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Obtenção e análise de laços de histerese magnética: uma inserção de estudantes em pesquisas de magnetismo

Obtaining and analyzing magnetic hysteresis loops: an insertion of students in magnetism research

Resumos

Um aparato experimental para a obtenção de curvas de histerese magnética foi construído, com a participação de estudantes de licenciatura em física, visando uma visualização dos fundamentos que caracterizam a resposta magnética de materiais ferromagnéticos submetidos a campos magnéticos alternados. Foram obtidos laços de histereses do núcleo secundário de um transformador, visualizando-os na tela de um osciloscópio na forma gráfica de tensão em um capacitor conectado ao enrolamento secundário em função da tensão medida em um resistor conectado ao enrolamento primário. Os laços foram obtidos para cinco valores de tensão aplicadas ao primário do transformador na faixa de 160–220 V. Foi observado um aumento nos campos coercivo, remanente e magnetização máxima com o aumento da tensão no primário. As curvas de permeabilidade magnética relativa apresentam um máximo próximo aos valores de campo coercivo, e assim observou-se a não linearidade da permeabilidade com o campo intensidade magnética. Por fim, com o aumento da tensão, os estudantes estimaram a potência perdida em 5 curvas de histerese associadas a rotação de dipolos magnéticos e fatores dinâmicos.

Palavras-chave:
Ensino de Física; Experimento; Magnetismo; Histerese magnética


An experimental apparatus for obtaining magnetic hysteresis curves was built, with the participation of undergraduate physics students, aiming at a visualization of the fundamentals that characterize the magnetic response of ferromagnetic materials subjected to alternating magnetic fields. Hysteresis loops of the secondary core of a transformer were obtained, visualizing them on the screen of an oscilloscope in the graphic form of voltage in a capacitor connected to the secondary winding as a function of the voltage measured in a resistor connected to the primary. Loops were obtained for five values of voltage applied to the primary of the transformer in the range of 160–220 V. An increase in coercive, remanent and maximum magnetization fields was observed with increasing primary voltage. The relative magnetic permeability curves show a maximum close to the coercive field values, and thus the non-linearity of the permeability with the magnetic field intensity was observed. Finally, with increasing voltage, the students estimated the power lost in 5 hysteresis curves associated with the rotation of magnetic dipoles and dynamic factors.

Keywords
Teaching Physics; Experiment; Magnetism; Magnetic Hysteresis


1. Introdução

A ciência é uma das maiores conquistas da nossa cultura e, portanto, a popularização do conhecimento científico deve representar um importante fator de inclusão e cidadania [1[1] M.B. Rocha, Revista Brasileira de Ensino de Ciência e Tecnologia 5, 47 (2012).]. Sendo assim, considera-se de importante relevância o direcionamento do ensino de física para conceitos relacionados aos avanços científicos e tecnológicos que revolucionaram o modo de vida moderno, mostrando aos estudantes quais são os fundamentos físicos existentes nos dispositivos modernos. Dentre os diversos avanços tecnológicos que vêm sendo desenvolvidos a milhares de anos, certamente a maior revolução tecnológica moderna deu-se a partir do século XVIII, pela valorização do pensamento científico (razão), hoje reconhecido como o movimento “iluminismo”. Fundamentalmente, foi a partir deste momento – até o atual – que o grande avanço nas ciências da natureza promoveu as revoluções industriais modernas [2[2] M.P. Santos, Imagens da Educação 3, 1 (2013).]. Em particular, do eletromagnetismo resultou uma “infinidade” de aplicações, tais como os motores e transformadores, amplamente empregados na vida cotidiana. Para o melhor desempenho dessas máquinas, faz-se o uso de materiais magnéticos que são facilmente magnetizados.

Laboratórios de pesquisa em física, energia e tecnologia de materiais empregam equipamentos de custos elevados para a investigação e caracterização de materiais magnéticos. Dentre eles citam-se os magnetômetros, tal como o magnetômetro de amostra vibrante (VSM) [3[3] A.P. Guimarães, Magnetismo e Ressonância Magnética em Sólidos (Editora da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009), v. 1, 1 ed., 4[4] https://portal.ifi.unicamp.br/servicos/equipamentos-de-acesso-controlado-eacs/quantum-design-ppms-physical-property-measurement-system, acessado em 10/01/2023.
https://portal.ifi.unicamp.br/servicos/e...
], a balança de Faraday, e aqueles que utilizam técnicas espectroscópicas como Espectrômetro Mössbauer e o de Ressonância Magnética [3[3] A.P. Guimarães, Magnetismo e Ressonância Magnética em Sólidos (Editora da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009), v. 1, 1 ed., 5[5] A.P. Guimarães, Revista Brasileira de Ensino de Física 22, 299 (2000).]. Geralmente, um grupo pequeno de estudantes tem contato com estas técnicas na graduação, por meio de uma iniciação científica, projetos de ensino ou seminários. Desta forma, faz-se necessário envolver o estudante com práticas experimentais, sejam elas simples ou sofisticadas, para que os mesmos possam vivenciar a física e compreender melhor suas áreas e aplicações no cotidiano, agregando mais em sua formação.

Neste trabalho, objetiva-se a construção de um aparato experimental para observar algumas das propriedades magnéticas de uma classe de materiais denominados de ferromagnéticos. O maior atrativo deste trabalho é de demonstrar ao estudante que a investigação científica, de complexidade relativamente elevada, nem sempre está limitada a grandes investimentos, em laboratórios de ponta. Especificamente, objetiva-se construir um aparato experimental para obter curvas de histerese, característicos de uma classe de materiais denominados de ferromagnéticos. As curvas, ou laços de histerese, serão obtidas para o núcleo ferromagnético de um transformador. O circuito a ser montado é relativamente simples; todos os materiais ´podem ser encontrados em um laboratório de física ou engenharia.

2. Aspectos Teóricos

2.1. Os campos B, H e M

Para mostrar ao estudante um comportamento interessante da matéria, pegue um “prego” comercial novo, feito de aço, adquirido em uma loja de construção, e aproxime-o de outros pregos. Possivelmente não haverá força de atração. Entretanto, se você construir um pequeno eletroímã com o mesmo, fazendo uma corrente elétrica circular na bobina do eletroímã, você verá que o prego terá a propriedade de atrair outros pregos. Nessa condição, diz-se que o prego se tornou magnetizado e o mesmo apresenta uma magnetização M, propriedade intrínseca dos ímãs associados a forças de atração e repulsão com outros ímãs. Mesmo após desligar a corrente do eletroímã, o prego ainda apresentará uma magnetização diferente de zero. Essa classe de materiais é denominada de ferromagnéticos [3[3] A.P. Guimarães, Magnetismo e Ressonância Magnética em Sólidos (Editora da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009), v. 1, 1 ed.].

Na experiência supracitada é importante realizar uma abordagem teórica, como a sugerida aqui. A aplicação da corrente elétrica num material ferromagnético, com magnetização nula, produz nele um campo denominado de intensidade magnética, H. Este campo gera um torque sobre todos os dipolos magnéticos do material; cada dipolo tenderá a seguir vetorialmente a direção e o sentido do campo H; a magnetização é então definida como a soma de todos os dipolos magnéticos por unidade de volume. Todo o material se comporta como um “grande” ímã, gerando uma indução magnética,B, dada por [3[3] A.P. Guimarães, Magnetismo e Ressonância Magnética em Sólidos (Editora da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009), v. 1, 1 ed., 5[5] A.P. Guimarães, Revista Brasileira de Ensino de Física 22, 299 (2000).]:

(1) B = μ 0 ( H + M ) ,

no qual μ0=4π10-7Tm/A é a permeabilidade magnética do vácuo. Para os materiais ferromagnéticos, tem-se que MH. São exemplos as ligas de Fe-Si, ligas de Ni-Mo, ligas amorfas e ligas nano cristalinas com prevalência de Fe [3[3] A.P. Guimarães, Magnetismo e Ressonância Magnética em Sólidos (Editora da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009), v. 1, 1 ed.]. Estas são comumente utilizadas em transformadores e motores elétricos.

O campo H depende de parâmetros geométricos, dos componentes elétricos utilizados (formato da bobina do eletroímã por exemplo) e da corrente elétrica, i. Já o campo B é definido para representar a intensidade magnética líquida em um ponto no material, ou seja, resultante da soma do campo magnético H, gerado por correntes elétricas, com a resposta magnética do material submetido ao campo magnético (magnetização M) (Equação (1)). Considerando uma faixa com dependência linear, M pode ser escrita na forma de proporcionalidade direta ao campo H[5[5] A.P. Guimarães, Revista Brasileira de Ensino de Física 22, 299 (2000).], segue que:

(2) M = χ H ,

e portanto, considerando a Equação (1):

(3) B = μ 0 ( 1 + χ ) H ,

no qual χ é definido como susceptibilidade magnética do ambiente submetido ao campoH. Define-se μ0(1+χ)μ como sendo a permeabilidade magnética do ambiente. Note que para um ambiente sem a presença de materiais/elementos magnéticos, μ=μ0, representando a permeabilidade magnética do vácuo. Define-se a permeabilidade relativa μr do material/ambiente relativo ao vácuo como [3[3] A.P. Guimarães, Magnetismo e Ressonância Magnética em Sólidos (Editora da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009), v. 1, 1 ed., 5[5] A.P. Guimarães, Revista Brasileira de Ensino de Física 22, 299 (2000).]:

(4) μ r = μ μ o ,

segue que:

(5) μ r = ( 1 + χ ) .

Como MH, segue da Equação (1) que BαM significa que uma curva B(H) possui mesma forma que uma curva M(H). As grandezas μr e χ, são comumente tabeladas para os mais diferentes tipos de materiais e dependem da magnitude de H. Por exemplo, para materiais ferromagnéticos são encontrados valores de χ entre 1.000 e 100.000, o que os tornam fortemente magnetizáveis quando submetidos a campos magnéticos [6[6] H.D. Young e R. A. Freedman, Física III – Eletromagnetismo (Pearson – Addison Wesley, São Paulo, 2009), v. 3, 12 ed.].

2.2. O transformador

O funcionamento de um transformador de tensão elétrica é baseado no princípio de indução de Faraday. Ele é composto por um núcleo ferromagnético – magneticamente mole – ao redor do qual são enrolados fios condutores. Em sua versão mais simples utiliza-se apenas duas bobinas, denominadas de primário e secundário, no qual se conectam, respectivamente, a tensão de entrada e a tensão de saída [7[7] S.J. Chapman, Fundamentos de Máquinas Elétricas (AMGH Editora Ltda, Porto Alegre, 2013), v. 1, 7 ed., 8[8] L. Balbinotti, Projeto de Transformador Monofásico com Núcleo UI. Trabalho de Conclusão de Curso, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Pato Branco (2021).]. Ao submeter-se a bobina primária a uma tensão alternada e, consequentemente, a uma corrente alternada, o núcleo fica submetido a um campo intensidade magnética,H, também alternado. Todos os dipolos magnéticos tendem a oscilar coerentemente, devido a corrente alternada na bobina primária, independente do formato do núcleo, possibilitando que a bobina secundária possa ser posicionada internamente e coaxialmente com o primário ou em qualquer outra região do núcleo, que pode se estender além dos limites do rolamento primário.

A alta susceptibilidade do núcleo do transformador promove um aumento significativo da concentração da energia magnética em seu interior, aumentando a eficiência de fornecimento energético para o secundário. Sem o núcleo, as linhas de campo magnético gerado pelo solenóide primário se dispersam pelo ambiente, diminuindo a eficiência de transmissão direta ao secundário. Desta forma, com o núcleo é possível aproximarmos a transmissão energética para seu valor máximo, tal que a potência de entrada tende a se aproximar ao valor da potência de saída. Como os campos gerados por corrente no primário e por indução no secundário são proporcionais aos respectivos números de espiras, pode-se demonstrar, para um transformador ideal com 100% de transmissão energética, que:

(6) V 1 V 2 = i 2 i 1 = N 1 N 2 ,

nos quais V1 e V2 são as respectivas tensões nos enrolamentos do primário e secundário do transformador; i1 e i2 as respectivas correntes e N1 e N2 são os respectivos números de espiras do primário e secundário [7[7] S.J. Chapman, Fundamentos de Máquinas Elétricas (AMGH Editora Ltda, Porto Alegre, 2013), v. 1, 7 ed.]. Para um transformador real com o secundário em aberto, as perdas energéticas são pequenas, pois apenas uma corrente, denominada de corrente de excitação, da ordem de 2–3% da corrente do transformado em plena carga prevalece [9[9] S.D. Umans, Máquinas elétricas (Editora AMG, Porto Alegre, 2007), v. 1, 7 ed.]. Esta corrente mínima é necessária para magnetizar o núcleo. Portanto, a Equação (6) pode ser aplicada, com aproximação razoável, na investigação de transformação de tensão em um transformador real.

2.3. Ferromagnetismo e a histerese magnética

Nos materiais ferromagnéticos não magnetizados, existem regiões, denominadas de domínios magnéticos. Neles os dipolos se acoplam paralelamente entre si (acoplamento ferromagnético). De uma região de domínio para outra, os dipolos magnéticos se apresentam em diferentes orientações, sendo separados por regiões denominadas “paredes de domínios”, tal como está ilustrado na Figura 1(a)[3[3] A.P. Guimarães, Magnetismo e Ressonância Magnética em Sólidos (Editora da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009), v. 1, 1 ed., 5[5] A.P. Guimarães, Revista Brasileira de Ensino de Física 22, 299 (2000).]. Nelas há distorções dos alinhamentos dos dipolos magnéticos que tendem a girar, entre um domínio e outro. Isto pode ser visto na ampliação da parede de domínio ilustrada na Figura 1(b).

Figura 1
(a) Ilustração bidimensional de uma estrutura de domínios magnéticos típica de estruturas cristalinas. (b) uma ampliação da região de paredes de domínio destacada com um círculo na parte (a).

As paredes de domínio existem devido ao balanço energético de três termos [10[10] L.J.A.S. Maldonado, Caracterização de Materiais Magnéticos a Baixo Custo Aplicada a Obtenção dos Parâmetros de um Dispositivo Eletromagnético. Dissertação de Mestrado, Universidade do Estado de Santa Catarina, Joinville (2015).]: (i) a interação de troca, que implica no alinhamento paralelo dos momentos magnéticos, (ii) a interação dipolar magnética, que implica no alinhamento antiparalelo para momentos magnéticos vizinhos e, (iii) a energia de anisotropia, um termo de energia devido à rede cristalina nos quais os átomos estão inseridos. Esta última favorece a direções bem definidas para a orientação dos momentos magnéticos (direções de fácil magnetização).

Experimentalmente é comum, e por simplicidade, apresentar-se curvas B(H) como representantes de curvas de magnetização. Devido às propriedades físicas de μ e a efeitos relacionados às correntes de Foucault, a curva B(H) no volume de um material magnético é do tipo não linear e tende a um máximo. A magnetização atinge um valor máximo quando um material submetido ao campo H atinge alinhamento magnético completo (saturação). Essa curva, obtida com o material inicialmente desmagnetizado é chamada de curva normal de magnetização (Figura 2).

Figura 2
Relação entre as magnitudes B e H numa curva típica de magnetização.

O ponto de saturação magnética costuma ser controverso entre os pesquisadores; isto é devido ao fato de que na maior parte dos casos a saturação é atingida de forma lenta e suave, tal que gera imprecisão na definição da condição de saturação. Concomitantemente, a saturação magnética dependente da temperatura, pois este é um fator que contribui para o desalinhamento magnético. Em geral considera-se que a saturação ocorra para regiões da curva B(H) horizontais (permeabilidade magnética nula). Visando uma análise geral, a saturação ocorre em regiões externas ao gráfico, indicando que deve ocorrer para H= (muito maiores que o atingido pelo equipamento disponível). Aqui denominaremos como Bmá x, a magnitude do campo obtido próximo a saturação.

Alguns termos utilizados nesse trabalho precisam ser definidos. A susceptibilidade e a permeabilidade magnéticas, definidas por, χM/H e μB/H, respectivamente, quando analisadas em diferentes pontos das curvas B(H) e M(H), devem ser consideradas por suas respectivas taxas locais de variação [10[10] L.J.A.S. Maldonado, Caracterização de Materiais Magnéticos a Baixo Custo Aplicada a Obtenção dos Parâmetros de um Dispositivo Eletromagnético. Dissertação de Mestrado, Universidade do Estado de Santa Catarina, Joinville (2015).], ou seja:

(7) μ d i f = B H ,
(8) χ d i f = M H .

É comum referir-se aos respectivos valores médios de μ e χ para variações não diferenciais, tal que:

(9) μ = Δ B Δ H ,
(10) χ = Δ M Δ H .

As curvas de histerese representam a forma com a qual a intensidade da magnetização, M, ou da indução magnética, B, de um material submetido a um campo, H, se comporta. Ela surge devido ao fato de M ou B não serem nulos após se retirar o campo H.

Uma curva de histerese é afetada por três fatores [10[10] L.J.A.S. Maldonado, Caracterização de Materiais Magnéticos a Baixo Custo Aplicada a Obtenção dos Parâmetros de um Dispositivo Eletromagnético. Dissertação de Mestrado, Universidade do Estado de Santa Catarina, Joinville (2015)., 12[12] E.J. Meures, Estudo das Perdas Magnéticas Interlaminares em Máquinas Elétricas. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis (2005).]: (i) histerese magnética, associada ao trabalho de alinhamento/reversão dos momentos de dipolo magnéticos e ao trabalho do movimento das estruturas de domínios magnéticos, (ii) correntes de Foucault, induzidas pela variação de campo magnético em núcleos condutores e (iii) perdas excedentes, cuja origem ainda é discutida na literatura; possivelmente associadas à efeitos de giros abruptos de momentos de dipolos magnéticos. Estas causam uma variação localmente intensa do campo magnético produzindo campos induzidos opostos ao campo H, de acordo com a lei de Faraday. Uma Equação teórica/experimental que leva em consideração todas essas perdas, relaciona a energia de perdas com funções polinomiais com o campo máximo, Bmá x, atingido numa curva de histerese [12[12] E.J. Meures, Estudo das Perdas Magnéticas Interlaminares em Máquinas Elétricas. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis (2005).].

Uma curva típica da magnitude de B em função da magnitude de H, em um ciclo na faixa de -Hmá xa+Hmá x, para diferentes valores de Hmá x, está representada na Figura 3(a)[12[12] E.J. Meures, Estudo das Perdas Magnéticas Interlaminares em Máquinas Elétricas. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis (2005)., 13[13] D.O.T. Filho e E. Laureto, Histerese Magnética, disponível em: http://www.uel.br/pessoal/fmelquiades/pages/arquivos/2FIS064/18b%20Histerese%20magn%C3%A9tica.pdf, acessado em 14/05/2023.
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]. Na Figura 3(b) estão apresentadas diversas curvas de histerese, que serão abordadas nos próximos parágrafos. Partindo do ponto “O” (H=B=0), na Figura 3(a) e elevando-se a magnitude de H, atinge-se a magnetização de saturação máxima, Mmá x, no ponto “a”. Ela é obtida para campos H acima do qual não se observam alterações significativas de B (ou M).

A subsequente retirada do campo H permite que a energia dipolar (que tenta reverter domínios magnéticos vizinhos), juntamente com a agitação térmica (que promove oscilações aleatórias dos momentos magnéticos), tentem levar a magnetização de volta ao valor inicial nulo. Contudo, barreiras energéticas internas associadas a anisotropias, tais como anisotropias magnetocristalinas, dificultam o retorno dos momentos magnéticos à configuração inicial. Desta forma, quando H=0, um percentual da magnetização estará temporariamente travado no sentido do campo H prévio, fazendo resultar em uma magnetização remanente, no ponto “b” da Figura 3(a), denotada por Br. Ressalta-se que se o campo H for mantido nulo por um tempo suficientemente “grande”, a magnetização tenderá à zero devido aos efeitos dipolar e térmico. isto confere uma característica temporal do ciclo de histerese, ou seja, quanto mais lento for o processo de acréscimo/decréscimo do campo H, menor será o campo remanente Br.

Figura 3
(a) Laço de histereses para diferentes campos Bmá xs. Fonte: referência “13”. (b) conjunto de curvas de histerese. Cada laço é obtido partindo de uma condição de magnetização inicial zero, seguindo a curva normal de magnetização.

Para um acréscimo/decréscimo na magnitude H, a curva ultrapassa o eixo vertical de forma suave no sentido negativo. Quando a magnetização volta a ser nula (Br=0), no ponto “c” define-se o campo magnético coercivo Hc– campo necessário para levar o sistema, forçadamente (daí o termo “coercivo), à condição de magnetização nula (passagem pelo eixo H). Para ciclos simétricos o ponto de magnetização nula coincide com os pontos de maior susceptibilidade magnética μmá x do núcleo. Seguindo com o aumento negativo de H, atinge-se a saturação reversa no ponto “c”, simetricamente posicionado em relação à origem do sistema coordenado. Subsequente acréscimo de H gera um ciclo completo, denominado ciclo de histerese. Obtém-se de forma análoga os campo remanente e coercivo nos pontos “e” e “f” respectivamente, na curva em azul [11[11] M. Januário, Modelagem de Transformadores em Função da Frequência. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis (2007)., 13[13] D.O.T. Filho e E. Laureto, Histerese Magnética, disponível em: http://www.uel.br/pessoal/fmelquiades/pages/arquivos/2FIS064/18b%20Histerese%20magn%C3%A9tica.pdf, acessado em 14/05/2023.
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].

Na ilustração da Figura 3(b), a curva normal de magnetização está representada em preto na parte direita do gráfico. Cada ponto em vermelho representa o valor de Bmá x atingido para uma dada magnitude de H. A área de cada curva de histerese depende do trabalho necessário para reverter momentos magnéticos previamente alinhados; nota-se que quanto maior a “dificuldade” de reversão, maiores tendem a ser os valores do campo remanente, Br, e do campo coercivo, Hc. Assim, a área delimitada pelo ciclo de histerese é proporcional à energia perdida por ciclo (Uciclo). Mantendo-se a frequência da fonte constante, observa-se que quanto maior o valor de Bmá x maior é a área da curva de histerese e consequentemente maiores os valores de Br,Hc e Uciclo. Como já discutido, os fatores de perda histerético e dinâmicos, associados a área da curva dependerão da magnitude atingida de Bmá x.

Neste trabalho, a magnitude do campo magnético H, no núcleo do transformador, é medida indiretamente pela tensão elétrica, VR, em um resistor (de resistência, RP) conectado ao primário do transformador [13[13] D.O.T. Filho e E. Laureto, Histerese Magnética, disponível em: http://www.uel.br/pessoal/fmelquiades/pages/arquivos/2FIS064/18b%20Histerese%20magn%C3%A9tica.pdf, acessado em 14/05/2023.
http://www.uel.br/pessoal/fmelquiades/pa...
, 14[14] J.A. Barbosa, M.H.R. Bernardo, R.B. Oliveira, R.S. Silva e I.A.J.W.S. Meireles, Revista META 1, 330 (2016).]. A magnitude de B é medida indiretamente pela tensão elétrica (VC) num capacitor em série a um resistor, conectado na saída do secundário do transformador. As tensões são medidas com o uso de um osciloscópio e a curva da magnitude de B, em função da magnitude deH, pode ser visualizada na tela deste, no modo XY.

3. Cálculos Teóricos para a Confecção do Transformador

A relação entre voltagem de entrada Vp e voltagem de saída Vs em um transformador é dada pela Equação (6). Esta relação diz que se N2=2N1 então V2=2V1; portanto, pode-se levar a seguinte questão para o estudante: “bastaria uma espira primária com uma única volta e uma secundária com duas voltas para conseguir-se duplicar qualquer voltagem?”. Isto não é o que se observa experimentalmente; de fato nota-se que existe uma relação entre a área magnética efetiva (Am) atravessada pelo campo magnético gerado pelos enrolamentos condutores ao seu redor com o número de espiras enroladas ao redor do núcleo. Quanto menor o número de espiras maior deve ser Am e quanto menor Am maior deve ser o número de espiras. Concomitante, a potência que se pretende operar também determina características internas do transformador. Para transformadores monofásicos com lâminas padronizadas (cada chapa do núcleo formada por uma lâmina em formato de “E” junta com uma em formato de “I” – Figura 4), a relação entre a área efetiva Am, a frequência de operação f e a potência de operação do secundário Ps é dada por [16[16] C.A. Mangialardo, Projeto de Execução de Transformador Monofásico no Matlab. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curitiba (2017)., 17[17] T.C.S. Lopes e V.P.B. Aguiar, Projeto e Análise de Parâmetros de Operação de um Autotransformador. Trabalho de Conclusão de Curso, Universidade Federal Rural do Semiárido, Mossoró (2018).]:

Figura 4
Lâminas ferromagnéticas do tipo padronizadas. Cada chapa do empilhamento é composta por uma unidade em forma de “E” juntada a uma outra em forma de “I”.
(11) P S = f ( A m 7 , 5 ) 2 .

Considerando que existem “perdas de área”, pelo fino espaçamento e camadas de material isolante entre uma lâmina e outra, estima-se experimentalmente uma perda de 10 % do fluxo do campo magnético que passa pelas lâminas [16[16] C.A. Mangialardo, Projeto de Execução de Transformador Monofásico no Matlab. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curitiba (2017)., 17[17] T.C.S. Lopes e V.P.B. Aguiar, Projeto e Análise de Parâmetros de Operação de um Autotransformador. Trabalho de Conclusão de Curso, Universidade Federal Rural do Semiárido, Mossoró (2018).]. Assim, a área efetiva é calculada como:

(12) A m = A g - 10 % A g = 0 , 9 A g ,

no qual Ag é a área geométrica (lâminas mais espaçamentos) medida experimentalmente. Mediu-se: Ag=(18,4±0,4)cm2. De acordo com a Equação (12), tem-se: Am=(16,6±0,4)cm2. Inserindo a frequência utilizada, f=60Hz, obtém-se PS=(290¯±10¯)W como a capacidade de entrega de potência a uma carga acoplado ao secundário.

Para o primário, tem-se: PP=1,1.(290¯±10¯)W=(320¯±10¯)W. O fator experimental, 1,1, leva em consideração as perdas de potência total do primário para o secundário do transformador [17[17] T.C.S. Lopes e V.P.B. Aguiar, Projeto e Análise de Parâmetros de Operação de um Autotransformador. Trabalho de Conclusão de Curso, Universidade Federal Rural do Semiárido, Mossoró (2018).]. As correntes (is) em ambos os enrolamentos podem ser calculadas de acordo com a Equação:

(13) i = P V .

Considerando os valores calculados de PP e PS e que as tensões no primário e secundário são VP=220V e VS=110V, respectivamente, tem-se para as correntes no primário e secundário, os valores de iP=(1,46±0,05)A e iS=(2,66±0,05)A, respectivamente.

Para o cálculo da área de seção transversal dos condutores é preciso levar em consideração a densidade de corrente,j. Na Tabela 1 encontram-se as recomendações padronizadas da densidade de corrente relativas às potências [17[17] T.C.S. Lopes e V.P.B. Aguiar, Projeto e Análise de Parâmetros de Operação de um Autotransformador. Trabalho de Conclusão de Curso, Universidade Federal Rural do Semiárido, Mossoró (2018).].

Tabela 1
Densidade de corrente recomendada com relação a potência.

Dessa forma para PPPS300W tem-se que j=3,0A/mm2. Essa densidade de corrente é definida como a razão entre a corrente (i) e a área, A, de seção reta do condutor:

(14) j = i A .

Utilizando os valores de corrente previamente calculados, tem-se que as áreas de seção reta dos condutores no primário e secundário são, respectivamente: AP=(0,49±0,02)mm2 e AS=(0,89±0,02)mm2. De acordo com a tabela para condutores elétricos AWG (American Wire Gauge) a numeração a ser utilizada no primário deve ser 20 AWG (0,4mm2) e no secundário 17 AWG (0,89mm2).

O número de espiras, N, em uma dada bobina pode ser calculada de acordo com a Equação [16, 17]:

(15) N = V 2 π f B m á x A m 10 - 4 ,

no qual Bmá x é o máximo da indução magnética, em Tesla; nessa fórmula, Am deve ser inserida em unidades de cm2. Recomenda-se utilizar o valor de Bmá x, próximo à “saturação” do Fe-Si. Aqui utilizou-se Bmá x=1,13T[16[16] C.A. Mangialardo, Projeto de Execução de Transformador Monofásico no Matlab. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curitiba (2017).]. Com isto, o número de espiras calculadas para o primário e secundário, são respectivamente, NP=441 e NS=227. Em ambos os enrolamentos, os cálculos realizados pelos estudantes demonstram que a incerteza nessas grandezas é da ordem de 10 espiras.

4. Aspectos Construtivos do Transformador com Núcleo em “E”

Na Figura 5 está mostrado uma das partes do núcleo central para determinação dos dimensionamentos supracitados. As lâminas de material ferromagnético foram “emplilhadas” até que a área, A, de seção reta do núcleo, representada em amarelo, tenha dimensões cuja área seja equivalente à de um quadrado. Nas partes esquerda e direita da Figura 5 estão indicadas por L1 e L2 os respectivos comprimentos das “pernas” laterais. O comprimento do núcleo, para efeitos de construção, é calculado como L=L1+L2[16[16] C.A. Mangialardo, Projeto de Execução de Transformador Monofásico no Matlab. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curitiba (2017).]. Embora neste trabalho, o formato das lâminas utilizadas não seja semelhante ao da Figura 4, estas quando fechadas para atuarem como núcleo, apresentará o formato padronizado em “E”. As lâminas foram adquiridas nas sucatas de uma empresa de recuperação de motores e transformadores, em São Mateus, ES.

Figura 5
Lâminas de Fe-Si empilhadas para a determinação da área de seção reta do núcleo.

As bobinas foram enroladas em um carretel, construído utilizando um papel grosso tipo o paraná ou o papel cartão. O carretel, mostrado na Figura 6(a), foi construído em um molde de madeira. Na Figura 6(b) é mostrado a parte central do carretel em torno do molde de madeira. Uma tira do papel com a mesma largura que o comprimento, L, do núcleo central, foi utilizada para a construção da parte central do carretel. Esta, por sua vez, foi envolta em torno do molde de madeira, até que se obtenha uma forma retangular rígida. Posteriormente, as abas laterais foram coladas. Para a colagem das partes do carretel foi utilizada uma cola de alta fixação tipo tec-bond®. Para mais detalhes, os leitores podem consultar a os procedimentos utilizados por Alves et al. (2022) [18[18] A.L. Alves, E.M. Souza, C.P. Machado, K.A. Littike e D.M.S. Silva, Revista Brasileira de Ensino de Física 44, (2022).].

Figura 6
(a) O carretel construído, com as abas laterais coladas. (b) Inserção do molde e colagem de pedaços de madeira para enrolamento das bobinas.

O enrolamento foi feito de forma manual, ilustrado na Figura 7(a). Primeiro realizou-se o enrolamento das bobinas do primário do transformador; toda vez que uma camada de espiras chegava até o final do carretel, colocava-se uma folha de papel Chamex® para que pudesse ser realizado um novo conjunto de espiras. Na Figura 7(b), encontra-se o transformador construído. Os dois condutores mais finos que saem à esquerda nessa Figura são o início e o fim do enrolamento primário. Os condutores mais espessos à direita pertencem ao enrolamento do secundário. Após o enrolamento das bobinas no carretel, as lâminas do núcleo tiveram de ser encaixadas no orifício do carretel. Esse encaixe foi realizado colocando-se as lâminas uma a uma e em posições alternadas, para um melhor aproveitamento do o fluxo magnético [18[18] A.L. Alves, E.M. Souza, C.P. Machado, K.A. Littike e D.M.S. Silva, Revista Brasileira de Ensino de Física 44, (2022).].

Figura 7
(a) Uma etapa do enrolamento do núcleo. (b) O transformador confeccionado pelos estudantes.

5. Metodologia Teórico/Experimental para a Obtenção do Laço de Histerese

Para a obtenção do laço de histerese no núcleo do transformador, foram utilizadas as metodologias descritas nas referências “13 e 14”. Na Figura 8 está ilustrado o circuito utilizado pelos estudantes para a obtenção das curvas de histerese. Na Figura 9 está mostrado o circuito construído pelos estudantes e as grandezas elétricas medidas.

Figura 8
Diagrama do circuito com simbologias e valores de grandezas físicas utilizadas.
Figura 9
Aparato experimental montado para a obtenção da curva de histerese.

O circuito consiste de um resistor, RP=1Ω e P=5W, ligado em série com a bobina do primário, no qual foi inicialmente alimentado com uma tensão eficaz de 220 V. Na ilustração da Figura 8, CH1 e CH2 representam as entradas dos canais 1 e 2 do osciloscópio, respectivamente. O cabo em comum do osciloscópio, no qual se designa por “ref” é conectado ao aterramento, feito entre as bobinas primárias e secundárias do transformador.

Na bobina do secundário, foi utilizado um circuito do tipo integrador no qual um resistor, RS=102,1kΩ, é ligado em série a um capacitor de capacitância, C=2,16μF (veja a ampliação na Figura 9). Aqui deve ser satisfeita a condição de que RSXC=1/(2πfC), no qual XC é a reatância capacitiva do capacitor e f=60Hz é a frequência utilizada [13[13] D.O.T. Filho e E. Laureto, Histerese Magnética, disponível em: http://www.uel.br/pessoal/fmelquiades/pages/arquivos/2FIS064/18b%20Histerese%20magn%C3%A9tica.pdf, acessado em 14/05/2023.
http://www.uel.br/pessoal/fmelquiades/pa...
]. A tensão eficaz de saída no secundário, medida com um multímetro foi da ordem de 112 V, corroborando com a teoria, apresentada na seção 1. O valor medido para a corrente no primário, ip=1,82A, é praticamente aquela do transformador em aberto, visto que o valor de RS é elevado, fazendo com que a corrente no secundário, iS0. Esta é então a corrente de excitação. O valor relativamente alto para esta corrente está associado a fatores construtivos como por exemplo o espaçamento entre uma lâmina e o isolamento “parcialmente comprometido” entre as mesmas.

A tensão aplicada ao primário do transformador é do tipo alternada e assim os campos H e B no núcleo do transformador variarão no tempo, mas com funções de oscilação diferentes da rede [13[13] D.O.T. Filho e E. Laureto, Histerese Magnética, disponível em: http://www.uel.br/pessoal/fmelquiades/pages/arquivos/2FIS064/18b%20Histerese%20magn%C3%A9tica.pdf, acessado em 14/05/2023.
http://www.uel.br/pessoal/fmelquiades/pa...
]. Utilizando a lei de Ampère para a magnitude do campo H(t) produzido pelas bobinas do primário e secundário e, levando em consideração que iSiP, pode se demonstrar que:

(16) H ( t ) = N p l i P = N p l R p V R ( t ) ,

no qual VR é a tensão no resistor do primário, l é o comprimento médio do núcleo do transformador, atravessado pelo campo H e Np é o número de espiras no primário. Dessa forma, H(t) é proporcional a tensão na saída do resistor, conectado ao primário. Essa leitura é feita com o canal CH1 do osciloscópio, conforme ilustrado na Figura 8.

Utilizando a lei de indução de Faraday para o fluxo do campo B(t) no núcleo do transformador e, levando em consideração que RSXC no circuito integrador do secundário, é possível demonstrar que:

(17) B ( t ) = R s C N s A V c ( t ) ,

no qual “A” é a área de seção reta do núcleo e Vc é a tensão medida no capacitor [13[13] D.O.T. Filho e E. Laureto, Histerese Magnética, disponível em: http://www.uel.br/pessoal/fmelquiades/pages/arquivos/2FIS064/18b%20Histerese%20magn%C3%A9tica.pdf, acessado em 14/05/2023.
http://www.uel.br/pessoal/fmelquiades/pa...
, 20]. Assim a magnitude do campo B(t) é proporcional a tensão Vc(t) no capacitor. A leitura dessa tensão é feita com o canal CH2 do osciloscópio. Para a geração gráfica simultânea de VR(t) e VC(t), o osciloscópio deve operar no modo XY, exibindo as medidas de tensão do canal CH1 (VR) no eixo vertical e do canal CH2 (VC) no eixo horizontal. Uma vez obtida a curva de histerese, os valores de campo remanente, campos coercivos e a potência perdida devido a histerese podem ser determinadas.

A área delimitada pela curva de histerese, representa a densidade de energia, u, perdida por ciclo de oscilação da tensão alternada e por unidade de volume. Esta pode ser calculada pela integral:

(18) u = B d H .

Utilizando as Equações (16) e (17) demonstra-se que:

(19) B d H = R s C N P R P N s . v o l V c d V R .

Esta relação fornece a área delimitada por um ciclo de histerese magnética, dada em unidades de “Volt2”. O osciloscópio utilizado não nos permitiu obter essa área e então, um método de obtenção indireta dessa área teve de ser utilizado (veja a seção 6.2). Um método alternativo para a estimativa de pontos experimentais também foi realizado. O leitor pode consultar o Apêndice I para verificar os resultados.

Como u corresponde à densidade de energia na região submetida aos campos H e B proporcionais à VR e VC, respectivamente, resulta que a energia total perdida por ciclo, U, é dada pelo produto de ucom o volume do núcleo no qual o fluxo dos campos percorrem. Para um núcleo da área transversal A, e comprimento delimitado, l, temos que: vol=Al. A energia perdida em um ciclo é então:

(20) U = u . v o l = R s C N P R P N s V c d V R .

Para a potência de perda, P, basta multiplicar a Equação (20) pela quantidade de ciclos por segundo, ou seja, pela frequência, tal que:

(21) P = R s C N P R P N s f V C d V R .

6. Resultados e Discussões

6.1. Obtendo a curva de histerese

Na Figura 10 estão representadas as formas de onda para VR(t) e VC(t), obtidas com a montagem ilustrada na Figura 8 e utilizando um osciloscópio modelo Minipa MO 2000, no modo de operação YT. Observa-se que a forma de onda para VC(t) segue um padrão senoidal, enquanto que VP apresenta regiões irregulares resultantes do “freamento” da corrente elétrica de magnetização, im, nos momentos de inversão da magnetização do núcleo ferromagnético – imediatamente acima e abaixo do eixo horizontal nos momentos de acréscimo e decréscimo, respectivamente, de VR. Na literatura, este efeito é atribuído às respostas magnéticas não lineares do núcleo [9[9] S.D. Umans, Máquinas elétricas (Editora AMG, Porto Alegre, 2007), v. 1, 7 ed.]; aqui sugerimos uma interpretação mais objetiva.

Figura 10
Formas de onda para VP(t) (em azul, CH1) e VC(t) (em amarelo, CH2).

Consideramos que toda vez que a magnetização passa pelo momento de reversão de sentido – o que ocorre de forma ligeiramente atrasada em relação à corrente de magnetização – sua taxa de variação atinge valor máximo. Este processo gera variação no fluxo magnético que tende a frear mais intensamente im, proporcional à VR, devido à reatância indutiva sobre o solenoide primário. Adicionalmente, observa-se que os máximos para as curvas de VR(t) e VC(t) acima e abaixo do eixo dos tempos, ocorrem no mesmo instante (muito próximos), enquanto que os valores nulos ocorrem em instantes claramente diferentes, corroborando a hipótese sugerida, pois diferente dos momentos de reversão magnética, em pontos próximos aos picos de máximos ou mínimos as taxas de variações são mínimas, tal que a reatância indutiva também é nula. Por outro lado, a corrente no solenoide secundário (i2) resulta quase que unicamente do campo gerado pela magnetização, tal que o “freio” na corrente do solenoide primário não produz variações significativas em i2; o que explica a forma suave verificada para a curva VC(t).

O ciclo de histerese, em termos dos campos H e B, pode ser obtido de sua respectiva correlação com VR(t) e VC(t), dadas pelas Equações (16) e (17). O resultado, para diferentes amplitudes de tensões aplicadas ao rolamento primário, está apresentado na Figura 11. Para as conversões utilizou-se NP=441, RP=1Ω, l=0,47m, NS=227, RS=102,1kΩ, C=2,16μF, Ag=8,4×10-4m2. Com os valores dessas grandezas, resulta que as escalas, e, horizontal e vertical são, respectivamente, eH=38A/mdivisã o e eB=0,12Tdivisã o.

Figura 11
Fotos de curvas de histerese, vistas na tela do osciloscópio. Cada curva foi obtida para uma dada tensão aplicada no primário.

Com esses dados foi possível estimar o campo coercivo, HC, o campo remanente, Br, e o campo máximo, Bmá x, calculados de acordo com as Equações (22), (23) e (24), respectivamente.

(22) H C = | H 1 C | + | H 2 C | 2 ,
(23) B r = | B 1 r | + | B 2 r | 2 ,
(24) B m á x = | B 1 m á x | + | B 2 m á x | 2 .

Os valores calculados para essas grandezas, para VP=220V, estão apresentados na Figura 11(a). Representações semelhantes podem ser colocadas para as Figuras 11(a)(c). Entretanto, para uma melhor visualização da relação entre os valores de HC, Br e Bmá x em função de Vp construiu-se gráficos, apresentados na Figura 12(a). Observa-se um aumento nos valores de todas as grandezas medidas com o aumento de Vp, no qual Bmá x é proporcional. Esta observação está de acordo com o aumento da curva de histerese com Bmá x, conforme discutido nos últimos parágrafos da seção2.3 2.3. Ferromagnetismo e a histerese magnética Nos materiais ferromagnéticos não magnetizados, existem regiões, denominadas de domínios magnéticos. Neles os dipolos se acoplam paralelamente entre si (acoplamento ferromagnético). De uma região de domínio para outra, os dipolos magnéticos se apresentam em diferentes orientações, sendo separados por regiões denominadas “paredes de domínios”, tal como está ilustrado na Figura 1(a)[3, 5]. Nelas há distorções dos alinhamentos dos dipolos magnéticos que tendem a girar, entre um domínio e outro. Isto pode ser visto na ampliação da parede de domínio ilustrada na Figura 1(b). Figura 1 (a) Ilustração bidimensional de uma estrutura de domínios magnéticos típica de estruturas cristalinas. (b) uma ampliação da região de paredes de domínio destacada com um círculo na parte (a). Fonte: o autor. As paredes de domínio existem devido ao balanço energético de três termos [10]: (i) a interação de troca, que implica no alinhamento paralelo dos momentos magnéticos, (ii) a interação dipolar magnética, que implica no alinhamento antiparalelo para momentos magnéticos vizinhos e, (iii) a energia de anisotropia, um termo de energia devido à rede cristalina nos quais os átomos estão inseridos. Esta última favorece a direções bem definidas para a orientação dos momentos magnéticos (direções de fácil magnetização). Experimentalmente é comum, e por simplicidade, apresentar-se curvas B⁢(H) como representantes de curvas de magnetização. Devido às propriedades físicas de μ e a efeitos relacionados às correntes de Foucault, a curva B⁢(H) no volume de um material magnético é do tipo não linear e tende a um máximo. A magnetização atinge um valor máximo quando um material submetido ao campo H→ atinge alinhamento magnético completo (saturação). Essa curva, obtida com o material inicialmente desmagnetizado é chamada de curva normal de magnetização (Figura 2). Figura 2 Relação entre as magnitudes B e H numa curva típica de magnetização. Fonte: referência “11”. O ponto de saturação magnética costuma ser controverso entre os pesquisadores; isto é devido ao fato de que na maior parte dos casos a saturação é atingida de forma lenta e suave, tal que gera imprecisão na definição da condição de saturação. Concomitantemente, a saturação magnética dependente da temperatura, pois este é um fator que contribui para o desalinhamento magnético. Em geral considera-se que a saturação ocorra para regiões da curva B⁢(H→) horizontais (permeabilidade magnética nula). Visando uma análise geral, a saturação ocorre em regiões externas ao gráfico, indicando que deve ocorrer para H=∞ (muito maiores que o atingido pelo equipamento disponível). Aqui denominaremos como Bm⁢á ⁢x, a magnitude do campo obtido próximo a saturação. Alguns termos utilizados nesse trabalho precisam ser definidos. A susceptibilidade e a permeabilidade magnéticas, definidas por, χ≡M/H e μ≡B/H, respectivamente, quando analisadas em diferentes pontos das curvas B⁢(H) e M⁢(H), devem ser consideradas por suas respectivas taxas locais de variação [10], ou seja: (7) μ d ⁢ i ⁢ f = ∂ ⁡ B ∂ ⁡ H , (8) χ d ⁢ i ⁢ f = ∂ ⁡ M ∂ ⁡ H . É comum referir-se aos respectivos valores médios de ⟨μ⟩ e ⟨χ⟩ para variações não diferenciais, tal que: (9) ⟨ μ ⟩ = Δ ⁢ B Δ ⁢ H , (10) ⟨ χ ⟩ = Δ ⁢ M Δ ⁢ H . As curvas de histerese representam a forma com a qual a intensidade da magnetização, M→, ou da indução magnética, B→, de um material submetido a um campo, H→, se comporta. Ela surge devido ao fato de M→ ou B→ não serem nulos após se retirar o campo H→. Uma curva de histerese é afetada por três fatores [10, 12]: (i) histerese magnética, associada ao trabalho de alinhamento/reversão dos momentos de dipolo magnéticos e ao trabalho do movimento das estruturas de domínios magnéticos, (ii) correntes de Foucault, induzidas pela variação de campo magnético em núcleos condutores e (iii) perdas excedentes, cuja origem ainda é discutida na literatura; possivelmente associadas à efeitos de giros abruptos de momentos de dipolos magnéticos. Estas causam uma variação localmente intensa do campo magnético produzindo campos induzidos opostos ao campo H→, de acordo com a lei de Faraday. Uma Equação teórica/experimental que leva em consideração todas essas perdas, relaciona a energia de perdas com funções polinomiais com o campo máximo, Bm⁢á ⁢x, atingido numa curva de histerese [12]. Uma curva típica da magnitude de B→ em função da magnitude de H→, em um ciclo na faixa de -Hm⁢á ⁢x⁢a+Hm⁢á ⁢x, para diferentes valores de Hm⁢á ⁢x, está representada na Figura 3(a)[12, 13]. Na Figura 3(b) estão apresentadas diversas curvas de histerese, que serão abordadas nos próximos parágrafos. Partindo do ponto “O” (H=B=0), na Figura 3(a) e elevando-se a magnitude de H→, atinge-se a magnetização de saturação máxima, M→m⁢á ⁢x, no ponto “a”. Ela é obtida para campos H→ acima do qual não se observam alterações significativas de B→ (ou M→). A subsequente retirada do campo H→ permite que a energia dipolar (que tenta reverter domínios magnéticos vizinhos), juntamente com a agitação térmica (que promove oscilações aleatórias dos momentos magnéticos), tentem levar a magnetização de volta ao valor inicial nulo. Contudo, barreiras energéticas internas associadas a anisotropias, tais como anisotropias magnetocristalinas, dificultam o retorno dos momentos magnéticos à configuração inicial. Desta forma, quando H→=0, um percentual da magnetização estará temporariamente travado no sentido do campo H→ prévio, fazendo resultar em uma magnetização remanente, no ponto “b” da Figura 3(a), denotada por Br. Ressalta-se que se o campo H→ for mantido nulo por um tempo suficientemente “grande”, a magnetização tenderá à zero devido aos efeitos dipolar e térmico. isto confere uma característica temporal do ciclo de histerese, ou seja, quanto mais lento for o processo de acréscimo/decréscimo do campo H→, menor será o campo remanente B→r. Figura 3 (a) Laço de histereses para diferentes campos Bm⁢á ⁢x′⁢s. Fonte: referência “13”. (b) conjunto de curvas de histerese. Cada laço é obtido partindo de uma condição de magnetização inicial zero, seguindo a curva normal de magnetização. Fonte: referência “15”. Para um acréscimo/decréscimo na magnitude H, a curva ultrapassa o eixo vertical de forma suave no sentido negativo. Quando a magnetização volta a ser nula (Br=0), no ponto “c” define-se o campo magnético coercivo H→c– campo necessário para levar o sistema, forçadamente (daí o termo “coercivo), à condição de magnetização nula (passagem pelo eixo H). Para ciclos simétricos o ponto de magnetização nula coincide com os pontos de maior susceptibilidade magnética μm⁢á ⁢x do núcleo. Seguindo com o aumento negativo de H→, atinge-se a saturação reversa no ponto “c”, simetricamente posicionado em relação à origem do sistema coordenado. Subsequente acréscimo de H→ gera um ciclo completo, denominado ciclo de histerese. Obtém-se de forma análoga os campo remanente e coercivo nos pontos “e” e “f” respectivamente, na curva em azul [11, 13]. Na ilustração da Figura 3(b), a curva normal de magnetização está representada em preto na parte direita do gráfico. Cada ponto em vermelho representa o valor de Bm⁢á ⁢x atingido para uma dada magnitude de H→. A área de cada curva de histerese depende do trabalho necessário para reverter momentos magnéticos previamente alinhados; nota-se que quanto maior a “dificuldade” de reversão, maiores tendem a ser os valores do campo remanente, Br, e do campo coercivo, Hc. Assim, a área delimitada pelo ciclo de histerese é proporcional à energia perdida por ciclo (≡Uc⁢i⁢c⁢l⁢o). Mantendo-se a frequência da fonte constante, observa-se que quanto maior o valor de Bm⁢á ⁢x maior é a área da curva de histerese e consequentemente maiores os valores de Br,Hc e Uc⁢i⁢c⁢l⁢o. Como já discutido, os fatores de perda histerético e dinâmicos, associados a área da curva dependerão da magnitude atingida de Bm⁢á ⁢x. Neste trabalho, a magnitude do campo magnético H→, no núcleo do transformador, é medida indiretamente pela tensão elétrica, VR, em um resistor (de resistência, RP) conectado ao primário do transformador [13, 14]. A magnitude de B→ é medida indiretamente pela tensão elétrica (VC) num capacitor em série a um resistor, conectado na saída do secundário do transformador. As tensões são medidas com o uso de um osciloscópio e a curva da magnitude de B→, em função da magnitude deH→, pode ser visualizada na tela deste, no modo XY. .

Figura 12
(a) Magnitudes de Bmá x, Br e HC em função de VP. (b) Valores de μ/μo em função de H para as tensões de 220 V e 160 V.

Na Figura 12(b) estão apresentados os valores calculados para a permeabilidade média relativa, definida como μ/μo, para as tensões de 220 V e 160 V. Os gráficos foram obtidos para a parte superior das respectivas curvas de histerese. Esta tarefa, desenvolvida pelos estudantes, foi feita “na mão”. Com uma régua foi possível calcular a inclinação média da curva de histerese, para passos no campo H equivalentes a 2 traços na horizontal. Foi possível constatar, por meio dessas curvas, que a permeabilidade relativa possui poucas variações nas regiões próximas à saturação e que ela é máxima em regiões no qual M0 em HHC.

Nas regiões correspondentes a altos valores de campo muitos dipolos magnéticos já estão orientados na direção do campo, H sendo necessário maiores valores de campo para girar os momentos de dipolo magnético. Nas regiões correspondentes a baixos valores de campo H a magnetização é predominada por movimentos das paredes de domínio [3[3] A.P. Guimarães, Magnetismo e Ressonância Magnética em Sólidos (Editora da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009), v. 1, 1 ed., 5[5] A.P. Guimarães, Revista Brasileira de Ensino de Física 22, 299 (2000).]. Prevalecem domínios nos quais os momentos de dipolo magnético apresentam uma orientação na direção do campo aplicado. Para baixo valores de campo H a quantidade de momentos de dipolos que tendem a se orientarem na direção do campo é relativamente maior do que aqueles para regiões de H altos; espera-se que a permeabilidade relativa apresentará maiores valores para baixos valores de H.

Adicionalmente, observa-se na Figura 12(b) um deslocamento para a esquerda no máximo de μ/μo para a curva de 220 V relativo ao máximo da curva de 160 V. Esse comportamento é esperado de acordo com o discutido na seção2.2 2.2. O transformador O funcionamento de um transformador de tensão elétrica é baseado no princípio de indução de Faraday. Ele é composto por um núcleo ferromagnético – magneticamente mole – ao redor do qual são enrolados fios condutores. Em sua versão mais simples utiliza-se apenas duas bobinas, denominadas de primário e secundário, no qual se conectam, respectivamente, a tensão de entrada e a tensão de saída [7, 8]. Ao submeter-se a bobina primária a uma tensão alternada e, consequentemente, a uma corrente alternada, o núcleo fica submetido a um campo intensidade magnética,H→, também alternado. Todos os dipolos magnéticos tendem a oscilar coerentemente, devido a corrente alternada na bobina primária, independente do formato do núcleo, possibilitando que a bobina secundária possa ser posicionada internamente e coaxialmente com o primário ou em qualquer outra região do núcleo, que pode se estender além dos limites do rolamento primário. A alta susceptibilidade do núcleo do transformador promove um aumento significativo da concentração da energia magnética em seu interior, aumentando a eficiência de fornecimento energético para o secundário. Sem o núcleo, as linhas de campo magnético gerado pelo solenóide primário se dispersam pelo ambiente, diminuindo a eficiência de transmissão direta ao secundário. Desta forma, com o núcleo é possível aproximarmos a transmissão energética para seu valor máximo, tal que a potência de entrada tende a se aproximar ao valor da potência de saída. Como os campos gerados por corrente no primário e por indução no secundário são proporcionais aos respectivos números de espiras, pode-se demonstrar, para um transformador ideal com 100% de transmissão energética, que: (6) V 1 V 2 = i 2 i 1 = N 1 N 2 , nos quais V1 e V2 são as respectivas tensões nos enrolamentos do primário e secundário do transformador; i1 e i2 as respectivas correntes e N1 e N2 são os respectivos números de espiras do primário e secundário [7]. Para um transformador real com o secundário em aberto, as perdas energéticas são pequenas, pois apenas uma corrente, denominada de corrente de excitação, da ordem de 2–3% da corrente do transformado em plena carga prevalece [9]. Esta corrente mínima é necessária para magnetizar o núcleo. Portanto, a Equação (6) pode ser aplicada, com aproximação razoável, na investigação de transformação de tensão em um transformador real. no qual as curvas de histerese apresentam maiores valores de HC, Br, e Bmá x, com o aumento no máximo do campo H.

6.2. Cálculo da potência de perdas

A obtenção da área delimitada pelos ciclos de histereses não pode, neste caso, ser obtida analiticamente. Optou-se pela utilização de um método alternativo, tradicionalmente comum nestes casos.

O método: Imprime-se a curva (tal como obtida no painel do osciloscópio) em seu formato retangular original, mantendo as mesmas escalar x e y. A área desta folha é definida por AR, e é facilmente calculada por ser retangular (Figura 13(a)). Sua área, após conversão, pode ser expressa em unidades de energia. Subsequentemente, corta-se cuidadosamente, com uma tesoura, a curva de histerese nestas impressões, definindo área da curva de histerese AH (Figura 13(b)). Esta área AH não pode ser medida com boa exatidão devido à sua irregularidade sendo, portanto, uma incógnita a ser obtida. Para isso pesa-se AR e AH definindo-se, respectivamente, os pesos PR e PH. Resulta que a razão entre as áreas equivale à razão entre os pesos, tal que:

Figura 13
Recortes de papel que foram pesados para o cálculo da área da histerese (AH) em unidades V2.
(25) A H = P H P R A R .

Para a pesagem foi utilizada uma balança analítica com precisão décimos de milésimos de grama. Os cálculos apresentados nos próximos parágrafos, visando conversão dos valores em “Volt2” para Joules, são referentes à tensão VP=220V. Utilizando a Equação (25), o valor obtido para a área da histerese foi AH=2,06V2. Nota-se que esta área corresponde ao fator VcdVR, na Equação (19); tal que a mesma pode assumir a forma:

(26) u = R s C N P R P N s . v o l A H = R s C N P R P N s . v o l P H P R A R ,

resultando em uma densidade de energia de u1843J/ciclo.m3. Para o volume do transformador, vol=4,7910-4 m3, energia total por ciclo é Uciclo=u.vol0,88J/ciclo. A potência total é dada por P=u.vol.f; para a frequência de 60 Hz resulta em P53W. Os cálculos para os demais valores deP, para as demais tensões máximas VP, foram realizados de forma análoga e estão apresentados no gráfico da Figura 14. A proporcionalidade da potência com a tensão máxima no primário é esperada. Os valores de potência são da mesma ordem de grandeza que os obtidos na literatura [14[14] J.A. Barbosa, M.H.R. Bernardo, R.B. Oliveira, R.S. Silva e I.A.J.W.S. Meireles, Revista META 1, 330 (2016).].

Figura 14
Potência perdida nos laços de histerese em função de VP.

7. Considerações Finais

Neste trabalho foi possível realizar cálculos teóricos para a construção de um transformador com núcleo em “E” e realizar a montagem do mesmo. Com o secundário do transformador em aberto, foi possível verificar a transformação de tensão do tipo 220 V/112 V, que vai de acordo com as previsões teóricas.

Com o aparato experimental montado, os estudantes vivenciaram técnicas de instrumentação e compreenderam que uma histerese magnética é característica de um material do tipo ferromagnético. Além disso, foi possível extrair parâmetros importantes relacionados às propriedades magnéticas do núcleo e a potência perdida durante sua operação. Dentre as propriedades investigadas estão o campo coercivo, o campo remanente e os campos máximos. Os estudantes chegaram à conclusão, comparando os resultados aqui obtidos com a literatura, que o material do núcleo é do tipo macio e trata-se de uma liga de Fe elétrico. Foi possível compreender que fatores como a amplitude da tensão ligada ao primário, a frequência da rede e fatores de construção alargam a curva de histerese, aumentando as perdas no núcleo ferromagnético.

Agradecimentos

Agradecemos ao Programa de Iniciação Científica da UFES, a Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (FAPES) e a Pró-reitora de Graduação (Prograd/UFES) por fomentar este trabalho e conceder bolsas de estudos aos estudantes participantes.

Apêndice: I

Outra maneira de se obter a curva de histerese magnética é utilizando um programa computacional, como o Corel Draw ou o Matlab. As fotos obtidas da curva de histerese, Figura 11, podem ser colocadas nestes programas e então os pontos experimentais podem ser estimados. Utilizando as Equações (16) e (17), estimam-se os campos magnéticos. Veja a Figura A1. A área do ciclo pode ser obtida diretamente da figura, com o auxílio do programa Origin lab. Realizando o produto destas áreas pelo volume e a frequência utilizada, obtém-se as potências. Os valores obtidos para as potencias estão na mesma faixa de valores daqueles apresentados na Figura 14.

Figura A1
Curvas de histerese obtidas por estimativas dos pontos experimentais. Diferentes cores representam diferentes curvas de histerese.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Ago 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    14 Maio 2023
  • Revisado
    10 Jun 2023
  • Aceito
    12 Jun 2023
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