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Experimentos Portáteis para o Aprendizagem das Leis da Óptica Geométrica com Metodologia ISLE

Portable Experiments for Learning about Laws of Geometric Optics with ISLE Methodology

Resumos

Neste trabalho socializar-se-ão a idealização e a construção de experimentos portáteis planejados para alargar a aprendizagem no campo das Ciências da Natureza. Descrever-se-á detalhadamente uma sequência didática para a aplicação do Experimento Portátil (ExP) sobre as leis da óptica geométrica, desenvolvida a partir de orientações psicopedagógicas de Freire, Vygostky, Ausubel e Moreira. Os experimentos portáteis foram produzidos a partir de pesquisa relacionada com os estudos da metodologia para o ensino de física recorrendo à metodologia ISLE. Tais produtos podem ser montados e manuseados na sala de aula, em aulas presenciais ou online, se constituindo em experimentos pedagógicos que podem auxiliar assertivamente professores de ciências e de matemática no contexto do ensino remoto, motivado pela pandemia da COVID-19. Esta nova ferramenta se afirmou como uma solução assertiva para o ensino de ciências e de matemática experimental no período da pandemia, contexto em que as aulas remotas ou gravadas se constituíram na alternativa possível para mitigar aglomerações, principalmente, porque a partir da mediação do produto pedagógico, sobre as leis da óptica geométrica, as aprendizagens se tornaram potentes, mesmo que os estudantes se encontrassem distantes da infraestrutura laboratorial das instituições de ensino que o adotaram no seu repertório metodológico.

Palavras-chave:
Aprendizagem; experimento portátil; sequência didática; metodologia ISLE


We will socialize the design and how to make of portable experiments to broaden learning in the field of Natural Sciences. We will describe in detail the application of the Portable Experiment (ExP) on the laws of geometric optics developed from psychopedagogical prescription of Freire, Vygostky, Ausubel and Moreira. The ExP were created from research initially related to the studies of the methodology for teaching physics using the ISLE (Investigative Science Learning Environment) methodology. Such products can be assembled and handled in the classroom or in the context of student’s homes, in classroom or online classes, constituting pedagogical experiments that can assertively help science and mathematics teachers in the context of remote education motivated by the COVID pandemic-19. This new instrument asserted itself as an assertive solution for the teaching of science and experimental mathematics in the period of the pandemic, where remote or recorded classes constituted the possible alternative to mitigate crowding, mainly because from the mediation of the pedagogical product the learning became powerful even though students were far from the laboratory infrastructure of educational institutions that adopted it in their methodological repertoire.

Keywords:
Learning; portable experiment; ISLE methodology


1. Introdução e Fundamentação Teórica

O objetivo central da aprendizagem escolar no campo das ciências e da matemática, dentre elas a física, deve ser demonstrar conceitos para que os estudantes desenvolvam autonomia reflexiva para compreender e apreciar os fenômenos. A psicologia cognitiva é um campo de produção do conhecimento que instrui sobre os processos mentais, tais como: percepção, criatividade, tomada de decisão, resolução de problemas, representação, raciocínio, atenção e atribuição de significado. A teorização da psicologia cognitiva advoga que os alunos, para ativar a capacidade de aprender, precisam está prontos! Trata-se de uma teorização que valoriza a atuação dos educadores para o desenvolvimento integral do ser humano. Os docentes são compreendidos como impulsionadores da reconfiguração da estrutura cognitiva do estudante, são mediadores para que a mente esteja aberta para internalizações e amadurecimentos [1[1] L.S. Vygotsky, Mind in society: the development of higher psychological processes (Harvard University Press, Londres, 1978).], esta intenção é mais importante do que a aquisição do conhecimento pelas finalidades meramente instrutivas, para o entretenimento ou para a diversão. O conteúdo presente nos repositórios internacionais, espaços virtuais que abrigam pesquisas realizadas nos principais centros de produção de conhecimento do campo da psicopedagogia, tem demonstrado que, as metodologias de aprendizagem a partir de experimentos, por demonstrações ou por realização de práticas específicas, podem ser uma alternativa pedagógica segura para facilitar a aprendizagem de conteúdos psíquicos que requerem maior grau de abstração por parte dos estudantes.

Porém, é fato que há inúmeras dificuldades para a implantação de atividades práticas nas aulas de ciências e de matemática, dentre elas destacam-se: a aquisição e o manuseio dos equipamentos, a falta de infraestrutura laboratorial e o pouco treinamento dos professores em atividades experimentais. Estas dificuldades se fazem presentes em praticamente todos os contextos escolares do mundo e geralmente se relacionam com a falta de equipamentos, de professores competentes na atividade e de sala ambiente para laboratório. Os pesquisadores do campo concordam que o caminho da aprendizagem por experimentação deve ser mais amplamente usado, principalmente, quando a mediação se fundamenta nos grandes pensadores da educação [1[1] L.S. Vygotsky, Mind in society: the development of higher psychological processes (Harvard University Press, Londres, 1978)., 2[2] P. Freire, Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa (Paz e Terra, São Paulo, 1996), 25. ed., 3[3] P. Freire, Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar (Olho D’Água, São Paulo, 1997)., 4[4] L.S. Vygotsky Thought and Language (The MIT Press, Massachusetts, 1978)., 5[5] D.P. Ausubel, J.D. Novak e H. Hanesian, Education Phychology (Interamericana, Rio de Janeiro, 1980).].

Pensando ainda no repertório de dificuldades, é importante ressaltar a escassez de equipamentos pedagógicos com roteiros e com metodologias assertivas para a aprendizagem significativa em ensino de ciências e matemática. De acordo com Moreira [6[6] M.A. Moreira, Mapas conceituais e aprendizagem significativa, disponível em: https://www.if.ufrgs.br/~moreira/mapasport.pdf
https://www.if.ufrgs.br/~moreira/mapaspo...
, 7[7] M.A. Moreira, Aprendizagem significativa: a teoria e textos complementares (Livraria da Física, São Paulo, 2011).], a aprendizagem significativa se caracteriza pela interação entre novos conhecimentos e o conhecimento prévio do aluno. Sendo que nessa interação, os novos conhecimentos adquirem significado para o sujeito e os conhecimentos prévios adquirem novos significados, proporcionando maior estabilidade cognitiva. Dito de outra forma, a crítica é a seguinte: até existem equipamentos didáticos que se destinam à aprendizagem das áreas referidas neste estudo, porém, na sua imensa maioria, os roteiros desses equipamentos se limitam a descrever sequências de tarefas a serem observadas; faltam, nesses manuais, concepções e atividades pedagógicas que concorram para a aprendizagem a partir da experimentação assertiva. Um exemplo pertinente, uma dificuldade pouco abordada na aplicação de experimentação é a falta de subsunçores dos alunos e até dos professores sobre os equipamentos e seus usos. Subsunçor é o termo utilizado na teoria da Aprendizagem Significativa cunhada por David Ausubel [5[5] D.P. Ausubel, J.D. Novak e H. Hanesian, Education Phychology (Interamericana, Rio de Janeiro, 1980).] para se referir à estrutura cognitiva existente, capaz de favorecer novas aprendizagens. Um exemplo prático do conceito seria: para uma prática sobre óptica é necessário haver conhecimentos sobre componentes ópticos; sem eles não há como se executar as medidas das grandezas e inferir sobre as leis observadas.

Neste contexto de dificuldades, acredita-se que a produção de material experimental didático perspectivado na concepção cognitivista e na aprendizagem significativa seja um caminho alternativo a ser guiado e seguido. Neste artigo, apresentar-se-á uma sugestão de um experimento portátil circunstanciado no salto de qualidade de pensamento do estudante para a aprendizagem significativa do conteúdo escolar sobre as Leis da Óptica Geométrica, a partir de conteúdo de aplicação sobre o funcionamento de instrumentos ópticos, em especial, o olho humano.

Todos os materiais para a realização da aula com experimento portátil estão disponíveis em um caixote elaborado nas mesmas dimensões de um livro didático para assegurar a mobilidade total da experiência. Desta forma, a portabilidade do experimento é um importante atributo para o professor e o aluno, pois se relaciona com o fácil transporte do experimento e a diversidade de locais em que pode se dar a vivência pedagógica. O experimento sobre as Leis da Óptica Geométrica que aqui se ressalta pode ser transportado dentro da uma mochila e pode ser realizado na própria sala de aula, ou ainda, se assim desejar, realizar a prática na própria residência.

O ponto forte do experimento que aqui se defende repousa na metodologia de aprendizagem ISLE (Investigative Science Learning Environment), um caminho pedagógico que proporciona ao executor observar e experimentar, para em seguida, teorizar e modelar sobre o tema em estudo. Essa perspectiva, ao enfatizar a prática experimental, colabora com a criação e concepção de subsunçores experimentais. Novamente, para ilustrar a argumentação, ressalta-se que não há na vida cotidiana de um cidadão comum o uso de ohmímetro, voltímetro ou amperímetro; daí, em uma atividade prática, haverá o contato com estes instrumentos e consequentemente criam-se novos conhecimentos ditos subsunçores, para se alcançar novos conteúdos.

Na sequência, apresentar-se-á inicialmente as experimentações, para só depois apresentar a modelagem e a teorização das observações, seguindo a perspectiva metodológica ISLE.

2. ISLE

Esta metodologia de aprendizagem foi criada pelo grupo da Graduate School of Education, Rutgers University dos Estados Unidos da América, liderado pela professora Eugenia Etkina [8[8] E. Etkina, e A. Van Heuvelen, Investigative Science Learning Environment – A Science Process Approach to Learning Physics, disponível em: http://per-central.org/per_reviews/media/volume1/ISLE-2007.pdf
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], tendo inclusive já recebido a “medalha Robert A. Millikan” da Associação Americana de Professores de Física [9[9] E. Etkina, American Journal of Physics 83, 669 (2015).]. Há inclusive um sítio na internet com vastas informações sobre esta metodologia, https://www.islephysics.net/. Outra referência que apresenta essa metodologia mais recente e em língua portuguesa é G.G. de Oliveira et al. [10[10] G.G. Oliveira, A.H. Vasconcelos, L.C.N. Sousa, J.S. Costa, A.P. Lima e C. Chesman, Rev. Bras. Ens. Fis. 44, e20210388 (2022).].

De forma resumida o método ISLE é um jogo epistêmico, um jogo cognitivo que emula a metodologia pela qual os cientistas criam o seu conhecimento. É possível acessar uma profícua entrevista sobre esta temática do jogo pedagógico, concedida pela pesquisadora Adriana Araújo da Universidade do Minho em Portugal, por meio do endereço: <https://www.potiguarnoticias.com.br/noticias/46180/estamos-dentro-de-um-grande-jogo-vivendo-e-aprendendo-a-jogar>

Neste contexto de ser um jogo, a chave para o jogo é seguir com bom grau de engajamento e mediar a vivência do experimento com performance de investigação misteriosa. Os alunos constroem seus conceitos de ciência e desenvolvem habilidades de aprendizagem da ciência, simulando os processos que os cientistas usam para construir conhecimento, com ciclo que segue a Figura 1, iniciando-se com uma observação prática, passando-se essencialmente pelo método científico e finalizando-se com aplicações tecnológicas.

Figura 1
Ciclo ou diagrama de bloco do ISLE. O início é a observação ou uma experimentação. Segue-se a construção de conceitos de física e desenvolve habilidades de aprendizagem da ciência simulando os processos que os cientistas usam para construir conhecimento e, por fim, chegam-se às aplicações tecnológicas, conforme referência [10[10] G.G. Oliveira, A.H. Vasconcelos, L.C.N. Sousa, J.S. Costa, A.P. Lima e C. Chesman, Rev. Bras. Ens. Fis. 44, e20210388 (2022).]. Fonte: referência [10[10] G.G. Oliveira, A.H. Vasconcelos, L.C.N. Sousa, J.S. Costa, A.P. Lima e C. Chesman, Rev. Bras. Ens. Fis. 44, e20210388 (2022).].

3. Produção Didática Inovadora: Os Experimentos Portáteis

Conforme já se pontuou, este artigo ressalta a descrição fundamentada da produção de experimentos portáteis que se organizam dentro de um caixote de madeira, mais ou menos do tamanho de um livro, para que possa ser transportado dentro de uma mochila. Veja a Figura 2, uma fotografia deste caixote; é feito de madeira tipo MDF e foi cortado a laser, mede 21,0 cm de comprimento, 17,0 cm de largura e 7,0 cm de altura.

Figura 2
Fotografia de um livro e um ExP nas mãos de um aluno; veja as dimensões semelhantes. Estes tamanho e formato permitem fácil transporte e armazenamento pelo professor ou aluno. Esses objetos podem ser tranquilamente guardados em estantes nos ambientes escolares e universitários. Fonte: Imagem dos autores.

Os materiais escolhidos para compor cada ExP são de baixo custo e de fácil aquisição; usaram-se novas tecnologias de confecção (corte a laser e impressora 3D), e na medida do possível, se aproveitaram materiais existentes no centro comercial, de fácil acesso nos centros urbanos. Sem a necessidade de manufaturar novas peças, este ponto foi crucial na produção do material, isto é, usou-se a criatividade, visando cumprir os objetivos iniciais de ser portátil, ter baixo custo e fácil aquisição.

Concomitamente ao uso da metodologia ISLE, é também muito importante se criar a sequência didática para orientar a mediação didática do material. Sequência didática é um termo utilizado na área educacional que caracteriza o conjunto de atividades planejadas e interligadas para o ensino de um conteúdo. É um instrumento de gestão pedagógica da aula que consiste em um sistema que pode ser utilizado em todas as disciplinas, pois visiona auxiliar o professor na organização do trabalho em sala de aula de forma gradual, partindo de habilidades que os alunos já dominam (subsunçor) para alcançar os níveis que eles ainda precisam dominar [6[6] M.A. Moreira, Mapas conceituais e aprendizagem significativa, disponível em: https://www.if.ufrgs.br/~moreira/mapasport.pdf
https://www.if.ufrgs.br/~moreira/mapaspo...
]. A metodologia ISLE segue claramente em três momentos pedagógicos e com uma abordagem problematizadora [1[1] L.S. Vygotsky, Mind in society: the development of higher psychological processes (Harvard University Press, Londres, 1978)., 2[2] P. Freire, Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa (Paz e Terra, São Paulo, 1996), 25. ed.], a saber: Primeiro Momento Pedagógico (Problematização Inicial), Segundo Momento Pedagógico (Organização do Conhecimento) e Terceiro Momento Pedagógico (Aplicação do Conhecimento). Todas essas etapas concorrem para uma vivência experimental direcionada para a aprendizagem ativa, por meio da participação em um jogo epistêmico em que há proatividade coletiva, a partir da estimulação da curiosidade e da descoberta na interação com o material didático. A metodologia ativa se baseia em unidades de aprendizagem [6[6] M.A. Moreira, Mapas conceituais e aprendizagem significativa, disponível em: https://www.if.ufrgs.br/~moreira/mapasport.pdf
https://www.if.ufrgs.br/~moreira/mapaspo...
, 7[7] M.A. Moreira, Aprendizagem significativa: a teoria e textos complementares (Livraria da Física, São Paulo, 2011).] sendo formulada a partir da incontestável necessidade da atuação do discente na construção do seu conhecimento. Nessa perspectiva, as metodologias ativas de ensino apresentam-se como um conjunto de estratégias que visam transformar os processos de ensino e de aprendizagem em um ato dinâmico, onde o principal ator deixa de ser o professor. Nesse cenário, o aluno assume um papel de construtor do próprio conhecimento e o professor, o provedor dos meios e procedimentos adequados para que o aluno atinja seus objetivos [7[7] M.A. Moreira, Aprendizagem significativa: a teoria e textos complementares (Livraria da Física, São Paulo, 2011).]. Neste ponto, é interessante que sejamos apresentados às metodologias ativas que basearam o desenvolvimento das Unidades de Aprendizagem Ativa: Peer-Instruction (Instrução por Pares) e Flipped Classroom (Sala de Aula Invertida) [6[6] M.A. Moreira, Mapas conceituais e aprendizagem significativa, disponível em: https://www.if.ufrgs.br/~moreira/mapasport.pdf
https://www.if.ufrgs.br/~moreira/mapaspo...
, 7[7] M.A. Moreira, Aprendizagem significativa: a teoria e textos complementares (Livraria da Física, São Paulo, 2011).]. Com esta prática pedagógica, professores revelam depoimentos dos alunos relacionados à aplicação das ideias em suas vidas cotidianas e isso é um indicador de que a experiência corrobora para a ampliação da memória em longo prazo, ambiente cognitivo onde se encontra as aprendizagens consolidadas. A memória em longo prazo é uma designação que se relaciona com a capacidade de manter a informação adquirida recentemente até décadas. É diferenciada estruturalmente e funcionalmente da memória de trabalho, também chamada de memória em curto prazo, que diferentemente armazena conteúdos por pequenos prazos de tempo. Em psicopedagogia compreendemos memória em longo prazo como um processo que está intimamente relacionada com a aprendizagem assertivamente consolidada [7[7] M.A. Moreira, Aprendizagem significativa: a teoria e textos complementares (Livraria da Física, São Paulo, 2011).].

Para exemplificar como é a criação e uso desses Experimentos Portáteis, se descreverá o ExP sobre as Leis da Óptica Geométrica, centradamente na montagem, nos materiais e na sequência didática para o uso desse experimento portátil.

Os professores pesquisadores responsáveis pela produção do experimento em evidência neste artigo desenvolvem Experimentos Portáteis desde 2018, com o apoio Departamento de Física da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e com aporte do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Conforme já pontuado, o objetivo central do material didático é facilitar a aprendizagem dos conceitos presentes nos currículos escolares por meio de experiência que integre conhecimento científico e experimental de forma desafiadora e contagiante a partir de experimento portátil. A criação autoral dos experimentos fez nascer um grupo de pesquisa que é formado por professores pesquisadores da Física, Química, Biologia, Matemática, Pedagogia e Psicopedagogia, constituindo uma comunidade científica interdisciplinar. Para o visionamento dos vários ExPs já produzidos pelo grupo interdisciplinar Fractal, se orienta a conexão no endereço virtual <www.fractal.ind.br>. No sítio que expressa a larga produção didática dos pesquisadores, também se disponibiliza uma revista online em formato PDF informativa sobre os produtos e as experiências por meio do link: <https://fractal.ind.br/pdfs/Fractal_Revista.pdf>.

4. ExP Leis da Óptica Geométrica

Este ExP foi montado com o objetivo de facilitar o manuseio e orientação dos componentes ópticos em um quadro magnético. Todos esses componente ópticos possuem uma manta magnética, semelhante aos chamados ímãs de geladeira, fixada em uma de suas profundidades laterais. Os componentes são perfis de lentes e são todas cortados com raios esféricos e de material acrílico transparente, cortadas a laser. Com os ajustes do corte a laser não será necessário fazer polimento nas superfícies das lentes para a realização experimental das práticas.

A placa magnética é formada por uma placa zincada de 1,2 mm de espessura e dobrada para ficar com dimensões de 15 cm × 20 cm e base de 5 cm × 20 cm, nesta os elementos ópticos (perfil de lentes e espelhos) são fixados por um pedaço de manta magnética. Os espelhos e o prisma, mesmo após corte a laser, precisam ser polidos. Os espelhos, também esféricos, são montados com papel adesivo na cor prateada, e as curvaturas são as mesmas das lentes.

Para observar algumas propriedades do desvio da luz dentro do olho, uma figura pictórica de um olho é fixada no quadro magnético, e os perfil-lentes fixados sobre esta figura ilustram a trajetória dos feixes luminosos. Como fonte luminosa, usam-se 2 lasers de diodo na cor vermelha acoplados a uma lente cilíndrica, para tornar o feixe inicialmente pontual-circular em um traço vertical, assim, a trajetória retilínea dos feixes de luz poderá ser visualizada na superfície do quadro magnético, por ocasião da execução das diferentes experimentações.

Na Figura 3, há uma fotografia desse ExP e seus materiais, dentro do caixote e em uso com os lasers ligados e os perfis das lentes fixadas magneticamente no quadro. Observa-se nitidamente a trajetória do feixe na placa magnética.

Figura 3
Fotografia do caixote com todos os materiais do ExP Leis da Óptica Geométrica. Fonte: Imagem dos autores.

Os materiais que compõem o Experimento Portátil mencionado são:

  • 01 Caixote de madeira MDF (0,3 cm de espessura) com tampa (21,0 cm × 17,0 cm × 7,0 cm).

  • 01 Placa magnética, anteparo (20,0 cm × 15,0 cm) com base (20,0 cm × 5,0 cm).

  • 01 Emissor de luz com 2 lasers de diodo com 2 spots retílineos (650 nm e < 1 mW), com cabo 40 cm de comprimento e 3,5 mm de diâmetro e conector USB na extremidade.

  • 01 Fonte AC/DC 220/110 volts (bivolt) para 5,0 volts para alimentar os lasers.

  • 01 Prisma equilátero de acrílico com 1,0 cm de espessura e 3,0 cm de lado.

  • 01 Perfil-Espelho Plano-côncavo com -2,5 cm de foco, espessura de 1,0 cm.

  • 01 Perfil-Espelho Plano-convexa com +2,5 cm de foco, espessura de 1,0 cm.

  • 01 Perfil-Lente plana bicôncava, -5,0 cm de foco, espessura de 1,0 cm.

  • 01 Perfil-Lente plana biconvexa, +5,0 cm de foco, espessura de 1,0 cm.

  • 01 Perfil-Lente plano-côncava, -10,0 cm de foco, espessura de 1,0 cm.

  • 01 Perfil-Lente plano-convexa, +10,0 cm de foco, espessura de 1,0 cm.

  • 01 Perfil-Lente plana-plana com espessura de 1,0 cm.

  • 01 Figura pictórica do olho humano com manta magnética, 8 cm × 13 cm.

5. As Sequências Didáticas Para o ExP Leis da Óptica Geométrica

A sequência didática se divide basicamente em três etapas de realizações experimentais, alinhadas com aprendizagens sobre leis básicas da óptica geométrica, lei da reflexão, lei da refração e a aplicação sobre óculos e olho humano.

No primeiro momento pedagógico, o professor apresenta aos estudantes os materiais e o seu uso. Como ligar os dois feixes de lasers, como visualizá-los na placa magnética, como posicionar os perfil-lentes, perfil-espelhos e prisma na placa magnética e, se for para estudo quantitativo, como colocar um papel e marcar os traços das trajetórias dos feixes. Com esses diálogos, o passo inicial da problematização inicial foi executado.

Para se atingir o segundo momento pedagógico qualitativamente, é apresentada a trajetória dos feixes. Após a apresentação de cada elemento óptico (lentes, espelhos e prisma) pergunta-se aos estudantes qual deve ser a trajetória da luz após passar por cada um destes elementos, para, em seguida, colocá-los no caminho dos feixes. É momento de aguçar a observação experimental.

Da observação, solicita-se que seja feita uma classificação ou caracterização dos padrões das observações do comportamento dos feixes após passar por de cada perfil-lente, de cada espelho e do prisma. Depois, pergunta-se o que há de comum nesses elementos ópticos. Uma possível resposta inicial: todos desviam o feixe luminoso, cada um de uma forma diferente. Mas será que todos desviam? Percebe-se-á que uns aproximam os feixes. Assim, algumas respostas seriam “atraem” os feixes para um ponto e outros “repelem” os feixes. Neste momento, pode-se introduzir o conceito de foco, ponto onde os feixes se encontram, que pode ser visto diretamente quando os dois feixes se unem em um ponto geométrico, isto quando um perfil de lente dito convergente for colocado na frente dos dois feixes de laser paralelos, ou ainda pode ser desenhado no prolongamento dos feixes de um perfil de lente dita divergente, define-se um foco positivo e um foco negativo, respectivamente. Observe que a definição do que é foco, partiu da observação experimental.

Nesse momento, pode-se também explorar os padrões entre os perfis das lentes e dos espelhos, por exemplo; ambos apresentam foco, já o prisma não apresenta o foco, os feixes continuam paralelos depois da passagem por ele, entretanto, ocorre um desvio. Em seguida, pode-se instigar e perguntar o que acontece com a associação de lentes e espelhos (em série, em paralelo ou mista). Qual seria a trajetória dos feixes? Escutam-se as respostas e suas justificativas e logo em seguida realiza-se a experimentação. Para instigá-los mais ainda vem à clássica pergunta: por que ocorrem esses desvios? Qual é o fenômeno científico que o explica?

Ainda no segundo momento pedagógico, se iniciará a observação das leis da óptica geométrica, da lei da reflexão e da lei da refração. Para a lei de reflexão, usam-se os espelhos, inicialmente o espelho plano. Examinam-se os feixes incidentes e refletidos no espelho plano, faz-se girar o espelho e investigar, por exemplo, o triângulo formado entre os feixes incidentes e refletidos e que padrão se apresenta. Sempre se formará um triângulo com dois lados iguais, um triângulo isósceles. Ou, de outra maneira, pode-se dizer que o ângulo de incidência é igual ao ângulo refletido. Apresenta-se a equação (1):

(1) θ incidente = θ refletido

Para examinar a lei da refração usa-se inicialmente a perfil-lente plana, o paralelograma de acrílico. Neste caso, usa-se um estudo quantitativo para se observar a lei da refração. Observa-se o triângulo formado entre a trajetória dos feixes e a superfície plana desse Pefil-ente, no caso é um triângulo retângulo. Assim, mede-se a projeção do feixe ao longo do comprimento da superfície da lente plana, isto é, a projeção das hipotenusas, C1 e C2. Faz-se umas 5 medidas, e comparando-se o resultado da divisão C1/C2, arredondado para uma casa após a vírgula, encontra-se sempre o mesmo valor, 1,5.

Como explicar este número constante mágico? De onde ele surgiu?

Nesta etapa, o professor deve deixar os alunos pensarem e escutar todas as respostas. Pode sugerir que isso ocorre talvez seja devido a alguma propriedade do material que forma a lente, dando a possibilidade de consultar tabelas de índice de refração. Se isso ocorrer, encontrar-se-á o número 1,5, o índice de refração do acrílico. Aqui o jogo da investigação pode tomar um novo rumo com as consultas em livros e revistas científicas, assim mesmo, como faz um cientista, procurar referências de outros autores sobre o assunto investigado. Um adendo interessante é perguntar ou responder, se o feixe de laser fosse de outra cor, o valor encontrado seria exatamente 1,5? Pode-se lembrar que Isaac Newton verificou que com uma luz branca passando pelo prisma, surge um arco-íris de cores, isto é, a decomposição das cores do feixe original, este fenômeno observado é o advento da espectroscopia óptica [11[11] R.A. Martins e C.C. Silva, Rev. Bras. Ens. Fis. 37, 4202-1 (2015).].

Na atualidade, o uso das informações na internet é o caminho mais rápido, isto é, uma consulta bibliográfica pode ser sugerida aos alunos. Ou ainda, consultar os livros da Beatriz Alverenga ou Alberto Gaspar referentes as leis da óptica geométrica [12[12] B. Alvarenga e A. Máximo, Física (Scipione, São Paulo, 2006), v. 2, 3 ed., 13[13] A. Gaspar, Física (Ática, São Paulo, 2016), v. 2, 3 ed.]. A equipe encontrará a equação (2):

(2) n 1 s e n θ 1 = n 2 s e n θ 2 .

Esta é a lei da refração, onde n1 é o índice de refração do meio 1 (aqui é o ar), θ1 é o ângulo de incidência com relação a normal da superfície da lente plana, n2 é o índice de refração do meio 2 (aqui o acrílico) e θ2 é o ângulo do feixe refratado dentro do acrílico, com relação a normal, a superfície do perfil-lente plana. O valor encontrado nas experimentações foram C1/C2 = 1,5 (valor aproximado das medidas experimentais), ou de acordo com a lei da refração, por indução, se levará à seguinte conclusão:

(3) C 1 C 2 = 1,5 = s e n θ 1 s e n θ 2 1,0 s e n θ 1 = 1,5 s e n θ 2 n 1 s e n θ 1 = n 2 s e n θ 2

Com as leis básicas da óptica geométrica encontradas, pode-se passar para o terceiro momento pedagógico, que é aplicação deste conhecimento. A pergunta chave é: que instrumentos podem-se construir com esses conhecimentos? Ouvem-se as respostas, que podem ser: lupas, óculos, lunetas e microscópios. Tratando-se dos óculos, este é o objeto que será, provavelmente, mais fácil de ser encontrado em sala de aula, pois deve ter ao menos alguém que use óculos no ambiente. Inicialmente, coloca-se uma das lentes na frente dos feixes da luz laser do material, e observa-se a trajetória numa certa distância, como o traço do feixe se comportou depois da lente dos óculos. Será uma lente que converge ou diverge os feixes?

Para continuidade sobre a óptica do olho, o professor-instrutor apresenta a figura de um olho humano com seus constituintes, principalmente, a retina e lente do olho. É necessário que o professor explique aos aprendizes que esta figura é um modelo bem simplificado para o olho humano, isto é, aqui será representado unicamente por um perfil de uma lente convergente, pois na verdade, tanto a córnea, quanto o cristalino, e também o humor vítreo (líquido que preenche o globo ocular) desviam a luz.

Depois, vem outra pergunta: o que deve acontecer com o feixe luminoso ao entrar no olho? Que tipo de lente deve ser a lente do nosso olho para focar a luz na retina? A resposta pode ser obtida experimentalmente, colocando-se os perfis de lentes disponíveis na posição da figura do olho, onde está o desenho da lente do olho humano. A resposta é o perfil-Lente convergente de foco igual a +5,0 cm.

Assim se demonstrará, de forma simplificada e do ponto de vista da óptica, como funciona o olho humano. Tem-se uma lente que converge os raios luminosos na retina e o cérebro reconhece este sinal e transforma em imagem. Pode-se ainda trabalhar os dois principais defeitos da visão humana, a miopia e hipermetropia e suas correções com o uso dos óculos. Como tarefa adicional, pós-atividade prática, pode-se fazer consulta ao princípio de funcionamento dos instrumentos ópticos luneta, telescópio e microscópio, ou ainda como funciona o microscópio eletrônico e o microscópio de tunelamento. Para mais informações de como se executar todas essas etapas práticas e experimentais do uso desse material, orienta-se acessar o link e vide o roteiro (sequência didática):<https://fractal.ind.br/pdfs/ExP_F13_Leis_da_Optica_Geometrica.pdf>

6. Conclusões e Perspectivas

Apresentou-se aqui uma nova ferramenta de aprendizagem, nomeada de Experimento Portátil, que facilita a operação de experimentação pelo professor e aluno, torna-o protagonista, pois permite que o próprio aluno controle toda a sua experimentação. Não há necessidade de infraestrutura laboratorial para a realização da prática, inclusive, pode ser realizada na própria sala de aula ou nos lares dos aprendizes.

No artigo, apresentaram-se em detalhes a idealização, a implementação de um ExP sobre Leis da Óptica Geométrica e suas sequências didáticas. Este trabalho foi iniciado nas atividades laboratoriais de ensino de física. A montagem dos primeiros protótipos contou com recursos aprovados pelo CNPq, enquanto agência de fomento à pesquisa do Brasil, uma bolsa de tipo Desenvolvimento Tecnológico (DT). Mais adiante, foi criada uma microempresa, Fractal Experimentos, que hoje fabrica e comercializa os Experimentos Portáteis. No caso do ExP Leis da Óptica Geométrica, já foram fabricados e comercializados cerca de 200 unidades, sendo os principais consumidores os próprios professores de ciências e de matemática no Brasil.

A equipe de pesquisadores fez doação de 10 (dez) ExPs para o laboratório de óptica do Departamento de Física da UFRN. A aceitação desta inovadora ferramenta também vem sendo testada agora no período da pandemia na disciplina experimental de eletricidade e magnetismo da Universidade; os alunos recebem os ExPs (Leis da Eletrônica), baixam a sequência didática pela internet e realizam o experimento em sua casa com o apoio da internet, inclusive, no formato síncrono, com o professor fazendo acompanhamento em tempo real.

Vale ressaltar que, no caso da utilização institucional, cada ExP deve ser higienizado, antes e depois do uso, na entrada e saída da sala de aula ou do laboratório, com radiação ultravioleta.

Os Experimentos Portáteis são uma alternativa assertiva de aprendizagem significativa. Ressalta-se que se farão necessárias mais avaliações, principalmente, de metodologias avaliativas na área da psicopedagogia, para aferir com mais precisão os limites dessa nova ferramenta de aprendizagem.

Sobre a afirmação da colaboração da dinâmica pedagógica dos ExP integrados à metodologia ISLE no contexto das investigações em nível stricto sensu, sugere-se navegar no link, https://www.editorafamen.com.br/dissertacoes/sequencia-didatica-de-magnetismo-uma-proposta-para-o-ensino-de-alunos-com-tda/. que socializa uma dissertação desenvolvida no Mestrado Nacional Profissional em Ensino de Física (MNPEF), polo da UFRN, em que os citados experimentos ocupam centralidade na investigação em educação. As imagens dos apêndices da dissertação revelam fotografias de estudantes em situação de aprendizagem de física manuseando experimentos portáteis na direção das argumentações apresentadas neste artigo.

Os professores usuários informam também sobre o ganho psicopedagógico a partir da condição da portabilidade, da usabilidade do experimento, da promoção do interesse, autonomia, pertencimento e competência dos discentes; necessidades psicológicas básicas que devem ser alimentadas a fim de impulsionar o desenvolvimento holístico dos estudantes.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    11 Mar 2022
  • Aceito
    19 Abr 2022
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