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Uma reconstrução didática da apresentação original do Teorema de Bell: Sobre o Paradoxo de Einstein, Podolsky e Rosen

A didactic reconstruction of the original presentation of Bell’s Theorem: On the Einstein, Podolsky and Rosen Paradox

Resumos

A desigualdade de Bell, foi uma das discussões que mais gerou controvérsias em torno dos fundamentos da Teoria Quântica, pois envolvia aspectos físico-matemáticos e, também, discussões filosóficas sobre a realidade. O intuito do presente artigo é elaborar uma abordagem didática para a apresentação do Teorema de Bell e suas implicações para o desenvolvimento da Teoria Quântica. Para isso, a proposta é apresentar o material de forma a facilitar seu uso em contexto pedagógico, apresentando inicialmente um exemplo mais concreto do que seria o Teorema de Bell, o experimento (sendo apenas uma analogia ao experimento de Bell) de Mermin. Na sequência, após o aluno ter uma noção concreta sobre o tema, serão apresentados os fundamentos matemáticos necessários para o entendimento do Teorema e, então, uma explicação do argumento de Bell. Ao ser explicado dessa forma, o Teorema de Bell pode assumir um caráter menos instrumentalista, evidenciando a controvérsia envolvida no seu desenvolvimento. Ao destacar de onde e porque determinados elementos são utilizados na derivação da desigualdade de Bell, por uma perspectiva que permite compreender a construção da teoria, buscamos aproximar o estudante dos conceitos apresentados e promover uma melhor compreensão da natureza da ciência no que diz respeito à Teoria Quântica.

Palavras-chave:
Teorema de Bell; Reconstrução Didática; Teoria Quântica


Bell’s inequality, proposed in the article “On the Einstein Podolsky Rosen Paradox”, was one of the discussions that most generated controversy around the foundations of Quantum Theory, as it involved physical-mathematical aspects and also philosophical discussions about reality. The purpose of this article is to elaborate a didactic approach for the presentation of Bell’s Theorem and its implications for the development of Quantum Theory. For this, the proposal is to present the material in order to facilitate its use in a pedagogical context, initially presenting a more concrete example of what would be Bell’s Theorem, Mermin’s approach, and then, after the student has a concrete notion about the theme, to present the necessary mathematical foundations for the understanding of the Theorem and, then, an explanation of Bell’s argument. When developed in this way, Bell’s Theorem can take on a less instrumentalist character, highlighting the controversy involved in its development. By highlighting where and why certain elements are used in the derivation of Bell’s inequality, from a perspective that allows understanding the construction of theory, we seek to bring the student closer to the concepts presented and promote a better understanding of the nature of science with regard to Theory Quantum.

Keywords:
Bell’s Theorem; Didactic Reconstruction; Quantum Theory


1. Introdução

Na área de Ensino de Física, muitos pesquisadores defendem a noção de que, para ensinar a Teoria Quântica, é necessário ensinar, ao menos um pouco, a história da Teoria Quântica [1[1] H. Kragh, Sci. Educ. 1, 349 (1992).]. Essa noção se alinha com uma perspectiva mais geral de que o ensino de Física e o ensino de Ciências se beneficiariam significativamente com a introdução de discussões históricas, pois isso permite que os alunos entendam melhor a construção das teorias e a natureza da ciência [2[2] M.R. Matthews, Sci. Educ. 1, 11 (1992)., 3[3] N.W. Lima, Rev. Bras. Ensino Ciências e Matemática 4, 1 (2021).]. Ademais, os estudiosos das teorias de ensino e aprendizagem defendem a importância de diversificar os materiais didáticos, complementando o uso do livro didático [4[4] M.A. Moreira, Indivisa, Bol. Estud. Invest. 6, 37 (2005).].

Nesse sentido, temos defendido o uso de elementos de artigos originais em sala de aula – fazendo-se uma reconstrução didática que os torne significativos no contexto pedagógico [5[5] R. Karam, Rev. Bras. Ensino Ciências e Matemática 4, 1067 (2021)., 6[6] R. Karam e N.W. Lima, em: Connecting Research in Physics Education with Teacher Education 3, editado por J. Guisasola e E. McLoughlin (The International Commission on Physics Education, Dublin, 2022).]. Sobre o uso de fontes primárias no ensino da Teoria Quântica, têm-se desenvolvido discussões sobre a dualidade onda-partícula [7[7] N. Lima, C. Cavalcanti, e F. Ostermann, Rev. Bras. Ensino Física 43, e20200270 (2021).], a proposta de Louis de Broglie [8[8] N.W. Lima, M.M. Nascimento, C. Cavalcanti e F. Ostermann, Rev. Bras. Ensino Fis. 42, p. e20190134 (2020).], uma comparação entre as ideias de Louis de Broglie e Erwin Schrödinger [9[9] N. Lima e R. Karam, Am. J. Phys. 89, 521 (2021).], as preocupações de Schrödinger com a natureza complexa de sua função de onda [10[10] R. Karam, Am. J. Phys. 88, 433 (2020).], a derivação do princípio da Incerteza [11[11] G.G. Rosa, N.W. Lima e J.C.H. Cavalcanti, Rev. Bras. Ensino Física 44, e20210298 (2022).], e a proposição do paradoxo EPR [12[12] R. Wagner, A.W. Rosa, N.W. Lima e M.M. Nascimento, Rev. Enseñanza la Física 33, 167 (2021).].

No presente artigo, pretendemos dar um passo adiante na proposta de trazer fontes primárias para o ensino da Teoria Quântica, apresentando uma reconstrução didática do teorema de Bell, o qual é apresentado em resposta ao paradoxo EPR. Deve-se lembrar que a publicação de Einstein, Podolsky e Rosen [13[13] A. Einstein, B. Podolsky e N. Rosen, Phys. Rev. 47, 777 (1935).], em 1935, fez uma dura crítica à Teoria Quântica (TQ), principalmente ao caráter não completo da função de onda, que já havia sido abordado anteriormente por Von Neumann [14[14] J. Von Neumann, Mathematical Foundations of Quantum Mechanics (Julius Springer, Berlin, 1932), 1 ed.]. Em uma tentativa de caracterizar a TQ como uma teoria causal, em 1952, David Bohm publica uma sequência de dois artigos, em que sugere uma interpretação da TQ em termos de variáveis ocultas [15[15] D. Bohm, Phys. Rev. 85, 66 (1952).]. John S. Bell, tendo lido as publicações de EPR e Bohm, influenciado pelos argumentos de Bohm sobre parâmetros ocultos, escreveu um artigo em que apresenta uma previsão teórica capaz de distinguir a possibilidade entre haver ou não variáveis ocultas locais [16[16] J.S. Bell, Phys. Phys. Fiz. 1, 195 (1964).], o que leva à conhecida desigualdade de Bell (ou Teorema de Bell).

Juntamente com a teoria das variáveis ocultas, outras intepretações da TQ começaram a se desenvolver [17[17] O. Freire Jr., The quantum dissidents: Rebuilding the foundations of quantum mechanics (1950–1990) (Springer, New York, 2015).], opondo-se à interpretação padrão (complementaridade), o que gerou uma grande controvérsia na comunidade de físicos, envolvendo os fundamentos da TQ. Muitas previsões teóricas da Mecânica Quântica foram corroboradas experimentalmente nos últimos 80 anos, mas as questões interpretativas (como as variáveis ocultas) ainda são fontes de controvérsia [18[18] B. Berche, C. Chatelain, C. Dufour, T. Gourieux, e D. Karevski, Condens. Matter Phys. 9, 319 (2006).]. Porém, muitos pesquisadores da época argumentavam que os temas envolvendo os fundamentos já haviam sido resolvidos pelos “pais fundadores” da TQ [17[17] O. Freire Jr., The quantum dissidents: Rebuilding the foundations of quantum mechanics (1950–1990) (Springer, New York, 2015)., 19[19] D. Kaiser, How the hippies saved physics: science, counterculture, and the quantum revival (W.W. Norton Company, New York, 2011).] e que qualquer discordância era meramente uma questão metafísica (sem consequências experimentais). Foi justamente com o artigo de Bell que foi possível mostrar que a discussão entre a teoria ser completa ou não poderia ter sim uma implicação experimental – trazendo o debate filosófico para dentro do laboratório [17[17] O. Freire Jr., The quantum dissidents: Rebuilding the foundations of quantum mechanics (1950–1990) (Springer, New York, 2015).].

O objetivo desse artigo é contribuir para o ensino da TQ, apresentando um tema que geralmente não é aprofundado em sala de aula (principalmente no que tange ao seu entendimento conceitual) e que tem implicações muito fortes para o desenvolvimento da TQ. Para isso, será feita uma reconstrução didática do artigo de John Stewart Bell, explicitando (i) os pressupostos da sua apresentação, (ii) os principais pontos conceituais para a compreensão do argumento de Bell e (iii) a derivação da conhecida desigualdade que carrega seu nome. Existem artigos que tentaram simplificar a ideia contida na desigualdade de Bell, dentre eles pode-se destacar os de d’Espagnat [20[20] B. D’Espagnat, Sci. Am. 241, 158 (1979)], Herbert [21[21] N. Herbert, Am. J. Phys. 43, 315 (1975).] e Mermin [22[22] N. D. Mermin, Phys. Today 38, 38 (1985).]. Em nossa abordagem buscamos manter uma linguagem semelhante à utilizada no artigo original [16[16] J.S. Bell, Phys. Phys. Fiz. 1, 195 (1964).] fazendo conexão com conceitos que os alunos usualmente aprendem nos cursos de Mecânica Quântica.

Apesar da grande controvérsia causada pelo artigo de John S. Bell, em 1964, quando Alain Aspect [23[23] A. Aspect, J. Dalibard e G. Roger, Phys. Rev. Lett. 49, 1804 (1982).] realizou o experimento favorável a interpretação usual da TQ (que previa violações da desigualdade de Bell e portanto contrária à Teoria das Variáveis Oculta Locais suposta por Einstein e outros físicos tradicionais), muitos físicos acabaram considerando a controvérsia em torno das variáveis ocultas como encerrado. A temática referente ao teorema de Bell está presente em várias publicações atuais na literatura, seja para discussões de aspectos conceituais do teorema [24[24] M.G. Alford, Am. J. Phys. 84, 448 (2016)., 25[25] L.E. Ballentine e J P. Jarrett, Am. J. Phys. 55, 696 (1987)., 26[26] M. Ferrero, T.W. Marshall e E. Santos, Am. J. Phys. 58, 683 (1990).], em forma de discussões experimentais [27[27] Y. Hasegawa, R. Loidl, G. Badurek, M. Baron, e H. Rauch, J. Opt. B Quantum semiclassical Opt. 6, 7 (2004)., 28[28] B.Q. Liu e B.S.J. Zou, J. Phys. A Math. Theor. 43, 245301 (2010)., 29[29] E.R. Loubenets e A. Y. Khrennikov, J. Phys. A Math. Theor. 52, 435304 (2019).], discussões referentes à matemática envolvida no teorema de Bell [30[30] K. Hess, H. De Raedt e K. Michielsen, Phys. Scr. T151, 014002 (2012)., 31[31] J. Foukzon, E.R. Men’kova e A.A. Potapov, J. Phys. Conf. Ser. 1391, 012073 (2019)., 32[32] L. Maccone, Am. J. Phys. 81, 854 (2013)., 33[33] J. Pinochet e D. Rojas-Líbano, Rev. Bras. Ensino Física 38, e3303 (2016).] ou em usos mais voltados para a área educacional e acadêmica [34[34] A. Broadbent, H.A. Carteret, A.A. Méthot e J. Walgate, New J. Phys. 8, 302 (2006)., 35[35] J.R.C. Piqueira, Rev. Bras. Ensino Física 33, 4303 (2011)., 36[36] L.E. Ballentine, Am. J. Phys. 55, 785 (1987).]. A área de estudos e as conclusões sobre as variáveis ocultas ainda permanecem em aberto, uma vez que o teorema não extingue a possibilidade de variáveis ocultas não-locais.

Buscando estabelecer uma estrutura didática capaz de contribuir para a compreensão do artigo proposto, as seções foram divididas para introduzir os conceitos fundamentais utilizados no artigo de Bell (texto em sua maior parte contido no material suplementar), a derivação da desigualdade de Bell e uma discussão sobre o argumento do autor. Para isso, a seção 2 2. A Analogia Experimental de Mermin (1985) à Desigualdade de Bell Em 1985, Nathaniel D. Mermin apresentou ao público geral uma analogia mais simples de como funcionava e qual era a questão envolvida na desigualdade formulada por Bell em 1964. O autor propõe um experimento mental fictício (Figura 1) para estabelecer uma analogia do que acontece com o experimento de Bell em sistemas quânticos e o relaciona com o problema das variáveis ocultas na Teoria Quântica. As próximas linhas serão destinadas a sintetizar essa formulação experimental apresentada por Mermin [22]. O aparato experimental metafórico de Mermin é composto por três peças A, B e C, nas quais A e B são detectores e C é uma fonte que emite “algo” (C sempre emite duas “partículas” ao mesmo tempo, uma em direção ao detector A e outra em direção ao B), como segue na representação abaixo. Figura 1 A imagem representa o aparato experimental metafórico sugerido por Mermin, no qual cada detector A e B contém 3 posições de chave escolhidas aleatoriamente e duas luzes, vermelha e verde, que piscam nas interações que ocorrem no experimento. Os detectores possuem três configurações de uma chave, com posição numerada até três, além de duas luzes (verde e vermelha) que piscam com as interações que ocorrem com o que é emitido por C. As chaves têm suas posições aleatoriamente escolhidas e os detectores não têm nenhum tipo de contato entre si e nem com a fonte emissora de “algo” (que posteriormente o autor chama de partícula, mas poderia levar qualquer outro nome). Os registros do experimento são feitos através da numeração referente a uma chave e uma letra que identifica a cor da luz que piscou (sendo G para verde (green) e R para vermelho (red)). A única ligação entre os aparelhos é a partícula (ou “algo”) emitida pela fonte. Anotando-se os resultados das medições (Figura 2), obtêm-se o seguinte conjunto de dados: Figura 2 Anotação de alguns resultados fictícios que poderiam ser obtidos após a realização das medições. A sequência de números representa a chave e a cor obtida em cada aparato, respectivamente para A e B. Por exemplo, 3R2G quer dizer que o resultado foi a seleção da chave 3 e luz vermelha para o detector A e chave 2 com a luz verde para o B. Baseado em Mermin [22]. A Figura 2, com um trecho dos possíveis dados do experimento, permite concluir duas considerações importantes sobre os dados. A primeira é que, em todos os casos em que os interruptores têm a mesma configuração, é possível observar que as luzes piscam sempre nas mesmas cores. A segunda é que, no caso de observarmos os dados no geral, sem considerar as configurações dos interruptores, observa-se que o padrão de cores é aleatório, piscando metade das vezes com cores idênticas, metade das vezes com cores distintas. O problema referente à desigualdade de Bell surge justamente pela observação de certas medidas da tabela acima. Observando-se o caso em que a mesma chave foi escolhida para ambos os detectores é possível ver que, em todos os casos, as mesmas cores de luz ascenderam. Esse resultado incomodou muitos Físicos da época, como poderia acontecer tamanha coincidência? Alguns Físicos mais desconfiados dos aspectos da TQ, como era o caso de Einstein, poderiam supor, seguindo a analogia de Mermin, que a explicação é fácil, já que os dois receptores recebem partículas vindas de uma mesma origem. Pode-se imaginar que a fonte C emite partículas que tem uma certa propriedade que é descrita por três variáveis 1,2,3. Cada variável pode assumir duas cores (verde ou vermelha). Assim, por exemplo, uma partícula pode ser associada ao conjunto de variáveis GGG, outra pode ser descrita por GGR, e assim por diante. Todas as combinações possíveis de variáveis para uma partícula somam 8 alternativas (representadas na Figura 3). Como a fonte C sempre emite duas partículas ao mesmo tempo, podemos imaginar que ela está sempre emitindo duas partículas com a mesma sequência de cores. Figura 3 Visão da parte interna dos aparatos A e B, com repartições que mostram as possibilidades de combinações referentes às cores que serão emitidas nas lâmpadas do experimento. Com isso, conseguimos explicar por que os detectores apresentam as mesmas cores quando a chave está no mesmo número: eles estão medindo a mesma variável em partículas idênticas. Essa é justamente a noção de uma variável oculta (que a Teoria Quântica não teria descrito até então, como propunha Einstein no paradoxo EPR). A explicação das variáveis ocultas, apesar de uma boa alternativa para a primeira característica de dados (detectores sempre assinalarem as mesmas cores quando a chave está na mesma posição), se torna insustentável para a segunda característica dos dados: a probabilidade de as cores piscarem iguais corresponde à metade das execuções do experimento. Considerando, por exemplo, um conjunto de instruções “R-R-G”, os detectores piscarão nas mesmas cores quando a configuração for: 1-1, 2-2, 3-3, 1-2 ou 2-1 e em cores diferentes em: 1-3, 3-1, 2-3 ou 3-2. A probabilidade de cada um desses 9 casos resultarem em cores iguais é de 5/9, sendo que essa mesma probabilidade vale para as “instruções” R-G-R, G-R-R, G-G-R, G-R-G e R-G-G, nas quais uma das cores se repete (permitindo que, nessa seleção de variáveis, as chaves selecionadas pisquem na mesma cor nas situações em que ela se repete). Só não sendo válidas para G-G-G e R-R-R, nas quais serão iguais em todas combinações. Então, se esse conjunto de “instruções” existir, em 5/9 de todas as execuções, os resultados serão iguais para as cores das luzes resultantes das possíveis medições. Porém, na demonstração real do experimento da desigualdade de Bell, as luzes piscam iguais somente na metade das vezes. Ou seja, existe um teste experimental que indica que não pode haver variáveis ocultas locais. Uma forma de realizar esse experimento, de acordo com a TQ, seria utilizando partículas correlacionadas, do estado singleto. Nesse caso teríamos dois aparatos Stern-Gerlach e um par de partículas, sendo que as partículas seriam lançadas em direções opostas, nas quais estariam os aparatos. As chaves seriam três possíveis direções para onde apontariam os polos de ímãs Stern-Gerlach (por exemplo, direções em x,y e z) e as luzes representariam os estados “spin up” e “spin down” (para verde e vermelho). O aparelho do outro lado seria configurado com as cores opostas. Dessa forma, quando os ímãs estiverem na mesma direção (chave 1, 2 ou 3), a mesma cor aparece, pois em um aparelho teríamos “spin up” e no outro “spin down”, que devido as configurações opostas, resultariam nas mesmas cores das lâmpadas. Portanto, nunca seria possível obtermos cores diferentes para uma mesma seleção de chaves. Sendo assim, independente da distância escolhida entre os aparelhos, os resultados sempre seriam opostos para uma mesma configuração de chave. Era isso que incomodava Einstein, pois ele achava que deveriam existir “instruções” prévias que permitissem prever com antecedência qual configuração pré-determinada o sistema tinha, o que não ocorre de fato. Com esse exemplo mental podemos entender exatamente o que está em jogo no Teorema de Bell. Na época, a discussão proposta por Einstein era se a Teoria Quântica estaria completa (e não existiriam variáveis ocultas) ou se estaria incompleta (e existiriam variáveis ocultas). Em princípio, essa parecia ser uma discussão filosófica – sem implicação empírica. Entretanto, com o experimento proposto, vemos que há uma diferença empírica entre uma partícula “carregar instruções” ou não. Os dados experimentais, como aponta Mermin, corroboram a ideia de que não há variáveis ocultas locais (instruções carregadas pela partícula). Na próxima seção, discutimos os fundamentos matemáticos necessários para derivar o teorema de Bell formalmente. apresenta uma reconstrução de uma discussão simplificada do problema envolvido no artigo de Bell, exposta por Mermin [22[22] N. D. Mermin, Phys. Today 38, 38 (1985).]. Essa explicação permite que o aluno entenda, primeiramente, o que está por trás do formalismo matemático que será utilizado. A ideia de explicitar essa discussão antes da derivação formal segue a sugestão de que a representação matemática, em uma aula, deve vir na sequência de uma discussão conceitual [37[37] J. Piaget, Para Onde Vai a Educação (Livraria José Olympio Editora, Rio de Janeiro, 1976).]. Na seção 3 3. Fundamentos da Teoria Quântica Nessa seção, apresentamos alguns elementos fundamentais para compreensão da discussão em torno do artigo de John Bell, que ficou conhecido pela famosa desigualdade que leva o nome do autor. Para esse fim, no Material Suplementar, ao fim deste artigo, também é disponibilizado uma explicação dos principais elementos matemáticos necessários para a compreensão da derivação do Teorema de Bell e da notação utilizada. O material também contém a exposição de relações que permitem realizar cálculo do valor esperado para o estado singleto, que será abordado a seguir, de acordo com a Teoria Quântica usual. Assim, em um curso introdutório de Mecânica Quântica, sugerimos que o estudante se familiarize com o material suplementar antes de avançar nas próximas seções. 3.1. O valor esperado do Spin para o estado singleto na Teoria Quântica usual Nesta seção, demonstramos o valor esperado do Spin para o estado singleto segundo a Teoria Quântica ortodoxa, relacionando-o com as passagens as quais Bell se refere em seu artigo de 1964. O artigo inicia a formulação da situação explicando que no artigo EPR a situação descrita é um singleto, como segue Considere um par de partículas de spin meio formadas de alguma forma no estado de spin singleto e movendo-se livremente em direções opostas. As medições podem ser feitas, digamos por ímãs de Stern-Gerlach, em componentes selecionados de spins σ→1 e σ→2. Se a medição do componente σ→1⋅a→, onde a→ é algum vetor unitário, produz o valor +1, então, de acordo com a mecânica quântica, a medição de σ→2⋅a→ deve produzir o valor -1 e vice-versa [16, p. 1]. Nesse trecho Bell se refere aos estados correlacionados do estado singleto, no qual, por consequência, obtêm-se medidas de valores contrários de spin ao utilizar o experimento de Stern-Gerlach. Porém, na continuação do artigo, Bell propõe uma segunda hipótese, na qual Se duas medições são feitas em locais distantes um do outro, a orientação de um ímã não influencia o resultado obtido com o outro. Uma vez que podemos prever com antecedência o resultado da medição de qualquer componente escolhido de σ→2, medindo previamente o mesmo componente de σ→1, segue-se que o resultado de qualquer medição deve realmente ser premeditado [16, p. 1]. Além disso, pela TQ usual, um resultado de medição realizado em um aparelho distante do outro não poderia afetá-lo, ou seja, o resultado B para a partícula 2 não tem dependência do ajuste realizado na medição A da direção a→ do ímã correspondente à partícula 1, e vice-versa. Então, o valor esperado do produto de dois componentes σ→1⋅a→ e σ→2⋅b→ , para o singleto, deve ser “-a→⋅b→”, como será demonstrado na sequência. Seguindo a relação de “bra” e “ket” (equações S.44 e S.45 do material suplementar) para o estado singleto e substituindo o vetor genérico “v→” (equação S.43) pelos utilizados por Bell, “a→” e “b→”, utilizando “a” como o arco que representa a inclinação do vetor “a→” com a origem e “b” o ângulo formado pelo vetor “b→”, podemos reescrever a matriz para esses vetores como (1) σ → 1 ⋅ a → = ( cos ⁡ ( a ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) - cos ⁡ ( a ) ) 1 (2) σ → 2 ⋅ b → = ( cos ⁡ ( b ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) - cos ⁡ ( b ) ) 2 Onde os sobescritos relacionam os vetores à respectiva partícula representada pelo estado singleto. Sabendo que Bell se refere ao valor esperado do produto de σ→1⋅a→⁢σ→2⋅b→ para o estado singleto, podemos escrevê-lo como ⟨0|σ→1⋅a→⁢σ→2⋅b→|0⟩. Temos então que σ → 1 ⋅ a → ⁢ σ → 2 ⋅ b → ⁢ | 0 ⟩ = { ( cos ⁡ ( a ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) - cos ⁡ ( a ) ) 1 ⁢ ( cos ⁡ ( b ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) - cos ⁡ ( b ) ) 2 } [ 1 2 ⁢ ( 1 0 ) 1 ⁢ ( 0 1 ) 2 - 1 2 ⁢ ( 0 1 ) 1 ⁢ ( 1 0 ) 2 ] Sendo que as matrizes de sobescrito 1 só atuam em matrizes de sobescrito 1 e o mesmo valendo para o índice 2, tem-se que σ → 1 ⋅ a → ⁢ σ → 2 ⋅ b → ⁢ | 0 ⟩ = 1 2 ⁢ [ ( cos ⁡ ( a ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) - cos ⁡ ( a ) ) 1 ⁢ ( 1 0 ) 1 ] [ ( cos ⁡ ( b ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) - cos ⁡ ( b ) ) 2 ⁢ ( 0 1 ) 2 ] - 1 2 ⁢ [ ( cos ⁡ ( a ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) - cos ⁡ ( a ) ) 1 ⁢ ( 0 1 ) 1 ] [ ( cos ⁡ ( b ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) - cos ⁡ ( b ) ) 2 ⁢ ( 1 0 ) 2 ] σ → 1 ⋅ a → ⁢ σ → 2 ⋅ b → ⁢ | 0 ⟩ = 1 2 ⁢ ( cos ⁡ ( a ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) ) 1 ⁢ ( s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) - cos ⁡ ( b ) ) 2 - 1 2 ⁢ ( s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) - cos ⁡ ( a ) ) 1 ⁢ ( cos ⁡ ( b ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) ) 2 Por último, a multiplicação de ⟨0|, obtendo ⟨ 0 | σ → 1 ⋅ a → ⁢ σ → 2 ⋅ b → | 0 ⟩ = 1 2 [ 1 2 ( 1 0 ) 1 ( 0 1 ) 2 - 1 2 ( 0 1 ) 1 ( 1 0 ) 2 ] ( cos ⁡ ( a ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) ) 1 ⁢ ( s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) - cos ⁡ ( b ) ) 2 - 1 2 [ 1 2 ( 1 0 ) 1 ( 0 1 ) 2 - 1 2 ( 0 1 ) 1 ( 1 0 ) 2 ] ( s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) - cos ⁡ ( a ) ) 1 ⁢ ( cos ⁡ ( b ) s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) ) 2 ⟨ 0 | σ → 1 ⋅ a → ⁢ σ → 2 ⋅ b → | 0 ⟩ = 1 2 ⁢ [ 1 2 ⁢ cos ⁡ ( a ) ⁢ ( - cos ⁡ ( b ) ) - 1 2 ⁢ s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) ⁢ s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) ] - 1 2 ⁢ [ 1 2 ⁢ s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) ⁢ s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) - 1 2 ⁢ ( - cos ⁡ ( a ) ) ⁢ cos ⁡ ( b ) ] ⟨ 0 | σ → 1 ⋅ a → ⁢ σ → 2 ⋅ b → | 0 ⟩ = - 1 2 ⁢ cos ⁡ ( a ) ⁢ cos ⁡ ( b ) - 1 2 ⁢ s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) ⁢ s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) - 1 2 ⁢ s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) ⁢ s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) - 1 2 ⁢ cos ⁡ ( a ) ⁢ cos ⁡ ( b ) ⟨ 0 | σ → 1 ⋅ a → ⁢ σ → 2 ⋅ b → | 0 ⟩ = - cos ⁡ ( a ) ⁢ cos ⁡ ( b ) - s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( a ) ⁢ s ⁢ e ⁢ n ⁢ ( b ) Utilizando propriedades trigonométricas, lembrando que “-cos⁡(a)⁢cos⁡(b)-s⁢e⁢n⁢(a)⁢s⁢e⁢n⁢(b)” é uma forma alternativa de “-cos⁡(a-b)”, chegamos em (3) ⟨ 0 | σ → 1 ⋅ a → ⁢ σ → 2 ⋅ b → | 0 ⟩ = - cos ⁡ ( a - b ) Ou ainda, pela propriedade de multiplicação de vetores, (4) ⟨ 0 | σ → 1 ⋅ a → ⁢ σ → 2 ⋅ b → | 0 ⟩ = - a → ⋅ b → Obtendo então a resposta que, de acordo com a TQ usual, seria o valor esperado para o singleto. Esse valor esperado aparece posteriormente na forma de P⁢(a→,b→) pela notação de densidade de probabilidade de Bell. 3.2. O paradoxo de Einstein, Podolsky e Rosen Antes de prosseguir com o desenvolvimento da desigualdade e dos argumentos de Bell, é interessante retomarmos o que deu início a essa discussão. Em 1935, Einstein, Podolsky e Rosen [13] publicaram um artigo que fazia críticas em relação a completude da Teoria Quântica. A relação de existência de uma correspondência entre elementos de teoria e da realidade era considerada pelos autores uma característica de completude de uma teoria física. Dessa forma, um critério de realidade de uma quantidade física é justamente a possibilidade de podermos realizar previsões sobre o sistema sem perturbá-lo. A Teoria Quântica usual assume que uma função de onda Ψ forneceria a descrição completa para um sistema, porém, essa função de onda é expressa em termos de uma sobreposição de autoestados de um operador, que representa a grandeza física observada. Sendo assim, não podemos definir simultaneamente os valores dos autoestados das grandezas que não comutam. Então se escolhermos medir posição e momento, ao medirmos um, não será possível definir simultaneamente o valor do outro, de forma que uma das grandezas acaba não tendo realidade física. Isso gerou duas conclusões: “(1) a descrição da mecânica quântica da realidade dada pela função de onda não é completa ou (2) quando os operadores correspondentes a duas grandezas físicas não comutam as duas grandezas não podem ter realidade simultânea” [13, p. 778]. Por consequência, teríamos duas1 opções: a mecânica quântica é completa e a posição e momento não são reais ao mesmo tempo ou a teoria quântica é incompleta e posição e momento são reais. Einstein, Podolsky e Rosen partem então do pressuposto de que a função de onda nos dá todas as informações sobre o sistema, propondo então, um experimento mental, que acaba revelando um novo fenômeno de estudo na Teoria Quântica, o emaranhamento. O experimento consiste em duas partículas livres com momentos opostos, em um sistema isolado, que interagiram durante um intervalo breve de tempo. O fato de terem momentos de igual valor, mas em sentidos opostos, permite que, ao medirmos o valor do momento no sistema I, saibamos por consequência, o momento no sistema II. Ao final do argumento, os autores mostram que as descrições realizadas nas medidas dos dois sistemas são consistentes com a mesma realidade. Esse fator torna a conclusão (1) falsa, destacando então que a função de onda não descreve a realidade dada. Mais detalhes sobre o argumento EPR podem ser encontrados em Wagner et al. [12]. Shimony e Clauser [39], em seu artigo sobre o Teorema de Bell, destacaram que EPR tiveram uma terceira condição colocada como verdadeira, que foi o pressuposto de que não há ação a distância na natureza. Assim, o desenvolvimento do artigo EPR foi baseado em realismo e localidade, estando o último evidenciado na observação de que um sistema não poderia afetar instantaneamente o outro em locais espacialmente separados. , será apresentado o valor esperado para o estado singleto de acordo com a Teoria Quântica usual, sem as variáveis ocultas. Na seção 4 4. Discussão Sobre o Argumento de J. S. Bell A introdução do artigo escrito por Bell permite identificarmos quais as noções iniciais do autor, quanto ao contexto da Teoria Quântica na época, sendo que nessa breve introdução consta que O paradoxo de Einstein, Podolsky e Rosen foi apresentado como um argumento de que a mecânica quântica não poderia ser uma teoria completa, mas deveria ser complementada por variáveis adicionais. Essas variáveis adicionais deveriam restaurar a teoria de causalidade e localidade. Nesta nota essa ideia será formulada matematicamente e se mostrará incompatível com as previsões estatísticas da mecânica quântica. É a exigência de localidade, ou mais precisamente que o resultado de uma medição em um sistema não seja afetado por operações em um sistema distante com o qual interagiu no passado, que cria a dificuldade essencial. Houve tentativas de mostrar que, mesmo sem tal exigência de separabilidade ou localidade, nenhuma interpretação de “variável oculta” da mecânica quântica é possível. Essas tentativas foram examinadas em outro lugar e consideradas insuficientes. Além disso, uma interpretação de variável oculta da teoria quântica elementar foi explicitamente construída. Essa interpretação particular tem, de fato, uma estrutura grosseiramente não-local. Isso é característico, de acordo com o resultado a ser provado aqui, de qualquer teoria que reproduza exatamente as previsões da mecânica quântica [16, p. 195]. Tendo isto, é possível analisarmos a grande influência de Von Neumann [14] na Teoria Quântica, pois seu argumento no livro “Mathematishe Grundlagen der Quanten-mechanik”, até então, era considerado como uma prova de impossibilidade de que novas variáveis fossem adicionadas a TQ. Sendo que a falha no argumento de Von Neumann já havia sido percebida anteriormente a Bell, por Grete Hermann, na década de 1930 [17], porém não recebeu a devida atenção dos Físicos. Além disso, Bell afirma ter percebido uma estrutura “grosseiramente” não-local já na Teoria de Variáveis Ocultas de David Bohm [15, 40]. Foi justamente a existência de uma interpretação em termos de variáveis ocultas, que por consequência desafiava a autoridade da prova de impossibilidade de Von Neumann, que motivou Bell a escrever seu artigo. O elemento de não-localidade era o que caracterizava qualquer teoria que reproduzisse as previsões da Mecânica Quântica. Bell ainda destaca que o grande problema de toda essa situação é o fato de que um sistema não possa interferir no outro, o que é descrito como “localidade”. Toda essa questão envolvendo os fundamentos, apesar de muita importância para as discussões posteriores, acabou não tendo uma devida atenção na época de sua elaboração. Essa retomada de discussões sobre algo já “concluído” não era visto como um trabalho que envolvesse realmente uma questão física, chegando a ser considerado “metafísica” [17], o que inclusive fez com que muitos físicos envolvidos nesse debate tivessem dificuldade em suas vidas profissionais. Por isso o destaque à discussão que Bell iniciou com a demonstração de sua desigualdade, o que mostrou que não somente a interpretação, mas a forma como entendemos e estudamos a Teoria Quântica poderia ser reconsiderada. O experimento que John S. Bell descreve em seu artigo é feito com a suposição de uma medição realizada por aparatos Stern-Gerlach, no qual o estado utilizado é o singleto. Retomando o estado singleto, mais especificamente a equação que o define, ao medirmos o spin de uma das partículas correlacionadas, por consequência, saberemos o resultado da outra. O estado sendo dado por (5) | 0 ⟩ = 1 2 ⁢ ( 1 0 ) 1 ⁢ ( 0 1 ) 2 - 1 2 ⁢ ( 0 1 ) 1 ⁢ ( 1 0 ) 2 se uma medição nos revela “spin up” para a partícula 1 (ou valor +1 no artigo de Bell), o estado acima se reduz para 12⁢(10)1⁢(01)2, que por consequência fornece o resultado de “spin down” para a partícula 2 (ou, valor -1) e vice-versa. Para mostrar que o resultado obtido utilizando “variáveis ocultas” se difere do resultado esperado de acordo com a Teoria Quântica usual, Bell adiciona ao experimento as variáveis ocultas representadas por “λ” (lambda). De forma que as medições A e B dependam somente das direções a→ e b→, respectivamente, e da suposta variável oculta λ. E é justamente esse fato que representava a característica do realismo que foi adicionada ao argumento da desigualdade de Bell, pois A⁢(a→,λ) e B⁢(b→,λ) deveriam ter valores pré-definidos, independentemente da realização da medida ser feita ou não. Uma representação do esquema imaginado por Bell é dado na Figura 4. Figura 4 Experimento sugerido por Bell, no qual os aparatos Stern-Gerlach estão distantes um do outro a ponto de que a direção do campo magnético de um não interfira no outro. Um aparelho está apontando para uma direção a→ e o outro para uma direção b→. Adaptado de Pessoa Jr [41]. As medições realizadas em direções arbitrárias a→ e b→ são denotadas então pelos valores correspondentes a spin up e spin down, ou +1 e -1 respectivamente. A média dos produtos das medições nas duas direções é representada por P⁢(a→,b→). Os aparelhos, em uma posição alinhada, vão sempre apresentar resultados opostos, que é a anticorrelação perfeita do estado singleto. Adicionando a suposta variável oculta ou conjunto de variáveis representadas por λ, descreve-se os resultados das duas medidas como A⁢(a,λ) e B⁢(b,λ). A crítica realizada no paradoxo EPR era em relação ao caráter não-realista da teoria TQ. O argumento que os autores do EPR utilizaram é o de que esse valor (medida de A e B) é desconhecido por que faltaria um complemento das informações necessárias da medição com a variável oculta λ, de caráter local, que restauraria a causalidade da teoria quântica. Algo que incomodava muitos físicos, como Einstein por exemplo, era a concepção probabilística do mundo quântico e a perspectiva de que as informações sobre um determinado aspecto da TQ só pudessem ser dadas no momento da medição [22]. , demonstraremos a derivação da desigualdade de Bell, relacionando com argumentos do próprio artigo e relacionando o significado físico de tal desenvolvimento. A seção 5 5. Derivação da Desigualdade de Bell Ao final, no artigo do paradoxo EPR, fica em aberto a possibilidade de existir uma descrição completa da realidade física fornecida Mecânica Quântica. Em teoria, essa especificação ou descrição mais completa da Mecânica Quântica seria dada por possíveis variáveis ocultas λ. Sendo que λ pode representar uma única variável, um conjunto de variáveis ou, até mesmo, um conjunto de funções (essa variável pode ser discreta ou contínua), o que é indiferente para a representação que seguirá. Apesar de Bell escolher considerá-la um único parâmetro contínuo. Dessa forma, ρ⁢(λ) representa a distribuição de probabilidade, ou seja, os possíveis valores de λ e suas probabilidades de ocorrência. Temos, da seção 4, que mostra o experimento imaginado por Bell, que o resultado obtido pela medida a partir de um observável A da medição σ→1⋅a→ é determinada por a→ e λ, assim como para B a medição de σ→1⋅b→ é determinada por b→ e λ. Sendo λ a representação das variáveis ocultas, não previstas na Teoria Quântica. De forma que: (6) A ⁢ ( a → , λ ) = ± 1 (7) B ⁢ ( b → , λ ) = ± 1 O resultado de B não depende de a→ e nem A depende de b→. Se ρ⁢(λ) é a distribuição de probabilidade de (λ), então o valor esperado do produto de dois componentes é: (8) P ⁢ ( a → , b → ) = ∫ d λ ⁢ ρ ⁢ ( λ ) ⁢ A ⁢ ( a → , λ ) ⁢ B ⁢ ( b → , λ ) Sendo ρ⁢(λ) a distribuição de probabilidade normalizada, tem-se (9) ∫ d λ ⁢ ρ ⁢ ( λ ) = 1 E, devido as relações (6) e (7), a equação (8) não pode admitir valores menores que -1, sendo possível obter esse valor quando a→=b→. Se (10) A ⁢ ( a → , λ ) = - B ⁢ ( a → , λ ) e B ⁢ ( b → , λ ) = - A ⁢ ( b → , λ ) Então, fazendo essa substituição em (8), tem-se que (11) P ⁢ ( a → , b → ) = ∫ d λ ⁢ ρ ⁢ ( λ ) ⁢ A ⁢ ( a → , λ ) ⁢ [ - A ⁢ ( b → , λ ) ] P ⁢ ( a → , b → ) = - ∫ d λ ⁢ ρ ⁢ ( λ ) ⁢ A ⁢ ( a → , λ ) ⁢ A ⁢ ( b → , λ ) Incluindo agora um vetor unitário c→, representando a medida em uma outra direção arbitrária, com o mesmo procedimento usado para obter (11), tem-se P ⁢ ( a → , b → ) - P ⁢ ( a → , c → ) = - ∫ d λ ⁢ ρ ⁢ ( λ ) ⁢ A ⁢ ( a → , λ ) ⁢ A ⁢ ( b → , λ ) - ( - ∫ d λ ⁢ ρ ⁢ ( λ ) ⁢ A ⁢ ( a → , λ ) ⁢ A ⁢ ( c → , λ ) ) P ( a → , b → ) - P ( a → , c → ) = - ∫ d λ ρ ( λ ) [ A ( a → , λ ) A ( b → , λ ) - A ( a → , λ ) A ( c → , λ ) ] Considerando que [A⁢(b→,λ)]2=1, podemos fazer a seguinte inserção: P ( a → , b → ) - P ( a → , c → ) = - ∫ d λ ρ ( λ ) [ A ( a → , λ ) A ( b → , λ ) - A ( a → , λ ) ( 1 ) A ( c → , λ ) ] P ( a → , b → ) - P ( a → , c → ) = - ∫ d λ ρ ( λ ) [ A ( a → , λ ) A ( b → , λ ) - A ( a → , λ ) A ( b → , λ ) A ( b → , λ ) A ( c → , λ ) ] Colocando A⁢(a→,λ)⁢A⁢(b→,λ) em evidência, obtêm-se: P ⁢ ( a → , b → ) - P ⁢ ( a → , c → ) = - ∫ d λ ⁢ ρ ⁢ ( λ ) ⁢ [ 1 - A ⁢ ( b → , λ ) ⁢ A ⁢ ( c → , λ ) ] ⁢ A ⁢ ( a → , λ ) ⁢ A ⁢ ( b → , λ ) De acordo com as relações (6) e (7) a multiplicação do termo A⁢(a→,λ)⁢A⁢(b→,λ) só pode assumir valores -1 e +1, de forma que seus produtos tenham como resultado, ao estarem alinhados, -1 (para os vetores apontando em um mesmo sentido, já que são spins contrários) e +1 (para sentidos opostos) de forma que o módulo do produto dos dois seja |A⁢(a→,λ)⁢A⁢(b→,λ)|=1. Além disso, a distribuição de probabilidade da função de λ não pode assumir valores negativos, de forma que ρ⁢(λ)≥0 e como o produto A⁢(b→,λ)⁢A⁢(c→,λ) é ±1, então o termo entre colchetes será 0 ou 2, para os valores extremos que podem ser atingidos. Sendo assim o termo fica [1-A⁢(b→,λ)⁢A⁢(c→,λ)]≥0. Da mesma maneira, se tomássemos módulo dos dois lados |P⁢(a→,b→)-P⁢(a→,c→)|=|∫dλ⁢ρ⁢(λ)⁢[1-A⁢(b→,λ)⁢A⁢(c→,λ)]|, teríamos que “o valor absoluto de uma integração inteira deve ser menor ou igual ao valor integrado do valor absoluto do integrando” [42, p. 12]. De forma que, com as características que acabaram de ser descritas, podemos propor que a igualdade seja representada pela seguinte desigualdade: | P ⁢ ( a → , b → ) - P ⁢ ( a → , c → ) | ≤ ∫ d λ ⁢ ρ ⁢ ( λ ) ⁢ [ 1 - A ⁢ ( b → , λ ) ⁢ A ⁢ ( c → , λ ) ] Sendo que -∫dλ⁢ρ⁢(λ)⁢A⁢(b→,λ)⁢A⁢(c→,λ) é a probabilidade P⁢(b→,c→), temos então (12) | P ⁢ ( a → , b → ) - P ⁢ ( a → , c → ) | ≤ 1 + P ⁢ ( b → , c → ) A expressão (8) é a famosa desigualdade de Bell, na mesma forma a qual foi apresentada em seu artigo de 1964. As densidades de probabilidade P⁢(a→,b→), P⁢(a→,c→) e P⁢(b→,c→) decorrem da relação desenvolvida em (4) e a→, b→ e c→ são vetores unitários que apontam nas direções em que os aparatos Stern-Gerlach podem ser configurados. Dessa forma, P⁢(a→,b→) representa a média do produto das medições para os componentes de spin realizadas nas direções a→ e b→, assim como P⁢(a→,c→) e P⁢(b→,c→) representam a média do produto das medições nas direções a→ e b→ e nas direções b→ e c→, respectivamente. Dada essa desigualdade, é simples mostrar que a previsão da Teoria Quântica é incompatível [43], basta imaginarmos que os três vetores estejam em um mesmo plano e que c→ faça um ângulo de 45∘ com a→ e b→, tendo assim P ⁢ ( a → , b → ) = 0 , P ⁢ ( a → , c → ) = P ⁢ ( b → , c → ) = - 0,707 de forma que a desigualdade assuma os valores | - 0,707 | ≤ 1 + ( - 0,707 ) 0,707 ≤ 0,294 o que claramente viola a desigualdade de Bell. , então, apresenta uma discussão do argumento de Bell quanto à não-localidade (para compreender mais tipos de não-localidade e seus aspectos ver Berkovitz [38[38] J. Berkovitz, Stud. Hist. Philos. Mod. Phys. 29, 183 (1998).]) e as variáveis ocultas. Na seção 6 6. Considerações Finais A Teoria Quântica é, geralmente, uma disciplina que desperta nos alunos a sensação de dificuldade, o que se deve a abstração necessária para a compreensão de alguns dos seus conceitos. Muitas vezes isso ocorre pela desvinculação de uma determinada teoria/conceito do seu contexto de origem, sendo estabelecida somente uma perspectiva instrumentalista dos conteúdos e conceitos compreendidos nas disciplinas que abordam a Física Moderna e Teoria Quântica, deixando de lado vários elementos que foram destacados pelo autor em detrimento da compreensão de como realizar os cálculos que o envolvem [8, 44]. A dificuldade ocasionada pelo desligamento do formalismo com as teorias filosóficas e acontecimentos históricos pode fazer com que o aluno aprenda a utilizar determinado conceito mesmo sem saber seu real significado. Uma das formas de contemplar esse desenvolvimento permeando as áreas destacadas anteriormente é a utilização dos trabalhos originais dos autores, as fontes primárias [5, 9]. O estudo dos elementos matemáticos fundamentais para a compreensão do desenvolvimento do argumento de Bell na derivação da desigualdade juntamente do contexto histórico da época e das implicações filosóficas envolvidas, podem proporcionar um certo “aprofundamento” nos conceitos e modelos de interpretação da TQ [45]. Uma certa “base” para iniciar as temáticas envolvidas na Teoria Quântica pode iniciar no Ensino Médio [46], pois a explicação prévia de alguns conceitos sobre o tema pode facilitar a abstração em uma futura abordagem. Para isso, seria indicada a avaliação de como a estruturação dos livros didáticos são feitas e como apresentam o material sobre a Teoria Quântica, atentando aos elementos originais que aparecem na obra [47]. As possibilidades da abordagem do Teorema de Bell vão além da matemática envolvida no desenvolvimento e cálculos sobre a Teoria Quântica, o teorema traz para primeiro plano todo o aspecto filosófico envolvido e as interferências históricas ocorridas em seu contexto. A grande importância da abordagem do artigo original de Bell é, além da importância da desigualdade para a TQ e o desenrolar de aspecto filosófico, que ele foi escrito em um momento de ápice de uma das controvérsias mais importantes da Teoria Quântica [48], que era justamente a discussão sobre os fundamentos da TQ e o realismo local. A desigualdade se mostra interessante justamente por evidenciar a relação fundamental entre Teoria Quântica, matemática e filosofia, na medida em que esses aspectos são incorporados no desenvolvimento do Teorema de Bell. O artigo no qual Bell desenvolve a desigualdade [16], que posteriormente leva seu nome, é de extrema importância para a história, pois é um momento no qual os fundamentos da Teoria Quântica são retomados, principalmente a questão da localidade. Bell consegue, partindo dos pressupostos de localidade e realismo, desenvolver uma desigualdade envolvendo variáveis ocultas que, após algumas etapas matemáticas, é violada pela Teoria Quântica. Esse trabalho permitiu que fossem desenvolvidas novas relações da desigualdade (por exemplo, a desigualdade de Clauser, Horne, Shimony e Holt), as quais permitiram que o Teorema de Bell adentrasse nos laboratórios de Física, mostrando que a interação entre duas partículas correlacionadas, separadas espacialmente, ocorria instantaneamente, revelando então o caráter não-local da teoria. Havendo então a possibilidade de existirem variáveis ocultas não-locais, algo não imaginado até o momento. Considerando toda essa importância da fonte primária, o artigo de J. Bell, o presente trabalho buscou apresentar todos os elementos que seriam necessários para desenvolver o raciocínio matemático e filosófico envolvido na derivação do Teorema de Bell. Isso permite a simplificação na compreensão de todos os elementos envolvidos em seu desenvolvimento, pois agrupa em uma seção todos conhecimentos físico-matemáticos necessários. Junto a isso, pode-se acrescentar a explicação detalhada dos argumentos utilizados por Bell no desenvolvimento de sua teoria. Sendo assim, esperamos ter aproximado o artigo de Bell de uma formulação que permita sua entrada em contexto pedagógico, proporcionando aos alunos uma explicação mais didática do original. , por fim, fazemos nossas considerações finais apresentando algumas sugestões para o uso da discussão nos cursos de TQ da graduação.

Assim, ressaltamos que a contribuição do presente artigo é de natureza didática: a estrutura com que o tema é apresentado está ancorado em resultados de pesquisas na área de ensino, o que aumenta a potencialidade da abordagem no sentido de contribuir para um entendimento significativo dos estudantes. A novidade do artigo está, nesse sentido, em partir de um exemplo concreto (o experimento de Mermin para construir uma analogia ao experimento de Bell) e avançar em direção à discussão mais abstrata proposta por Bell.

2. A Analogia Experimental de Mermin (1985) à Desigualdade de Bell

Em 1985, Nathaniel D. Mermin apresentou ao público geral uma analogia mais simples de como funcionava e qual era a questão envolvida na desigualdade formulada por Bell em 1964. O autor propõe um experimento mental fictício (Figura 1) para estabelecer uma analogia do que acontece com o experimento de Bell em sistemas quânticos e o relaciona com o problema das variáveis ocultas na Teoria Quântica. As próximas linhas serão destinadas a sintetizar essa formulação experimental apresentada por Mermin [22[22] N. D. Mermin, Phys. Today 38, 38 (1985).]. O aparato experimental metafórico de Mermin é composto por três peças A, B e C, nas quais A e B são detectores e C é uma fonte que emite “algo” (C sempre emite duas “partículas” ao mesmo tempo, uma em direção ao detector A e outra em direção ao B), como segue na representação abaixo.

Figura 1
A imagem representa o aparato experimental metafórico sugerido por Mermin, no qual cada detector A e B contém 3 posições de chave escolhidas aleatoriamente e duas luzes, vermelha e verde, que piscam nas interações que ocorrem no experimento.

Os detectores possuem três configurações de uma chave, com posição numerada até três, além de duas luzes (verde e vermelha) que piscam com as interações que ocorrem com o que é emitido por C. As chaves têm suas posições aleatoriamente escolhidas e os detectores não têm nenhum tipo de contato entre si e nem com a fonte emissora de “algo” (que posteriormente o autor chama de partícula, mas poderia levar qualquer outro nome). Os registros do experimento são feitos através da numeração referente a uma chave e uma letra que identifica a cor da luz que piscou (sendo G para verde (green) e R para vermelho (red)). A única ligação entre os aparelhos é a partícula (ou “algo”) emitida pela fonte. Anotando-se os resultados das medições (Figura 2), obtêm-se o seguinte conjunto de dados:

Figura 2
Anotação de alguns resultados fictícios que poderiam ser obtidos após a realização das medições. A sequência de números representa a chave e a cor obtida em cada aparato, respectivamente para A e B. Por exemplo, 3R2G quer dizer que o resultado foi a seleção da chave 3 e luz vermelha para o detector A e chave 2 com a luz verde para o B. Baseado em Mermin [22[22] N. D. Mermin, Phys. Today 38, 38 (1985).].

A Figura 2, com um trecho dos possíveis dados do experimento, permite concluir duas considerações importantes sobre os dados. A primeira é que, em todos os casos em que os interruptores têm a mesma configuração, é possível observar que as luzes piscam sempre nas mesmas cores. A segunda é que, no caso de observarmos os dados no geral, sem considerar as configurações dos interruptores, observa-se que o padrão de cores é aleatório, piscando metade das vezes com cores idênticas, metade das vezes com cores distintas.

O problema referente à desigualdade de Bell surge justamente pela observação de certas medidas da tabela acima. Observando-se o caso em que a mesma chave foi escolhida para ambos os detectores é possível ver que, em todos os casos, as mesmas cores de luz ascenderam. Esse resultado incomodou muitos Físicos da época, como poderia acontecer tamanha coincidência? Alguns Físicos mais desconfiados dos aspectos da TQ, como era o caso de Einstein, poderiam supor, seguindo a analogia de Mermin, que a explicação é fácil, já que os dois receptores recebem partículas vindas de uma mesma origem. Pode-se imaginar que a fonte C emite partículas que tem uma certa propriedade que é descrita por três variáveis 1,2,3. Cada variável pode assumir duas cores (verde ou vermelha). Assim, por exemplo, uma partícula pode ser associada ao conjunto de variáveis GGG, outra pode ser descrita por GGR, e assim por diante. Todas as combinações possíveis de variáveis para uma partícula somam 8 alternativas (representadas na Figura 3). Como a fonte C sempre emite duas partículas ao mesmo tempo, podemos imaginar que ela está sempre emitindo duas partículas com a mesma sequência de cores.

Figura 3
Visão da parte interna dos aparatos A e B, com repartições que mostram as possibilidades de combinações referentes às cores que serão emitidas nas lâmpadas do experimento.

Com isso, conseguimos explicar por que os detectores apresentam as mesmas cores quando a chave está no mesmo número: eles estão medindo a mesma variável em partículas idênticas. Essa é justamente a noção de uma variável oculta (que a Teoria Quântica não teria descrito até então, como propunha Einstein no paradoxo EPR).

A explicação das variáveis ocultas, apesar de uma boa alternativa para a primeira característica de dados (detectores sempre assinalarem as mesmas cores quando a chave está na mesma posição), se torna insustentável para a segunda característica dos dados: a probabilidade de as cores piscarem iguais corresponde à metade das execuções do experimento. Considerando, por exemplo, um conjunto de instruções “R-R-G”, os detectores piscarão nas mesmas cores quando a configuração for: 1-1, 2-2, 3-3, 1-2 ou 2-1 e em cores diferentes em: 1-3, 3-1, 2-3 ou 3-2. A probabilidade de cada um desses 9 casos resultarem em cores iguais é de 5/9, sendo que essa mesma probabilidade vale para as “instruções” R-G-R, G-R-R, G-G-R, G-R-G e R-G-G, nas quais uma das cores se repete (permitindo que, nessa seleção de variáveis, as chaves selecionadas pisquem na mesma cor nas situações em que ela se repete). Só não sendo válidas para G-G-G e R-R-R, nas quais serão iguais em todas combinações. Então, se esse conjunto de “instruções” existir, em 5/9 de todas as execuções, os resultados serão iguais para as cores das luzes resultantes das possíveis medições. Porém, na demonstração real do experimento da desigualdade de Bell, as luzes piscam iguais somente na metade das vezes. Ou seja, existe um teste experimental que indica que não pode haver variáveis ocultas locais.

Uma forma de realizar esse experimento, de acordo com a TQ, seria utilizando partículas correlacionadas, do estado singleto. Nesse caso teríamos dois aparatos Stern-Gerlach e um par de partículas, sendo que as partículas seriam lançadas em direções opostas, nas quais estariam os aparatos. As chaves seriam três possíveis direções para onde apontariam os polos de ímãs Stern-Gerlach (por exemplo, direções em x,y e z) e as luzes representariam os estados “spin up” e “spin down” (para verde e vermelho). O aparelho do outro lado seria configurado com as cores opostas. Dessa forma, quando os ímãs estiverem na mesma direção (chave 1, 2 ou 3), a mesma cor aparece, pois em um aparelho teríamos “spin up” e no outro “spin down”, que devido as configurações opostas, resultariam nas mesmas cores das lâmpadas. Portanto, nunca seria possível obtermos cores diferentes para uma mesma seleção de chaves. Sendo assim, independente da distância escolhida entre os aparelhos, os resultados sempre seriam opostos para uma mesma configuração de chave. Era isso que incomodava Einstein, pois ele achava que deveriam existir “instruções” prévias que permitissem prever com antecedência qual configuração pré-determinada o sistema tinha, o que não ocorre de fato.

Com esse exemplo mental podemos entender exatamente o que está em jogo no Teorema de Bell. Na época, a discussão proposta por Einstein era se a Teoria Quântica estaria completa (e não existiriam variáveis ocultas) ou se estaria incompleta (e existiriam variáveis ocultas). Em princípio, essa parecia ser uma discussão filosófica – sem implicação empírica. Entretanto, com o experimento proposto, vemos que há uma diferença empírica entre uma partícula “carregar instruções” ou não. Os dados experimentais, como aponta Mermin, corroboram a ideia de que não há variáveis ocultas locais (instruções carregadas pela partícula). Na próxima seção, discutimos os fundamentos matemáticos necessários para derivar o teorema de Bell formalmente.

3. Fundamentos da Teoria Quântica

Nessa seção, apresentamos alguns elementos fundamentais para compreensão da discussão em torno do artigo de John Bell, que ficou conhecido pela famosa desigualdade que leva o nome do autor. Para esse fim, no Material Suplementar, ao fim deste artigo, também é disponibilizado uma explicação dos principais elementos matemáticos necessários para a compreensão da derivação do Teorema de Bell e da notação utilizada. O material também contém a exposição de relações que permitem realizar cálculo do valor esperado para o estado singleto, que será abordado a seguir, de acordo com a Teoria Quântica usual. Assim, em um curso introdutório de Mecânica Quântica, sugerimos que o estudante se familiarize com o material suplementar antes de avançar nas próximas seções.

3.1. O valor esperado do Spin para o estado singleto na Teoria Quântica usual

Nesta seção, demonstramos o valor esperado do Spin para o estado singleto segundo a Teoria Quântica ortodoxa, relacionando-o com as passagens as quais Bell se refere em seu artigo de 1964. O artigo inicia a formulação da situação explicando que no artigo EPR a situação descrita é um singleto, como segue

Considere um par de partículas de spin meio formadas de alguma forma no estado de spin singleto e movendo-se livremente em direções opostas. As medições podem ser feitas, digamos por ímãs de Stern-Gerlach, em componentes selecionados de spins σ1 e σ2. Se a medição do componente σ1a, onde a é algum vetor unitário, produz o valor +1, então, de acordo com a mecânica quântica, a medição de σ2a deve produzir o valor -1 e vice-versa [16[16] J.S. Bell, Phys. Phys. Fiz. 1, 195 (1964)., p. 1].

Nesse trecho Bell se refere aos estados correlacionados do estado singleto, no qual, por consequência, obtêm-se medidas de valores contrários de spin ao utilizar o experimento de Stern-Gerlach. Porém, na continuação do artigo, Bell propõe uma segunda hipótese, na qual

Se duas medições são feitas em locais distantes um do outro, a orientação de um ímã não influencia o resultado obtido com o outro. Uma vez que podemos prever com antecedência o resultado da medição de qualquer componente escolhido de σ2, medindo previamente o mesmo componente de σ1, segue-se que o resultado de qualquer medição deve realmente ser premeditado [16[16] J.S. Bell, Phys. Phys. Fiz. 1, 195 (1964)., p. 1].

Além disso, pela TQ usual, um resultado de medição realizado em um aparelho distante do outro não poderia afetá-lo, ou seja, o resultado B para a partícula 2 não tem dependência do ajuste realizado na medição A da direção a do ímã correspondente à partícula 1, e vice-versa. Então, o valor esperado do produto de dois componentes σ1a e σ2b , para o singleto, deve ser “-ab”, como será demonstrado na sequência.

Seguindo a relação de “bra” e “ket” (equações S.44 e S.45 do material suplementar) para o estado singleto e substituindo o vetor genérico “v” (equação S.43) pelos utilizados por Bell, “a” e “b”, utilizando “a” como o arco que representa a inclinação do vetor “a” com a origem e “b” o ângulo formado pelo vetor “b”, podemos reescrever a matriz para esses vetores como

(1) σ 1 a = ( cos ( a ) s e n ( a ) s e n ( a ) - cos ( a ) ) 1
(2) σ 2 b = ( cos ( b ) s e n ( b ) s e n ( b ) - cos ( b ) ) 2

Onde os sobescritos relacionam os vetores à respectiva partícula representada pelo estado singleto. Sabendo que Bell se refere ao valor esperado do produto de σ1aσ2b para o estado singleto, podemos escrevê-lo como 0|σ1aσ2b|0. Temos então que

σ 1 a σ 2 b | 0 = { ( cos ( a ) s e n ( a ) s e n ( a ) - cos ( a ) ) 1 ( cos ( b ) s e n ( b ) s e n ( b ) - cos ( b ) ) 2 } [ 1 2 ( 1 0 ) 1 ( 0 1 ) 2 - 1 2 ( 0 1 ) 1 ( 1 0 ) 2 ]

Sendo que as matrizes de sobescrito 1 só atuam em matrizes de sobescrito 1 e o mesmo valendo para o índice 2, tem-se que

σ 1 a σ 2 b | 0 = 1 2 [ ( cos ( a ) s e n ( a ) s e n ( a ) - cos ( a ) ) 1 ( 1 0 ) 1 ] [ ( cos ( b ) s e n ( b ) s e n ( b ) - cos ( b ) ) 2 ( 0 1 ) 2 ] - 1 2 [ ( cos ( a ) s e n ( a ) s e n ( a ) - cos ( a ) ) 1 ( 0 1 ) 1 ] [ ( cos ( b ) s e n ( b ) s e n ( b ) - cos ( b ) ) 2 ( 1 0 ) 2 ] σ 1 a σ 2 b | 0 = 1 2 ( cos ( a ) s e n ( a ) ) 1 ( s e n ( b ) - cos ( b ) ) 2 - 1 2 ( s e n ( a ) - cos ( a ) ) 1 ( cos ( b ) s e n ( b ) ) 2

Por último, a multiplicação de 0|, obtendo

0 | σ 1 a σ 2 b | 0 = 1 2 [ 1 2 ( 1 0 ) 1 ( 0 1 ) 2 - 1 2 ( 0 1 ) 1 ( 1 0 ) 2 ] ( cos ( a ) s e n ( a ) ) 1 ( s e n ( b ) - cos ( b ) ) 2 - 1 2 [ 1 2 ( 1 0 ) 1 ( 0 1 ) 2 - 1 2 ( 0 1 ) 1 ( 1 0 ) 2 ] ( s e n ( a ) - cos ( a ) ) 1 ( cos ( b ) s e n ( b ) ) 2 0 | σ 1 a σ 2 b | 0 = 1 2 [ 1 2 cos ( a ) ( - cos ( b ) ) - 1 2 s e n ( a ) s e n ( b ) ] - 1 2 [ 1 2 s e n ( a ) s e n ( b ) - 1 2 ( - cos ( a ) ) cos ( b ) ] 0 | σ 1 a σ 2 b | 0 = - 1 2 cos ( a ) cos ( b ) - 1 2 s e n ( a ) s e n ( b ) - 1 2 s e n ( a ) s e n ( b ) - 1 2 cos ( a ) cos ( b ) 0 | σ 1 a σ 2 b | 0 = - cos ( a ) cos ( b ) - s e n ( a ) s e n ( b )

Utilizando propriedades trigonométricas, lembrando que “-cos(a)cos(b)-sen(a)sen(b)” é uma forma alternativa de “-cos(a-b)”, chegamos em

(3) 0 | σ 1 a σ 2 b | 0 = - cos ( a - b )

Ou ainda, pela propriedade de multiplicação de vetores,

(4) 0 | σ 1 a σ 2 b | 0 = - a b

Obtendo então a resposta que, de acordo com a TQ usual, seria o valor esperado para o singleto. Esse valor esperado aparece posteriormente na forma de P(a,b) pela notação de densidade de probabilidade de Bell.

3.2. O paradoxo de Einstein, Podolsky e Rosen

Antes de prosseguir com o desenvolvimento da desigualdade e dos argumentos de Bell, é interessante retomarmos o que deu início a essa discussão. Em 1935, Einstein, Podolsky e Rosen [13[13] A. Einstein, B. Podolsky e N. Rosen, Phys. Rev. 47, 777 (1935).] publicaram um artigo que fazia críticas em relação a completude da Teoria Quântica. A relação de existência de uma correspondência entre elementos de teoria e da realidade era considerada pelos autores uma característica de completude de uma teoria física. Dessa forma, um critério de realidade de uma quantidade física é justamente a possibilidade de podermos realizar previsões sobre o sistema sem perturbá-lo. A Teoria Quântica usual assume que uma função de onda Ψ forneceria a descrição completa para um sistema, porém, essa função de onda é expressa em termos de uma sobreposição de autoestados de um operador, que representa a grandeza física observada. Sendo assim, não podemos definir simultaneamente os valores dos autoestados das grandezas que não comutam. Então se escolhermos medir posição e momento, ao medirmos um, não será possível definir simultaneamente o valor do outro, de forma que uma das grandezas acaba não tendo realidade física.

Isso gerou duas conclusões: “(1) a descrição da mecânica quântica da realidade dada pela função de onda não é completa ou (2) quando os operadores correspondentes a duas grandezas físicas não comutam as duas grandezas não podem ter realidade simultânea” [13[13] A. Einstein, B. Podolsky e N. Rosen, Phys. Rev. 47, 777 (1935)., p. 778]. Por consequência, teríamos duas1 1 As duas conclusões mencionadas decorrem do artigo EPR, mas existem outras possibilidades, como as que consideram que ambas as afirmações podem ser falsas, ou seja, a Teoria Quântica ser incompleta e posição e momento não terem realidade simultânea. Um exemplo disso é a Teoria das Variáveis Ocultas Estocásticas que, além de abandonar a questão do realismo, determinismo na medição, conclui que existam variáveis ocultas que possam complementar a TQ. opções: a mecânica quântica é completa e a posição e momento não são reais ao mesmo tempo ou a teoria quântica é incompleta e posição e momento são reais. Einstein, Podolsky e Rosen partem então do pressuposto de que a função de onda nos dá todas as informações sobre o sistema, propondo então, um experimento mental, que acaba revelando um novo fenômeno de estudo na Teoria Quântica, o emaranhamento.

O experimento consiste em duas partículas livres com momentos opostos, em um sistema isolado, que interagiram durante um intervalo breve de tempo. O fato de terem momentos de igual valor, mas em sentidos opostos, permite que, ao medirmos o valor do momento no sistema I, saibamos por consequência, o momento no sistema II. Ao final do argumento, os autores mostram que as descrições realizadas nas medidas dos dois sistemas são consistentes com a mesma realidade. Esse fator torna a conclusão (1) falsa, destacando então que a função de onda não descreve a realidade dada. Mais detalhes sobre o argumento EPR podem ser encontrados em Wagner et al. [12[12] R. Wagner, A.W. Rosa, N.W. Lima e M.M. Nascimento, Rev. Enseñanza la Física 33, 167 (2021).]. Shimony e Clauser [39[39] J.F. Clauser e A. Shimony, Reports Prog. Phys. 41, 1881 (1978).], em seu artigo sobre o Teorema de Bell, destacaram que EPR tiveram uma terceira condição colocada como verdadeira, que foi o pressuposto de que não há ação a distância na natureza. Assim, o desenvolvimento do artigo EPR foi baseado em realismo e localidade, estando o último evidenciado na observação de que um sistema não poderia afetar instantaneamente o outro em locais espacialmente separados.

4. Discussão Sobre o Argumento de J. S. Bell

A introdução do artigo escrito por Bell permite identificarmos quais as noções iniciais do autor, quanto ao contexto da Teoria Quântica na época, sendo que nessa breve introdução consta que

O paradoxo de Einstein, Podolsky e Rosen foi apresentado como um argumento de que a mecânica quântica não poderia ser uma teoria completa, mas deveria ser complementada por variáveis adicionais. Essas variáveis adicionais deveriam restaurar a teoria de causalidade e localidade. Nesta nota essa ideia será formulada matematicamente e se mostrará incompatível com as previsões estatísticas da mecânica quântica. É a exigência de localidade, ou mais precisamente que o resultado de uma medição em um sistema não seja afetado por operações em um sistema distante com o qual interagiu no passado, que cria a dificuldade essencial. Houve tentativas de mostrar que, mesmo sem tal exigência de separabilidade ou localidade, nenhuma interpretação de “variável oculta” da mecânica quântica é possível. Essas tentativas foram examinadas em outro lugar e consideradas insuficientes. Além disso, uma interpretação de variável oculta da teoria quântica elementar foi explicitamente construída. Essa interpretação particular tem, de fato, uma estrutura grosseiramente não-local. Isso é característico, de acordo com o resultado a ser provado aqui, de qualquer teoria que reproduza exatamente as previsões da mecânica quântica [16[16] J.S. Bell, Phys. Phys. Fiz. 1, 195 (1964)., p. 195].

Tendo isto, é possível analisarmos a grande influência de Von Neumann [14[14] J. Von Neumann, Mathematical Foundations of Quantum Mechanics (Julius Springer, Berlin, 1932), 1 ed.] na Teoria Quântica, pois seu argumento no livro “Mathematishe Grundlagen der Quanten-mechanik”, até então, era considerado como uma prova de impossibilidade de que novas variáveis fossem adicionadas a TQ. Sendo que a falha no argumento de Von Neumann já havia sido percebida anteriormente a Bell, por Grete Hermann, na década de 1930 [17[17] O. Freire Jr., The quantum dissidents: Rebuilding the foundations of quantum mechanics (1950–1990) (Springer, New York, 2015).], porém não recebeu a devida atenção dos Físicos. Além disso, Bell afirma ter percebido uma estrutura “grosseiramente” não-local já na Teoria de Variáveis Ocultas de David Bohm [15[15] D. Bohm, Phys. Rev. 85, 66 (1952)., 40[40] D. Bohm, Phys. Rev. 85, 2, 180 (1952).]. Foi justamente a existência de uma interpretação em termos de variáveis ocultas, que por consequência desafiava a autoridade da prova de impossibilidade de Von Neumann, que motivou Bell a escrever seu artigo. O elemento de não-localidade era o que caracterizava qualquer teoria que reproduzisse as previsões da Mecânica Quântica. Bell ainda destaca que o grande problema de toda essa situação é o fato de que um sistema não possa interferir no outro, o que é descrito como “localidade”. Toda essa questão envolvendo os fundamentos, apesar de muita importância para as discussões posteriores, acabou não tendo uma devida atenção na época de sua elaboração. Essa retomada de discussões sobre algo já “concluído” não era visto como um trabalho que envolvesse realmente uma questão física, chegando a ser considerado “metafísica” [17[17] O. Freire Jr., The quantum dissidents: Rebuilding the foundations of quantum mechanics (1950–1990) (Springer, New York, 2015).], o que inclusive fez com que muitos físicos envolvidos nesse debate tivessem dificuldade em suas vidas profissionais. Por isso o destaque à discussão que Bell iniciou com a demonstração de sua desigualdade, o que mostrou que não somente a interpretação, mas a forma como entendemos e estudamos a Teoria Quântica poderia ser reconsiderada.

O experimento que John S. Bell descreve em seu artigo é feito com a suposição de uma medição realizada por aparatos Stern-Gerlach, no qual o estado utilizado é o singleto. Retomando o estado singleto, mais especificamente a equação que o define, ao medirmos o spin de uma das partículas correlacionadas, por consequência, saberemos o resultado da outra. O estado sendo dado por

(5) | 0 = 1 2 ( 1 0 ) 1 ( 0 1 ) 2 - 1 2 ( 0 1 ) 1 ( 1 0 ) 2

se uma medição nos revela “spin up” para a partícula 1 (ou valor +1 no artigo de Bell), o estado acima se reduz para 12(10)1(01)2, que por consequência fornece o resultado de “spin down” para a partícula 2 (ou, valor -1) e vice-versa. Para mostrar que o resultado obtido utilizando “variáveis ocultas” se difere do resultado esperado de acordo com a Teoria Quântica usual, Bell adiciona ao experimento as variáveis ocultas representadas por “λ” (lambda). De forma que as medições A e B dependam somente das direções a e b, respectivamente, e da suposta variável oculta λ. E é justamente esse fato que representava a característica do realismo que foi adicionada ao argumento da desigualdade de Bell, pois A(a,λ) e B(b,λ) deveriam ter valores pré-definidos, independentemente da realização da medida ser feita ou não.

Uma representação do esquema imaginado por Bell é dado na Figura 4.

Figura 4
Experimento sugerido por Bell, no qual os aparatos Stern-Gerlach estão distantes um do outro a ponto de que a direção do campo magnético de um não interfira no outro. Um aparelho está apontando para uma direção a e o outro para uma direção b. Adaptado de Pessoa Jr [41[41] O. Pessoa Jr., Consequências filosóficas da desigualdade de Bell,” in Temas de Filosofia da Natureza (UERJ, Rio de Janeiro, 2004).].

As medições realizadas em direções arbitrárias a e b são denotadas então pelos valores correspondentes a spin up e spin down, ou +1 e -1 respectivamente. A média dos produtos das medições nas duas direções é representada por P(a,b). Os aparelhos, em uma posição alinhada, vão sempre apresentar resultados opostos, que é a anticorrelação perfeita do estado singleto. Adicionando a suposta variável oculta ou conjunto de variáveis representadas por λ, descreve-se os resultados das duas medidas como A(a,λ) e B(b,λ). A crítica realizada no paradoxo EPR era em relação ao caráter não-realista da teoria TQ. O argumento que os autores do EPR utilizaram é o de que esse valor (medida de A e B) é desconhecido por que faltaria um complemento das informações necessárias da medição com a variável oculta λ, de caráter local, que restauraria a causalidade da teoria quântica.

Algo que incomodava muitos físicos, como Einstein por exemplo, era a concepção probabilística do mundo quântico e a perspectiva de que as informações sobre um determinado aspecto da TQ só pudessem ser dadas no momento da medição [22[22] N. D. Mermin, Phys. Today 38, 38 (1985).].

5. Derivação da Desigualdade de Bell

Ao final, no artigo do paradoxo EPR, fica em aberto a possibilidade de existir uma descrição completa da realidade física fornecida Mecânica Quântica. Em teoria, essa especificação ou descrição mais completa da Mecânica Quântica seria dada por possíveis variáveis ocultas λ. Sendo que λ pode representar uma única variável, um conjunto de variáveis ou, até mesmo, um conjunto de funções (essa variável pode ser discreta ou contínua), o que é indiferente para a representação que seguirá. Apesar de Bell escolher considerá-la um único parâmetro contínuo. Dessa forma, ρ(λ) representa a distribuição de probabilidade, ou seja, os possíveis valores de λ e suas probabilidades de ocorrência.

Temos, da seção 4 4. Discussão Sobre o Argumento de J. S. Bell A introdução do artigo escrito por Bell permite identificarmos quais as noções iniciais do autor, quanto ao contexto da Teoria Quântica na época, sendo que nessa breve introdução consta que O paradoxo de Einstein, Podolsky e Rosen foi apresentado como um argumento de que a mecânica quântica não poderia ser uma teoria completa, mas deveria ser complementada por variáveis adicionais. Essas variáveis adicionais deveriam restaurar a teoria de causalidade e localidade. Nesta nota essa ideia será formulada matematicamente e se mostrará incompatível com as previsões estatísticas da mecânica quântica. É a exigência de localidade, ou mais precisamente que o resultado de uma medição em um sistema não seja afetado por operações em um sistema distante com o qual interagiu no passado, que cria a dificuldade essencial. Houve tentativas de mostrar que, mesmo sem tal exigência de separabilidade ou localidade, nenhuma interpretação de “variável oculta” da mecânica quântica é possível. Essas tentativas foram examinadas em outro lugar e consideradas insuficientes. Além disso, uma interpretação de variável oculta da teoria quântica elementar foi explicitamente construída. Essa interpretação particular tem, de fato, uma estrutura grosseiramente não-local. Isso é característico, de acordo com o resultado a ser provado aqui, de qualquer teoria que reproduza exatamente as previsões da mecânica quântica [16, p. 195]. Tendo isto, é possível analisarmos a grande influência de Von Neumann [14] na Teoria Quântica, pois seu argumento no livro “Mathematishe Grundlagen der Quanten-mechanik”, até então, era considerado como uma prova de impossibilidade de que novas variáveis fossem adicionadas a TQ. Sendo que a falha no argumento de Von Neumann já havia sido percebida anteriormente a Bell, por Grete Hermann, na década de 1930 [17], porém não recebeu a devida atenção dos Físicos. Além disso, Bell afirma ter percebido uma estrutura “grosseiramente” não-local já na Teoria de Variáveis Ocultas de David Bohm [15, 40]. Foi justamente a existência de uma interpretação em termos de variáveis ocultas, que por consequência desafiava a autoridade da prova de impossibilidade de Von Neumann, que motivou Bell a escrever seu artigo. O elemento de não-localidade era o que caracterizava qualquer teoria que reproduzisse as previsões da Mecânica Quântica. Bell ainda destaca que o grande problema de toda essa situação é o fato de que um sistema não possa interferir no outro, o que é descrito como “localidade”. Toda essa questão envolvendo os fundamentos, apesar de muita importância para as discussões posteriores, acabou não tendo uma devida atenção na época de sua elaboração. Essa retomada de discussões sobre algo já “concluído” não era visto como um trabalho que envolvesse realmente uma questão física, chegando a ser considerado “metafísica” [17], o que inclusive fez com que muitos físicos envolvidos nesse debate tivessem dificuldade em suas vidas profissionais. Por isso o destaque à discussão que Bell iniciou com a demonstração de sua desigualdade, o que mostrou que não somente a interpretação, mas a forma como entendemos e estudamos a Teoria Quântica poderia ser reconsiderada. O experimento que John S. Bell descreve em seu artigo é feito com a suposição de uma medição realizada por aparatos Stern-Gerlach, no qual o estado utilizado é o singleto. Retomando o estado singleto, mais especificamente a equação que o define, ao medirmos o spin de uma das partículas correlacionadas, por consequência, saberemos o resultado da outra. O estado sendo dado por (5) | 0 ⟩ = 1 2 ⁢ ( 1 0 ) 1 ⁢ ( 0 1 ) 2 - 1 2 ⁢ ( 0 1 ) 1 ⁢ ( 1 0 ) 2 se uma medição nos revela “spin up” para a partícula 1 (ou valor +1 no artigo de Bell), o estado acima se reduz para 12⁢(10)1⁢(01)2, que por consequência fornece o resultado de “spin down” para a partícula 2 (ou, valor -1) e vice-versa. Para mostrar que o resultado obtido utilizando “variáveis ocultas” se difere do resultado esperado de acordo com a Teoria Quântica usual, Bell adiciona ao experimento as variáveis ocultas representadas por “λ” (lambda). De forma que as medições A e B dependam somente das direções a→ e b→, respectivamente, e da suposta variável oculta λ. E é justamente esse fato que representava a característica do realismo que foi adicionada ao argumento da desigualdade de Bell, pois A⁢(a→,λ) e B⁢(b→,λ) deveriam ter valores pré-definidos, independentemente da realização da medida ser feita ou não. Uma representação do esquema imaginado por Bell é dado na Figura 4. Figura 4 Experimento sugerido por Bell, no qual os aparatos Stern-Gerlach estão distantes um do outro a ponto de que a direção do campo magnético de um não interfira no outro. Um aparelho está apontando para uma direção a→ e o outro para uma direção b→. Adaptado de Pessoa Jr [41]. As medições realizadas em direções arbitrárias a→ e b→ são denotadas então pelos valores correspondentes a spin up e spin down, ou +1 e -1 respectivamente. A média dos produtos das medições nas duas direções é representada por P⁢(a→,b→). Os aparelhos, em uma posição alinhada, vão sempre apresentar resultados opostos, que é a anticorrelação perfeita do estado singleto. Adicionando a suposta variável oculta ou conjunto de variáveis representadas por λ, descreve-se os resultados das duas medidas como A⁢(a,λ) e B⁢(b,λ). A crítica realizada no paradoxo EPR era em relação ao caráter não-realista da teoria TQ. O argumento que os autores do EPR utilizaram é o de que esse valor (medida de A e B) é desconhecido por que faltaria um complemento das informações necessárias da medição com a variável oculta λ, de caráter local, que restauraria a causalidade da teoria quântica. Algo que incomodava muitos físicos, como Einstein por exemplo, era a concepção probabilística do mundo quântico e a perspectiva de que as informações sobre um determinado aspecto da TQ só pudessem ser dadas no momento da medição [22]. , que mostra o experimento imaginado por Bell, que o resultado obtido pela medida a partir de um observável A da medição σ1a é determinada por a e λ, assim como para B a medição de σ1b é determinada por b e λ. Sendo λ a representação das variáveis ocultas, não previstas na Teoria Quântica. De forma que:

(6) A ( a , λ ) = ± 1
(7) B ( b , λ ) = ± 1

O resultado de B não depende de a e nem A depende de b. Se ρ(λ) é a distribuição de probabilidade de (λ), então o valor esperado do produto de dois componentes é:

(8) P ( a , b ) = d λ ρ ( λ ) A ( a , λ ) B ( b , λ )

Sendo ρ(λ) a distribuição de probabilidade normalizada, tem-se

(9) d λ ρ ( λ ) = 1

E, devido as relações (6) e (7), a equação (8) não pode admitir valores menores que -1, sendo possível obter esse valor quando a=b. Se

(10) A ( a , λ ) = - B ( a , λ ) e B ( b , λ ) = - A ( b , λ )

Então, fazendo essa substituição em (8), tem-se que

(11) P ( a , b ) = d λ ρ ( λ ) A ( a , λ ) [ - A ( b , λ ) ] P ( a , b ) = - d λ ρ ( λ ) A ( a , λ ) A ( b , λ )

Incluindo agora um vetor unitário c, representando a medida em uma outra direção arbitrária, com o mesmo procedimento usado para obter (11), tem-se

P ( a , b ) - P ( a , c ) = - d λ ρ ( λ ) A ( a , λ ) A ( b , λ ) - ( - d λ ρ ( λ ) A ( a , λ ) A ( c , λ ) ) P ( a , b ) - P ( a , c ) = - d λ ρ ( λ ) [ A ( a , λ ) A ( b , λ ) - A ( a , λ ) A ( c , λ ) ]

Considerando que [A(b,λ)]2=1, podemos fazer a seguinte inserção:

P ( a , b ) - P ( a , c ) = - d λ ρ ( λ ) [ A ( a , λ ) A ( b , λ ) - A ( a , λ ) ( 1 ) A ( c , λ ) ] P ( a , b ) - P ( a , c ) = - d λ ρ ( λ ) [ A ( a , λ ) A ( b , λ ) - A ( a , λ ) A ( b , λ ) A ( b , λ ) A ( c , λ ) ]

Colocando A(a,λ)A(b,λ) em evidência, obtêm-se:

P ( a , b ) - P ( a , c ) = - d λ ρ ( λ ) [ 1 - A ( b , λ ) A ( c , λ ) ] A ( a , λ ) A ( b , λ )

De acordo com as relações (6) e (7) a multiplicação do termo A(a,λ)A(b,λ) só pode assumir valores -1 e +1, de forma que seus produtos tenham como resultado, ao estarem alinhados, -1 (para os vetores apontando em um mesmo sentido, já que são spins contrários) e +1 (para sentidos opostos) de forma que o módulo do produto dos dois seja |A(a,λ)A(b,λ)|=1. Além disso, a distribuição de probabilidade da função de λ não pode assumir valores negativos, de forma que ρ(λ)0 e como o produto A(b,λ)A(c,λ) é ±1, então o termo entre colchetes será 0 ou 2, para os valores extremos que podem ser atingidos. Sendo assim o termo fica [1-A(b,λ)A(c,λ)]0. Da mesma maneira, se tomássemos módulo dos dois lados |P(a,b)-P(a,c)|=|dλρ(λ)[1-A(b,λ)A(c,λ)]|, teríamos que “o valor absoluto de uma integração inteira deve ser menor ou igual ao valor integrado do valor absoluto do integrando” [42[42] N. Hoglund e O. Jacobson, Bell’s Theorem and Inequalities, with Experimental Considerations (Royal Institute of Technology (KTH), Stockholm, 2013)., p. 12]. De forma que, com as características que acabaram de ser descritas, podemos propor que a igualdade seja representada pela seguinte desigualdade:

| P ( a , b ) - P ( a , c ) | d λ ρ ( λ ) [ 1 - A ( b , λ ) A ( c , λ ) ]

Sendo que -dλρ(λ)A(b,λ)A(c,λ) é a probabilidade P(b,c), temos então

(12) | P ( a , b ) - P ( a , c ) | 1 + P ( b , c )

A expressão (8) é a famosa desigualdade de Bell, na mesma forma a qual foi apresentada em seu artigo de 1964. As densidades de probabilidade P(a,b), P(a,c) e P(b,c) decorrem da relação desenvolvida em (4) e a, b e c são vetores unitários que apontam nas direções em que os aparatos Stern-Gerlach podem ser configurados. Dessa forma, P(a,b) representa a média do produto das medições para os componentes de spin realizadas nas direções a e b, assim como P(a,c) e P(b,c) representam a média do produto das medições nas direções a e b e nas direções b e c, respectivamente. Dada essa desigualdade, é simples mostrar que a previsão da Teoria Quântica é incompatível [43[43] D.J. Grifftihs, Introduction to Quantum Mechanics (Pearson, London, 2005), 2 ed.], basta imaginarmos que os três vetores estejam em um mesmo plano e que c faça um ângulo de 45 com a e b, tendo assim

P ( a , b ) = 0 , P ( a , c ) = P ( b , c ) = - 0,707

de forma que a desigualdade assuma os valores

| - 0,707 | 1 + ( - 0,707 ) 0,707 0,294

o que claramente viola a desigualdade de Bell.

6. Considerações Finais

A Teoria Quântica é, geralmente, uma disciplina que desperta nos alunos a sensação de dificuldade, o que se deve a abstração necessária para a compreensão de alguns dos seus conceitos. Muitas vezes isso ocorre pela desvinculação de uma determinada teoria/conceito do seu contexto de origem, sendo estabelecida somente uma perspectiva instrumentalista dos conteúdos e conceitos compreendidos nas disciplinas que abordam a Física Moderna e Teoria Quântica, deixando de lado vários elementos que foram destacados pelo autor em detrimento da compreensão de como realizar os cálculos que o envolvem [8[8] N.W. Lima, M.M. Nascimento, C. Cavalcanti e F. Ostermann, Rev. Bras. Ensino Fis. 42, p. e20190134 (2020)., 44[44] A. Johansson, S. Andersson, M. Salminen-Karlsson e M. Elmgren, Cult. Stud. Sci. Educ. 13, 205 (2018).]. A dificuldade ocasionada pelo desligamento do formalismo com as teorias filosóficas e acontecimentos históricos pode fazer com que o aluno aprenda a utilizar determinado conceito mesmo sem saber seu real significado. Uma das formas de contemplar esse desenvolvimento permeando as áreas destacadas anteriormente é a utilização dos trabalhos originais dos autores, as fontes primárias [5[5] R. Karam, Rev. Bras. Ensino Ciências e Matemática 4, 1067 (2021)., 9[9] N. Lima e R. Karam, Am. J. Phys. 89, 521 (2021).].

O estudo dos elementos matemáticos fundamentais para a compreensão do desenvolvimento do argumento de Bell na derivação da desigualdade juntamente do contexto histórico da época e das implicações filosóficas envolvidas, podem proporcionar um certo “aprofundamento” nos conceitos e modelos de interpretação da TQ [45[45] I.D. Johnston, K. Crawford e P.R. Fletcher, Int. J. Sci. Educ. 20, 427 (1998).]. Uma certa “base” para iniciar as temáticas envolvidas na Teoria Quântica pode iniciar no Ensino Médio [46[46] A.C. Silva e M.J.P.M. De Almeida, Cad. Bras. Ensino Física 28, 624 (2011).], pois a explicação prévia de alguns conceitos sobre o tema pode facilitar a abstração em uma futura abordagem. Para isso, seria indicada a avaliação de como a estruturação dos livros didáticos são feitas e como apresentam o material sobre a Teoria Quântica, atentando aos elementos originais que aparecem na obra [47[47] N. W. Lima, F. Ostermann, e C.J.H. Cavalcanti, Cad. Bras. Ensino Física 34, 435 (2017).].

As possibilidades da abordagem do Teorema de Bell vão além da matemática envolvida no desenvolvimento e cálculos sobre a Teoria Quântica, o teorema traz para primeiro plano todo o aspecto filosófico envolvido e as interferências históricas ocorridas em seu contexto. A grande importância da abordagem do artigo original de Bell é, além da importância da desigualdade para a TQ e o desenrolar de aspecto filosófico, que ele foi escrito em um momento de ápice de uma das controvérsias mais importantes da Teoria Quântica [48[48] O. Freire Jr., Sci. Educ., 12, 573 (2003).], que era justamente a discussão sobre os fundamentos da TQ e o realismo local. A desigualdade se mostra interessante justamente por evidenciar a relação fundamental entre Teoria Quântica, matemática e filosofia, na medida em que esses aspectos são incorporados no desenvolvimento do Teorema de Bell.

O artigo no qual Bell desenvolve a desigualdade [16[16] J.S. Bell, Phys. Phys. Fiz. 1, 195 (1964).], que posteriormente leva seu nome, é de extrema importância para a história, pois é um momento no qual os fundamentos da Teoria Quântica são retomados, principalmente a questão da localidade. Bell consegue, partindo dos pressupostos de localidade e realismo, desenvolver uma desigualdade envolvendo variáveis ocultas que, após algumas etapas matemáticas, é violada pela Teoria Quântica. Esse trabalho permitiu que fossem desenvolvidas novas relações da desigualdade (por exemplo, a desigualdade de Clauser, Horne, Shimony e Holt), as quais permitiram que o Teorema de Bell adentrasse nos laboratórios de Física, mostrando que a interação entre duas partículas correlacionadas, separadas espacialmente, ocorria instantaneamente, revelando então o caráter não-local da teoria. Havendo então a possibilidade de existirem variáveis ocultas não-locais, algo não imaginado até o momento.

Considerando toda essa importância da fonte primária, o artigo de J. Bell, o presente trabalho buscou apresentar todos os elementos que seriam necessários para desenvolver o raciocínio matemático e filosófico envolvido na derivação do Teorema de Bell. Isso permite a simplificação na compreensão de todos os elementos envolvidos em seu desenvolvimento, pois agrupa em uma seção todos conhecimentos físico-matemáticos necessários. Junto a isso, pode-se acrescentar a explicação detalhada dos argumentos utilizados por Bell no desenvolvimento de sua teoria. Sendo assim, esperamos ter aproximado o artigo de Bell de uma formulação que permita sua entrada em contexto pedagógico, proporcionando aos alunos uma explicação mais didática do original.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Set 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    20 Abr 2022
  • Revisado
    30 Jun 2022
  • Aceito
    09 Ago 2022
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