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O Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em Saúde: uma Estratégia para a Melhoria da Graduação Médica

Resumo:

Discutem-se os desafios atuais da Educação Médica, focalizando a especificidade da formação docente em saúde e da incorporação da tecnologia educacional nos cenários pedagógicos do processo ensino-aprendizagem da graduação em Medicina. Apresenta­se a experiência da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina com a implementação de um Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em Saúde como uma estratégia que visa à melhoria da graduação por meio de uma atuação interdisciplinar.

Palavras-chave:
Educação médica; Capacitação docente; Tecnologia educacional

Summary:

The authors discuss the contemporary challenges of Medical Education, focusing primarily on the specificity of teacher training. They also emphasize the incorporation of educational technology to the pedagogic scenaries of the teaching-learning process in undergraduation in Medicine. They introduce the experience of Unifesp-EPM with the setting up of a Center for Development of Higher Teaching in Health. This center aims at improving undergraduate medical studies through an interdisciplinary approach.

Keywords:
Medical education; Educational Technology

INTRODUÇÃO

Os recentes avanços no processo de comunicação, associados à evolução da Psicologia Cognitiva, colocam, para a Universidade, a necessidade de produzir conhecimento sobre sua própria prática, tomando como objeto seu projeto educacional, incluindo organizações e estruturas acadêmicas, processos pedagógicos e novas tecnologias no ensino superior em saúde.

Este desafio tem suscitado uma reflexão permanente, no contexto acadêmico, sobre a prática docente e o processo ensino-aprendizagem no ensino superior em saúde.

Os debates em torno dessa questão têm priorizado reflexões sobre as tendências atuais da educação médica, indicando transformações em seus enfoques curriculares e a incorporação de novas estratégias de ensino, que têm em sua base pressupostos que valorizam a promoção da saúde, os problemas comunitários e a compreensão do homem em sua totalidade, dos valores sociais e da comunicação (Declaração de Edimburgo de 1988)11. WORLD FEDERATION FOR MEDICAL EDUCATION. The Edimburg Declaration. Lancet, v. 464, p. 8608, 1988..

No âmbito de estudos e avaliações sobre a prática pedagógica das escolas médicas, há que incluir a capacidade de reunir informações com sensibilidade e discernimento; de formular critérios e começar a agir com base em probabilidades; de tomar decisões de acordo com a realidade; de prosseguir com a aprendizagem independente após a conclusão dos estudos formais.

Tão importantes quanto a seleção de metodologias adequadas de ensino são os procedimentos empregados para avaliar o alcance dos objetivos definidos para o processo de aprendizagem na graduação. Atualmente, os procedimentos de avaliação mais utilizados medem, primeiro, a capacidade de rememorar e reproduzir fragmentos de informação, recompensando mais o conteúdo do que o raciocínio. Contudo, os avanços teóricos das últimas décadas têm aberto espaço para o desenvolvimento de novos instrumentos de avaliação e o aperfeiçoamento dos antigos.

É neste sentido que a Associação Americana de Escolas Médicas (AAMC)22. LIAISON COMMITEE ON MEDICAL EDUCATION. Functions and Structure of a Medical School. Washington D.C.: AAMC, 1991., em 1991, recomenda aos professores fomentar nos estudantes a capacidade de aprender mediante estudos autodirigidos e independentes ao longo de sua carreira profissional.

Essa recomendação já se fazia presente nas reflexões da Associação Brasileira de Educação Médica, apontadas por Chaves & Rosa (1990)33. CHAVES, M.; ROSA, A. R. Educação médica nas Américas: o desafio dos anos 90. São Paulo: Cortez, 1990., segundo as quais, se os membros do corpo docente devem representar mais do que um simples recurso de informação, agindo como facilitadores da aprendizagem ativa do estudante, que continuará através de sua vida profissional, deduz-se que eles devem saber mais do que muitos sabem acerca da dinâmica da aprendizagem e de várias técnicas de ensino e avaliação, a fim de suplementar seu conhecimento de ciências biomédicas.

Tudo isso traz à reflexão outra questão fundamental: a preparação do professor para seu papel educacional.

No Encontro Continental de Educação Médica, realizado no Uruguai em 1994, foram considerados como elementos fundamentais para elevar a qualidade do ensino superior em saúde a profissionalização docente, a instauração de mecanismos que permitam o desenvolvimento e a atualização de seu desempenho pedagógico e a melhoria das condições de sua prática.

No que diz respeito à avaliação do docente de ensino superior, cabe considerar, conforme Severino (1991)44. SEVERINO, A. J. A Formação profissional do educador: pressupostos filosóficos e implicações Curriculares. Revista da Associação Nacional de Educação. v. 10, n.17, p. 29-40, 1991., as seguintes dimensões fundamentais: o domínio do conhecimento (conteúdo), o domínio de habilidades (instrumental, técnico e metodológico) e o domínio das relações situacionais (referências existenciais dos envolvidos no processo educacional).

Todos esses elementos trazem à tona a importância da reflexão a respeito do processo ensino-aprendizagem, enfatizando a participação mais ativa do aluno enquanto construtor do seu próprio conhecimento e a atuação docente enquanto animadora desse processo.

Neste sentido, a tecnologia educacional em saúde deve explorar a introdução de novas opções para o ensino de graduação, hoje frequentemente massificado pela predominância de aulas expositivas e métodos tradicionais de avaliação, que pouco contribuem para que o aluno conquiste maior independência e autonomia em sua formação acadêmica. Para tanto, cabe, conforme comentam Byrne e Rosenthal (1994)55. BYRNE, N. & ROSENTHAL, M. Tendências actuales de la educación medica y propuesta de orientación para la Educación Medica em América Latina. Educ. Med. Salud, n. 28, p. 53-92, 1994., incorporar avanços científicos de diferentes campos do saber, como as teorias da comunicação, comunicação social, psicologia social, psicologia da aprendizagem e inteligência artificial, entre outros.

A partir dos aspectos aqui levantados e de outros que têm sido preocupação de reflexões e debates sobre a educação em saúde, é importante assumir as recomendações do Encontro Continental de Educação Médica (Uruguai, 1994)66. Encuentro Continental de Educación Medica. Relato. Uruguai, 1994. no sentido de buscar modos de integração nacional, regional e internacional para o desenvolvimento conjunto em temas como a informação técnico-científica e para a gestão de qualidade em educação em saúde, o fomento da investigação e o intercâmbio de experiências de alunos e de docentes.

Propõe-se, portanto, urna estrutura de redes colaborativas interinstitucionais que não somente compartam a informação, mas também permitam um melhor aproveitamento das possibilidades regionais, nacionais e internacionais de cooperação técnica e financeira.

Assim, considerando a complexidade do tema e sua atual relevância, quando se buscam caminhos para a formação de um profissional de saúde humanista e técnico competente, adequado às demandas da população e do próprio sistema de saúde, a Unifesp/EPM encontra-se em um momento de reflexão da prática docente no ensino superior em saúde. Neste sentido, abriu um espaço formal em sua estrutura acadêmica e implantou, em 1996, o Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em Saúde - Cedess.

OBJETIVOS

O Cedess, com a intenção básica de ampliar caminhos para a formação e o aperfeiçoamento de profissionais para o ensino superior em saúde e a produção de material educativo, assume os seguintes objetivos:

Refletir sobre a prática de ensino na universidade, focalizando a especificidade da área da saúde;

Avaliar os diferentes procedimentos utilizados no processo ensino-aprendizagem na área da saúde;

Conduzir oficinas de trabalho e cursos de curta duração para o desenvolvimento docente;

Produzir vídeos educativos na área da saúde, bem como implantá-los e avaliá-los no âmbito do ensino da graduação;

Discutir formas de julgamento e utilização de resultados da avaliação de ensino superior em saúde;

Propiciar o uso de diferentes tecnologias (material impresso, livros-texto, vídeos, softwares, etc.) a professores e alunos, visando à melhoria do processo ensino­aprendizagem na graduação;

Desenvolver pesquisa no campo da Educação em Saúde, assim como na utilização de novas tecnologias de informação no processo educacional em saúde;

Estabelecer, em forma de rede, sistema de intercâmbio com centros congêneres no Brasil e no exterior.

AÇÕES

O Cedess, no contexto da Unifesp/EPM, constitui um órgão complementar vinculado à Pró-Reitoria de Graduação e atua de forma interdisciplinar, mantendo estreito intercâmbio com os seguintes órgãos da Universidade:

Centro de Informática em Saúde - CIS;

Coordenadoria de Avaliação e Integração de Dados Institucionais - Caidi;

Biblioteca Acadêmica - Biblac.

As atividades são desenvolvidas por intermédio de quatro setores internos ao próprio Centro:

Setor de Desenvolvimento de Recursos Humanos para a Docência em Ciências da Saúde

Este setor concretiza as atividades referentes à formação e capacitação docente e ao desenvolvimento de estudos e pesquisas na área da Educação em Saúde.

A capacitação docente se realiza por meio de cursos, seminários, workshops, oficinas de trabalho, curso de pós-graduação lato sensu. Aos pós-graduandos é ofertada a disciplina Formação Didático-Pedagógica em Saúde, e ao Curso de Graduação em Medicina, uma disciplina eletiva - Educação e Comunicação na Formação e no Exercício Profissional do Médico.

Para o desenvolvimento dessas atividades, conta-se com um "Laboratório de Práticas de Ensino", cuja instalação foi financiada pela Capes/Programa Integração Graduação/Pós-Graduação e que oferece condições adequadas ao treinamento docente, assim como à avaliação crítica de novas tecnologias que podem ser utilizadas no processo ensino-aprendizagem.

Setor de Produção e Avaliação de Vídeos Educativos

Este setor tem por objetivo produzir vídeos educativos na área da saúde, bem como implantá-los e avaliá-los no âmbito do ensino de graduação.

Para isto, a produção de vídeos educativos ocorre a partir de projetos previamente elaborados, propostos pelos Departamentos de Ensino da Unifesp/EPM, contando com uma Assessoria de Conteúdo e uma Assessoria Pedagógica.

Além da produção local de vídeos, este setor importa vídeos educativos produzidos em outros centros do País ou do exterior, por meio de trabalho conjunto com os Departamentos envolvidos.

Setor de Apoio à Comunicação Visual

Este setor apoia os trabalhos desenvolvidos nos demais setores e também atende à comunidade universitária de maneira a integrar as necessidades por serviços especializados na área de produção visual (confecção de slides, pósteres, cartazes, desenho, fotografia) com as realizações do Cedess.

Além dessas atividades, são providenciadas tradução e versão de materiais de interesse da comunidade acadêmica.

RECURSOS HUMANOS

Para operacionalizar seus objetivos e ações, o Cedess conta com uma equipe docente multidisciplinar (profissionais das áreas de Medicina, Fonoaudiologia, Sociologia, Psicologia e Educação).

O corpo técnico-administrativo é constituído de profissionais especializados na área de comunicação visual (vídeos educativos, programação visual, slides, desenho e fotografia), além de pessoal para o desenvolvimento de trabalho de apoio e suporte operacional.

A carência de centros especializados no desenvolvimento, implantação de novas tecnologias, avaliação e, acima de tudo, investigação no campo da tecnologia educacional em saúde nos impulsionou a propor, partindo da experiência e recursos atualmente disponíveis na Unifesp/EPM, a criação deste Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em Saúde (Cedess­Unifesp/EPM) como órgão da Universidade comprometido com o ensino, a pesquisa e a extensão relacionados à melhoria da graduação em Ciências da Saúde.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • 1
    WORLD FEDERATION FOR MEDICAL EDUCATION. The Edimburg Declaration. Lancet, v. 464, p. 8608, 1988.
  • 2
    LIAISON COMMITEE ON MEDICAL EDUCATION. Functions and Structure of a Medical School. Washington D.C.: AAMC, 1991.
  • 3
    CHAVES, M.; ROSA, A. R. Educação médica nas Américas: o desafio dos anos 90. São Paulo: Cortez, 1990.
  • 4
    SEVERINO, A. J. A Formação profissional do educador: pressupostos filosóficos e implicações Curriculares. Revista da Associação Nacional de Educação. v. 10, n.17, p. 29-40, 1991.
  • 5
    BYRNE, N. & ROSENTHAL, M. Tendências actuales de la educación medica y propuesta de orientación para la Educación Medica em América Latina. Educ. Med. Salud, n. 28, p. 53-92, 1994.
  • 6
    Encuentro Continental de Educación Medica. Relato. Uruguai, 1994.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Set 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 1998
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