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Aspectos do Sol observados em diferentes faixas espectrais

Aspects of the Sun observed at different spectral ranges

Resumos

A busca por novas metodologias e estratégias para transformar as aulas de Física mais próximas da realidade dos(as) estudantes do Ensino Médio, faz com que professores(as) criem novas atividades com ideias diferentes das que são usualmente apresentadas em livros didáticos.

Nesse contexto, utilizou-se o Sol como base conhecida para explicar os conceitos de ondas eletromagnéticas e radiação de corpo negro, abordando esse conteúdo por meio da Função de Planck, da Lei de Wien e da Lei de Stefan-Boltzmann de uma forma aplicada, com o uso de um programa desenvolvido para esse fim, e de imagens astronômicas obtidas com tecnologia de ponta, visando tornar o aprendizado mais significativo.

O objetivo é apresentar a possibilidade do uso de informações relativas ao Sol como tema norteador para o aprendizado dos conteúdos de Física Moderna, motivando os(as) estudantes durante o processo educativo. Além disso, apresenta-se um resumo dos conceitos básicos relacionados ao Sol, buscando levar aos(às) professores(as) uma forma de compreender os processos físicos que explicam as diferentes características solares observadas em faixas espectrais específicas.

Palavras-chave:
Estrelas; Estrutura solar; Espectro eletromagnético; Radiação de corpo negro; BNCC


The search for new methodologies and strategies to bring physics classes closer to the reality of high school students, prompts teachers to create new activities with novel ideas, different from those that are usually found in textbooks.

In this context, the Sun was used as a known basis to explain the concepts of electromagnetic waves and black body radiation, approaching this content with the use of the Planck function, the Wien’s law and the Stefan-Boltzmann law in practical activities by using a code developed by us, and astronomical images obtained through cutting edge technology, making the learning process more significant.

The goal is to present the possibility of using information related to the Sun as a guiding theme for the learning of Modern Physics topics, motivating students during the educational process. In addition, a summary of the basic concepts related to the Sun is presented, endeavoring to provide teachers with a way to understand the physical processes that explain how different solar characteristics are observed in specific spectral ranges.

Keywords
Stars; Solar structure; Electromagnetic spectrum; Black body radiation; BNCC


1. Introdução

Por muitas vezes os(as) alunos(as) perdem a motivação de determinado assunto, pois não conseguem relacioná-lo com o cotidiano ou com o futuro profissional que almejam. Segundo o livro “A sala de aula inovadora: estratégias pedagógicas para fomentar o aprendizado ativo”, de Fausto Camargo e Thuinie Daros [1[1] F. Camargo e T. Daros, A sala de aula inovadora estratégias pedagógicas para fomentar o aprendizado ativo (Penso Editora, Porto Alegre, 2018).], nos traz uma reflexão sobre o tema.

“Se os alunos conseguem estabelecer relações entre o que aprendem no plano intelectual e as situações reais, experimentais e profissionais ligadas a seus estudos, certamente a aprendizagem será mais significativa e enriquecedora [1[1] F. Camargo e T. Daros, A sala de aula inovadora estratégias pedagógicas para fomentar o aprendizado ativo (Penso Editora, Porto Alegre, 2018).].”

De acordo com a reflexão acima, e seguindo a proposta de Ausubel [2[2] D.P. Ausubel, Aquisição e retenção de conhecimentos: Uma perspectiva cognitiva (Editora Plátano, Lisboa, 2003).], a base da aprendizagem significativa está fundamentada na conexão entre o conhecimento prévio do(a) aluno(a) e o novo conteúdo a ser assimilado, de forma que o processo de aquisição de conhecimento seja dinâmico [3[3] M.A. Moreira, Uma abordagem cognitivista ao Ensino de Física: a teoria da aprendizagem de David Ausubel como sistema de referência para organização do ensino de ciências (Editora da UFRGS, Porto Alegre, 1983)., 4[4] A. Pelizzari, M.L. Kriegl, M.P. Baron, N.T.L. Finck e S.I. Dorocinski, Revista PEC 2, 37 (2002).]. Nesse sentido, a contextualização é necessária para evitar um aprendizado mecânico, no qual as informações são memorizadas, como no exemplo em que o aluno aprendeu a usar uma fórmula, mas não compreendeu o sentido de realizar uma dada operação matemática [5[5] O. Reboul, O Que É Aprender (Livraria Almedina, Coimbra, 1982).]. Com esse argumento, Anastasiou [6[6] L.G.C. Anastasiou e L.P. Alves, Processos de ensinagem na universidade: pressupostos para as estratégia de trabalho em sala de aula (Ed. Uninville, Joinville, 2007).] sugere que se tenha em mente a diferença entre as ações de “aprender” (que significa tomar conhecimento) e “apreender” que está relacionada com segurar, entender e compreender. Segundo a autora, “para apreender é preciso agir, exercitar-se, informar-se, tomar para si, apropriar-se, entre outros fatores …”. É a partir deste conceito básico teórico que se justifica a importância da aprendizagem ativa e significativa.

Os(As) professores(as) por outro lado, buscam incessantemente diferentes formas para atribuir sentido ao que se é dado em sala de aula e ao mesmo tempo cumprir o projeto pedagógico e os conteúdos dos livros didáticos disponibilizados pela escola. Os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (PCN) para a área de Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias, traz uma reflexão sobre o assunto:

“É preciso rediscutir qual Física ensinar para possibilitar uma melhor compreensão do mundo e uma formação para a cidadania mais adequada. Sabemos todos que, para tanto, não existem soluções simples ou únicas, nem receitas prontas que garantam o sucesso. Essa é a questão a ser enfrentada pelos educadores de cada escola, de cada realidade social, procurando corresponder aos desejos e esperanças de todos os participantes do processo educativo, reunidos através de uma proposta pedagógica clara [7[7] MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio (Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias) (Ministério da Educação, Brasília, 2000).].”

No contexto das realidades do(a) professor(a) e do(a) aluno(a), é necessário pensar em novas possibilidades dentro da sala de aula. Segundo Zabala [8[8] A. Zabala, A prática educativa: como ensinar (Penso Editora, Porto Alegre, 2015).], é interessante que o(a) professor(a) monte situações didáticas que coloquem o(a) aluno(a) como protagonista de seu aprendizado, mesmo que sua aula ainda tenha uma base no conteúdo previsto pelo currículo escolar, porém com um significado intrínseco baseado na realidade de cada aluno(a), não apenas nomes, fórmulas e regras para serem memorizadas e sim um conteúdo interconectado com seu cotidiano. Nesse formato, o(a) professor(a) deve sair do papel de controlador do saber, para assumir um papel ainda mais desafiador e importante para a aprendizagem, o de mediador, orientando seus(suas) alunos(as) nos diversos caminhos que podem ser traçados dentro de uma determinada atividade. Para isso o(a) professor(a) deve ter conhecimento básico em relação ao assunto da atividade que será colocada em prática em sala de aula, pois assim terá autonomia para a escolha de recursos didáticos baseados na realidade escolar de seus(suas) alunos(as) e nos seus interesses, de forma a ser flexível quando necessário [8[8] A. Zabala, A prática educativa: como ensinar (Penso Editora, Porto Alegre, 2015)., 9[9] J.A.S. Silva e M.E.F. Braidante, Revista Insignare Scientia 1, 1 (2018)., 10[10] D.G. Pérez, Enseñanza de las ciencias: revista de investigación y experiencias didácticas 9, 69 (1991).].

O Sol é a estrela mais conhecida por nós, não somente pelo fato que nosso sistema planetário é regido por ele, mas também por ser responsável pela vida e energia do nosso planeta. Fenômenos como auroras boreais e austrais são ligadas diretamente com a atividade solar, assim como análises de variações de temperatura da Terra, além das interferências nas comunicações. Tratam-se de temas de impacto no cotidiano, tornando as pesquisas voltadas para o Sol cada vez mais específicas e que dependem de tecnologia de ponta. Pela proximidade com temas da atualidade, o estudo do Sol se configura em uma excelente contextualização para a aprendizagem significativa por meio de um processo dinâmico. Além disso, como se pode constatar durante as aulas de Ciências da Natureza, a curiosidade é inerente ao jovem, que tem prazer em compreender a origem dos fenômenos e como se dá a produção de conhecimentos sobre os mesmos. Essa curiosidade é ainda mais estimulada quando são abordadas tecnologias avançadas e relacionadas com pesquisa científica. Sabemos que as metodologias de ensino tradicional, baseadas em processos de aprendizagem mecânica e de memorização, são aquelas que desestimulam a curiosidade natural, criando o desinteresse dos(as) alunos(as) em estudar tópicos relacionados com as ciências exatas, por exemplo. Assim, surge a motivação em utilizar o Sol como objeto de estudo e propor neste artigo atividades práticas relacionadas com o espectro eletromagnético e a radiação de corpo negro.

Para analisar a atual situação das atividades e/ou sequências didáticas disponíveis para os(as) professores(as) do ensino médio, foi feito um levantamento bibliográfico e percebeu-se que há grandes esforços em utilizar o tema Sol dentro da sala de aula, principalmente nos anos finais do ensino médio. Foram encontrados trabalhos sobre potência do Sol, efeito estufa e o aquecimento global [11[11] M.A. Rodrigues, HOLOS 1, e5442 (2020)., 12[12] R.S.R. Rodrigues e J.G. Carlos, Caminho Aberto: Revista de extensão do IFSC 6, 15 (2019).], física moderna com foco em espectroscopia, radiação de corpo negro e modelos atômicos [13[13] F.B. Santana e P.J.S. dos Santos, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 34, 555 (2017)., 14[14] P.C. Junior, A. Cristina e C.C. Silva, Enseñanza de las ciencias: revista de investigación y experiencias didácticas, 786 (2013)., 15[15] P.D.C. Junior e C.C. Silva, em: VIII Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciência – ENPEC (Campinas, 2011)., 16[16] S.M. Silva, Uma experiência de inserção de astronomia e física moderna no ensino médio a partir do sol . Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal (2015)., 17[17] F.F. Guimarães, Proposta de sequência didática para o estudo da radiação do corpo negro no ensino médio . Dissertação de Mestrado, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Campo Mourão (2018).] e por fim estrelas de forma mais geral, com menções ao Sol sendo sempre utilizado como exemplo básico e conhecido [18[18] J.E. Horvath, Revista Brasileira de Ensino de Física 35, 4501 (2013)., 19[19] G.F. Marranghello e D.B. Pavani, A Física na escola 12, 20 (2011).]. Os artigos em geral apresentam bons indicadores teóricos para que o(a) professor(a) realize as atividades propostas, porém nenhum dos artigos aqui mencionados trazem atividades que visam a análise das características do Sol.

Foi considerando todo esse contexto que a atividade proposta nesse artigo foi criada. O(A) professor(a) então terá subsídios para colocar seus(suas) alunos(as) para refletirem, analisarem e discutirem em grupos sobre o tema proposto. Assim, o(a) aluno(a) terá os conteúdos que fazem parte do currículo do terceiro ano do ensino médio, como ondas eletromagnéticas e radiação de corpo negro, como também terá acesso a uma atividade prática sobre um assunto pouco discutido nos anos finais da educação básica, mas muito relevante para o conhecimento em geral.

Além da aplicação na última etapa da educação básica, o(a) professor(a) poderá utilizar esse material para a criação de projetos dos chamados itinerários formativos que são previstos pela BNCC [29[29] http://basenacionalcomum.mec.gov.br, acessado em 07/12/2020.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br...
].

O artigo é subdividido da seguinte forma: a Seção2 2. Desenvolvimento das Atividades A atividade proposta nesse artigo tem como base algumas estratégias de ensino e aprendizagem ativa e significativa [5, 6] discutida na Seção1. Segundo Vygotsky [20], a apropriação de conhecimentos e habilidades se dá por meio da interação entre estudantes. Além disso, o desenvolvimento cognitivo depende do contexto em que o indivíduo está inserido [21]. As habilidades em trabalhos grupais são fundamentais, advindas do desenvolvimento da inteligência relacional [6], ou seja “a capacidade de os indivíduos serem competentes na interação com outros seres humanos no contexto grupal onde atuam” [22]. Justifica-se também o uso da pesquisa científica e tecnologia de ponta como forma de estímulo ao aprendizado, visando combater o mecanicismo e promover a interpretação, a espontaneidade e a auto-organização [23]. Seguindo tais marcos teóricos, dentre as diversas estratégias de ensino-aprendizagem [24, 25, 26, 27, 28] compiladas por Anastasiou [6], adotamos duas: “estudo dirigido” e “ensino com pesquisa”, que mais se aproximam dos objetivos a serem alcançados no presente trabalho. Tais metodologias podem ser aplicadas, mediadas pelo(a) professor(a), por meio de trabalho em equipe a partir de uma atividade de análise, construída conforme algumas competências, como o desenvolvimento de ideias a partir de reflexões, argumentação oral e escrita, capacidade analítica e de síntese, utilizando para este fim, análises por comparação, leitura e interpretação de texto. Com essas competências, a atividade visa que o(a) estudante tenha uma base geral para uma discussão fundamentada e argumentativa sobre não somente a estrutura solar, mas também sobre os comprimentos de onda no qual o Sol pode ser estudado, os satélites capazes de receber essas informações (espectro eletromagnético) e por fim sobre o ciclo solar, percebendo que para determinados momentos do ciclo, o Sol pode nos apresentar diferentes estados, como por exemplo, número de manchas solares. A atividade proposta também está alinhada à BNCC, focada principalmente na Competência 3 apresentada abaixo: Investigar situações-problema e avaliar aplicações do conhecimento científico e tecnológico e suas implicações no mundo, utilizando procedimentos e linguagens próprios das Ciências da Natureza, para propor soluções que considerem demandas locais, regionais e/ou globais, e comunicar suas descobertas e conclusões a públicos variados, em diversos contextos e por meio de diferentes mídias e tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC) [29]. Utilizando especificamente as seguintes habilidades: (EM13CNT301) Construir questões, elaborar hipóteses, previsões e estimativas, empregar instrumentos de medição e representar e interpretar modelos explicativos, dados e/ou resultados experimentais para construir, avaliar e justificar conclusões no enfrentamento de situações-problema sob uma perspectiva científica [29]. (EM13CNT302) Comunicar, para públicos variados, em diversos contextos, resultados de análises, pesquisas e/ou experimentos, elaborando e/ou interpretando textos, gráficos, tabelas, símbolos, códigos, sistemas de classificação e equações, por meio de diferentes linguagens, mídias, tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC), de modo a participar e/ou promover debates em torno de temas científicos e/ou tecnológicos de relevância sociocultural e ambiental [29]. (EM13CNT303) Interpretar textos de divulgação científica que tratem de temáticas das Ciências da Natureza, disponíveis em diferentes mídias, considerando a apresentação dos dados, tanto na forma de textos como em equações, gráficos e/ou tabelas, a consistência dos argumentos e a coerência das conclusões, visando construir estratégias de seleção de fontes confiáveis de informações [29]. A atividade começa contemplando as habilidades EM13CNT301 e EM13CNT303 onde os grupos deverão fazer uma leitura e interpretação de um texto de divulgação científica que está disponível no início do roteiro da atividade. A partir dessa leitura os grupos analisarão por inspeção visual as imagens que revelam diferentes características do Sol, chegando em algumas possíveis conclusões utilizando como base um questionário. Já a habilidade EM13CNT302 foi contemplada ao final da atividade, onde cada grupo deverá elaborar um texto do tipo Divulgação Científica, apresentando as descobertas feitas e discutidas com os colegas do grupo e da turma. A atividade proposta foi dividida em duas partes, com objetivos distintos mas, interligados. A Parte I tem como objetivo entender as diferentes camadas do Sol, por meio de inspeção visual de imagens observadas em três faixas espectrais. Essa parte da atividade pode ser aplicada no Terceiro Ano do Ensino Médio como revisão de ondas eletromagnéticas para que o(a) professor(a) tenha subsídios para iniciar os conteúdos de Física Moderna. Já a Parte II da atividade tem como objetivo entender a relação entre a temperatura de uma estrela e em qual comprimento de onda ocorre o máximo da emissão de luz. Além de propor a resolução de problemas relacionados com a cor das estrelas e sua relação com a temperatura, são sugeridas outras aplicações, tais como determinação do fluxo estelar e a quantização de energia. Essa parte da atividade também pode ser aplicada para o Terceiro Ano do Ensino Médio no conteúdo sobre radiação de corpo negro. Buscou-se para esse artigo materiais que fossem acessíveis para qualquer tipo de escola, seja ela pública ou privada. A escolha do uso das figuras foi pensada para que o maior número de professores(as) possam utilizar como recurso didático dentro da sala de aula, sem a necessidade de se preocuparem com direitos autorais (pelo uso das imagens). Zabala, em seu livro “A prática educativa” [8], apresenta uma reflexão que mostra a importância desse tipo de recurso na hora da escolha de um livro didático ou de uma sequência didática. “As imagens estáticas, […], são úteis como suporte para as exposições dos professores e úteis como complemento esclarecedor de muitas das ideias que se querem comunicar, tanto através de esquemas como imagens ou ilustrações que ajudem na elaboração e na construção de conceitos, assim, como para a exposição das fases de determinados conteúdos procedimentais. São instrumentos que facilitam o diálogo em classe e ajudam a centrar a atenção do grupo com relação a um objeto de estudo comum. Também são instrumentos para a criação de formas expressivas e comunicativas, que os alunos podem utilizar em suas exposições em aula [8].” Além do uso de imagens, os recursos computacionais facilitam o aprendizado do(a) aluno(a), principalmente quando o assunto não é viável em uma experimentação mais palpável. “Os programas de computador podem exercer uma função inestimável como suporte para qualquer trabalho de simulação de processos que, por suas características, podem ser perigosos ou cuja realização pode ser complexa [8].” O uso de recursos tecnológicos, também faz parte de algumas habilidades da BNCC e para que isso seja implementado nas atividades práticas sugeridas, desenvolvemos um código que calcula e apresenta graficamente a curva de radiação de corpo negro, de forma comparativa entre o Sol e estrelas de diferentes temperaturas. Apresenta-se a seguir alguns tópicos que foram utilizados como base teórica para a criação da atividade proposta nesse artigo. Esses tópicos foram organizados não somente com o foco voltado ao currículo comum do terceiro ano do ensino médio, como em livros didáticos, mas principalmente para o entendimento do(a) professor(a) para uma aplicação eficaz da atividade dentro da sala de aula. Conforme notado por Horvath [30], são raras as ocasiões em que educadores são expostos de forma aprofundada à Física envolvida nos temas de Astronomia, sendo de interesse a produção de materiais que contribuam para sua formação continuada. apresenta a motivação em se desenvolver a atividade proposta, alinhada com algumas das competências e habilidades previstas na BNCC. Para fornecer aos(às) professores(as) um embasamento dos conceitos básicos relacionados com o tema de estudo do presente trabalho, na Seção3 3. Princípios físicos envolvidos na atmosfera e no interior solar A radiação de corpo negro, expressa pela Função de Planck, fornece uma boa aproximação para representar a emissão estelar. Na Seção3.1 apresentamos a função de Planck e sua relação com os conceitos abordados na atividade proposta neste trabalho. A eficiência da transferência de energia por radiação depende da opacidade, em função da estrutura do interior estelar, ou seja, se é convectivo ou radiativo. Algumas das características do interior e da atmosfera de estrelas semelhantes ao Sol, com enfoque nos processos de convecção e efeitos do campo magnético, são abordadas nas Seções3.2 e 3.3 para descrever as características observáveis em diferentes faixas espectrais, tais como granulação e manchas solares, por exemplo. São características que também se relacionam com o ciclo de atividade solar discutido na Seção3.4. 3.1. Radiação estelar O que se observa na superfície solar está relacionado com a forma em que a energia, produzida em seu interior por processos nucleares, é transportada para o exterior estelar. Devido à opacidade no interior da estrela, os fótons realizam caminhos aleatórios em sucessivas colisões e espalhamentos através do conteúdo estelar (elétrons e partículas de gás). Os fótons escapam da estrela graças a uma tendência do caminho direcionado para fora, que é devida ao gradiente de pressão de radiação. A pressão total de radiação produzida por fótons em todos comprimentos de onda (λ) depende da radiação de corpo negro, expressa pela função de Planck: (1) B λ ⁢ ( T ) = 2 ⁢ h ⁢ c 2 λ 5 ⁢ [ e h ⁢ c λ ⁢ k ⁢ T - 1 ] - 1 , onde c=2,9979×108⁢m⁢s-1 é a velocidade da luz, h=6,6262×10-34⁢J⁢s é a constante de Planck e k=1,38062×10-23⁢J⁢K-1 é a constante de Boltzmann. É interessante notar que o termo h⁢cλ que aparece na exponencial da Eq. (1) define a energia mínima de uma onda eletromagnética de frequência f, conhecida por quantum de energia: E = hf. A função de Planck fornece uma estimativa do brilho estelar em função da temperatura da estrela e do comprimento de onda (vide Fig. 1). Considerando um corpo negro de temperatura T e elemento de área superficial (dA), a quantidade de energia radiante por unidade de tempo, em um intervalo de comprimento de onda (dλ), atravessando o ângulo sólido (dΩ) é expressa por: Figura 1: Curva da Função de Planck obtida para o Sol, indicando que seu máximo de emissão ocorre na faixa do visível. Para comparação, é apresentada a curva para uma estrela mais quente e outra mais fria. (2) B λ ⁢ ( T ) ⁢ d ⁢ λ ⁢ d ⁢ A ⁢ c ⁢ o ⁢ s ⁢ θ ⁢ d ⁢ Ω . em unidades de W m-2 nm-1 sr-1 , onde cosθ indica a direção de radiação1. Para obtenção da luminosidade da estrela de raio R realiza-se a integral da Eq. (2) em toda superfície estelar e em todas as direções, o que leva a: (3) L λ ⁢ d ⁢ λ = 4 ⁢ π 2 ⁢ R 2 ⁢ B λ ⁢ ( T ) ⁢ d ⁢ λ . Assim, a luminosidade é uma característica intrínseca da estrela, dependendo apenas de sua temperatura e seu raio. Por outro lado, o fluxo monocromático de radiação coletado a uma dada distância (d) é obtido pela lei do inverso do quadrado da distância, na qual a luminosidade é divida pela área de uma esfera de raiod: (4) F λ ⁢ d ⁢ λ = L λ ⁢ d ⁢ λ 4 ⁢ π ⁢ d 2 = π ⁢ ( R 2 d 2 ) ⁢ B λ ⁢ ( T ) ⁢ d ⁢ λ . Para estimar o fluxo total de radiação, integramos a função de Planck em todos os comprimentos de onda: (5) B ⁢ ( T ) = ∫ B λ ⁢ ( T ) ⁢ d λ = σ ⁢ T 4 π , onde σ=5,67×10-8⁢W⁢m-2⁢K-4 é a constante de Stefan-Boltzmann. Desta forma temos o fluxo dado por: (6) F = ( R d ) 2 ⁢ σ ⁢ T 4 , nas unidades de W m-2. Aplicando a Eq. (6) para os dados R = 6,9598 ×108 m (raio do Sol, R⊙), e d = 1,49598 ×1011 m = 1 ua (unidade astronômica), que corresponde à distância entre a Terra e o Sol, temos uma expressão para a irradiância solar total (TSI) incidente na Terra. Rodríguez Gómez et al. [31] e Carlesso et al. [32] apresentam os conceitos básicos relacionados com a radiação solar e seus impactos na Terra. O monitoramento da TSI, como por exemplo do SORCE/TIM2, apresentado por Kopp [33], mostra variações correlacionadas com o ciclo de atividade solar. A temperatura da superfície solar, também chamada temperatura efetiva (Te⁢f), pode ser estimada partir da Eq. (6), em função do valor da TSI. Por exemplo, Te⁢f= 5770 K foi estimada por Cahalan et al. [35] adotando F = TSI = 1360,8 W m-2[36]. Nos cálculos de modelos solares, Bahcall et al. [37] adotam F = 1369 W m-2, que corresponde à luminosidade solar L=⊙3,844×1026 W e temperatura Te⁢f = 5780 K. Para simplificar os cálculos, vamos adotar T∼e⁢f 5800 K em uma importante aplicação que relaciona cor e temperatura estelar, um dos conceitos abordados na atividade proposta no presente trabalho. Trata-se da lei de Wien, utilizada para estimar a região espectral onde ocorre o pico de máxima intensidade. Esse pico é determinado quando a derivada da função de Planck é nula: d⁢Bλ⁢(T)d⁢λ=0, que leva à solução: (7) λ m ⁢ a ⁢ x ⁢ T = 0 , 002897755 ⁢ m ⁢ K . Para ilustrar a aplicação da lei de Wien, utilizando o Sol como exemplo, vamos calcular o comprimento de onda λm⁢a⁢x em ocorre o seu máximo de emissão. Utilizando a Eq. (7) de forma aproximada, tem-se que: λ m ⁢ a ⁢ x . = 0 , 0029 ⁢ ( m ⁢ K ) T ⁢ ( K ) λ m ⁢ a ⁢ x . = 0 , 0029 5800 ⁢ ( m ) λ m ⁢ a ⁢ x . ≈ 5 × 10 - 7 ⁢ m ≈ 500 ⁢ n ⁢ m . Logo, é possível perceber que para essa temperatura, o Sol tem seu pico de emissão em um comprimento de onda aproximadamente igual a 500 nm, conforme ilustrado na Fig. 1, onde são também comparadas as curvas da função de Planck para outras estrelas, uma mais fria e outra mais quente que o Sol. Nota-se que o pico de emissão é mais alto para a estrela mais quente e deslocado para a região do azul no espectro. No caso da estrela mais fria, o máximo de emissão é menos intenso e ocorre na região do vermelho. No Apêndice A são descritas as ferramentas computacionais sugeridas para os(as) professores(as) reproduzirem a Fig. 1 para diversas temperaturas estelares. 3.2. Processo de convecção A estrutura em camadas distribuídas no interior das estrelas depende de sua massa e das condições físicas, como densidade e temperatura. No caso das estrelas de massa semelhante à do Sol, o núcleo é radiativo e o envoltório é convectivo. Para melhor entender a forma que a energia, gerada no núcleo estelar, é transportada para fora, devemos relembrar os conceitos de termodinâmica, que estabelecem um critério para o início da convecção no interior da estrela. A condição necessária para que a convecção seja mais dominante que a radiação nas regiões profundas da estrela é que o gradiente de temperatura se torne maior do que a variação dT/dr no caso adiabático. Esta é a condição em que uma “bolha” de gás quente continuará a subir, em vez de voltar a descer, depois de ter se deslocado para cima. Com base em modelos estelares (por exemplo [38], [39]) e adotando as condições físicas da região central do Sol (dados de [37]), estima-se que atualmente o Sol é puramente radiativo abaixo de r∼0,7⁢R⊙, como ilustrado na Fig. 2. A explicação física para isso é a opacidade na parte mais externa do Sol, que é alta o suficiente para inibir o transporte de energia por radiação. A Fig. 2 também destaca os detalhes que apresentam o movimento do gás quente ascendente e do gás frio descendente nas células de convecção. A aparência granular da fotosfera solar é devida à ocorrência destas células de convecção, cujo topo é brilhante (gás quente) e as bordas escuras (gás frio que desce pelas bordas da célula). Figura 2: Esquema da estrutura interna do Sol, indicando o raio estimado que define o núcleo central, onde ocorrem as reações termonucleares, e as camadas que estabelecem as zonas de radiação e de convecção. Detalhes da superfície granular e as células de convecção são mostrados no lado esquerdo do painel B. 3.3. Características da fotosfera e da cromosfera solar Quando os fótons produzidos no interior estelar chegam à superfície, eles escapam para o espaço atravessando livremente a primeira camada externa do Sol, chamada fotosfera. Como pode ser visto na Fig. 3, o início desta região é definido quando o gás torna-se menos opaco que no interior estelar, expresso pela profundidade óptica3 τλ< 1. Figura 3: A espessura das camadas da atmosfera solar. Adaptado de [40]. Na fotosfera se observa a granulação solar, formada por pequenas (diâmetros ∼ 700 km) regiões brilhantes contornadas por regiões escuras. O aspecto granular se deve a essas regiões transitórias, que desaparecem em cerca de 5 a 10 minutos, correspondendo ao topo das células convectivas. As manchas solares são características típicas da fotosfera solar. Elas aparecem mais escuras, por se tratarem de regiões mais frias, onde ocorre inibição da emissão de fótons, devido à concentração de linhas de campo magnético. Neste caso, as manchas solares ocorrem em grupos e aos pares, associados aos polos magnéticos, acompanhando a direção da rotação do Sol. É o movimento de cargas no interior da estrela que causa o efeito dínamo e produz o campo magnético neste caso (vide ilustração na Fig. 4). Figura 4: Esquema descrevendo de forma geral o campo magnético no Sol. As linhas tracejadas indicam o campo de um perfeito dipolo magnético. Adaptado de [40]. Na Fig. 5 temos um exemplo de mancha solar observada na fotosfera. Estas estruturas têm em média um diâmetro de 10000 km, ou seja, quase 2 vezes o diâmetro da Terra. A aparência da estrutura filamentar observada na penumbra (região menos escura ao redor da mancha) indica a presença das linhas de campo magnético. Figura 5: Imagem de mancha solar e simulações da distribuição de campo magnético ao seu redor, com base nos dados do Swedish 1-m Solar Telescope [42]. Adaptado de [41]. A confirmação da existência de fortes campos magnéticos associados às manchas solares é obtida pela observação das linhas espectrais que aparecem subdivididas pelo efeito Zeeman. Essa subdivisão das linhas, aparecendo em comprimentos de onda levemente deslocados, se deve aos fótons produzidos quando há transição de elétrons entre sub-níveis atômicos degenerados, que foram alterados pela presença de campo magnéticos, adquirindo pequenas variações de energia. Os painéis do centro e da direita na Fig. 5 mostram simulações indicando intensidade e direção do campo magnético, com base no efeito Zeeman observado na linha de Fe em 617,3 nm, que são resultados do estudo de Solanki et al. [41]. A camada localizada acima da fotosfera é chamada cromosfera, que se estende por cerca de 1600 km. A densidade diminui por um fator de 104, enquanto que a temperatura aumenta a partir de 4400 K até atingir 10000 K. Estas condições físicas são favoráveis para a formação de linhas espectrais que não são produzidas nas baixas temperaturas e altas densidades da fotosfera. Destacam-se as linhas do hidrogênio da série de Balmer, como Hα (656,28 nm) por exemplo, cuja predominância favorece o aspecto avermelhado observado na cromosfera, notado mais facilmente no início ou no final de eclipse total do Sol. Com um filtro adequado para restringir apenas a passagem de fótons da emissão Hα é possível notar importantes sub-estruturas da cromosfera, como a supergranulação, em escala muito maior (30000 km) que a observada na fotosfera, além de, por exemplo, os filamentos verticais transitórios, chamados espículos, através dos quais ocorre movimento de material. 3.4. Atividade solar Embora as complexas características observadas na atmosfera solar sejam transientes, muitas delas correspondem a fenômenos relacionados a mudanças no campo magnético global do Sol e seus ciclos de atividade. O evento eruptivo, conhecido como flare (ou clarão) solar, ocorre na forma de ejeção de partículas carregadas (raios cósmicos) em função de perturbações nos arcos formados pelas linhas de campo magnético e um mecanismo que envolve alta produção de energia associada com a reconexão das linhas magnéticas. Além dos flares , outro evento eruptivo (ou de atividade) é conhecido como proeminência solar, que está relacionado à uma instabilidade do arco magnético, mas em vez de emissão de radiação refere-se a movimento de massa, na forma de gás sendo ejetado do Sol. A intensidade dos flares e das proeminências cresce com a maior atividade solar, assim como o aumento do número de manchas solares. O acompanhamento das contagens do número de manchas tem sido realizado desde os tempos de Galileo, permitindo a identificação do ciclo solar de 11 anos, bem como um ciclo de inversão de polos do campo magnético a cada período de 22 anos, sempre ocorrendo durante um mínimo de atividade (menos contagens de manchas solares). A variação do número de manchas solares4, observadas no período de 1995 a 2019, é apresentada na Fig. 6, na qual é possível notar no ciclo 23 uma média de cerca de 180 manchas contadas nos meses de máxima atividade, enquanto que no ciclo 24 o máximo está em torno de 100. A previsão do comportamento da atividade solar para o ciclo 25, que se iniciou em dezembro de 2019, é estimado a partir de diferentes tipos de simulações e estudos estatísticos, tais como [43, 44, 45], dentre os mais recentes. Figura 6: Número de manchas solares observadas nos ciclos de atividade solar 23 e 24, indicando as medidas a cada mês (azul) e os valores médios (preto). De acordo com as previsões, o ciclo 25 (linha amarela) tem máximo esperado para julho de 2025. Adaptado da imagem disponibilizada pelo Space Weather Prediction Center/NOAA. são resumidas as principais características físicas das estruturas interna e externa do Sol. A Seção4 4. Estudando o Sol em diferentes comprimentos de onda Toda informação proveniente do Universo é obtida a partir de instrumentos próprios para coletar as diferentes formas de radiação. Esses instrumentos estão associados à análise de determinados comprimentos de onda, fornecendo-nos informações específicas das condições físicas dos astros, como por exemplo nas diferentes camadas do Sol. A Fig. 7 apresenta as imagens do Sol em várias faixas do espectro eletromagnético, sendo possível observar diversas características solares discutidas na Seção3. Para ilustrar o máximo de atividade solar que ocorreu mais recentemente (ciclo 24), foram selecionadas as imagens obtidas pelo satélite SDO (Solar Dynamics Observatory) com os instrumentos AIA (Atmospheric Imaging Assembly) operando em três diferentes comprimentos de onda do ultravioleta [46]; HMI (Helioseismic and Magnetic Imager) para detecção na faixa do visível [47, 48]; e GNH (Global High Resolution H-alpha Network)5 para mapeamento da emissão Hα. Para tais imagens, disponibilizadas pelo grupo de Física Solar do Trinity College Dublin6 são indicadas as regiões ativas identificadas pelo NOAA Space Weather Prediction Center . O painel (f) da Fig. 7 corresponde a uma imagem obtida no infravermelho próximo (λ=1,083⁢μm) pelo NSO (National Solar Observatory at Kitt Peak)7. Essa imagem no infravermelho foi obtida no ciclo 23, o que explica as diferenças na distribuição de regiões ativas com relação aos painéis (a)-(e). Figura 7: Imagens do Sol em diferentes faixas do espectro eletromagnético obtidas pelo satélite SDO em 03/4/2014 com os instrumentos AIA (imagens a, b e c); HMI (d) e GNH (e). Os números anotados sobre as imagens identificam 12 regiões ativas. A imagem (f) foi obtida pelo NSO, em 05/02/2002. O SOHO (Solar and Heliospheric Observatory) e o Hinode são duas missões que foram enviadas para estudar o Sol em detalhes. A partir do SOHO e do Hinode foi possível obter as imagens fornecidas na atividade de análise proposta nesse trabalho que se encontram no Apêndice C. A nave espacial SOHO é uma missão com consórcio entre a NASA e a Agência Espacial Europeia (ESA), que tem como um dos objetivos investigar as camadas mais externas da atmosfera solar, como a Fotosfera, a Cromosfera e a Coroa Solar. O SOHO possui 12 instrumentos de observação diferentes, que trabalham independentes, onde dois deles são de particular interesse para este artigo: o MDI8 (Michelson Doppler Imager) e o EIT (Extreme Ultraviolet Imaging) [49]. Já o Hinode é um satélite que possui colaboração entre as agências espaciais do Japão (JAXA), Estados Unidos (NASA) e Europa (ESA) além do Particle Physics and Astronomy Research Council (PPARC) do Reino Unido. Esse satélite tem como principal objetivo estudar os campos magnéticos solares afim de entender melhor as erupções solares. Para isso, possui três instrumentos de observação e análise sendo um deles o XRT (X-Ray Telescope) [51]. Embora os princípios físicos que envolvem as emissões de altas energias, em particular relacionadas à coroa solar, sejam diferentes dos conceitos básicos apresentados na Seção3, as observações em raios-X são incluídas aqui de forma ilustrativa, para demonstrar que a radiação solar ocorre em todas as frequências de ondas eletromagnéticas, revelando diferentes características relacionadas a uma ampla faixa de energias envolvidas. descreve as diferentes missões espaciais e os aspectos relacionados ao espectro eletromagnético e a radiação de corpo negro explorados na atividade prática proposta. Finalmente, as conclusões são discutidas na Seção5 5. Considerações Finais Este artigo mostra uma forma de apresentar os conteúdos de ondas eletromagnéticas e de radiação de corpo negro, utilizando como objeto de estudo o Sol. As atividades foram pensadas com foco na determinação de características estelares, como cor, temperatura e fluxo emitido, usando ferramentas computacionais gráficas, cálculos, comparações com tabelas, e análise visual de imagens fornecidas pelo(a) professor(a), trazendo dessa forma competências e habilidades da BNCC que são importantes para serem desenvolvidas dentro de sala de aula. O intuito principal da atividade é que os alunos e alunas trabalhem de forma colaborativa, aprendendo em conjunto, conteúdos que normalmente são abstratos na educação básica, trazendo motivação e entusiasmo, juntamente com a produção e educação científica. Além disso, espera-se motivar os professores a reverem conceitos básicos relacionados ao Sol, de forma a compreender os processos físicos que explicam as diferentes características solares observadas em diferentes faixas espectrais. O material de apoio está dividido em três partes. O Apêndice A é dedicado à atividade computacional, com o código desenvolvido no presente trabalho para gerar o gráfico da curva de corpo negro, com uso alternativo de linguagem de programação e de software. O Apêndice B contém a atividade que deve ser entregue para os(as) alunos(as) e o Apêndice C, o Gabarito da mesma atividade, incluíndo as imagens a serem analisadas. Uma versão online destes dois apêndices está disponível na formatação adequada para impressão e uso em sala de aula. , e três apêndices são dedicados ao fornecimento de material de apoio.

2. Desenvolvimento das Atividades

A atividade proposta nesse artigo tem como base algumas estratégias de ensino e aprendizagem ativa e significativa [5[5] O. Reboul, O Que É Aprender (Livraria Almedina, Coimbra, 1982)., 6[6] L.G.C. Anastasiou e L.P. Alves, Processos de ensinagem na universidade: pressupostos para as estratégia de trabalho em sala de aula (Ed. Uninville, Joinville, 2007).] discutida na Seção1 1. Introdução Por muitas vezes os(as) alunos(as) perdem a motivação de determinado assunto, pois não conseguem relacioná-lo com o cotidiano ou com o futuro profissional que almejam. Segundo o livro “A sala de aula inovadora: estratégias pedagógicas para fomentar o aprendizado ativo”, de Fausto Camargo e Thuinie Daros [1], nos traz uma reflexão sobre o tema. “Se os alunos conseguem estabelecer relações entre o que aprendem no plano intelectual e as situações reais, experimentais e profissionais ligadas a seus estudos, certamente a aprendizagem será mais significativa e enriquecedora [1].” De acordo com a reflexão acima, e seguindo a proposta de Ausubel [2], a base da aprendizagem significativa está fundamentada na conexão entre o conhecimento prévio do(a) aluno(a) e o novo conteúdo a ser assimilado, de forma que o processo de aquisição de conhecimento seja dinâmico [3, 4]. Nesse sentido, a contextualização é necessária para evitar um aprendizado mecânico, no qual as informações são memorizadas, como no exemplo em que o aluno aprendeu a usar uma fórmula, mas não compreendeu o sentido de realizar uma dada operação matemática [5]. Com esse argumento, Anastasiou [6] sugere que se tenha em mente a diferença entre as ações de “aprender” (que significa tomar conhecimento) e “apreender” que está relacionada com segurar, entender e compreender. Segundo a autora, “para apreender é preciso agir, exercitar-se, informar-se, tomar para si, apropriar-se, entre outros fatores …”. É a partir deste conceito básico teórico que se justifica a importância da aprendizagem ativa e significativa. Os(As) professores(as) por outro lado, buscam incessantemente diferentes formas para atribuir sentido ao que se é dado em sala de aula e ao mesmo tempo cumprir o projeto pedagógico e os conteúdos dos livros didáticos disponibilizados pela escola. Os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (PCN) para a área de Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias, traz uma reflexão sobre o assunto: “É preciso rediscutir qual Física ensinar para possibilitar uma melhor compreensão do mundo e uma formação para a cidadania mais adequada. Sabemos todos que, para tanto, não existem soluções simples ou únicas, nem receitas prontas que garantam o sucesso. Essa é a questão a ser enfrentada pelos educadores de cada escola, de cada realidade social, procurando corresponder aos desejos e esperanças de todos os participantes do processo educativo, reunidos através de uma proposta pedagógica clara [7].” No contexto das realidades do(a) professor(a) e do(a) aluno(a), é necessário pensar em novas possibilidades dentro da sala de aula. Segundo Zabala [8], é interessante que o(a) professor(a) monte situações didáticas que coloquem o(a) aluno(a) como protagonista de seu aprendizado, mesmo que sua aula ainda tenha uma base no conteúdo previsto pelo currículo escolar, porém com um significado intrínseco baseado na realidade de cada aluno(a), não apenas nomes, fórmulas e regras para serem memorizadas e sim um conteúdo interconectado com seu cotidiano. Nesse formato, o(a) professor(a) deve sair do papel de controlador do saber, para assumir um papel ainda mais desafiador e importante para a aprendizagem, o de mediador, orientando seus(suas) alunos(as) nos diversos caminhos que podem ser traçados dentro de uma determinada atividade. Para isso o(a) professor(a) deve ter conhecimento básico em relação ao assunto da atividade que será colocada em prática em sala de aula, pois assim terá autonomia para a escolha de recursos didáticos baseados na realidade escolar de seus(suas) alunos(as) e nos seus interesses, de forma a ser flexível quando necessário [8, 9, 10]. O Sol é a estrela mais conhecida por nós, não somente pelo fato que nosso sistema planetário é regido por ele, mas também por ser responsável pela vida e energia do nosso planeta. Fenômenos como auroras boreais e austrais são ligadas diretamente com a atividade solar, assim como análises de variações de temperatura da Terra, além das interferências nas comunicações. Tratam-se de temas de impacto no cotidiano, tornando as pesquisas voltadas para o Sol cada vez mais específicas e que dependem de tecnologia de ponta. Pela proximidade com temas da atualidade, o estudo do Sol se configura em uma excelente contextualização para a aprendizagem significativa por meio de um processo dinâmico. Além disso, como se pode constatar durante as aulas de Ciências da Natureza, a curiosidade é inerente ao jovem, que tem prazer em compreender a origem dos fenômenos e como se dá a produção de conhecimentos sobre os mesmos. Essa curiosidade é ainda mais estimulada quando são abordadas tecnologias avançadas e relacionadas com pesquisa científica. Sabemos que as metodologias de ensino tradicional, baseadas em processos de aprendizagem mecânica e de memorização, são aquelas que desestimulam a curiosidade natural, criando o desinteresse dos(as) alunos(as) em estudar tópicos relacionados com as ciências exatas, por exemplo. Assim, surge a motivação em utilizar o Sol como objeto de estudo e propor neste artigo atividades práticas relacionadas com o espectro eletromagnético e a radiação de corpo negro. Para analisar a atual situação das atividades e/ou sequências didáticas disponíveis para os(as) professores(as) do ensino médio, foi feito um levantamento bibliográfico e percebeu-se que há grandes esforços em utilizar o tema Sol dentro da sala de aula, principalmente nos anos finais do ensino médio. Foram encontrados trabalhos sobre potência do Sol, efeito estufa e o aquecimento global [11, 12], física moderna com foco em espectroscopia, radiação de corpo negro e modelos atômicos [13, 14, 15, 16, 17] e por fim estrelas de forma mais geral, com menções ao Sol sendo sempre utilizado como exemplo básico e conhecido [18, 19]. Os artigos em geral apresentam bons indicadores teóricos para que o(a) professor(a) realize as atividades propostas, porém nenhum dos artigos aqui mencionados trazem atividades que visam a análise das características do Sol. Foi considerando todo esse contexto que a atividade proposta nesse artigo foi criada. O(A) professor(a) então terá subsídios para colocar seus(suas) alunos(as) para refletirem, analisarem e discutirem em grupos sobre o tema proposto. Assim, o(a) aluno(a) terá os conteúdos que fazem parte do currículo do terceiro ano do ensino médio, como ondas eletromagnéticas e radiação de corpo negro, como também terá acesso a uma atividade prática sobre um assunto pouco discutido nos anos finais da educação básica, mas muito relevante para o conhecimento em geral. Além da aplicação na última etapa da educação básica, o(a) professor(a) poderá utilizar esse material para a criação de projetos dos chamados itinerários formativos que são previstos pela BNCC [29]. O artigo é subdividido da seguinte forma: a Seção2 apresenta a motivação em se desenvolver a atividade proposta, alinhada com algumas das competências e habilidades previstas na BNCC. Para fornecer aos(às) professores(as) um embasamento dos conceitos básicos relacionados com o tema de estudo do presente trabalho, na Seção3 são resumidas as principais características físicas das estruturas interna e externa do Sol. A Seção4 descreve as diferentes missões espaciais e os aspectos relacionados ao espectro eletromagnético e a radiação de corpo negro explorados na atividade prática proposta. Finalmente, as conclusões são discutidas na Seção5, e três apêndices são dedicados ao fornecimento de material de apoio. . Segundo Vygotsky [20[20] L.S. Vygotsky, A formação social da mente (Martins Fontes, São Paulo, 1988).], a apropriação de conhecimentos e habilidades se dá por meio da interação entre estudantes. Além disso, o desenvolvimento cognitivo depende do contexto em que o indivíduo está inserido [21[21] K.S. Silva e L.S Fonseca, Teorias da aprendizagem: perfis de práticas no ensino de ciências e matemática (Instituto Federal do Sergipe, Aracaju, 2019).]. As habilidades em trabalhos grupais são fundamentais, advindas do desenvolvimento da inteligência relacional [6[6] L.G.C. Anastasiou e L.P. Alves, Processos de ensinagem na universidade: pressupostos para as estratégia de trabalho em sala de aula (Ed. Uninville, Joinville, 2007).], ou seja “a capacidade de os indivíduos serem competentes na interação com outros seres humanos no contexto grupal onde atuam” [22[22] L.C. Osório, Psicologia grupal: uma nova disciplina para advento de uma nova era (Artmed, Porto Alegre, 2003).]. Justifica-se também o uso da pesquisa científica e tecnologia de ponta como forma de estímulo ao aprendizado, visando combater o mecanicismo e promover a interpretação, a espontaneidade e a auto-organização [23[23] E. Morin, Complexidade e transdisciplinaridade: a reforma da universidade e do ensino fundamental (Editora da UFRN, Natal, 2000).].

Seguindo tais marcos teóricos, dentre as diversas estratégias de ensino-aprendizagem [24[24] J.D. Bordenave, Estratégias de ensino-aprendizagem (Vozes, Petrópolis, 2001), 22ª ed., 25[25] M.A. Behrens, O paradigma emergente e a prática pedagógica (Champagnat, Curitiba, 1999)., 26[26] P. Meirieu, Aprender…sim, mas como? (Artes Médicas, Porto Alegre, 1998)., 27[27] M.T. Masetto, Competência pedagógica do professor universitário (Summus, São Paulo, 2003)., 28[28] I.P.A. Veiga, Técnicas de ensino: por que não? (Papirus, Campinas, 1991).] compiladas por Anastasiou [6[6] L.G.C. Anastasiou e L.P. Alves, Processos de ensinagem na universidade: pressupostos para as estratégia de trabalho em sala de aula (Ed. Uninville, Joinville, 2007).], adotamos duas: “estudo dirigido” e “ensino com pesquisa”, que mais se aproximam dos objetivos a serem alcançados no presente trabalho. Tais metodologias podem ser aplicadas, mediadas pelo(a) professor(a), por meio de trabalho em equipe a partir de uma atividade de análise, construída conforme algumas competências, como o desenvolvimento de ideias a partir de reflexões, argumentação oral e escrita, capacidade analítica e de síntese, utilizando para este fim, análises por comparação, leitura e interpretação de texto. Com essas competências, a atividade visa que o(a) estudante tenha uma base geral para uma discussão fundamentada e argumentativa sobre não somente a estrutura solar, mas também sobre os comprimentos de onda no qual o Sol pode ser estudado, os satélites capazes de receber essas informações (espectro eletromagnético) e por fim sobre o ciclo solar, percebendo que para determinados momentos do ciclo, o Sol pode nos apresentar diferentes estados, como por exemplo, número de manchas solares.

A atividade proposta também está alinhada à BNCC, focada principalmente na Competência 3 apresentada abaixo:

Investigar situações-problema e avaliar aplicações do conhecimento científico e tecnológico e suas implicações no mundo, utilizando procedimentos e linguagens próprios das Ciências da Natureza, para propor soluções que considerem demandas locais, regionais e/ou globais, e comunicar suas descobertas e conclusões a públicos variados, em diversos contextos e por meio de diferentes mídias e tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC) [29[29] http://basenacionalcomum.mec.gov.br, acessado em 07/12/2020.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br...
].

Utilizando especificamente as seguintes habilidades:

(EM13CNT301) Construir questões, elaborar hipóteses, previsões e estimativas, empregar instrumentos de medição e representar e interpretar modelos explicativos, dados e/ou resultados experimentais para construir, avaliar e justificar conclusões no enfrentamento de situações-problema sob uma perspectiva científica [29[29] http://basenacionalcomum.mec.gov.br, acessado em 07/12/2020.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br...
].

(EM13CNT302) Comunicar, para públicos variados, em diversos contextos, resultados de análises, pesquisas e/ou experimentos, elaborando e/ou interpretando textos, gráficos, tabelas, símbolos, códigos, sistemas de classificação e equações, por meio de diferentes linguagens, mídias, tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC), de modo a participar e/ou promover debates em torno de temas científicos e/ou tecnológicos de relevância sociocultural e ambiental [29[29] http://basenacionalcomum.mec.gov.br, acessado em 07/12/2020.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br...
].

(EM13CNT303) Interpretar textos de divulgação científica que tratem de temáticas das Ciências da Natureza, disponíveis em diferentes mídias, considerando a apresentação dos dados, tanto na forma de textos como em equações, gráficos e/ou tabelas, a consistência dos argumentos e a coerência das conclusões, visando construir estratégias de seleção de fontes confiáveis de informações [29[29] http://basenacionalcomum.mec.gov.br, acessado em 07/12/2020.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br...
].

A atividade começa contemplando as habilidades EM13CNT301 e EM13CNT303 onde os grupos deverão fazer uma leitura e interpretação de um texto de divulgação científica que está disponível no início do roteiro da atividade. A partir dessa leitura os grupos analisarão por inspeção visual as imagens que revelam diferentes características do Sol, chegando em algumas possíveis conclusões utilizando como base um questionário. Já a habilidade EM13CNT302 foi contemplada ao final da atividade, onde cada grupo deverá elaborar um texto do tipo Divulgação Científica, apresentando as descobertas feitas e discutidas com os colegas do grupo e da turma.

A atividade proposta foi dividida em duas partes, com objetivos distintos mas, interligados. A Parte I tem como objetivo entender as diferentes camadas do Sol, por meio de inspeção visual de imagens observadas em três faixas espectrais. Essa parte da atividade pode ser aplicada no Terceiro Ano do Ensino Médio como revisão de ondas eletromagnéticas para que o(a) professor(a) tenha subsídios para iniciar os conteúdos de Física Moderna. Já a Parte II da atividade tem como objetivo entender a relação entre a temperatura de uma estrela e em qual comprimento de onda ocorre o máximo da emissão de luz. Além de propor a resolução de problemas relacionados com a cor das estrelas e sua relação com a temperatura, são sugeridas outras aplicações, tais como determinação do fluxo estelar e a quantização de energia. Essa parte da atividade também pode ser aplicada para o Terceiro Ano do Ensino Médio no conteúdo sobre radiação de corpo negro.

Buscou-se para esse artigo materiais que fossem acessíveis para qualquer tipo de escola, seja ela pública ou privada.

A escolha do uso das figuras foi pensada para que o maior número de professores(as) possam utilizar como recurso didático dentro da sala de aula, sem a necessidade de se preocuparem com direitos autorais (pelo uso das imagens). Zabala, em seu livro “A prática educativa” [8[8] A. Zabala, A prática educativa: como ensinar (Penso Editora, Porto Alegre, 2015).], apresenta uma reflexão que mostra a importância desse tipo de recurso na hora da escolha de um livro didático ou de uma sequência didática.

“As imagens estáticas, […], são úteis como suporte para as exposições dos professores e úteis como complemento esclarecedor de muitas das ideias que se querem comunicar, tanto através de esquemas como imagens ou ilustrações que ajudem na elaboração e na construção de conceitos, assim, como para a exposição das fases de determinados conteúdos procedimentais. São instrumentos que facilitam o diálogo em classe e ajudam a centrar a atenção do grupo com relação a um objeto de estudo comum. Também são instrumentos para a criação de formas expressivas e comunicativas, que os alunos podem utilizar em suas exposições em aula [8[8] A. Zabala, A prática educativa: como ensinar (Penso Editora, Porto Alegre, 2015).].”

Além do uso de imagens, os recursos computacionais facilitam o aprendizado do(a) aluno(a), principalmente quando o assunto não é viável em uma experimentação mais palpável.

“Os programas de computador podem exercer uma função inestimável como suporte para qualquer trabalho de simulação de processos que, por suas características, podem ser perigosos ou cuja realização pode ser complexa [8[8] A. Zabala, A prática educativa: como ensinar (Penso Editora, Porto Alegre, 2015).].”

O uso de recursos tecnológicos, também faz parte de algumas habilidades da BNCC e para que isso seja implementado nas atividades práticas sugeridas, desenvolvemos um código que calcula e apresenta graficamente a curva de radiação de corpo negro, de forma comparativa entre o Sol e estrelas de diferentes temperaturas.

Apresenta-se a seguir alguns tópicos que foram utilizados como base teórica para a criação da atividade proposta nesse artigo. Esses tópicos foram organizados não somente com o foco voltado ao currículo comum do terceiro ano do ensino médio, como em livros didáticos, mas principalmente para o entendimento do(a) professor(a) para uma aplicação eficaz da atividade dentro da sala de aula. Conforme notado por Horvath [30[30] J.E. Horvath, Revista Brasileira de Ensino de Física 43, e20210237 (2021).], são raras as ocasiões em que educadores são expostos de forma aprofundada à Física envolvida nos temas de Astronomia, sendo de interesse a produção de materiais que contribuam para sua formação continuada.

3. Princípios físicos envolvidos na atmosfera e no interior solar

A radiação de corpo negro, expressa pela Função de Planck, fornece uma boa aproximação para representar a emissão estelar. Na Seção3.1 3.1. Radiação estelar O que se observa na superfície solar está relacionado com a forma em que a energia, produzida em seu interior por processos nucleares, é transportada para o exterior estelar. Devido à opacidade no interior da estrela, os fótons realizam caminhos aleatórios em sucessivas colisões e espalhamentos através do conteúdo estelar (elétrons e partículas de gás). Os fótons escapam da estrela graças a uma tendência do caminho direcionado para fora, que é devida ao gradiente de pressão de radiação. A pressão total de radiação produzida por fótons em todos comprimentos de onda (λ) depende da radiação de corpo negro, expressa pela função de Planck: (1) B λ ⁢ ( T ) = 2 ⁢ h ⁢ c 2 λ 5 ⁢ [ e h ⁢ c λ ⁢ k ⁢ T - 1 ] - 1 , onde c=2,9979×108⁢m⁢s-1 é a velocidade da luz, h=6,6262×10-34⁢J⁢s é a constante de Planck e k=1,38062×10-23⁢J⁢K-1 é a constante de Boltzmann. É interessante notar que o termo h⁢cλ que aparece na exponencial da Eq. (1) define a energia mínima de uma onda eletromagnética de frequência f, conhecida por quantum de energia: E = hf. A função de Planck fornece uma estimativa do brilho estelar em função da temperatura da estrela e do comprimento de onda (vide Fig. 1). Considerando um corpo negro de temperatura T e elemento de área superficial (dA), a quantidade de energia radiante por unidade de tempo, em um intervalo de comprimento de onda (dλ), atravessando o ângulo sólido (dΩ) é expressa por: Figura 1: Curva da Função de Planck obtida para o Sol, indicando que seu máximo de emissão ocorre na faixa do visível. Para comparação, é apresentada a curva para uma estrela mais quente e outra mais fria. (2) B λ ⁢ ( T ) ⁢ d ⁢ λ ⁢ d ⁢ A ⁢ c ⁢ o ⁢ s ⁢ θ ⁢ d ⁢ Ω . em unidades de W m-2 nm-1 sr-1 , onde cosθ indica a direção de radiação1. Para obtenção da luminosidade da estrela de raio R realiza-se a integral da Eq. (2) em toda superfície estelar e em todas as direções, o que leva a: (3) L λ ⁢ d ⁢ λ = 4 ⁢ π 2 ⁢ R 2 ⁢ B λ ⁢ ( T ) ⁢ d ⁢ λ . Assim, a luminosidade é uma característica intrínseca da estrela, dependendo apenas de sua temperatura e seu raio. Por outro lado, o fluxo monocromático de radiação coletado a uma dada distância (d) é obtido pela lei do inverso do quadrado da distância, na qual a luminosidade é divida pela área de uma esfera de raiod: (4) F λ ⁢ d ⁢ λ = L λ ⁢ d ⁢ λ 4 ⁢ π ⁢ d 2 = π ⁢ ( R 2 d 2 ) ⁢ B λ ⁢ ( T ) ⁢ d ⁢ λ . Para estimar o fluxo total de radiação, integramos a função de Planck em todos os comprimentos de onda: (5) B ⁢ ( T ) = ∫ B λ ⁢ ( T ) ⁢ d λ = σ ⁢ T 4 π , onde σ=5,67×10-8⁢W⁢m-2⁢K-4 é a constante de Stefan-Boltzmann. Desta forma temos o fluxo dado por: (6) F = ( R d ) 2 ⁢ σ ⁢ T 4 , nas unidades de W m-2. Aplicando a Eq. (6) para os dados R = 6,9598 ×108 m (raio do Sol, R⊙), e d = 1,49598 ×1011 m = 1 ua (unidade astronômica), que corresponde à distância entre a Terra e o Sol, temos uma expressão para a irradiância solar total (TSI) incidente na Terra. Rodríguez Gómez et al. [31] e Carlesso et al. [32] apresentam os conceitos básicos relacionados com a radiação solar e seus impactos na Terra. O monitoramento da TSI, como por exemplo do SORCE/TIM2, apresentado por Kopp [33], mostra variações correlacionadas com o ciclo de atividade solar. A temperatura da superfície solar, também chamada temperatura efetiva (Te⁢f), pode ser estimada partir da Eq. (6), em função do valor da TSI. Por exemplo, Te⁢f= 5770 K foi estimada por Cahalan et al. [35] adotando F = TSI = 1360,8 W m-2[36]. Nos cálculos de modelos solares, Bahcall et al. [37] adotam F = 1369 W m-2, que corresponde à luminosidade solar L=⊙3,844×1026 W e temperatura Te⁢f = 5780 K. Para simplificar os cálculos, vamos adotar T∼e⁢f 5800 K em uma importante aplicação que relaciona cor e temperatura estelar, um dos conceitos abordados na atividade proposta no presente trabalho. Trata-se da lei de Wien, utilizada para estimar a região espectral onde ocorre o pico de máxima intensidade. Esse pico é determinado quando a derivada da função de Planck é nula: d⁢Bλ⁢(T)d⁢λ=0, que leva à solução: (7) λ m ⁢ a ⁢ x ⁢ T = 0 , 002897755 ⁢ m ⁢ K . Para ilustrar a aplicação da lei de Wien, utilizando o Sol como exemplo, vamos calcular o comprimento de onda λm⁢a⁢x em ocorre o seu máximo de emissão. Utilizando a Eq. (7) de forma aproximada, tem-se que: λ m ⁢ a ⁢ x . = 0 , 0029 ⁢ ( m ⁢ K ) T ⁢ ( K ) λ m ⁢ a ⁢ x . = 0 , 0029 5800 ⁢ ( m ) λ m ⁢ a ⁢ x . ≈ 5 × 10 - 7 ⁢ m ≈ 500 ⁢ n ⁢ m . Logo, é possível perceber que para essa temperatura, o Sol tem seu pico de emissão em um comprimento de onda aproximadamente igual a 500 nm, conforme ilustrado na Fig. 1, onde são também comparadas as curvas da função de Planck para outras estrelas, uma mais fria e outra mais quente que o Sol. Nota-se que o pico de emissão é mais alto para a estrela mais quente e deslocado para a região do azul no espectro. No caso da estrela mais fria, o máximo de emissão é menos intenso e ocorre na região do vermelho. No Apêndice A são descritas as ferramentas computacionais sugeridas para os(as) professores(as) reproduzirem a Fig. 1 para diversas temperaturas estelares. apresentamos a função de Planck e sua relação com os conceitos abordados na atividade proposta neste trabalho.

A eficiência da transferência de energia por radiação depende da opacidade, em função da estrutura do interior estelar, ou seja, se é convectivo ou radiativo. Algumas das características do interior e da atmosfera de estrelas semelhantes ao Sol, com enfoque nos processos de convecção e efeitos do campo magnético, são abordadas nas Seções3.2 3.2. Processo de convecção A estrutura em camadas distribuídas no interior das estrelas depende de sua massa e das condições físicas, como densidade e temperatura. No caso das estrelas de massa semelhante à do Sol, o núcleo é radiativo e o envoltório é convectivo. Para melhor entender a forma que a energia, gerada no núcleo estelar, é transportada para fora, devemos relembrar os conceitos de termodinâmica, que estabelecem um critério para o início da convecção no interior da estrela. A condição necessária para que a convecção seja mais dominante que a radiação nas regiões profundas da estrela é que o gradiente de temperatura se torne maior do que a variação dT/dr no caso adiabático. Esta é a condição em que uma “bolha” de gás quente continuará a subir, em vez de voltar a descer, depois de ter se deslocado para cima. Com base em modelos estelares (por exemplo [38], [39]) e adotando as condições físicas da região central do Sol (dados de [37]), estima-se que atualmente o Sol é puramente radiativo abaixo de r∼0,7⁢R⊙, como ilustrado na Fig. 2. A explicação física para isso é a opacidade na parte mais externa do Sol, que é alta o suficiente para inibir o transporte de energia por radiação. A Fig. 2 também destaca os detalhes que apresentam o movimento do gás quente ascendente e do gás frio descendente nas células de convecção. A aparência granular da fotosfera solar é devida à ocorrência destas células de convecção, cujo topo é brilhante (gás quente) e as bordas escuras (gás frio que desce pelas bordas da célula). Figura 2: Esquema da estrutura interna do Sol, indicando o raio estimado que define o núcleo central, onde ocorrem as reações termonucleares, e as camadas que estabelecem as zonas de radiação e de convecção. Detalhes da superfície granular e as células de convecção são mostrados no lado esquerdo do painel B. e 3.3 3.3. Características da fotosfera e da cromosfera solar Quando os fótons produzidos no interior estelar chegam à superfície, eles escapam para o espaço atravessando livremente a primeira camada externa do Sol, chamada fotosfera. Como pode ser visto na Fig. 3, o início desta região é definido quando o gás torna-se menos opaco que no interior estelar, expresso pela profundidade óptica3 τλ< 1. Figura 3: A espessura das camadas da atmosfera solar. Adaptado de [40]. Na fotosfera se observa a granulação solar, formada por pequenas (diâmetros ∼ 700 km) regiões brilhantes contornadas por regiões escuras. O aspecto granular se deve a essas regiões transitórias, que desaparecem em cerca de 5 a 10 minutos, correspondendo ao topo das células convectivas. As manchas solares são características típicas da fotosfera solar. Elas aparecem mais escuras, por se tratarem de regiões mais frias, onde ocorre inibição da emissão de fótons, devido à concentração de linhas de campo magnético. Neste caso, as manchas solares ocorrem em grupos e aos pares, associados aos polos magnéticos, acompanhando a direção da rotação do Sol. É o movimento de cargas no interior da estrela que causa o efeito dínamo e produz o campo magnético neste caso (vide ilustração na Fig. 4). Figura 4: Esquema descrevendo de forma geral o campo magnético no Sol. As linhas tracejadas indicam o campo de um perfeito dipolo magnético. Adaptado de [40]. Na Fig. 5 temos um exemplo de mancha solar observada na fotosfera. Estas estruturas têm em média um diâmetro de 10000 km, ou seja, quase 2 vezes o diâmetro da Terra. A aparência da estrutura filamentar observada na penumbra (região menos escura ao redor da mancha) indica a presença das linhas de campo magnético. Figura 5: Imagem de mancha solar e simulações da distribuição de campo magnético ao seu redor, com base nos dados do Swedish 1-m Solar Telescope [42]. Adaptado de [41]. A confirmação da existência de fortes campos magnéticos associados às manchas solares é obtida pela observação das linhas espectrais que aparecem subdivididas pelo efeito Zeeman. Essa subdivisão das linhas, aparecendo em comprimentos de onda levemente deslocados, se deve aos fótons produzidos quando há transição de elétrons entre sub-níveis atômicos degenerados, que foram alterados pela presença de campo magnéticos, adquirindo pequenas variações de energia. Os painéis do centro e da direita na Fig. 5 mostram simulações indicando intensidade e direção do campo magnético, com base no efeito Zeeman observado na linha de Fe em 617,3 nm, que são resultados do estudo de Solanki et al. [41]. A camada localizada acima da fotosfera é chamada cromosfera, que se estende por cerca de 1600 km. A densidade diminui por um fator de 104, enquanto que a temperatura aumenta a partir de 4400 K até atingir 10000 K. Estas condições físicas são favoráveis para a formação de linhas espectrais que não são produzidas nas baixas temperaturas e altas densidades da fotosfera. Destacam-se as linhas do hidrogênio da série de Balmer, como Hα (656,28 nm) por exemplo, cuja predominância favorece o aspecto avermelhado observado na cromosfera, notado mais facilmente no início ou no final de eclipse total do Sol. Com um filtro adequado para restringir apenas a passagem de fótons da emissão Hα é possível notar importantes sub-estruturas da cromosfera, como a supergranulação, em escala muito maior (30000 km) que a observada na fotosfera, além de, por exemplo, os filamentos verticais transitórios, chamados espículos, através dos quais ocorre movimento de material. para descrever as características observáveis em diferentes faixas espectrais, tais como granulação e manchas solares, por exemplo. São características que também se relacionam com o ciclo de atividade solar discutido na Seção3.4 3.4. Atividade solar Embora as complexas características observadas na atmosfera solar sejam transientes, muitas delas correspondem a fenômenos relacionados a mudanças no campo magnético global do Sol e seus ciclos de atividade. O evento eruptivo, conhecido como flare (ou clarão) solar, ocorre na forma de ejeção de partículas carregadas (raios cósmicos) em função de perturbações nos arcos formados pelas linhas de campo magnético e um mecanismo que envolve alta produção de energia associada com a reconexão das linhas magnéticas. Além dos flares , outro evento eruptivo (ou de atividade) é conhecido como proeminência solar, que está relacionado à uma instabilidade do arco magnético, mas em vez de emissão de radiação refere-se a movimento de massa, na forma de gás sendo ejetado do Sol. A intensidade dos flares e das proeminências cresce com a maior atividade solar, assim como o aumento do número de manchas solares. O acompanhamento das contagens do número de manchas tem sido realizado desde os tempos de Galileo, permitindo a identificação do ciclo solar de 11 anos, bem como um ciclo de inversão de polos do campo magnético a cada período de 22 anos, sempre ocorrendo durante um mínimo de atividade (menos contagens de manchas solares). A variação do número de manchas solares4, observadas no período de 1995 a 2019, é apresentada na Fig. 6, na qual é possível notar no ciclo 23 uma média de cerca de 180 manchas contadas nos meses de máxima atividade, enquanto que no ciclo 24 o máximo está em torno de 100. A previsão do comportamento da atividade solar para o ciclo 25, que se iniciou em dezembro de 2019, é estimado a partir de diferentes tipos de simulações e estudos estatísticos, tais como [43, 44, 45], dentre os mais recentes. Figura 6: Número de manchas solares observadas nos ciclos de atividade solar 23 e 24, indicando as medidas a cada mês (azul) e os valores médios (preto). De acordo com as previsões, o ciclo 25 (linha amarela) tem máximo esperado para julho de 2025. Adaptado da imagem disponibilizada pelo Space Weather Prediction Center/NOAA. .

3.1. Radiação estelar

O que se observa na superfície solar está relacionado com a forma em que a energia, produzida em seu interior por processos nucleares, é transportada para o exterior estelar. Devido à opacidade no interior da estrela, os fótons realizam caminhos aleatórios em sucessivas colisões e espalhamentos através do conteúdo estelar (elétrons e partículas de gás). Os fótons escapam da estrela graças a uma tendência do caminho direcionado para fora, que é devida ao gradiente de pressão de radiação. A pressão total de radiação produzida por fótons em todos comprimentos de onda (λ) depende da radiação de corpo negro, expressa pela função de Planck:

(1) B λ ( T ) = 2 h c 2 λ 5 [ e h c λ k T - 1 ] - 1 ,

onde c=2,9979×108ms-1 é a velocidade da luz, h=6,6262×10-34Js é a constante de Planck e k=1,38062×10-23JK-1 é a constante de Boltzmann.

É interessante notar que o termo hcλ que aparece na exponencial da Eq. (1) define a energia mínima de uma onda eletromagnética de frequência f, conhecida por quantum de energia: E = hf.

A função de Planck fornece uma estimativa do brilho estelar em função da temperatura da estrela e do comprimento de onda (vide Fig. 1). Considerando um corpo negro de temperatura T e elemento de área superficial (dA), a quantidade de energia radiante por unidade de tempo, em um intervalo de comprimento de onda (dλ), atravessando o ângulo sólido (dΩ) é expressa por:

Figura 1:
Curva da Função de Planck obtida para o Sol, indicando que seu máximo de emissão ocorre na faixa do visível. Para comparação, é apresentada a curva para uma estrela mais quente e outra mais fria.

(2) B λ ( T ) d λ d A c o s θ d Ω .

em unidades de W m-2 nm-1 sr-1 , onde cosθ indica a direção de radiação1 1 Adotamos aqui o sistema de coordenadas esféricas em que o ângulo θ é medido com relação ao eixo perpendicular ao elemento de área dA , ou seja, à superfície estelar. . Para obtenção da luminosidade da estrela de raio R realiza-se a integral da Eq. (2) em toda superfície estelar e em todas as direções, o que leva a:

(3) L λ d λ = 4 π 2 R 2 B λ ( T ) d λ .

Assim, a luminosidade é uma característica intrínseca da estrela, dependendo apenas de sua temperatura e seu raio. Por outro lado, o fluxo monocromático de radiação coletado a uma dada distância (d) é obtido pela lei do inverso do quadrado da distância, na qual a luminosidade é divida pela área de uma esfera de raiod:

(4) F λ d λ = L λ d λ 4 π d 2 = π ( R 2 d 2 ) B λ ( T ) d λ .

Para estimar o fluxo total de radiação, integramos a função de Planck em todos os comprimentos de onda:

(5) B ( T ) = B λ ( T ) d λ = σ T 4 π ,

onde σ=5,67×10-8Wm-2K-4 é a constante de Stefan-Boltzmann. Desta forma temos o fluxo dado por:

(6) F = ( R d ) 2 σ T 4 ,

nas unidades de W m-2. Aplicando a Eq. (6) para os dados R = 6,9598 ×108 m (raio do Sol, R), e d = 1,49598 ×1011 m = 1 ua (unidade astronômica), que corresponde à distância entre a Terra e o Sol, temos uma expressão para a irradiância solar total (TSI) incidente na Terra. Rodríguez Gómez et al. [31[31] J.M. Rodríguez Gómez, F. Carlesso, L.E. Vieira e L. Da Silva, Revista Brasileira de Ensino de Física 40, e3312 (2018).] e Carlesso et al. [32[32] F. Carlesso, J.M.R. Gómez, L.E.A. Vieira, G.S. Savonov, L.A. Berni, e L.L. Costa, Revista Brasileira de Ensino de Física 41, e20180220 (2019).] apresentam os conceitos básicos relacionados com a radiação solar e seus impactos na Terra.

O monitoramento da TSI, como por exemplo do SORCE/TIM2 2 Solar Radiation and Climate Experiment/Total Irradiance Monitor [34] , apresentado por Kopp [33[33] G. Kopp, Solar Physics 296, 133 (2021).], mostra variações correlacionadas com o ciclo de atividade solar.

A temperatura da superfície solar, também chamada temperatura efetiva (Tef), pode ser estimada partir da Eq. (6), em função do valor da TSI. Por exemplo, Tef= 5770 K foi estimada por Cahalan et al. [35[35] R.F. Cahalan, P. Ajiquichi e G. Yataz, arXiv:2109.08736 (2021).] adotando F = TSI = 1360,8 W m-2[36[36] G. Kopp e J.L. Lean, Geophysical Research Letters 38, L01706 (2011).]. Nos cálculos de modelos solares, Bahcall et al. [37[37] J.N. Bahcall, M.H. Pinsonneault e S. Basu, The Astrophysical Journal 555, 990 (2001).] adotam F = 1369 W m-2, que corresponde à luminosidade solar L=3,844×1026 W e temperatura Tef = 5780 K.

Para simplificar os cálculos, vamos adotar Tef 5800 K em uma importante aplicação que relaciona cor e temperatura estelar, um dos conceitos abordados na atividade proposta no presente trabalho. Trata-se da lei de Wien, utilizada para estimar a região espectral onde ocorre o pico de máxima intensidade. Esse pico é determinado quando a derivada da função de Planck é nula: dBλ(T)dλ=0, que leva à solução:

(7) λ m a x T = 0 , 002897755 m K .

Para ilustrar a aplicação da lei de Wien, utilizando o Sol como exemplo, vamos calcular o comprimento de onda λmax em ocorre o seu máximo de emissão. Utilizando a Eq. (7) de forma aproximada, tem-se que:

λ m a x . = 0 , 0029 ( m K ) T ( K ) λ m a x . = 0 , 0029 5800 ( m ) λ m a x . 5 × 10 - 7 m 500 n m .

Logo, é possível perceber que para essa temperatura, o Sol tem seu pico de emissão em um comprimento de onda aproximadamente igual a 500 nm, conforme ilustrado na Fig. 1, onde são também comparadas as curvas da função de Planck para outras estrelas, uma mais fria e outra mais quente que o Sol. Nota-se que o pico de emissão é mais alto para a estrela mais quente e deslocado para a região do azul no espectro. No caso da estrela mais fria, o máximo de emissão é menos intenso e ocorre na região do vermelho. No Apêndice A são descritas as ferramentas computacionais sugeridas para os(as) professores(as) reproduzirem a Fig. 1 para diversas temperaturas estelares.

3.2. Processo de convecção

A estrutura em camadas distribuídas no interior das estrelas depende de sua massa e das condições físicas, como densidade e temperatura. No caso das estrelas de massa semelhante à do Sol, o núcleo é radiativo e o envoltório é convectivo.

Para melhor entender a forma que a energia, gerada no núcleo estelar, é transportada para fora, devemos relembrar os conceitos de termodinâmica, que estabelecem um critério para o início da convecção no interior da estrela. A condição necessária para que a convecção seja mais dominante que a radiação nas regiões profundas da estrela é que o gradiente de temperatura se torne maior do que a variação dT/dr no caso adiabático. Esta é a condição em que uma “bolha” de gás quente continuará a subir, em vez de voltar a descer, depois de ter se deslocado para cima. Com base em modelos estelares (por exemplo [38[38] G. Schaller, D. Schaerer, G. Meynet e A. Maeder, Astronomy and Astrophysics, Supplement Series 96, 269 (1992).], [39[39] C. Charbonnel, W. Däppen, D. Schaerer, P.A. Bernasconi, A. Maeder, G. Meynet e N. Mowlavi, Astronomy and Astrophysics, Supplement Series 135, 405 (1999).]) e adotando as condições físicas da região central do Sol (dados de [37[37] J.N. Bahcall, M.H. Pinsonneault e S. Basu, The Astrophysical Journal 555, 990 (2001).]), estima-se que atualmente o Sol é puramente radiativo abaixo de r0,7R, como ilustrado na Fig. 2. A explicação física para isso é a opacidade na parte mais externa do Sol, que é alta o suficiente para inibir o transporte de energia por radiação. A Fig. 2 também destaca os detalhes que apresentam o movimento do gás quente ascendente e do gás frio descendente nas células de convecção. A aparência granular da fotosfera solar é devida à ocorrência destas células de convecção, cujo topo é brilhante (gás quente) e as bordas escuras (gás frio que desce pelas bordas da célula).

Figura 2:
Esquema da estrutura interna do Sol, indicando o raio estimado que define o núcleo central, onde ocorrem as reações termonucleares, e as camadas que estabelecem as zonas de radiação e de convecção. Detalhes da superfície granular e as células de convecção são mostrados no lado esquerdo do painel B.

3.3. Características da fotosfera e da cromosfera solar

Quando os fótons produzidos no interior estelar chegam à superfície, eles escapam para o espaço atravessando livremente a primeira camada externa do Sol, chamada fotosfera. Como pode ser visto na Fig. 3, o início desta região é definido quando o gás torna-se menos opaco que no interior estelar, expresso pela profundidade óptica3 3 Para o comprimento de onda ∼500 nm, a profundidade ópticaτ500=1 indica o início da região em que o gás se encontra no regime opticamente fino. τλ< 1.

Figura 3:
A espessura das camadas da atmosfera solar. Adaptado de [40[40] B.W. Carroll e D.A. Ostlie, An introduction to modern astrophysics (Pearson Addison Wesley, São Francisco, 2007).].

Na fotosfera se observa a granulação solar, formada por pequenas (diâmetros 700 km) regiões brilhantes contornadas por regiões escuras. O aspecto granular se deve a essas regiões transitórias, que desaparecem em cerca de 5 a 10 minutos, correspondendo ao topo das células convectivas.

As manchas solares são características típicas da fotosfera solar. Elas aparecem mais escuras, por se tratarem de regiões mais frias, onde ocorre inibição da emissão de fótons, devido à concentração de linhas de campo magnético. Neste caso, as manchas solares ocorrem em grupos e aos pares, associados aos polos magnéticos, acompanhando a direção da rotação do Sol. É o movimento de cargas no interior da estrela que causa o efeito dínamo e produz o campo magnético neste caso (vide ilustração na Fig. 4).

Figura 4:
Esquema descrevendo de forma geral o campo magnético no Sol. As linhas tracejadas indicam o campo de um perfeito dipolo magnético. Adaptado de [40[40] B.W. Carroll e D.A. Ostlie, An introduction to modern astrophysics (Pearson Addison Wesley, São Francisco, 2007).].

Na Fig. 5 temos um exemplo de mancha solar observada na fotosfera. Estas estruturas têm em média um diâmetro de 10000 km, ou seja, quase 2 vezes o diâmetro da Terra. A aparência da estrutura filamentar observada na penumbra (região menos escura ao redor da mancha) indica a presença das linhas de campo magnético.

Figura 5:
Imagem de mancha solar e simulações da distribuição de campo magnético ao seu redor, com base nos dados do Swedish 1-m Solar Telescope [42[42] G.B. Scharmer, K. Bjelksjo, T.K. Korhonen, B. Lindberg, B. Petterson, em: Proceedings SPIE, Vol. 4853, Innovative Telescopes and Instrumentation for Solar Astrophysics, (Society of Photo-Optical Instrumentation Engineers, Waikoloa, 2003), p. 341.]. Adaptado de [41[41] S.K. Solanki, J.C. del Toro Iniesta, J. Woch, A. Gandorfer, J. Hirzberger, A. Alvarez-Herrero, T. Appourchaux, V. Martínez Pillet, I. Pérez-Grande, E. Sanchis Kilders et al., Astronomy & Astrophysics 642, A11 (2020).].

A confirmação da existência de fortes campos magnéticos associados às manchas solares é obtida pela observação das linhas espectrais que aparecem subdivididas pelo efeito Zeeman. Essa subdivisão das linhas, aparecendo em comprimentos de onda levemente deslocados, se deve aos fótons produzidos quando há transição de elétrons entre sub-níveis atômicos degenerados, que foram alterados pela presença de campo magnéticos, adquirindo pequenas variações de energia. Os painéis do centro e da direita na Fig. 5 mostram simulações indicando intensidade e direção do campo magnético, com base no efeito Zeeman observado na linha de Fe em 617,3 nm, que são resultados do estudo de Solanki et al. [41[41] S.K. Solanki, J.C. del Toro Iniesta, J. Woch, A. Gandorfer, J. Hirzberger, A. Alvarez-Herrero, T. Appourchaux, V. Martínez Pillet, I. Pérez-Grande, E. Sanchis Kilders et al., Astronomy & Astrophysics 642, A11 (2020).].

A camada localizada acima da fotosfera é chamada cromosfera, que se estende por cerca de 1600 km. A densidade diminui por um fator de 104, enquanto que a temperatura aumenta a partir de 4400 K até atingir 10000 K. Estas condições físicas são favoráveis para a formação de linhas espectrais que não são produzidas nas baixas temperaturas e altas densidades da fotosfera. Destacam-se as linhas do hidrogênio da série de Balmer, como Hα (656,28 nm) por exemplo, cuja predominância favorece o aspecto avermelhado observado na cromosfera, notado mais facilmente no início ou no final de eclipse total do Sol. Com um filtro adequado para restringir apenas a passagem de fótons da emissão Hα é possível notar importantes sub-estruturas da cromosfera, como a supergranulação, em escala muito maior (30000 km) que a observada na fotosfera, além de, por exemplo, os filamentos verticais transitórios, chamados espículos, através dos quais ocorre movimento de material.

3.4. Atividade solar

Embora as complexas características observadas na atmosfera solar sejam transientes, muitas delas correspondem a fenômenos relacionados a mudanças no campo magnético global do Sol e seus ciclos de atividade. O evento eruptivo, conhecido como flare (ou clarão) solar, ocorre na forma de ejeção de partículas carregadas (raios cósmicos) em função de perturbações nos arcos formados pelas linhas de campo magnético e um mecanismo que envolve alta produção de energia associada com a reconexão das linhas magnéticas. Além dos flares , outro evento eruptivo (ou de atividade) é conhecido como proeminência solar, que está relacionado à uma instabilidade do arco magnético, mas em vez de emissão de radiação refere-se a movimento de massa, na forma de gás sendo ejetado do Sol.

A intensidade dos flares e das proeminências cresce com a maior atividade solar, assim como o aumento do número de manchas solares. O acompanhamento das contagens do número de manchas tem sido realizado desde os tempos de Galileo, permitindo a identificação do ciclo solar de 11 anos, bem como um ciclo de inversão de polos do campo magnético a cada período de 22 anos, sempre ocorrendo durante um mínimo de atividade (menos contagens de manchas solares). A variação do número de manchas solares4 4 https://www.weather.gov/news/201509-solar-cycle , observadas no período de 1995 a 2019, é apresentada na Fig. 6, na qual é possível notar no ciclo 23 uma média de cerca de 180 manchas contadas nos meses de máxima atividade, enquanto que no ciclo 24 o máximo está em torno de 100. A previsão do comportamento da atividade solar para o ciclo 25, que se iniciou em dezembro de 2019, é estimado a partir de diferentes tipos de simulações e estudos estatísticos, tais como [43[43] Q.J. Wang, J.C. Li e L.Q. Guo, Research in Astronomy and Astrophysics 21, 012 (2021)., 44[44] V.M.S. Carrasco e J.M. Vaquero, Research Notes of the AAS 5, 181 (2021)., 45[45] Y. Xiong, J. Lu, K. Zhao, M. Sun e Y. Gao, Monthly Notices of the Royal Astronomical Society 505, 1046 (2021).], dentre os mais recentes.

Figura 6:
Número de manchas solares observadas nos ciclos de atividade solar 23 e 24, indicando as medidas a cada mês (azul) e os valores médios (preto). De acordo com as previsões, o ciclo 25 (linha amarela) tem máximo esperado para julho de 2025. Adaptado da imagem disponibilizada pelo Space Weather Prediction Center/NOAA.

4. Estudando o Sol em diferentes comprimentos de onda

Toda informação proveniente do Universo é obtida a partir de instrumentos próprios para coletar as diferentes formas de radiação. Esses instrumentos estão associados à análise de determinados comprimentos de onda, fornecendo-nos informações específicas das condições físicas dos astros, como por exemplo nas diferentes camadas do Sol. A Fig. 7 apresenta as imagens do Sol em várias faixas do espectro eletromagnético, sendo possível observar diversas características solares discutidas na Seção3 3. Princípios físicos envolvidos na atmosfera e no interior solar A radiação de corpo negro, expressa pela Função de Planck, fornece uma boa aproximação para representar a emissão estelar. Na Seção3.1 apresentamos a função de Planck e sua relação com os conceitos abordados na atividade proposta neste trabalho. A eficiência da transferência de energia por radiação depende da opacidade, em função da estrutura do interior estelar, ou seja, se é convectivo ou radiativo. Algumas das características do interior e da atmosfera de estrelas semelhantes ao Sol, com enfoque nos processos de convecção e efeitos do campo magnético, são abordadas nas Seções3.2 e 3.3 para descrever as características observáveis em diferentes faixas espectrais, tais como granulação e manchas solares, por exemplo. São características que também se relacionam com o ciclo de atividade solar discutido na Seção3.4. 3.1. Radiação estelar O que se observa na superfície solar está relacionado com a forma em que a energia, produzida em seu interior por processos nucleares, é transportada para o exterior estelar. Devido à opacidade no interior da estrela, os fótons realizam caminhos aleatórios em sucessivas colisões e espalhamentos através do conteúdo estelar (elétrons e partículas de gás). Os fótons escapam da estrela graças a uma tendência do caminho direcionado para fora, que é devida ao gradiente de pressão de radiação. A pressão total de radiação produzida por fótons em todos comprimentos de onda (λ) depende da radiação de corpo negro, expressa pela função de Planck: (1) B λ ⁢ ( T ) = 2 ⁢ h ⁢ c 2 λ 5 ⁢ [ e h ⁢ c λ ⁢ k ⁢ T - 1 ] - 1 , onde c=2,9979×108⁢m⁢s-1 é a velocidade da luz, h=6,6262×10-34⁢J⁢s é a constante de Planck e k=1,38062×10-23⁢J⁢K-1 é a constante de Boltzmann. É interessante notar que o termo h⁢cλ que aparece na exponencial da Eq. (1) define a energia mínima de uma onda eletromagnética de frequência f, conhecida por quantum de energia: E = hf. A função de Planck fornece uma estimativa do brilho estelar em função da temperatura da estrela e do comprimento de onda (vide Fig. 1). Considerando um corpo negro de temperatura T e elemento de área superficial (dA), a quantidade de energia radiante por unidade de tempo, em um intervalo de comprimento de onda (dλ), atravessando o ângulo sólido (dΩ) é expressa por: Figura 1: Curva da Função de Planck obtida para o Sol, indicando que seu máximo de emissão ocorre na faixa do visível. Para comparação, é apresentada a curva para uma estrela mais quente e outra mais fria. (2) B λ ⁢ ( T ) ⁢ d ⁢ λ ⁢ d ⁢ A ⁢ c ⁢ o ⁢ s ⁢ θ ⁢ d ⁢ Ω . em unidades de W m-2 nm-1 sr-1 , onde cosθ indica a direção de radiação1. Para obtenção da luminosidade da estrela de raio R realiza-se a integral da Eq. (2) em toda superfície estelar e em todas as direções, o que leva a: (3) L λ ⁢ d ⁢ λ = 4 ⁢ π 2 ⁢ R 2 ⁢ B λ ⁢ ( T ) ⁢ d ⁢ λ . Assim, a luminosidade é uma característica intrínseca da estrela, dependendo apenas de sua temperatura e seu raio. Por outro lado, o fluxo monocromático de radiação coletado a uma dada distância (d) é obtido pela lei do inverso do quadrado da distância, na qual a luminosidade é divida pela área de uma esfera de raiod: (4) F λ ⁢ d ⁢ λ = L λ ⁢ d ⁢ λ 4 ⁢ π ⁢ d 2 = π ⁢ ( R 2 d 2 ) ⁢ B λ ⁢ ( T ) ⁢ d ⁢ λ . Para estimar o fluxo total de radiação, integramos a função de Planck em todos os comprimentos de onda: (5) B ⁢ ( T ) = ∫ B λ ⁢ ( T ) ⁢ d λ = σ ⁢ T 4 π , onde σ=5,67×10-8⁢W⁢m-2⁢K-4 é a constante de Stefan-Boltzmann. Desta forma temos o fluxo dado por: (6) F = ( R d ) 2 ⁢ σ ⁢ T 4 , nas unidades de W m-2. Aplicando a Eq. (6) para os dados R = 6,9598 ×108 m (raio do Sol, R⊙), e d = 1,49598 ×1011 m = 1 ua (unidade astronômica), que corresponde à distância entre a Terra e o Sol, temos uma expressão para a irradiância solar total (TSI) incidente na Terra. Rodríguez Gómez et al. [31] e Carlesso et al. [32] apresentam os conceitos básicos relacionados com a radiação solar e seus impactos na Terra. O monitoramento da TSI, como por exemplo do SORCE/TIM2, apresentado por Kopp [33], mostra variações correlacionadas com o ciclo de atividade solar. A temperatura da superfície solar, também chamada temperatura efetiva (Te⁢f), pode ser estimada partir da Eq. (6), em função do valor da TSI. Por exemplo, Te⁢f= 5770 K foi estimada por Cahalan et al. [35] adotando F = TSI = 1360,8 W m-2[36]. Nos cálculos de modelos solares, Bahcall et al. [37] adotam F = 1369 W m-2, que corresponde à luminosidade solar L=⊙3,844×1026 W e temperatura Te⁢f = 5780 K. Para simplificar os cálculos, vamos adotar T∼e⁢f 5800 K em uma importante aplicação que relaciona cor e temperatura estelar, um dos conceitos abordados na atividade proposta no presente trabalho. Trata-se da lei de Wien, utilizada para estimar a região espectral onde ocorre o pico de máxima intensidade. Esse pico é determinado quando a derivada da função de Planck é nula: d⁢Bλ⁢(T)d⁢λ=0, que leva à solução: (7) λ m ⁢ a ⁢ x ⁢ T = 0 , 002897755 ⁢ m ⁢ K . Para ilustrar a aplicação da lei de Wien, utilizando o Sol como exemplo, vamos calcular o comprimento de onda λm⁢a⁢x em ocorre o seu máximo de emissão. Utilizando a Eq. (7) de forma aproximada, tem-se que: λ m ⁢ a ⁢ x . = 0 , 0029 ⁢ ( m ⁢ K ) T ⁢ ( K ) λ m ⁢ a ⁢ x . = 0 , 0029 5800 ⁢ ( m ) λ m ⁢ a ⁢ x . ≈ 5 × 10 - 7 ⁢ m ≈ 500 ⁢ n ⁢ m . Logo, é possível perceber que para essa temperatura, o Sol tem seu pico de emissão em um comprimento de onda aproximadamente igual a 500 nm, conforme ilustrado na Fig. 1, onde são também comparadas as curvas da função de Planck para outras estrelas, uma mais fria e outra mais quente que o Sol. Nota-se que o pico de emissão é mais alto para a estrela mais quente e deslocado para a região do azul no espectro. No caso da estrela mais fria, o máximo de emissão é menos intenso e ocorre na região do vermelho. No Apêndice A são descritas as ferramentas computacionais sugeridas para os(as) professores(as) reproduzirem a Fig. 1 para diversas temperaturas estelares. 3.2. Processo de convecção A estrutura em camadas distribuídas no interior das estrelas depende de sua massa e das condições físicas, como densidade e temperatura. No caso das estrelas de massa semelhante à do Sol, o núcleo é radiativo e o envoltório é convectivo. Para melhor entender a forma que a energia, gerada no núcleo estelar, é transportada para fora, devemos relembrar os conceitos de termodinâmica, que estabelecem um critério para o início da convecção no interior da estrela. A condição necessária para que a convecção seja mais dominante que a radiação nas regiões profundas da estrela é que o gradiente de temperatura se torne maior do que a variação dT/dr no caso adiabático. Esta é a condição em que uma “bolha” de gás quente continuará a subir, em vez de voltar a descer, depois de ter se deslocado para cima. Com base em modelos estelares (por exemplo [38], [39]) e adotando as condições físicas da região central do Sol (dados de [37]), estima-se que atualmente o Sol é puramente radiativo abaixo de r∼0,7⁢R⊙, como ilustrado na Fig. 2. A explicação física para isso é a opacidade na parte mais externa do Sol, que é alta o suficiente para inibir o transporte de energia por radiação. A Fig. 2 também destaca os detalhes que apresentam o movimento do gás quente ascendente e do gás frio descendente nas células de convecção. A aparência granular da fotosfera solar é devida à ocorrência destas células de convecção, cujo topo é brilhante (gás quente) e as bordas escuras (gás frio que desce pelas bordas da célula). Figura 2: Esquema da estrutura interna do Sol, indicando o raio estimado que define o núcleo central, onde ocorrem as reações termonucleares, e as camadas que estabelecem as zonas de radiação e de convecção. Detalhes da superfície granular e as células de convecção são mostrados no lado esquerdo do painel B. 3.3. Características da fotosfera e da cromosfera solar Quando os fótons produzidos no interior estelar chegam à superfície, eles escapam para o espaço atravessando livremente a primeira camada externa do Sol, chamada fotosfera. Como pode ser visto na Fig. 3, o início desta região é definido quando o gás torna-se menos opaco que no interior estelar, expresso pela profundidade óptica3 τλ< 1. Figura 3: A espessura das camadas da atmosfera solar. Adaptado de [40]. Na fotosfera se observa a granulação solar, formada por pequenas (diâmetros ∼ 700 km) regiões brilhantes contornadas por regiões escuras. O aspecto granular se deve a essas regiões transitórias, que desaparecem em cerca de 5 a 10 minutos, correspondendo ao topo das células convectivas. As manchas solares são características típicas da fotosfera solar. Elas aparecem mais escuras, por se tratarem de regiões mais frias, onde ocorre inibição da emissão de fótons, devido à concentração de linhas de campo magnético. Neste caso, as manchas solares ocorrem em grupos e aos pares, associados aos polos magnéticos, acompanhando a direção da rotação do Sol. É o movimento de cargas no interior da estrela que causa o efeito dínamo e produz o campo magnético neste caso (vide ilustração na Fig. 4). Figura 4: Esquema descrevendo de forma geral o campo magnético no Sol. As linhas tracejadas indicam o campo de um perfeito dipolo magnético. Adaptado de [40]. Na Fig. 5 temos um exemplo de mancha solar observada na fotosfera. Estas estruturas têm em média um diâmetro de 10000 km, ou seja, quase 2 vezes o diâmetro da Terra. A aparência da estrutura filamentar observada na penumbra (região menos escura ao redor da mancha) indica a presença das linhas de campo magnético. Figura 5: Imagem de mancha solar e simulações da distribuição de campo magnético ao seu redor, com base nos dados do Swedish 1-m Solar Telescope [42]. Adaptado de [41]. A confirmação da existência de fortes campos magnéticos associados às manchas solares é obtida pela observação das linhas espectrais que aparecem subdivididas pelo efeito Zeeman. Essa subdivisão das linhas, aparecendo em comprimentos de onda levemente deslocados, se deve aos fótons produzidos quando há transição de elétrons entre sub-níveis atômicos degenerados, que foram alterados pela presença de campo magnéticos, adquirindo pequenas variações de energia. Os painéis do centro e da direita na Fig. 5 mostram simulações indicando intensidade e direção do campo magnético, com base no efeito Zeeman observado na linha de Fe em 617,3 nm, que são resultados do estudo de Solanki et al. [41]. A camada localizada acima da fotosfera é chamada cromosfera, que se estende por cerca de 1600 km. A densidade diminui por um fator de 104, enquanto que a temperatura aumenta a partir de 4400 K até atingir 10000 K. Estas condições físicas são favoráveis para a formação de linhas espectrais que não são produzidas nas baixas temperaturas e altas densidades da fotosfera. Destacam-se as linhas do hidrogênio da série de Balmer, como Hα (656,28 nm) por exemplo, cuja predominância favorece o aspecto avermelhado observado na cromosfera, notado mais facilmente no início ou no final de eclipse total do Sol. Com um filtro adequado para restringir apenas a passagem de fótons da emissão Hα é possível notar importantes sub-estruturas da cromosfera, como a supergranulação, em escala muito maior (30000 km) que a observada na fotosfera, além de, por exemplo, os filamentos verticais transitórios, chamados espículos, através dos quais ocorre movimento de material. 3.4. Atividade solar Embora as complexas características observadas na atmosfera solar sejam transientes, muitas delas correspondem a fenômenos relacionados a mudanças no campo magnético global do Sol e seus ciclos de atividade. O evento eruptivo, conhecido como flare (ou clarão) solar, ocorre na forma de ejeção de partículas carregadas (raios cósmicos) em função de perturbações nos arcos formados pelas linhas de campo magnético e um mecanismo que envolve alta produção de energia associada com a reconexão das linhas magnéticas. Além dos flares , outro evento eruptivo (ou de atividade) é conhecido como proeminência solar, que está relacionado à uma instabilidade do arco magnético, mas em vez de emissão de radiação refere-se a movimento de massa, na forma de gás sendo ejetado do Sol. A intensidade dos flares e das proeminências cresce com a maior atividade solar, assim como o aumento do número de manchas solares. O acompanhamento das contagens do número de manchas tem sido realizado desde os tempos de Galileo, permitindo a identificação do ciclo solar de 11 anos, bem como um ciclo de inversão de polos do campo magnético a cada período de 22 anos, sempre ocorrendo durante um mínimo de atividade (menos contagens de manchas solares). A variação do número de manchas solares4, observadas no período de 1995 a 2019, é apresentada na Fig. 6, na qual é possível notar no ciclo 23 uma média de cerca de 180 manchas contadas nos meses de máxima atividade, enquanto que no ciclo 24 o máximo está em torno de 100. A previsão do comportamento da atividade solar para o ciclo 25, que se iniciou em dezembro de 2019, é estimado a partir de diferentes tipos de simulações e estudos estatísticos, tais como [43, 44, 45], dentre os mais recentes. Figura 6: Número de manchas solares observadas nos ciclos de atividade solar 23 e 24, indicando as medidas a cada mês (azul) e os valores médios (preto). De acordo com as previsões, o ciclo 25 (linha amarela) tem máximo esperado para julho de 2025. Adaptado da imagem disponibilizada pelo Space Weather Prediction Center/NOAA. . Para ilustrar o máximo de atividade solar que ocorreu mais recentemente (ciclo 24), foram selecionadas as imagens obtidas pelo satélite SDO (Solar Dynamics Observatory) com os instrumentos AIA (Atmospheric Imaging Assembly) operando em três diferentes comprimentos de onda do ultravioleta [46[46] J.R. Lemen, A.M. Title, D.J. Akin, P.F. Boerner, C. Chou, J.F. Drake, D.W. Duncan, C.G. Edwards, F.M. Friedlaender, G.F. Heyman et al., Solar Physics 275, 17 (2012).]; HMI (Helioseismic and Magnetic Imager) para detecção na faixa do visível [47[47] Y. Liu, P.H. Scherrer, J.T. Hoeksema, J. Schou, T. Bai, J.G. Beck, M. Bobra, R.S. Bogart, R.I. Bush, S. Couvidat, Astronomical Society of the Pacific Conference Series 455, 337 (2012)., 48[48] P.H. Scherrer, J. Schou, R.I. Bush, A.G. Kosovichev, R.S. Bogart, J.T. Hoeksema, Y. Liu, T.L. Duvall Jr. e J. Zhao, A.M. Title et al., Solar Physics 275, 207 (2012).]; e GNH (Global High Resolution H-alpha Network)5 5 http://www.bbso.njit.edu/Research/Halpha/ para mapeamento da emissão Hα. Para tais imagens, disponibilizadas pelo grupo de Física Solar do Trinity College Dublin6 https://www.solarmonitor.org/ são indicadas as regiões ativas identificadas pelo NOAA Space Weather Prediction Center . O painel (f) da Fig. 7 corresponde a uma imagem obtida no infravermelho próximo (λ=1,083μm) pelo NSO (National Solar Observatory at Kitt Peak)7 7 Colaboração NSF/NOAO, NASA/GSFC, NOAA/SE https://nispdata.nso.edu/ftp/kpvt/daily/medres/02.02 . Essa imagem no infravermelho foi obtida no ciclo 23, o que explica as diferenças na distribuição de regiões ativas com relação aos painéis (a)-(e).

Figura 7:
Imagens do Sol em diferentes faixas do espectro eletromagnético obtidas pelo satélite SDO em 03/4/2014 com os instrumentos AIA (imagens a, b e c); HMI (d) e GNH (e). Os números anotados sobre as imagens identificam 12 regiões ativas. A imagem (f) foi obtida pelo NSO, em 05/02/2002.

O SOHO (Solar and Heliospheric Observatory) e o Hinode são duas missões que foram enviadas para estudar o Sol em detalhes. A partir do SOHO e do Hinode foi possível obter as imagens fornecidas na atividade de análise proposta nesse trabalho que se encontram no Apêndice C.

A nave espacial SOHO é uma missão com consórcio entre a NASA e a Agência Espacial Europeia (ESA), que tem como um dos objetivos investigar as camadas mais externas da atmosfera solar, como a Fotosfera, a Cromosfera e a Coroa Solar. O SOHO possui 12 instrumentos de observação diferentes, que trabalham independentes, onde dois deles são de particular interesse para este artigo: o MDI8 8 O SOHO/MDI foi encerrado em 12/4/2011 [50]. (Michelson Doppler Imager) e o EIT (Extreme Ultraviolet Imaging) [49[49] https://www.nasa.gov/mission_pages/soho/index.html, acessado em: 23/11/2020.
https://www.nasa.gov/mission_pages/soho/...
].

Já o Hinode é um satélite que possui colaboração entre as agências espaciais do Japão (JAXA), Estados Unidos (NASA) e Europa (ESA) além do Particle Physics and Astronomy Research Council (PPARC) do Reino Unido. Esse satélite tem como principal objetivo estudar os campos magnéticos solares afim de entender melhor as erupções solares. Para isso, possui três instrumentos de observação e análise sendo um deles o XRT (X-Ray Telescope) [51[51] NASA, Hinode: Mission to the Sun, disponível em: https://www.nasa.gov/mission_pages/hinode/mission.html, acessado em: 23/11/2020.
https://www.nasa.gov/mission_pages/hinod...
]. Embora os princípios físicos que envolvem as emissões de altas energias, em particular relacionadas à coroa solar, sejam diferentes dos conceitos básicos apresentados na Seção3 3. Princípios físicos envolvidos na atmosfera e no interior solar A radiação de corpo negro, expressa pela Função de Planck, fornece uma boa aproximação para representar a emissão estelar. Na Seção3.1 apresentamos a função de Planck e sua relação com os conceitos abordados na atividade proposta neste trabalho. A eficiência da transferência de energia por radiação depende da opacidade, em função da estrutura do interior estelar, ou seja, se é convectivo ou radiativo. Algumas das características do interior e da atmosfera de estrelas semelhantes ao Sol, com enfoque nos processos de convecção e efeitos do campo magnético, são abordadas nas Seções3.2 e 3.3 para descrever as características observáveis em diferentes faixas espectrais, tais como granulação e manchas solares, por exemplo. São características que também se relacionam com o ciclo de atividade solar discutido na Seção3.4. 3.1. Radiação estelar O que se observa na superfície solar está relacionado com a forma em que a energia, produzida em seu interior por processos nucleares, é transportada para o exterior estelar. Devido à opacidade no interior da estrela, os fótons realizam caminhos aleatórios em sucessivas colisões e espalhamentos através do conteúdo estelar (elétrons e partículas de gás). Os fótons escapam da estrela graças a uma tendência do caminho direcionado para fora, que é devida ao gradiente de pressão de radiação. A pressão total de radiação produzida por fótons em todos comprimentos de onda (λ) depende da radiação de corpo negro, expressa pela função de Planck: (1) B λ ⁢ ( T ) = 2 ⁢ h ⁢ c 2 λ 5 ⁢ [ e h ⁢ c λ ⁢ k ⁢ T - 1 ] - 1 , onde c=2,9979×108⁢m⁢s-1 é a velocidade da luz, h=6,6262×10-34⁢J⁢s é a constante de Planck e k=1,38062×10-23⁢J⁢K-1 é a constante de Boltzmann. É interessante notar que o termo h⁢cλ que aparece na exponencial da Eq. (1) define a energia mínima de uma onda eletromagnética de frequência f, conhecida por quantum de energia: E = hf. A função de Planck fornece uma estimativa do brilho estelar em função da temperatura da estrela e do comprimento de onda (vide Fig. 1). Considerando um corpo negro de temperatura T e elemento de área superficial (dA), a quantidade de energia radiante por unidade de tempo, em um intervalo de comprimento de onda (dλ), atravessando o ângulo sólido (dΩ) é expressa por: Figura 1: Curva da Função de Planck obtida para o Sol, indicando que seu máximo de emissão ocorre na faixa do visível. Para comparação, é apresentada a curva para uma estrela mais quente e outra mais fria. (2) B λ ⁢ ( T ) ⁢ d ⁢ λ ⁢ d ⁢ A ⁢ c ⁢ o ⁢ s ⁢ θ ⁢ d ⁢ Ω . em unidades de W m-2 nm-1 sr-1 , onde cosθ indica a direção de radiação1. Para obtenção da luminosidade da estrela de raio R realiza-se a integral da Eq. (2) em toda superfície estelar e em todas as direções, o que leva a: (3) L λ ⁢ d ⁢ λ = 4 ⁢ π 2 ⁢ R 2 ⁢ B λ ⁢ ( T ) ⁢ d ⁢ λ . Assim, a luminosidade é uma característica intrínseca da estrela, dependendo apenas de sua temperatura e seu raio. Por outro lado, o fluxo monocromático de radiação coletado a uma dada distância (d) é obtido pela lei do inverso do quadrado da distância, na qual a luminosidade é divida pela área de uma esfera de raiod: (4) F λ ⁢ d ⁢ λ = L λ ⁢ d ⁢ λ 4 ⁢ π ⁢ d 2 = π ⁢ ( R 2 d 2 ) ⁢ B λ ⁢ ( T ) ⁢ d ⁢ λ . Para estimar o fluxo total de radiação, integramos a função de Planck em todos os comprimentos de onda: (5) B ⁢ ( T ) = ∫ B λ ⁢ ( T ) ⁢ d λ = σ ⁢ T 4 π , onde σ=5,67×10-8⁢W⁢m-2⁢K-4 é a constante de Stefan-Boltzmann. Desta forma temos o fluxo dado por: (6) F = ( R d ) 2 ⁢ σ ⁢ T 4 , nas unidades de W m-2. Aplicando a Eq. (6) para os dados R = 6,9598 ×108 m (raio do Sol, R⊙), e d = 1,49598 ×1011 m = 1 ua (unidade astronômica), que corresponde à distância entre a Terra e o Sol, temos uma expressão para a irradiância solar total (TSI) incidente na Terra. Rodríguez Gómez et al. [31] e Carlesso et al. [32] apresentam os conceitos básicos relacionados com a radiação solar e seus impactos na Terra. O monitoramento da TSI, como por exemplo do SORCE/TIM2, apresentado por Kopp [33], mostra variações correlacionadas com o ciclo de atividade solar. A temperatura da superfície solar, também chamada temperatura efetiva (Te⁢f), pode ser estimada partir da Eq. (6), em função do valor da TSI. Por exemplo, Te⁢f= 5770 K foi estimada por Cahalan et al. [35] adotando F = TSI = 1360,8 W m-2[36]. Nos cálculos de modelos solares, Bahcall et al. [37] adotam F = 1369 W m-2, que corresponde à luminosidade solar L=⊙3,844×1026 W e temperatura Te⁢f = 5780 K. Para simplificar os cálculos, vamos adotar T∼e⁢f 5800 K em uma importante aplicação que relaciona cor e temperatura estelar, um dos conceitos abordados na atividade proposta no presente trabalho. Trata-se da lei de Wien, utilizada para estimar a região espectral onde ocorre o pico de máxima intensidade. Esse pico é determinado quando a derivada da função de Planck é nula: d⁢Bλ⁢(T)d⁢λ=0, que leva à solução: (7) λ m ⁢ a ⁢ x ⁢ T = 0 , 002897755 ⁢ m ⁢ K . Para ilustrar a aplicação da lei de Wien, utilizando o Sol como exemplo, vamos calcular o comprimento de onda λm⁢a⁢x em ocorre o seu máximo de emissão. Utilizando a Eq. (7) de forma aproximada, tem-se que: λ m ⁢ a ⁢ x . = 0 , 0029 ⁢ ( m ⁢ K ) T ⁢ ( K ) λ m ⁢ a ⁢ x . = 0 , 0029 5800 ⁢ ( m ) λ m ⁢ a ⁢ x . ≈ 5 × 10 - 7 ⁢ m ≈ 500 ⁢ n ⁢ m . Logo, é possível perceber que para essa temperatura, o Sol tem seu pico de emissão em um comprimento de onda aproximadamente igual a 500 nm, conforme ilustrado na Fig. 1, onde são também comparadas as curvas da função de Planck para outras estrelas, uma mais fria e outra mais quente que o Sol. Nota-se que o pico de emissão é mais alto para a estrela mais quente e deslocado para a região do azul no espectro. No caso da estrela mais fria, o máximo de emissão é menos intenso e ocorre na região do vermelho. No Apêndice A são descritas as ferramentas computacionais sugeridas para os(as) professores(as) reproduzirem a Fig. 1 para diversas temperaturas estelares. 3.2. Processo de convecção A estrutura em camadas distribuídas no interior das estrelas depende de sua massa e das condições físicas, como densidade e temperatura. No caso das estrelas de massa semelhante à do Sol, o núcleo é radiativo e o envoltório é convectivo. Para melhor entender a forma que a energia, gerada no núcleo estelar, é transportada para fora, devemos relembrar os conceitos de termodinâmica, que estabelecem um critério para o início da convecção no interior da estrela. A condição necessária para que a convecção seja mais dominante que a radiação nas regiões profundas da estrela é que o gradiente de temperatura se torne maior do que a variação dT/dr no caso adiabático. Esta é a condição em que uma “bolha” de gás quente continuará a subir, em vez de voltar a descer, depois de ter se deslocado para cima. Com base em modelos estelares (por exemplo [38], [39]) e adotando as condições físicas da região central do Sol (dados de [37]), estima-se que atualmente o Sol é puramente radiativo abaixo de r∼0,7⁢R⊙, como ilustrado na Fig. 2. A explicação física para isso é a opacidade na parte mais externa do Sol, que é alta o suficiente para inibir o transporte de energia por radiação. A Fig. 2 também destaca os detalhes que apresentam o movimento do gás quente ascendente e do gás frio descendente nas células de convecção. A aparência granular da fotosfera solar é devida à ocorrência destas células de convecção, cujo topo é brilhante (gás quente) e as bordas escuras (gás frio que desce pelas bordas da célula). Figura 2: Esquema da estrutura interna do Sol, indicando o raio estimado que define o núcleo central, onde ocorrem as reações termonucleares, e as camadas que estabelecem as zonas de radiação e de convecção. Detalhes da superfície granular e as células de convecção são mostrados no lado esquerdo do painel B. 3.3. Características da fotosfera e da cromosfera solar Quando os fótons produzidos no interior estelar chegam à superfície, eles escapam para o espaço atravessando livremente a primeira camada externa do Sol, chamada fotosfera. Como pode ser visto na Fig. 3, o início desta região é definido quando o gás torna-se menos opaco que no interior estelar, expresso pela profundidade óptica3 τλ< 1. Figura 3: A espessura das camadas da atmosfera solar. Adaptado de [40]. Na fotosfera se observa a granulação solar, formada por pequenas (diâmetros ∼ 700 km) regiões brilhantes contornadas por regiões escuras. O aspecto granular se deve a essas regiões transitórias, que desaparecem em cerca de 5 a 10 minutos, correspondendo ao topo das células convectivas. As manchas solares são características típicas da fotosfera solar. Elas aparecem mais escuras, por se tratarem de regiões mais frias, onde ocorre inibição da emissão de fótons, devido à concentração de linhas de campo magnético. Neste caso, as manchas solares ocorrem em grupos e aos pares, associados aos polos magnéticos, acompanhando a direção da rotação do Sol. É o movimento de cargas no interior da estrela que causa o efeito dínamo e produz o campo magnético neste caso (vide ilustração na Fig. 4). Figura 4: Esquema descrevendo de forma geral o campo magnético no Sol. As linhas tracejadas indicam o campo de um perfeito dipolo magnético. Adaptado de [40]. Na Fig. 5 temos um exemplo de mancha solar observada na fotosfera. Estas estruturas têm em média um diâmetro de 10000 km, ou seja, quase 2 vezes o diâmetro da Terra. A aparência da estrutura filamentar observada na penumbra (região menos escura ao redor da mancha) indica a presença das linhas de campo magnético. Figura 5: Imagem de mancha solar e simulações da distribuição de campo magnético ao seu redor, com base nos dados do Swedish 1-m Solar Telescope [42]. Adaptado de [41]. A confirmação da existência de fortes campos magnéticos associados às manchas solares é obtida pela observação das linhas espectrais que aparecem subdivididas pelo efeito Zeeman. Essa subdivisão das linhas, aparecendo em comprimentos de onda levemente deslocados, se deve aos fótons produzidos quando há transição de elétrons entre sub-níveis atômicos degenerados, que foram alterados pela presença de campo magnéticos, adquirindo pequenas variações de energia. Os painéis do centro e da direita na Fig. 5 mostram simulações indicando intensidade e direção do campo magnético, com base no efeito Zeeman observado na linha de Fe em 617,3 nm, que são resultados do estudo de Solanki et al. [41]. A camada localizada acima da fotosfera é chamada cromosfera, que se estende por cerca de 1600 km. A densidade diminui por um fator de 104, enquanto que a temperatura aumenta a partir de 4400 K até atingir 10000 K. Estas condições físicas são favoráveis para a formação de linhas espectrais que não são produzidas nas baixas temperaturas e altas densidades da fotosfera. Destacam-se as linhas do hidrogênio da série de Balmer, como Hα (656,28 nm) por exemplo, cuja predominância favorece o aspecto avermelhado observado na cromosfera, notado mais facilmente no início ou no final de eclipse total do Sol. Com um filtro adequado para restringir apenas a passagem de fótons da emissão Hα é possível notar importantes sub-estruturas da cromosfera, como a supergranulação, em escala muito maior (30000 km) que a observada na fotosfera, além de, por exemplo, os filamentos verticais transitórios, chamados espículos, através dos quais ocorre movimento de material. 3.4. Atividade solar Embora as complexas características observadas na atmosfera solar sejam transientes, muitas delas correspondem a fenômenos relacionados a mudanças no campo magnético global do Sol e seus ciclos de atividade. O evento eruptivo, conhecido como flare (ou clarão) solar, ocorre na forma de ejeção de partículas carregadas (raios cósmicos) em função de perturbações nos arcos formados pelas linhas de campo magnético e um mecanismo que envolve alta produção de energia associada com a reconexão das linhas magnéticas. Além dos flares , outro evento eruptivo (ou de atividade) é conhecido como proeminência solar, que está relacionado à uma instabilidade do arco magnético, mas em vez de emissão de radiação refere-se a movimento de massa, na forma de gás sendo ejetado do Sol. A intensidade dos flares e das proeminências cresce com a maior atividade solar, assim como o aumento do número de manchas solares. O acompanhamento das contagens do número de manchas tem sido realizado desde os tempos de Galileo, permitindo a identificação do ciclo solar de 11 anos, bem como um ciclo de inversão de polos do campo magnético a cada período de 22 anos, sempre ocorrendo durante um mínimo de atividade (menos contagens de manchas solares). A variação do número de manchas solares4, observadas no período de 1995 a 2019, é apresentada na Fig. 6, na qual é possível notar no ciclo 23 uma média de cerca de 180 manchas contadas nos meses de máxima atividade, enquanto que no ciclo 24 o máximo está em torno de 100. A previsão do comportamento da atividade solar para o ciclo 25, que se iniciou em dezembro de 2019, é estimado a partir de diferentes tipos de simulações e estudos estatísticos, tais como [43, 44, 45], dentre os mais recentes. Figura 6: Número de manchas solares observadas nos ciclos de atividade solar 23 e 24, indicando as medidas a cada mês (azul) e os valores médios (preto). De acordo com as previsões, o ciclo 25 (linha amarela) tem máximo esperado para julho de 2025. Adaptado da imagem disponibilizada pelo Space Weather Prediction Center/NOAA. , as observações em raios-X são incluídas aqui de forma ilustrativa, para demonstrar que a radiação solar ocorre em todas as frequências de ondas eletromagnéticas, revelando diferentes características relacionadas a uma ampla faixa de energias envolvidas.

5. Considerações Finais

Este artigo mostra uma forma de apresentar os conteúdos de ondas eletromagnéticas e de radiação de corpo negro, utilizando como objeto de estudo o Sol. As atividades foram pensadas com foco na determinação de características estelares, como cor, temperatura e fluxo emitido, usando ferramentas computacionais gráficas, cálculos, comparações com tabelas, e análise visual de imagens fornecidas pelo(a) professor(a), trazendo dessa forma competências e habilidades da BNCC que são importantes para serem desenvolvidas dentro de sala de aula.

O intuito principal da atividade é que os alunos e alunas trabalhem de forma colaborativa, aprendendo em conjunto, conteúdos que normalmente são abstratos na educação básica, trazendo motivação e entusiasmo, juntamente com a produção e educação científica. Além disso, espera-se motivar os professores a reverem conceitos básicos relacionados ao Sol, de forma a compreender os processos físicos que explicam as diferentes características solares observadas em diferentes faixas espectrais.

O material de apoio está dividido em três partes. O Apêndice A é dedicado à atividade computacional, com o código desenvolvido no presente trabalho para gerar o gráfico da curva de corpo negro, com uso alternativo de linguagem de programação e de software. O Apêndice B contém a atividade que deve ser entregue para os(as) alunos(as) e o Apêndice C, o Gabarito da mesma atividade, incluíndo as imagens a serem analisadas. Uma versão online destes dois apêndices está disponível na formatação adequada para impressão e uso em sala de aula.

Referênces

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Dez 2021
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    16 Nov 2021
  • Aceito
    22 Nov 2021
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