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Comunidades de Prática no Ensino de Ciências: uma revisão da literatura de 1991 a 2018

Communities of practice in science education: a literature review from 1991 to 2018

Resumos

Este trabalho apresenta uma revisão da literatura sobre o uso do conceito de Comunidades de Prática (CoP) nas pesquisas em Ensino de Ciências nos últimos 27 anos. Nossa investigação permitiu que traçássemos o perfil da produção acadêmica sobre o tema na área. Além disso investigamos quais referenciais teóricos e metodológicos foram utilizados na realização das pesquisas sobre CoP e quais problemáticas esses estudos abordam em relação à Formação Profissional. Dentre os resultados de nossa revisão destacamos a potencialidade das CoP como uma importante alternativa para promover a inserção e socialização de estudantes universitários nas ações de promoção de melhoria na qualidade das relações entre Universidade e Sociedade, tanto na formação profissional docente como não docente. Outro resultado importante desta revisão foi a identificação de duas lacunas na produção acadêmica: (i) a falta de estudos sobre formação profissional de nível médio e (ii) a não utilização dos sete princípios propostos por Wenger e colaboradores para o cultivo de Comunidades de Prática.

Palavras-chave
Comunidades de Prática; Formação Profissional; Ensino de Física; Ensino de Ciências


This work presents a literature review about the use of concept of Communities of Practice in science education research in the last 27 years. Our investigation allowed us to draw the profile of the academic production on the subject in the area. In addition, we investigated which theoretical and methodological references were used in the research on CoP and which issues these studies address in relation to vocational training. Among the results of our review, we highlight the potential of CoP as an important alternative to promote the insertion and socialization of university students by promoting and improving the quality of relations between University and Society in both teacher and non-teacher professional education. Another important result of this review was the identification of two important gaps in academic production: (i) the lack of studies on vocational training at mid-level and (ii) the non-use of the seven principles proposed by Wenger and collaborators for the cultivation of Communities of Practice.

Keywords
Community of practice; Professional Education; Physics Education; Science Education


1. Introdução

As mudanças advindas do acelerado progresso tecnológico experimentado nas últimas décadas, que permitiu processar e armazenar informações sem limitação de distância, tempo e volume, vêm acarretando importantes transformações no modo de trabalho das sociedades atuais. O profissional da atualidade não mais deve ser preparado para o trabalho fragmentado e individualizado, mas sim para atuar de maneira colaborativa, buscar, tratar e avaliar informações, tomar decisões, buscar ajuda e reconhecer o valor do outro, resolver problemas e desenvolver a consciência de suas potencialidades e limitações [11 Knud Illeris, Contemporary Learning Theories: Learning Theorists in their our words (Routledge, New York, 2009).22 M. Binkley, O. Erstad, J. Herman, S. Ripley, M. Miller-Ricci e M. Rumble, em: Assessment and Teaching of 21st Century Skills, editado por P. Griffn, B. McGaw e E. Care (Springer Netherlands, Dordrecht, 2012).]. No entanto, a formação profissional ofertada nos cursos de nível médio e superior se mostra distante dos problemas reais do mundo e não tem acompanhando o ritmo acelerado das transformações na sociedade, nem tampouco o esperado de uma educação contemporânea. Centrada no conteúdo, na figura do professor e em treinar os alunos para realização de provas, pouco contribui para a formação de profissionais capazes de atuar no mundo contemporâneo [33 Z. Bozu e F.I. Muñoz, Rev Univ y Soc del Conoc 6, 1 (2009).55 A. Bauer, N. Cassettari e R.P. de Oliveira, Ens. Avaliação e Políticas Públicas em Educ 25, 97 (2017).]. Nesse contexto, encontrar caminhos para engajar estudantes em oportunidades de aprendizagem e no desenvolvimento dessas habilidades sociais e profissionais de forma mais autêntica em sua trajetória de vida se mostra um desafio para os sistemas educativos atuais.

Uma possibilidade para o enfrentamento desse problema provém da adoção de diferentes perspectivas para o que se considera aprender. Destacam-se, nesse sentido, as visões que compreendem a aprendizagem e o conhecimento como fenômenos situados no contexto da experiência humana de participação no mundo. Essas perspectivas, pertencentes ao ramo das Teorias Sociais de Aprendizagem, ainda que não substituam outras com enfoques distintos, destacam a natureza profundamente social dos seres humanos enquanto sujeitos capazes de conhecer. Aprender, à luz desses referenciais teóricos, é algo inerente ao ser humano e deve ser entendido em termos de participação nas atividades valorizadas por grupos sociais em contextos específicos, como escolas e ambientes de trabalho.

Nessa lente teórica podem ser enquadradas as Comunidades de Prática (CoP), conceito utilizado para compreender estruturas sociais capazes de produzir, reproduzir, transformar conhecimentos e proporcionar oportunidades de aprendizagem aos seus integrantes. Sua fonte de coerência se encontra nas suas práticas – os modos de ação sustentados no tempo pela comunidade, marcadas pela existência de um forte compromisso que possibilita aos participantes levarem adiante uma iniciativa que valorizam e, assim, promoverem uma parceria de aprendizagem conjunta. A aprendizagem ocorre através das trajetórias de participação nas CoP, em um processo de negociação de significados e de legitimação de conhecimentos, que permite a transformação pessoal e construção da identidade dos participantes. Tendo caráter orgânico, vivaz e colaborativo, as Comunidades de Prática podem oferecer oportunidades e espaço para uma formação educativa mais autêntica e próxima da realidade atual. Devido à sua capacidade de incentivar a produção e reprodução de saberes, as CoP tem ganhado espaço nas pesquisas científicas em Ensino, sendo utilizadas em diversas áreas do conhecimento – destacando-se processos de aprendizagem em Administração, em Engenharia e Ciências da Informação, na área da Saúde e da Educação [66 E. Wenger, R. Mcdermott e W.M. Snyder, Cultivating communities of practice: a guide to managing knowledge (Harvard Business School Press, 2002).], inclusive no Brasil [77 L. Mendes e L.M.S. Urbina, Rev Adm Contemp 19,3 (2015).].

Em vista da crescente presença do conceito de CoP nas pesquisas científicas das mais diversas áreas, inclusive para a formação de bacharéis [88 P.W. Irving e E.C. Sayre, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 10, 1 (2014).1212 P.W. Irving, M.J. Obsniuk e M.D. Caballero, Eur J Phys 38, 5 (2017).] e licenciados [1313 B.S. Eylon e E. Bagno, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 2, 2 (2006)., 1414 A.L. Gretton, T. Bridges e J.M. Fraser, Am J Phys 85, 5 (2017).] em Física, e da possibilidade de seu uso para o enfrentamento dos problemas apontados anteriormente, é importante investigar a produção científica do tema nas pesquisas em Ensino de Ciências, como feito nesta revisão da literatura.

Outras revisões da literatura sobre Comunidades de Prática já foram realizadas por Rodrigues, Silva e Miskulin [1515 M.U. Rodrigues, L.D. da Silva e R.G.S. Miskulin, Rev Educ Matemática 14, 16 (2017).] e Smith, Hayes e Shea [1616 S.U. Smith, S. Hayes e P. Shea, Online Learn 21. 1 (2017).]. Os primeiros autores se concentraram nas áreas de Educação e Ensino, identificando 20 dissertações e 26 teses defendidas entre 2005 e 2016 no Brasil. O trabalho contém um mapeamento que permite identificar referenciais teóricos utilizados em teses e dissertações nas áreas de Educação e Ensino no Brasil, bem como título, autores e programas de pós-graduação em que foram desenvolvidas. Em sua conclusão, os autores destacam que as Comunidades de Prática se apresentam como cenário de aprendizagem capaz de contribuir com a Formação de Professores, pois se configuram como um contexto propício para o desenvolvimento de práticas colaborativas e reflexivas entre os seus membros [1515 M.U. Rodrigues, L.D. da Silva e R.G.S. Miskulin, Rev Educ Matemática 14, 16 (2017).]. Em nível internacional, o trabalho de Smith, Hayes e Shea [1616 S.U. Smith, S. Hayes e P. Shea, Online Learn 21. 1 (2017).] apresenta uma revisão da literatura com 60 estudos que fazem uso do conceito de Comunidades de Prática em ambientes virtuais entre os anos de 2000 e 2014. Os autores buscaram investigar quais padrões de CoP virtual têm sido utilizados e que oportunidades eles oferecem para futuras investigações sobre ensino e aprendizagem, focando-se na análise de elementos estruturais das comunidades.

A revisão da literatura apresentada neste trabalho é mais ampla que as citadas, compreendendo um período entre os anos de 1991 e 2018. Mapeia o perfil da produção acadêmica, os referenciais teóricos e metodológicos utilizados nesses artigos e identifica como as CoP têm sido investigadas em estudos na área de pesquisa em Ensino de Ciências, em especial nas investigações sobre Formação Profissional. O objetivo desta revisão é obter uma visão panorâmica dos estudos realizados sobre o tema na área de Ensino de Ciências. Para alcançá-lo buscamos responder três questões de pesquisa:

  1. Qual o perfil da produção acadêmica a respeito de Comunidades de Prática no contexto do Ensino de Ciências?

  2. Quais são os principais referenciais teóricos e as metodologias utilizados nas pesquisas sobre Comunidades de Prática?

  3. Quais problemáticas têm sido abordadas nas pesquisas sobre formação profissional docente e não-docente? Quais as principais questões de pesquisa e respostas alcançadas? Quais as principais limitações e críticas a esses estudos?

Com a intenção de apresentar ao leitor o referencial teórico estudado, consideramos útil fazer um breve apanhado dos conceitos e temáticas tratados em cada uma das quatro obras seminais sobre o conceito de Comunidades de Prática. Em seguida, apresentamos a metodologia de busca e seleção dos artigos publicados em periódicos da área de Ensino de Ciências; respondemos cada uma das questões de pesquisa e, então, apresentamos as considerações finais sobre a produção mapeada.

2. Travessia Histórica do Conceito de Comunidades de Prática

O conceito de Comunidades de Prática tem evoluído ao longo do tempo. Criado na perspectiva de aprendizagem situada, foi desenvolvido na Teoria Social da Aprendizagem de Wenger, voltada incialmente para o empoderamento e a aprendizagem profissional, posteriormente orientou-se como ferramental de gestão no meio empresarial [1717 A. Cox, J Inf Sci 31, 6 (2005).].

De acordo com Cox [1717 A. Cox, J Inf Sci 31, 6 (2005).], quatro obras seminais contribuíram para a construção do conceito de CoP.

O termo Comunidade de Prática surge no livro Situated Learning: Legitimate Peripheral Participation, de Jean Lave e Etienne Wenger [1818 J. Lave e E. Wenger, Situated Learning: Legitimate Peripheral Participation (Cambridge Univertity Press, Cambridge, 1991).]. Os autores analisam cinco estudos etnográficos realizados em diferentes grupos sociais, e propõem uma nova compreensão para aprendizagem ocorrida na interação social informal e situada, contrastando com o paradigma educacional dominante de transmissão de conhecimento. Para os autores, aprender não se trata de adquirir determinado conhecimento cognitivo abstrato, mas sim de modificar sua identidade através da participação em comunidades sociais. Esse processo ocorre por meio do que chamam de participação periférica legítima, em que recém-chegados a determinados grupos sociais já estabelecidos – as Comunidades de Prática – aprendem ao passo que se envolvem de maneira ativa e intencional nas práticas desses grupos. Nessa obra “o conceito de ‘comunidade de prática’ é deixado em grande parte como uma noção intuitiva” [1818 J. Lave e E. Wenger, Situated Learning: Legitimate Peripheral Participation (Cambridge Univertity Press, Cambridge, 1991)., p. 42, tradução nossa], sendo mais bem trabalhado ao longo de outras obras.

No mesmo ano, Brown e Duguid [1919 J.S. Brown e P. Duguid, Organ Sci 2, 1 (1991).] escrevem o artigo Organizational Learning and Communities-of-Practice: Toward a Unified View of Working, Learning and Innovation, onde aplicam ideias de Lave e Wenger para lançar um novo olhar sobre os estudos etnográficos realizados por Julian Orr [2020 J.E. Orr, Talking About Machines: an Etnography of a Modern Job (Cornell University Press, Ithaca, 1996).] com técnicos de manutenção de máquinas fotocopiadoras da empresa Xerox1 1 Em 1996, os estudos de Orr foram reunidos no livro Talking About Machines: an ethnography of a modern job. . A discussão gira em torno da diferença existente entre problemas enfrentados pelos trabalhadores e as soluções apresentadas nos manuais de manutenção das máquinas fotocopiadoras, nos cursos de qualificação oferecidos pela empresa e nas práticas desenvolvidas pelos reparadores. Os autores discutem aprendizagem, práticas no trabalho e inovação utilizando as ideias de participação periférica legítima e comunidades de prática para argumentar que a aprendizagem é uma ponte entre trabalho e inovação. Nesse contexto, as Comunidades de Prática surgem como “locais privilegiados de inovação” no trabalho [1919 J.S. Brown e P. Duguid, Organ Sci 2, 1 (1991)., p. 41, tradução nossa].

No livro basilar Communities of practice: learning, meaning and identity2 2 O livro é derivado de sua tese de doutorado, Toward a theory of cultural transparency: elements of a social discourse of the visible and the invisible, publicada em 1991. A obra original foi publicada em 1998, em inglês e traduzida para o espanhol em 2001. A versão em espanhol foi escolhida para as citações desse artigo. , Wenger preenche a lacuna deixada pelo seu trabalho anterior e define Comunidades de Prática da seguinte forma:

O fato de vivermos como seres humanos significa que iniciamos constantemente empreendimentos de todo o tipo, desde procurar nossa sobrevivência física até a busca pelos prazeres mais elevados. Quando definimos estes empreendimentos e participamos de sua realização, interagimos com os outros e com o mundo e em razão disso ajustamos nossas relações com o mundo e com os demais. Em outras palavras, aprendemos. Com o tempo, esta aprendizagem coletiva desencadeia práticas que refletem tanto a busca pelo sucesso de nossos empreendimentos como as relações sociais que os acompanham. Portanto, estas práticas são a propriedade de um tipo de comunidade criada, com o tempo, mediante a intenção sustentada de obter sucesso em um empreendimento compartilhado. É por isso que faz sentido chamar de comunidade de prática esse tipo de comunidade

[2121 E. Wenger, Comunidades de Practica: Aprendizaje, significado e identidad (Paidós, Barcelona, 2001).., p. 69, tradução nossa].

Ao longo da obra, o autor detalha o que são Comunidades de Prática, de que maneira elas surgem e como a aprendizagem ocorre dentro dessas configurações sociais. A aprendizagem enquanto participação social se dá na inter-relação de quatro dimensões [2121 E. Wenger, Comunidades de Practica: Aprendizaje, significado e identidad (Paidós, Barcelona, 2001).., p. 22]: o significado, que caracteriza a capacidade humana de experimentar o viver como algo significativo; a prática, que corresponde aos recursos históricos e sociais que são compartilhados nas Comunidades de Práticas; a comunidade, representando a configuração social, o grupo de pessoas com um compromisso entre si e suas interações; e a identidade, enquanto dimensão pessoal e social, que compreende as mudanças em nós provocadas pela aprendizagem. À luz dessas quatro dimensões, a aprendizagem é entendida como experiência de afiliação, de fazer e de identificação ocorridas nas histórias de participação em uma Comunidade de Prática.

Nesse livro são utilizados três conceitos para explicitar as práticas enquanto fontes de coerência de uma Comunidades de Prática: (1) compromisso mútuo, (2) empreendimento conjunto e (3) repertório compartilhado. O compromisso mútuo descreve o engajamento dos membros com a comunidade, em sua responsabilidade frente aos demais e o meio pelo qual realizam sua prática. O empreendimento conjunto compreende aquilo que une e dá sentido, o que objetiva e o que move a comunidade. Por fim, o repertório compartilhado caracteriza todos os recursos (símbolos, ferramentas, histórias, documentos, rotinas, etc.) necessários para que uma comunidade possa desenvolver sua prática em compromisso mútuo, visando a consecução do empreendimento conjunto.

Esta obra discute a potencialidade do uso de CoP nos sistemas educativos. Nas palavras de Wenger [2121 E. Wenger, Comunidades de Practica: Aprendizaje, significado e identidad (Paidós, Barcelona, 2001).., p. 311–312, tradução nossa]

As questões relacionadas à educação deveriam ser abordadas, acima de tudo, em função de identidades e modos de filiação [...] e somente de maneira secundária em função de capacidades e informação. [...] a educação se converte em um processo de desenvolvimento mútuo entre comunidades e indivíduos que supera a mera socialização. É uma inversão de uma comunidade em seu próprio futuro, mas não como uma reprodução do passado mediante a transmissão cultural, e sim como a formação de novas identidades que pode fazer progredir a sua história de aprendizagem.

Wenger discute as dimensões do projeto educativo e defende que falar da aprendizagem em função dos modos de afiliação a CoP possibilita considerar os projetos não somente em função de um currículo, mas também em termos mais gerais, em função de seus efeitos na formação de identidades. Para tal, os estudantes necessitam de lugares de participação, materiais e experiências que lhes permitam construir uma imagem do mundo e de si mesmos, assim como maneiras de influenciar o mundo de modo que suas ações tenham importância.

Na obra de Wenger, McDermott e Snyder [66 E. Wenger, R. Mcdermott e W.M. Snyder, Cultivating communities of practice: a guide to managing knowledge (Harvard Business School Press, 2002).], intitulada Cultivating Communities of Practice, o conceito de CoP se distancia do aprofundamento teórico que rumava originalmente. Traçando diretrizes de como cultivar Comunidades de Prática em grandes empresas, o livro dá maior atenção à capacidade que esses grupos apresentam para gerar soluções de problemas e inovação, do que propriamente à aprendizagem dos participantes. Essa ideia pode ser verificada já no início do livro, quando os autores apresentam as potencialidades de Comunidades de Prática cultivadas em estruturas organizacionais [66 E. Wenger, R. Mcdermott e W.M. Snyder, Cultivating communities of practice: a guide to managing knowledge (Harvard Business School Press, 2002)., p. 14, tradução nossa]:

  • conectar os grupos locais especializados e profissionais isolados;

  • diagnosticar e resolver problemas recorrentes de negócios cujas causas ultrapassam os limites da equipe;

  • analisar fontes de desempenho desigual relacionadas ao conhecimento entre as unidades que executam tarefas semelhantes e trabalhar para que cada uma atinja o mais alto padrão;

  • vincular e coordenar atividades e iniciativas desconectadas, abordando um domínio de conhecimento similar.

O conceito de Comunidade de Prática é apresentado, nessa obra, como uma combinação de três elementos: domínio, comunidade e prática. Essas estruturas, aqui, podem ser entendidas como uma comunidade de pessoas que compartilham determinadas práticas em torno de um domínio de conhecimentos, e essa interação faz com que os membros aprofundem os conhecimentos relativos a esse domínio.

É importante ressaltar que não há uma linearidade na trajetória evolutiva descrita [2222 L.C. Li, J.M. Grimshaw, C. Nielsen, M. Judd, P.C. Coyte e I.D. Graham, Implement Sci 4, 1 (2009).]. Alguns dos principais conceitos discutidos em uma dessas obras, como o de participação periférica legitima, estão ausentes ou recebem menor destaque em outras. Além disso, existem divergências sobre os significados de conceitos básicos, como o de Comunidade [1717 A. Cox, J Inf Sci 31, 6 (2005).]. Apesar disso, todas apresentam um ponto importante em comum: a visão de que o significado é situado – construído local e socialmente – e de que a identidade é um aspecto central da aprendizagem.

3. Metodologia

Para a realização desta revisão, adotamos como guia a taxonomia de revisões de literatura apresentada por Cooper, Hedges e Valentine [2222 L.C. Li, J.M. Grimshaw, C. Nielsen, M. Judd, P.C. Coyte e I.D. Graham, Implement Sci 4, 1 (2009)., p. 5], em particular atentando para a definição de características básicas da revisão, como foco, objetivos, escopo, e processo de busca. Em relação ao foco: identificamos os referenciais teóricos e metodológicos, assim como as práticas e aplicações do conceito de CoP no Ensino de Ciências. Como objetivo, além de traçar o perfil da produção acadêmica sobre CoP na área de Ensino de Ciências, nossa meta foi identificar as principais problemáticas abordadas. Para tanto, foi feita uma busca sistemática por artigos científicos entre o ano de 1991, ano em que foi publicada as obras seminais de Lave e Wenger e Brown e Duguid, e 29 de agosto de 2018, data em que teve início este trabalho. Nossas conclusões estão baseadas em todos os artigos encontrados e analisados, mas somente uma seleção deles é descrita no texto

O processo sistemático de busca foi iniciado em periódicos classificados na área de Ensino no quadriênio 2013-2016 do sistema Qualis-Periódicos3 3 Para mais informações, conferir <https://sucupira.capes.gov.br/sucupira/public/index.jsf da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), porque esse sistema de classificação inclui as mais importantes revistas da área sediadas no Brasil; os estratos A1, A2 e B1, incluídos na busca, reúnem publicações revisadas por pares e possuem os maiores indicativos de qualidade, segundo os padrões nacionais. Do total de periódicos da área selecionamos 95 revistas por apresentarem publicações voltadas para o Ensino de Ciências, mesmo que essa não seja especificamente a temática do periódico. A busca foi complementada com o uso do indexador Scopus conforme descrito abaixo.

Etapa 1 -Busca de Trabalhos

A busca sistemática dos artigos iniciou com a consulta do termo “communit* of practice” no indexador Scopus4 4 Scopus é o maior banco de dados de resumos e citações da literatura revisada por especialistas: periódicos científicos, livros e anais de congressos. Apenas 25 das revistas selecionadas no Sistema Qualis se encontram indexadas nesse banco de dados. Informações sobre o indexador estão disponíveis em: <https://www.elsevier.com/solutions/scopus>. Acesso em: 20 de janeiro de 2020. , empregando o “ISSN” como filtro para a seleção de trabalhos publicados especificamente nas 95 revistas selecionadas através do Qualis. No caso das revistas não indexadas pelo buscador, a pesquisa foi feita diretamente no site de cada uma das publicações. Todas as revistas que também publicam artigos em espanhol e/ou português passaram por uma nova busca através dos descritores “comunidad de práctica” e/ou “comunidade de prática”, também no plural. Essa pesquisa foi complementada posteriormente por uma busca pelos termos “communit* of practice” e “science education”, ligados por uma função de inclusão “AND” no indexador Scopus. Os artigos encontrados através dessas diferentes formas de consulta foram comparados, a fim de descartar duplicatas. Ao final desta etapa obtivemos um total de 165 artigos.

Etapa 2 - Leitura preliminar

Os 165 artigos encontrados foram armazenados e organizados no software de análise de dados qualitativos Nvivo 12. Dois pesquisadores trabalharam separadamente fazendo a leitura preliminar dos títulos, resumos e trechos dos artigos onde apareciam os descritores de busca. Ao final dessa análise os pesquisadores compararam suas análises, convergindo para os seguintes resultados: foi excluído um trabalho[2222 L.C. Li, J.M. Grimshaw, C. Nielsen, M. Judd, P.C. Coyte e I.D. Graham, Implement Sci 4, 1 (2009).] por estar inacessível; foram excluídos 38 artigos por não abordarem o conceito de Comunidades de Prática; quatro artigos que tratavam de Comunidades de Prática, mas se localizavam na área da Educação Matemática; 10 artigos que diziam respeito a Comunidades de Prática, entretanto não tratavam de Ensino de Ciências. Ao total foram excluídos 53 artigos nessa leitura preliminar dos trabalhos.

Etapa 3 - Leitura integral e classificação

Procedemos com a leitura dos 112 artigos selecionados. A classificação inicial, que possibilitou o mapeamento do perfil da produção acadêmica, foi realizada conjuntamente em uma planilha virtual pelos quatro autores da revisão. Cada artigo foi avaliado por pelo menos dois pesquisadores; divergências quanto à classificação necessitaram da avaliação de um terceiro autor, de maneira que se obtivesse consenso nas classificações. Nesta etapa foram excluídos: 17 artigos que não diziam respeito ao tema de Comunidades de Prática; quatro artigos que não tratavam de Ensino de Ciências; um artigo identificado como divulgação científica; e três artigos de relatos de experiência. Com a exclusão de 25 artigos nesta etapa, restaram 87.

Na Figura 1 é apresentado um esquema com o processo de exclusão e seleção dos artigos, sintetizando as informações apresentadas. Os artigos encontrados na revisão, com a identificação dos excluídos nas etapas 2 e 3, podem ser encontrados na Tabela S1 do material suplementar deste artigo. Na Tabela S2 desse suplemento vê-se uma síntese da classificação feita para os 87 artigos em relação às seguintes categorias: Natureza dos Trabalhos, Área de Conhecimento, Nível de Ensino, Tipo de CoP, Obras seminais, Origem, Metodologia utilizada e Tipo de Espaço e Formação. Passamos aos resultados e análise em forma de respostas às questões de pesquisa que guiaram esta revisão.

Figura 1
Processo de exclusão e seleção de artigos.

4. Qual o Perfil da Produção Sobre Comunidades de Prática?

Para mapear o perfil da produção acadêmica classificamos os artigos selecionados quanto à sua natureza (pesquisa empírica ou pesquisa teórica), ao nível de ensino (Fundamental, Médio ou Superior), à natureza da relação entre os membros das CoP (predominantemente presencial ou predominantemente virtual), aos espaços em que atuam (formal ou não-formal), à origem das CoP (fomentada ou criada espontaneamente) e quanto à sua aplicação na formação profissional (docente ou não docente).

Quanto à natureza dos trabalhos, foram separados em: a) pesquisa empírica (70), pois apresentam questões de pesquisa, metodologia de pesquisa, análise e resultados baseados em dados empíricos e b) pesquisa teórica (17), incluindo aqueles que apresentam uma reflexão teórica sobre Comunidades de Prática apoiados em outros estudos, sejam eles teóricos ou empíricos.

Quanto ao nível de ensino, classificamos os trabalhos em: a) Ensino Fundamental, b) Ensino Médio, c) Ensino Fundamental e Médio, d) Educação Superior e e) Não se aplica. Nessa classificação foi possível constatar que há pesquisas em todos os níveis de ensino. A Figura 2 mostra a distribuição de artigos quanto a essa classificação.

Figura 2
Distribuição dos artigos quanto ao nível de ensino.

De maneira geral as Comunidades de Prática investigadas nesses estudos são grupos heterogêneos, formadas por pessoas que atuam em diversos níveis, podendo incluir pesquisadores e professores de universidades, profissionais de diversas áreas, professores de escolas de Educação Básica, alunos e pais. Classificamos, então, os artigos de acordo com o nível de ensino foco da Comunidade de Prática. Essa é apenas uma maneira de especificar a que público se destina a finalidade principal da CoP, não excluindo a premissa fundamental das CoP, a de que as aprendizagens e trocas de conhecimentos envolvem todos os seus participantes. Essa classificação possibilitou verificar uma importante lacuna na produção sobre CoP, apenas um estudo [2424 H. Munby, J. Taylor, P. Chin e N.L. Hutchinson, Sci Educ 91, 1 (2006).] trata de Formação Profissional ocorrida no Ensino Médio.

A fim de esclarecer a classificação, apresentamos como exemplo as investigações de Forbes e Skamp [2525 A. Forbes e K. Skamp, Res Sci Educ, 49, 2, (2019).2828 A. Forbes e K. Skamp, Res Sci Educ, 43, 3, (2013).]. São estudos sobre o grupo chamado MyScience, que está inserido em escolas de Ensino Fundamental e é formado por alunos e professores dessas instituições, assim como por cientistas (astrônomos, engenheiros). Visando levar Ciência Básica para as escolas de New South Wales, em Sydney, na Austrália, o grupo é fundamentado em cinco elementos: (i) aprendizagem profissional colaborativa entre os professores primários, (ii) utilização de critérios claros sobre as metas a serem atingidas, (iii) incentivo aos alunos para realizar investigação científica, (iv) integração entre cientistas e alunos de escolas primárias e (v) valorização de suas realizações. Entendida como uma CoP, o MyScience possibilitou que seus integrantes compartilhassem conhecimento; ao passo que os alunos e professores primários transformaram suas percepções sobre a Natureza das Ciências, os cientistas modificaram suas visões sobre o Ensino de Ciências, em decorrência da necessidade de organizar e gerenciar o contexto social de aprendizagem durante as atividades propostas na Comunidade de Prática. Apesar da aprendizagem ocorrer para todos os membros participantes do projeto, o foco desse foi levar Ciência para alunos do Ensino Fundamental, e por isso consideramos esse o seu nível de ensino, ainda que todos os participantes passassem por vivências de aprendizagem.

Os trabalhos categorizados como “não se aplica” são aqueles em que as investigações são realizadas fora dos ambientes escolares ou que não estão dirigidas a um nível de ensino específico. Se enquadra nessa categoria, por exemplo, o estudo de Falk, Randol e Dierking [29], que objetivou verificar se alguns ambientes informais de aprendizagem como museus, aquários, centros de ciências, jardins botânicos funcionavam como Comunidades de Prática eficazes. Os investigadores concluíram que o amplo conjunto de subcomunidades que fazem parte da educação informal em ciências, embora compartilhem alguns repertórios (por ex., rotinas, expressões, instrumentos, maneiras de fazer e símbolos), não funcionam como uma Comunidade de Prática capaz de possibilitar o compartilhamento de conhecimento entre seus membros. A Tabela 1 mostra a distribuição dos artigos quanto à natureza dos trabalhos e nível de ensino.

Tabela 1
Classificação dos artigos quanto à natureza e nível de ensino.

Quanto à natureza das relações interpessoais entre os participantes da CoP, foi possível classificar as Comunidades de Prática investigadas em: a) predominantemente presenciais; b) predominantemente virtuais e c) não se aplica. Optamos pela classificação empregando o termo predominantemente por entendermos existir um espectro entre as estruturas sociais totalmente presenciais e as totalmente virtuais. Os artigos que não possuem informações suficientes para determinar a natureza das inter-relações nas comunidades estudadas ou que não enfatizam a descrição das comunidades foram classificados como “não se aplica”.

A maior parte dos artigos (53) tratam de CoP predominantemente presenciais [88 P.W. Irving e E.C. Sayre, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 10, 1 (2014).1414 A.L. Gretton, T. Bridges e J.M. Fraser, Am J Phys 85, 5 (2017)., 2424 H. Munby, J. Taylor, P. Chin e N.L. Hutchinson, Sci Educ 91, 1 (2006).2929 J.H. Falk, S. Randol e L.D. Dierking, Public Underst Sci 21, 7 (2012)., 3131 S.A.I. Bottoms, K.M. Ciechanowski e B. Hartman, J Sci Teacher Educ 26, 8 (2015)., 3232 J. Byrne, M. Ideland, C. Malmberg e M. Grace, Int J Sci Educ 36, 9 (2014)., 3434 S. Hawkins e M. Park Rogers, J Sci Teacher Educ 27,4 (2016)., 3535 A.C. Hume, Res Sci Educ 42, 3 (2012)., 3737 J.F. Kisiel, Sci Educ 94, 1 (2010).4141 J.A. da Silva e R.C. Bartelmebs, Acta Sci 15, 1 (2011)., 4343 J. Anker-Hansen e M. Andrée, Int J Sci Educ 37, 15 (2015)., 4747 G. Erickson, J. Mayer-Smith e A. Rodriguez, Int J Sci Educ 16, 5 (1994).4949 E.M. Furtak e S.C. Heredia, J Res Sci Teach 51, 8 (2014)., 5151 C.R. Nicholas, Cult Stud Sci Educ 12, 2 (2017)., 5353 Y. Saka, S.A. Southerland e J.S. Brooks, Sci Educ 93,6 (2009)., 5454 L.H. Swanson e L.R. Coddington, Teach Teach Educ 59, 1 (2016)., 5757 A.C. Howe e H.S. Stubbs, Sci Educ 87, 2 (2003)., 5959 J.F. Kisiel, J Res Sci Teach 51, 3 (2014)., 6363 V.L. Akerson, L.A. Donnelly, M.L. Riggs e J.L. Eastwood, Int J Sci Educ 34, 9 (2012).6868 A.B. Hunter, S.L. Laursen e E. Seymour, Sci Educ 91, 1 (2006)., 7171 J.S.C. Leung, A.S.L. Wong e B.H.W. Yung, Sci Educ 24, 7 (2015)8383 M.U. Bers, J Sci Educ Technol 16, 6 (2007)., 8888 R. Tytler, Cult Stud Sci Educ 13, 2 (2018)., 9090 K. Dhingra, Cult Stud Sci Educ 3, 1 (2008)., 9797 P. Davies, Cult.Stud Sci Educ 11, 4 (2016).], enquanto quinze estudos tratam de CoP predominantemente virtuais [3333 J.M. García, I.M. Greca e J. Meneses, Rev Electron Enseñanza las Ciencias 7, 2 (2008)., 3636 R. Kermish-Allen, K. Peterman e C. Bevc, Cult Stud Sci Educ 14, 3 (2018)., 4444 C. Eick e M. Dias, Sci Educ 89, 3 (2005).4646 C.N. El-Hani e I.M. Greca, Ciência Educ 17, 3 (2011)., 5050 M.M. Marques, M.J. Loureiro e L. Marques, Int J Web Based Communities 7, 4 (2011)., 5555 R. Battle e I. Hawkins, J Sci Educ Technol 5. 4 (1996)., 5656 P.W.U. Chinn, Cult Stud Sci Educ 1, 2 (2006)., 5858 H.J. Kim e B. Herbert, J Sci Educ Technol 21, 4 (2012)., 6060 S. Sentance e S. Humphreys, Comput Sci Educ 28,4 (2018)., 6161 S. Sotiriou, K. Riviou, S. Cherouvis, E. Chelioti e F.X. Bogner, J Sci Educ Technol 25, 4 (2016)., 6969 H.J. Kim, H.R. Miller, B. Herbert, S. Pedersen e C. Loving, J Sci Educ Technol 21, 4 (2012)., 7070 M. Kim e B. Cavas, Sci Educ Int 24, 3 (2013)., 8585 K.J. Crippen, S. Ellis, B.A. Dunckel, A.J. W. Hendy e B. J. MacFadden, J Sci Educ Technol 25, 5 (2016)., 8686 M.M. Marques, M.J. Loureiro e L. Marques, Int J Web Based Communities 11, 3 (2015).]. Nessas duas categorias há CoP de diferentes níveis de ensino e problemáticas abordadas. A título de exemplo, Gretton, Bridges e Fraser [1414 A.L. Gretton, T. Bridges e J.M. Fraser, Am J Phys 85, 5 (2017).] sugerem que o uso de CoP presenciais envolvendo professores assistentes e alunos de graduação em Física auxilia na aceleração da formação de uma identidade profissional na área. Já El-Hani e Greca [4444 C. Eick e M. Dias, Sci Educ 89, 3 (2005).4545 C.N. El-Hani e I.M. Greca, Res Sci Educ 43, 4 (2013).] investigaram uma CoP virtual que reúne professores de Ensino Médio, alunos de licenciatura, pesquisadores e estudantes de graduação e pós-graduação através da utilização de fóruns e chats sobre assuntos relativos ao Ensino de Biologia. A comunicação frequente, mesmo que por ferramentas virtuais, permite um diálogo aberto entre os participantes fornecendo aos professores iniciantes meios de participação periférica legítima [4646 C.N. El-Hani e I.M. Greca, Ciência Educ 17, 3 (2011).], em um ambiente de compartilhamento de conhecimento, recursos e experiências profissionais. O uso de CoP é sugerido pelos autores pela potencialidade de ser uma ferramenta importante para enfrentar um dos maiores desafios para o desenvolvimento profissional do professor: a construção de uma base de conhecimento docente que pode melhorar continuamente por meio do diálogo entre o conhecimento do profissional e o conhecimento baseado em pesquisa. Um exemplo marcante de CoP classificada como predominantemente virtual, mas que contém uma dimensão presencial considerável, é o estudo de Chinn [5656 P.W.U. Chinn, Cult Stud Sci Educ 1, 2 (2006).]. O trabalho centra-se no desenvolvimento de uma CoP de professores não-nativos do Havaí, de modo a se engajar no reconhecimento da relevância da cultura havaiana e sua promoção nas atividades escolares. Para isso, os participantes experimentaram uma semana de imersão cultural através da vivência com o cotidiano das populações nativas da região, permitindo maior compreensão da sua visão de mundo. O desenvolvimento se deu na continuidade da elaboração de materiais didáticos, interações em um website e no planejamento e realização de novas experiências de imersão cultural.

Quanto os espaços em que atuam, os trabalhos foram divididos em: a) espaços formais, b) espaços não formais de aprendizagem e c) não se aplica. Nessa classificação não adotamos a definição de que espaços não formais são aqueles constituídos fora do ambiente escolar, como sugerido por alguns autores Rodari, 2009 apud [104104 J.B.V. Marques e D. de Freitas, Fapesp 43, 4 (2017).]. Como destaca Trilla [105105 J. Trilla, em: Educação formal e não-formal: pontos e contrapontos, organizado por E. Ghanem e J. Trilla (Summus, São Paulo, 2008).] existe uma vasta variedade de propostas educacionais não formais que se localizam na própria escola como, por exemplo, algumas atividades extracurriculares. Logo, como sugerem Cazelli, Costa e Mahomed, [2010, p. 586], apud [104104 J.B.V. Marques e D. de Freitas, Fapesp 43, 4 (2017)., p. 1099] o espaço físico é insuficiente para definir o caráter das práticas educativas que nele se encerram, visto que práticas educativas não formais podem ter lugar no espaço físico da escola, assim como práticas formais podem ocorrer (e de fato ocorrem) em lugares como museus, tidos como espaços de práticas não formais. Gohn reforça essa linha de pensamento ao dizer “a educação não formal é um processo de aprendizagem, não uma estrutura simbólica edificada e corporificada em um prédio ou em uma instituição; ela ocorre pelo diálogo tematizado” [106106 M.D.G. Gohn, Rev Pedagógica 18. 39 (2016)., p. 62].

Adotamos em nossa classificação a linha de pensamento de Gohn, o que resultou em um total de 29 estudos em que as CoP atuam em espaços formais [88 P.W. Irving e E.C. Sayre, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 10, 1 (2014).1414 A.L. Gretton, T. Bridges e J.M. Fraser, Am J Phys 85, 5 (2017)., 3232 J. Byrne, M. Ideland, C. Malmberg e M. Grace, Int J Sci Educ 36, 9 (2014)., 3535 A.C. Hume, Res Sci Educ 42, 3 (2012)., 4040 W.M. Roth, Sci Educ 79, 5 (1995)., 4343 J. Anker-Hansen e M. Andrée, Int J Sci Educ 37, 15 (2015)., 4444 C. Eick e M. Dias, Sci Educ 89, 3 (2005)., 4848 P.M. Friedrichsen, D. Munford e M. Orgill, Sci Educ 90, 3 (2006)., 5454 L.H. Swanson e L.R. Coddington, Teach Teach Educ 59, 1 (2016)., 5555 R. Battle e I. Hawkins, J Sci Educ Technol 5. 4 (1996)., 6363 V.L. Akerson, L.A. Donnelly, M.L. Riggs e J.L. Eastwood, Int J Sci Educ 34, 9 (2012).6565 J. Case e J. Jawitz, J Res Sci Teach 41, 5 (2004)., 6767 C. Halversen e L.U. Tran, New Educ 6, 3 (2010)., 7171 J.S.C. Leung, A.S.L. Wong e B.H.W. Yung, Sci Educ 24, 7 (2015), 7373 T.A. Murray, P. Higgins, V. Minderhout e J. Loertscher, Biochem Mol Biol Educ 39, 6 (2011)., 7474 V.C. dos Santos e A. Arroio, J Sci Educ 17, 1 (2016).7676 H. Sevian, D. Hugi-Cleary, C. Ngai, F. Wanjiku e J.M. Baldoria, Int J Sci Educ 40, 10 (2018)., 7979 H. Thiry e S.L. Laursen, J Sci Educ Technol 20, 6 (2011)., 8080 K.L. Tonso, Cult Stud Sci Educ 1, 2 (2006)., 9191 W. Melville e B. Yaxley, Eurasia J Math Sci Technol Educ 5, 4 (2009)., 9393 P. Gupta, J. Adams, J. Kisiel e J. Dewitt, Cult Stud Sci Educ 5, 3 (2010).9595 M. Andrée, Cult Stud Sci Educ 9, 1 (2014).] e 33 em espaços não-formais [2525 A. Forbes e K. Skamp, Res Sci Educ, 49, 2, (2019).2929 J.H. Falk, S. Randol e L.D. Dierking, Public Underst Sci 21, 7 (2012)., 3131 S.A.I. Bottoms, K.M. Ciechanowski e B. Hartman, J Sci Teacher Educ 26, 8 (2015)., 3636 R. Kermish-Allen, K. Peterman e C. Bevc, Cult Stud Sci Educ 14, 3 (2018).3939 S. Philippou, C. Papademetri-Kachrimani e L. Louca, Prof Dev Educ 41, 2 (2015)., 4545 C.N. El-Hani e I.M. Greca, Res Sci Educ 43, 4 (2013)., 4646 C.N. El-Hani e I.M. Greca, Ciência Educ 17, 3 (2011)., 4949 E.M. Furtak e S.C. Heredia, J Res Sci Teach 51, 8 (2014).5151 C.R. Nicholas, Cult Stud Sci Educ 12, 2 (2017)., 5353 Y. Saka, S.A. Southerland e J.S. Brooks, Sci Educ 93,6 (2009)., 5656 P.W.U. Chinn, Cult Stud Sci Educ 1, 2 (2006).5959 J.F. Kisiel, J Res Sci Teach 51, 3 (2014)., 6060 S. Sentance e S. Humphreys, Comput Sci Educ 28,4 (2018)., 6666 A. Feldman, K.A. Divoll e A. Rogan-Klyve, Sci Educ 97, 2 (2013)., 6868 A.B. Hunter, S.L. Laursen e E. Seymour, Sci Educ 91, 1 (2006).7070 M. Kim e B. Cavas, Sci Educ Int 24, 3 (2013)., 7272 S.L. Mark, Cult Stud Sci Educ 13, 4 (2018)., 7878 K.A. Tallman e A. Feldman, J Sci Teacher Educ 27,3 (2016)., 8282 S. Fincher e J. Teneberg, J Eng Educ 95, 4 (2006).8686 M.M. Marques, M.J. Loureiro e L. Marques, Int J Web Based Communities 11, 3 (2015)., 9898 H. Durmaz, E.O. Dinçer e A. Osmanoğlu, Asia-Pacific Forum Sci Learn Teach 18, 1 (2017).]. As CoP em espaços formais costumam estar situadas em escolas e universidades. Já as atuantes em espaços não-formais são bastante diversas. Por exemplo, Bers [8383 M.U. Bers, J Sci Educ Technol 16, 6 (2007).] investiga uma CoP multigeracional, envolvendo crianças de 4 a 7 anos e seus pais, na aprendizagem de robótica. Segundo o autor, as famílias se inspiram em motivos religiosos para suas criações de robótica e as apresentam aos membros da comunidade na sinagoga antes das tradicionais preces judaicas. Já Feldman, Divoll e Rogan-Klyve [6666 A. Feldman, K.A. Divoll e A. Rogan-Klyve, Sci Educ 97, 2 (2013).] investigam como, no espaço (não-formal) universitário, alunos de graduação e pós-graduação constroem suas trajetórias de aprendizagem ao participar de grupos de pesquisas. Por meio da participação periférica legítima, em que os alunos mais experientes se comportam como mentores dos menos experientes, os aprendizes percorrem trajetórias que podem transformá-los em pesquisadores novatos, técnicos proficientes e produtores de conhecimento.

Quanto à origem das Comunidades de Prática os artigos foram divididos em: a) CoP fomentada e/ou criada, b) CoP já existente e c) não se aplica. Verificamos que um total de 45 estudos [88 P.W. Irving e E.C. Sayre, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 10, 1 (2014).1414 A.L. Gretton, T. Bridges e J.M. Fraser, Am J Phys 85, 5 (2017)., 3333 J.M. García, I.M. Greca e J. Meneses, Rev Electron Enseñanza las Ciencias 7, 2 (2008).3737 J.F. Kisiel, Sci Educ 94, 1 (2010)., 3939 S. Philippou, C. Papademetri-Kachrimani e L. Louca, Prof Dev Educ 41, 2 (2015).4141 J.A. da Silva e R.C. Bartelmebs, Acta Sci 15, 1 (2011)., 4343 J. Anker-Hansen e M. Andrée, Int J Sci Educ 37, 15 (2015).4747 G. Erickson, J. Mayer-Smith e A. Rodriguez, Int J Sci Educ 16, 5 (1994)., 5151 C.R. Nicholas, Cult Stud Sci Educ 12, 2 (2017)., 5454 L.H. Swanson e L.R. Coddington, Teach Teach Educ 59, 1 (2016).5858 H.J. Kim e B. Herbert, J Sci Educ Technol 21, 4 (2012)., 6161 S. Sotiriou, K. Riviou, S. Cherouvis, E. Chelioti e F.X. Bogner, J Sci Educ Technol 25, 4 (2016)., 6363 V.L. Akerson, L.A. Donnelly, M.L. Riggs e J.L. Eastwood, Int J Sci Educ 34, 9 (2012)., 6464 A.C. Barton, E. Tan e A. Rivet, Am Educ Res J 45,1 (2008)., 6767 C. Halversen e L.U. Tran, New Educ 6, 3 (2010).7070 M. Kim e B. Cavas, Sci Educ Int 24, 3 (2013)., 7373 T.A. Murray, P. Higgins, V. Minderhout e J. Loertscher, Biochem Mol Biol Educ 39, 6 (2011)., 7575 J. Schilling e R. Klamma, Assess Eval High Educ 35,4 (2010)., 7676 H. Sevian, D. Hugi-Cleary, C. Ngai, F. Wanjiku e J.M. Baldoria, Int J Sci Educ 40, 10 (2018)., 7878 K.A. Tallman e A. Feldman, J Sci Teacher Educ 27,3 (2016).8686 M.M. Marques, M.J. Loureiro e L. Marques, Int J Web Based Communities 11, 3 (2015).] dizem respeito a grupos5 5 Preferimos aqui denominar “grupos” e não CoP, porque somos críticos em relação à postura de vários autores que consideram, a priori, o grupo alvo do estudo como uma CoP, sem avaliar se o grupo apresenta características indispensáveis para uma CoP, como a intencionalidade da aprendizagem, uma identidade ou um repertório compartilhado de falas e comportamentos. criados e/ou fomentados pelos autores e que em 21 artigos [2525 A. Forbes e K. Skamp, Res Sci Educ, 49, 2, (2019).2929 J.H. Falk, S. Randol e L.D. Dierking, Public Underst Sci 21, 7 (2012)., 3131 S.A.I. Bottoms, K.M. Ciechanowski e B. Hartman, J Sci Teacher Educ 26, 8 (2015)., 3838 H. Min, H.J. Noh e S.H. Paik, Eurasia J Math Sci Technol Educ 13, 10 (2017)., 4848 P.M. Friedrichsen, D. Munford e M. Orgill, Sci Educ 90, 3 (2006)., 4949 E.M. Furtak e S.C. Heredia, J Res Sci Teach 51, 8 (2014)., 5353 Y. Saka, S.A. Southerland e J.S. Brooks, Sci Educ 93,6 (2009)., 5454 L.H. Swanson e L.R. Coddington, Teach Teach Educ 59, 1 (2016)., 5959 J.F. Kisiel, J Res Sci Teach 51, 3 (2014)., 6060 S. Sentance e S. Humphreys, Comput Sci Educ 28,4 (2018)., 6565 J. Case e J. Jawitz, J Res Sci Teach 41, 5 (2004)., 6666 A. Feldman, K.A. Divoll e A. Rogan-Klyve, Sci Educ 97, 2 (2013)., 7171 J.S.C. Leung, A.S.L. Wong e B.H.W. Yung, Sci Educ 24, 7 (2015), 7272 S.L. Mark, Cult Stud Sci Educ 13, 4 (2018)., 7474 V.C. dos Santos e A. Arroio, J Sci Educ 17, 1 (2016)., 7777 P.P. Silva, A.M.P. de Oliveira e E.C. de Souza, Ens Pesqui em Educ em Ciências 19, e665 (2017)., 8888 R. Tytler, Cult Stud Sci Educ 13, 2 (2018)., 9898 H. Durmaz, E.O. Dinçer e A. Osmanoğlu, Asia-Pacific Forum Sci Learn Teach 18, 1 (2017).] os grupos investigados se constituíram de maneira espontânea. Embora Comunidades de Prática possam surgir espontaneamente Wenger, McDermott e Snyder [66 E. Wenger, R. Mcdermott e W.M. Snyder, Cultivating communities of practice: a guide to managing knowledge (Harvard Business School Press, 2002).] esclarecem que é possível cultivá-las levando em conta sete princípios básicos por eles estabelecidos: desenhar para a evolução, manter o diálogo entre a perspectiva interna e externa, convidar diferentes níveis de participação, desenvolver espaços públicos e privados para a CoP, focar no valor da CoP, combinar familiaridade e entusiasmo e criar um ritmo para a comunidade. Exemplos de Comunidades de Prática fomentadas pelos próprios pesquisadores, a partir da reunião de membros potenciais motivados por um interesse comum, encontram-se nos já mencionados estudos de El-Hani e Greca [4444 C. Eick e M. Dias, Sci Educ 89, 3 (2005).4545 C.N. El-Hani e I.M. Greca, Res Sci Educ 43, 4 (2013).] que focam na criação de Comunidade de Prática de professores de Biologia e no trabalho de Crippen et al. [8585 K.J. Crippen, S. Ellis, B.A. Dunckel, A.J. W. Hendy e B. J. MacFadden, J Sci Educ Technol 25, 5 (2016).], que organizam uma comunidade congregando paleontólogos profissionais e amadores. Fazer com que esses grupos de pessoas se tornem uma Comunidade de Prática, compartilhem conhecimento, aprendam uns com os outros, ensinem uns para os outros e modifiquem a sua identidade requer um importante planejamento, porém não identificamos, nos trabalhos que fazem parte desta revisão, a utilização dos princípios propostos por Wenger, McDermott e Snyder [66 E. Wenger, R. Mcdermott e W.M. Snyder, Cultivating communities of practice: a guide to managing knowledge (Harvard Business School Press, 2002).], para o cultivo de CoP.

Já os trabalhos apresentados por Feldman, Divoll e Rogan-Klyve [6666 A. Feldman, K.A. Divoll e A. Rogan-Klyve, Sci Educ 97, 2 (2013).], Leung, Wong e Yung [7171 J.S.C. Leung, A.S.L. Wong e B.H.W. Yung, Sci Educ 24, 7 (2015)] e Mark [7272 S.L. Mark, Cult Stud Sci Educ 13, 4 (2018).] tratam de grupos já existentes investigados pelos autores sob a óptica das Comunidades de Práticas, através de entrevistas e observação participante, por exemplo.

Quanto à formação profissional, os artigos que tratam dessa temática foram divididos em: a) docente e b) não docente. Verificamos que 61 artigos dizem respeito ao uso de Comunidades de Prática como estratégia para a formação profissional. A maior parte concentra-se em formação docente (N=43), mas há também os que se preocupam com a formação não docente (N=18), como a formação de engenheiros, físicos, biotecnólogos, paleontólogos e biólogos. As problemáticas abordadas nesses artigos são discutidas na Seção 6.

Síntese da resposta à Questão de Pesquisa (1)

Realizando a classificação dos 87 artigos investigados, quanto à sua natureza (pesquisa empírica ou pesquisa teórica), nível de ensino (Fundamental, Médio ou Superior), natureza da relação entre os membros das CoP (presencial ou virtual), espaços em que atuam (formal ou não-formal) e a origem das CoP (fomentada ou criada espontaneamente), foi possível traçar o perfil da produção acadêmica sobre Comunidades de Prática no Ensino de Ciências. A Figura 3 resume as categorizações adotadas para o delineamento do perfil da produção acadêmica.

Figura 3
Perfil da produção acadêmica sobre CoP no Ensino de Ciências.

Os trabalhos de pesquisa empírica (N=70) são a grande maioria dos presentes nesta revisão. Quanto ao nível de ensino, embora haja um número maior de artigos classificados como Educação Básica (N=47) do que aqueles classificados como Educação Superior (N=32), foi verificada uma importante lacuna nas pesquisas sobre CoP, os trabalhos voltados para o Ensino Médio não estão focados em cursos profissionais nesse nível de ensino.

Mesmo com a crescente oferta de ferramentas virtuais de comunicação, os trabalhos envolvendo CoP predominantemente presenciais (N=53) são a grande maioria se comparados com CoP predominantemente virtuais (N=15). No que diz respeito a essa classificação, defendemos que o fomento de Comunidades de Prática promissoras deve ocorrer com o planejamento de espaços para encontros presenciais frequentes de maneira que se promova o processo de participação dentro da CoP. Por outro lado, é importante que se invista, também, em meios virtuais de comunicação uma vez que eles apresentam a possibilidade de preservar a memória das atividades e do repertório compartilhado da CoP, fornecendo uma maneira de coisificar as produções e práticas da Comunidade.

Os estudos que investigam CoP já constituídas de maneira espontânea (N=21) são importantes uma vez que investigar esses grupos é um passo fundamental para minimizar os riscos nas propostas de criação e fomento de Comunidades de Prática voltadas para a melhoria dos processos educativos no Ensino de Ciências. Ainda foi possível verificar uma lacuna referente a não utilização dos princípios de Wenger para o cultivo de Comunidades de Prática no Ensino de Ciências.

Finalmente, os estudos que investigam ou propõem o uso de Comunidades de Prática na formação docente são a maioria (N=43) se comparados com aqueles voltados para a formação não docente (N=18). Na Tabela S2 do material suplementar apresentamos a classificação dos artigos que nos permitiu traçar o perfil da produção acadêmica sobre Comunidades de Prática no Ensino de Ciências.

5. Quais os Principais Referenciais Teóricos e Metodológicos Utilizados nas Pesquisas sobre CoP?

Nesta seção, apresentamos as discussões acerca dos referenciais teóricos e as metodologias de pesquisa presente nos trabalhos contidos nessa revisão da literatura.

5.1. Referenciais teóricos utilizados nos artigos investigados

Tendo como base o panorama geral da construção do conceito de Comunidades de Prática desenvolvido ao longo das quatro obras seminais discutidas na Seção 2, nossa intenção foi verificar quais desses trabalhos são empregues como referenciais teóricos das pesquisas. A Figura 4 apresenta a quantidade de artigos que faz uso das obras seminais sobre Comunidades de Prática.

Figura 4
Referenciais teóricos utilizados nos artigos.

Identificamos que aproximadamente 64% dos trabalhos (N=56) utilizam o livro Situated Learning: Legitimate Peripheral Participation e que em torno de 67% (N=58) tem como referencial o livro Communities of Practice: Learning, Meaning and Identity. Ao discutir os processos de aprendizagem nas CoP, Wenger dá relevância às descontinuidades geracionais; embora a existência de uma CoP dependa de alguns membros fixos, alguns membros vão-se e outros vêm. Ou seja, sempre haverá novas gerações de pessoas se filiando a esses grupos e “estes encontros entre gerações são o aspecto da prática que com mais frequência se considera aprendizagem” [2121 E. Wenger, Comunidades de Practica: Aprendizaje, significado e identidad (Paidós, Barcelona, 2001).., p. 129]. A descontinuidade geracional ocorre exatamente na periferia da comunidade e para que um novato possa percorrer uma trajetória entrante deve adquirir legitimidade suficiente ao ponto de ser tratado como um membro potencial. Para isso, a participação periférica deve proporcionar acesso às três dimensões da prática: ao compromisso mútuo com os outros membros, às suas ações e negociação de um empreendimento, e ao repertório de práticas compartilhado nas ações da CoP.

Portanto não causa surpresa que grande parte dos artigos (N=33) faça a utilização, em conjunto, das duas obras mais citadas uma vez que seus principais conceitos estão inter-relacionados.

Verificamos um baixo número de menções à Brown e Duguid [8484 D. Blackman e A.M. Benson, Public Underst Sci 21,5 (2010).], em torno de 2% (N=2), e à Wenger, McDermott e Snyder [66 E. Wenger, R. Mcdermott e W.M. Snyder, Cultivating communities of practice: a guide to managing knowledge (Harvard Business School Press, 2002).], aproximadamente 9% (N=8). Uma possível explicação pode ser o fato de que essas duas publicações são voltadas para a área organizacional. No trabalho de Brown e Duguid [8484 D. Blackman e A.M. Benson, Public Underst Sci 21,5 (2010).], a ênfase está em gerar soluções para novos problemas que surgem nos ambientes empresariais, em vez da reprodução de conhecimentos já existentes, como discutido por Lave e Wenger [1818 J. Lave e E. Wenger, Situated Learning: Legitimate Peripheral Participation (Cambridge Univertity Press, Cambridge, 1991).]. Já no livro de Wenger, McDermott e Snyder [66 E. Wenger, R. Mcdermott e W.M. Snyder, Cultivating communities of practice: a guide to managing knowledge (Harvard Business School Press, 2002).] o foco está no valor das Comunidades de Prática como ferramenta de gerenciamento para estimular a inovação e solução de problemas em grandes corporações. Como afirma Cox [1717 A. Cox, J Inf Sci 31, 6 (2005)., p. 536], “o livro de 2002 é uma simplificação e popularização, mas também uma mercantilização da ideia de Comunidades de Prática”.

Ainda, observamos que aproximadamente 9% (N=8) dos artigos não se apropriam diretamente de nenhuma das quatro obras seminais. Desses, cinco [1313 B.S. Eylon e E. Bagno, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 2, 2 (2006)., 3232 J. Byrne, M. Ideland, C. Malmberg e M. Grace, Int J Sci Educ 36, 9 (2014)., 5050 M.M. Marques, M.J. Loureiro e L. Marques, Int J Web Based Communities 7, 4 (2011)., 8686 M.M. Marques, M.J. Loureiro e L. Marques, Int J Web Based Communities 11, 3 (2015)., 8888 R. Tytler, Cult Stud Sci Educ 13, 2 (2018).] se baseiam em fontes secundárias, recorrendo a trabalhos que utilizam ao menos uma das obras seminais descritas. O único artigo dessa revisão que desempenha função de referência para esses trabalhos é o de Sadler [9292 T.D. Sadler, Stud Sci Educ 45. 1 (2009).] que contém uma vasta discussão teórica acerca de teorias de Aprendizagem Situada. Os outros três artigos [3636 R. Kermish-Allen, K. Peterman e C. Bevc, Cult Stud Sci Educ 14, 3 (2018)., 5757 A.C. Howe e H.S. Stubbs, Sci Educ 87, 2 (2003)., 7171 J.S.C. Leung, A.S.L. Wong e B.H.W. Yung, Sci Educ 24, 7 (2015)] não esclarecem o que entendem por Comunidade de Prática, assumindo esse termo como dado. Consideramos esse achado ao mesmo tempo uma oportunidade e um motivo de cautela: o uso de fontes secundárias implica que o referencial se encontra em expansão, mas atentamos para os riscos da utilização de uma teoria apenas à luz de fontes secundárias, ou da total desconsideração de uma especificação desse referencial teórico. Por fim, consideramos que o termo Comunidades de Prática não possa ser utilizado sem qualquer descrição; trata-se de um termo reservado dentro de um referencial teórico, cujo significado não pode ser assumido como de senso comum.

Nossos resultados divergem, em parte, dos resultados obtidos por Rodrigues, Silva e Miskulin [1515 M.U. Rodrigues, L.D. da Silva e R.G.S. Miskulin, Rev Educ Matemática 14, 16 (2017).], cujo foco são teses e dissertações nacionais. Esses autores concluem que 45 das 46 pesquisas realizadas no Brasil na área da Educação se valem do conceito de Comunidades de Prática conforme apresentado por Wenger em 1998. Em seguida, a obra mais citada (N=14) é o livro publicado por Wenger, McDermott e Snyder em 2002. Por último está o trabalho conjunto de Lave e Wenger, de 1991, com 12 citações.

5.2. Metodologias Utilizadas nos Artigos Investigados

Em nossa busca verificamos que dos 70 trabalhos classificados como pesquisa empírica, apenas Sotiriou et al. [6161 S. Sotiriou, K. Riviou, S. Cherouvis, E. Chelioti e F.X. Bogner, J Sci Educ Technol 25, 4 (2016).] e Kim e Cavas [7070 M. Kim e B. Cavas, Sci Educ Int 24, 3 (2013).] usaram unicamente métodos quantitativos. Outros 11 trabalhos (Akerson et al., 2012 [6363 V.L. Akerson, L.A. Donnelly, M.L. Riggs e J.L. Eastwood, Int J Sci Educ 34, 9 (2012).]; Crippen et al., 2016 [8585 K.J. Crippen, S. Ellis, B.A. Dunckel, A.J. W. Hendy e B. J. MacFadden, J Sci Educ Technol 25, 5 (2016).]; Eylon e Bagno, 2006 [1313 B.S. Eylon e E. Bagno, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 2, 2 (2006).]; Fincher e Tenenberg, 2006 [8282 S. Fincher e J. Teneberg, J Eng Educ 95, 4 (2006).]; Gretton, Bridges e Fraser, 2017 [1414 A.L. Gretton, T. Bridges e J.M. Fraser, Am J Phys 85, 5 (2017).]; Kim et al., 2012 [6969 H.J. Kim, H.R. Miller, B. Herbert, S. Pedersen e C. Loving, J Sci Educ Technol 21, 4 (2012).]; Kisiel, 2014 [5959 J.F. Kisiel, J Res Sci Teach 51, 3 (2014).]; Leung, Wong e Yung, 2015 [7171 J.S.C. Leung, A.S.L. Wong e B.H.W. Yung, Sci Educ 24, 7 (2015)]; Murray et al., 2011 [7373 T.A. Murray, P. Higgins, V. Minderhout e J. Loertscher, Biochem Mol Biol Educ 39, 6 (2011).]; Sentence e Humphreys, 2018 [6060 S. Sentance e S. Humphreys, Comput Sci Educ 28,4 (2018).]; Sevian et al., 2018 [7676 H. Sevian, D. Hugi-Cleary, C. Ngai, F. Wanjiku e J.M. Baldoria, Int J Sci Educ 40, 10 (2018).]) empregaram métodos qualitativos associados a métodos quantitativos. Nos demais 41 trabalhos de pesquisa que utilizam exclusivamente métodos qualitativos, damos destaque aos oito que fizeram uso da etnografia (Hunter, Laursen e Seymour, 2006 [6868 A.B. Hunter, S.L. Laursen e E. Seymour, Sci Educ 91, 1 (2006).]; Irving, Obsniuk e Caballero, 2017 [1212 P.W. Irving, M.J. Obsniuk e M.D. Caballero, Eur J Phys 38, 5 (2017).]; Irving e Sayre, 2014, 2015 [88 P.W. Irving e E.C. Sayre, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 10, 1 (2014).], [1010 P.W. Irving e E.C. Sayre, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 11, 2 (2015).]; Mark, 2018 [7272 S.L. Mark, Cult Stud Sci Educ 13, 4 (2018).]; Rodriguez et al., 2015 [1111 I. Rodriguez, R.M. Goertzen, E. Brewe e L.H. Kramer, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 11, 1 (2015).]; Roth, 1995 [4040 W.M. Roth, Sci Educ 79, 5 (1995).]; Tonso, 2006 [8080 K.L. Tonso, Cult Stud Sci Educ 1, 2 (2006).]).

Segundo Lorenz e Barlatier [107107 E. Lorenz e P. Barlatier, Report on Methods for Studying Communities of Practice, União Europeia, Bruxelas (2007).], a escolha do método etnográfico, utilizado nos trabalhos seminais sobre Comunidades de Prática, foi baseada na premissa de que ele é adequado para captar a natureza localmente situada da aprendizagem, incluindo a forma como essas configurações sociais e seus artefatos servem para mediar o processos de troca de conhecimento e cooperação no desempenho de suas tarefas.

É difícil pensar como Wenger [2121 E. Wenger, Comunidades de Practica: Aprendizaje, significado e identidad (Paidós, Barcelona, 2001).., p. 158] poderia chegar, por exemplo, a alguns dos 14 indicadores de que uma Comunidade de Prática tenha se formado, sem o auxílio do método etnográfico. Alguns elementos dessa lista como: a ausência de preâmbulos introdutórios nas conversas, o uso de histórias compartilhadas e de piadas internas, e os estilos reconhecidos como mostra de afiliação ao grupo se referem a comportamentos espontâneos que permanecem tácitos e, portanto, são difíceis de serem expressos pelos membros da CoP. Seria uma tarefa bastante árdua ou mesmo impossível capturar esse comportamento sem o suporte do método etnográfico, que prevê a participação nas atividades do grupo e a permanência do pesquisador durante longos períodos de tempo.

Quando os autores não realizam etnografias, mesmo assim, existe forte tendência ao uso de instrumentos de coleta de dados próprios dessa metodologia como observação participante, entrevistas e escrita de diários de campos. De fato, o método etnográfico parece ser privilegiado nos estudos de CoP, mas isso não exclui a adoção de outros métodos, como estudos de caso e estudos fenomenológicos.

As Comunidades de Prática podem se diferenciar umas das outras em várias dimensões como o tipo de conhecimento, a prevalência da comunicação face a face em oposição à comunicação virtual, a importância dos laços interpessoais em relação aos arranjos institucionais mais amplos e a relação entre a prática formal e a informal. Portanto diferentes métodos podem ser mais ou menos adequados para estudar esta ou aquela Comunidade de Prática, fornecendo uma justificativa que apoia o pluralismo metodológico [107107 E. Lorenz e P. Barlatier, Report on Methods for Studying Communities of Practice, União Europeia, Bruxelas (2007).]. No entanto, esta revisão mostra que existe forte tendência de utilização do método etnográfico ou de instrumentos característicos dele. A descrição detalhada dos grupos estudados, através de narrativas, por exemplo, é um importante instrumento de pesquisa que permite a identificação das práticas e relações interpessoais que ocorrem dentro das CoP. Além disso o emprego da etnografia como metodologia de pesquisa dialoga de forma estreita com os referenciais teóricos amplamente utilizados nessas pesquisas.

Durante a leitura dos artigos emergiu uma nova questão: Qual o grau de rigor teórico e metodológico apresentado na caracterização de grupos estudados nas pesquisas como Comunidades de Prática?

Diversos estudos consideram, a priori, os grupos estudados como Comunidades de Prática; não descrevem de maneira detalhada as suas dinâmicas e nem apresentam indícios da existência dos três elementos constituintes de uma CoP, conforme a Teoria Social de Aprendizagem proposta por Wenger: o empreendimento conjunto, o compromisso mútuo e um repertório compartilhado para levar adiante a prática. Esses resultados corroboram os obtidos por Smith, Hayes e Shea [1616 S.U. Smith, S. Hayes e P. Shea, Online Learn 21. 1 (2017).], cujo corpus da análise é mais limitado que o presente. Somos críticos em relação à postura de ignorar em que medida o grupo social em estudo pode ser considerado uma CoP, pois como alerta Wenger [2121 E. Wenger, Comunidades de Practica: Aprendizaje, significado e identidad (Paidós, Barcelona, 2001).., p. 155] “chamar de comunidade de prática cada configuração social imaginável faria que este conceito perdesse todo o sentido”. Sendo assim, é importante investigar essa questão em trabalhos futuros, pois foge ao escopo desta revisão, em que buscamos construir um panorama geral da produção.

Síntese da resposta à Questão de Pesquisa (2)

Em síntese, como resposta à questão de pesquisa título desta seção podemos afirmar que os referenciais teóricos mais frequentes são as obras seminais Situated Learning: legitimate peripheral participation (N=56) e Communities of Practice: learning, meaning and identity (N=58). As outras duas obras seminais, voltadas para a área da gestão organizacional, quase não são citadas nas pesquisas em Ensino de Ciências.

As metodologias de pesquisa utilizadas nas investigações sobre Comunidades de Prática são predominantemente qualitativas; alguns poucos autores associam métodos quantitativos aos qualitativos; e apenas dois artigos fazem uso exclusivo de métodos quantitativos. Pode-se destacar o uso da etnografia como um importante método de pesquisa e a utilização de instrumento de coleta de dados que possibilita uma descrição profunda dos grupos estudados, como observação participante e entrevistas.

6. Quais as Principais Problemáticas Sobre Formação Profissional Presentes nos Artigos?

No que diz respeito à Formação Profissional identificamos 55 artigos sobre Comunidades de Prática: 18 artigos sobre Formação Profissional Não Docente; oito, sobre Formação Inicial de Professores; seis sobre Indução Profissional de Professores e 23 artigos sobre Formação Continuada de Professores. A seguir, apresentamos os trabalhos classificados nessas categorias, descrevendo as problemáticas abordadas.

6.1. Formação profissional não docente

Dos 18 artigos que tratam de formação não docente três são de pesquisa teórica: Andrée [9595 M. Andrée, Cult Stud Sci Educ 9, 1 (2014).], Ramaley, Olds e Earle [9999 J.A. Ramaley, B.M. Olds e J. Earle, J Sci Educ Technol 14, 2 (2005).] e Ben-Ari [8989 M. Ben-Ari, Sci Educ 14, 3 (2005).]. Eles discutem o conceito de CoP apoiados em trabalhos anteriores e citam que essas estruturas sociais podem ser importantes alternativas para auxiliar a formação profissional nos cursos universitários, nas áreas de Biotecnologia, STEM e Ciência da Computação. Nos demais 15 artigos, o referencial de Comunidade de Prática tem sido utilizado para compreender os processos de formação de profissionais ligados a carreiras científicas em nível Superior. As problemáticas encontradas nos diferentes trabalhos podem ser divididas em duas linhas principais: (i) aproximação entre o ambiente formativo universitário e o campo de trabalho na sociedade e (ii) compreensão do impacto da inserção em Comunidades de Prática nas trajetórias formativas profissionais.

Aproximação da Universidade com a sociedade

Um dos problemas abordados neste grupo de artigos é a dificuldade da transferência e disseminação de conhecimento entre cientistas e outros segmentos da sociedade. Blackman e Benson [8484 D. Blackman e A.M. Benson, Public Underst Sci 21,5 (2010).] realizaram três estudos de caso em organizações que operam programas nos quais turistas são recrutados para participar como pesquisadores voluntários coletando dados em pesquisas ambientais. Seguindo a mesma linha, Crippen et al. [8585 K.J. Crippen, S. Ellis, B.A. Dunckel, A.J. W. Hendy e B. J. MacFadden, J Sci Educ Technol 25, 5 (2016).] realizaram uma investigação nos EUA sobre as características de grupos de paleontólogos profissionais e de paleontólogos amadores, que têm por hobby a coleta de fósseis, Já Halversen e Tran [6767 C. Halversen e L.U. Tran, New Educ 6, 3 (2010).] promovem um curso que estabelece uma parceria entre educadores que trabalham em aquários e centros de ciências com professores universitários. Por fim, Munby et al. [2424 H. Munby, J. Taylor, P. Chin e N.L. Hutchinson, Sci Educ 91, 1 (2006).] investigam os processos de transferência de aprendizagem entre os ambientes educativos e os locais de trabalho. Assim, os trabalhos evidenciam a busca por estabelecer uma ponte entre o conhecimento especializado de cientistas e demais profissionais e o conhecimento na sociedade, oportunizado pela interação e imersão em diferentes Comunidades de Prática.

Trajetórias de aprendizagem dos alunos em cursos universitários

Os demais artigos que investigam o uso de CoP na formação profissional não-docente discutem como os alunos aprendem à medida que participam de práticas relacionadas às atividades profissionais supervisionadas por colegas mais experientes. Esse é o caso dos trabalhos de Case e Jawitz [6565 J. Case e J. Jawitz, J Res Sci Teach 41, 5 (2004).], Feldman, Divoll e Rogan-Klyve [6666 A. Feldman, K.A. Divoll e A. Rogan-Klyve, Sci Educ 97, 2 (2013).], Fincher e Tenenberg [8282 S. Fincher e J. Teneberg, J Eng Educ 95, 4 (2006).], Hunter, Laursen e Seymour [6868 A.B. Hunter, S.L. Laursen e E. Seymour, Sci Educ 91, 1 (2006).], Tonso [8080 K.L. Tonso, Cult Stud Sci Educ 1, 2 (2006).], Irving, Obsniuk e Caballero [1212 P.W. Irving, M.J. Obsniuk e M.D. Caballero, Eur J Phys 38, 5 (2017).] e Silva, Oliveira e Souza [7777 P.P. Silva, A.M.P. de Oliveira e E.C. de Souza, Ens Pesqui em Educ em Ciências 19, e665 (2017).], Schilling e Klamma [7575 J. Schilling e R. Klamma, Assess Eval High Educ 35,4 (2010).]. Um conjunto de trabalhos, propostos por Irving e Sayre [88 P.W. Irving e E.C. Sayre, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 10, 1 (2014).1010 P.W. Irving e E.C. Sayre, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 11, 2 (2015).], voltado para a formação de físicos, é representativo nessa categoria de problemáticas. Irving e Sayre [88 P.W. Irving e E.C. Sayre, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 10, 1 (2014).] realizaram um estudo etnográfico observando as interações entre os participantes de um curso de laboratório chamado AdLab oferecido pela Universidade Estadual do Kansas, nos Estados Unidos da América. Em um estudo posterior, os mesmos autores [1010 P.W. Irving e E.C. Sayre, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 11, 2 (2015).] discutem as fronteiras existentes entre o que chamam de Comunidade de Prática dos físicos (profissionais) e a Comunidade de Prática dos alunos do bacharelado em Física. Neste estudo discutem como os alunos de graduação transitam de uma comunidade para a outra, em especial nas atividades de iniciação científica. Em um terceiro artigo, Irving e Sayre [99 P.W. Irving e E.C. Sayre, Cult Stud Sci Educ 11,4 (2016).] estendem os dois estudos anteriores investigando a formação de identidade dos estudantes de graduação realizando três estudos de caso com alunos da Universidade do Kansas. Uma ressalva que fazemos aos três trabalhos de Irving e Sayre diz respeito à caracterização de um grupo um tanto amplo como uma Comunidade de Prática, quando se refere à CoP dos físicos. Pode ser possível que físicos constituam Comunidades de Prática em um determinado contexto institucional, no entanto dizer que todos os físicos participam de uma única CoP não nos parece uma boa opção. Entendemos que seria mais adequado classificar o grupo como uma constelação de práticas [2121 E. Wenger, Comunidades de Practica: Aprendizaje, significado e identidad (Paidós, Barcelona, 2001).., p. 160]. Em síntese, para os autores, as Comunidades de Prática podem fornecer espaços para compreender apoiar e promover processos formativos que privilegiem o trabalho colaborativo, o contato com profissionais já formados e atuantes em seu ambiente de trabalho, a busca por ajuda, o desenvolvimento de projetos de pesquisa e uma consciência mais apurada de sua atuação futura na profissão.

6.2. Formação profissional docente

A presente revisão também possibilitou identificar trabalhos preocupados em compreender e apoiar a formação de professores à luz dos referenciais de Comunidades de Prática. Foi possível classificá-los como voltados para a Formação Inicial de Professores, compreendida como a que ocorre nos cursos preparatórios de professores, usualmente de nível Superior, para a Formação Continuada de Professores, ocorrida ao longo da carreira docente, e para a categoria emergente, chamada de Indução Profissional de Professores, referindo-se ao período inicial de atuação profissional docente.

6.2.1. Formação Inicial de Professores

Uma crítica recorrente na literatura em relação à formação inicial de professores diz respeito à existência de uma contradição entre os modelos que se apregoa para os processos de ensino e aprendizagem e as experiências vivenciadas pelos estudantes nos cursos de formação inicial. É comum nesses cursos uma ampla discussão e teorização sobre práticas e tendências educativas inovadoras para a sala de aula que não são utilizadas de forma direta com os próprios estudantes em processos de formação inicial (e.g [108108 R.A. de Nevado, B.C. Magdalena e I.E.T. Costa, Informática na Educ Teor prática 2, 2 (1999)., 109109 R. Martinez, C. Leite e A. Monteiro, Crítica Educ 1,1 (2015).]). Uma alternativa para o enfrentamento desse problema tem sido encontrada nas Comunidades de Prática. Por meio de CoP é possível desenvolver experiências inovadoras para apoiar Estágios Docentes e/ou práticas de ensino de estudantes universitários que estão se formando como futuros professores de Ciências.

Assim as CoP se constituem em ambientes colaborativos que facilitam a interação entre professores em formação inicial, professores em serviço e pesquisadores, promovendo o aprendizado de conhecimentos científicos, pedagógicos e novas tendências de ensino. Entre as características dessas comunidades, ressaltamos que têm como denominador comum a participação de um professor orientador ou coordenador do estágio, que na maioria dos casos atua como pesquisador, contribuindo por sua vez, na intermediação entre professores em exercício e os estagiários.

Compõem essa categoria, os estudos de Akerson et al. [6363 V.L. Akerson, L.A. Donnelly, M.L. Riggs e J.L. Eastwood, Int J Sci Educ 34, 9 (2012).], Bottoms, Ciechanowsky e Hartman [3131 S.A.I. Bottoms, K.M. Ciechanowski e B. Hartman, J Sci Teacher Educ 26, 8 (2015).], Eicke e Dias [4444 C. Eick e M. Dias, Sci Educ 89, 3 (2005).], Erickson et al. [4747 G. Erickson, J. Mayer-Smith e A. Rodriguez, Int J Sci Educ 16, 5 (1994).], Hawkins e Rogers [3434 S. Hawkins e M. Park Rogers, J Sci Teacher Educ 27,4 (2016).], Hume [3535 A.C. Hume, Res Sci Educ 42, 3 (2012).], Kim e Cavas [7070 M. Kim e B. Cavas, Sci Educ Int 24, 3 (2013).] e Santos e Arroio [7474 V.C. dos Santos e A. Arroio, J Sci Educ 17, 1 (2016).]. Entre os principais interesses das CoP estudadas estão: simulação de modelos de ensino e a interação com comunidades de professores [3535 A.C. Hume, Res Sci Educ 42, 3 (2012).], aprendizagem sobre novas tendências no Ensino de Ciências através de programas supervisionados de estágio docente [7474 V.C. dos Santos e A. Arroio, J Sci Educ 17, 1 (2016).], desenvolvimento de concepções acerca da Natureza das Ciências [6363 V.L. Akerson, L.A. Donnelly, M.L. Riggs e J.L. Eastwood, Int J Sci Educ 34, 9 (2012).], promoção de projetos de práticas educativas focados no estudo dos problemas de aprendizado e Ensino das Ciências em situações reais [4444 C. Eick e M. Dias, Sci Educ 89, 3 (2005).], culturalmente relevantes e na reflexão docente [3434 S. Hawkins e M. Park Rogers, J Sci Teacher Educ 27,4 (2016).] Finalmente, desenvolvimento de práticas de ensino marcadas por atividades de pesquisa na Escola integrando plataformas virtuais [4444 C. Eick e M. Dias, Sci Educ 89, 3 (2005).] e redes sociais [7070 M. Kim e B. Cavas, Sci Educ Int 24, 3 (2013).] como recurso mediador entre os participantes.

Os trabalhos não apresentam um conjunto de problemáticas partilhadas bem definida, como observado nas outras categorias de formação docente, apresentando em comum o fomento de CoP como experiências inovadoras para apoiar estágios ou práticas docentes de estudantes universitários na sua formação profissional. Isso se deve, em parte, pelo baixo número de pesquisas empíricas voltadas para essa categoria. Dessa maneira, reconhecemos a urgente necessidade da realização de mais estudos voltados para a Formação Inicial de Professores sob o olhar das Comunidades de Prática.

6.2.2. Formação Continuada de Professores

O referencial teórico de Comunidades de Prática também tem ganhado espaço no contexto de Formação Continuada de Professores, oferecendo novas perspectivas e modelos formativos para apoiar os processos de aprendizagem ao longo da carreira. Tradicionalmente, essa é marcada por uma visão insular, ocorrendo na forma de cursos isolados da prática docente e dos problemas reais de sala de aula [110110 F. Imbernón, Formação Continuada de Professores (Artmed, Porto Alegre, 2010).]. As Comunidades de Prática oferecem uma nova perspectiva teórica e prática útil para o sustentar a aprendizagem profissional de professores ao longo de sua carreira; assim, essa revisão da literatura permitiu identificar comos as CoP promovem (i) espaços de interlocução entre Escola e Universidade, (ii) estruturas para a criação e difusão de inovações didáticas, e (iii) ambientes para o desenvolvimento da identidade docente. A seguir, aprofundamos e discutimos essas problemáticas. Vale destacar, também, que muitas das CoP [4545 C.N. El-Hani e I.M. Greca, Res Sci Educ 43, 4 (2013)., 4646 C.N. El-Hani e I.M. Greca, Ciência Educ 17, 3 (2011)., 5454 L.H. Swanson e L.R. Coddington, Teach Teach Educ 59, 1 (2016)., 5656 P.W.U. Chinn, Cult Stud Sci Educ 1, 2 (2006).] estudadas possuem conexão com a Formação Inicial de Professores, mas que são classificadas nessa seção por dedicarem maior ênfase e apresentarem maior relevância para a Formação Continuada de Professores.

Espaços de Interlocução entre Escola e Universidade

A lacuna entre a pesquisa realizada nas Universidades e as práticas docentes desenvolvidas na Escola é o tema central dos trabalhos de El-Hani e Greca [4545 C.N. El-Hani e I.M. Greca, Res Sci Educ 43, 4 (2013)., 4646 C.N. El-Hani e I.M. Greca, Ciência Educ 17, 3 (2011).], Eylon e Bagno [1313 B.S. Eylon e E. Bagno, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 2, 2 (2006).] Silva e Bartelmebs [4141 J.A. da Silva e R.C. Bartelmebs, Acta Sci 15, 1 (2011).], Swanson e Coddington [5454 L.H. Swanson e L.R. Coddington, Teach Teach Educ 59, 1 (2016).] e de Tallman e Feldman [7878 K.A. Tallman e A. Feldman, J Sci Teacher Educ 27,3 (2016).]. Eylon e Bagno [1313 B.S. Eylon e E. Bagno, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 2, 2 (2006).] buscaram descrever um modelo de desenvolvimento profissional que respondesse à necessidade, por parte dos professores de Física da Escola Básica, de maior consciência acerca das pesquisas na área de Ensino de Física. As autoras se concentraram em relatar a experiência de seis professores em um projeto que visava o engajamento em investigações científicas propiciadas a partir de problemas reais de sala de aula. Os objetivos do projeto foram despertar a consciência da necessidade contínua de aprender, através da atualização e expansão dos conhecimentos científicos e pedagógicos, e o desenvolvimento de lições baseadas em pesquisa em Ensino de Física e o fomento de uma Comunidade de Prática. O projeto de Formação Continuada de Professores foi aplicado em forma de workshop, com duração de três anos, com a participação de 50 professores de Física. As autoras salientaram o desenvolvimento, no coletivo de uma CoP, de uma consciência sobre as próprias deficiências em conhecimentos por parte dos professores e sobre as dificuldades enfrentadas por diferentes aprendizes, professores e pesquisadores. Ao longo da participação na comunidade, as pesquisas científicas em Ensino de Física ganharam relevância nas práticas dos professores, passando a ser consideradas como fontes para a solução dos problemas vivenciados em sala de aula.

Estruturas para a Criação e Difusão de Inovações Didáticas

A criação e difusão de inovações didáticas e tecnológicas e a transformação das práticas docentes são o tema predominante nos estudos conduzidos por Battle e Hawkins [5555 R. Battle e I. Hawkins, J Sci Educ Technol 5. 4 (1996).], Forbes e Skamp [2828 A. Forbes e K. Skamp, Res Sci Educ, 43, 3, (2013).], Furtak e Heredia [4949 E.M. Furtak e S.C. Heredia, J Res Sci Teach 51, 8 (2014).], García, Greca e Meneses [3333 J.M. García, I.M. Greca e J. Meneses, Rev Electron Enseñanza las Ciencias 7, 2 (2008).], Kim et al. [6969 H.J. Kim, H.R. Miller, B. Herbert, S. Pedersen e C. Loving, J Sci Educ Technol 21, 4 (2012).] Marques, Loureiro e Marques [5050 M.M. Marques, M.J. Loureiro e L. Marques, Int J Web Based Communities 7, 4 (2011)., 8686 M.M. Marques, M.J. Loureiro e L. Marques, Int J Web Based Communities 11, 3 (2015).], Min, Noh e Paik [3838 H. Min, H.J. Noh e S.H. Paik, Eurasia J Math Sci Technol Educ 13, 10 (2017).], Philippou, Papademetri-Kachrimani e Louca [3939 S. Philippou, C. Papademetri-Kachrimani e L. Louca, Prof Dev Educ 41, 2 (2015).], Sentance e Humphreys [6060 S. Sentance e S. Humphreys, Comput Sci Educ 28,4 (2018).], Sotiriou et al. [6161 S. Sotiriou, K. Riviou, S. Cherouvis, E. Chelioti e F.X. Bogner, J Sci Educ Technol 25, 4 (2016).] e de Tytler et al [6262 R. Tytler, D. Symington, L. Darby, C. Malcolm e V. Kirkwood, Teach Teach Educ 27, 5, (2011).]. Além disso, aparecem com grande importância nos estudos já mencionados de El-Hani e Greca [4545 C.N. El-Hani e I.M. Greca, Res Sci Educ 43, 4 (2013)., 4646 C.N. El-Hani e I.M. Greca, Ciência Educ 17, 3 (2011).] e de Eylon e Bagno [1313 B.S. Eylon e E. Bagno, Phys Rev Spec Top -Phys Educ Res 2, 2 (2006).]. Esse conjunto de artigos pode ser representado pelo estudo de grande escala de Sotiriou et al. [6161 S. Sotiriou, K. Riviou, S. Cherouvis, E. Chelioti e F.X. Bogner, J Sci Educ Technol 25, 4 (2016).], envolvendo professores de 400 escolas em toda a Europa, que participavam do programa Open Discovery Space, cujo objetivo era melhorar a aprendizagem das Ciências das escolas europeias integrando tecnologias. O programa forneceu aos professores um portal virtual para a interação e um conjunto de ferramentas de suporte para o desenvolvimento de novas práticas de ensino focadas no uso e desenvolvimento de Recursos Educacionais Abertos. Algumas das Comunidades de Prática criadas entre os professores eram de acesso aberto para qualquer outro professor participante ou privadas só para os professores da Escola. Essa condição mudava segundo às políticas da Escola, mas era uma regra do programa fazer pública uma parte da comunidade ou uma parte dos recursos gerados pelos principais participantes, permitindo o compartilhamento de conteúdo e experiências educacionais entre professores. Essas comunidades serviram de catalisadoras para introduzir nos entornos escolares práticas inovadoras usando tecnologias, contribuindo para um crescimento na maturidade digital dos professores e um incremento no uso e compartilhamento de recursos digitais para o ensino e aprendizado.

Ambientes para o desenvolvimento da Identidade Docente

Enquanto ambientes sociais de participação conjunta e afiliação, as Comunidades de Prática são espaços para a negociação da identidade profissional dos professores. Para Wenger [2121 E. Wenger, Comunidades de Practica: Aprendizaje, significado e identidad (Paidós, Barcelona, 2001)..], as nossas experiências de participação em comunidades configuram diversas formas de afiliação, negociadas segundo o compromisso adquirido com as práticas da comunidade conformando a nossa identidade. Nessa dimensão aparecem os trabalhos de Chinn [5656 P.W.U. Chinn, Cult Stud Sci Educ 1, 2 (2006).], Howe e Stubb [5757 A.C. Howe e H.S. Stubbs, Sci Educ 87, 2 (2003).] e de Ryder e Banner [5252 J. Ryder e I. Banner, Int J Sci Educ 35, 3 (2013).]. Além disso, a formação de uma identidade e das inter-relações profissionais aparece com grande importância para Swanson e Coddington [5454 L.H. Swanson e L.R. Coddington, Teach Teach Educ 59, 1 (2016).]. De modo representativo, podemos destacar o trabalho conduzido por Ryder e Banner [5252 J. Ryder e I. Banner, Int J Sci Educ 35, 3 (2013).], que revela como Comunidades de Prática podem ser consideradas espaços para a renegociação de identidades e práticas docentes durante processos de reformas curriculares. Os pesquisadores investigaram a maneira pela qual professores de Ciências experimentam a implementação de mudanças no currículo escolar, bem como os fatores determinantes que condicionam essa experiência de modificação de práticas educativas. O estudo foi conduzido em termos de identidade dos professores de Ciências, entendida como socialmente construída na interação com colegas e com os aspectos institucionais da profissão. A reforma, iniciada em 2006, voltou o ensino nos anos finais da Educação Básica inglesa a uma perspectiva de inter-relação entre ciência e sociedade, em especial destacando questões sócio-científicas e o letramento científico acompanhando os conteúdos tradicionais de ensino. A investigação longitudinal, em que foram entrevistados 56 professores de 19 escolas, apontou que o alinhamento de condições pessoais (como os objetivos dos professores e seus próprios conhecimentos científicos e pedagógicos) e institucionais (como o ambiente escolar ou a flexibilidade do currículo) é crucial para que uma reforma curricular tenha alcance em sala de aula. Para muito dos professores investigados, as mudanças curriculares envolveram um trabalho de identidade profissional; para os autores, comunidades de aprendizagem são percebidas como espaços para transformações e desenvolvimento na identidade na interação entre professores.

6.2.3. Indução Profissional de Professores

A categoria emergente de Indução Profissional de Professores compreende os estudos que investigam e apoiam as experiências de professores de Ciências em início de carreira. O processo de indução de novos professores é considerado um período de transição significativo entre a Universidade (de onde o recém-formado regressou) e a Escola (que recebe o professor novato). Começa com a entrada na profissão docente e termina quando o professor possui um certo grau de familiaridade e facilidade em seu trabalho profissional (Fulton, Yoon e Lee apud [5353 Y. Saka, S.A. Southerland e J.S. Brooks, Sci Educ 93,6 (2009).]). Esse período é muitas vezes marcado pelo contraste entre os conhecimentos da formação inicial universitária e os conhecimentos socializados e criados no ambiente de trabalho escolar durante os primeiros anos de atuação profissional. Os professores novatos aprendem a realizar seu trabalho através da socialização com seus colegas de profissão mais experientes.

Essa categoria é composta pelos trabalhos de Friedrichsen et al. [4848 P.M. Friedrichsen, D. Munford e M. Orgill, Sci Educ 90, 3 (2006).], Gretton et al. [1414 A.L. Gretton, T. Bridges e J.M. Fraser, Am J Phys 85, 5 (2017).], Kim e Herbert [5858 H.J. Kim e B. Herbert, J Sci Educ Technol 21, 4 (2012).], Kim et al. [6969 H.J. Kim, H.R. Miller, B. Herbert, S. Pedersen e C. Loving, J Sci Educ Technol 21, 4 (2012).], Saka, Southerland e Brooks [5353 Y. Saka, S.A. Southerland e J.S. Brooks, Sci Educ 93,6 (2009).] e Varelas, House, Wenzel [8181 M. Varelas, R. House e S. Wenzel, Sci Educ 89, 3 (2005).]. Entre as principais problemáticas nas CoP estudadas, identificamos: construir ambientes mediadores entre a Universidade e a Escola, de forma que o professor iniciante assuma o papel de ligação entre as comunidades de pesquisadores e as comunidades de professores, com o objetivo de introduzir a prática de pesquisa em sua nova prática de ensino na Escola. Nesse processo destacamos o importante papel do professor veterano já que ele auxilia no processo de socialização do professor iniciante na comunidade escolar, conforme [4848 P.M. Friedrichsen, D. Munford e M. Orgill, Sci Educ 90, 3 (2006).]. Nos diversos artigos dessa categoria, identificamos uma CoP que oferece uma coleção de recursos de consulta desenvolvidos por cientistas para apoiar o design das lições de consulta de professores novatos em ciências através de uma plataforma wiki [5858 H.J. Kim e B. Herbert, J Sci Educ Technol 21, 4 (2012)., 6969 H.J. Kim, H.R. Miller, B. Herbert, S. Pedersen e C. Loving, J Sci Educ Technol 21, 4 (2012).]; CoP focadas no fortalecimento da identidade profissional de professores iniciantes a partir da interação com cientistas e professores experientes em um laboratório de ciências [1414 A.L. Gretton, T. Bridges e J.M. Fraser, Am J Phys 85, 5 (2017)., 8181 M. Varelas, R. House e S. Wenzel, Sci Educ 89, 3 (2005).]; e CoP com ênfase no desenvolvimento de práticas inovadoras [5353 Y. Saka, S.A. Southerland e J.S. Brooks, Sci Educ 93,6 (2009).].

Assim, compreende-se que os referenciais teóricos de Comunidade de Prática são úteis para desenvolver ambientes colaborativos de socialização profissional no delicado período inicial da carreira docente, que fortalecem a identidade dos professores e facilitam seu engajamento no desenvolvimento de suas práticas docentes, em colaboração com os colegas de profissão, com a instituição escolar em que trabalham e com a academia. As Comunidades de Prática, assim, se constituem como ambientes colaborativos que facilitam a interação entre professores em formação inicial, professores novatos, professores experientes e investigadores, potencializando a aprendizagem de conhecimentos de Ciências e de seu ensino.

Síntese da resposta à Questão de Pesquisa (3)

Em resposta à questão de pesquisa que é título desta seção, foi possível determinar as principais problemáticas de pesquisa presentes na literatura de Ensino de Ciências quanto ao uso do referencial teórico de Comunidades de Prática na formação de docentes, cientistas, engenheiros e demais profissionais. As pesquisas voltadas para o tema de Formação Profissional de Não Docentes preocupam-se basicamente com dois temas: (i) a inserção e socialização de estudantes universitários com a promoção e melhoria na qualidade das relações entre Universidade e Sociedade e (ii) a investigação dos processos de aprendizagem durante a trajetória de formação dos estudantes em atividades desenvolvidas nos cursos universitários.

Quanto à Formação Docente para o Ensino de Ciências, as pesquisas destacam o uso do referencial teórico em suas diferentes etapas – na Formação Inicial, na Formação Continuada e na categoria emergente identificada por Indução Profissional de Professores. Na Formação Inicial de Professores e na Indução Profissional de Professores, as Comunidades de Prática são utilizadas para auxiliar a compreender e desenvolver processos de aprendizagem próximos à realidade escolar e promover espaços de socialização, no ambiente de trabalho, de professores iniciantes com professores mais experientes. A Formação Continuada de Professores também se beneficia do uso das Comunidades de Práticas para melhor compreender os processos de aprendizagem ao longo da carreira docente, em especial no cultivo de espaços de interlocução entre Escola e Universidade, na difusão e criação de inovações didáticas e na construção e consolidação da Identidade Docente.

Sobretudo, o conjunto de trabalhos oferece uma visão ampla dos processos formativos para diferentes áreas, apontando para a compreensão das Comunidades de Prática como espaços privilegiados para a construção de identidades profissionais na aprendizagem em práticas colaborativas de trabalho. Valoriza-se a construção de conhecimentos teóricos e práticos em contato com o ambiente profissional e com os demais profissionais nele atuantes, compreendendo a importância da formação para o desenvolvimento de uma identidade profissional e ressignificando os processos formativos para além de uma concepção de transmissão de teorias a serem aplicadas nas práticas cotidianas de trabalho. Ainda assim, conseguimos perceber lacunas na literatura que podem ser exploradas em pesquisas futuras, como a falta de trabalhos relacionados à Comunidade de Prática para a Formação Profissional em cursos técnicos e integrados ao Ensino Médio e a falta de clareza quanto aos critérios escolhidos para identificar ou cultivar as comunidades, não havendo qualquer menção à utilização dos princípios para cultivo de CoP propostos por Wenger, McDermott e Snyder [66 E. Wenger, R. Mcdermott e W.M. Snyder, Cultivating communities of practice: a guide to managing knowledge (Harvard Business School Press, 2002).]. A Figura 5 apresenta uma síntese das problemáticas abordadas quanto ao uso de Comunidades de Prática na Formação Profissional em Ensino de Ciências.

Figura 5
Classificação dos artigos sobre formação professional.

7. Conclusões e implicações para o Ensino de Ciências

Para a realização da presente revisão da literatura consultamos o banco de dados Scopus e periódicos voltados para a área do Ensino de Ciências classificados na área de Ensino no quadriênio 2013-2016 do sistema Qualis-Periódicos. Nossa busca compreendeu um período de 27 anos (1991-2018) e retomou um total de 165 artigos. Após um processo inicial de leitura e categorização, restaram 87 artigos que fizeram parte desta revisão. Nossa investigação buscou responder três questões de pesquisa: qual o perfil da produção acadêmica sobre CoP? (Seção 4); quais os principais referencias teóricos e metodológicos utilizados nas pesquisas sobre CoP? (Seção 5) e quais as principais problemáticas sobre Formação Profissional presente nas pesquisas sobre formação profissional? (Seção 6). As sínteses que respondem a essas questões constam ao final de cada uma das seções citadas.

O estudo permitiu avaliar lacunas na literatura, que podem e devem ser preenchidas em estudos futuros. Reiteramos, porque consideramos de particular interesse, que a maior parte dos estudos sobre Comunidades de Prática diz respeito à Formação Profissional, tanto docente quanto não docente. Entretanto, quanto à Formação Profissional em nível médio localizamos um único trabalho. Essa é uma lacuna importante tendo em vista que diversas instituições de ensino, dentre elas os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, ofertam Formação Profissional de nível médio e buscam alternativas para melhorar a formação profissional de seus alunos. No que se refere ao desenvolvimento de CoP, não tem sido levado em conta ou especificados princípios e estratégias de cultivo, como os propostos por Wenger, McDermott e Snyder [66 E. Wenger, R. Mcdermott e W.M. Snyder, Cultivating communities of practice: a guide to managing knowledge (Harvard Business School Press, 2002).], mesmo pelos pesquisadores que adotam a perspectiva wengeriana de Comunidades de Prática.

De maneira geral, podemos afirmar que as Comunidades de Prática se apresentam como um referencial teórico adequado e frutífero para entender e promover processos de aprendizagem que possibilitem aos estudantes o desenvolvimento de habilidades sociais e profissionais de forma autêntica em sua trajetória acadêmica, auxiliando na compreensão da aprendizagem como um processo intrínseco às relações humanas, presente em todas as dimensões da vida. Percebemos, ainda, que o caminho a ser trilhado é longo; o uso do referencial, desenvolvido ao longo dos últimos trinta anos, ainda requer um aprofundamento de seus conceitos pela Comunidade Acadêmica.

Um último ponto, que consideramos de grande relevância, é que o emprego desse referencial para as pesquisas em Ensino de Ciências parece indicar a necessidade, vista pela comunidade acadêmica e pelos corpos docentes dos sistemas educativos, de melhor relacionar a aprendizagem de conhecimentos científicos à vida dos estudantes. Percebemos um crescente interesse em empreender articulações entre espaços de formação, sejam eles formais ou não, e espaços na Sociedade, particularmente no trabalho, e em estabelecer maior diálogo entre teorias e práticas. Assim, o uso do referencial volta a atenção para o profundo relacionamento entre os conhecimentos explícitos e implícitos que intrinsecamente se ligam às ações dos sujeitos e aos contextos em que ocorrem, promovendo um novo olhar sobre as práticas formativas vivenciadas no dia a dia dos sujeitos da Educação.

Desta forma as Comunidades de Prática, vistas como contextos vivos e vivificantes da aprendizagem social, marcados por intensa negociação de significados e de construção de identidades daqueles que nelas participam, abrem caminhos para a adoção de práticas educativas alternativas às comumente adotadas pelos sistemas educativos atuais. Sobretudo, parafraseando Wenger, as Comunidades de Prática trazem para o Ensino de Ciências mais do que apenas conhecimentos instrumentais sobre as Ciências, mas oferecem possibilidades de participação, de conhecer, de estar juntos, de ver o mundo de maneira significativa, de desenvolver-se enquanto pessoa e, enfim, de ser humano.

  • 1
    Em 1996, os estudos de Orr foram reunidos no livro Talking About Machines: an ethnography of a modern job.
  • 2
    O livro é derivado de sua tese de doutorado, Toward a theory of cultural transparency: elements of a social discourse of the visible and the invisible, publicada em 1991. A obra original foi publicada em 1998, em inglês e traduzida para o espanhol em 2001. A versão em espanhol foi escolhida para as citações desse artigo.
  • 3
  • 4
    Scopus é o maior banco de dados de resumos e citações da literatura revisada por especialistas: periódicos científicos, livros e anais de congressos. Apenas 25 das revistas selecionadas no Sistema Qualis se encontram indexadas nesse banco de dados. Informações sobre o indexador estão disponíveis em: <https://www.elsevier.com/solutions/scopus>. Acesso em: 20 de janeiro de 2020.
  • 5
    Preferimos aqui denominar “grupos” e não CoP, porque somos críticos em relação à postura de vários autores que consideram, a priori, o grupo alvo do estudo como uma CoP, sem avaliar se o grupo apresenta características indispensáveis para uma CoP, como a intencionalidade da aprendizagem, uma identidade ou um repertório compartilhado de falas e comportamentos.

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Material Suplementar

O seguinte material suplementar está disponível on line:

Tabela S1: Identificação dos Artigos Excluídos.

Tabela S2: Classificação dos 87 Artigos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    26 Set 2019
  • Revisado
    28 Jan 2020
  • Aceito
    03 Fev 2020
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