada com a política desenvolvimentista? Ela é elemento importante na industrialização do país? Entre a iniciativa privada, o poder público e as autarquias, qual é o encarregado mais aconselhável para sua construção? Com que esfera governamental deveria ficar o encargo de planejá-las? Como conciliar o princípio da autonomia local com a obrigatoriedade do planejamento de cidades novas? Qual regime de propriedade do solo é o mais adequado? Até que ponto a propriedade privada é compatível com o planejamento urbano em larga escala? (IAB-RJ, 1958aIAB-RJ. Instituto de Arquitetos do Brasil-RJ. Boletim Mensal, Rio de Janeiro, n. 10, out. 1958a.).

Os não arquitetos foram novamente convidados a se sentarem à mesa, moderada por Themístocles Cavalcanti, já mencionado, e composta do suíço Jean-Pierre Vouga, editor da revista Habitation e diretor das comissões de trabalho da UIA; do francês Pierre Vago; secretário-geral da mesma instituição; e do holandês Cornelis van Eesteren, chefe do departamento de urbanismo de Amsterdam. Ao lado desses três arquitetos, estavam o suíço Antony Babel, reitor da Universidade de Genebra e representante da Unesco, e Diogo Lordello de Mello, diretor do Instituto Brasileiro de Administração Municipal (Ibam) e figura importante do pensamento municipalista brasileiro (IAB-RJ, 1958aIAB-RJ. Instituto de Arquitetos do Brasil-RJ. Boletim Mensal, Rio de Janeiro, n. 10, out. 1958a.).

A presença de Lordello de Mello é reveladora da institucionalização em andamento do pensamento municipalista no Brasil e de sua defesa da autonomia local. Uma das sessões do I Seminário Interamericano de Estudos Municipais, também realizado em 1958, debateu a questão do planejamento regional pautada na perspectiva de articulação de saberes voltados ao pensamento urbanístico e ao problema das cidades. Nessa rede de circulação de ideias, tem-se claramente uma abordagem sobre o desenvolvimento municipal não restrito ao campo disciplinar urbanístico, mas já articulado com o direito e com o planejamento em seu sentido mais amplo (FARIA, 2020FARIA, R. S. de. O município em face do planejamento regional: ideias interamericanas na década de 1950. Revista brasileira de estudos urbanos e regionais. v. 22, E202040pt, 2020. DOI: 10.22296/2317-1529.rbeur.202040pt.
https://doi.org/10.22296/2317-1529.rbeur...
).

Com efeito, a questão do município ganhou relevo nas conclusões da terceira e última mesa, que apontou para a necessária participação da comunidade na formulação e, sobretudo, na aprovação do plano, garantida pela criação de instituições democráticas. O planejamento urbano deveria ser considerado não uma prerrogativa, e sim um dever governamental atendido em todos os níveis - municipal, estadual e federal - com a respectiva criação de órgãos competentes e com legislações sobre o urbanismo que definissem deveres e limites da competência da municipalidade. Por fim, a mesa ressaltou a necessidade de preservar os direitos da coletividade por parte do Estado, particularmente no combate à especulação sobre terrenos, indicando a possibilidade da cessão do direito à terra por prazo determinado e a fixação dos preços antes do planejamento (IAB-RJ, 1958bIAB-RJ. Instituto de Arquitetos do Brasil-RJ. Boletim Mensal, Rio de Janeiro, n. 11, nov. 1958b., p. 109-111).

Encerrada a mesa, Cavalcanti diria ao Jornal do Brasil: “[...] no tema Planejamento de Novas Cidades entrelaçam-se a arquitetura e a sociologia, pois, além dos problemas exclusivamente técnicos de urbanização, o estudo dos fatores humanos deve ser tido como primordial”. E, em seguida: “[...] o Planejamento de Novas Cidades, não estando adaptado às condições do elemento humano, de muito pouco poderá valer” (ARQUITETURA..., 1958, p. 8)ARQUITETURA e sociologia. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, ano 68, n. 234, 7 out. 1958, 1º Caderno, p. 8.. É interessante sua escolha por lançar luz no papel da sociologia ao falar das novas cidades, sobretudo por não ter sido ponto central da discussão, ou talvez justamente por isso.

Arquitetos e sociólogos estavam em pontos muito distintos no que diz respeito à representação institucional e à regulamentação profissional. Em texto seminal publicado no ano seguinte, “A Sociologia no Brasil”, Antonio Candido ([1959] 2006)CANDIDO, A. A Sociologia no Brasil. Tempo Social, v. 18, n. 1, p. 271-301, [1959] 2006. faz um balanço do ponto no qual se encontrava a disciplina da Sociologia nacionalmente. Se até 1930 ela era praticada por intelectuais não especializados, focados em pensar princípios teóricos e na interpretação da sociedade brasileira de maneira mais global, os anos 1940 corresponderam à sua consolidação e generalização como disciplina universitária e atividade socialmente reconhecida, assinalada por uma produção regular no campo da teoria, da pesquisa e da aplicação. Candido também menciona que, apesar do reconhecimento da ciência e da profissão, de sua produção em franca ampliação, os sociólogos especializados não contavam com uma vida associativa estruturada e com o resguardo legal de suas atribuições profissionais (CANDIDO, [1959] 2006)CANDIDO, A. A Sociologia no Brasil. Tempo Social, v. 18, n. 1, p. 271-301, [1959] 2006..

No seminário, no entanto, os sociólogos contavam com o apoio do Ibecc. A instituição, que em sua primeira composição de delegados contava, por exemplo, com a participação de Gilberto Freyre, havia sinalizado, de acordo com as diretrizes da Unesco do início dos anos 1950, a intenção de apoiar iniciativas de criação de centros de pesquisa e formação em Ciências Sociais, entendidas como importante elemento para a compreensão dos problemas locais, especialmente em face da crescente urbanização e industrialização. De fato, sob a presidência de Themístocles Cavalcanti, o Ibecc apoiou, por exemplo, a inauguração, no Rio de Janeiro em 1957, do Centro Latino-Americano de Pesquisas em Ciências Sociais (Clapcs). Entre seus primeiros projetos estavam Problemas de urbanização na América Latina (1960), uma listagem bibliográfica sobre o assunto, alguns estudos sobre estrutura agrária, estratificação e mobilidade social em cidades latino-americanas; e a documentação e o levantamento bibliográfico sobre imigração e colonização na região (ABRANTES, 2008 ABRANTES, A. Ciência, educação e sociedade: o caso do Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura (Ibecc) e da Fundação Brasileira de Ensino de Ciências (Funbec). 2008. Tese (Doutorado) - Casa de Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2008.).

É interessante também notar outro ponto levantado por Candido: que a expressão “realidade brasileira” era típica do momento, tornando-se um verdadeiro lugar-comum ao qual “recorriam indiscriminadamente jornalistas, políticos, escritores e estudiosos” - e poderíamos, sem dúvida, acrescentar arquitetos (CANDIDO, [1959] 2006, p. 284)CANDIDO, A. A Sociologia no Brasil. Tempo Social, v. 18, n. 1, p. 271-301, [1959] 2006.. A menção de Candido ao fato é interessante porque, ao mesmo tempo que aponta seu otimismo com a solicitação intensa pelos estudos sociais e com a atmosfera de receptividade e expectativa em torno da Sociologia, indica certo desconforto, expressado com elegância, com o uso indiscriminado da ideia. Sem dúvida, entre os arquitetos, era quase uma palavra de ordem naquele momento, mas raramente o pensamento arquitetônico-urbanístico chegava a esmiuçar de maneira concreta a realidade a que ele se referia.

Ninguém menos que Gilberto Freyre tomaria as conclusões do evento como mote para condenar a exclusão dos cientistas sociais dessa “causa em que o Brasil inteiro se sentia de corpo e alma empenhado” e como confirmação de que Brasília deveria ser pensada interdisciplinarmente e em equipe, em busca de uma sistemática de integração de novas cidades no espaço natural, social e cultural. Para ele, o seminário comprovava que, com a incorporação das considerações sociológicas e ecológicas, seria possível elaborar uma nova articulação, mais dinâmica e plural, “de Brasis em Brasil, tendo por centro Brasília”, oposta à cidade unicamente escultural, pensada por “príncipes da mais alta nobreza” - no caso, os arquitetos - e desintegrada de um sistema inter-regional (FREYRE, 1968, p. 173-197)FREYRE, G. Brasis, Brasil, Brasília. Lisboa: Edição Livros do Brasil, 1960..

“Individualmente, excelentes, e coletivamente, algo muito delicado, caprichoso, difícil, impossível mesmo.” É assim que Jayme Maurício, em uma de suas colunas sobre o acontecimento, se refere aos arquitetos, descritos como classe “absolutamente impraticável” (MAURÍCIO, 1958b MAURICIO, JOs encontros de arquitetos. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, ano 58, n.20.058, 16 ago. 1958b, 1º Caderno, p. 11., p. 11). No entanto, é notável que, apesar das muitas divergências aqui descritas e do “tom excessivamente polêmico” que o colunista notou ao longo do seminário, os registros oficiais do encontro tenham consolidado consensos generalistas e submergido as diversas disputas em curso, que buscamos aqui apontar com o apoio dos registros mais acidentais do jornalismo cotidiano da cidade. Para Maurício, a conformidade reinante era superficial, e, no fundo, as coisas andavam “muito tumultuadas” (MAURÍCIO, 1958d MAURICIO, JEm torno dos trabalhos do Seminário de Urbanismo. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, ano 58, n. 20.106, 11 out. 1958d, 1º Caderno, p. 16., p. 11).

Assim, do contato, no qual perspectivas diversas se encontram e se chocam, resultam experiências e avaliações diversas. Em contraponto a Freyre, o êxito do encontro parece ter sido indiscutível para os estrangeiros - sobretudo para os arquitetos, que deram depoimentos sobre suas boas impressões à imprensa local, nas quais se confundiam comentários sobre o encontro e o entusiasmo com Brasília. Já outros brasileiros, como Carlos Lodi e o engenheiro Paulo Novaes, apesar de louvarem a qualidade do debate, teceram ressalvas quanto à falta de originalidade das conclusões e à necessidade de tradução das ideias gerais consensuais a termos práticos, visto que, quando aplicadas em circunstâncias precisas, esbarravam em discordâncias (LODI, 1958LODI, C. Encontro intelectual de arquitetura no Rio de Janeiro, outubro de 1958, sobre novas cidades. Boletim Mensal do IAB-SP, n. 57, p. 5, out. 1958.; IAB-RJ, 1958cIAB-RJ. Instituto de Arquitetos do Brasil-RJ. Boletim Mensal, Rio de Janeiro, n. 12, dez. 1958c.).

Talvez seja esse o motivo da pouca repercussão do seminário na imprensa periódica voltada aos profissionais da arquitetura e do urbanismo. A despeito de este artigo ter se concentrado no material recolhido na imprensa diária, a repercussão do encontro em tais veículos especializados parece ter sido pequena, mas se trata de uma hipótese a ser enfrentada mediante uma pesquisa mais detida. Para além das já mencionadas notícias sobre o evento nos boletins oficiais do IAB paulista e carioca, que assumiram ares de relatos oficiais, tais como atas que também foram reproduzidas elogiosamente pela revista Habitat logo a seguir, não foi encontrada nenhuma discussão de maior fôlego acerca dos pontos debatidos ao longo do seminário (SEMINÁRIO..., 1958aSEMINÁRIO, Habitat, São Paulo, n. 50, p. 94, set./out. 1958a.). Na revista Acrópole não há menção ao encontro; Módulo veiculou apenas duas notas curtíssimas, meramente informativas (SEMINÁRIO..., 1958bSEMINÁRIO de arquitetura e urbanismo. Módulo, Rio de Janeiro, n. 10, v. 2, p. 58, ago. 1958b., ENCONTRO..., 1958bENCONTRO Internacional de Arquitetos e Urbanistas. Módulo, Rio de Janeiro, n. 11, v. 2, p. 58, dez.1958b.); a revista Brasília reproduziu as falas do embaixador Paulo Carneiro na visita a Brasília e as impressões dos convidados após circularem pela cidade em construção, sem entrar no mérito do debate em si (ARQUITETOS..., 1958ARQUITETOS e urbanistas, Brasília, Rio de Janeiro, n. 22, p. 6-8, out.1958.; OPINIÕES..., 1958OPINIÕES Internacionais, Brasília, Rio de Janeiro, n. 23, p. 9, nov. 1958.). Ainda como apontamento de um investimento futuro de pesquisa, é possível que tal debate possa ter se desenrolado em veículos com circulação mais delimitada, sobretudo no âmbito municipal do Rio de Janeiro.

4. Em Brasília

Ao fim dos debates, os convidados voaram a Brasília. Lá, foram recepcionados por Juscelino Kubitschek, que discursou de improviso, recorrendo a argumentos conhecidos - a conquista do país, a integração do território, a soberania -, mas convocando um assunto não abordado no seminário: “Brasília terá uma repercussão mundial, porque tivemos a preocupação de fazê-la uma obra de arte” (IAB-RJ, 1958cIAB-RJ. Instituto de Arquitetos do Brasil-RJ. Boletim Mensal, Rio de Janeiro, n. 12, dez. 1958c., p. 119). É interessante que, dentre os vários temas tratados pelo seminário, a urbanística reconhecida como atividade artística tenha ficado de fora. O fato de que, no ano seguinte, outro evento internacional, de repercussão muito maior, tenha sido realizado com o mesmo tema, mas subtema diferente, é curioso: o Congresso Internacional Extraordinário de Críticos de Arte, intitulado “Cidade Nova: síntese das artes”. Trata-se de um contraponto ainda a ser explorado.5 5 Um caminho interessante, não explorado por este artigo, consiste em olhar para o seminário como nó no qual se cruzaram trajetórias individuais e institucionais, pontos e modos distintos de pensar e fazer as novas cidades planejadas. São diversas as notícias na imprensa diária sobre ecos e derivações dos debates do seminário em solo carioca, brasileiro e estrangeiro.

Não menos interessante é que, encerradas as falas oficiais, Marcelo Roberto tenha entregado ao presidente da República um documento que vinha sendo formulado havia meses: o novo projeto de lei de regulamentação da profissão de arquiteto, que propunha a total separação de suas atribuições do exercício da engenharia. Dando sequência à estratégia, seu irmão, sócio e então presidente do IAB-RJ, Maurício Roberto, alguns dias depois, declararia em entrevista à Jayme Maurício: “[...] vinte e cinco anos de trabalho, estudo e progresso arquitetônico” davam aos arquitetos autoridade suficiente para “dirigirem a si mesmos”. Para ele, era uma separação que, a despeito da legislação coincidente, já estava assegurada pela prática naquele momento. Tal fato revela que havia, efetivamente, uma segunda agenda dos arquitetos associada ao seminário, que girava ao redor da construção de um discurso de legitimidade da profissão, e que talvez imaginasse o evento como um ritual de afirmação da categoria e de universalização de seus desejos. Vale notar que, apesar das promessas de Kubitschek, o projeto não foi aprovado. Afinal, naquele momento, eram 2 mil arquitetos contra 28 mil engenheiros em disputa (MAURÍCIO, 1958e MAURICIO, JStone e o chamado novo estilo na arquitetura. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, ano 58, n. 20.166, 20 dez. 1958e, 1º Caderno, p. 14., p. 14).

Assim, não foi a intenção deste artigo colocar sub judice as credenciais de grupos profissionais sobre o saber-fazer cidades, mas buscar, ao olhar para o seminário em foco, situá-los em relação a suas posições no jogo pela legitimidade de suas práticas. Se é evidente que a autoridade de certo grupo sobre os problemas da cidade é variável historicamente, é interessante notar como, ao mesmo tempo que os arquitetos galgavam uma posição inédita nesses anos perante o Estado e o público mais amplo, ao buscarem consolidar e garantir as fronteiras de sua atuação, punham-se em franca disputa com outras disciplinas.

Referências

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  • UNESCO faz simpósio para tratar das cidades novas. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, ano 10, n. 2.657, p. 2, 2 out. 1958.
  • 1
    Parte deste texto tem origem na tese de doutorado Arquitetura e engajamento: o IAB, o debate profissional e suas arenas transnacionais (1920-1970). A autora agradece à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) pelo auxílio financeiro, bem como à Amália Cristóvão dos Santos, Glória Kok e Pedro Lopes pela oportunidade de debate de seu conteúdo em versão preliminar.
  • 2
    São muitos os casos que aqui poderiam ser citados para ilustrar essa variedade, tais como Belo Horizonte, como capital do estado de Minas Gerais; a cidade balneária de Águas de Lindoia (SP); Nova Veneza (GO) como assentamento de colonização; a cidade de Paulo Afonso (BA) construída em razão da barragem e da usina hidrelétrica; de Caraíba (BA) e Serra do Navio (AP) como vilas operárias e cidades-companhia (TREVISAN, 2020TREVISAN, R. Cidades novas. Brasília: Editora da UnB, 2020.).
  • 3
    A este artigo interessa, sobretudo, contribuir com a reflexão sobre a história das profissões, pensando os embates pela delimitação de atribuições e fronteiras em uma perspectiva de campo tal como proposta por Pierre Bourdieu, mas também as disputas internas acerca da validação de modos de atuação. Para o mergulho na historiografia sobre as cidades novas, são muitos os escritos relevantes sobre o tema, de pesquisadores como Carlos Roberto Monteiro de Andrade, Ricardo Trevisan, Rogério Quintanilha, Telma de Barros Correia, Maria Cristina Leme, entre outros, no cenário nacional, ou como Donatella Calabi, Françoise Choay, Jean-Louis Huot, Pierre Merlin, Rassem Khamaisi, entre outros, em âmbito internacional.
  • 4
    Vale dizer que a análise da lista de participantes é uma frente interessante de desenvolvimento, que foge das possibilidades do artigo aqui apresentadas.
  • 5
    Um caminho interessante, não explorado por este artigo, consiste em olhar para o seminário como nó no qual se cruzaram trajetórias individuais e institucionais, pontos e modos distintos de pensar e fazer as novas cidades planejadas. São diversas as notícias na imprensa diária sobre ecos e derivações dos debates do seminário em solo carioca, brasileiro e estrangeiro.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    13 Out 2021
  • Aceito
    03 Jun 2022
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