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Uma experiência no ensino de Embriologia para pequenos grupos

INTRODUÇÃO

O ensino de graduação na área da saúde vem experimentando freqüentes modificações, com a introdução de novas técnicas pedagógicas e recursos para a instrução. Ultimamente vêm sendo realizados diversos tipos de experiências educacionais, tais como programas de auto-instrução11. DAVIES, M. A. - Audiotape and booklet self instructional materials in physiology: an evaluation of their clinical curriculum. Med. Educ. 11: 370, 1977.) (22. DE SOUZA, R. R. - Self instruction in anatomy for medical students. Rev. Bras. Pesq. Med. Biol. 11: 145-146, 1978.) (44. FISHER, L. J. - Teaching of neuroanatomy by means of self instructional laboratory stalations. Med. Educ. 14: 119-123, 1980. e uso de computadores como instrumentos de avaliação33. ESSEX, D. L. - Effectiveness of instructional computers in teaching basic medical sciences. Med. Educ. 13: 189-193, 1979.) (55. KALACHE, A. & MACHA DO-COELHO, M. A. - O Uso do computador na avaliação formativa. Educ. Med. y Salud 8: 191-204, 1974.. Em nosso meio, contudo, ainda são poucos os relatos escritos relativos a experiências inovadoras, as quais, não raro, se restringem à própria universidade ou escola em que foram realizadas.

Na área de Embriologia, o ensino na maioria das faculdades brasileiras de Medicina, Odontologia, Enfermagem, Nutrição e Biologia, apresenta como tipo de aula predominante, a expositiva, que é geralmente ministrada mediante o uso, como recurso visual, do quadro-de-giz, da projeção de diapositivos ou de transparências; os grupos, na maioria dos casos, são compostos por mais de sessenta alunos.

Descreveremos, neste trabalho, uma experiência de ensino desenvolvida na Disciplina de Embriologia Animal Comparada, na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

METODOLOGIA

Cursaram a Disciplina de Embriologia Animal Comparada, 12 alunos do 3o e 4o anos de bacharelado do Curso de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro. As aulas tinham de 3 a 4 horas de duração, e foram ministradas uma vez por semana, durante todo o semestre.

No primeiro encontro, o grupo - constituído por alunos e o professor - traçou como objetivo geral do curso: “conhecer os processos gerais do desenvolvimento, e poder aplicá-los a uma determinada espécie”. Definido o objetivo geral, discutiu-se qual seria a maneira mais adequada de atingi-lo, e por sugestão do professor, discutida e aprovada pelo grupo, decidiu-se que o curso se desenvolveria dentro da seguinte metodologia.

1. Conteúdo Teórico

O conteúdo teórico referente à Disciplina era dividido em duas partes fundamentais: a) análise fenomenológica dos processos gerais do desenvolvimento; e b) análise comparativa desses processos, em classes de invertebrados e vertebrados. Cada uma dessas partes era subdividida em tópicos discutidos semanalmente pelo grupo, que já havia consultado a bibliografia previamente fornecida pelo professor, bibliografia essa que se constituía, principalmente, de capítulos de livros e artigos recentes de revisão e, ainda, de alguns trabalhos originais.

Não houve, durante todo o curso, nenhuma aula expositiva ministrada pelo professor.

2. Conteúdo Prático

Cada aluno teve a responsabilidade de desenvolver uma tarefa prática por ele mesmo idealizada, e executada sob a orientação do professor. Essa tarefa poderia ser a repetição de um experimento já conhecido em embriologia, ou a feitura de um experimento original. O andamento da mesma era semanalmente discutido pelo grupo de alunos, de modo que todos soubessem o que cada um estava realizando. No fim do curso cada aluno fez uma apresentação ao grupo, a qual constou de explanação da idéia do trabalho, seu desenvolvimento e resultados obtidos.

3. Sistema de Avaliação

Após intensa discussão, concluimos que o sistema de avaliação devia incluir: a) duas provas escritas, uma no final de cada parte do programa constituindo-se de análise de um texto idealizado pelo professor. Os textos apresentavam uma coerência interna de idéias, mas continha assertivas certas e erradas. Ao aluno cabia analisar cada assertiva, dizendo se estava certa ou errada, e justificando tal interpretação com as evidências experimentais discutidas durante as aulas; b) realização e apresentação da tarefa prática; e c) grau de desempenho do grupo como unidade de trabalho. Esse grau (o mesmo para todos os alunos) foi obtido pela média aritmética dos graus atribuídos por cada indivíduo do grupo - alunos e professor.

No final do curso, os alunos responderam a um questionário de avaliação que considerava: a) adequação da metodologia aplicada; b) nível do conteúdo da matéria discutida durante o curso; e c) se o aluno havia atingido o objetivo geral proposto no início do curso.

RESULTADOS

O desenvolvimento do grupo, no decorrer do curso, foi muito bom. Os alunos liam semanalmente a bibliografia fornecida, e com isto o nível de conteúdo das discussões foi bastante alto. Tal fato foi percebido pelos alunos, visto que, ao responderem o questionário de avaliação do curso seis deles afirmaram que o nível correspondeu à expectativa, e quatro disseram que o curso foi além da expectativa prevista. Isso ficou ainda demonstrado pelo grau atribuído ao grupo como unidade de trabalho, cuja média foi 8, numa escala de 0 a 10. Além disso, o resultado das provas escritas, cuja média geral foi de 7,77 (desvio padrão de 1,13), sugere que o aprendizado foi satisfatório.

Outro aspecto importante, no que diz respeito ao aprendizado, é que na medida em que cada aluno do grupo dispunha de total liberdade de expressão, durante as discussões, desenvolveu-se entre eles uma atitude crítica perante o que estava sendo aprendido. Esse tipo de aprendizado crítico foi acompanhado não apenas pelo professor, mas também pelos alunos, o que ficou clara­ mente demonstrado nos relatórios sobre a avaliação do curso.

As tarefas práticas foram cuidadosamente realizadas pelos alunos, e consistiram, na sua maioria, de experimentos de embriologia já conhecidos. No entanto, dois alunos chegaram a desenvolver trabalhos originais.

Dois outros pontos importantes puderam ser verificados nos relatórios de avaliação do curso; assim, todos os doze alunos acharam adequada a metodologia empregada, e onze afirmaram que atingiram o objetivo geral proposto na primeira discussão.

Devemos ainda salientar que, em três semestres subseqüentes, utilizamos esse método de ensino, obtendo resultados satisfatórios, semelhantes aos descritos acima.

DISCUSSÃO

A experiência didática apresentada no presente trabalho sugere que um programa de ensino para pequenos grupos de alunos, voltado principalmente para um aprendizado crítico, utilizando a técnica de discussão em grupo, pode surtir bons resultados não apenas em relação à aquisição do conhecimento, mas também no que diz respeito à possibilidade de se estabelecer um clima de “criação intelectual coletiva” durante as discussões, cujo resultado é absorvido individualmente por cada aluno do grupo. Isto faz do aprendizado um processo ativo e criador.

Os cursos de Medicina, Odontologia, Enfermagem, Nutrição e Biologia apresentam, em geral turmas de mais de 60 alunos, mas acreditamos que a metodologia acima descrita possa ser aplicada para um maior número de alunos, desde que as turmas sejam subdivididas em grupos de cerca de quinze pessoas. Tal sistema de subdivisão de turmas utilizando a metodologia de discussão em grupo vem sendo aplicado no ensino de Patologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, com resultados bastante promissores66. SARNO, E. N. - Um Curso de patologia geral. Rev. Bras. Educ. Med. 4: 1-4, 1980..

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • 1
    DAVIES, M. A. - Audiotape and booklet self instructional materials in physiology: an evaluation of their clinical curriculum. Med. Educ 11: 370, 1977.
  • 2
    DE SOUZA, R. R. - Self instruction in anatomy for medical students Rev. Bras. Pesq. Med. Biol 11: 145-146, 1978.
  • 3
    ESSEX, D. L. - Effectiveness of instructional computers in teaching basic medical sciences. Med. Educ 13: 189-193, 1979.
  • 4
    FISHER, L. J. - Teaching of neuroanatomy by means of self instructional laboratory stalations. Med. Educ 14: 119-123, 1980.
  • 5
    KALACHE, A. & MACHA DO-COELHO, M. A. - O Uso do computador na avaliação formativa. Educ. Med. y Salud 8: 191-204, 1974.
  • 6
    SARNO, E. N. - Um Curso de patologia geral. Rev. Bras. Educ. Med 4: 1-4, 1980.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 1982
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