Acessibilidade / Reportar erro

Avaliação do ensino e aprendizagem de noções básicas de tratamento de queimados entre alunos do curso de medicina

RESUMO

Introdução:

Agravo de grande importância biopsicossocial, queimadura é um tema crucial na formação médica, uma vez que recém-formados se deparam com pacientes que sofreram queimaduras nos mais variados cenários profissionais.

Métodos:

Este estudo avaliou o ensino e a aprendizagem do tema queimaduras em alunos do curso de Medicina de uma faculdade pública do Estado de São Paulo; foi aplicado um questionário específico para avaliar o conhecimento sobre o atendimento inicial ao paciente queimado na primeira série (grupo 1 - 54 estudantes), e na sexta série (grupo 2 - 60 estudantes).

Resultados:

Observou-se, no grupo 1, grande desconhecimento sobre o tema, com média geral de desconhecimento (“erros”) de 70,98% e de acertos de 29,02%; no grupo 2, essas taxas foram de 36,66 % e 63,34 %, respectivamente. Somente 63,34% dos alunos do sexto ano conseguiriam conduzir adequadamente o tratamento de um paciente queimado e, consequentemente, oferecer a este paciente um melhor prognóstico.

Conclusões:

Os dados são preocupantes, uma vez que não se verificou conhecimento nem preparo adequados dos formandos para atendimento de pacientes queimados, e que queimaduras são situações de emergência que exigem intervenção médica rápida, adequada e eficiente, a fim de reduzir a morbimortalidade das vítimas.

Descritores:
Curva de aprendizado; Educação médica; Queimaduras; Serviços Médicos de emergência; Testes de aptidão.

ABSTRACT

Introduction:

Burns, an injury of high biopsychosocial importance, are a crucial issue in medical training, and newly graduated students face burn patients in a variety of professional settings.

Methods:

This study assessed the teaching and learning of burns among medical students at a public facility in the State of São Paulo; a specific questionnaire was applied to evaluate first year (Group 1: 54 students) and sixth year (Group 2: 60 students) medical students’ knowledge about the initial care of burn patients.

Results:

In Group 1, there was a substantial lack of knowledge about the subject, with a general average incorrect answer rate (“errors”) of 70.98% and a correct answer rate of 29.02%; in Group 2, these rates were 36.66% and 63.34%, respectively. Only 63.34% of the sixth-year students would be able to adequately conduct the treatment of a burn patient, gauged by their ability to offer a patient a better prognosis.

Conclusions:

The data are disturbing, since adequate knowledge and preparation of the trainees for the care of burn patients has not been verified, and burns are emergency situations that require prompt, adequate, and efficient medical intervention to reduce patients’ morbidity and mortality.

Keywords:
Learning curve; Medical education; Burns; Emergency medical services; Aptitude tests.

INTRODUÇÃO

Devido à importância social e ao impacto na saúde pública, queimadura é um tema de suma importância para a formação médica. Segundo Shahrokhi et al.11 Shahrokhi S, Jindal K, Jeschke MG. Three components of education in burn care: surgical education, inter-professional education, and mentorship. Burns. 2012;38(6):783-9. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2012.01.012
http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2012.0...
, a educação médica em queimaduras pode ser dividida em três componentes principais: a educação cirúrgica, a educação multiprofissional e a orientação.

Historicamente, o método tradicional de educação na prática da cirurgia foi centrado no modelo hospitalocêntrico, inicialmente descrito por William Halsted há mais de 100 anos11 Shahrokhi S, Jindal K, Jeschke MG. Three components of education in burn care: surgical education, inter-professional education, and mentorship. Burns. 2012;38(6):783-9. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2012.01.012
http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2012.0...
. A aquisição de competências é dependente de observação, auxílio e, posteriormente, de execução de tarefas, classicamente conhecido como “veja um, faça um e ensine um”. Porém, com o avanço da tecnologia, a preocupação com a segurança do paciente e os “erros médicos”, criou-se uma demanda por inovação na educação cirúrgica11 Shahrokhi S, Jindal K, Jeschke MG. Three components of education in burn care: surgical education, inter-professional education, and mentorship. Burns. 2012;38(6):783-9. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2012.01.012
http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2012.0...
.

Médicos recém-formados se deparam com pacientes que sofreram queimaduras nos mais variados cenários profissionais: medicina de emergência, trauma, atendimento pré-hospitalar, cirurgia plástica, dermatologia e clínica geral, sendo dessa forma essencial que tenham conhecimentos significativos sobre o manejo de queimaduras22 Egro FM, Estela CM. The need for burns teaching: a cross-sectional study to assess burns teaching in the United Kingdom. Burns. 2014;40(1):173-4. PMID: 24238672 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2013.10.001
http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2013.1...
.

Estudo realizado por Egro e Estela22 Egro FM, Estela CM. The need for burns teaching: a cross-sectional study to assess burns teaching in the United Kingdom. Burns. 2014;40(1):173-4. PMID: 24238672 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2013.10.001
http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2013.1...
, em 2014, aponta que o desconhecimento sobre como diagnosticar e executar os cuidados iniciais em queimaduras poderia potencialmente levar à má gestão de queimaduras por médicos.

OBJETIVO

Este trabalho foi elaborado com o intuito de avaliar, de forma indireta, como a formação médica está preparando os estudantes de Medicina para o atendimento primário em queimaduras.

Para tanto, foi proposto verificar se há diferença significativa entre o desempenho dos acadêmicos do primeiro ano (1ª série) com os do último ano (6ª série) do curso de Medicina da Faculdade de Medicina de Marília (FAMEMA), a descrever a distribuição de idade e sexo entre esses estudantes, averiguar se há diferença significativa no número de erros e acertos perante os casos-problema, se ocorre maior número de acertos em estudantes que previamente fizeram algum curso extracurricular sobre o tema ou que cursaram outra faculdade na área da saúde e, ainda, a checar se nos casos de menor complexidade envolvendo queimaduras há uma maior convergência entre as respostas dadas pelos estudantes ou um maior número de acertos.

MÉTODOS

Este é um estudo quantitativo que se propôs a quantificar e qualificar o conhecimento dos estudantes dos primeiro e último anos do curso médico em relação às condutas e ao prognóstico em casos envolvendo queimaduras. Foi aplicado um questionário que consiste em perguntas sobre a identificação do aluno, seu conhecimento sobre o atendimento inicial em queimados e se ele recorre a outras fontes de conhecimento sobre o tema, além do conteúdo ministrado na faculdade (FAMEMA).

O questionário aplicado (Anexo 1 Anexo 1. Questões sobre atendimento ao queimado (Balan et al.3). 1. No exame básico do primeiro atendimento do paciente queimado devem-se inspecionar as vias aéreas, a respiração, a condição da circulação, condição da coluna cervical, dificuldades e disfunções, expor e examinar o doente e iniciar reposição hídrica.( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 2. Os cuidados imediatos do atendimento do paciente queimado consistem em parar o processo da queimadura e lavar a área acometida com água morna até a dor passar.( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 3. No atendimento do paciente queimado a remoção de roupas queimadas ou intactas nas áreas da queimadura e a avaliação clínica completa com registro do agente causador, da extensão e da profundidade da queimadura são aspectos de pouca relevância em indivíduos com queimaduras de média gravidade.( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 4. Para cálculo mais apurado da área queimada se utiliza a regra dos “nove” (Wallace), que admite que cada membro superior e cada quadrante do tronco correspondem a 9% da SC independente da idade.( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 5. Nos cuidados locais ao queimado devem-se remover medicamentos caseiros com limpeza local (se necessário) com sabão neutro ou glicerinado, sabão de coco ou sabão líquido e lavagem abundante com água corrente.( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 6. Quando o agente causador da queimadura for aderente, deve-se tentar a remoção imediata para evitar maior propagação da queimadura.( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 7. Após limpeza das lesões, os curativos deverão ser realizados com tópico de escolha seguidos de curativo estéril, de acordo com a rotina do serviço. Utilizar preferencialmente curativos oclusivos, exceto em lesões de orelha ou períneo.( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 8. As mãos devem ficar elevadas por 24 a 48 horas após a queimadura, para minimizar o edema. Queimaduras circunferenciais poderão ter tratamento ambulatorial, sendo orientado apenas observar coloração da mão.( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 9. A diurese deve ser controlada (medida e suas características descritas - clara, límpida, turva hemorrágica, hemoglobinúria, etc.) - mesmo quando se decidir contra o uso de sonda vesical.( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 10. A fisiopatologia das queimaduras é caracterizada por duas ocorrências principais: aumento da permeabilidade capilar (APC), que se inicia imediatamente após a queimadura, tem seu pico máximo em 8 horas e dura, em média, 18 a 24 horas. O edema resulta do extravasamento de líquidos para o espaço intersticial, intensificado pela passagem de grandes moléculas de albumina que por ter alto peso molecular atraem mais líquido para o espaço extracelular.( ) Concordo ( )Discordo ( ) Não sei 11. Queimaduras de face, pé, mão ou pescoço e queimaduras de região perineal ou genitália, com boa higiene, podem ser tratadas ambulatorialmente.( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 12. Queimadura circunferencial de extremidades, queimaduras por descarga elétrica, Intoxicações por fumaça ou lesões das vias aéreas são consideradas acometimentos graves, mas não necessitam de encaminhamento para tratamento em centro especializado. ( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 13. Internação na UTI está indicada, entre outros, nos seguintes casos: queimaduras na fase aguda; acima de 30% da superfície corporal no adulto e acima de 20% na criança menor de 12 anos.( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 14. Paciente queimado deverá permanecer em jejum nas primeiras 48 horas, até que se tenha certeza da extensão da lesão, com cálculo do suporte nutricional adequado.( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 15. Indivíduos com necessidade de suporte ventilatório, múltiplas intervenções cirúrgicas, estado nutricional comprometido anterior à queimadura, perda de peso superior a 10% durante tratamento, idosos com mais de 20% de SCQ e traumatismo cranioencefálico com lesões faciais graves deverão receber suporte nutricional.( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 16. Para reposição hidroeletrolítica, cateterizar preferencialmente veia periférica de grosso calibre e calcular reposição inicial. O volume diário da reposição de urgência deve ser na proporção de 2-4 ml/kg de peso X a área queimada (superfície corporal) em porcentagem.( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 17. Deve-se utilizar antibiótico profilático para prevenção da infecção com cobertura para gram-positivos. ( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei 18. Paciente internado deve ser pesado diariamente. É necessário solicitar hemoglucoteste de 3/3 horas em pacientes diabéticos e controle de PA de 3/3 horas em pacientes hipertensos.( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei ) foi construído e validado através da pesquisa “Construção de um questionário para análise do conhecimento sobre o atendimento inicial do queimado”, e data do ano de 200833 Balan MAJ, Meschial WC, Santana RG, Suzuki SM, Oliveira MLF. Validation of an instrument for investigating knowledge on the initial assistance to burns victims. Text Context Nursing. 2014:23(2):373-81. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/0104-07072014000380013
http://dx.doi.org/10.1590/0104-070720140...
.

População do estudo

Foram entrevistados estudantes dos primeiro e último anos do curso de Medicina da FAMEMA, no ano de 2015. Os estudantes do primeiro ano foram entrevistados nos dois primeiros meses do curso de Medicina. Os estudantes do último (sexto) ano foram entrevistados nos dois últimos meses do curso de Medicina. O tamanho idealizado da população do estudo foi de 160 sujeitos, divididos em 80 alunos do primeiro ano e 80 alunos do sexto ano do curso de Medicina da FAMEMA.

Critérios de inclusão

Foi considerado critério de inclusão unicamente o fato de o estudante estar cursando o primeiro ou o último ano do curso de Medicina da FAMEMA no ano de 2015.

Critérios de exclusão

Foi considerado como único critério de exclusão o fato do estudante se recusar a participar do estudo.

Aspectos éticos

Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de Marília (FAMEMA) - CAAE: 37178914.0.0000.5413. Todos os participantes foram esclarecidos a respeito do propósito da investigação e assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido após concordarem em participar.

Análise dos dados

Os dados foram transcritos para meio (planilhas) eletrônico e para a análise quantitativa foi utilizada apenas análise comparativa (porcentagens). Os dados obtidos foram comparados com a literatura prévia.

RESULTADOS

Para avaliação do conhecimento geral sobre queimaduras, os seguintes domínios foram selecionados: conceito de queimaduras, classificação da gravidade, cálculo da área de superfície corporal queimada (SCQ) no paciente adulto e na criança, fisiopatologia, exame básico, cuidados imediato e inicial, lesões por inalação, cuidado local, posicionamento da vítima, reposição volêmica, triagem de queimaduras, analgesia, antibioticoterapia, sinais vitais e suporte nutricional (Tabela 1).

Tabela 1
Descrição da área do conhecimento em queimaduras abordada em cada questão.

O questionário foi fornecido para 160 estudantes das primeira e sexta séries do curso de Medicina da FAMEMA. Destes, 46 negaram-se a participar do estudo (26 estudantes do primeiro e 20 do sexto ano). Com isto, a amostra da primeira série (grupo 1) foi constituída por 54 estudantes (47,37% do total) e da sexta série (grupo 2) por 60 estudantes (52,63% do total). A prevalência do sexo feminino foi de 68 alunos (59,65%) e masculino de 46 alunos (40,35%). Dentre os alunos, apenas cinco (4,39%) possuíam curso superior prévio. A média geral de idade foi de 23,93 anos.

Nas questões que abordavam exame básico e os cuidados imediato e inicial no primeiro atendimento à queimadura (questões 1, 2 e 3 do questionário) houve como índices de acerto, respectivamente, 48%, 55% e 68% no grupo 1, e 95%, 78,33% e 93,33% no grupo 2, e de desconhecimento, 51,85%, 44,44% e 31,48% no grupo 1 e 5%, 21,67% e 6,67% no grupo 2.

A taxa de desconhecimento na questão 4, que aborda o conhecimento do cálculo da superfície corporal queimada no adulto e na criança, foi de 94,44% e de acerto foi de 5% no primeiro ano (grupo 1); no sexto ano (grupo 2), estes índices foram, respectivamente, de 31,67% e 68,33%.

As questões 5, 6 e 7 visavam avaliar o conhecimento acerca dos cuidados locais no primeiro atendimento a queimados, e obtiveram taxas de acertos de 37%, 26% e 9%, e de desconhecimento de 62,96%, 74,07% e 90,74% no grupo 1; no grupo 2 os índices foram de 60%,43,33% e 60% de acertos e de 40,0%, 56,67% e 40,0%, respectivamente, para as questões 5, 6 e 7.

Nas questões 8 e 9 foram abordados o posicionamento e controles do paciente no atendimento médico, e foram obtidas taxas de acertos de, respectivamente, 16% e 37% no grupo 1 e de 48,33% e 96,67% no grupo 2, e de desconhecimento de 83,33% e 62,96% no grupo 1 e de 51,67% e 3,33% no grupo 2.

A décima pergunta do questionário foi sobre a fisiopatologia das queimaduras. A porcentagem de acertos foi de 37% e a de desconhecimento foi de 62,96% no grupo 1. No segundo grupo, o índice de acertos foi de 73,33 e de desconhecimento de 26,67%.

As questões 11, 12 e 13 eram sobre a triagem das queimaduras e as taxas de acertos foram de 16%, 46% e 29%, e as de desconhecimento sobre o tema foram de 83,33%, 53,70% e 70,37% no grupo 1. No segundo grupo, as taxas de acerto foram de 86,67%, 85% e 80%, e as taxas de desconhecimento foram de 13,33%, 15% e 20%. Nas perguntas 14 e 15, o assunto abordado foi suporte nutricional do paciente e as razões de acerto foram de 13% e 37% e de desconhecimento de 87,04% e 62,96% para o primeiro grupo, com 31,67% e 83,33% de acerto, e 68,33% e 16,67% de desconhecimento para o segundo grupo.

A questão 16 versava sobre volume inicial administrado no paciente queimado, e obteve taxas de acertos de 5% e de desconhecimento sobre o tema de 94,44% no grupo 1, e de 10% de acerto e 90% de desconhecimento no grupo 2.

A taxa de desconhecimento na questão 17, que abordava antibioticoterapia no paciente queimado foi de 98,15%, e a de acertos foi de 1% no grupo 1, e de 20% de acertos e 80% de desconhecimento no grupo 2.

Na pergunta 18, que era sobre os controles vitais em paciente queimado, a porcentagem de acertos foi de 31% e a de desconhecimento foi de 68,52% no primeiro grupo, e de 63,33% de acertos e de 36,67% de desconhecimento no segundo grupo (para ver detalhamento dos resultados, vide Tabelas 2 e 3).

Tabela 2
Número absoluto das questões com acertos, erros e dúvidas dos alunos do 1º ano do curso de Medicina (FAMEMA) e as respectivas porcentagens de acerto e desconhecimento sobre o tema.
Tabela 3
Número absoluto das questões com acertos, erros e dúvidas dos alunos do 6º ano do curso de Medicina (FAMEMA) e as respectivas porcentagens de acerto e desconhecimento sobre o tema.

DISCUSSÃO

Queimaduras são lesões traumáticas geradas pelo contato com calor, frio, substância química, eletricidade ou radioatividade, que determina destruição parcial ou total da pele e de seus anexos, deixando sequelas físicas e/ou psicológicas em suas vítimas44 Peck MD. Epidemiology of burns throughout the world. Part I: Distribution and risk factors. Burns. 2011;37(7):1087-100. PMID: 21802856 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2011.06.005
http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2011.0...
,55 Gawryszewski VP, Bernal RTI, Silva NN, Morais Neto OL, Silva MM, Mascarenhas MDM, et al. Sá NN. Public hospital emergency department visits due to burns in Brazil, 2009. Cad Saúde Pública. 2012;28(4):629-40. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012000400003
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012...
.

As queimaduras são tidas como um problema de saúde pública pela Organização Mundial da Saúde (OMS)66 Burn prevention: success stories and Lessons Learned [internet]. Geneva: World Heath Organization; 2011. [cited 2017 Oct 30]. Available from: http://www.who.int/violence_injury_prevention/publications/other_injury/burn_success_stories/en/
http://www.who.int/violence_injury_preve...
. Somente no ano de 2004, o número de queimados graves que passaram por algum procedimento médico no mundo foi de aproximadamente 11 milhões de pessoas, superando a incidência de doenças altamente prevalentes como tuberculose e HIV44 Peck MD. Epidemiology of burns throughout the world. Part I: Distribution and risk factors. Burns. 2011;37(7):1087-100. PMID: 21802856 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2011.06.005
http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2011.0...
.

Mais de 300.000 mortes por ano são causadas por queimaduras por fogo, e este número se torna muito maior ao se considerar queimaduras de outras etiologias. A mortalidade por queimaduras é maior em países em desenvolvimento ou subdesenvolvidos, correspondendo a 95% do total de mortes causadas por queimaduras em todo o mundo66 Burn prevention: success stories and Lessons Learned [internet]. Geneva: World Heath Organization; 2011. [cited 2017 Oct 30]. Available from: http://www.who.int/violence_injury_prevention/publications/other_injury/burn_success_stories/en/
http://www.who.int/violence_injury_preve...
.

Em países desenvolvidos, a mortalidade por queimaduras no sexo masculino é maior que no feminino (proporção de 2:1) na faixa etária de 15-59 anos, enquanto em países subdesenvolvidos a morte em mulheres ocorre 2 a 3 vezes mais, considerando o mesmo grupo etário44 Peck MD. Epidemiology of burns throughout the world. Part I: Distribution and risk factors. Burns. 2011;37(7):1087-100. PMID: 21802856 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2011.06.005
http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2011.0...
. No Egito, 9% das mortes de mulheres em idade fértil é causada por queimaduras. Na Índia, aproximadamente 65% da mortalidade por queimaduras se refere às mulheres, geralmente relacionadas a acidentes domésticos, automutilação e violência doméstica44 Peck MD. Epidemiology of burns throughout the world. Part I: Distribution and risk factors. Burns. 2011;37(7):1087-100. PMID: 21802856 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2011.06.005
http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2011.0...
.

Um estudo prospectivo, realizado no período de abril de 2000 a março de 2005, em Hong Kong77 Tse T, Poon CH, Tse KH, Tsui TK, Ayyappan T, Burd A. Paediatric burn prevention: an epidemiological approach. Burns. 2006;32(2):229-34. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2005.08.025
http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2005.0...
, evidenciou 264 crianças admitidas na Unidade de Queimados do hospital “Prince of Wales”, com predomínio do sexo masculino em todas as faixas etárias, sendo a escaldadura a etiologia mais comum77 Tse T, Poon CH, Tse KH, Tsui TK, Ayyappan T, Burd A. Paediatric burn prevention: an epidemiological approach. Burns. 2006;32(2):229-34. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2005.08.025
http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2005.0...
. Em outro estudo88 Zahid A, Atannaz J, Alaoui M, Rafik A, Ezzoubi M, Diouri M, et al. Epidemiological profile of children burns admitted at the National Center for Brules, Morocco. Ann Burns Fire Disasters. 2011;24(4):171-4., publicado em 2008, e realizado no Centro Nacional de Queimados CHU IbnRochd de Casablanca, Marrocos, observaram-se 543 admissões de crianças queimadas no serviço (45,7% do total), sendo 96,5% das queimaduras de origem térmica, com predomínio na faixa etária de 1 a 5 anos e a maior parte sendo do sexo masculino (63,5%).

Em 2009, foram realizados 80.607 internamentos no Sistema único de Saúde (SUS) por lesões decorrentes de queimaduras. Houve um predomínio de homens em relação às mulheres (58,6%), e as faixas etárias mais acometidas foram adultos jovens (23,1%) e crianças (22%), havendo predomínio entre menores de 4 anos (16%)55 Gawryszewski VP, Bernal RTI, Silva NN, Morais Neto OL, Silva MM, Mascarenhas MDM, et al. Sá NN. Public hospital emergency department visits due to burns in Brazil, 2009. Cad Saúde Pública. 2012;28(4):629-40. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012000400003
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012...
.

No Brasil, os agentes externos, como queimaduras, são os principais responsáveis por mortes na faixa etária de 1 a 14 anos, contribuindo para altas taxas de mortalidade infantil. Em se tratando de queimaduras, as sequelas também são fatores de grande impacto social: para cada morte, tem-se quatro crianças com sequelas físicas e 100% das sobreviventes com sequelas psicológicas99 Millan LS, Gemperli R, Tovo FM, Mendaçolli TJ, Gomez DS, Ferreira MC. Epidemiological study of burns in children treated at a tertiary hospital in São Paulo. Rev Bras Cir Plást. 2012;27(4):611-5. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1983-51752012000400024
http://dx.doi.org/10.1590/S1983-51752012...
. Nos dados do SUS referentes ao ano de 2015, disponíveis pelo DATASUS (http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sih/cnv/fiuf.def), foram realizadas 7.147 internações em caráter de urgência e foram gastos R$ 9.795.595,31 (aproximadamente US$ 3.000.000,00) com serviços hospitalares devido a acidentes por contato com fonte de calor e substâncias quentes.

Peets et al.1010 Peets AD, McLaughlin K, Lockyer J, Donnon T. So much to teach, so little time: a prospective cohort study evaluating a tool to select content for a critical care curriculum. Crit Care. 2008;12(5):R127. DOI: http://dx.doi.org/10.1186/cc7087
http://dx.doi.org/10.1186/cc7087...
atentaram-se ao fato de que o conteúdo curricular atualmente é baseado em opiniões de alguns médicos e diretores de instituições de ensino, e não em protocolos. Com isso, os currículos, no que tange ao atendimento de pacientes graves, como queimados, podem não atender às necessidades de ensino dos alunos. As patologias selecionadas no estudo foram: parada respiratória, arritmias cardíacas, choque hemorrágico, distúrbios eletrolíticos e equilíbrio ácido-base, convulsão, parada cardíaca, overdose e abstinência medicamentosa, além de politrauma e sepse. Com base nisto, observase que o tema “queimaduras” não é frequentemente abordado no currículo médico. Contudo, é de fundamental importância o preparo adequado dos profissionais para o atendimento emergencial de pacientes queimados.

Estudo realizado no Kilimanjaro Christian Medical Centre constatou que a maioria dos pacientes queimados não recebiam conduta emergencial adequada, o que culminou em internação prolongada e aumento da mortalidade1111 Ringo Y, Chilonga K. Burns at KCMC: epidemiology, presentation, management and treatment outcome. Burns. 2014;40(5):1024-9. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2013.10.019
http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2013.1...
. Em observação prospectiva1212 Rea S, Kuthubutheen J, Fowler B, Wood F. Burn first aid in Western Australia--do healthcare workers have the knowledge? Burns. 2005;31(8):1029-34. realizada no Royal Perth Hospital, na Austrália, de 227 atendimentos a queimados, apenas 88 (39%) receberam o manejo inicial de maneira adequada e 50% dos pacientes receberam condutas completamente inadequadas.

Na avaliação realizada no presente trabalho, no grupo 1 (alunos do primeiro ano do curso de Medicina), observou-se grande índice de desconhecimento geral sobre o tema “queimaduras”, com média geral de desconhecimento (“erros”) de 70,98% e de acertos de 29,02%; no grupo 2 (alunos do sexto ano do curso de Medicina), essas taxas foram de 36,66 % e 63,34%, respectivamente. Constatou-se, portanto, que o aprendizado no atendimento primário de queimaduras teve relativa alta porcentagem de acertos entre os estudantes do último ano do curso de Medicina na amostra estudada.

Contudo, somente 63,34% dos alunos do sexto ano conseguiriam conduzir naturalmente o tratamento de um paciente queimado e, consequentemente, obter maior sucesso teórico. Os dados são preocupantes, uma vez que o índice de desconhecimento dos alunos do último ano do curso de Medicina ocorreu particularmente em relação aos cuidados locais, suporte nutricional, hidratação e administração de antibióticos, temas de fundamental importância na condução desses casos; o bom uso do tempo nestes casos (queimaduras) é primordial e determinante do prognóstico1313 Maia ER, Gonçalves Júnior J, Lima EP, Campos W, Jovino EM, Fernandes FF, et al. Conhecimentos em atenção pré-hospitalar e suporte básico de vida por estudantes recém-ingressos de medicina. Rev Bras Educ Méd. 2014;38(1):59-64. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-55022014000100008
http://dx.doi.org/10.1590/S0100-55022014...
.

As maiores taxas de acertos no grupo 1 foram justamente no exame básico e cuidados imediatos e inicial no primeiro atendimento à queimadura, demonstrando maior conhecimento em temas básicos (gerais). Contudo, devido à grande importância da abordagem inicial do paciente queimado para a sobrevida do mesmo, e o fato de o conhecimento geral sobre tais temas ser esperado para alunos da primeira série do curso de Medicina, uma porcentagem de acertos média de 57% é considerada inadequada, podendo, assim, considerarmos que o aprendizado já se inicia de forma ineficaz. Não era esperada a contemplação dos temas sobre cuidado local, conduta médica e fisiopatologia na grade curricular da primeira série de Medicina, e a taxa média de desconhecimento encontrada na amostra foi realmente alta, de 64%.

Como o grupo 1 foi composto por alunos recém egressantes do ensino médio, também podemos inferir quão deficitária está a educação em saúde nas escolas primárias e secundárias. Como em nosso estudo, aquele realizado por Rea et al.1212 Rea S, Kuthubutheen J, Fowler B, Wood F. Burn first aid in Western Australia--do healthcare workers have the knowledge? Burns. 2005;31(8):1029-34. apontou que educação em primeiros socorros não é fornecida adequadamente na Austrália após estudantes da área de saúde apresentarem desempenho ruim em um questionário sobre abordagem inicial em queimaduras. Contudo, escolas têm um papel importante e crescente na promoção de saúde, prevenção de doenças e de acidentes entre crianças e adolescentes1414 Liberal EF, Aires RT, Aires MT, Osório AC. Safe school. J Pediatr (Rio J). 2005;81(5 Suppl):S155-63. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0021-75572005000700005
http://dx.doi.org/10.1590/S0021-75572005...
.

Em nosso estudo, os alunos concluintes (grupo 2) do curso de Medicina obtiveram bom desempenho nos temas exame básico e cuidados imediatos no atendimento à queimadura, da mesma forma que Lemon et al.1515 Lemon TI, Stapley S, Idisis A, Green B. Is the current UK undergraduate system providing junior doctors knowledge and confidence to manage burns? A questionnaire-based cohort study. Burns Trauma. 2015;3:6. DOI: http://dx.doi.org/10.1186/s41038-015-0005-9
http://dx.doi.org/10.1186/s41038-015-000...
obtiveram resultados satisfatórios em primeiros socorros em queimaduras. Contudo, nos temas cuidados locais no primeiro atendimento à queimadura, obtivemos baixas porcentagens de acertos, assim como no estudo realizado por Rea et al.1212 Rea S, Kuthubutheen J, Fowler B, Wood F. Burn first aid in Western Australia--do healthcare workers have the knowledge? Burns. 2005;31(8):1029-34., que teve como objetivo verificar o conhecimento da abordagem inicial em queimaduras entre profissionais da saúde e obteve acerto máximo em apenas 18,8% dos entrevistados.

Vale enfatizar que situações de emergência exigem intervenção imediata, conduzida de forma rápida e eficiente, a fim de reduzir a morbimortalidade das vítimas, sendo este ponto de sumária importância na formação médica1313 Maia ER, Gonçalves Júnior J, Lima EP, Campos W, Jovino EM, Fernandes FF, et al. Conhecimentos em atenção pré-hospitalar e suporte básico de vida por estudantes recém-ingressos de medicina. Rev Bras Educ Méd. 2014;38(1):59-64. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-55022014000100008
http://dx.doi.org/10.1590/S0100-55022014...
.Skinner e Peat1616 Skinner A, Peat B. Burns treatment for children and adults: a study of initial burns first aid and hospital care. N Z Med J. 2002;115(1163):U199., ainda em 2002, enfatizaram que injúrias causadas por queimaduras, quando conduzidas com primeiros cuidados adequados, estão associadas a resultados mais favoráveis, restringindo o dano aos tecidos, a necessidade de cirurgias e a morbidade subsequente.

Na análise do conhecimento da fisiopatologia das queimaduras, o presente estudo teve 73,33% de acertos no grupo 2. Lemon et al.1515 Lemon TI, Stapley S, Idisis A, Green B. Is the current UK undergraduate system providing junior doctors knowledge and confidence to manage burns? A questionnaire-based cohort study. Burns Trauma. 2015;3:6. DOI: http://dx.doi.org/10.1186/s41038-015-0005-9
http://dx.doi.org/10.1186/s41038-015-000...
analisaram o mesmo tema (conhecimento da fisiopatologia das queimaduras) com quatro questionamentos, obtendo taxas de acertos de 88%, 83%, 36% e 92%, podendo ser o desempenho considerado nos dois estudos (este e o de Lemon et al.1515 Lemon TI, Stapley S, Idisis A, Green B. Is the current UK undergraduate system providing junior doctors knowledge and confidence to manage burns? A questionnaire-based cohort study. Burns Trauma. 2015;3:6. DOI: http://dx.doi.org/10.1186/s41038-015-0005-9
http://dx.doi.org/10.1186/s41038-015-000...
) aceitável. De maneira geral, nos dois grupos analisados neste trabalho, o conhecimento teórico em queimaduras se mostrou superior ao prático. Estudo anterior publicado por Chakravarthy et al.1717 Chakravarthy B, Ter Haar E, Bhat SS, McCoy CE, Denmark TK, Lotfipour S. Simulation in medical school education: review for emergency medicine. West J Emerg Med. 2011;12(4):461-6. DOI: http://dx.doi.org/10.5811/westjem.2010.10.1909
http://dx.doi.org/10.5811/westjem.2010.1...
apontaram o fato de que o ensino em Medicina de emergência demanda treinamentos práticos com simulações para atingir a eficácia desejada.

Infelizmente, neste trabalho, destacou-se no grupo 2 o desconhecimento sobre os cálculos da superfície corporal queimada no adulto e na criança (68,33%) e do volume inicial de reposição volêmica a ser administrado (90%). Tais cálculos são fundamentais no primeiro atendimento ao paciente queimado em sala de emergência, uma vez que a hidratação adequada nas primeiras horas após o trauma tem relação direta com as taxas de sobrevida1818 Dougherty W, Waxman K. The complexities of managing severe burns with associated trauma. Surg Clin North Am. 1996;76(4):923-58. PMID: 8782481 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/S0039-6109(05)70488-6
http://dx.doi.org/10.1016/S0039-6109(05)...
.

Somente no Reino Unido são realizados cerca de 175 mil atendimentos de pacientes queimados em salas de emergência por ano, e cerca de 13 mil na Holanda1919 British Burn Association Standards. National Burn Care Review. [acesso 2017 Out 31]. Disponível em: http://www.britishburnassociation.org/downloads/NBCR2001.pdf
http://www.britishburnassociation.org/do...
. No Brasil não há um levantamento específico sobre tais atendimentos, mas, sendo um país de terceiro mundo, espera-se números muito elevados. Mais uma vez nos preocupa a dimensão do quão deficitário está o preparo de nossos estudantes para atendimentos em emergências, particularmente em se tratando de queimaduras.

Em estudo realizado por Lemon et al.1515 Lemon TI, Stapley S, Idisis A, Green B. Is the current UK undergraduate system providing junior doctors knowledge and confidence to manage burns? A questionnaire-based cohort study. Burns Trauma. 2015;3:6. DOI: http://dx.doi.org/10.1186/s41038-015-0005-9
http://dx.doi.org/10.1186/s41038-015-000...
no Reino Unido, apenas 45% dos alunos tiveram ensino formal na área de queimaduras, 20% tiveram ensino não relacionado à grade curricular da faculdade e 35% não tiveram nenhum ensino relacionado ao tema. Em estudos prévios, demonstra-se que apenas 13% das escolas inglesas ensinam sobre queimaduras de forma estruturada, e das 29 faculdades entrevistadas, o tempo máximo que se dispensa ao tema é de 4 horas durante todo o curso de graduação, não muito diferente daquilo que observamos no dia-a-dia da nossa Instituição (FAMEMA).

Na Instituição onde foi realizado este estudo (FAMEMA), existe apenas uma atividade de ensino formal para queimaduras, de tempo limitado e insuficiente, de apenas 2 horas. Comparando-se com o estudo realizado por Lemon et al.1515 Lemon TI, Stapley S, Idisis A, Green B. Is the current UK undergraduate system providing junior doctors knowledge and confidence to manage burns? A questionnaire-based cohort study. Burns Trauma. 2015;3:6. DOI: http://dx.doi.org/10.1186/s41038-015-0005-9
http://dx.doi.org/10.1186/s41038-015-000...
, podemos dizer que os nossos estudantes têm apenas metade do tempo de “ensino formal” em queimaduras quando comparados aos estudantes do Reino Unido, já considerado inadequado e bastante ineficiente.

O reduzido espaço da especialidade de Cirurgia Plástica no currículo médico, e consequentemente do tema “queimaduras”, em muito é ligado ao fato desta especialidade ser erroneamente considerada, muitas vezes, somente por seu componente estético. Uma pesquisa relativamente recente2020 Parikh AR, Clarke A, Butler PE. Plastic surgery and the undergraduate medical school curriculum. Med Educ. 2006;40(5):476-7. PMID: 16635148 DOI: http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2929.2006.02425.x
http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2929.20...
, do ano de 2006, mostrou que 93% dos alunos de Medicina classificaram a “cirurgia estética” como o núcleo da especialidade de Cirurgia Plástica, durante avaliação do currículo médico.

CONCLUSÃO

Embora os índices de acerto no sexto ano de graduação em Medicina sejam maiores que no primeiro ano, não há conhecimento nem preparo adequado dos formandos para atendimento de pacientes queimados. Isto é preocupante, pois queimaduras implicam em situações de emergência que exigem intervenção médica rápida, adequada e eficiente, a fim de reduzir a morbimortalidade das vítimas.

  • Instituição: Faculdade de Medicina de Marília, Marília, SP, Brasil.

Anexo 1. Questões sobre atendimento ao queimado (Balan et al.33 Balan MAJ, Meschial WC, Santana RG, Suzuki SM, Oliveira MLF. Validation of an instrument for investigating knowledge on the initial assistance to burns victims. Text Context Nursing. 2014:23(2):373-81. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/0104-07072014000380013
http://dx.doi.org/10.1590/0104-070720140...
).

1. No exame básico do primeiro atendimento do paciente queimado devem-se inspecionar as vias aéreas, a respiração, a condição da circulação, condição da coluna cervical, dificuldades e disfunções, expor e examinar o doente e iniciar reposição hídrica.
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
2. Os cuidados imediatos do atendimento do paciente queimado consistem em parar o processo da queimadura e lavar a área acometida com água morna até a dor passar.
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
3. No atendimento do paciente queimado a remoção de roupas queimadas ou intactas nas áreas da queimadura e a avaliação clínica completa com registro do agente causador, da extensão e da profundidade da queimadura são aspectos de pouca relevância em indivíduos com queimaduras de média gravidade.
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
4. Para cálculo mais apurado da área queimada se utiliza a regra dos “nove” (Wallace), que admite que cada membro superior e cada quadrante do tronco correspondem a 9% da SC independente da idade.
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
5. Nos cuidados locais ao queimado devem-se remover medicamentos caseiros com limpeza local (se necessário) com sabão neutro ou glicerinado, sabão de coco ou sabão líquido e lavagem abundante com água corrente.
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
6. Quando o agente causador da queimadura for aderente, deve-se tentar a remoção imediata para evitar maior propagação da queimadura.
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
7. Após limpeza das lesões, os curativos deverão ser realizados com tópico de escolha seguidos de curativo estéril, de acordo com a rotina do serviço. Utilizar preferencialmente curativos oclusivos, exceto em lesões de orelha ou períneo.
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
8. As mãos devem ficar elevadas por 24 a 48 horas após a queimadura, para minimizar o edema. Queimaduras circunferenciais poderão ter tratamento ambulatorial, sendo orientado apenas observar coloração da mão.
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
9. A diurese deve ser controlada (medida e suas características descritas - clara, límpida, turva hemorrágica, hemoglobinúria, etc.) - mesmo quando se decidir contra o uso de sonda vesical.
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
10. A fisiopatologia das queimaduras é caracterizada por duas ocorrências principais: aumento da permeabilidade capilar (APC), que se inicia imediatamente após a queimadura, tem seu pico máximo em 8 horas e dura, em média, 18 a 24 horas. O edema resulta do extravasamento de líquidos para o espaço intersticial, intensificado pela passagem de grandes moléculas de albumina que por ter alto peso molecular atraem mais líquido para o espaço extracelular.
( ) Concordo ( )Discordo ( ) Não sei
11. Queimaduras de face, pé, mão ou pescoço e queimaduras de região perineal ou genitália, com boa higiene, podem ser tratadas ambulatorialmente.
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
12. Queimadura circunferencial de extremidades, queimaduras por descarga elétrica, Intoxicações por fumaça ou lesões das vias aéreas são consideradas acometimentos graves, mas não necessitam de encaminhamento para tratamento em centro especializado. ( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
13. Internação na UTI está indicada, entre outros, nos seguintes casos: queimaduras na fase aguda; acima de 30% da superfície corporal no adulto e acima de 20% na criança menor de 12 anos.
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
14. Paciente queimado deverá permanecer em jejum nas primeiras 48 horas, até que se tenha certeza da extensão da lesão, com cálculo do suporte nutricional adequado.
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
15. Indivíduos com necessidade de suporte ventilatório, múltiplas intervenções cirúrgicas, estado nutricional comprometido anterior à queimadura, perda de peso superior a 10% durante tratamento, idosos com mais de 20% de SCQ e traumatismo cranioencefálico com lesões faciais graves deverão receber suporte nutricional.
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
16. Para reposição hidroeletrolítica, cateterizar preferencialmente veia periférica de grosso calibre e calcular reposição inicial. O volume diário da reposição de urgência deve ser na proporção de 2-4 ml/kg de peso X a área queimada (superfície corporal) em porcentagem.
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
17. Deve-se utilizar antibiótico profilático para prevenção da infecção com cobertura para gram-positivos. ( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
18. Paciente internado deve ser pesado diariamente. É necessário solicitar hemoglucoteste de 3/3 horas em pacientes diabéticos e controle de PA de 3/3 horas em pacientes hipertensos.
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei

REFERÊNCIAS

  • 1
    Shahrokhi S, Jindal K, Jeschke MG. Three components of education in burn care: surgical education, inter-professional education, and mentorship. Burns. 2012;38(6):783-9. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2012.01.012
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2012.01.012
  • 2
    Egro FM, Estela CM. The need for burns teaching: a cross-sectional study to assess burns teaching in the United Kingdom. Burns. 2014;40(1):173-4. PMID: 24238672 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2013.10.001
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2013.10.001
  • 3
    Balan MAJ, Meschial WC, Santana RG, Suzuki SM, Oliveira MLF. Validation of an instrument for investigating knowledge on the initial assistance to burns victims. Text Context Nursing. 2014:23(2):373-81. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/0104-07072014000380013
    » http://dx.doi.org/10.1590/0104-07072014000380013
  • 4
    Peck MD. Epidemiology of burns throughout the world. Part I: Distribution and risk factors. Burns. 2011;37(7):1087-100. PMID: 21802856 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2011.06.005
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2011.06.005
  • 5
    Gawryszewski VP, Bernal RTI, Silva NN, Morais Neto OL, Silva MM, Mascarenhas MDM, et al. Sá NN. Public hospital emergency department visits due to burns in Brazil, 2009. Cad Saúde Pública. 2012;28(4):629-40. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012000400003
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012000400003
  • 6
    Burn prevention: success stories and Lessons Learned [internet]. Geneva: World Heath Organization; 2011. [cited 2017 Oct 30]. Available from: http://www.who.int/violence_injury_prevention/publications/other_injury/burn_success_stories/en/
    » http://www.who.int/violence_injury_prevention/publications/other_injury/burn_success_stories/en/
  • 7
    Tse T, Poon CH, Tse KH, Tsui TK, Ayyappan T, Burd A. Paediatric burn prevention: an epidemiological approach. Burns. 2006;32(2):229-34. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2005.08.025
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2005.08.025
  • 8
    Zahid A, Atannaz J, Alaoui M, Rafik A, Ezzoubi M, Diouri M, et al. Epidemiological profile of children burns admitted at the National Center for Brules, Morocco. Ann Burns Fire Disasters. 2011;24(4):171-4.
  • 9
    Millan LS, Gemperli R, Tovo FM, Mendaçolli TJ, Gomez DS, Ferreira MC. Epidemiological study of burns in children treated at a tertiary hospital in São Paulo. Rev Bras Cir Plást. 2012;27(4):611-5. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1983-51752012000400024
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1983-51752012000400024
  • 10
    Peets AD, McLaughlin K, Lockyer J, Donnon T. So much to teach, so little time: a prospective cohort study evaluating a tool to select content for a critical care curriculum. Crit Care. 2008;12(5):R127. DOI: http://dx.doi.org/10.1186/cc7087
    » http://dx.doi.org/10.1186/cc7087
  • 11
    Ringo Y, Chilonga K. Burns at KCMC: epidemiology, presentation, management and treatment outcome. Burns. 2014;40(5):1024-9. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2013.10.019
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.burns.2013.10.019
  • 12
    Rea S, Kuthubutheen J, Fowler B, Wood F. Burn first aid in Western Australia--do healthcare workers have the knowledge? Burns. 2005;31(8):1029-34.
  • 13
    Maia ER, Gonçalves Júnior J, Lima EP, Campos W, Jovino EM, Fernandes FF, et al. Conhecimentos em atenção pré-hospitalar e suporte básico de vida por estudantes recém-ingressos de medicina. Rev Bras Educ Méd. 2014;38(1):59-64. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-55022014000100008
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0100-55022014000100008
  • 14
    Liberal EF, Aires RT, Aires MT, Osório AC. Safe school. J Pediatr (Rio J). 2005;81(5 Suppl):S155-63. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0021-75572005000700005
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0021-75572005000700005
  • 15
    Lemon TI, Stapley S, Idisis A, Green B. Is the current UK undergraduate system providing junior doctors knowledge and confidence to manage burns? A questionnaire-based cohort study. Burns Trauma. 2015;3:6. DOI: http://dx.doi.org/10.1186/s41038-015-0005-9
    » http://dx.doi.org/10.1186/s41038-015-0005-9
  • 16
    Skinner A, Peat B. Burns treatment for children and adults: a study of initial burns first aid and hospital care. N Z Med J. 2002;115(1163):U199.
  • 17
    Chakravarthy B, Ter Haar E, Bhat SS, McCoy CE, Denmark TK, Lotfipour S. Simulation in medical school education: review for emergency medicine. West J Emerg Med. 2011;12(4):461-6. DOI: http://dx.doi.org/10.5811/westjem.2010.10.1909
    » http://dx.doi.org/10.5811/westjem.2010.10.1909
  • 18
    Dougherty W, Waxman K. The complexities of managing severe burns with associated trauma. Surg Clin North Am. 1996;76(4):923-58. PMID: 8782481 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/S0039-6109(05)70488-6
    » http://dx.doi.org/10.1016/S0039-6109(05)70488-6
  • 19
    British Burn Association Standards. National Burn Care Review. [acesso 2017 Out 31]. Disponível em: http://www.britishburnassociation.org/downloads/NBCR2001.pdf
    » http://www.britishburnassociation.org/downloads/NBCR2001.pdf
  • 20
    Parikh AR, Clarke A, Butler PE. Plastic surgery and the undergraduate medical school curriculum. Med Educ. 2006;40(5):476-7. PMID: 16635148 DOI: http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2929.2006.02425.x
    » http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2929.2006.02425.x

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2017

Histórico

  • Recebido
    05 Jun 2017
  • Aceito
    23 Set 2017
Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica Rua Funchal, 129 - 2º Andar / cep: 04551-060, São Paulo - SP / Brasil, Tel: +55 (11) 3044-0000 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbcp@cirurgiaplastica.org.br